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>>Atas CIAIQ2016 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1 Concepções de Futuros Professores de Ciências e Biologia sobre a Teoria da Evolução de Darwin 1
Vanessa Minuzzi Bidinoto , Maria Guiomar Carneiro Tommasiello
2 Colégio Militar de Santa Maria, Rio Grande do Sul, Brasil. [email protected]; 2
Curso de Pós-­‐Graduação em Educação Universidade Metodista de Piracicaba, São Paulo, Brasil. [email protected] 1
Resumo. O tema central desta pesquisa foi a Evolução Biológica de Darwin, cuja abordagem em sala de aula é um assunto que gera inúmeras controvérsias em virtude da crença que tudo foi criado por Deus. A pesquisa, de abordagem qualitativa, foi realizada com alunos e docentes de dois cursos de Ciências Biológicas e Licenciatura em Ciências. Os resultados das entrevistas apontaram que o ensino e a aprendizagem da teoria da evolução de Darwin, a despeito da sua importância para a área de Ciências e Biologia, têm sérios problemas de entendimento e de aceitação por parte dos alunos. Confirmou-­‐se a hipótese que, em geral, as pessoas, mesmo as que já tenham estudado a teoria da evolução, não veem diferenças entre o evolucionismo e o criacionismo, acreditando se tratar de uma escolha pessoal. Parte dos alunos acredita que a teoria de Darwin é apenas uma “teoria”, algo ainda a ser provado. Palavras-­‐chave: Darwin, evolucionismo, criacionismo, ensino de Biologia Título do artigo em inglês: Conceptions of future teachers of Sciences and biology on the theory of evolution of Darwin Abstract. The central theme of this research was the theory of Biological evolution of Darwin, whose approach in the classroom is a subject that generates considerable controversy because of the belief that everything was created by God. This research, of qualitative approach was conducted with students and professors of two courses of Biological Sciences. The results of the interviews showed that the teaching and learning of Darwin's theory of evolution, despite its importance for the area of Sciences and Biology, have serious problems of understanding and acceptance on the part of students. The hypothesis was confirmed that, in general, people, even those who have already studied the theory of evolution, not seeing differences between evolutionism and creationism, believing it is concerned a personal choice. Part of the students believes that the theory of Darwin is only a "theory", something still to be proven. Keywords: Darwin, Evolutionism, creationism, teaching of Biology 1 Introdução O tema central desta pesquisa é o ensino/aprendizagem da teoria da evolução de Darwin. Charles Darwin (1809-­‐1882), cuja conjectura constitui a base da teoria evolutiva moderna, defendeu que a diversidade biológica se deve a um processo de variabilidade genética, em grande medida, da ação da seleção natural. Subjacente a esta teoria encontram-­‐se conceitos distintos, embora interligados, nomeadamente a ideia de evolução enquanto tal, ou seja, a de que o mundo não é constante nem perpetuamente cíclico, mas que está em mudança permanente, e os organismos têm-­‐se transformado no decurso do tempo; a ideia de ancestralidade, na qual cada grupo de organismos descende de uma espécie ancestral; e a ideia de seleção natural, como principal mecanismo de mudança evolutiva, sendo responsável pela construção gradual de adaptações (Mayr, 2009). Conforme Ridley (2006), a Teoria Darwiniana é considerada um paradigma nas Ciências Biológicas, tanto por sua capacidade de integração teórica de diferentes campos da Biologia quanto por sua extensa corroboração empírica. A Teoria Evolutiva substitui a visão estática das espécies por processos seletivos e adaptativos, bem como pela existência de uma filogenia. 1015 >>Atas CIAIQ2016 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1 A resistência à aceitação da teoria pelos criacionistas se deve à crença de que a Bíblia traz a verdade. Com base em Tidon & Vieira (2009), os criacionistas acreditam que a criação aconteceu 6 mil anos atrás e que ocorreu desenvolvimento profundo entre as espécies. A autora compreende que alunos e até professores de Ciências, em algum momento, enfrentam um conflito na profissão. O fato de acreditar em Deus, no entanto, não faz do cientista um criacionista. Apesar de aceitar algumas conclusões de Darwin, os criacionistas usam a Bíblia como fonte de indícios para a evolução e tentam relacionar o sobrenatural e a Ciência. Existem pelo menos três grandes tipos de criacionistas: 1. Criacionistas da Terra Jovem, chamados de YEC (Young Earth Creationist); 2. Criacionismo da Terra Antiga e 3. Evolucionismo Teísta. Para o “evolucionista teísta forte”, Deus interfere direcionando a evolução e para o “evo teísta fraco” Deus estaria por trás das leis naturais, não interferindo na evolução. O padre jesuíta Teilhard de Chardin (1881-­‐1995) procurou construir uma visão integradora entre Ciência e Teologia criando o termo criacionismo científico que desembocou na ideia do Design Intelligent que considera que a vida na Terra não evoluiu naturalmente, mas foi sim, projetada e guiada por um Criador. É uma hipótese que não pode ser testada, mas é tida como uma “teoria” pelos criacionistas. Nesses últimos anos no Brasil, observa-­‐se o aparecimento, nos centros urbanos, de vários grupos religiosos Pentecostais e Neopentecostais, com aumento vertiginoso do número de adeptos, que passaram a disputar espaço com afinco com outras formas de produção de sentido e explicações para a vida humana e para o mundo a sua volta (Dorvillé, 2010). E também há no Brasil vários profissionais de renome, que atuam em universidades públicas e privadas, defendendo o criacionismo, com base no design intelligent. Para muitos, a teoria de Darwin continua a ser uma “teoria”, ou seja, na acepção popular da palavra, que quer dizer algo ainda não provado. A teoria evolucionária, apesar de sua grande importância, acaba desafiando várias crenças de cunho religioso, ideológico, filosófico e epistemológico, tornando dessa forma a abordagem em contexto na sala de aula de uma forma difícil, tanto por parte dos professores, quanto pela aprendizagem dos alunos (Almeida & Falcão, 2005). A Teoria Evolutiva, embora corroborada por evidências científicas, segundo Oleques et al (2011b) ainda causa dilemas no pensamento de professores da área biológica, ocasionado pelo conflito de ideias defendidas pela teoria com outros aspectos sociais, religiosos e principalmente epistemológicos. Entre os diversos conteúdos do campo da Biologia, a Evolução dos seres vivos apresenta um papel de relevância, pois fornece uma base conceitual para a compreensão de inúmeros fenômenos relacionados à vida. Mesmo a Evolução sendo um tema norteador para a compreensão dos diversos fenômenos biológicos, refletindo assim nas propostas oficiais de ensino, pesquisas recentes têm mostrado que este tema não é considerado tão importante pelos professores de Ensino Fundamental e Médio (Cicillini, 1997). Para Tidon & Lewontin (2004) a abordagem do tema geralmente acontece no final do terceiro ano do Ensino Médio, sendo este desconectado dos assuntos discutidos nos anos anteriores, bem como, dos demais temas tratados em aula. O bioquímico americano Bruce Alberts (2012, p. 32) relata que os pesquisadores da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos ficaram surpresos ao descobrir que adultos com formação universitária não viam nenhuma diferença entre os “dogmas” da ciência e os dogmas dos pastores. As pessoas achavam que podiam escolher qualquer um dos dois tipos de dogma, o da ciência ou o do criacionismo. Esse autor considera que isso ocorre por que ensinamos ciência como dogma e não explicamos com evidências e experimentos científicos de onde vêm as ideias. A preocupação presente dos pesquisadores da área de Biologia é o ressurgimento do fundamentalismo bíblico em pleno século XXI. E esse problema está imbricado com a forma que ensinamos a teoria da evolução nas escolas. Assim, a questão de investigação é: como os futuros professores de Biologia vão 1016 >>Atas CIAIQ2016 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1 ensinar a teoria da evolução, tendo em vista o seu conhecimento sobre a teoria e suas concepções religiosas? Dessas acepções, a pesquisa teve como hipótese que, em geral, as pessoas, mesmo as que já tenham estudado a teoria da evolução, como é o caso dos alunos universitários, não veem diferenças entre o evolucionismo e o criacionismo, acreditando se tratar de uma escolha pessoal. Teve por objetivo conhecer as concepções de professores e futuros professores de Ciências e Biologia sobre a Teoria da Evolução de Darwin, tendo em vista as influências de suas concepções religiosas, e analisar as implicações destas para o ensino de Ciências e Biologia. 2 Metodologia Esta pesquisa caracteriza-­‐se como uma pesquisa qualitativa uma vez que busca “descrever e compreender um fenômeno, e não explicá-­‐lo ou fazer previsões”(Ollaik & Ziller, 2012, p. 232). Com o objetivo de conhecer as concepções dos professores e futuros professores de Ciências e Biologia sobre a teoria da evolução de Darwin e as implicações destas para o ensino optamos pela realização de entrevistas semi-­‐estruturadas. Posto que, segundo Duarte (2004, p.215) “as entrevistas são fundamentais quando se precisa/deseja mapear práticas, crenças, valores e sistemas classificatórios de universos sociais específicos, mais ou menos bem delimitados, em que os conflitos e contradições não estejam claramente explicitados”. As entrevistas foram realizadas com acadêmicos, futuros professores, e com os seus respectivos professores de dois cursos de Graduação: Ciências Biológicas e Licenciatura em Ciências. O primeiro em uma Universidade privada e o segundo em uma Universidade Pública, ambos localizados em uma cidade do interior de São Paulo, nas disciplinas de “Evolução” e “Diversidade Biológica e Filogenia”, que também foi escolhida em virtude de que no momento da construção dos dados estava sendo trabalhado o tema evolução biológica. As entrevistas ocorreram nos campi das universidades, após as aulas das disciplinas citadas. Foram audiogravadas, transcritas e posteriormente organizadas em torno de núcleos de sentido, nos quais aproximamos “respostas semelhantes, complementares ou divergentes de modo a identificar recorrências, concordâncias, contradições, divergências etc.” (Duarte, 2004, p.222) e que nos levassem à resposta do problema da pesquisa. Buscamos como método de análise dos dados a análise de conteúdo, que segundo a perspectiva de Bardin (2004, p. 38), a característica principal está na atitude interpretativa do pesquisador em compreender o que está sendo pesquisado e “conhecer aquilo que está por trás das palavras sobre as quais se debruça”. Com o objetivo de descobrir os núcleos de sentido que compõem a comunicação dos professores e alunos, foi construída uma grade analítica adaptada do trabalho de Silva & Carvalho (2011) contendo: -­‐ Unidade de contexto/significação: serve de unidade de compreensão para codificar a unidade de registro e corresponde ao segmento da mensagem, cujas dimensões são superiores as da unidade de registro (BARDIN, 2004). Permitem compreender a significação da unidade de registro. -­‐ Unidade de registro: é a unidade de significação a codificar que corresponde ao segmento de conteúdo considerado como unidade base para a categorização (BARDIN, 2004). Neste trabalho é representada por frases e parágrafos das entrevistas. -­‐ Termo-­‐chave: são os termos que se encontram presentes nas unidades de registro e servem para selecionar tais unidades. -­‐ Respondentes: alunos e professores identificados por meio de um nome fictício -­‐ Frequência: número de respostas em porcentagem 1017 >>Atas CIAIQ2016 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1 Foram realizadas individualmente 28 entrevistas com alunos da graduação e 02 com docentes, captadas por um gravador e transcritas na íntegra. Partimos de um questionamento predeterminado, mas fazendo o aproveitamento de outros assuntos, redefinidos no decorrer da conversa. As perguntas foram as seguintes: 1) O que significa para você a palavra evolução?; 2) Quais as ideias principais da teoria da evolução de Darwin?; 3) Podemos considerar que a evolução de Darwin já está comprovada? 4)E quanto ao criacionismo? Qual a sua opinião? 5) Você acha que os professores de Biologia devem ensinar a teoria da evolução e também o criacionismo? Na análise dos dados buscou-­‐se desconsiderar todas as perguntas das entrevistas e, ao mesmo tempo, incluir todas as respostas como um corpus de estudo. A partir das perguntas e das respostas, foram estabelecidas as unidades de contexto, que segundo Bardin (2004) servem de unidade de compreensão para codificar a unidade de registro e correspondem ao segmento da mensagem, cujas dimensões são superiores às da unidade de registro. As respostas foram, então, agrupadas em quatro grandes unidades de contexto/significação (ao redor dos quais o discurso se organiza): 1-­‐Conhecimentos sobre a teoria da evolução; 2-­‐Conhecimentos sobre as comprovações da teoria da evolução; 3-­‐Opiniões sobre o criacionismo; 4-­‐Opiniões sobre o ensino da teoria da evolução. 3 Resultados e Discussão Participaram 15 estudantes do gênero feminino e 13 do gênero masculino cursando o III e o V semestre de cursos de Licenciatura em Ciências e de Ciências Biológicas, respectivamente. A maioria deles encontra-­‐se na faixa etária dos 21 a 30 anos, grande parte católica e sem religião, sem experiência com a docência. Quanto aos professores, uma tem 53 anos e segue a doutrina espírita, com doutorado em Zoologia e o outro tem 37 anos, da religião celta, com doutorado em ecologia e recursos naturais. Por uma questão de espaço não serão apresentadas as grades analíticas com as respostas dos 30 entrevistados e sim os seus conteúdos sintetizados. 3.1-­‐ Unidade de Contexto: Conhecimentos sobre a teoria da evolução Unidades de registro Vinícius : Mudanças que os seres desenvolvem para se adaptarem aos ambientes (...) Théo : A evolução eu acho que é o progresso (...) Helena: Evolução é um processo adaptativo em relação às condições ambientais(...) Pedro: Olha, evolução eu vejo de que é a continuidade! TEMPO! Ester: algo que era mais primitivo e passou por um:: um processo de algo mais recente Profª Lorena: (...) nós viemos de um mesmo ancestral(...) Prof. Luiz: Acaso é uma força que está sendo manipulada, a gente considera como o acaso porque a gente não sabe o que está por trás. Temos-­‐chave e frequência Adaptação: 43%; Mudança: 30%; Evolução: 16%; Progresso: 13%; Transformação: 10%; Modificações; ancestral comum: 6%; Processo; continuidade; acaso; desenvolvimento: 3%. Se considerarmos os termos mudança, transformação e modificações como sinônimos, 46% das respostas contemplam essa ideia, de transformação no âmbito biológico, frente às condições 1018 >>Atas CIAIQ2016 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1 ambientais. De forma similar ao trabalho de Oleques et al (2011a), em geral os alunos/professores não percebem a evolução como transformação também no seu aspecto cultural. Cerca de 43% dos entrevistados entendem a evolução como adaptação. Para Sepúlveda & El Hani (2007, apud Oleques et al., 2011a) a etimologia da palavra adaptação, a partir dos termos latinos ad + aptus, significa em direção a um ajuste. Observando as falas dos alunos tal como Oleques et al (2011a, p. 251) a evolução pode estar sendo interpretada como um processo em direção a causas finais, ou seja, a evolução biológica tem um objetivo. Essa informação mostra que o professor não compreende que os mecanismos de evolução têm um componente estocástico. Cabe destacar que Adaptação é um termo bastante utilizado na Biologia, mas não é facilmente definido. No caso de significar evolução temos que nos atentar que uma característica é uma adaptação se e somente se ela for produto de seleção natural, segundo Sober (2001). Cerca de 13% dos entrevistados fizeram referência ao termo progresso. Têm uma visão que os seres vivos evoluem para um aperfeiçoamento, estão melhorando com o passar do tempo, ou seja, têm uma visão lamarckista de acordo com Oleques et al, (2011a, p. 31). Bizzo (1994) em uma pesquisa com estudantes também observou que eles entendem a evolução como progresso, aperfeiçoamento, crescimento, veem o processo evolutivo como algo positivo. Já os termos evolução, desenvolvimento, processo e continuidade estão vinculados a uma ideia de algo unidirecional, preditível, ocorrendo em direção a uma causa final positiva, segundo Oleques et al (2011a). Quanto aos termos ancestral comum e acaso, sozinhos não representam o conceito de evolução uma vez que são parte da teoria evolutiva. 3.2. Unidade de Contexto: Conhecimentos sobre as comprovações da teoria da evolução Unidades de registro Vinícius: Ela não está comprovada, por isso é uma teoria (...) Théo : Ah! da minha cabeça eles já comprovaram sim, agora cientificamente Pedro: Por exemplo, em relação a nós humanos, que viemos da evolução do macaco. Eu não concordo. Não concordo que seja a única verdade! Mateus: ela tem alguns fatos e algumas ideias que não foram testadas. Pra mim é uma teoria, que está comprovada em partes. Prof. Luiz: na verdade não é uma coisa que surgiu do nada assim, que é uma coisa que ao longo de milhares de gerações foi se aprimorando até chegar na perfeição dessa estrutura que nós temos hoje em dia. Profª Lorena: A ciência já comprovou a evolução, a genética já comprovou isso... Termos-­‐Chave e frequência Teoria ainda não comprovada: 10%; Teoria comprovada em parte: 40%; Teoria totalmente comprovada: 50%. Os dados indicam que cerca de 50% dos professores em formação acreditam que a teoria da evolução esteja totalmente comprovada (citam fatos genéticos 13%; tentilhões 10% e fósseis 7%). Os alunos restantes falam de outros fenômenos considerados por eles como provas (girafa, dinossauro, pato, deriva continental, dentre outros). Mas o percentual de alunos da graduação que acredita que ela esteja comprovada apenas em parte é significativo, totalizando 40% das opiniões. E 10% deles consideram a teoria da evolução como uma teoria ainda não comprovada. Ou seja, metade dos alunos entrevistados não acredita que a teoria da evolução esteja provada cientificamente. Segundo um dos alunos, o que é apresentado para validar a teoria da evolução são evidências e não provas científicas: “são evidências que estão aí e que todos possam ver e tirar as suas 1019 >>Atas CIAIQ2016 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1 conclusões (...). O professor ouve a explanação desse aluno e não faz considerações sobre o que seriam provas e o que seriam evidências em ciência, de forma a esclarecer as dúvidas dos alunos. Parece haver, por parte dos alunos, uma subestimação do papel das confirmações (ou provas) da teoria da evolução por meio das evidências empíricas. Cabe lembrar que a Teoria da Evolução é um modelo científico, sendo que quando se refere à Teoria Evolutiva, a palavra “teoria” é usada como um conjunto de princípios que descrevem os processos causais da evolução (Futuyma, 1992). Em geral, os alunos têm uma visão de um suposto método científico como um algoritmo único, bem definido, infalível (Gil Perez et al, 2001), por isso creem numa prova definitiva para a teoria da evolução. O que se percebe é que muitos alunos desconhecem a História e a Filosofia da ciência, bem como a Natureza da Ciência e assim, não têm condições de entender como a ciência se organiza. 3.3. Unidade de Contexto: Opiniões sobre o criacionismo Unidades de registro Vinícius: (...)no meu íntimo (a teoria da evolução) comprova mais ainda a existência de Deus. (...) todos os pais deveriam ensinar sobre Deus ou sobre o criacionismo para seus filhos (...) para que eles possam estar preparados para se defender e decidir em quem acreditar. Théo: Adão, Eva, sabe? Isso daí eu não acredito. (...) mas não veio do macaco, eu acho que já era o homem só que ele era diferente.... Melissa: (...) deve ser respeitada a religião de cada aluno, de cada indivíduo, mas isso (o criacionismo) não pode ser abordado de forma nenhuma na sala de aula. Afonso: Eu penso que deveria se ensinar todas as teorias seja ela criacionismo ou seleção natural Pedro: em relação à questão dos animais e das plantas eu acredito sim que possa ter havido. Termos-­‐chave e frequência O criacionismo é uma crença religiosa: 53%; Existe a evolução, mas Deus criou todas as coisas: 23%; O criacionismo é também uma teoria, como o evolucionismo: 17%; Existe a evolução para os animais, mas Deus criou o homem: 3%; Há uma lacuna na teoria da Evolução sobre a criação do homem: 3%. Para 53% dos entrevistados a concepção de que “O criacionismo é uma crença religiosa” e, como tal, não deve ser trabalhada na escola. A crença de cada indivíduo a respeito da fé e dos seus princípios ideológicos não interfere desta forma na ciência sendo possível conciliar fé com razão. Neste grupo há predominância de indivíduos sem religião, seguidos pela religião católica e sem experiência no ensino. Mas mesmo os que consideram que o criacionismo é uma crença religiosa e, por isso, deve ficar fora da escola, não se posicionam claramente como evolucionistas. Provavelmente, as pessoas não se declaram evolucionistas, pois isso equivaleria a dizer que não acreditam em Deus e para Bizzo; Gouw & Pereira, (2013, p. 27), mesmo não tendo fé religiosa “não duvidar das palavras de Deus tende a ser, nessa situação, a alternativa mais simpática ou mais respeitosa”. Entretanto para Sober (2001) a crença na teoria evolucionista não é o mesmo que ateísmo, pois considera a teoria evolucionista atual neutra em relação à existência de Deus. Para o autor, a teoria evolucionista pode ser complementada com uma alegação, pró ou contra, a existência de Deus. Por outro lado, há controvérsias, segundo Gleiser (2015) com atitudes intermediárias e conciliatórias entre fé e ciência, pois o objetivo da ciência é descobrir as leis que regem a matéria, não existindo espaço para o sobrenatural. 1020 >>Atas CIAIQ2016 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1 Observa-­‐se que 23% dos entrevistados acreditam que “existe a evolução, mas Deus criou todas as coisas”, sendo em grande parte pertencentes à religião católica, seguidos da crença espírita, e sem experiência com o ensino. Mais 6% dos estudantes acreditam na teoria da evolução, mas não para o homem. São ideias próximas as dos evolucionistas teístas. Lembrando que no evolucionismo teísta Deus põe em movimento processos evolucionistas cegos, que uma vez em movimento são suficientes para explicar as características dos organismos (Sober, 2001). Um grupo correspondendo a 17% acredita que “O criacionismo é também uma teoria, como o evolucionismo”, não havendo diferença desta forma entre o conhecimento científico e as ideias do senso comum. Consideram que tanto o evolucionismo quanto o criacionismo devem ser ensinados na escola Pelos dados, grande parte dos futuros professores de Ciências e Biologia vivem essa polêmica entre a Ciência e a Religião, em virtude de suas crenças pessoais. Assim, as respostas estão mais próximas do criacionismo, que Deus seria o responsável pela vida e pela diversidade biológica. Concordamos com Licatti & Diniz (2005, p. 11) que ensinar Biologia sem a teoria da evolução como base pode levar a uma “visão fragmentada do conhecimento biológico e a um ensino voltado para a memorização de estruturas sem uma rede conceitual que relacione os diversos conhecimentos sobre a vida”. 3.4. Unidade de contexto: Opiniões sobre o ensino da teoria da evolução Unidades de Registros Vinícius: apresentar a teoria da evolução como ela realmente é: uma teoria! E deixar que os alunos decidam se é verdade ou não. Melissa: Somente passaria a teoria da evolução! Afonso: Eu passaria as duas! Eu digo assim, a gente pode ter seleções, modificações, transformações, mas há alguma coisa por trás que é divina... Termos-­‐chave e frequência Ensinar só a teoria da evolução: 40%; Ensino da teoria da evolução mencionando o criacionismo: 10%; Ensino da teoria da evolução e do criacionismo: 40%; Não ensinar nem evolução, nem criacionismo: 3%. Grande parte só ensinaria a teoria da evolução. Mas muitos não veem diferenças entre o evolucionismo e os dogmas da Igreja, cujas crenças se baseiam no criacionismo e no design inteligente. Podemos perceber através de suas falas que eles acreditam que possam escolher em qual acreditar: se no conhecimento científico ou no dogma religioso e assim contribuirão para que seus futuros alunos não vejam diferenças entre o que é ciência e o que é dogma. Nota-­‐se a confusão entre ciência e senso comum. Em virtude de muitos deles desconhecerem a natureza da ciência entendem o criacionismo como uma “teoria válida” e por isso acabam deixando livre para os alunos escolherem qual seguir. Conclusões O objetivo do trabalho foi atingido uma vez que pudemos responder à questão de investigação e conhecer as concepções de professores e futuros professores de Ciências e Biologia sobre a Teoria da Evolução de Darwin. Muitos alunos não têm conhecimentos adequados sobre a teoria da evolução e nem sobre a sua comprovação. A maioria entende a evolução como adaptação, mas em função dos 1021 >>Atas CIAIQ2016 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1 diferentes significados do termo, há o que Sepúlveda & El-­‐Hani (2007, p.2) consideram como uma confusão semântica, pois os alunos tanto se referem a “mudanças fisiológicas ocorridas ao longo da vida de um organismo, como para designar mudanças evolutivas que ocorrem ao nível de populações, ao longo da filogênese”. Com relação à aceitação da teoria da evolução, 50% dos entrevistados acreditam que a teoria da evolução esteja totalmente comprovada, mas o percentual de alunos da graduação que acredita que ela esteja comprovada apenas em parte é significativo, totalizando 40% das opiniões. E a maioria não conhece ou não cita as descobertas mais recentes sobre a teoria da evolução, o chamado Neodarwinismo. Eles desconhecem ou não aceitam as provas ou, muitas vezes, conhecem pouco, de forma insuficiente para ensinar Ciências da maneira como ela deve ser ensinada: com comprovações científicas. Quanto ao ensino da teoria, 40% dizem que só ensinariam essa teoria-­‐ sem fazer referência ao criacionismo-­‐, quando estiverem atuando como professor. Mas parte significativa dos futuros professores apresentou sérios problemas de entendimento e de aceitação da teoria da evolução de Darwin. Muitos alunos consideraram a teoria da evolução uma teoria no mesmo nível do criacionismo ou do design inteligente. A forma como grande parte dos futuros professores ensinaria a teoria da evolução pode contribuir para que seus alunos não entendam as diferenças entre o que é ciência e o que é dogma. Assim, confirma-­‐se a hipótese que, em geral, as pessoas, mesmo as que já tenham estudado a teoria da evolução, não veem diferenças entre o evolucionismo e o criacionismo, acreditando se tratar de uma escolha pessoal.
Os resultados, similares a de outros pesquisadores (Bizzo, 1994; Cicillini, 1997; Licatti; Diniz, 2005; Carneiro, 2004; Sepúlveda & El-­‐Hani, 2009; Pagan, 2009; Oleques, 2010), são alarmantes, uma vez que os entrevistados serão professores de Biologia. Os currículos dos cursos analisados apontam que são poucas as aulas destinadas às ideias de Darwin, de forma similar a outros cursos de Biologia, nos quais a evolução é trabalhada no âmbito de uma disciplina específica. Como recomendação à área, indicamos que a evolução deveria ser o eixo principal do curso, portanto, seria imprescindível a mudança curricular dos cursos de Licenciatura em Ciências e Ciências Biológicas de forma a permitir uma formação integral do licenciando sobre o conteúdo de evolução biológica, bem como de possibilitar um aprofundamento na História, Filosofia e Natureza da Ciência. Além disso, é preciso materiais didáticos adequados para não reforçarem as interpretações errôneas sobre a evolução. Por outro lado, Shapin (2010) pondera que é possível realizar bons trabalhos em áreas específicas da Biologia, sem o conhecimento dessa teoria. Por exemplo, pode-­‐se estudar sobre a vida sexual de vermes marinhos, sobre a fotossíntese das algas ou falar sobre a sequência de nucleotídeos em genes de câncer do seio sem se remeter à evolução. Contudo, para esse autor, esses especialistas são incapazes de enunciar os supostos fundamentos de suas práticas. A título de finalização, consideramos que, devido à evolução de Darwin ser um dos eixos principais da Biologia, não ensiná-­‐la ou ensinar de forma simplista ou superficial compromete o ensino de Biologia e a formação tanto do professor como do bacharel. Além disso, conhecer a teoria da evolução com profundidade nos ajudaria a respeitar a trama da vida e a admirar/preservar a biodiversidade. Referências Alberts, B. Ensinar Ciência é preciso (2012). In Marcos Pivetta e Fabrício Marques. São Paulo: Fapesp. Edição 199. Disponível em: http://revistapesquisa.fapesp.br/2012/09/14/bruce-­‐alberts-­‐ensinar-­‐
ciencia-­‐epreciso. 1022 >>Atas CIAIQ2016 >>Investigação Qualitativa em Educação//Investigación Cualitativa en Educación//Volume 1 Almeida, A. V. & Falcão, J. T. da R.(2005). A Estrutura histórico-­‐conceitual dos programas de pesquisa de Darwin e Lamarck e sua transposição para o ambiente escolar. Ciência & Educação, 11, 1, 17-­‐
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