o Espectro de Darwin

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ANOTAÇÕES DE
O ESPECTRO DE DARWIN
AUTOR: MICHAEL ROSE
EDITORA: JORGE ZAHAR - 1999
11
A União Soviética chegou a liquidar alguns darwinistas por suas convicções
cientificas.
O Tennessee promulgou em março de 1925 uma lei que proibia o ensino, nas
escolas públicas, de qualquer teoria que negasse a criação divina do homem, tal
como ensinada na Bíblia. Um homem chegou a ser julgado por viola-la. A base da
natureza sensacionalista do julgamento foi a crescente preocupação dos
fundamentalistas cristãos com o desafio que a ciência e a teoria evolucionista
representavam para a interpretação literal das Escrituras.
17
Há 3 questões principais na biologia evolucionista: a natureza da hereditariedade,
o modo de funcionamento da seleção e o padrão da evolução.
36
Antes de Darwin, havia 3 características gerais da vida que eram intrigantes: o
parentesco entre as espécies, a diversidade das espécies e a adaptabilidade das
espécies. Darwin forneceu as explicações básicas para esses fenômenos, usadas
pelos biólogos até hoje.
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Tese do projeto divino. Ela equivale à necessidade imperativa de evocar um
criador para explicar esses mecanismos maravilhosos, dada a implausibilidade de
eles surgirem por acaso.
39
A coisa mais difícil de entender na biologia é a importância da variação. (...) A
variação não é uma mera característica dos seres vivos – é também essencial à
sua própria evolução.
41
Quando se considera que os verdadeiros representantes das espécies têm certos
atributos ideais, e que os desvios destes são variações acidentais ou “impuras”, é
improvável que a evolução seja considerada ou aceita.
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“Qualquer variação que não seja herdada não é importante para nós. Mas o
numero e a diversidade dos desvios estruturais transmissíveis pela herança, tanto
os de pequena quanto os de considerável importância fisiológica, são
intermináveis.”
A principal alternativa a qualquer teoria da evolução é um mundo vivo estático,
que presuma que todas as espécies são inalteráveis.
45
Cruzando coelhos pretos com brancos, obtemos coelhos cinzentos. Isso pode
parecer uma variação maior do que tínhamos antes, mas esse tipo de resultado
significa que restam menos coelhos nos extremos do branco ou do preto. Alem
disso, os cinzentos cruzados com brancos produzem coelhos cinzentos, e nunca
pretos. Ao longo do tempo e de gerações de acasalamento, se a cruza dos coelhos
for mais ou menos aleatória com respeito à cor, haverá cada vez menos coelhos
brancos ou pretos. Tudo se transforma’ra em alguma tonalidade de cinza. Depois,
à medida que esses coelhos cinzentos cruzarem entre si, ao longo de outras
gerações, a cor de seu pelo convergirá para um cinza uniforme, sem que reste
qualquer variação na população. Os extremos se perderão, deixando a população
sem nada alem de uma uniformidade entediante.
A herança de caracteres adquiridos é a idéia de que o que se transmite à prole
depende do meio ambiente ou da condição fisiológica dos genitores. (...) Por
exemplo, havendo uma herança de caracteres adquiridos, os filhos de pais com
muitas tatuagens deveriam nascer com marcas na pele.
48
Darwin, às vezes recebia as observações que ameaçavam suas teorias como
inimigos a serem combatidos, e não como exceções reveladoras.
50
No jargão da genética, dizemos que existe “um gene para a cor dos olhos”, “um
gene para o nanismo” e assim por diante. O interessante é que a maioria dos
organismos tem duas cópias, ou “alelos”, de cada um desses genes.
51
A questão centrar da genética é que os dois alelos de cada gene são transmitidos
à prole com igual freqüência. Esse processo não tem muita importância quando os
dois alelos são idênticos – digamos, quando os dois codificam olhos azuis -, mas é
importante quando eles codificam traços diferentes, por exemplo, um para olhos
azuis e outro para olhos castanhos. Alem disso, Mendel sabia que as combinações
de alelos não se misturavam nem se contaminavam; eles continuavam diferentes.
Por essa razão, a hereditariedade mendeliana é chamada de particulada e
“consistente”, o oposto diametral do esquema darwiniano da herança miscível e da
herança de caracteres adquiridos.
Quando dois alelos têm que expressar o traço codificado por seu gene, (...) há
uma possibilidade chamada “dominância”. (...) Muitos caracteres exibem esse tipo
de dominância genética, dentre eles a maioria dos alelos da pigmentação dos
mamíferos, quer se trate da cor dos olhos ou da cor da pelagem. (...) mas a
maioria dos caracteres dos organismos, como a altura ou o peso, exibe valores
intermediários quando dois alelos diferentes se combinam.
[interessante isso. Se não fosse pela média, e sim pelo maior, a altura do ser
humano estaria aumentando indefinidamente]
55
Por volta de 1940 já não havia como duvidar de 3 pontos básicos: a) as mutações
eram resultantes de processos bioquímicos convencionais, e não da “vontade” ou
de qualquer outro mecanismo compatível com uma interpretação neolamarckiana;
b) as mutações não necessariamente davam origem a novas espécies; e c), as
mutações não tinham nenhuma tendência a serem benéficas.
58
Tudo o que acontece no acasalamento e na produção da prole é análogo ao
embaralhamento das cartas num jogo de baralho. Quando não há trapaça e
nenhuma carta cai no chão, todas as mãos são tiradas de um mesmo numero de
cartas.
59
Não há uma tendência direcional proveniente da genética mendeliana como tal.
Por conseguinte, embora a variação genética exista, sua transmissão de uma
geração para a seguinte, por si só, não explica a evolução.
61
A variação genética de ocorrência natural é abundante e quase multidirecional. Os
animais mutantes podem variar quanto à cor dos olhos e ao numero de membros.
Podem até ser completamente desprovidos de olhos. Portanto, a variação genética
não está obrigada a preservar a fixidez das espécies.
65
Darwin sempre enfatizou, dentro do espírito gradualista, que a ação da seleção
natural era cumulativa, ao longo de muitas gerações. Modificações ligeiras e quase
imperceptíveis difundiam-se pelas espécies, só vindo a se manifestar em larga
escala ao longo de muitos milhares de gerações.
66
Quem já viu um são-bernardo do lado de um chihuahua, ambos produtos de
cruzamentos conduzidos pelo homem, aliados a acidentes do processo, tem que
acreditar no poder da seleção.
Por que não continuamos a ver as formas intermediarias? A réplica de Darwin foi
que os produtos mais recentes da seleção natural teriam eliminado as formas
intermediárias menos completamente desenvolvidas. Um exemplo óbvio disso é
que o Homo sapiens é a única espécie sobrevivente dos homídeos, embora, em
algum momento, devam ter existido várias. Direta ou indiretamente as outras
formas de homídeos foram extintas.
67
A sugestão darwiniana de que a bexiga natatória está evolutivamente relacionada
com o pulmão dos vertebrados terrestres é hoje corroborada por provas
irrefutáveis. Os órgãos não necessariamente evoluem de maneira simplista para
uma forma característica, idealmente montada. Como esperaria um darwiniano, os
órgãos evoluem por vias evolutivas sinuosas, nas quais determinadas funções
podem ser adquiridas ao longo de centenas de milhões de anos e perdidas nas
centenas de milhões de anos seguinte.
69
De 1910 a 1920, reuniram-se muitos fatores para dar a vitória a uma biologia
evolucionista que combinava o mendelismo e o darwinismo, mas não incluía o
neolamarckismo, o mutacionismo ou a herança miscível. A questão que se
mostrava crucial era a natureza da “variação contínua”., como a da altura humana,
particularmente em sua base genética, se é que ela existia. (...) Igualmente
importante foi o trabalho experimental com genes múltiplos. Nos cereais, mostrouse que alguns padrões de hereditariedade exigiam a pressuposição de genes
múltiplos que afetassem um mesmo traço, e não de um simples gene para cada
característica.
74
As abelhas operárias trabalham ininterruptamente, criando larvas de abelha,
defendendo a colméia e descobrindo alimento para levar até ela, mas são estéreis;
nenhuma das larvas criadas na colméia é prole sua. Esse tipo de comportamento é
chamado de “altruísmo”.
75
Nos gêmeos idênticos, o grau de parentesco é igual a um inteiro. Eles têm uma
completa identidade genética. Entre pais e filhos, o grau de parentesco costuma
ser de ½, em relação a cada um dos genitores. Esse valor provém do fato de que
cada um dos pais contribui com metade dos genes dos filhos. Nos mamíferos, aves
e outras espécies, o parentesco genético entre irmão descendentes do mesmo pai
e da mesma mãe também é igual a ½. Entre meio-irmãos, que têm apenas um
genitor em comum, o parentesco genético é igual a ¼. Entre primos em primeiro
grau, é de 1/8, e assim por diante.
76
Os membros da ordem Himenóptera de insetos (abelhas, vespas e formigas) têm
um sistema inusitado de determinação sexual. Os ovos fecundados transformamse em fêmeas e têm duas cópias de todos os cromossomos, condição que recebe o
nome de “diplóide”. Os ovos não fecundados transformam-se em machos e têm
apenas uma cópia de cada cromossomo, o que é chamado de “haplóide”. A
situação geral é chamada de “haplo-diploidia”.
A verdadeira importância da haplo-diploidia para a evolução do altruísmo está em
que ela altera a estrutura das relações genéticas. As irmãs diplóides que têm pai e
mãe em comum apresentam, normalmente, um coeficiente de relacionamento
genético igual a ¾, em contraste com o ½ que é normal entre os irmãos nas
espécies convencionais. A razão disso é que o pai tem apenas um conjunto de
cromossomos.
78
Existe um roedor subterrâneo, o rato-toupeira pelado da África, que exibe, como
mamífero, um paralelo quase completo com os cupins. Ele também se adaptou a
se alimentar de estruturas de madeira do subsolo, como raízes, e exibe um alto
grau de altruísmo. Há sempre um casal dominante de macho e fêmea, que tem
uma numerosa prole não reprodutora. Os descendentes executam tarefas de
operários, obtendo alimento e defendendo a toca labiríntica.
(...) se você é o único individuo com caninos grandes numa população, eles podem
ser usados para demolir seus rivais no combate. Mas quando todos têm os
mesmos caninos, o valor destes fica consideravelmente reduzido.
79
(...) a idéia das estratégias imbatíveis, estratégias que não poderiam ser
aprimoradas se todos os membros de uma população as adotassem.
Os cervos são dotados de chifres que poderiam causar enormes estragos, se os
machos atacassem um ao outro de lado ou pelas costas. Em vez disso, eles
contornam um ao outro, colocam-se diretamente de frente e partem para um
ataque de chifres contra chifres. Esses confrontos animados raramente passam de
trocas de empurrões.
82
Os macacos rhesus têm um combate ritualizado, no qual o perdedor aceita
dentadas inofensivas com os incisivos para encerrar a luta. Se, no momento em
que é apropriado morder com os incisivos, o adversário morder com os caninos,
que são muito mais perigosos, o macaco mordido revidará com violência. As
mordidas com os caninos são percebidas como uma escalada do ataque, o que,
por sua vez, provoca uma escalada no outro macaco.
85
A teoria evolucionista nos diz que a “aptidão” média de uma população, também
conhecida como sua “taxa [média] de reprodução”, tende a aumentar quando
ocorre a seleção natural.
87
Se presumirmos que os biólogos não podem buscar indefinidamente explicações
pautadas na seleção, qual é a alternativa? Teremos que recair em Deus, toda vez
que a primeira suposição ingênua não funcionar? A verdade é que a seleção não é
onipotente. Algumas limitações fundamentais cerceiam o processo evolutivo,
impedindo que a seleção atinja perfeição. Essas limitações são genéticas e
históricas.
89
Quase tudo o que funciona em nosso corpo foi criado pela seleção natural, agindo
sobre uma variação genética produzida ao acaso. Mas ela não é onipotente nem
toma conta de tudo. Funciona bem quando a ecologia, a fisiologia e a genética de
uma situação biológica lhe permitem funcionar.
90
Como havemos de estudar os acontecimentos que cercaram a origem da vida,
dado que não podemos observa-los diretamente? Como se criam novas espécies?
Quais foram os mecanismos de seleção que geraram traços tão surpreendentes
quanto o vôo, a localização pelo eco nos morcegos, a plumagem bizarra de muitas
aves tropicais e o simples tamanho das baleias ou das sequías?
Você é membro da espécie Homo sapiens,
Que pertence à família dos hominídeos,
À ordem dos primatas,
À classe dos mamíferos,
Ao filo dos cordados
E ao reino animal.
Essa é sua designação taxonômica que existe há algum tempo, desde o trabalho
do biólogo sueco Carl von Lineu, no século XVIII. Na taxonomia, a idéia mais
importante é classificar os organismos em grupos pautados na similaridade.
92
Criacionismo: todas as espécies foram criadas na origem da Terra, estiveram
presentes desde então e continuam conosco.
Lamarckismo: ainda há uma criação original da vida. Depois dessa primeira
criação, novas formas de vida surgem espontaneamente de substâncias não vivas.
Depois da origem, cada espécie evolui independentemente para formas cada vez
mais complexas.
Darwinismo: a organização hierárquica da diversidade surge por causa dos
ancestrais comuns das espécies atuais. As espécies têm ancestrais comuns porque
o sistema de vida é concebido como uma árvore ramificada, na qual as novas
espécies brotam das que já existem. Não existe geração espontânea; a vida
provém da vida, exceto, talvez, por uma ou poucas formas originais de vida. Ao
surgir pela primeira vez, a vida deve provir da matéria inanimada.
O fato de ser praticamente universal o código genético que relaciona a seqüência
do DNA com as seqüências de aminoácidos das proteínas é tanto um triunfo para
Darwin quanto para a biologia molecular. Foi Darwin quem previu que haveria essa
universalidade bioquímica, um século antes de sua descoberta pelos biólogos
moleculares.
96
A “unidade na diversidade” é produto do entrelaçamento da semelhança
proveniente dos ancestrais com a divergência proveniente da adaptação.
A evolução só consegue trabalhar com os materiais gradualmente. Não pode
atrever-se a criar modelos de vida completamente novos.
98
(...) os embriões dos mamíferos e das aves desenvolvem arcos de guelras no inicio
de seu desenvolvimento embrionário, o que só é plausível se admitirmos que,
originalmente, esses grupos tiveram espécies de peixes como ancestrais comuns.
(...) com freqüência, o processo de desenvolvimento de muitos seres vivos deixa
transparecer origens evolutivas muito diferentes das que se manifestam na forma
adulta.
103
As orquídeas Dendrobium precisam do clima certo para florescer, como um
temporal num dia quente. As orquídeas produzem então flores que duram apenas
1 dia, desabrochando no alvorecer e murchando ao anoitecer. Uma dessas
espécies floresce 8 dias depois de um temporal adequando, outra, 9 dias depois, e
uma terceira, 10 ou 11 dias depois.
104
Quando se constroem mutantes da mosca das frutas nos quais falta uma parte do
comportamento normal de acasalamento, a maioria das fêmeas não cruza com
eles, sobretudo se puderem escolher machos normais.
107
Quase todas as espécies se extinguem no espaço de alguns milhões de anos. Esse
é o resultado natural de um mundo vivo em que as espécies são geradas de
acordo com sua própria genética populacional especifica, em contraste com algum
principio ordenador cósmico, seja ele estético ou moral. Lindas aves-do-paraíso
são aniquiladas, enquanto as baratas prosperam.
117
Os Estados Unidos produziram 378 milhões de alqueires de grãos em 1839, no
início da era moderna, quando tinha uma população de cerca de 17 milhões de
habitantes. Em 1957, o país produziu 3,422 bilhões de alqueires, com uma
população de cerca de 180 milhões.
123
O começo de qualquer programa de seleção é a variação genética. Quando não há
variação genética em relação a um traço, não há razão para selecioná-lo. (...) mas
a variação genética é um requisito necessário, mas não suficiente.
125
Os tomates costumavam ser maiores, mais vermelhos e mais saborosos. Também
se estragavam mais depressa e sua colheita era mais dispendiosa. Alguma coisa no
cultivo dos tomates, que os tornou mais fáceis de plantar e de colher, tornou-os
inferiores em matéria de sabor. (...) Não se pode selecionar apenas uma coisa de
cada vez. É inevitável que outros caracteres também respondam à seleção. Os
genes que codificam caracteres como o tamanho corporal também podem codificar
outros atributos.
134
(...) os testículos matam os camundongos marsupiais. Basta tira-los para que sua
saúde melhore. As fêmeas não têm testículos, e é por isso que se saem muito
melhor.
135
Existe, portanto, um antagonismo perfeito entre a definição médica da saúde e a
definição darwiniana da saúde. Uma vez que a medicina é quase toda orientada
para a manutenção da vida, o pequeno detalhe da castração do camundongo
marsupial é largamente compensado pelos extraordinários benefícios trazidos para
sua sobrevivência. Como os darwinistas vêem a função inteiramente em termos da
taxa liquida de reprodução, um macho castrado é visto como um completo
fracasso, na falta de alguma contribuição compensatória para os parentes
próximos, como nas situações de seleção por parentesco (...).
136
Existem 3 sistemas de valores diferentes : o médico, o darwiniano e o das pessoas
na vida cotidiana.
138
Convém notar que há uma vasta gama de dados sobre outros organismos, como
os camundongos marsupiais e os salmões do Oceano Pacífico, que mostram um
aumento da sobrevivência masculina com a castração. É improvável que o
problema esteja nos hambúrgueres.
Em certo sentido, portanto, o vilão médico é o testículo. Ao mesmo tempo,
entretanto, eles são a essência da masculinidade. Em se castrando um mamífero
macho antes da puberdade, ele se torna um animal muito diferente, menos
agressivo e, em geral, com relativamente mais gordura e menos músculos. Os
eunucos dos corais dos papas ou dos haréns dos sultões eram muito diferentes
dos homens não mutilados, tendo a voz diferente e padrões de crescimento
também diferentes. (...) A genitália, portanto, é o centro biológico do homem.
145
Compreender esse resultado [progéria infantil] da seleção natural, aparentemente
perverso, requer um entendimento do que ela visa a fazer. A seleção natural não
age no sentido de melhorar a saúde de todo e qualquer organismo. Ao contrário,
age – quando muito – no sentido de aumentar a aptidão média dos membros da
população. Isso significa, em primeiro lugar, que alguns indivíduos podem ficar mal
servidos. Significa também, em segundo lugar, que o foco é a aptidão, não a
saúde do corpo como um todo.
150
O sistema imunológico dos vertebrados funciona de acordo com o darwinismo. Ele
produz ao acaso proteínas de reconhecimento, e depois continua a produzir
aquelas que se ajustam à molécula estranha, ou “antígeno”.
151
Até 100 milhões de candidatas a moléculas de proteínas podem ser produzidos por
um sistema imunológico humano, embora apenas algumas delas se ajustem
suficientemente bem ao antígeno para tornarem a ser usadas.
154
Há vários dados elementares a compreender em matéria de envelhecimento. O
primeiro é que nem todas as coisas vivas envelhecem. É provável que as bactérias
nunca o façam. Alguns tipos de grama e arbusto, como o zimbro, não parecem
envelhecer. Até mesmo algumas anêmonas marinhas, que são animais
multicelulares, não envelhecem. Simplesmente crescem e se dividem, desde que
as condições sejam adequadas. Os animais que não envelhecem também podem
morrer. Apenas não apresentam uma aceleração da taxa de mortalidade em
decorrência de uma deterioração fisiológica geral durante a idade adulta.
155
A seleção natural faz uma triagem criteriosa dos genes que têm efeitos nocivos
precoces, enquanto deixa que se acumulem as mutações e outros problemas
genéticos que só tenham efeitos em idade avançada. E é assim que envelhecemos,
porque a seleção natural é a fonte máxima de nossa saúde.
Se o envelhecimento tem uma origem tão simples quanto a inexistência da seleção
natural em idade avançada, aumentar a força da seleção nessas faixas etárias
deve adia-lo. Isso é o que implica a teoria evolucionista. E é isso que se observa,
principalmente nos experimentos com a mosca das frutas de laboratório, a
Drosophila.
156
Forçar uma população a só se reproduzir em idade mais avançada obriga a seleção
natural a trabalhar mais em todas as faixas etárias, antes do início retardado da
reprodução. Isso faz com que a evolução fique atenta aos problemas genéticos do
envelhecimento. (...) Quando esse regime de adiamento da primeira reprodução é
mantido numa população inteira por umas 10 gerações ou mais, a população
geneticamente variável consegue desenvolver um período de vida mais longo e
uma saúde melhor em faixas etárias mais avançadas.
(...) seria muito lento e muito antiético moldar a evolução humana de maneira a
retardar seletivamente o envelhecimento humano. Um dos requisitos consistiria em
tornar ilegal a reprodução dos adolescentes ou das pessoas na faixa dos 20 anos.
Uma vez que isso não é viável, é preciso descobrir meios de intervir no
envelhecimento humano sem interferir na evolução humana.
157
(...) suposição generalizada de que a biologia molecular e a bioquímica fornecem
as bases necessárias e suficientes de toda a biologia.
158
Mas nossa origem darwiniana, infelizmente, não impede os pretensos Prometeus
modernos de terem sonhos de grandeza. Se a evolução é realmente a força
fundamental que nos cria, nos defini ou nos limita, a missão prometeica pode ser
reformulada como o esforço de controlar a direção da evolução. (...) Esse projeto
de dirigir deliberadamente a evolução humana tem um nome: eugenia. (A palavra
deriva de um termo grego que significa “de boa cepa”.)
[Fia uma anotação sobre pesquisar casais com mesma habilidade, músicos,
atletas, pintores etc. Talvez para ver se há uma transmissão do talento.]
161
Todos esses avanços tornaram possível a idéia de criar uma eugenia poderosa,
capaz de direcionar a futura autocriação do homem. Era um futuro em que nossa
espécie seria benignamente guiada por um grupo seleto de geneticistas e
evolucionistas, os Novos Prometeus.
164
(...) o foco principal da eugenia nos Estados Unidos foi a imigração,
particularmente a das “raças inferiores”. Calvin Coolidge, por exemplo, pontificou
que “a América deve continuar americana. As leis biológicas mostram que (...) os
nórdicos se deterioram quando se misturam com outras raças”.
165
Essa rejeição da raça pela biologia evolucionista não se baseia em nenhuma
ideologia convicta. O que se verifica é que é muito difícil definir raças na maioria
dos organismos. O problema é que, dentro das espécies, é típico as populações
locais apresentarem grandes variações, em vez de se conformarem a um tipo bem
definido, cada qual numa região especifica. Além disso, há tanto polimorfismo na
maioria das espécies sexiadas, que as populações locais variam entre si de
maneira sumamente complexa.
168
Qual é sua raça, se seu pai é um “negro” de tez clara e sua mãe é mexicanoirlandesa? Sua raça é a espécie humana, e essa é a situação essencial de todos
nós. Quase todo o resto é superficial, não passando da profundeza da pele.
170
O tratamento dos portadores de doenças genéticas é hoje o inverso das
recomendações eugênicas. Sob esse aspecto, o tratamento dos bebês com
fenilcetonúria é praticamente paradigmático. Nenhum medico respeitável proporia
matar os bebes portadores de PKU depois de eles saírem do ventre materno. Em
vez disso, as crianças são tratadas com dietas especiais, que lhes permitem evitar
o retardo mental grave.
171
Esperemos que o espectro demoníaco do darwinismo prometeico nunca volte a
nos assombrar.
182
No caso da evolução humana, felizmente, parece haver um consenso quanto a
dois alvos importantes da seleção: a “inteligência técnica” e a “inteligência social”
(a adaptação em questão permite ao individuo explorar melhor as ações dos
membros da mesma espécie ou sobrevier a elas, através do uso de
comportamentos aprendidos).
183
Na vasta maioria das espécies, existe apenas um punhado de técnicas de emprego
de utensílios e, em muitos desses casos, esse emprego é geneticamente
codificado, como na construção de ninhos ou abrigos pelos insetos sociais. Com
efeito, deixando de lado as construções e a tecnologia empregados pelos insetos
sociais, quase toda a utilização de instrumentos pelos animais tem um nível
baixíssimo de sofisticação.
184
Engels afirmou que a libertação das mãos, através da adoção da postura bípede,
levara ao domínio da natureza através do trabalho manual.
185
Existem vários campos em que a competição poderia operar. Primeiro, existem as
relações entre os sexos, nas quais machos e fêmeas negociam a criação de
oportunidades de acasalamento. Segundo, existe a competição intra-sexual dos
machos pelo acesso às fêmeas. A competição pelos recursos, como o alimento e o
território, fornece um terceiro contexto em que a inteligência social seria valiosa.
Claramente, todos os três são campos de importância geral para a maioria das
espécies animais.
196
Se não há nenhum componente genético no comportamento humano, por que
nosso comportamento difere do dos chimpanzés? Uma certa base genética do
comportamento humano é inevitável em qualquer teoria cientifica sensata.
199
Um fenômeno genético elementar consiste em que o endocruzamento, nas
espécies sexuais normalmente exogâmicas, leva à produção de descendentes
defeituosos. Chama-se a isso de “depressão do endocruzamento”. (...) A evitação
do incesto parece ser geneticamente determinada e não ensinada. [Esta é uma
afirmação absolutamente errada e originada nos preconceitos dos cientistas.
Recentemente a mídia divulgou um caso de irmãos que se conheceram adultos e
se apaixonaram e mesmo depois de descobrirem que eram irmãos continuaram a
viver como casados e, inclusive, reivindicaram o direito de ter filhos. E Édipo e
Jocasta não constituem historia fantasiosa ou absurda, ela serve para reprimir o
incesto.]
201
“A sociobiologia morreu, viva a psicologia evolucionista!” Se a sociobiologia foi a
ingênua tentativa de E. O. Wilson de unificar todas as ciências biológicas e sociais,
a psicologia evolucionista é sua herdeira. (...) ela tem sido muito mais sofisticada
do que a sociobiologia.
204
A programação do comportamento não é imanente na maioria das espécies. Mas,
numa espécie dotada de cálculos neurais abertos, a programação do
comportamento é predominantemente imanente, e não genética. [????]
(...) há um aspecto de unificação no processo mental. Em certo sentido,
poderíamos descrever isso dizendo que os membros dessa espécie têm “uma
mente”. Os cálculos que moldam o comportamento passam por uma liberação
central, em vez de haver mecanismos individuais, desencadeados por estímulos
específicos, de maneira geneticamente canalizada.
205
(...) é possível explicar a extraordinária flexibilidade do comportamento humano,
sobretudo a facilidade com que milhões de pessoas são capazes de modificar seu
comportamento em apenas 2 ou 3 anos [????]. Portanto, aceitar o darwinismo
como base do comportamento humano não exige que se aceite o reducionismo
suavizado da psicologia evolucionista. Existe uma alternativa: o darwinismo
imanente.
207
O grupo dos sociopatas, quando testado, tem um perfil psicológico singular,
atingindo altos níveis de “desvio psicopático” e índices de “esquizofrenia” e
hipomania”. Estimou-se que os indivíduos desse tipo cometam aproximadamente
metade de todos os crimes, muito embora representem apenas 1% a 2% da
população geral.
215
Uma das questões de fundo para as teorias da natureza humana é a natureza dos
valores humanos. Que desejam os seres humanos? Que evitam eles? Essa é uma
pergunta à qual as duas principais teorias darwinianas sobre a natureza humana
dão respostas interessantes.
A evolução biológica criou a maquina darwiniana do lobo frontal, mas, hoje em dia,
a evolução genética tem pouco papel direto na moldagem do comportamento
humano.
A psicologia evolucionista presume que o comportamento humano é movido por
uma grande coleção de mecanismos comportamentais específicos, cada um dos
quais é produto da seleção natural.
222
Segundo o modelo da psicologia evolucionista, os seres humanos estão presos a
padrões comportamentais estereotipados, que foram estabelecidos pela evolução
genética decorrente da seleção natural. É de se esperar que falte a esses
organismos a capacidade de responder a certos tipos de mudança ambiental.
Assim, como produtores, eles só conseguirão passar de um produto para outro
com dificuldade. Como consumidores, demorarão a perceber o valor relativo dos
diferentes produtos. Como intermediários, raramente perceberão as novas
combinações de circunstancias econômicas vantajosas.
224
No cerne do Leviatã hobbesiano está o medo da anarquia. A Reforma havia
desencadeado várias guerras religiosas na Europa, algumas delas de crueldade
aterradora. (...) Bebês eram assados em espetos para consumo popular. (...) Essas
pessoas não apenas desconheciam o cristianismo, como também, muitas vezes,
andavam nuas ou seminuas, eram desregradas, canibalescas e francamente
promíscuas. A conclusão de gente como Hobbes foi que o homem era bestial e
abominável, quando ficava entregue a seus próprios recursos.
O problema, portanto, era como salvar a humanidade dela mesma. A solução
lógica para os temerosos era a criação de um poder civil, o Leviatã, sob a forma de
um Grande Príncipe. O povo teria que dar a essa autoridade um poder supremo,
para que pudesse ser salvo de suas próprias tendências para a maldade e a
desordem. Para Hobbes, essa era a lógica fundamental do Estado.
225
Mas a biologia subjacente ao pensamento autoritário merece uma certa atenção.
Esse modelo tem o pressuposto implícito de que os seres humanos são
intrinsecamente inclinados a se comportar de maneira a um tempo destrutiva e
egoísta. Segundo o modelo autoritário, só o investimento num Estado dotado de
grandes poderes é capaz de evitar a anarquia.
A falha central do pensamento autoritário está em ele imaginar que o
comportamento controlado é obra do Estado forte. (...) [mas] existe um tipo
humano que se adusta aos mitos do conservadorismo – o sociopata. Os sociopatas
realmente não se importam com as convenções, a moral, a lei, a propriedade ou a
decência humana, a menos que sejam estritamente vigiados. (...) Muitas vezes, os
policiais parecem desenvolver um modelo hobbesiano da natureza humana, o que
talvez decorra de seu contato freqüente com sociopatas. (...) [mas] a vasta
maioria da espécie obedece naturalmente às leis e costumes locais, mesmo na
ausência visível de algo que se aproxime de um Estado invasivo.
228
Por último, Spencer sobrecarregou o darwinismo com uma expressão infeliz e, a
rigor, enganosa: a “sobrevivência dos mais aptos”. (...) Afinal, segundo se dizia, se
Darwin havia mostrado que, na natureza, a competição levava à sobrevivência dos
mais aptos e ao aprimoramento das formas de vida, é claro que essa mesma
doutrina deveria ser utilizada nas políticas de governo referentes aos pobres, ao
salário mínimo, às pensões e assim por diante.
230
Poucos mitos são mais atraentes do que o celebre mito difundido por Jean-Jacques
Rousseau: o de que os seres humanos são naturalmente bons e generosos. (...) O
Bom Selvagem é um mito agradável. Ele diz que o ser humano natural é um bom
ser humano. O natural é bom, o civilizado é ruim. (...) A inocência não é apenas
um pressuposto, é uma conclusão determinada.
Em termos psiquiátricos, em vez de ser paranóica, a visão de Rousseau é maníaca.
Presume-se uma tendência reprimida para a benignidade universal, tendência esta
que requer a destruição da ordem estabelecida para permitir a transformação da
sociedade numa forma nova e apropriada. Essa é a ideologia da revolução.
231
O socialismo poderia ser compatível com o sistema da psicologia evolucionista. É
central nessa suposição que o modelo da psicologia evolucionista é basicamente
um modelo animal. Ele enuncia a hipótese de que os seres humanos se
conformam a padrões comportamentais ótimos específicos, dotados de uma base
genética.
233
A ideologia é algo que está sempre renascendo, ou, pelo menos, recebendo uma
nova embalagem. (...) O bom comportamento humano não precisa de um Estado
policialesco.
(...) qualquer ideologia parece propensa a fracassar. Em pouco tempo, essas
criaturas se transformariam em pragas, senão em cupins, no edifício do Estado
ideológico. Sendo assim, nas palavras de Sting, “There’s no political solution / To
our troubled evolution”.
234
Tal como as ideologias, as religiões são singularmente imunes à experimentação e
à comprovação. (...) A religião interessa-se, em ultima instancia, pela autoridade e
pela fé, e não pela duvida e pelo conhecimento.
237
[quando as coisas saem errado] um cientista criacionista poderá dizer,
simplesmente, que Deus deve ter interferido (...). A alternativa, que um não-
criacionista seria obrigado a abraçar, seria admitir que a teoria original estava
errada.
238
O Deus ad física é o Deus que aciona a maquinaria do universo, mas não faz com
que o rosto de determinado santo apareça no bolor do pão. Trata-se de um Deus
remoto, um Deus distante. Não é um Deus que precise ser cultuado. Ao contrário,
é um Deus que mal chega a ser vislumbrado, enquanto não se obtém um grau de
doutor em física. Às vezes, esse Deus da física parece ser pouco mais do que o
próprio universo.
240
E há o problema adicional do sucesso dos evangelistas da televisão. Que têm eles
a vender que as pessoas se dispõem a comprar? Deve haver algum tipo elementar
de prazer que se obtenha, assistindo a horas de declarações fervorosas.
244
E, para os que desejam conhecer e compreender a longa historia da vida na Terra,
o darwinismo é o grande farol na escuridão. Para o mundo moderno, seguir sem o
Espectro de Darwin seria extraviar-se num ocaso do pensamento.
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