Texto complementar O Nordeste e os desafios do terceiro milênio Michel Zaidan Filho GEOGRAFIA 1 Geografia Assunto: Nordeste brasileiro O Nordeste e os desafios do terceiro milênio Uma resposta possível à indagação sobre como deverá ser o Nordeste no Terceiro Milênio passa necessariamente pela questão do futuro das regiões ou das políticas regionais, em um mundo crescentemente globalizado. [...] Antes de tudo, diga-se que vivemos o paradoxo de exaltar a cultura regional nordestina, em um momento em que não há mais um Nordeste, mas vários Nordestes. Nada é mais dessemelhante da realidade do Nordeste contemporâneo do que antigos emblemas, como o cangaço, o messianismo, o velho engenho ou a seca. Esses temas pertencem à saga cultural-simbólica das oligarquias nordestinas, nascida com a Revolução de 30, com o fenômeno da decadência econômica e social desses estamentos sociais. Enquanto espaço geopolítico, o Nordeste é hoje uma justaposição de economias regionais que competem ferozmente entre si, em troca de receitas fiscais, vantagens locacionais, mão de obra barata, crédito subsidiado, etc. Essa luta encaniçada ocorre em um contexto de declínio do Estado-nação (totalmente subordinado ao interesse da especulação financeira internacional) e na absoluta ausência de políticas de combate à desigualdade regional responsabilizada pelo chamado “Custo Brasil”. [...] Assim o mais correto seria falar em Nordestes (em vez de Nordeste), pensando nos enclaves dinâmicos da economia regional, diretamente atrelados ao mercado globalizado. Exemplos? A fruticultura irrigada (Platô de Neópolis, a fruticultura irrigada de Petrolina, do Vale do Pium etc.), a indústria extrativa mineradora ou de transformação (petróleo, gesso, gipsita etc.), os polos tecnológicos metropolitanos, o turismo, a indústria de lazer e alimentação (Recife, Salvador, Fortaleza). Atividades fortemente incentivadas pelo governo federal como as mais capazes de gerar emprego e renda. A exceção, portanto, do Polo de Camaçari, da indústria têxtil do Ceará e do polo mineral-exportador do RN/SE, o Nordeste seria um “aglomerado” desconexo de economias sub-regionais estagnadas e pobres, dominadas por políticos clientelistas patrimonialistas, ou seja, não modernos. Superar esse quadro dilacerado de nossa economia regional envolveria sobretudo repensar o pacto federativo em um cenário de “soberania compartilhada”. A integração latino-americana não é incompatível com as políticas regionais. Basta ver o exemplo da União Europeia e das políticas de combate às desigualdades na Alemanha, na Espanha e em Portugal. Mas para evitar que esses processos de integração acentuem a desigualdade e a fragmentação inter-regional é necessário que os governos se preocupem em reforçar ou criar instrumentos e mecanismos que compensem as dificuldades das regiões mais pobres. Abandoná-las à própria sorte (ou se omitir), nessa competição profundamente desigual, é apostar na desintegração do país e na guerra social, enquanto motores da História. O desafio que o Terceiro Milênio reserva para o Nordeste é o de convencer as elites dirigentes e econômicas do país de que é possível se integrar na economia mundial sem abandonar seus pobres e miseráveis. E que o principal ativo de uma nação são seu povo e suas tradições culturais. Países que não têm política de desenvolvimento regional e social estão destinados a ser meras plataformas de exportação para o mundo, sem cidadãos, sem direitos, sem identidade cultural. ZAIDAN FILHO, Michel. O fim do Nordeste e outros mitos. São Paulo: Cortez, 2001. p. 43, 45-47. 1