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O CARSTE. PRODUTO DE UMA EVOLUÇÃO OU PROCESSO? EVOLUÇÃO DE
UM CONCEITO
Rubens Hardt1e2; Joël Rodet2; Sergio dos Anjos Ferreira Pinto1.
RESUMO
Estudando o processo de carstificação no arenito, depara-se com o problema da definição do
que é ou não “carste”, e como se chegou ao paradigma atual. O levantamento de bibliografia
conduziu a um entendimento de uma evolução do conceito “carste” ligada a três grandes
etapas de aproximação ou de integração deste conceito no contexto da geomorfologia global.
As três etapas definidas tratam, em um primeiro momento, do levantamento das formas
superficiais, no contexto da geomorfologia germânica, do final do século XIX até a primeira
metade do século XX, num segundo momento, da difusão da exploração espeleológica,
sobretudo depois da segunda guerra mundial, que conduz os estudos da carstologia para o
interior das cavernas, enfocando o endocarste. Mais recentemente, a carstologia passa a
integrar os ambientes subterrâneos não acessíveis ao homem, bem como a evolução do relevo
dentro da perspectiva global de sistema geomorfológico, realizando assim uma terceira fase
de evolução do conceito. Estas três fases foram pontuadas por alguns trabalhos específicos
que ilustram esta evolução.
Palavras-Chave: Evolução conceitual do carste, exocarste, endocarste, sistema
geomorfológico.
ABSTRACT
Working on the problem of karstification in the sandstone, the problem of defining what is or
is not “karst”, and how it evoluted to current paradigm, has appeared. The bibliographical
research led to an understanding of the evolution of the concept of "karst" linked to three
main stages of integration of this concept in the context of global geomorphology. The three
stages begin with the study of the surface forms in the context of Germanic geomorphology,
from the late nineteenth century to the first half of the twentieth century. The second period,
based on the diffusion of speleological exploration, especially after the Second World War,
conducts the karst studies into the caves, focusing on endokarst. More recently, during the
third period of the evolution of this concept, the study of karst includes the underground
environments not accessible to humans, and the evolution of the relief into the global
perspective of geomorphological system. These three phases were punctuated by some
specific works that illustrate this conceptual evolution.
Key Words: Conceptual evolution of karst, exokarst, endokarst, geomorphological system.
INTRODUÇÃO
A problemática do carste é complexa, e uma série de termos imprecisos é utilizados,
com definições pouco claras ou baseados não em processos, mas em descrições, que muitas
vezes reportam a rocha encaixante, sem levar em consideração a possibilidade de ocorrências
1
Universidade Estadual Paulista – UNESP, Campus de Rio Claro, SP. [email protected];
[email protected]
2
UMR/CNRS – 6143, Laboratoire de Géologie de l'Université de Rouen, France.
[email protected];
110
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em outras rochas, ou estudar o processo de formação, ao invés de simplesmente propor
definições baseadas em observações descritivas.
Resultado desta complexidade e imprecisão, o conceito de carste está em plena
mudança, com os avanços da ciência no campo da carstologia, em especial a melhor
compreensão dos processos que dão origem às formas, e a relação do produto destes
processos com o sistema geomorfológico em que o carste se encontra inserido.
Assim sendo, o carste não é um relevo isolado, com uma “fronteira” espacial definida,
limitando um terreno cárstico de um não cárstico. Existe uma gradação e uma inter-relação, e
mesmo, uma mescla de formas de relevos que colocam o carste como apenas um dos
componentes de evolução de uma paisagem.
O que identifica um relevo cárstico é um conjunto de formas de relevo distintas,
estudado cientificamente pela primeira vez na região de Kras, nos limites da Eslovênia com a
Itália, onde tal relevo é denominado carso, incluindo ainda porções da Áustria e Croácia
atuais. A palavra eslovena kras, deu origem nas línguas germânicas à palavra karst, nome
pelo qual é conhecida a região, e nome que acabou definindo o tipo de relevo mundialmente
(Sweeting, 1972; Ford e Williams, 1989; 2007). A predominância do termo germânico sobre
o termo de origem eslava ou italiana se explica pelo fato histórico de que, quando dos
primeiros estudos científicos da região, esta se encontrava sob o domínio do Império Austrohúngaro. Como resultado, as pesquisas iniciais foram publicadas em língua germânica, e por
esta razão, o nome germânico predominou e é utilizado até hoje.
Os primeiros estudos estabeleceram o padrão da “carstificação” para algumas décadas.
Somente depois da segunda guerra mundial, a exploração espeleológica intensa aportou uma
grande quantidade de novos dados resultando na conceitualização do endocarste.
A partir dos anos 1980, foram integradas estas várias dimensões dentro de um
conjunto único, resultando em um paradigma do carste, integrado dentro do conceito de
sistema geomorfológico.
Neste trabalho, objetiva-se apresentar uma rápida síntese da evolução da carstologia,
associada a três momentos históricos distintos, e refletir sobre o que é ou deixa de ser carste,
sob a luz da geomorfologia atual.
O NASCIMENTO DA CARSTOLOGIA
A carstologia surge, enquanto ciência, a partir dos trabalhos do sérvio Jovan Cvijic
(1865-1927), nascido e criado em meio à região de Kras. Enquanto estudante em Belgrado
desenvolve suas pesquisas sobre o tema. Tendo se dirigido a Viena para concluir seus estudos,
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tem por mestres A. Penck e E. Suess, e conclui então seus estudos com a obra “Das
Karstphänomen” (1893) primeira obra científica sobre as formas de relevo do carste.
Seu enfoque, geográfico por natureza, envolveu a descrição detalhada das formas de
superfície, culminando com a obra póstuma (Cvijic, 1960), onde estabelece as bases da
ciência do carste.
Para Cvijic (1960), o carste ocorre em regiões calcárias ou de rochas análogas,
compostas por uma proporção maior ou menor de carbonato de cálcio, como a dolomita,
calcário margoso, marga, conglomerados e arenitos com elementos e cimento carbonático,
tornando-as, por consequência, solúveis em água, sobretudo em água contendo ácido
carbônico, ressaltando que a maior ou menor fissuração da rocha, permite a penetração da
água em meio a esta promovendo a dissolução em profundidade.
Estas duas características, solubilidade e permeabilidade permitiriam distinguir, no
calcário, as características que caracterizam um relevo cárstico em relação ao relevo
desenvolvido em outras superfícies rochosas (Cvijic, 1960).
A ampla descrição de formas cársticas, e a associação da origem destas formas com o
processo de dissolução da rocha, estabelecem então as bases da carstologia.
Paralelamente, Edouard-Alfred Martel desenvolve a exploração das cavernas na
Europa, dando início a pesquisa do endocarste. Sua principal contribuição é demonstrar que,
nas cavernas, a circulação das águas se dá de forma rápida, concentrada, não se tratando de
uma circulação do tipo “lençol”.
Segundo Lowe (2000), dois modelos de evolução do carste, com contribuições de
diversos autores começaram a evoluir. O primeiro, defendido por Gründ em 1903, mostrava
que os aquíferos cársticos podiam ser divididos em duas zonas, acima e abaixo do nível
freático. Na zona inferior, a água estaria estagnada, enquanto na zona superior, estaria em
movimento pelos condutos de cavernas. A ideia equivocada de que a água abaixo do nível
freático estaria estagnada persistiu na mente de vários pesquisadores subsequentes, que
defendiam o mesmo ponto de vista. O segundo modelo, defendido por Katzer em 1909,
(também proposto por Martel, que viria a consolidar em sua obra de 1921), era que não havia
nível freático e toda a água existente no carste corria por condutos e fissuras até ressurgir em
um vale abaixo.
Em 1918 Cvijic publicou um trabalho em que defendia a existência de três zonas
hídricas em terrenos cársticos, a zona seca, a zona de transição e a zona saturada, sendo que a
zona de transição seria aquela onde a maior parte do movimento da água subterrânea
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ocorreria, e que, portanto, deveria ser o foco das atenções no estudo do desenvolvimento das
cavernas (Lowe, 2000).
É preciso situar os trabalhos de Cvijic nas circunstâncias da época. Ao fim do século
XIX, dois conceitos opostos estão em debate. De um lado, existem os que suportam a ideia de
um subsolo completamente alagado que pode ser identificado pelo título de “gründwasser”
(Gründ, 1903); de outro, aqueles que creem na circulação concentrada em drenagens típicas
do carste, proposto por E.-A. Martel (1921). O único domínio em que havia unanimidade era
sobre o desenvolvimento das formas de superfície ou exocarste, devido, principalmente, pela
facilidade de acesso, pois seu estudo é muito mais acessível que o das galerias subterrâneas. É
neste contexto de divergências que o trabalho de Cvijic vem demonstrar que a situação é
complexa e que cada situação específica e localizada privilegia um tipo de drenagem
subterrânea ou outra, sem excluir casos em que ocorre a mescla dos dois tipos. Ter
compreendido a complexidade dos fenômenos cársticos é, certamente, a grande contribuição
de Cvijic para a carstologia, fazendo com que, após tantos anos, seja considerado um
pesquisador avante de seu tempo.
Nesta época predominam grandes estudos sobre as formas superficiais, ou exocarste,
onde a terminologia de origem eslava disputa a predominância com os termos
geomorfológicos de origem germânica. Deve-se a esta época as definições de kamenitza, de
polje, de dolina, de uvala, de ponor, incorporados à geomorfologia como terminologia
específica do relevo cárstico.
A PERCEPÇÃO DA IMPORTÂNCIA DO ENDOCARSTE
Martel foi o precursor das pesquisas do carste a partir do interior das cavernas, mas o
desenvolvimento das ideias sobre a importância do endocarste ganha força a partir da segunda
metade do século XX, onde os trabalhos de Alfred Bögli (1980) são a síntese do período.
Talvez se possa concluir a primeira fase com o tratado “Karst landsforms” de
Sweeting (1973), enquanto que o trabalho de Bögli surge como o precursor de uma nova
aproximação que privilegia o endocarste, em especial a compreensão da hidrologia do carste
no subterrâneo, como dependente das condições hidrostáticas e hidrodinâmicas, que
determinam o comportamento do fluxo.
Com base no trabalho de diversos autores, Bögli (1980) descreve o comportamento
físico das águas no carste, descrevendo a origem destas águas como provenientes de
precipitação sobre os calcários, da água existente no solo, por fluxos que chegam a zona
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cárstica advindos de outros terrenos e pela água de condensação. Também desenvolve
técnicas de traçagem para pesquisa de fluxos subterrâneos não acessíveis ao homem.
É também o período de atuação de um grande carstólogo francês, Philippe Renault
(1967-1968), que é o primeiro a introduzir, nos estudos do carste, a dimensão do
comportamento mecânico da rocha encaixante e da morfodinâmica, introduzindo os conceitos
de paragênese e singênese. A dimensão endocárstica conhece, então, uma renovação com a
tomada em conta da dimensão hidrogeológica e a introdução da ideia de que as cavidades
fazem parte de um conjunto maior denominado “rede”. É o que motiva os espeleólogos a
procurarem
conexões
de
sistemas
próximos,
levando
a
descoberta
do
enorme
desenvolvimento de algumas cavidades subterrâneas, em função destas conexões, enquanto
objetivo principal dos espeleólogos. Assim, a incrível rede de “Mammouth Cave” (Kentuky,
EUA), que supera os 500 km de galerias topografadas com as conexões descobertas com
cavernas próximas. Mesmo os abismos mais profundos, ultrapassando o quilômetro de
desnível, são pouco a pouco integrados em conjuntos complexos (Rede da “Pierre Saint
Martin”, França-Espanha). Esta última contribuição anuncia a terceira etapa, a concepção de
um carste integrado à evolução geomorfológica. É a época, também, de estudos no limite do
carste “clássico” (calcário), com as pesquisas na greda (Rodet, 1981), rocha na qual a
porosidade representava, para os pesquisadores clássicos, um obstáculo para a carstificação.
O
PARADIGMA
DE
UM
CARSTE
INTEGRADO
NA
EVOLUÇÃO
GEOMORFOLÓGICA
A grande mudança na aproximação do conceito de carste proveio da integração da
dimensão específica deste com o contexto geomorfológico. Os carstólogos descobriram, com
a aproximação sistêmica, que o carste é um elemento de um conjunto, e que sua integração
com uma aproximação mais global lhe deu uma dimensão insuspeita. É o senso das grandes
sínteses da escola francesa dos anos 1980-1990, com os trabalhos de livre-docência de Maire
(1990), Rodet (1991), e Delannoy (1997), bem como dos grandes tratados de língua inglesa
(Klimchouk et al., 2000; Gunn, 2004; Ford & Williams, 2007; Palmer, 2007).
A segunda grande mudança deste último período é a tomada de consciência de
morfologias típicas do carste em litologias que não haviam sido consideradas como suporte
para formas cársticas. Os pioneiros desta nova aproximação são Renault (1953), Mainguet
(1972) e Marescaux (1973), trabalhando na África, especialmente em rochas areníticas. Em
língua inglesa, Jennings (1983) destaca que, definir carste em função da litologia é arbitrário,
e que carste deve ser definido “em termos de processo, dissolução, a qual é entendida como
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crítica (mas não necessariamente dominante) no desenvolvimento das formas de relevo e
drenagens características do carste”. Têm-se também os trabalhos de Young (1986; 1987 e
1988), que discute carste em arenito na Austrália; Urbani (1986, 1990), sobre o carste nos
Tepuy Venezuelanos; Young e Young (1992), que discorrem sobre os relevos em arenito,
inclusive o carste; Doerr (1999), que também trabalha sobre os quartzitos venezuelanos; Wray
(1997a; 1997b; 2009), que discute sobre a natureza do carste em rochas não carbonáticas; Self
e Mullan (2005), que apresentam exemplos de carste em arenito na Inglaterra, e Turkington e
Paradise (2005), que apresenta uma revisão sobre o intemperismo no arenito, incluindo a
dissolução química, com descrições das diversas hipóteses, escalas de atuação de processos, e
uma expressiva lista de artigos revisados. Enfim, ressalta-se a tese de Willems (2000) que
demonstra a origem cárstica de diversas formas em substratos tão diversos quanto o arenito, o
quartzito, o granito ou o gnaisse. Estes trabalhos conhecem um sucesso importante na
Venezuela, com as grutas de grandes dimensões encontradas nos Tepuys do sul do país (com
até 10 km de desenvolvimento), e no Brasil, com descobertas excepcionais como os abismos
da Serra do Caraça (quartzito, MG), com quase 500m de desnível e mais de 3.000m de
desenvolvimento, ou o Abismo Guy-Collet (Serra da Aracá, AM), o mais profundo do mundo
no quartzito, com 670m de desnível.
A título de comparação, algumas formas cársticas em rochas carbonáticas e não
carbonáticas são apresentadas na Figura 1 (exocarste) e Figura 2 (endocarste).
Hoje, as pesquisas sobre o carste se multiplicam no território brasileiro e
interessa a quase todos os estados. Em termos nacionais, encontramos referências diversas,
como o trabalho de Wernick et al. (1973), Troppmair e Tavares (1984), Martins (1985),
Karmann (1986), Veríssimo e Spoladore (1994), Correa Neto e Batista Filho (1997), Correa
Neto (2000), Monteiro e Ribeiro (2001), Hardt (2003), Auler (2004), Silva (2004), Spoladore
(2006), Willems et al. (2004, 2008), Uagoda et al. (2006), Hardt e Pinto (2008), Hardt (2009),
Morais (2009), Rodet et al. (2009), Hardt et al. (2009), entre muitos outros, principalmente a
partir de 2000. Nos mais antigos, os autores evitam falar em carste, restringindo-se a avaliar
os elementos encontrados e sua influência na formação das cavidades e formas. Nos mais
recentes, o termo carste é adotado com frequência, mostrando já uma mudança de
posicionamento.
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Figura 1: Exemplos de formas cársticas em arenitos (coluna da esquerda) e em calcário (direita). De
cima para baixo: Dolina na Serra de Itaqueri – SP e Iraquara (BA); kamenitza na Chapada dos
Guimarães (MT) e em Jequitaí (MG); lapiás na Chapada dos Guimarães (MT) e nos Alpes (França).
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Figura 2: Endocarste em rochas não carbonáticas (esquerda) e em carbonatos (direita). De cima para
baixo: conduto em quartzito, Ibitipoca (MG) e em calcário, Jequitaí (MG); cúpula de dissolução em
arenito, Chapada dos Guimarães (MT) e em calcário Pré-Rouge, Alpes (França).
Pode-se ainda citar algumas ocorrências importantes em rochas não carbonáticas,
como o Piauí, com a Toca das Confusões (arenito, 1600m), o Mato Grosso, com as cavidades
da Chapada dos Guimarães (arenito, 1500m), Goiás, com a gruta dos Ecos (xisto, 1300m),
Bahia, com os rios subterrâneos da Chapada Diamantina (quartzito, 3.500m), ou os alvéolos
gigantes nos batólitos graníticos da região de Milagres-Itatim, Pará, com as cavernas de
Altamira (arenito, 1.300m), São Paulo, com as cavernas de Altinópolis (arenito, 700m), Minas
Gerais, com as cavernas de Ibitipoca (quartzito, 3.700m), Diamantina (quartzito, mais de
600m), etc.
O CARSTE É O RESULTADO DE UMA EVOLUÇÃO OU UM PROCESSO
ESPECÍFICO?
A noção de carste evoluiu bastante depois de sua criação enquanto ciência há um
pouco mais de um século. Tal provém de sua dualidade específica, a saber, a existência de
formas de superfície, mas, sobretudo de vias subterrâneas algumas vezes delicadas de se
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explorar. É a evolução do conhecimento ligado a exploração do endocarste que é o principal
responsável desta evolução. Embora não se desvalorize o conhecimento adquirido, é a
integração dos elementos do endocarste no contexto geomorfológico sistêmico que permite
uma compreensão mais fina dos processos que caracterizam o carste.
No entanto, o carste nos apresenta uma grande questão: É o carste resultado de uma
evolução ou o carste é um processo específico? No primeiro caso, o carste pode ser concebido
como uma expressão paisagística de um substrato específico, a saber, rochas carbonáticas, o
que implica em uma denominação distinta para formas análogas em outro substrato rochoso.
No segundo caso, se o carste é um processo específico, o que importa o substrato? E,
portanto, será lógico atribuir a mesma denominação ao processo, qualquer que seja o
substrato. O que não se pode aceitar mais é simplesmente atribuir um termo genérico e pouco
claro a uma área, denominando-a pseudo-carste, simplesmente porque não se trata de calcário.
Por outro lado, não é porque existem formas que se assemelham ao carste em uma
determinada área que é necessariamente carste. O equilíbrio tem de ser encontrado, e a
definição, se uma determinada área é ou não carste, deve ser feita após estudos do relevo e
processos que atuam ou atuaram na mesma. Como bem expressou Glazek (2006): “Se a
ciência que estuda o carste é razoavelmente denominada “carstologia”, não podemos aceitar
uma ciência pseudo-carstologia”.
Independente da importância do carste brasileiro, em especial nas ocorrências em
rochas não carbonáticas, o Brasil sofre hoje com a ausência de especialistas neste domínio,
especialmente no meio acadêmico, dependendo, principalmente, da presença de pesquisadores
estrangeiros, inclusive para a formação de eventuais pesquisadores brasileiros.
AGRADECIMENTOS
Rubens Hardt agradece a CAPES, através do Programa de Doutorado com Estágio no
Exterior – PDEE, pela oportunidade de realizar estudos na Université de Rouen, Laboratoire
de Géologie, UMR-6143, França, no quadro de uma co-tutela, que permitiu a elaboração
deste trabalho.
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