uma paradigma, constituído de formas supletivas

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A REGULARIDADE DOS VERBOS TIDOS COMO IRREGULARES:
UM PARADIGMA, CONSTITUÍDO DE FORMAS SUPLETIVAS
JOSÉ MARIO BOTELHO (FFP-UERJ E ABRAFIL)
O estudo sobre verbos não recebeu um tratamento adequado
pela nossa Tradição Gramatical, que procurou omitir a real complexidade que envolve o assunto.
No que se refere à conjugação verbal, mais precisamente, os
estudos tradicionais apontam para uma descrição não só inconveniente como também inconsistente, já que se concebe um único modelo de conjugação verbal, denominado Paradigma dos Verbos Regulares em “-ar”, em “-er” e em “-ir”, a partir do qual os verbos são classificados ou como regulares – aqueles que se conjugam exatamente
como o paradigma –, ou como irregulares – aqueles, cuja conjugação
não se enquadram perfeitamente no paradigma.
No entanto, não se pode deixar de observar que esses verbos,
que não se enquadram em um dos modelos apresentados pelas nossas
Gramáticas, por não se conjugarem exatamente como o verbomodelo de uma das três conjugações, apresentam entre si uma regularidade flagrante. A tal irregularidade1, enunciada nos estudos tradicionais, caracterizada por uma alteração na forma-base principalmente, podendo gerar outras irregularidades quanto ao acréscimo de um
1
“Conceito da gramática descritiva, referente às formas lingüísticas que
ficam fora do paradigma (v.) correspondente às demais da mesma estrutura.” (Cf. Câmara Jr. 1985a, p. 149 – verbete “Irregularidade”).
1
dos morfemas categóricos para a expressão de modo e tempo ou/e de
número e pessoa, quando não é a mesma em um grupo de verbos, é
da mesma natureza.
Logo, convém considerar dois paradigmas de conjugação dos
verbos portugueses: um, em que se mantêm invariáveis as formasbase; outro, em que ocorrem variações em suas formas-base.
Certamente, a nossa Tradição Gramatical vem tratando a questão da conjugação verbal dessa forma econômica para evitar a aplicação de novos termos e a ampliação da descrição da conjugação
verbal, que, por si só, já constitui um estudo extenso e complexo.
Tratamento dado pela Tradição Gramatical à conjugação verbal
Em nossas Gramáticas, não encontramos uma descrição satisfatoriamente desenvolvida e, portanto, esclarecedora. Nelas, de fato,
encontramos afirmações repetidas, como se o assunto não merecesse
atenção ou se não oferecesse problemas a serem solucionados ou
pelo menos a serem discutidos.
Ribeiro (2005), ao classificar os verbos quanto à conjugação,
limita-se à seguinte observação:
2 – Irregular – A irregularidade se reconhece por alterações no
radical ou nas desinências. Às vezes, ocorre simultaneamente no
radical e nas desinências: sei, soube, saiba; faço, fiz, farei. (Ri-
beiro, 2005, p. 198)
2
Mais adiante, quando trata das conjugações (Id., ibid., p. 200),
ressalta que são três as conjugações e que se caracterizam pelas vogais temáticas “-a-” – verbos de 1.a conjugação; “-e-” – verbos de 2.a
conjugação; e “-i-” – verbos de 3.a conjugação. Observa, também,
que a vogal temática é freqüentemente suprimida nos verbos irregulares (Ibidem, p. 200).
Tratando especificamente sobre os verbos irregulares, o autor
observa que quase sempre o presente do subjuntivo desses verbos é
formado da primeira pessoa do singular do presente do indicativo, e
que o pretérito mais-que-perfeito do indicativo e o pretérito imperfeito e o futuro do subjuntivo são formados do pretérito perfeito do
indicativo. Ressalta que o restante da conjugação segue, geralmente,
o radical normal do infinitivo, não havendo, praticamente, irregularidade (Ibidem, p. 200).
Em seguida, alerta para o fato de que se deve observar que, às
vezes, o radical só varia no presente do indicativo e no presente do
subjuntivo e passa a apresentar uma lista de alguns verbos irregulares
e sua conjugação irregular.
Bechara (1999), inicialmente repete a afirmação de que o paradigma verbal se caracteriza a partir daquelas três vogais temáticas
e, sob o título “Verbos regulares, irregulares e anômalos”, apresenta
a seguinte definição:
Irregular é o verbo que, em algumas formas, apresenta variações
no radical ou na flexão, afastando-se do modelo de conjugação a
que pertence. (Bechara, 1999, p. 225)
3
Depois apresenta, de forma sintética, os conceitos dos “irregulares fracos” (verbos, cujo radical do infinitivo não se modifica no
pretérito perfeito, como: sentir – senti; perder – perdi) e “fortes”
(verbos, cujo radical do infinitivo se modifica no pretérito perfeito,
como: caber – coube; fazer – fiz).
Em seguida, observa que os irregulares fracos apresentam
formas iguais para o infinitivo flexionado e para o futuro do subjuntivo (ex.: sentires tu – quando tu sentires) e que as formas de infinitivo flexionado e de futuro do subjuntivo dos irregulares fortes não são
iguais (ex.: cabermos nós – quando nós coubermos).
E finaliza o assunto, ressaltando que não há irregulares gráficos, pois “não entram no rol dos verbos irregulares aqueles que, para
conservar a pronúncia, têm de sofrer variações de grafia.” (Id., ibid.,
p. 226).
Depois, a partir da página 226, também apresenta uma relação
de verbos irregulares e a conjugação de suas formas irregulares.
Cunha e Cintra (1985) já apresentavam, de forma sintética e
evasiva, uma definição de verbo irregular no item sobre a classificação do verbo:
São irregulares os verbos que se afastam do paradigma de sua
conjugação, como dar, estar, ser, pedir, ir e vários outros, que no
lugar próprio estudaremos. (Cunha; Cintra, 1985, p. 374)
Contudo, os autores reservam um capítulo desenvolvido sobre
o assunto sob o título “Conjugação dos verbos irregulares” (Ibidem,
p. 400-29).
4
Nesse capítulo, os autores passam a descrever as variações que
ocorrem em verbos dos três modelos de conjugação e nos tempos e
modos específicos, fazendo observações sobre as condições das variações.
Fazem importantes observações acerca da alternância vocálica
e apresentam uma descrição dos principais tipos de alternância vocálica de verbos em que ocorrem formas rizotônicas, tomando como
modelo os verbos “levar” e “lograr” – para a 1.a conjugação; “dever”
e “mover” – para a 2.a conjugação; e “servir” e “dormir” – para a 3.a
conjugação.
Em seguida, apresentam a conjugação irregular de alguns verbos, sempre seguida de observações valiosas.
Entretanto, os autores apresentam-nos essa descrição sob a
perspectiva da irregularidade.
Rocha Lima (1998), sob o título de “Verbos irregulares (e anômalos)”, afirma que:
São irregulares os verbos que não acompanham o respectivo paradigma. (Rocha Lima, 1998, p. 156)
e observa que tais verbos se classificam em fortes ou fracos, de acordo com as alterações que venham sofrer no radical do pretérito perfeito do indicativo (ex.: fortes: saber – soube; trazer – trouxe; fracos:
pedir – pedi; ouvir – ouvi).
5
Depois, observa que “nem todas as formas verbais são irregulares num verbo chamado irregular” (Ibidem, p. 157), uma vez que
tal irregularidade não se dá em todas as suas formas.
Em seguida, como os demais gramáticos, apresenta a conjugação das formas irregulares de alguns verbos.
Como se pode confirmar, os nossos gramáticos não são esclarecedores quanto ao assunto e, além de repetirem a definição de verbos irregulares, concebem como “irregularidade” o fenômeno das
variações que eventualmente ocorrem em certas formas de alguns
verbos, em relação a um paradigma de conjugação caracterizado por
um das vogais temáticas: “-a”, “-e” e “-i”.
Embora o conceito de irregularidade dessa tradição gramatical
seja impreciso e deficiente, como observa Freitas (1997, p. 86) e já
observava Câmara Jr. (1985b, p. 111-6), descrevendo o fenômeno
das variações daquelas formas verbais de modo claro e conveniente,
sendo, pois, esclarecedora tal descrição, não se pode deixar de reconhecer que aqueles gramáticos apontaram também para uma padronização de tais formas, pois todos ressaltam que são poucas as formas variantes daqueles verbos tidos como irregulares. Apontam para
uma relativa padronização de tais variações e afirmam que o restante
da conjugação desses verbos (que, geralmente, é uma grande maioria) segue ao paradigma de sua conjugação.
Diferente da abordagem gramatical tradicional, mas sem negar
o caráter de irregularidade das formas variantes de certos verbos
portugueses, Câmara Jr. (1985, p. 140-59), sob uma visão diacrônica,
6
trata a questão de forma mais esclarecedora, visto que descreve o
fenômeno sem parcimônia.
Nessa descrição de Câmara Jr., a sua preocupação é com a estrutura de flexão verbal. Procura inicialmente distinguir dois tipos de
verbos portugueses quanto às suas formas-base (radical).
Considerando a origem dos verbos em português, o autor traça
um paralelo entre as línguas latina e portuguesa e afirma que “a oposição entre imperfeito e perfeito se faz exclusivamente em função de
uma variação de radical” (Id., ibid., p. 140).
Observa que há um grande número de verbos em português
com um radical comum para os tempos perfeito e imperfeito e que é
em número muito limitado os verbos portugueses de perfeito (Aqueles que “possuem, ou não, uma forma específica para os quatro tempos provenientes do perfectum latino: indicativo pretérito perfeito,
indicativo pretérito mais-que-perfeito, subjuntivo pretérito e subjuntivo futuro” (Idem).).
Depois observa que se poderia fazer uma outra divisão a partir
de uma distinção de temas verbais, o que constitui a tal conjugação
dos verbos portugueses, que se caracteriza pela vogal temática, sendo
que os verbos de perfeito podem apresentar um tema diferente nas
formas perfeitas e imperfeitas.
Em seguida, descreve o caráter diacrônico da formação dos
três temas (em: “-ar”, “-er” e “-ir”) e, por fim, passa a descrever os
tipos de variações de radicais em formas rizotônicas e arrizotônicas,
entre elas as alterações vocálicas dos verbos portugueses, e enfatiza,
7
no subitem “Verbos com radical de perfeito”, a importância da descrição de variações de radical, decorrente de uma oposição entre
formas imperfeitas e perfeitas, que deixou de ocorrer na maioria dos
radicais verbais do português.
A minoria desses verbos portugueses que mantém a oposição
divide-se, segundo Câmara Jr., em três tipos: a) oposição de temas
(somente dois verbos: dar: dás, dava, dei, deram; ver: vemos, vimos,
visse); b) oposição de radicais (são os chamados “fortes”, de que se
referem Bechara (Op. cit.) e Rocha Lima (Op. cit.) – inteiramente de
tema em “-e-”, em cujas formas rizotônicas não ocorre a marca flexional de 1.a nem de 3.a pessoa do singular do pretérito perfeito do
indicativo, porém com distinção entre as pessoas: fazer: faz, fazia,
fiz, fizermos; poder: podes, podem, pude, pudessem; pôr: pomos,
põe, pus, puserdes); e c) oposição de radicais (também fortes e
inteiramente de tema em “-e-”, em cujas formas rizotônicas não
ocorre a marca flexional de 1.a nem de 3.a pessoa do singular do
pretérito perfeito do indicativo, causando indeterminação mórfica
entre elas (neutralização): caber: cabe, cabias, coube, couberes;
dizer: diz, dizíamos, disse, disséssemos; querer: quero, queríamos,
quis, quisermos).
Por fim, Câmara Jr. Anuncia o estudo de supletivismo verbal
dos verbos portugueses, sob o título de “Os radicais supletivos” (p.
158-9). Nesse subitem, o autor só descreve, sob a visão diacrônica, a
formação de formas verbais concebidas pelos estudos tradicionais,
como anômalos, como é o caso das formas dos verbos “ser” e “ir”.
8
Afirma serem de radicais heterônimos as formas de imperfeito
de tais verbos.
Embora o autor descreva apenas esses dois verbos, considerados anômalos pelas gramáticas, a visão que introduz pode perfeitamente ser estendida aos verbos portugueses que apresentam formas
variantes em sua conjugação, que até então têm sido consideradas
irregulares por muitos.
Aliás, tal noção de supletivismo das formas verbais portuguesas consideradas irregulares foi desenvolvida pelo próprio Câmara Jr.
em seu “Estrutura da língua portuguesa” (1985b, p. 111-6) e, mais
tarde, por Freitas (Op. cit., p. ).
Formas irregulares ou formas supletivas?
Primeiramente, convém ressaltar que a conjugação verbal em
português é regular, porquanto se trata de um fenômeno flexional,
que se espera sistemático, regular, fechado e obrigatório2, o que faz
com que o seu paradigma se revele regular. A inconveniência da
concepção tradicional está fundamentalmente no fato de em sua abordagem classificar como irregulares certos verbos, que, de fato,
apresentam algumas formas que não seguem o modelo estabelecido
por ela para os verbos denominados regulares. Contudo, não se pode
negar que tais verbos apresentam uma regularidade na sua conjugação (Câmara Jr., 1985, p. 111) e, considerando as observações do
2
Cf. BOTELHO (2004, p. 19-29) – sobre a natureza da flexão.
9
próprio Câmara Jr. e dos gramáticos (citados no subitem anterior)
quanto às alterações eventuais que recebem certas formas de alguns
verbos portugueses, uma padronização do referido fenômeno.
Esses fenômenos de variações nas formas-base dos referidos
verbos resultam em formas alomórficas. Tais verbos são, pois, verbos que apresentam alomorfias, que, em alguns casos, parece constituírem formas de um outro verbo quando não o são realmente, como
é o caso dos verbos tradicionalmente chamados de “anômalos” “ser”
e “ir”, que apresentam em suas conjugações formas de outros verbos
de origem também latinas.
Consideramos mais apropriado chamar de formas supletivas a
essas formas alomórficas que compõem a conjugação daqueles verbos e considerá-la como um outro paradigma de conjugação verbal
em português, uma vez que essa conjugação apresenta particularidades que afetam algumas formas dos verbos que constituem o rol dos
que a seguem.
Freitas (Op. cit.) define como formas supletivas aquelas que
não pertencem a paradigmas maiores. O autor nos chama a atenção
para o fato de surgirem formas sob novos sistemas paradigmáticos,
em virtude do uso que tende a uma uniformização.
Ele também lembra que “na visão estrutural dos modernos estudos lingüísticos, denomina-se supletivismo que, sobre explicitar
formas paralelas aos padrões paradigmáticos de um sistema, desfaz o
errôneo conceito de ‘irregularidade’ da gramática filosófica.” (Id.,
ibid., p. 88).
10
Por isso, faz um intróito esclarecedor sobre o que venha ser
“irregularidade”, em cujo conceito a Tradição se baseou para classificar os verbos portugueses em regulares e irregulares.
A abordagem feita por Freitas é de natureza histórica e, por
conseguinte, resgata as noções que os pensadores gregos faziam dos
termos Physei (natureza) e Thési (convenção), explicando que da
polêmica gerada em torno desses termos surgem os anomalistas e os
analogistas. Aqueles defendem o caráter de convenção, de arbitrariedade e casualidade da linguagem, enquanto os anomalistas defendiam ter a linguagem uma relação natural e verdadeira entre o significado (conceito) e o significante (forma física sonora ou gráfica),
atribuindo ao uso a responsabilidade pelos casos de desvio – idiossincrasias.
Logo, são anomalistas os precursores do conceito de irregularidade (e de anomalia), que não recebe um tratamento conveniente
nos estudos gramaticais tradicionais, visto que não desenvolvem uma
abordagem consistente do fenômeno em si.
Não obstante, estudos lingüísticos contemporâneos vêm sendo
desenvolvidos por pesquisadores que vêem a língua como um fenômeno psicossocial. Nesses estudos, o princípio norteador é epistemológico, sob o qual se procura analisar os fenômenos da linguagem,
explicando-os, descrevendo-os e procurando determinar o valor e o
alcance das hipóteses e dos estudos existentes.
Sob tal prática, as idiossincrasias ou desvios do que se espera
padrão não são e nem podem ser rotulados como irregularidade ou
11
anomalia. A língua é em si um organismo vivo, além de ser um sistema de possibilidades lingüísticas. Logo, o que se nos parece uma
irregularidade ou anomalia pode constituir uma outra padronização,
como ocorre com certo número limitado de verbos portugueses, em
cuja conjugação se podem observar formas que não obedecem ao
padrão geral. São formas alomórficas, porquanto sofrem alterações, o
que as fazem parecer irregulares; mas as alterações são regulares,
embora não ocorram do mesmo modo em todos os verbos tidos como
irregulares.
A irregularidade de tais formas reside no conjunto de alomorfias, que ocorrem nesses verbos.3 Isto é o mesmo que dizer que certos verbos portugueses compõem um padrão especial, em virtude de
sua organização não ser a mesma que a do padrão geral.
Assim, temos dois padrões ou paradigmas de conjugação verbal: o padrão geral ou paradigma geral, a partir do qual se conjugam
os verbos que não apresentam nenhuma alomorfia, e o padrão especial ou paradigma especial, a partir do qual se conjugam algumas
formas de certos verbos em que ocorrem alomorfias em suas formasbase ou nos morfemas a elas acrescidos.
Essas formas alomórficas também podem ser denominadas
formas supletivas, já que para a sua conjugação concorrem formas
que não obedecem ao padrão geral de conjugação verbal.
3
Ver: CÂMARA Jr. (1985, p. 148-58) – Descrição diacrônica –; FREITAS
(1997, p. 91-2) – Descrição sincrônica.
12
Entre as formas supletivas figuram algumas heterônimas (ex.:
ir: vou, iremos, foram; ser: sou, és, fomos) e outras, cuja alomorfia é
tão abrupta que parecem ser heteronímia (ex.: saber: sei, soube, saibam; fazer: fez, fiz, faças; ter: tenho, tem, tivesse).
Para o estabelecimento dessas formas supletivas não se faz
mister decorar uma imensa lista, mormente porque não é tão extensa
e complexa a relação dessas formas. Além disso, as alterações ou
alomorfias que ocorrem nelas podem normalmente ser interpretadas
a partir de padrões morfofonêmicos e de modo sincrônico (Cf. Freitas, op. cit., p. 91-2).
Apenas para efeito de ilustração, enumeramos os seguintes exemplos4: dizer: digo, diremos, disses; trazer: trago, trarão, trouxe,;
fazer: faço, farás, fizeram; poder: posso, pude; ter: tenho, tive, tinha;
vir: venho, vim, vinha; pôr: ponho, pus, punha; saber: sei, soubeste;
ser: somos, é, era, fui, foram, seja; ir: vou, fui, foram, vá; e muitos
outros5.
Certamente, pode-se observar que há mais de um tipo de alomorfia, mas que se repetem em grupos de verbos, como se constata
nos exemplos supracitados, de modo que se torna possível uma padronização desses padrões especiais.
4
Outros exemplos e uma descrição dos padrões especiais podem ser encontrados em Câmara Jr. (1991, 1985, 1985a, 1985b e 1989) e Freitas (1997).
5
Dessas formas se depreendem outras, que delas se originam.
13
Considerações finais
Como as formas supletivas de certos verbos portugueses compõem um padrão especial que se repete, tornando possível reuni-los
em grupos, o conceito de irregularidade se torna impróprio à conjugação verbal em português.
Essas formas supletivas apresentam uma certa uniformidade
dentro de estrutura do sistema lingüístico do português, apesar de
não obedecer a um padrão geral, que tem sido considerado o paradigma de conjugação dos verbos portugueses, como se ele fosse o
único modelo a ser seguido.
De fato, as formas supletivas se mostram diferentes em relação
ao modelo geral, sob o qual se relaciona a maioria dos verbos do
português. Contudo, não constituem a tal irregularidade harmoniosamente aceita e descrita pela nossa tradição gramatical.
As referidas formas supletivas, na verdade, funcionam no sistema da língua portuguesa sob um outro modelo de conjugação paralelo ao modelo geral. Este, denominado paradigma de conjugação
dos verbos regulares, a partir do qual se conjugam a grande maioria
dos verbos da língua portuguesa, deve ser entendido como o paradigma geral. Aquele, paralelo ao geral, sob o qual se reúnem em
pequenos grupos de verbos que apresentam formas alomórficas afins
ou heterônimas, deve ser concebido como um paradigma especial.
Logo, são dois os tipos de verbos portugueses quanto à sua
classificação: os que seguem um paradigma geral e os que seguem
14
um paradigma especial. Ambos são regulares em seus paradigmas,
visto que compõem uma classe de palavras que sofrem flexão – fenômeno fundamentalmente sistemático e regular.
15
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16
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