ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING (ESPM-SP) GRADUAÇÃO EM COMUNICAÇÃO SOCIAL COM ÊNFASE EM PUBLICIDADE E PROPAGANDA LUIZ OTÁVIO ROCHA CRUZ ISLANDS IN THE STREAMING: Um estudo do panorama sociocultural de novas práticas de consumo fonográfico SÃO PAULO 1 / 2015 AGRADECIMENTOS Agradecerei sempre em primeiro lugar aos meus pais por serem meu alicerce em qualquer decisão de minha vida, por todas as oportunidades, pela qualidade de ensino que me proporcionaram, pelas palavras de apoio, por todo o amor e carinho e também pelos momentos de discordância. Por me fazerem a pessoa que sou hoje. Pelos ensinamentos que levarei para a vida inteira. Por me apoiarem em todos os meus sonhos, apostarem em meu sucesso e priorizarem minha felicidade. Agradeço a todos os meus colegas e as pessoas incríveis que conheci nesta caminhada acadêmica. Aos mestres, chefes, colegas de trabalho, todos, pela compreensão e apoio, em especial à Júlia, por toda a sensibilidade nos momentos difíceis, pelo suporte e por não ter desistido de nós. Agradeço aos velhos amigos pela confiança e por entenderem o processo no qual estive inserido durante a realização deste trabalho. Não posso deixar de agradecer à minha orientadora Gisela Castro, primeiro por se dispor a orientar mais um trabalho de conclusão de curso, por se interessar pelo meu tema e por acreditar em meu potencial mesmo com tantas tensões, desânimos e momentos de cabeça-dura. Por ter estudado tanto este tema. Agradeço ao Rafael Ofemann, mestrando do PPGCOM ESPM que conheci durante a realização deste trabalho e que, em seu papel de monitor deste PGE, se tornou peça indispensável para o desenvolvimento e sustentação dele. Agradeço eternamente aos dois por todos os puxões de orelha e por me direcionarem no caminho certo a cada orientação. CRUZ, Luiz Otávio Rocha. Islands in the Streaming: Um estudo do panorama sociocultural de novas práticas de consumo fonográfico. São Paulo: Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM-SP), 2015, 51. RESUMO Com o objetivo de entender a relação entre as práticas de consumo fonográfico da sociedade e as novas tecnologias das quais se apropria, bem como possíveis tendências mercadológicas e culturais resultantes dessas práticas, este estudo concentra-se num diálogo entre a música e seu consumo a partir da virada do século XXI, com a popularização dos meios digitais e das possibilidades que oferecem para o tema em questão. Por volta de 2005, um formato que passa a ser amplamente utilizado para o consumo de entretenimento digital é o streaming, que apresenta algumas propriedades, inclusive não-digitais, que o diferenciam do download comum. Consideramos também a relação entre música e valor, e as inúmeras tentativas da indústria de controlar os meios de distribuição fonográficos, bem como sua resistência às novas práticas do consumidor. Para estudar este fenômeno, apoiamo-nos principalmente numa extensa pesquisa bibliográfica de diversos artigos acadêmicos recentes – devido à natureza atual do tema – que, dentre outros objetivos, também buscam entender melhor a relação entre o streaming, música no universo digital e o consumidor. Nossa pesquisa bibliográfica incorpora autores como Edgar Morin, Douglas Kellner, Piérre Levy e Theodor Adorno. Incorporamos também uma pesquisa documental que reúne dados secundários relativos ao mercado e a hábitos de consumo fonográfico como relatórios anuais. Por fim, baseamo-nos numa pesquisa descritiva quantitativa em forma de questionário desenvolvida e aplicada via internet. PALAVRAS-CHAVE: comunicação; consumo musical; streaming; cibercultura. ABSTRACT With the objective of understanding the relation between music consumption habits on society and the new available technologies they relate to, as well as probable market and cultural tendencies resulting of those practices, this paper focuses on a dialogue between music and its consumption since the arrival of the new 21st century, considering the spread of the digital universe and the possibilities they can offer to the theme. Around 2005, society is presented with an interesting format to the consumption of digital entertainment: streaming, a technology that presents some properties, including non-digital ones, which differ from standard download. To study this phenomenon, this paper is based especially on an extended bibliographic research of many recent academic papers – because of the modern nature of the theme – that, despite other objectives, aim to better understand the relation between streaming, music in the digital world and the consumer. Our bibliographic research contains materials from authors such as Edgar Morin, Douglas Kellner, Pierre Lévy and Theodor Adorno. This work also contains some documentary research with market and music consumer habits data like annual reports of the industry. Finally, this work is also based on a survey developed and applied by the group via internet. KEYWORDS: communication; music consumption; streaming; ciberculture. SUMÁRIO 1. 2. Introdução.......................................................................................................................... 11 1.1. Contextualização ........................................................................................................ 11 1.2. Objeto......................................................................................................................... 20 1.3. Problema .................................................................................................................... 20 1.4. Objetivo Geral ............................................................................................................ 20 1.5. Objetivos Específicos ................................................................................................ 20 1.6. Metodologia ............................................................................................................... 20 1.7. Quadro Referencial Teórico....................................................................................... 22 O Consumo como Fenômeno Cultural .............................................................................. 24 2.1. O Consumo Contemporâneo ...................................................................................... 24 2.2. Culturas de Mídia e de Massa .................................................................................... 29 2.3. A Comunicação em Rede........................................................................................... 32 3. Uma Análise Cultural do Consumo Fonográfico Contemporâneo ................................... 36 4. Considerações Finais ......................................................................................................... 45 5. Bibliografia........................................................................................................................ 48 LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Tela Inicial do Spotify - "Browse" .......................................................................... 10 Figura 2 - Distribuição de conhecimento e uso de serviços de streaming ................................ 40 Figura 3 – Distribuição de uso de serviços de streaming específicos ...................................... 41 Figura 4 – Distribuição de contribuição de serviços de streaming com conhecimento de novidades musicais ................................................................................................................... 41 Figura 5 – Distribuição de hábitos de conhecimento de novas músicas, artistas e/ou bandas . 42 Figura 6 – Distribuição da relação geral com playlists em serviços de streaming ................... 43 Figura 7 – Distribuição de hábitos de consumo após uso de serviço de streaming .................. 44 GLOSSÁRIO Aplicativo/App – termo que indica software (ver acima) geralmente otimizado para dispositivos móveis como tablets e smarthphones (ver ambos acima). Apple – para efeito deste trabalho, ao mencionarmos Apple estaremos nos referindo à empresa fabricante de eletrônicos americana Apple, Inc., com sede em Cupertino, na Califórnia. Apesar disso, julgamos interessante informar que, como mencionamos os Beatles, a banda inglesa havia criado um conglomerado de empresas de nome semelhante para, dentre outras funções, gerenciar seu catálogo musical, a Apple Corps Ltd. A semelhança de nome gerou muitos conflitos legais no período de 1978 a 2006 entre as empresas. Em 2007 a Apple Inc., de Steve Jobs, finalmente anunciou em um acordo que incorporaria alguns direitos da marca Apple Corps Ltd. Apple Music – software de streaming desenvolvido pela Apple como alternativa ao modelo transacional revolucionário da empresa, frente às preferências do consumidor. CD – Compact Disc – mídia digital de armazenamento de dados, surgida por volta de 1980 e apropriada como uma das alternativas digitais ao armazenamento analógico de música. Download – ato de transferir um arquivo de um servidor qualquer conectado à internet para uma unidade de armazenamento local (um disco rígido, por exemplo) do dispositivo em utilização. iPhone – modelo de smartphone desenvolvido e fabricado pela Apple. iPod – dispositivo fabricado pela Apple semelhante ao Walkman: possibilita a portabilidade de música. É interessante notar que os primeiros modelos suportavam apenas a inserção de arquivos sonoros no dispositivo por intermédio de um computador com iTunes, enquanto que as versões mais recentes suportam a compra ou o streaming de áudio diretamente do dispositivo com acesso à internet. ISP – Internet Service Provider – empresas provedoras de pacotes com acesso à internet, geralmente comercializados com acesso a linhas telefônicas. A Vivo, a GVT e a NET são exemplos de ISPs no Brasil. iTunes/iTunes Store – software desenvolvido pela Apple para gerenciamento, acesso e reprodução à biblioteca musical digital do usuário e aos seus dispositivos fabricados pela 7 empresa (ex. iPhone e iPod), além da navegação pela loja de músicas da empresa (iTunes Store) e mais recentemente acesso ao Apple Music. Long-play (LP), vinil ou disco de vinil – disco de PVC (policloreto de vinila) utilizado como primeiro formato fonográfico comercial, introduzido em 1948 e presente até os dias de hoje. O termo long-play na verdade diferencia uma das variações em tamanho e capacidade de armazenamento, mas é geralmente utilizado como sinônimo de disco de vinil. Mono, estéreo e quadrafônico – termos que indicam a quantidade de canais gravados numa canção ou álbum, em formato analógico ou digital. Uma gravação mono significa que possui apenas um canal em sua versão finalizada, uma faixa em estéreo dois e uma faixa quadrafônica quatro. São comuns em formatos digitais outros termos como 5.1 (que indicam que uma gravação possui 6 canais) dentre outros. MP3 – sigla para MPEG-2 Audio Layer III, um tipo de arquivo desenvolvido pela Moving Pictures Expert Group (MPEG) amplamente utilizado para a codificação de arquivos sonoros de tamanho pequeno para fácil armazenamento digital massivo. P2P – peer-to-peer (par a par), meio de download no qual o mesmo arquivo é constantemente enviado e baixado por vários usuários, o que geralmente contribui para melhores velocidades de transferência. Esta ferramenta é amplamente utilizada na pirataria online, ligando-se ao coletivo, anonimato e ao caráter democrático da internet. RPM – Rotations per minute – “rotações por minuto” – um dos atributos usados para diferenciar os modelos de discos de vinil, além do diâmetro, qualidade do som, duração e número de canais. Define o número de rotações completas realizadas pelo disco no fonógrafo no período de 60 segundos. Single – canção lançada comercialmente antes de álbum, que geralmente a incluirá, com a função de amostrar o novo lançamento. Smartphone – “celular inteligente” – aparelhos celulares com funcionalidades avançadas de conexão à internet, multimídia, entretenimento, produtividade e gerenciamento de dados. Termo surgido em meados da virada do século XXI, hoje pode ser interpretado como um celular comum, já que é o que atende, de modo mais básico possível, as necessidades mais comuns de comunicação do consumidor da época. Software – programa (sequência de instruções, códigos e comandos) de computador que realiza tarefas e funções específicas (com base em cálculos binários). 8 Sony Walkman ou Walkman – dispositivo de reprodução sonora a partir da leitura de fitas cassetes e conexão a um fone externo, lançado em 1979. Streaming – modo de acessar conteúdo digital hospedado na internet. Difere do download comum pois permite aproveitamento do conteúdo simultâneo à operação de download. Tablet – dispositivo móvel (portátil) entendido como um “smartphone ampliado” e geralmente sem a função de ligações a partir de chips (cartões SIM) e mais focados em outras funções como entretenimento e produtividade. Upload – ato de transferir um arquivo de uma unidade de armazenamento local para um servidor qualquer conectado à internet. 9 1 2 3 4 Figura 1 - Tela Inicial do Spotify - "Browse" Apresentamos uma imagem da interface gráfica do Spotify desktop para um melhor conhecimento do software. Esta é a tela inicial padrão do aplicativo. 1. Painel esquerdo – organiza verticalmente em categorias as funções do aplicativo. 2. Painel principal – apresenta a função ativa neste momento. No caso da imagem acima, é a tela inicial do aplicativo, “Browse”, onde o usuário pode acessar os lançamentos e os conteúdos de maior reprodução (filtráveis por diversas variáveis), além de playlists separadas por temas, gêneros ou moods (“climas”). A mensagem principal exibida abaixo das categorias horizontais no topo também se atualiza de acordo com o horário, dia da semana, datas comemorativas como feriados etc. Destaque especial para a categoria horizontal Discover, a última da esquerda para a direita, que é especialmente dedicada a recomendar algoritmicamente artistas, bandas e músicas ao usuário. 3. Painel direito – apresenta as funções sociais do aplicativo, comentadas a fundo no capítulo 3 do trabalho. 4. Reprodução – mostra a música, a arte e o nome do álbum e o artista em reprodução no momento, bem como o tempo da canção, a letra, acesso à lista de reprodução atual e funções básicas de reprodução como o shuffle (ativa a reprodução aleatória da lista em questão) e o repeat (ativa a repetição de uma faixa ou da lista inteira), além do volume da reprodução. 10 1. INTRODUÇÃO Cabe a esta seção contextualizar o cenário mercadológico e cultural da indústria fonográfica na sociedade da primeira quinzena no século XXI, bem como o momento da introdução do streaming, tecnologia na qual este estudo foca. Como sugere o subtítulo, apresentamos um panorama geral social, cultural e econômico, dialogando com autores que também se dedicaram a estudar o tema. Para isto, porém, julgamos necessário observar a evolução do mercado fonográfico nas últimas décadas bem como a adoção de diversas novas tecnologias e formatos pelas práticas do consumidor. O título deste trabalho, Islands In The Streaming, remete a uma canção hit1 de 1983 (por sua vez inspirada no romance homônimo de Ernest Hemingway) escrita e produzida pelo grupo pop Bee Gees2 e cantada em dueto pelos artistas country Kenny Rogers e Dolly Parton3. Apresentado em forma de trocadilho, o título explora as diversas possibilidades e desvantagens da tecnologia do streaming em atender as mutantes necessidades do consumidor de música do início do século XXI. 1.1. Contextualização A partir de sua introdução, em 1948, o long-play (LP)4 predominou no mercado fonográfico durante quase três décadas ininterruptas. O chamado “vinil” – substância utilizada na fabricação do disco – aparece para substituir a música gravada que era tocada nos rádios exclusivamente em horários específicos definidos pela grade daquela estação. Assim firma-se a indústria fonográfica, dedicada a gravar, produzir, gerenciar, distribuir e divulgar artistas e suas obras gravadas diretamente para o consumidor final (GOMES, FRANÇA e BARROS, 2015). O termo “fonográfica”, que usaremos extensivamente para nos referir a palavras relativas à música, deriva do aparelho desenvolvido para reproduzir os discos de vinil, o fonógrafo. Inventado em 1877, mais tarde conhecido como gramofone, era composto de uma agulha, que em contato 1 Um hit é uma canção que alcança notável sucesso comercial e rápida difusão junto ao público, geralmente pouco tempo após seu lançamento. 2 Os irmãos Barry, Robin e Maurice Gibb compunham os Bee Gees, grupo pop inglês que alcançou vários hits nas paradas das décadas de 60 e 70, principalmente por serem pioneiros no gênero disco da época incluindo em seu estilo harmonias vocais “em bloco” e falsetes inigualáveis. O falsete é uma técnica de canto que permite ao homem alcançar notas fora de seu registro de um modo não-convencional ou “falso”, daí o nome. Maurice faleceu em 2003, o que acarretou no fim do grupo. 3 Kenny Rogers e Dolly Parton são dois cantores americanos do gênero country que tiveram seu já existente sucesso comercial impulsionado pela parceria na década de 80 com o grupo Bee Gees, que resultou na canção Islands In The Stream. 4 Long-play ou LP é um tipo de disco de vinil com capacidade de armazenamento maior que outras. Ver glossário. 11 com as ranhuras do disco, traduzia a informação que ele continha em ondas sonoras, na forma de música. Com a variação 45 rpm5, um pouco menor em diâmetro que o padrão, os singles, termo inglês que se refere a uma ou duas canções lançadas antes do álbum como uma espécie de teaser ou amostra do todo – pois geralmente estariam presentes no álbum –, se tornaram a principal ferramenta promocional da indústria para apoiar lançamentos musicais. O período em que as vendas do setor alcançaram alta, devido à oferta cultural de novos atos, foi o pós-guerra. Nessa época, a música popular estava ligada à identificação do fenômeno sociológico do “adolescente”, ou seja, da década de 1950 até um pouco adiante, as pessoas por volta de 20 anos se tornaram o segmento de mercado mais importante para esse crescente negócio (LEYSHON, WEBB, et al., 2005). O maior exemplo do sucesso da música popular na época foram os Beatles6, que além de terem sido o grupo musical de maior influência nos costumes, atitudes, moda e na própria música daquele tempo, venderam mais de 600 milhões de discos no mundo, número que desconsidera, ainda, o mercado informal e a carreira solo de cada um dos integrantes. As alternativas para se consumir música neste período eram poucas: pela música ao vivo (em concertos ou shows), pelas rádios ou programas de televisão, ou pela compra, empréstimo ou escuta da música gravada comercializada em discos. As rádios seguiam grades de programação bem definidas e compunham o veículo de maior importância para divulgação de novos grupos. Já a última possuía fortes características sociais e coletivas: frente a ausência de tecnologias e dispositivos distrativos ou que priorizam o uso individual, que outrora contribuíram para um afastamento das relações sociais, as pessoas de fato se reuniam para trocar discos e informações ou até mesmo ouvir música em grupos (JONES, 2000) (BARTMANSKI e WOODWARD, 2015). Os discos de vinil se diferenciavam em diversos atributos: tamanho em diâmetro e consequentes rpm (quanto menor o diâmetro menor o número de rpms) e duração do disco, o número de canais de gravação e reprodução (mono, estéreo, quadrafônico etc. 7) e o nível de fidelidade do som à gravação original de estúdio. 5 Rotations per minute (rotações por minuto), ou rpm, são um dos atributos utilizados para diferenciar modelos de discos de vinil. Traduzem quantas rotações completas o disco realiza no espaço de tempo de 1 minuto (60 segundos). Logicamente, quanto menor o rpm, menor em diâmetro o disco. 6 Os Beatles, considerados por muitos a maior banda de todos os tempos, foram uma banda inglesa da cidade de Liverpool que mudaram o rumo da música popular e influenciaram hábitos da sociedade – principalmente no âmbito juvenil – daquela época. 7 Mono, estéreo e quadrafônico são expressões que identificam o número de canais de uma gravação. Ver glossário. 12 A sociedade manteve-se relativamente estável com este modelo de consumo fonográfico até meados da década de 70, quando nos deparamos com um cenário onde o consumidor busca meios de aproveitar sua música em outros lugares, desvinculado de um aparelho fonográfico antigo (em comparação às outras tecnologias que já haviam surgido) e de difícil transporte e manuseio (o fonógrafo). O Sony Walkman, introduzido em 1979, foi um dos primeiros dispositivos portáteis de reprodução sonora do mundo, possibilitando ao ouvinte, pela primeira vez, portabilidade às suas músicas favoritas. Contrário ao tamanho dos LPs de vinil, o Walkman funcionava reproduzindo fitas cassetes, formato popularizado por ele8. O fácil manuseio do cassete e um custo de fabricação bem menor, em contraste ao LP, auxiliaram no surgimento de dispositivos de cópia e gravação da mídia, contribuindo para as práticas de pirataria9 e de gravações domésticas: já era possível ao consumidor converter até mesmo LPs inteiros em fitas cassete (OOIJEN, 2011). Considerando um modelo que se manteve consistente por pelo menos dez anos, a indústria se afronta com a primeira queda significativa nas vendas. Os esforços comunicacionais da indústria para evitar a pirataria do consumidor foram, e ainda são, muitos. Dentre eles, destacamos a campanha Home Tape Is Killing Music, criada na década de 80 pela British Phonographic Industry (BPI, “Indústria Fonográfica Britânica”). A campanha, com ícones10 hoje satirizados pelos meios que apoiam a pirataria e o compartilhamento P2P11, carrega um discurso utilizado até hoje pela indústria para evitar a atividade dentre os consumidores. As grandes gravadoras tentaram de diversos modos comunicar ao consumidor que o original é “melhor” ou “mais confiável” que a cópia sendo que na verdade, ela é muitas vezes idêntica ao original – salvas exceções onde os arquivos sofrem algum tipo de manipulação ou infecção por vírus com o intuito de danificar os dispositivos alheios. 8 A fita cassete é lançada comercialmente por volta de 1963/64 com o objetivo de auxiliar nas gravações do rádio, mas só se populariza em meados da década de 80 com a introdução dos reprodutores portáteis. 9 Entenderemos como pirataria, neste trabalho, a cópia e/ou distribuição não-comercial de conteúdo com posse comercial ou autoral. 10 A fita cassete no navio pirata, ícone amplamente utilizado pela campanha da época, hoje é logotipo do The Pirate Bay, a maior rede de compartilhamento P2P do mundo. 11 P2P ou peer-to-peer (par a par) é um outro tipo de download onde o arquivo transferido é dividido em pequenos “pacotes”, constantemente enviados e recebidos por diversos usuários, agilizando a distribuição. Ver glossário. 13 The music industry bluntly translates unauthorized copying into theft, neglecting the fact that if someone steals a purse, the purse is actually taken away from its owner, whereas a file that is copied does not disappear.12 (SCHÄFER, 2011, p. 140) Complementar ao lançamento das fitas cassetes, a busca do consumidor por novas experiências de entretenimento impulsionadas pelas novas tecnologias saciou-se em grande parte com a introdução dos CDs e dos videogames13 por volta de 1980. Diversos autores por exemplo defendem que o montante de dinheiro antes destinado para o consumo fonográfico pode ter sido desviado para novas tecnologias e outras atividades de entretenimento, dentre elas os consoles de videogame (LEYSHON, WEBB, et al., 2005). O CD, primeiro formato de armazenamento e reprodução fonográfica digital, por outro lado, foi gradualmente substituindo as fitas cassetes como o principal formato de consumo fonográfico e, portanto, principal meio da prática de compartilhamento musical. Inicialmente um formato puramente de áudio, lido desta vez por um laser óptico, em 1985 foi incrementado de modo que possibilitava também a gravação de dados e, portanto, a cópia de conteúdo. O consumidor fonográfico passa a adotar estas novas tecnologias informacionais digitais em suas práticas. Apenas uma década depois, junto ao aumento da popularização da internet, é que o compartilhamento de arquivos atinge nível exuberante. Com um alcance de conexão universal, a crescente plataforma mostra-se incontrolável aos esforços da indústria. Em 2002 já existiam mais de 1 bilhão de arquivos de música disponíveis para download14 na internet (LEYSHON, WEBB, et al., 2005), e o mercado fonográfico regressou, em vendas, pela metade desde a virada do século (DANGNGUYEN, DEJEAN e MOREAU, 2012), mas há diversos materiais que sugerem que um aumento da pirataria digital não pode ser, sozinho, responsável pela queda no faturamento da indústria fonográfica (LEYSHON, WEBB, et al., 2005). Devemos comentar, porém, que o compartilhamento de arquivos enquanto é apontado como maléfico para algumas empresas, beneficia outras: um estudo na Universidade de Minesotta (Leung, 2009) (Handke, 2011) descobriu que a cópia de arquivos foi responsável por 22% das vendas de iPods15. A pirataria também se prova positiva para os ISPs16: quando a lei que restringiu a pirataria digital 12 A indústria fonográfica traduz cópia não-autorizada em roubo, negligenciando o fato que se alguém rouba uma bolsa, a bolsa é tirada de seu dono, todavia um arquivo que é copiado não desaparece. (Tradução nossa) 13 Formato de jogos de entretenimento com conteúdo audiovisual. 14 Transferência de arquivo de uma rede ou servidor para um dispositivo local. Ver glossário. 15 Dispositivo fabricado pela Apple que, junto ao iTunes, oferece armazenamento de conteúdo multimídia portátil para o usuário. 16 Internet Service Provider: Provedores de Serviços de Internet comercializam acesso à internet, num pacote que geralmente também inclui acesso à televisão a cabo e telefonia. 14 chegou na Suécia, o tráfego na rede no país caiu cerca de 18% (LEYSHON, WEBB, et al., 2005). Destacamos o surgimento do software17 Napster, desenvolvido pelo universitário Shawn Fanning, o qual permitia, pela primeira vez, o compartilhamento de arquivos de música digitais via P2P – uma tecnologia pouco usada até então – e que foi rapidamente reprimido pela indústria fonográfica por caracterizar, para ela, violação de direitos comerciais e autorais e roubo. Atentamos à tentativa da Apple18 de lucrar com o consumo de música na internet, através do modelo transacional: nesse caso o usuário pagaria pela posse do conteúdo antes de poder fazer o que bem quiser com ele (o consumidor pagava por um arquivo digital manipulável), a partir de uma vasta biblioteca licenciada pelas gravadoras. A empresa californiana tinha finalmente encontrado um caminho viável para a indústria que incorporasse as novas tecnologias e práticas do consumidor de música do início do século: com esse modelo, a iTunes Store19 se tornou, desde fevereiro de 2010, o maior vendedor de música do mundo20, atingindo, em 2013, 25 bilhões de músicas vendidas21. Um outro meio de consumo fonográfico do século XXI que vem ganhando atenção é o streaming. Derivado do inglês stream [corrente (de um rio)], caracteriza uma multimídia que é constantemente recebida e apresentada ao usuário, entregue pelo provedor. Diferente do download comum, a tecnologia permite a fruição do conteúdo enquanto sua entrega é realizada, seja ele um filme, um vídeo ou um álbum de música. DangNguyen (2012) complementa a definição, ao comentar que o usuário agora possui o acesso a um conteúdo, e não mais a posse dele, como veremos adiante. A nova plataforma abre a possibilidade de um modo de consumo ao mesmo tempo não-disruptivo (sem intervalos comerciais), e caracteriza uma comunicação assíncrona, uma vez que o conteúdo não está organizado pelo provedor numa grade de conteúdo sincronicamente fixa. Em 2014, por exemplo, enquanto as vendas físicas caíram 8,1% a receita da área digital aumentou 6,9%, representando 46% das vendas globais de música (IFPI, 2015). 17 Programa (sequência de instruções, códigos e comandos) de computador que realiza tarefas e funções específicas (com base em cálculos binários). 18 Ver glossário para as definições de Apple para este trabalho. 19 Varejo eletrônico de músicas desenvolvido pela Apple Inc. para auxiliar o gerenciamento e a compra de música portátil para execução no iPod, mais tarde incrementado. Ver glossário. 20 Ver http://www.apple.com/pr/library/2010/02/25iTunes-Store-Tops-10-Billion-Songs-Sold.html 21 Ver http://www.apple.com/pr/library/2013/02/06iTunes-Store-Sets-New-Record-with-25-Billion-SongsSold.html 15 Frente à rápida adoção do streaming como prática de consumo de música digital (o número de assinantes de serviços de streaming aumentou quase 500% entre 2011 e 2015 (IFPI, 2015)), a Apple lançou seu próprio serviço com a tecnologia, o Apple Music, em 2015. Devemos destacar também a estratégia da empresa de gradual abandono do iPod, ícone da música portátil comprada, frente à significativa predominância do consumo via streaming contra o download comum. O consumidor da virada do século parece valorizar um dispositivo único que atenda a todas as suas necessidades comunicacionais e informacionais em um só lugar, papel este cada vez mais assumido pelo celular. Deste modo o iPhone – modelo de aparelho celular fabricado pela marca – passa a integrar, além das funções básicas de um celular como a realização e recebimento de chamadas e SMS, funções de entretenimento, produtividade, diversão, dentre outras. O streaming no consumo fonográfico dialoga com o conceito de música portátil (aquela que pode ser acessada de “qualquer lugar”), iniciado na década de 70 com a apropriação do Walkman. Na maioria dos serviços, uma interface apresenta um catálogo inteiro de conteúdo acessado pelo leitor a partir de um único ponto de convergência: o aplicativo22 (que pode, inclusive, ser mobile, ou seja, estar nos tablets23 e celulares conectados à internet). Nesta modalidade de consumo, a música gravada deixa de ser tangível. Ao contrário do cassete, por exemplo, que conferia à música certa tangibilidade e limitações mecânicas de reprodução, a música, agora traduzível em bits, pode ser salva aos milhares e ainda assim não apresentar massa ou volume, e conferir uma reprodução infinita. Para o presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Discos (ABPD), Paulo Rosa, o streaming é “sem dúvida a grande aposta da indústria para os próximos anos” (ABPD, 2015). Exemplos de serviços de streaming são o Netflix (de filmes e séries), o YouTube (quando cobre eventos ao vivo realiza o chamado livestreaming, que é um upload24 de conteúdo constante pelo provedor e download constante pelo cliente em tempo real), Twitch.tv (livestreaming de games), Popcorn Time [cliente de filmes e séries compartilhados via peer-topeer (P2P)] e o Spotify25. 22 Termo que geralmente indica software otimizado para funcionamento em dispositivos móveis. Ver glossário. Dispositivo móvel geralmente maior, mais poderoso e com maior bateria que um smartphone. 24 Transferência de um arquivo local para uma rede ou servidor qualquer. Ver glossário. 25 Até a realização deste estudo houve o lançamento do TIDAL, um serviço de streaming fonográfico criado a partir de uma sociedade de artistas como Jay-Z, Beyoncé e Rihanna que promete qualidade superior sonora – a um preço também superior – e uma curadoria de clipes e álbuns especializada, com a finalidade, de acordo com a 23 16 O Spotify, plataforma de streaming exclusivamente fonográfico lançado em 2008 pela startup suíça Spotify AB, conta com dois modelos: uma conta grátis, com acesso ilimitado ao catálogo, mas intervalos publicitários íntegros entre as faixas, e uma conta premium, que requer uma assinatura fixa mensal e garante um acesso livre de publicidade sonora e uma qualidade técnica de mídia superior, além de downloads das faixas para proveito off-line. Este modelo de complementação de um pacote básico gratuito a partir de monetização caracteriza o modelo freemium, amplamente utilizado pela indústria do entretenimento atual como atrativo ao produto ou serviço comercializado na medida que oferece uma amostra deste ao consumidor. “A palavra freemium é um neologismo criado combinando-se os dois aspectos do modelo de negócios: free (gratuito) e premium (prêmio/valor)” (TEIXEIRA, 2013, p. 54). Se para o usuário estes serviços apresentam facilidades e organização de um catálogo relevante e facilmente filtrável, pelas quais não hesitam em pagar, custou muito às gravadoras perceberem e considerarem o streaming como uma alternativa às compras online, já que aparenta não apresentar lucros e traz uma aparente descentralização do poder de detentores. Mas o Spotify conseguiu parcerias com as quatro maiores (Sony, EMI, Warner e Universal), além de inúmeras independentes, principalmente por apresentar uma redução nos números da pirataria, conceito pelo qual, na verdade, surgiu (SPOTIFY LTD, 2013). Uma enquete realizada no Reino Unido26, por exemplo, em 2009, mostrou que apenas 26% dos adolescentes entrevistados, enquanto fazem streaming, também baixam músicas, em comparação aos 42% do ano anterior (THE GUARDIAN, 2009). Vale destacar também que, salvas exceções onde o volume de vendas é muito alto, poucos artistas lucram com a venda de música gravada (a maior parte da receita é de posse das gravadoras), mas sim com shows e turnês (ferramentas promocionais das gravadoras para a venda de discos) (CASTRO, 2004). O uso de serviços de streaming com base no modelo freemium, por exemplo, pode afetar positivamente a presença em shows para os artistas que estão catalogados neles (DANGNGUYEN, DEJEAN e MOREAU, 2012) como uma espécie de “frequência” do play, que gera conhecimento e afinidade com a obra sem o envolvimento de transações monetárias. empresa, de valorizar o trabalho do artista e revolucionar a indústria fonográfica. O serviço foi visto, desde seu lançamento, como equivocado até mesmo por outros artistas pop, como Lilly Allen, que alega que o valor inferior percebido no TIDAL fará as pessoas “voltarem aos montes para os sites de pirataria” (ver NME 2015). 26 http://www.theguardian.com/music/2009/jul/12/music-industry-illegal-downloading-streaming 17 No Brasil, porém, nos deparamos com um cenário artístico que ainda não é familiar com a nova tecnologia: o artigo “Precisamos Falar sobre o Streaming” de Carlos Taran, empresário da indústria fonográfica nacional experiente com bandas brasileiras, mostra que diversos artistas do país desconhecem o funcionamento econômico da tecnologia27 e que, por isso, a mesma não foi discutida corretamente no país, apesar de seu crescimento constante (no Brasil, em 2014 serviços de streaming de áudio e vídeo tiveram um aumento de 53,61% em relação ao ano anterior (ABPD, 2015)). Os serviços de streaming pagam pouco, pagam muito mal. Esta é a voz corrente entre músicos, compositores e produtores. Já ouvi tal afirmativa uma centena de vezes mas, quando procuro saber o que leva os profissionais da música a pensarem assim, percebo que a maioria não entende a equação usada pela indústria para precificar a execução de suas canções. Todos acham que ganham mal, mas não entendem os motivos (TARAN, 2015, p. 2). É interessante notar que ao mesmo tempo em que a digitalização da música apresente diversas facilidades ao usuário e ao artista, como melhores métricas, para outros autores cada vez mais distancia a mesma de seu “valor real”, traduzido na tangibilidade do CD ou do LP, como comenta Bartmanski (2015). Para ele, estes formatos ainda apresentam uma visualidade (booklet28, arte do álbum, dentre outros elementos), que torna a obra mais material que a disponibilizada pelo streaming, são objetos de arte e objetos de coleção, e apresentam também o fator da raridade (a dificuldade em encontrar obras musicais em formatos mais tradicionais aumenta seu valor). Bartmanski (2015) comenta sobre o aspecto da experiência social, tratado anteriormente, sobre o consumo de música: os formatos tradicionais contribuem para esta experiência. Os artistas, de acordo com Castro (2004), buscam por uma maior personalização e interatividade com seu público, estes podendo se atrelar à constituição da identidade da obra como um todo. A própria natureza dos arquivos digitais já se distancia do modelo analógico “anterior”: não é mais necessário nenhum equipamento específico para a cópia de material musical, os próprios computadores, altamente popularizados e consumidos na época, conseguem copiar, ripar 29 e – uma vez conectados à internet – compartilhar arquivos nativamente. Com os custos de 27 Ver http://oglobo.globo.com/cultura/musica/musicos-questionam-direitos-autorais-em-servicos-de-streaming15934958 28 Booklet é o nome dado ao livreto que acompanha CDs e LPs, geralmente com fotos do(s) artista(s) e letras das canções. O booklet, de acordo com Bartmanski (2015), quando trabalhado em conjunto à arte da capa do álbum e a própria música, constrói a identidade da obra e contribui para o “valor real” percebido pelo consumidor. 29 Ripar, na informática, significa acessar e copiar o conteúdo de uma mídia física externa. 18 reprodução mais acessíveis ao consumidor, a própria música também se torna mais acessível (SCHÄFER, 2011). Na era da internet o custo para uma produção musical também reduziu consideravelmente, já que as inovações tecnológicas proporcionam ao usuário níveis nunca experimentados de produção e compartilhamento de conteúdo. O processo técnico de uma gravação que antes poderia tomar meses a bandas como os Beatles, mesmo tendo o melhor estúdio da época, o EMI/Abbey Road, inteiramente a serviço deles, hoje pode ser concluído num computador pessoal em questão de semanas com o auxílio de softwares acessíveis. Custos estes diminuíram não apenas para o consumidor, mas também para a indústria, que muitas vezes provoca os consumidores a pagarem pelo mesmo material relançado diversas vezes em novos formatos e modelos ao invés de criar novos conteúdos (SCHÄFER, 2011). O surgimento dos microcomputadores Macintosh e dos chips de processamento sonoro digital inauguram a era da microinformática musical. A crescente demanda por novas tecnologias digitais teve como consequência uma rápida popularização dos recursos tecnológicos de produção musical. (CASTRO, 2004, p. 5) A natureza democrática de compartilhamento da internet aponta para um novo modelo de distribuição musical longe dos meios detidos pela indústria, do qual o artista independente pode usufruir como alternativa de autopromoção e o consumidor como canal dedicado de obtenção de conhecimento musical de gêneros alternativos e novos artistas. Este estudo busca, no contexto apresentado, conhecer melhor a relação entre o consumidor e a música, tomando como base o momento em que o formato predominante é o streaming, um dos primeiros formatos digitais aceito pela indústria como alternativa viável. O ambiente econômico da plataforma e das novas formas de consumo fonográfico é aprofundado, buscando descobrir, dentre outros tópicos, a afinidade da ferramenta com as práticas do consumidor. Este estudo tem como alvo a tecnologia do streaming, mais especificamente o Spotify, líder30 da modalidade, com a finalidade de entender seu funcionamento e relação com a indústria cultural e com as práticas de consumo e produção fonográficas, levando em conta, principalmente, as mudanças que o novo formato engloba em relação a seus antecedentes. 30 O Spotify possui mais de 60 milhões de usuários ativos, número medido no final de 2014. Fonte: https://news.spotify.com/us/2015/01/12/15-million-subscribers/ 19 1.2. Objeto O objeto alvo deste estudo é a tecnologia do streaming no mercado fonográfico. Originada no início do século XXI, passou a fazer parte de alterações no modo como o consumidor se relaciona com os conteúdos de entretenimento, se destacando dentre as demais tecnologias por estar presente exclusivamente nos meios digitais, aproximando-se assim da cibercultura. Focaremos este estudo no modelo freemium31 de consumo da tecnologia proposto pelo Spotify, serviço lançado em 2008, e sua relação com o consumo fonográfico na mesma época. 1.3. Problema O problema sobre o qual este estudo busca refletir é: como e será que o consumo fonográfico via streaming dialoga com as práticas de consumo de música da virada do século? 1.4. Objetivo Geral O objetivo geral deste trabalho é de investigar as práticas de consumo musical com base em serviços de streaming. 1.5. Objetivos Específicos Os objetivos específicos deste trabalho são: 1) refletir sobre a relação entre cultura midiática, cibercultura e práticas de consumo, 2) observar transformações nas práticas de consumo fonográfico e 3) investigar na perspectiva do consumidor como ele negocia estas novas práticas de consumo com hábitos já consolidados. 1.6. Metodologia Este estudo se baseia primariamente numa pesquisa bibliográfica de livros, artigos e estudos acadêmicos que se dedicam a estudar a evolução do mercado fonográfico, novos formatos introduzidos ao longo de sua existência e os modos de consumo da sociedade nessa área. Os dados tratam tanto do consumo da música em si, estudando a relação entre música e valor, quanto das transformações socioculturais decorrentes das novas tecnologias e plataformas de consumo da arte. A pesquisa bibliográfica é definida por Gil (2008) como “desenvolvida com base em material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos” (GIL, 2008). Este tipo de pesquisa prova-se essencial para o estudo simultâneo de temas distintos e 31 Um modelo freemium de aplicativo oferece um conteúdo básico geralmente gratuito, este podendo ser, opcionalmente, implementado a partir de transações monetárias. 20 posterior análise das relações presentes entre eles. Além disso, contribui especialmente para uma contextualização histórica detalhada (GIL, 2008, p. 45). Baseamo-nos também na pesquisa documental de dados secundários como relatórios, artigos e estudos em andamento como o levantamento de dados anual da IFPI (International Federation of the Phonographic Industry) e da ABPD (Associação Brasileira de Produtores de Discos). Este tipo de pesquisa, apesar de semelhante à bibliográfica, difere-se por incluir fontes com dados muitas vezes não analisados ou concluídos, como relatórios, estatísticas etc. (GIL, 2008, p. 45). Para alcançarmos nossos objetivos, nos apoiamos também numa pesquisa empírica de natureza descritiva quantitativa (um questionário do tipo survey, anexo a este trabalho), com perguntas sobre hábitos de consumo de mídia, afinidade com streaming e gêneros musicais. Escolhemos a pesquisa descritiva pois esta apresenta a capacidade de descrever um determinado comportamento da amostra ou de um grupo de modo quantitativo e mensurável e pode ser aplicada em forma de questionário compartilhável via internet: “uma de suas características mais significativas está na utilização de técnicas padronizadas de coleta de dados, tais como o questionário e a observação sistemática” (GIL, 2008, p. 42). 21 1.7. Quadro Referencial Teórico Consumo RETONDAR, A. M. Sociedade de consumo, modernidade e globalização. 1ª. ed. São Paulo: Annablume, 2007. BAUDRILLARD, J. A sociedade de consumo. 2ª. ed. Lisboa: Edições 70, 2010. ROCHA, E. Culpa e prazer: imagens do consumo na cultura de massa. Comunicação, mídia e consumo, São Paulo, v. 2, n. 3, p. 123-138, março 2005. SLATER, D. Cultura e consumo e modernidade. São Paulo: Nobel, 2002. MCCRACKEN, G. Cultura e consumo: novas abordagens ao caráter simbólico dos bens e das atividades de consumo. Rio de Janeiro: MAUAD, 2003. SASSATELLI, R. Consumer culture: history, theory and politics. Londres: Sage, 2010. APPADURAI, A. Modernity at Large: Cultural Dimensions of Globalization. Minneapolis: Minnesota University Press, 1996. Cultura Midiática e MORIN, E. Cultura de Massas no Século XX: Neurose. Tradução de Cultura de Massa Maura Ribeiro Sardinha. 9ª. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, v. I, 1997. KELLNER, D. A Cultura de Mídia. Tradução de Ivone Castilho Benedetti. 1ª. ed. Bauru: EDUSC, 2001. SILVERSTONE, R. Por que estudar a mídia? 2ª. ed. São Paulo: Edições Loyola, 2005. Consumo CASTRO, G. G. S. Web music: produção e consumo de música na Fonográfico cibercultura. Comunicação, mídia e consumo, São Paulo, v. 1, n. 2, p. 7-19, novembro 2004. JONES, S. Music and the Internet. Popular Music, 2000. PEITZ, M.; WAELBROCK, P. File-Sharing, Sampling, and Music Distribution. SFB/TR 15 Discussion Paper. [S.l.]. 2004. (Nº 31). PEITZ, M.; WAELBROECK, P. Why the music industry may gain from free downloading - The role of sampling. International Journal of Industrial Organization, 2006. 22 BARTMANSKI, D.; WOODWARD, I. Vinyl: The Analogue Record in the Digital Age. 1ª. ed. [S.l.]: Bloomsbury Academic, 2015. Cibercultura LÉVY, P. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999. 23 2. O CONSUMO COMO FENÔMENO CULTURAL Entender a atividade do consumo prova-se essencial para analisá-la sobre as perspectivas de fenômenos imateriais e de natureza artística inseridos na cultura de uma sociedade, como a música, inclusive sob as várias diretrizes do universo digital. Neste capítulo exploramos, portanto, como a atividade do consumo, regulada pela mídia, se relaciona com o ciberespaço tão presente na sociedade atual. Assim, buscamos desenvolver a discussão proposta no primeiro objetivo específico e, para isto, recorremos à pesquisa bibliográfica de autores como McCracken, Lévy, Baccega, Silverstone e Kellner. 2.1. O Consumo Contemporâneo A linguagem do consumo transformou-se numa das mais poderosas formas de comunicação social (BACCEGA, 2008, p. 3) O consumo é atividade integrante do processo de transformação de um produto, é sua etapa final, na qual a produção de significado se dá por sua destruição. É “um estágio no ciclo de vida da mercadoria, mas um ciclo que não tem início nem fim: um jogo constante contínuo, constante de produtos e significados [...]” (SILVERSTONE, 2005). Ao mesmo tempo, o consumo é uma atividade pela qual nos relacionamos não só com objetos, mas com outras pessoas (seja por status, carência ou presentes) e também com a cultura do tempo em que vivemos. As inovações tecnológicas e ideológicas da Revolução Industrial possibilitaram novas relações entre trabalhador, produção e produto que levaram – de acordo com McKendrick (1982) – a uma intensificação do desejo de consumir da população não intensificado pela maior escala da produção, mas ao contrário: a última como consequência da primeira [a produção em larga escala só passou a acontecer, de acordo com Sassatelli (2010, p. 6), no fim do século XIX]. Esta intensificação do consumo se deu principalmente devido a vendedores que usavam técnicas marqueteiras persuasivas. Para Jan de Vries (1975), por outro lado, a necessidade de participar da vida econômica das classes mais baixas foi tanta nessa época que, frente à diminuição de salários e maior disponibilidade de bens de consumo (o início do capitalismo), a maioria das famílias passava a agir irracionalmente, consumindo cada vez mais e tendo muitas vezes que trabalhar mais horas para compensar os gastos, uma simplificação de um modelo familiar de consumo baseado na troca, ainda mais intensificado hoje. 24 Para McCracken (2003), as proposições e transformações que encontramos no consumo moderno inserem-se no conceito da “revolução do consumo”, para ele, com base nos estudos de McKendrick (1982), iniciada em meados do século XVIII com a revolução industrial: “[...] tal revolução do consumo representa não somente uma mudança nos gostos, preferências e hábitos de compra, [...] é encarada agora como tendo modificado os conceitos ocidentais de tempo, espaço, sociedade, indivíduo, família e estado” (MCCRACKEN, 2003, p. 21) Para outros autores32, ainda, esta revolução do consumo teve uma segunda etapa em meados do século XX, junto ao crescente surgimento de lojas de departamento e uma publicidade mais apelativa em seus temas e imagens (RETONDAR, 2007). Aliás, a própria profissionalização e especialização em publicidade a torna profissão voltada para a promoção do consumo. Como comenta Retondar (2007): [...] o desenvolvimento da indústria publicitária no final do séc. XIX passa a ter um papel fundamental na consolidação da moderna sociedade de consumo essencialmente por difundir a própria atividade de consumo não apenas como algo desejável mas, especialmente, como um valor social moralmente legítimo, destituído de pecado (RETONDAR, 2007) Neste constante processo de globalização, a atividade do consumo é catalisada pelas novas tecnologias. A informação é instantânea, a moda é ainda mais passageira, a ansiedade por uma atualização informacional é direcionada, muitas vezes, para a compra descomedida e incessante. Baccega (2008) nos proporciona uma visão geral do processo do consumo na sociedade contemporânea: O consumo acelera-se, acelera-se a produção. A corrida parece desenfreada. A acumulação flexível do capital, característica da época contemporânea, também decorrência do avanço das tecnologias, permitiu maior racionalidade na produção, ‘eliminando’ o estoque e trabalhando just in time. (BACCEGA, 2008, p. 3) Appadurai (1996, apud SILVERSTONE 2005) nos lembra que o consumo se torna um hábito, por ser processo essencialmente repetitivo como as necessidades fisiológicas humanas. Hábito este que deve ser regulado, e o fazemos na própria sociedade: “os dias são marcados pelos lugares e momentos apropriados para comer” (SILVERSTONE, 2005, p. 153). Por isso, não deve ser tachado como algo necessariamente negativo. Consumimos desde sempre, tanto pela subsistência e motivos de sobrevivência, quanto pelo prazer e pela ansiedade moderna. Para Silverstone (2005), o consumo “é notado apenas no excesso. [...] No entanto, o consumo 32 Particularmente McKendrick e Plumb (1982) e Campbell (1987). 25 faz o mundo girar”. Não apenas as regulações da sociedade, o consumo, principalmente nas sociedades contemporâneas, também sofre mediação da mídia e da propaganda: Consumimos sem cessar, e por nossa capacidade de fazê-lo contribuímos para, reproduzimos e afetamos consideravelmente a textura da experiência. Nisso recebemos auxílio da mídia. Com efeito, consumo e mediação são, em inúmeros aspectos, fundamentalmente interdependentes. Consumimos a mídia. Consumimos pela mídia. Aprendemos como e o que consumir pela mídia. A mídia, não é exagero dizer, nos consome. (SILVERSTONE, 2005, p. 150) A publicidade e a mídia desempenham papel significativo para o funcionamento desta sociedade do consumo, pois apropriam-se da fluidez proporcionada pelos novos meios de comunicação – resultantes das inúmeras transformações tecnológicas e informacionais do mundo moderno – em seu processo: “os produtos precisam ser rapidamente consumidos para dar lugar a outros produtos que seguirão o mesmo trajeto” (BACCEGA, 2008, p. 2) Neste cenário, elementos do consumo se misturam à esfera social, marcas e grifes cada vez mais passam a fazer parte do processo de comunicação, imaginário e da formação da identidade de um indivíduo (constitui-se de um sistema de signos). “Sou o que compro, não mais o que faço ou, de fato, penso” (SILVERSTONE, 2005, p. 150). É válido lembrar aqui de um aspecto interessante deste consumo voltado para a ostentação, a identidade: em oposição à pátina33, é a condição de “novo”, “moderno” e “atualizado” dos bens que exprimem status. O próprio indivíduo é, acima de tudo, consumidor, e tudo é bem de consumo: A fluidez, o desenraizamento, a vida líquida, a velocidades no lugar da duração, a aparente predominância da imagem, que caracterizam essa hipermodernidade ou sobremodernidade, carregam a possibilidade de transmutação de toda a realidade em objetos de consumo. (BACCEGA, 2008, p. 2) Cada vez mais o status na sociedade deixa de ser definido por nossa posição nas relações de produção [...] Nossas identidades são reivindicadas, em vez disso, pelo sutil, às vezes não tão sutil, posicionamento da exibição. (SILVERSTONE, 2005, p. 151) É neste contexto que se encaixa a cultura material presente nos dias de hoje. Para Sassatelli (2010) a definição deste conceito é muito simples: 33 O consumo de pátina (espécie de poeira) é caracterizado pela expressão do status de nobreza a partir da acumulação desta em objetos, principalmente de metais (meados do século XVI). 26 If by culture we intend the ensemble of meaningful practices through which social actors orient themselves in the world, then by ‘material culture’ we intend the ensemble of objects, man-made or otherwise, which are given meaning by those practices and which, in turn, contribute to giving meaning to those same practices.34 (SASSATELLI, 2010, p. 4) O consumo na sociedade contemporânea tem ainda outra característica que o define: a atemporalidade. O que antes consumíamos para durar e satisfazer nossas necessidades por muito tempo, hoje é uma ideia suplantada por um consumo efêmero, de curta duração, instantâneo. “O consumo moderno procura substituir a estética da duração pela estética da efemeridade” (APPADURAI, 1996, p. 85). E este efêmero só existe devido ao ritmo da sociedade globalizada: a informação instantânea, o tempo comprimido. Aliás, se analisarmos, o tempo mesmo é bem de consumo, imaginado no lazer comercializado por empresas deste setor. Exemplos comumente encontrados na mídia massiva como “Compre viagens”, “Tire um tempo para você mesmo”, sabemos que numa sociedade constantemente ansiosa a ideia de relaxar estes pensamentos corriqueiros cotidianos e dedicar-se somente à ilusão do “que importa” – imagem essa ironicamente também construída pela mídia – nos atrai. Para Silverstone (2005) e Scannell (1988), nessas sociedades a mídia é a responsável por regular nível e intensidade das atividades do consumo e portanto controlar essa percepção do “tempo do consumo”. Em outras palavras, “tempo, consumo e mediação ficam todos dessocializados, dependentes apenas da excentricidade do momento”. (SILVERSTONE, 2005, p. 156). A globalização dessa cultura do consumo implica na difusão mundial de um imaginário coletivo de valores, gostos, estilos de vida que ultrapassam as divisões políticas, sociais e econômicas e vão direto – e rapidamente, devido às novas tecnologias – ao âmbito cultural. Há uma descentralização de elementos que antes eram particulares a, por exemplo, uma cultura específica delimitada geograficamente, que se mesclam com o resto do globo a partir da linguagem universal do consumo. A questão é que muitas vezes as ideologias compartilhadas poderão ser contrárias a cultura “tradicional” de determinado local, ameaçando as estruturas do Estado ou da economia, por exemplo. Appadurai afirma: “A complexidade da atual economia global tem algo a ver com certas disjunções fundamentais entre a economia, a cultura e a política que mal começamos a teorizar” (1996, p. 312, apud ROCHA 2008, p. 124). 34 Se por cultura pretendemos falar da coletânea de práticas significantes pelas quais os atores sociais se orientam no mundo, então por ‘cultura material’ pretendemos falar da coletânea de objetos, feitos pelo homem ou não, aos quais são atribuídos significados por essas práticas e os quais, em retorno, colaboram atribuindo significado a essas mesmas práticas. (Tradução nossa) 27 Responsável por difundir estes gostos globais centrados no consumo está a mídia, a qual detalharemos mais adiante. Exemplo disto é a própria publicidade, que busca analogias e metáforas com situações socioculturais recheadas de sentidos e significados facilmente identificáveis pelos consumidores para estimular o consumo nestas mesmas situações, num incessante ciclo. O ‘reencantamento’ do mundo através da mistificação do consumismo global passou, neste caso, a produzir uma nova modalidade de ‘desencantamento’, [...] mais no sentido político de Marx, onde a efemeridade e a descartabilidade dos objetos se projeta para as relações humanas, onde a exclusão e o aumento da desigualdade, o advento da guerra eletrônica e dos “terrorismos” retiram, de maneira crescente, o encanto, a beleza do mundo. (RETONDAR, 2007, p. 114) A elevação do consumo como centro das relações da modernidade implica na produção em massa de bens de consumo e até mesmo no direcionamento de bens culturais para o consumo, como exploramos no item seguinte. 28 2.2. Culturas de Mídia e de Massa A indústria cultural, para Edgar Morin (1997), baseando-se em Adorno e Horkheimer (1944), é uma teoria essencialmente capitalista que sugere que bens culturais de uma sociedade podem também – e cada vez mais tendem a – ser transformados em bens de consumo, destinados, após diversos processos sincretistas35, à produção em massa e obtenção de lucro máximo. A música, como arte, não foge deste processo. A teoria da indústria cultural traduz a proposta da cultura de massa no campo dos bens culturais, esta última definida por Morin (1997): Cultura de massa, isto é, produzida segundo as normas maciças da fabricação industrial; propaganda pelas técnicas de difusão maciça (que um estranho neologismo anglo-latino chama de mass media); destinando-se a uma massa social, isto é, um aglomerado gigantesco de indivíduos compreendidos aquém e além das estruturas internas da sociedade (classes, famílias, etc.). (MORIN, 1997, p. 14) O autor define que o emprego do termo “cultura” caracteriza não apenas uma orientação ou desenvolvimento de algumas virtualidades humanas, mas a inibição de outras. A cultura, constituindo um conjunto de símbolos, mitos e normas de uma sociedade, “alimenta o ser semireal, semi-imaginário, que cada um secreta no interior de si (sua alma), o ser semi-real, semiimaginário que cada um secreta no exterior de si e no qual se envolve (sua personalidade)” (MORIN, 1997, p. 15). É importante lembrar que as sociedades são policulturais, portanto a cultura de massa conversa com as outras culturas existentes como a religiosa, nacional e humanista. Morin (1997) afirma que a cultura de massa “nos coloca os problemas da primeira cultura universal da história da humanidade” (MORIN, 1997, p. 16), à medida que diversos elementos dela já se espalharam por todo o globo. Para atingir seus objetivos, a indústria cultural tende a padronizar os conteúdos num nível de entendimento médio e universal. Até mesmo as fronteiras culturais são abolidas. Exemplos deste processo de normalização incluem a obrigatoriedade do happy ending, uma abordagem maniqueísta do enredo, atualização de temas clássicos e vocabulário mais contemporâneos. Esta aceitação dos conteúdos padronizados só é possível devido ao funcionamento do imaginário humano, que já traduz em arquétipos as diversas informações culturais que recebe. 35 Sincretismo é um termo definido por Edgar Morin como “a mais apta para traduzir a tendência a homogeneizar sob um denominador comum a diversidade dos conteúdos” (MORIN, 1997, p. 36). 29 “A análise estrutural nos mostra que se pode reduzir os mitos a estruturas matemáticas” (MORIN, 1997, p. 26). Há casos, inclusive, em que a narrativa se torna menos importante que a estética, ou seja, artifícios audiovisuais atraem mais o leitor que o próprio enredo ou conteúdo daquela obra. Talvez porque o visual seja nossa relação primária com o mundo. “Costuma-se afirmar que nos programas geralmente designados como ‘pós-modernos’ (...) há um novo visual e um novo tipo de sentimento: o significante foi liberado, e a imagem tem precedência sobre a narração” (KELLNER, 2001, p. 301). “Todo um setor das trocas entre o real e o imaginário, nas sociedades modernas, se efetua no modo estético, através das artes, dos espetáculos, dos romances, das obras ditas de imaginação” (MORIN, 1997, p. 79). Este processo, para Morin (1997), tem exemplos dos folhetins europeus, onde as correntes burguesa e popular se misturam num gênero mesclado entre o cotidiano elitista e geral. É interessante notar a ironia presente nesta mescla: o sucesso de uma obra, supostamente definido pelo número de leitores, só poderá ser atingido na medida em que possua uma forma e conteúdo inteligível a todos. É válido lembrar que apesar das expressões acima, de acordo com o autor, é nos Estados Unidos, onde também nasce a cultura de massa, que por volta da década de 30 surge a indústria cultural. Os conteúdos culturais, para Morin (1997) estariam sujeitos também à intervenção do Estado, esta podendo ser positiva (orientação, domesticação ou politização, por exemplo), ou negativa (censura ou controle, por exemplo). A iniciativa privada nunca estará livre desta intervenção, pois o Estado, no seu papel de “pelo menos, polícia” (MORIN, 1997, p. 22), também tem interesse em suas próprias produções culturais, criando um conflito de correntes de interesses: “há igualmente a preocupação de atingir o maior público possível no sistema privado (busca do máximo lucro) e no sistema do Estado (interesse político e ideológico)” (MORIN, 1997, p. 23). Por outro lado, a indústria cultural se conflita no que diz respeito à manufaturação individual, criativa e nova. A produção, cada vez mais destinada à massa, sofre com a constante exigência de uma criação inovadora. Aliás o próprio funcionamento dela é caracterizado pela concorrência destas forças. Este conflito é citado pelo autor: “A indústria cultural deve, pois, superar constantemente uma contradição fundamental entre suas estruturas burocratizadaspadronizadas e a originalidade [...] do produto que ela deve fornecer” (MORIN, 1997, p. 25). 30 A variedade é, então, indispensável à indústria cultural. Por isso, mesmo após constantes processos de padronização, nos deparamos com jornais, rádios e até mesmo grupos musicais diferentes entre si, “flexibilidade mínima de jogo que é vitalmente necessária a indústria cultural” (MORIN, 1997, p. 27). Entendemos, com base nos estudos de Morin (1997), que a nova cultura, a de massa, moldase para atingir o denominador universal ao público médio, mas também molda nela mesma um público que pode aproveitar-se de seus conteúdos. Ou seja, é ela que faz os costumes, temas e hábitos de diferentes classes sociais, por exemplo, ultrapassarem estas barreiras, por meio da produção de conteúdos semelhantes às duas, e constantemente cria um novo (apesar de massificado) conteúdo que o atende. “[A] produção cria o consumidor... A produção produz não só um objeto para o sujeito, mas também um sujeito para o objeto” (MARX apud MORIN 1997, p. 45). Enfim esta propalação do que é a chamada “moda” dentre a massa é concebida pela mídia. Como já explorado anteriormente, a constituição de novas identidades através da cultura de massa nos propõe normas, símbolos e imagens, alimentando a personalidade e a alma de cada indivíduo na sociedade. De acordo com Kellner (2001): (...) a televisão e outras formas da cultura da mídia desempenham papel fundamental na reestruturação da identidade contemporânea e na conformação de pensamentos e comportamentos. Em outro local, afirmamos que a televisão hoje em dia assume algumas das funções tradicionalmente atribuídas ao mito e ao ritual (ou seja, integrar os indivíduos numa ordem social, celebrando valores dominantes, oferecendo modelos de pensamento, comportamento e sexo para imitação, etc.). (KELLNER, 2001, p. 304) Em outro âmbito, a cultura de massa cria um sentido de “gosto” único e comum entre as diferentes segregações sociais, ironicamente, se pensarmos mais adiante, ligado à identidade e a formação de grupos sociais com gostos semelhantes (os punks ou os nerds, por exemplo). Isto implica que a cultura de massa, de certo modo, ao democratizar obras antes inacessíveis a uma determinada classe, por mais distantes que sejam do original ou da experiência oferecida por ele, a valorizam. Esta democratização pode também ser obtida através da cibercultura, que cada vez mais tende em criar regras próprias que lidam com a difusão desta “inteligência coletiva”. 31 2.3. A Comunicação em Rede Mas a globalização é também uma realidade material. Indústria, finança, economia. Estado, cultura, tanto separadamente como juntos, operam no espaço e no tempo globais e são construídos dentro deles: transgredindo fronteiras, transcendendo identidades, fraturando comunidades, universalizando imagens. E a mídia tanto permite como representa este processo. (SILVERSTONE, 2005, p. 199) Dentre as diversas transformações tecnológicas e informacionais da sociedade moderna está o surgimento da internet, antes uma invenção militar, que contribui para um fluxo instantâneo de informações por todo o mundo. Seu funcionamento contribui para uma difusão de dados, mensagens, valores e ideias em velocidade imensurável e é constantemente utilizada pela mídia por possuir esta característica. Por outro lado, possui caráter de entretenimento e justamente por atrair um grande número de usuários, estes passaram a criar uma própria cultura – a priori exclusiva – dos meios digitais. A cibercultura, como todas as culturas, tem seu próprio conjunto de normas, imagens e símbolos, conforme explorado anteriormente. Para Lévy (1999) ela se estabelece a partir do conceito do ciberespaço, inventado em 1984 por William Gibson no romance Neuromancer e definido pelo “universo das redes digitais [...]” (LÉVY, 1999, p. 91). O ciberespaço é uma construção coletiva internacional anônima, interativa heterogênea e intotalizável que segue suas próprias regras (a chamada “netiqueta”36): Aqueles que fizeram crescer o ciberespaço são em sua maioria anônimos, amadores dedicados a melhorar constantemente as ferramentas de software de comunicação, e não os grandes nomes, chefes de governo, dirigentes de grandes companhias cuja mídia nos satura. (LÉVY, 1999, p. 126) O fato de que qualquer ser humano pode hoje participar da construção, manutenção e até mesmo destruição deste espaço nos dá evidência da primeira característica notável do ciberespaço: a democracia. “A total liberdade da palavra é encorajada e os internautas são, como um todo, opostos a qualquer forma de censura” (LÉVY, 1999, p. 129). Apesar disso, é comum em meio às comunidades virtuais indivíduos37 que se apoiam no anonimato (outra característica do ciberespaço) para incendiar discussões ou cultivar o ódio ou oposição intolerável. Este anonimato pode ser parcial ou total, visto que na maior parte das 36 Termo criado da junção das palavras “net” (rede, em inglês) e “etiqueta” e utilizado pelo autor para tratar das práticas da boa educação no mundo virtual. 37 Atualmente estas pessoas são conhecidas no mundo virtual como trolls. 32 ocasiões as pessoas deixam transparecer sua personalidade real no modo como escrevem, atitudes e decisões que tomam etc. além dos chamados “vestígios digitais” como localização geográfica, IP38, dentre outros. Isto sem falar nos vírus criados puramente com propósito de danificar computadores pessoais ou corporativos (muitas vezes inseridos em arquivos compartilhados em redes P2P e contribuindo para uma má reputação destas). Voltando à questão do anonimato, por outro lado, devemos lembrar que pode ser visto como algo discutivelmente positivo, pois sugere uma nova forma de interação onde as pessoas, sem medo de um censor como o Estado, sentem-se mais livres para expressarem suas opiniões reais sobre determinados assuntos. Esta democratização, por outro lado, pode ser prejudicial ao Estado, que perde sua soberania e a capacidade de controlar os incontáveis fluxos informacionais e ideológicos transferidos a cada segundo pelas redes. Há aí um intenso debate sobre até que ponto o ciberespaço está livre do controle do Estado, uma vez que acontece sob seu, digamos, “território”, mas estabelece-se como uma conquista humana distante dele. Nos Estados Unidos, por exemplo, recentemente foi revelado39 que a NSA (National Security Agency) estava há um considerável período de tempo vigilando todos os dispositivos conectados à internet não apenas localizados em território americano, mas também aqueles que transmitem o mínimo fluxo de dados pelos servidores ali localizados. Em se tratar da internet como mídia, apesar do caráter inicial livre de qualquer poder mercadológico, o ciberespaço vem cada vez mais abrindo a possibilidade de ser também utilizado como mídia de massa. Um meio que por definição oferece uma comunicação independente da “grade de conteúdo” do seu detentor, a chamada comunicação assíncrona, aos poucos passa a abrir espaço aos grandes conglomerados da mídia de massa e da publicidade, visto que até mesmo os detentores destes veículos de entretenimento digital têm seus interesses mercadológicos. Esta apropriação dos meios digitais para interações comerciais dá-se principalmente devido às características deles, algumas já citadas até então. A interatividade que a comunicação digital oferece é de grande importância, por exemplo, para a publicidade. Permite que o usuário não 38 Internet Protocol é um conjunto de letras (desde sua 6ª versão) e números único que identifica um dispositivo (mais especificamente sua placa de rede) numa rede digital qualquer. 39 Ver o caso Edward Snowden. 33 apenas receba e processe a mensagem mentalmente, mas que de fato participe dela, usando outro recurso digital como uma segunda tela, um aplicativo, etc. A comunicação por mundos virtuais é, portanto, em certo sentido, mais interativa que a comunicação telefônica, uma vez que implica, na mensagem, tanto a imagem da pessoa como a da situação, que são quase sempre aquilo que está em jogo na comunicação. (LÉVY, 1999, p. 81) Ainda neste debate mercadológico-liberal temos a democratização, já comentada no capítulo anterior sobre a indústria cultural, em seu maior expoente, de obras de difícil acesso, ou de modo gratuito. Esta última alternativa contraria não apenas o Estado, mas também os interesses lucrativos de grandes corporações privadas. Bens como filmes inteiros, álbuns, livros e até games são constantemente compartilhados – muitas vezes gratuitamente – na internet. O direito autoral é, na maioria dos casos, ignorado. Exemplo deste embate se encontra no cenário em que se insere nosso objeto de estudo, o Spotify, e o quanto custou às grandes gravadoras perceberem a viabilidade do negócio como algo lucrativo às duas partes, e aceitado também pelo consumidor. Novamente volto a dizer que há um inegável debate entre a democracia e o caráter livre que a internet propõe versus a aplicação de regras do convívio real no ciberespaço. A participação do usuário na criação e remixagem de conteúdo cultural na internet é apontada por Shäfer (2011) como uma atividade de caráter colaborativa e inclusive trabalhista, por vontade própria, dos fãs. A implementação dessa atividade dos fãs à lógica de produção industrial pode ser beneficiária dos dois lados. A criação e distribuição de SDKs40, por exemplo, pela indústria de vídeo games, prova que outros conglomerados muito têm a aprender com sua base de consumidores-fãs e que em nada prejudica – isto quando não beneficia – seu modelo de negócios a abertura de material original à modificação alheia. Em Cibercultura, Lévy (1999) faz um ensaio sobre a comparação das linguagens oral e escrita com a da cibercultura, destacando outra de suas particularidades. Enquanto nas sociedades orais os emissores e receptores compartilhavam da mesma situação no mesmo local e sob as mesmas circunstâncias, a linguagem escrita traz, dentre outros, o advento da atemporalidade: escreve-se num papel, por exemplo, que pode ser lido quando se for conveniente. Por este motivo a linguagem escrita tende a ser universal a fim de facilitar sua inteligibilidade, pois como é, na maioria das vezes, entregue fora de contexto, pode apresentar dificuldades em seu entendimento. Este é o fenômeno denominado “universalidade”, pelo 40 Software Development Kit é o nome dado ao conjunto de elementos digitais oficiais da produtora de games disponibilizado a desenvolvedores profissionais ou amadores com o intuito de descobrir novos usos e aplicações para seu material original. O material original comercializado nunca é prejudicado pela distribuição de um SDK. 34 autor. Pelo mesmo motivo que vimos anteriormente, sobre a cultura de massa, as mensagens visam também atingir o maior número de pessoas possível, o que caracteriza a “totalidade” do autor. É o mesmo princípio: a mídia que se molda para atingir o maior público molda também este público. A cibercultura, para Lévy (1999), rompe com estes dois operadores sociolinguísticos, na medida em que a mensagem pode ao mesmo tempo ser e não ser compartilhada por interlocutores em idênticas situações, além de ser entregue de forma instantânea para todos. Por outro lado, qualquer que seja essa mensagem, dificilmente estará desvinculada de outras mensagens e comentários derivados dela – isto também tem ligação com a formação de grupos sociais de interesses semelhantes na internet, as chamadas “comunidades virtuais” (LÉVY, 1999) – o que pode não fazer sentido para a “totalidade” dos espectadores. Com base nas discussões realizadas até aqui, desdobramos no próximo capítulo a questão da música de modo mais específico, ela como bem cultural inserida no universo do consumo digital. 35 3. UMA ANÁLISE CULTURAL DO CONSUMO FONOGRÁFICO CONTEMPORÂNEO O processo de adoção de um novo formato de armazenamento fonográfico exige uma readaptação dos consumidores, – que muitas vezes significa a compra de novos aparelhos para reproduzirem este novo formato e até mesmo a recompra de algum material relançado pela indústria no novo padrão (este geralmente contendo material inédito ou com qualidade sonora ou visual superior ao formato anterior) – da indústria fonográfica e da indústria de aparelhos que irão reproduzir o novo formato. Foi a partir da década de 70, junto ao surgimento de alternativas de armazenamento fonográfico mais baratas e de fácil manuseio, as fitas cassetes, e de seus gravadores, que a indústria passa a ter que lidar com uma descentralização da detenção de controle sobre meios de distribuição da música gravada cada vez maior. O aparecimento dos CDs, dos meios digitais, da informática e da internet intensificaram, ao mesmo tempo, uma democratização da música (e de materiais de outras esferas de informação) nunca vista e uma resistência ainda maior da indústria a estes fenômenos. Sem controle, e deparada com uma grande queda de faturamento, a indústria optou por demonizar a pirataria e seus praticantes duramente, lançando campanhas publicitárias que igualavam a cópia e distribuição de material fonográfico licenciado a práticas criminosas como furto. Frente o surgimento desta natureza de compartilhamento e distribuição de música na internet, a indústria da informática enxerga nas novas práticas de consumo musical neste meio a possibilidade de inovação de seu modelo de negócios e obtenção de lucro junto aos amantes de música. Em meados de 2005 surgem tecnologias alternativas e comercialmente viáveis de distribuição fonográfica digital, como o iTunes, e mais tarde a própria tecnologia do streaming, fato que contribuiu para a indústria fonográfica chegar num modelo que apresentava estabilidade e considerável concordância com os anseios de consumo de seu público. Vale notar que a evolução de formatos físicos de armazenamento sonoro vem acompanhada da evolução dos próprios arquivos sonoros, catalisada pelas inovações tecnológicas computacionais. A compressão, um processo digital que apaga informações julgadas algoritmicamente como excesso descartável de um arquivo, resultando num arquivo menor, 36 aparece como uma alternativa e game-changer41 frente uma necessidade do consumidor de armazenar o maior número de músicas possíveis num espaço virtual limitado (por exemplo, no disco rígido de um computador pessoal ou num servidor para seu compartilhamento). Tanto que o formato mais comum dos arquivos de música compartilhados na internet, desde o surgimento do Napster, em 1999, é o MP3, um arquivo de áudio gerado da compressão de um outro arquivo “oficial”, geralmente originado de uma mídia física gravada, produzida, masterizada42, digitalizada e distribuída, no caso da música, por uma gravadora, como a Sony ou a Universal. Jones (2000), por outro lado, aponta que ao mesmo tempo em que a internet possibilita ao ouvinte uma gama infinita do descobrimento de novos atos musicais, também pode sobrecarregá-lo de informação. Esse fenômeno, conhecido dentre outros nomes como information overload, também ocorre fora da internet e leva o consumidor a ignorar muitos atos musicais de qualidade em favor de outros de maior destaque (JONES, 2000). Autores também citam o “efeito amostra” (sampling effect), fenômeno onde o download ou o streaming, principalmente o gratuito, de músicas contribui para uma compra mais informada do consumidor, ponto que se mostra como um benefício da distribuição fonográfica pela internet para as gravadoras (DANGNGUYEN, DEJEAN e MOREAU, 2012) (LEYSHON, WEBB, et al., 2005) (PEITZ e WAELBROECK, 2006). O Napster foi43 originalmente um software de busca e downloads P2P criado em meio as transformações do mundo digital que possibilitavam a transferência e manipulação de arquivos sonoros digitais. Desenvolvido pelo estudante Shawn Fanning, o software funcionou entre 1999 e 2001, quando a empresa, após receber sucessivos processos – inclusive de artistas como Metallica44 e Dr. Dre45 – foi desativada sob alegação de infrações de direitos autorais, para mais tarde ser comprada pela rede de varejo americana Best Buy. Esta, por sua vez, apostando no mercado digital fonográfico, o transformou num serviço de compra de músicas online. Apesar das ações tomadas contra o Napster, é possível notar que graças a ele em 2002, por exemplo, já 41 Tradução literal “virador de jogo”, é um termo que descreve um fenômeno de características fortes o suficiente para causarem mudanças radicais ou extremas no contexto onde se inserem. 42 A masterização sonora é o último estágio analógico “puro” (sem cópia física de mídia) de uma canção gravada antes da distribuição. Neste estágio todas as características do som gravado são ouvidas, analisadas e eventualmente corrigidas para criação de uma fita “mestre” que será utilizada como matriz das cópias que serão distribuídas para o consumidor. 43 Hoje o software foi comprado pela Best Buy e se fundiu com seu próprio serviço de música digital, Rhapsody. 44 Banda de Heavy Metal americana. 45 Produtor e rapper americano. 37 existiam cerca de 1 bilhão de arquivos de música compartilhados na internet (LEYSHON, WEBB, et al., 2005). Voltando à questão do MP3, a compressão que gera este arquivo descarta diversas informações do original, como determinadas frequências ou informações de volume e dinâmicas que em conjunto dão sentido único à obra como foi idealizada e gravada pelo autor. Este ponto é apresentado como uma possível desvantagem de se disponibilizar um arquivo sonoro para serviços de streaming ou download de músicas que, na tentativa de entregar o conteúdo rapidamente ao usuário, optam por armazenar arquivos em qualidade inferior, mas que possibilitam armazenamento em escala maior e acesso instantâneo – com exceção do TIDAL, serviço de streaming que destaca seu diferencial como sendo a qualidade sonora, desde sua publicidade pré-lançamento. Artistas como Neil Young46, Taylor Swift47 e Thom Yorke48 optaram por retirar sua obra de serviços de streaming por diferentes motivos. Enquanto Young alega que a qualidade sonora dos serviços é “a pior qualidade na história da radiodifusão ou em qualquer outro meio de distribuição” (tradução nossa) (GOLDSTEIN, 2015), Yorke e Swift reclamam dos baixos royalties49 que chegam nas mãos dos artistas. Taran (2015) faz uma análise completa do sistema de pagamento de royalties do Spotify – dados também disponibilizados explicitamente pela própria empresa num site dedicado a artistas50 – provando que apenas um número de “plays” exageradamente imenso seria suficiente para que um artista pudesse dedicar-se exclusivamente a se promover e se distribuir pelo software. Por outro lado, a tecnologia apresenta facilidades ao ouvinte que, no caso do Spotify, por um valor fixo mensal (ou até mesmo uso gratuito) tem acesso a um catálogo que pode ser organizado, salvo, compartilhado como e quando lhe bem convir, tudo de dentro do software, que também está disponível numa versão mobile e que sincroniza toda a biblioteca do ouvinte entre os dispositivos. Uma playlist51 criada em seu notebook aparece em tempo real em seu celular ou tablet, desde que conectados à internet. 46 Músico e compositor canadense, participou das bandas Buffalo Springfield e Crosby, Stills & Nash. Cantora pop dos anos 2000. 48 Cantor e guitarrista do grupo Radiohead, banda precursora do gênero alternativo nos anos 2000. 49 Royalties, no mercado fonográfico, são quantias monetárias pagas aos detentores dos direitos de reprodução de músicas a cada reprodução da obra em questão. 50 Disponível em http://www.spotifyartists.com 51 Do inglês Lista de Reprodução, é uma lista ou um conjunto de músicas ordenadas para reprodução (aleatória ou não) num software ou numa mídia física (o de cassetes e CDs “virgens” – fabricados nenhum dado gravado para o objetivo de gravação do consumidor – possibilitou a criação de listas de músicas nestes formatos). 47 38 Como reportado no Digital Music Report de 2015, relatório anual produzido pela IFPI (International Federation of the Phonographic Industry) que estuda as tendências anuais do mercado fonográfico global, Ethan Rudin, executivo do Rhapsody (serviço vinculado ao novo Napster) afirma que trabalhar com um modelo freemium pode desvalorizar a música, uma vez que dá a possibilidade de o usuário free acessar o mesmo conteúdo que o assinante pago (salvas as devidas diferenças de qualidade sonora etc.) sem pagar por isto (IFPI, 2015). Para Da Silva (2013), no caso da música, uma facilidade de aquisição pode tornar o bem consumido mais facilmente descartável e, portanto, mais desvalorizado. Citamos Bartmanski (2015) anteriormente, que também comenta a relação da exclusividade e raridade de um vinil com o seu valor percebido. Já o CEO do Deezer, outro serviço de streaming fonográfico, diz que continuarão apostando no modelo freemium e que ele continuará funcionando enquanto a oferta paga continuar sendo mais atraente (e principalmente percebida como mais atraente) para o consumidor que o acesso gratuito (IFPI, 2015). Hoje, o Spotify aposta nas funcionalidades off-line, melhor qualidade sonora e na escuta sem interrupções como diferencial que fará a conversão dos usuários para a versão paga do software. E faz isso corretamente, uma vez que, como mostra o questionário aplicado, 63,3% dos entrevistados, consumidores de pelo menos um serviço de streaming fonográfico, de graça ou como assinantes, apontam o item “funcionalidades off-line” como o segundo maior atrativo num serviço de streaming de música, o primeiro sendo uma premissa básica de qualquer player do mercado: um acervo variado. Somado a tudo isso, devemos mencionar também a parte social do programa, que incita o consumidor a procurar seus amigos de outras redes sociais e adicioná-los com o objetivo de saber o que estão ouvindo, as playlists que estão criando ou seguindo, os gêneros musicais que gostam, sem contar a habilidade de compartilhar músicas e artistas ou mandar mensagens instantâneas sem deixar o aplicativo ou pausar a reprodução daquele momento. Como toda transformação de formato de arquivos sonoros atentamos também às desvantagens do streaming e do Spotify em relação ao formato predominante anterior (o arquivo MP3, ou o CD). Para identificá-las, bem como os pontos positivos, nos apoiamos num questionário aplicado via internet, no modelo survey, para uma amostra de 450 pessoas de ambos os gêneros e faixa etária entre 17 e 66 anos. 332 entrevistados são considerados válidos para este estudo, que configuram pessoas que conhecem e utilizam serviços de streaming. 39 Figura 2 - Distribuição de conhecimento e uso de serviços de streaming O Spotify é apontado por muitos consumidores como um dos melhores – quando não o melhor – serviços que assinam mensalmente. Dentre os fatores apontados como um atrativo a um serviço de streaming estão a variedade do acervo que ele oferece (o que indica que as pessoas continuam interessadas em descobrirem novas músicas além de curtirem seus grupos favoritos), funcionalidades off-line (não precisar estar conectado à internet para reprodução das músicas) – hoje o Spotify oferece esta vantagem apenas aos assinantes premium – e qualidade sonora em terceiro lugar. Curiosamente, “por trás dos panos” o Spotify funciona com arquivos MP3 com uma bitrate máxima (também apenas aos assinantes) de 320 kbps – considerada a melhor qualidade52 que um arquivo MP3 pode ter – enquanto que o TIDAL funciona com arquivos de bitrates que ultrapassam 1 Mbps (1024 kbps) o que acarreta numa qualidade sonora maior. Mesmo assim, o número de entrevistados que assinam Spotify (premium ou free) corresponde a 86,7% dos entrevistados, enquanto que os que usam TIDAL correspondem a 0,6% do total (os entrevistados podiam assinalar mais de um serviço). 52 Isolando-se as outras variáveis e considerando apenas bitrate como parâmetro de medição. 40 Figura 3 – Distribuição de uso de serviços de streaming específicos Atentamos a capacidade do Spotify de democratizar os artistas independentes ao colocá-los no mesmo canal de artistas grandes. Deste modo, bandas e produtoras que não conseguem investir em publicidade em massa podem aproveitar do software para se autopromoverem. 54,5% dos entrevistados concordam totalmente com a afirmação “O(s) serviço(s) de streaming que utilizo contribuiu/contribuíram para que eu conhecesse novidades musicais”. O app53 também possui um sistema de recomendação algorítmica que aponta artistas que o ouvinte tem chances de gostar na página de outro artista, baseado na compatibilidade de tags54. Figura 4 – Distribuição de contribuição de serviços de streaming com conhecimento de novidades musicais A questão da atividade social, na qual as pessoas, na época do vinil, se reuniam para trocar informações e discos ou terem uma experiência de escuta coletiva, também se faz presente na 53 App é uma forma curta da palavra aplicativo, para efeito deste trabalho um sinônimo de software ou programa, mas de significado geralmente atrelado a programas mobile. 54 Tags são palavras-chave inseridas ou atreladas a arquivos ou dados para facilitar a organização e categorização de seus conteúdos seja para uso de consumidor final ou de software. 41 tecnologia do streaming e no Spotify. Apesar de o serviço ter desenvolvido uma playlist (a Discover Weekly, ou Descobertas da Semana) para cada usuário e que se atualiza a cada semana com novidades musicais baseadas algoritmicamente no gosto musical do ouvinte, a curadoria humana mostra-se um fator de peso, como afirma Popper (2015), pois 81,8% dos entrevistados afirmam conhecer novas músicas, bandas ou álbuns a partir da opinião de amigos e conhecidos contra os 58% que utilizam algum software com tal função (os entrevistados poderiam assinalar mais de uma alternativa). Figura 5 – Distribuição de hábitos de conhecimento de novas músicas, artistas e/ou bandas Apesar da questão das playlists, não podemos deixar de apontar o funcionamento do Spotify como rede social musical. No painel direito da versão desktop do software (ver Figura 7) encontra-se uma coluna com todos os amigos do usuário no Spotify (que podem ser importados da rede social Facebook) bem como informações como o que estão ouvindo no momento e se a origem do clique55 de play daquela canção é algum álbum ou artista do catálogo ou alguma playlist criada ou seguida por aquele usuário. O software permite também a troca de mensagens instantâneas entre os usuários, os quais podem, além de mensagens de texto comuns, compartilhar álbuns, artistas ou canções disponíveis no catálogo e serem notificados quando o destinatário ouviu o material enviado. As playlists, inclusive, merecem destaque especial no Brasil, de acordo com Bragatto (2015): são apontadas pelos entrevistados como facilitadoras de organização de biblioteca musical (56,9%), seguidas de responsáveis por expressar como o ouvinte se sente (54,8%), trilha sonora de situações específicas (50,6%), dentre outros (BRAGATTO, 2015). O fato de estarem altamente relacionadas com cenários e momentos do cotidiano do consumidor, além da questão do “consumo para os outros” (princípios de identidade) prova que a música, que a nível técnico se resume a vibrações causadas por ondas sonoras, tem poder de comunicação 55 Consideraremos “clique” neste trabalho como o aperto de botão específico no software, seja com o auxílio de um mouse e teclado ou de uma tela touchscreen. 42 muito forte atrelado a um sistema amplo de signos e significados desafiantes, inclusive, de nosso subconsciente. As playlists, ainda, servem como uma espécie de impressão digital do ouvinte: dificilmente uma será idêntica a outra, comunicando preferências e gostos muito específicos dele. Figura 6 – Distribuição da relação geral com playlists em serviços de streaming E finalmente, o Spotify, que foi lançado incialmente para combater a pirataria de arquivos digitais sonoros, influenciou 21,1% dos entrevistados a diminuírem seu consumo de álbuns físicos, seja pela facilidade de encontrar grande parte dos álbuns no aplicativo, mesmo com acesso gratuito, e 17,5% a aumentarem sua frequência em shows e concertos. Mas é interessante notar que, como apontam DangNguyen, Dejean e Moreau (2012), os entrevistados estão muito mais abertos a afirmarem que não consumiam e continuam não consumindo álbuns físicos (visto que, na pergunta, o ato de consumir deveria ser interpretado como transação monetária), de que praticavam e ainda praticam pirataria. (DANGNGUYEN, DEJEAN e MOREAU, 2012) 43 Figura 7 – Distribuição de hábitos de consumo após uso de serviço de streaming Do lado dos artistas e das indústrias, um modelo de contrato de royalties existente há décadas somado à baixa qualidade sonora não torna a tecnologia atraente para grandes artistas, apesar da promessa de um combate à pirataria, o maior pesadelo da indústria fonográfica. Quem, todavia, se beneficia deste novo modo de distribuir, são os artistas e gravadoras independentes, que agora dispõem de uma ferramenta amplamente utilizada e desejada pelos usuários que expõe suas obras no mesmo canal que as chamadas “estrelas” do star system. Por outro lado, devemos nos atentar à necessidade de se destacar nessa multidão de artistas: o consumidor, ao abrir o Spotify, é bombardeado com informações de bandas, álbuns, singles, lançamentos e playlists: 44 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS O objetivo deste trabalho foi estudar a relação entre as novas práticas de consumo fonográfico e as tecnologias da qual os fãs de música se apropriam, com base na tecnologia do streaming e na plataforma Spotify. Como em qualquer cenário que envolve o universo digital, a passagem do tempo pode acarretar numa obsolescência das tecnologias, formatos, informações aqui apresentadas etc. Enquanto este PGE está sendo redigido, novos players podem estar entrando no mercado de serviços de streaming. Sendo assim, não se busca neste trabalho encerrar a discussão sobre novas tecnologias de consumo musical. Pelo contrário, procuramos debater as possibilidades que uma reconfiguração das práticas de consumo pode trazer para o setor, do ponto de vista dos fãs e também do dos próprios artistas. No primeiro capítulo apresentamos uma introdução contextual do cenário da música gravada, com uma descrição cronológica de acontecimentos e uma explicação sobre os formatos de armazenamento musical. Falamos da chegada da internet e da reconfiguração das relações de consumo dos fãs de música com a apropriação desta tecnologia. No segundo capítulo, embasamos a teoria deste estudo. Este compõe-se de uma primeira parte sobre o consumo, baseado numa pesquisa bibliográfica, onde comentamos a importância e as transformações da atividade do consumo no âmbito da comunicação, sociedade e cultura. A segunda parte trata mais especificamente do consumo contemporâneo, apontando a relevância da mídia para a formação do indivíduo consumidor e suas configurações culturais decorrentes. O capítulo é, então, finalizado por um texto sobre a cibercultura e as transformações em diversas áreas causadas pela apropriação sociocultural de tecnologias como a internet. O terceiro capítulo apresenta um panorama cultural do consumo fonográfico, englobando tudo o que foi discutido no capítulo anterior e especificando o tema na questão da música gravada digital, com destaque aos serviços de streaming como o Spotify. Com base nas discussões realizadas até aqui em conjunto com nossa pesquisa empírica, aplicada numa amostra de 450 pessoas, entendemos que a inovação do streaming complementa aos modos digitais já existentes de consumir música, ocasionando numa nova relação de valor entre o artista, a obra e seus ouvintes. Ao mesmo tempo, ainda não se apresenta como solução financeira final para sua produção industrial. Esta tensão de interesses determinantes do 45 mercado demanda atenção especial da indústria que, tendo errado uma vez com a postura com a qual respondeu à pirataria na internet, corre o risco de entrar em colapso. O meio no qual o streaming surge, a internet, reconfigura o sistema de produção e distribuição de conteúdo, abrindo vertentes para a questão do direito autoral. Atualmente, qualquer pessoa pode, do conforto de seus lares, criar, compor, produzir, gravar e distribuir sua própria criação na web. A música nunca esteve tão acessível, e seu valor nunca foi tão difícil de determinar. Se antes não havia outra alternativa a não ser esperar um determinado horário para se ouvir nas rádios hoje isto não é mais necessário: traduzida em bits bytes, a música é pode ser acessada a partir de um clique do mouse ou toque na tela. Os principais pontos de discussão deste trabalho são as tentativas da indústria fonográfica de controlar e deter com exclusividade os meios de produção e distribuição da música como um dia conseguiu e tendo, por outro lado, as práticas de consumo musical em transformação. Há uma dificuldade de reconfigurar antigos modelos de negócio da indústria tendo em vista as novas tecnologias apropriadas pelo consumidor. A indústria da informática busca, a partir do modelo freemium comentado anteriormente, instigar uma valorização musical e receita para gravadoras. Além disso, como comprova nossa pesquisa empírica, os serviços de streaming não eliminam formas de consumo mais tradicionais de música, mas as complementam. Se antes as poucas alternativas para o consumo de música eram o rádio e TV com grades de conteúdo fixas, além de shows ao vivo e música gravada em forma de discos, hoje a música pode, literalmente, ser acessada de qualquer lugar a qualquer momento. Durante a realização deste trabalho pudemos ter um contato melhor com um tema de importância pessoal e profissional, verificando tendências, comprovando e refutando fatos e aprendendo com erros e achismos. Percebemos que os estudos de consumo de música são muito instigantes e possibilitam uma variedade de desdobramentos. Como tratamos, ainda, de temas relacionados à cultura digital, as constantes inovações tecnológicas pedem novos estudos de suas apropriações socioculturais. Sugerimos como possibilidades futuras um detalhamento sobre a relação de valor entre a música gravada analógica e digital, um sobre as vertentes independentes contra o mainstream, dentre outros. O processo de realização de um trabalho de conclusão de curso monográfico provou-se desafiante e ao mesmo tempo prazeroso. A escolha desta modalidade abriu a possibilidade de estudos fora do escopo essencialmente mercadológico proposto durante o curso de publicidade. Pudemos entender melhor o funcionamento da indústria fonográfica, seus players e o mercado 46 e ainda analisar as práticas de seus consumidores sob uma perspectiva social e cultural. O tema escolhido nos é de suma importância pessoal e profissional e contribuição deste trabalho para nossa formação é inegável. Pelas constantes transformações nas práticas do consumidor desta quinzena século XXI e sua apropriação de novas tecnologias, devemos indicar que estudos de consumo musical se provam convidativos a uma revisita futura, numa outra oportunidade de estudo após a graduação. 47 5. BIBLIOGRAFIA ABPD. Mercado brasileiro de música 2014. Associação Brasileira dos Produtores de Discos. [S.l.]. 2015. ADORNO, T. W. Introduction to the Sociology of Music. New York: Seabury Press, 1976. APPADURAI, A. Modernity at Large: Cultural Dimensions of Globalization. Minneapolis: Minnesota University Press, 1996. BACCEGA, M. A. Introdução – Consumo e identidade: leituras e marcas. In: BACCEGA, M. A. Comunicação e Culturas do Consumo. 1ª. ed. São Paulo: Atlas, 2008. BARTMANSKI, D.; WOODWARD, I. Vinyl: The Analogue Record in the Digital Age. 1ª. ed. [S.l.]: Bloomsbury Academic, 2015. 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