ENSINO DE FILOSOFIA: A HISTÓRIA DA FILOSOFIA E A PRÁTICA NO MUNDO André Luiz Silva Ferreira (Filosofia-UEL) Orientador: Prof. Dr. Arlei de Espíndola RESUMO Estamos vivendo um período de grande importância para todos que trabalham com o ensino de filosofia no Brasil. Depois de quase quarenta anos fora do currículo oficial das escolas brasileiras, esta disciplina volta a ser obrigatória no ensino médio. Esse estado de coisas traz também a necessidade de se refletir sobre a formação de professores e sobre as condições adequadas para a realização da função de docente no ensino médio. Neste contexto podemos perceber que o Programa Institucional de Bolsas de Iniciação a Docência – PIBID, constitui-se num aliado valiosíssimo para o curso de graduação em filosofia da Universidade Estadual de Londrina – UEL. Através deste projeto alunos da graduação puderam exercitar-se na prática docente, testar métodos, com apoio de recursos federais. As reflexões que apresentamos neste trabalho são motivadas pela nossa experiência como estagiários do PIBID. Discutimos aqui a metodologia que se adota para o ensino da filosofia nas escolas brasileiras. O objetivo é mostrar que através do contato com a história da filosofia pode se perceber que esta disciplina lida com problemas que estão diretamente relacionados com as questões da prática dos homens no mundo. A filosofia é fruto do cotidiano e sempre a ele está ligada. Palavras- chave: Ensino de Filosofia; História da Filosofia; Prática no Mundo. 50 A filosofia se destina ao homem e a todos diz respeito. (Karl Jaspers) 1. A Filosofia de volta à escola: o papel reservado e os desafios que se colocam a esta disciplina. Estamos vivendo um momento de grande importância para aqueles que trabalham com o ensino de filosofia no Brasil. Ao mesmo tempo em que há motivos suficientes para comemoração, não se pode perder de vista a quantidade de trabalho que os próximos anos reservam. O motivo para este estado de coisas é o seguinte: Há pouco tempo presenciamos a promulgação da lei 11. 684, a qual “altera o art. 36 da Lei no 9.394, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir a Filosofia e a Sociologia como disciplinas obrigatórias nos currículos do ensino médio” 1. A filosofia havia sido excluída em 1971, durante o regime militar. Naqueles anos, conteúdos do tipo filosófico perderam, progressivamente, espaço por não se adequarem aos interesses políticos do grupo que assumiu o poder. Durante os anos 60, com o impacto da ideologia da cultura tecnicista, de influência norte-americana, a educação humanista, dita clássica, sofreu grande abalo. O ensino de Filosofia, assim como o do Latim, por exemplo, acabou cedendo à formação científica, que passou a significar uma suposta modernização e adequação às novas demandas da realidade econômica do país2. Foi preciso esperar quase quarenta anos para ver o retorno, oficial, desta disciplina às escolas brasileiras. Agora podemos saldá-la, dar lhe as boas vindas. Juntamente com a Sociologia, esta já chega, no entanto, 1 Lei promulgada em 02/ 06/ 2008. o texto pode ser encontrado https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11684.htm integralmente em: 2 BIRCHAL, T; KAUARK, P; MARQUES, M. Filosofia: proposta curricular. Secretaria de Estado de Educação – Minas Gerais. p. 6. 51 carregando uma responsabilidade grande. Podemos perceber que o quadro mudou bastante desde aqueles anos de chumbo até nossos dias. A Filosofia e a Sociologia assumem hoje um papel importantíssimo. O tamanho das esperanças postas nestas disciplinas, nos conhecimentos que as compõe, pode ser avaliado ao se olhar para o discurso, na época da promulgação da lei que as trazia de volta, do então ministro da educação Fernando Haddad. Precisamos [dessas duas matérias] para nos facilitar o exercício e o direito à cidadania. Essa lei recupera o direito fundamental de aprender no sentido amplo da palavra, no sentido de se apropriar ao mesmo tempo em que se coloca crítica frente ao que se aprendeu 3 . Nos dias de hoje o Estado espera que o contato com os conteúdos filosóficos, e também com os de sociologia, prepare os jovens brasileiros para o exercício da cidadania. Esta meta fica explicita não apenas no discurso do ministro, mas também nos documentos oficiais que tratam da educação no Brasil, como por exemplo, no inciso III do § 1o do Artigo 36 da Lei de Diretrizes e Bases (Lei nº 9.394), onde lemos que o educando ao final do ensino médio deve demonstrar o “domínio dos conhecimentos de Filosofia e de Sociologia necessários ao exercício da cidadania” 4. Nada mais justo do que esperar que a filosofia possa auxiliar na formação moral, cívica, humana dos nossos jovens. Como observa Karl Jaspers, em sua Introdução ao Pensamento Filosófico, a filosofia busca caminhos que possam levar o homem à virtude: “A filosofia entrevê os critérios últimos, a abóboda celeste das possibilidades e procura, à luz do aparentemente impossível, a via pela qual o homem poderá enobrecer-se em sua existência empírica” 5. Mas, em suma, a questão aqui é a seguinte: agora, a filosofia recupera seu espaço como disciplina obrigatória no 3 A matéria sobre a promulgação da lei, contendo a fala de Haddad, pode ser lida online em: http://www.folhadaregiao.com.br/Materia.php?Canal=Arquivo&id=92370 4 Orientações Curriculares para o Ensino Médio – OCEM: ciências humanas e suas tecnologias. Brasília: Ministério da Educação - Secretária de Educação Básica, 2006. p 21. 5 JASPERS, K. Introdução ao pensamento filosófico. 3. ed. São Paulo: Cultrix, 1965. p 138. 52 currículo oficial das escolas, depois de tantos anos, e de saída tem de enfrentar um desafio desta magnitude. Preparar os jovens para o exercício da cidadania, este é o ponto que justifica a volta desta disciplina ao currículo. Para que esse objetivo possa ser atingido ainda há de se trabalhar e discutir muito. Como os documentos oficiais reconhecem. Nas Orientações Curriculares Para o Ensino Médio- OCEM, lemos : O tratamento da Filosofia como um componente curricular do ensino médio, ao mesmo tempo em que vem ao encontro da cidadania, apresenta-se, porém, como um desafio, pois a satisfação dessa necessidade e a oferta de um ensino de qualidade só são possíveis se forem estabelecidas condições adequadas para sua presença como disciplina, implicando a garantia de recursos materiais e humanos. Ademais, pensar a disciplina Filosofia no ensino médio exige também uma discussão sobre os cursos de graduação em Filosofia, que preparam os futuros profissionais, e da pesquisa filosófica em geral, uma vez que, especialmente nessa disciplina, não se pode dissociá-la do ensino, da produção filosófica e da transmissão do conhecimento. Considerando a reflexão acerca da Filosofia no ensino médio, cabe mencionar uma dificuldade peculiar: trata-se da reimplantação de uma disciplina por muito tempo ausente na maioria das instituições de ensino, motivo pelo qual ela não se encontra consolidada como componente curricular dessa última etapa da educação básica quer em materiais adequados, quer em procedimentos pedagógicos, quer por um histórico geral e suficientemente aceito6. Àqueles que trabalham com o ensino de filosofia o desafio que se coloca é, além de cumprir o papel de auxiliar os jovens no processo de amadurecimento para o exercício da cidadania, antes de tudo construir condições adequadas para o exercício da função de educador. Tanto no que 6 OCEM. Op. cit.; p. 15- 16. 53 diz respeito à formação humana como também no que diz respeito a materiais didáticos adequados. 2. O programa institucional de bolsas de iniciação à docência: a metodologia de trabalho do PIBID - UEL - Filosofia. Como os documentos que tratam da educação sinalizam, há que se refletir sobre a formação de professores, sobre o papel dos cursos de graduação. É neste contexto que podemos perceber o seguinte ponto: o curso de graduação em Filosofia da Universidade Estadual de Londrina encontrou no Programa Institucional de Bolsas de Iniciação a Docência (PIBID), um aliado valiosíssimo. O autor deste texto fez parte do primeiro grupo de alunos bolsistas do PIBID UEL subprojeto filosofia. Nesta primeira edição 14 alunos da graduação tiveram a oportunidade de ter contato prolongado com a sala de aula, se exercitar na pratica docente, preparando-se, com apoio de recursos públicos, para o grande desafio de apresentar as especificidades do pensamento filosófico aos jovens brasileiros. Além do amadurecimento individual destes futuros professores, o projeto ainda teve como resultado um livro que pretende ser um instrumento para auxiliar o docente do ensino médio no seu exercício. Também as reflexões que apresentamos neste texto são motivadas pelas experiências que tivemos durante o tempo em que fizemos parte do grupo de estagiários do PIBID. Semanalmente o grupo se reunia na escola para realizar oficinas com os alunos do ensino médio. Aqueles que freqüentaram as atividades foram, de maneira geral, apresentados aos diferentes momentos da história da filosofia. Desde pensadores da antiguidade até contemporâneos. No contexto de uma educação fortemente marcada pela tradição tecnicista que nosso passado recente nos legou, diante deste apanhado geral da história da filosofia, que somos obrigados a dizer, não é uma história breve, tem mais de vinte e cinco séculos, muito freqüentemente os jovens se questionam a respeito da utilidade destes conhecimentos. Pra que serve? É a duvida. Por que devo conhecer a história da filosofia se aquelas idéias, digamos de Platão, 54 por exemplo, são tão abstratas que parecem não ter nada que ver com o mundo? Qual a relação desta com a vida cotidiana? Alguém pode chegar à conclusão de que a história da filosofia não tem nenhum interesse prático. Por que será que se ensina a história da filosofia? Esta é a maneira tradicional de se ensinar filosofia em nosso país. Uma estratégia que vem de longa data. Já não é possível que a filosofia se ensine oficialmente de outro modo... O que o programa oficial desta disciplina pode indicar, é a história da evolução filosófica, a apreciação crítica da influência de cada escola, o conhecimento das bases da apologia de cada sistema, a separação entre a parte dessas idéias que a verificação experimental tem confirmado e a que pertence ao domínio extra-científico da metafísica e dos sentimentos pessoais do sistemático ou do crente 7. O texto acima bem que poderia ter sido escrito nesses longos anos em que se lutou para ver a filosofia de volta à escola, em uma discussão a respeito da maneira adequada de ensiná-la. Ele foi, no entanto, escrito por Rui Barbosa em 1882, o trecho é retirado de um parecer a respeito da reforma realizada no ensino secundário da época. Ainda hoje, assim que tomamos contato com qualquer texto atual que trate dos conteúdos necessários para o currículo do ensino médio podemos perceber: o caminho adotado para o ensino é apresentar os jovens, tanto quanto possível, à história da filosofia. Os conteúdos tentam cobrir os mais diversos campos em que esta disciplina, internamente, se divide. Estuda-se os problemas da ética, da filosofia política, da estética, ontologia, filosofia da ciência e assim por diante. Também se tenta garantir que todos os momentos que marcam a história da filosofia tenham seus representantes. Espalhados pela grade curricular estão pensadores da antiguidade, do período medieval, da idade moderna e da contemporaneidade. Em larga medida, os clássicos de todos os períodos estão presentes. É grande 7 . FILHO, M. O ensino de filosofia no Brasil. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e da Cultura – Biblioteca Nacional, 1959. p 10. 55 a diversidade de pensadores e de campos de reflexão com que os alunos têm contato. Podemos ver que esta estratégia não é novidade dos nossos dias. 3. A filosofia no mundo. O que justifica a apresentação de tantos pensadores, cada um com diversas peculiaridades, é, ironicamente, o elemento que é comum a todos: o discurso filosófico. Karl Jaspers adverte que o filosofar deve colocar o sujeito em contato com os problemas discutidos por uma tradição, estabelecida ao longo das gerações de homens: “Tão logo se filosofa, entra-se em contato com os grandes temas da filosofia. E se isso não acontece é porque da filosofia se está longe” 8. Todo filósofo, por ser filósofo, está ligado à tradição por um fio, qual seja: a maneira especifica de abordar os temas. Onde mais se poderia aprender a especificidade da filosofia, conhecer filosofia, se não no debate com filósofos? É no embate com os textos dos clássicos que se percebe em cada um o ponto que os coloca juntos em uma tradição. Aquela característica que se encontra no fundo das varias formas de se apresentar que o discurso encontrou ao longo dos tempos. Uma formulação que capta bem a essência deste tipo de discurso pode ser encontrada em Os Problemas da Filosofia de Bertrand Russell: Filosofia, se não é capaz de responder a tantas questões quantas gostaríamos, tem ao menos a capacidade de formular perguntas que aumentam o interesse do mundo, e mostram a estranheza e a maravilha contidas logo abaixo da superfície mesmo nas coisas mais triviais do cotidiano.9 8 JASPERS, op. cit.; p. 11. 9 RUSSELL, B. The problems of philosophy. New York: Oxford University Press, 1997. p. 24-25. A tradução do trecho citado foi realizada pelo autor deste texto. No original lemos: “Philosophy, if it cannot answer many questions as we could wish, has at least the power of asking questions which increase the interest of the world, and shown the strangeness and wonder lying just below surface even in the commonest things of daily life”. 56 Do convívio com os pensadores da tradição há que se apreender a atitude filosófica diante do mundo, da vida. Nesta jornada pela história da filosofia, o ideal seria que os jovens percebessem primeiro, que cada nome que figura na tradição foi capaz de se espantar, de se maravilhar e, consequentemente, de mergulhar profundamente no mundo em que viveu. E por isso mesmo pode transformar o modo como se olhou até então para ele. E segundo, que isto implica que se engana aquele que pensa que a filosofia não pertence ao mundo, não se relaciona com o cotidiano. Ao contrario, a filosofia nasce no mundo e a partir do mundo. São sujeitos históricos determinados, enfrentando demandas específicas historicamente efetivas, que fazem filosofia. O discurso filosófico simplesmente não faria sentido, a empreitada da pesquisa filosófica seria completamente vã, se não se relacionasse, no limite, com os problemas reais, de homens vivendo em um momento singular da história. O discurso filosófico, como diz Jaspers, vai alem dos quadros do mundo, mas nunca perde de vista que seu fundamento é concreto, historicamente delimitado. Seja a filosofia o que for, está presente em nosso mundo e a ele necessariamente se refere. Certo é que ela rompe os quadros do mundo para lançar-se ao infinito. Mas retorna ao finito para ai encontrar seu fundamento histórico sempre original. Certo é que tende aos horizontes mais remotos, a horizontes situados para alem do mundo, a fim de ali conseguir, no eterno, a experiência do presente. Contudo, nem mesmo a mais profunda meditação terá sentido se não se relacionar á existência do homem aqui e agora10. Neste quadro, acreditamos que cabe ao professor de filosofia demonstrar como cada um desses sujeitos, cujo nome figura na tradição do pensamento filosófico, se envolveu visceralmente com as questões da sua época. Questões que dizem respeito á sua pratica no mundo. 10 JASPERS, op. cit.; p. 138. 57 4. A história da filosofia e o desenvolvimento da consciência crítica. Do que foi dito até agora se tira que: a via para conhecer a filosofia, a especificidade do discurso filosófico, é o contato com a tradição do pensamento filosófico. A partir do conhecimento da história dos sistemas filosóficos pode-se perceber que estes estão ligados intimamente ao momento histórico no qual surgem. Portanto até este ponto nos ocupamos com as questões: Por que se ensina a história da filosofia? Qual a relação da filosofia com a vida cotidiana? Resta saber se o conhecimento da história da filosofia pode ter alguma função prática. Antonio Gramsci, um dos mais importantes pensadores marxistas do século XX, apresenta uma idéia muito interessante que pode incitar nossa reflexão a respeito deste ponto. Em A Concepção Dialética da História, o intelectual italiano chama atenção para o fato de que todos os homens são filósofos. Ele fala de uma “filosofia espontânea, peculiar a todo mundo... contida na própria linguagem, no senso comum e no folclore”, e ainda: “... mesmo na mais simples manifestação de uma atividade intelectual qualquer, na linguagem, está contida uma determinada concepção de mundo”. A todo instante os homens ordinários, nas suas atividades cotidianas, trabalham com concepções de mundo, com noções originariamente filosóficas, ainda que isto se de “inconscientemente”. O ponto de Gramsci aqui é o seguinte: É preferível pensar sem disto ter uma consciência crítica, de uma maneira desagregada e ocasional, isto é, participar de uma concepção de mundo “imposta” mecanicamente pelo ambiente exterior, ou seja, por um dos vários grupos sociais nos quais todos estão automaticamente envolvidos desde sua entrada no mundo consciente... Ou é preferível elaborar a própria concepção do mundo de uma maneira critica e consciente e, portanto, em ligação com este trabalho próprio do cérebro, escolher a própria esfera de atividade, participar ativamente na produção da história do mundo, ser o guia de si mesmo e 58 não aceitar do exterior, passiva e servilmente, a marca da própria personalidade11. Fica claro que esta é uma pergunta retórica. Parece-nos que não haverá oposição se dissermos: preferível é elaborar uma concepção de mundo crítica, ser ativo, ser o guia de si mesmo. Mas o que isto tem a ver com o conhecimento da história da filosofia, e a possível função prática que teria o conhecimento desta? Gramsci trata de nos responder: Não se pode separar a filosofia da história da filosofia... no sentido mais imediato e determinado, não podemos ser filósofos – isto é, ter uma concepção de mundo criticamente coerente - sem a consciência da nossa historicidade, da fase de desenvolvimento por ela representada e do fato que ela está em contradição com outras concepções ou com elementos de outras concepções. A própria concepção de mundo responde a determinados problemas colocados pela realidade, que são bem determinados e “originais” em sua atualidade12. O conhecimento da história do pensamento do homem (ocidental) – ou seja, ter contato com as diversas versões da história que este gênero contou para si sobre quem ele era e qual o seu papel no mundo, sobre o que era o mundo, etc. - é um aliado valiosíssimo na tentativa de compreender mais uma vez quem somos nós e qual nosso papel atualmente. A história da filosofia sintetiza a jornada do homem continuamente perseguindo a máxima que marca o seu ponto de partida. Em cada individuo vivo atualmente encontramos uma atualização do movimento inteiro que o homem fez desde seu ponto original. Ter claro isto é o primeiro passo para a elaboração de uma concepção critica. O inicio da elaboração crítica é a consciência daquilo que somos realmente, isto é, um 11 GRAMSCI, A. Concepção dialética da história. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978. p. 12. 12 GRAMSCI, op. cit.; p.13. 59 “conhece-te a ti mesmo” como produto do processo histórico até hoje desenvolvido, que deixou em ti uma infinidade de traços recebidos sem beneficio no inventário. Deve-se fazer, inicialmente, este inventário13. Certamente, espera-se do individuo, que é participante de um determinado arranjo político, no nosso caso do cidadão, uma prática conseqüente, responsável. Espera-se que ele seja capaz de compreender as questões objetivas, práticas, que se colocam aos homens de seu tempo, à comunidade dos homens, e possa auxiliar na superação das dificuldades. Ideal seria que todos fossem capazes de perceber o lugar em que estão inseridos neste conjunto de indivíduos, e os efeitos que sua prática tem. O pressuposto para tanto é, sem duvida, a consciência do movimento da história que o engendrou, as marcas legadas por muitas gerações passadas de homens e que mais uma vez se atualizam em um exemplar particular deste gênero. 5. Conclusão. Se o ponto que torna legitima a volta da filosofia aos currículos das escolas brasileiras é a contribuição que essa disciplina pode dar no processo de formação dos sujeitos, auxiliando-os no exercício da cidadania, parece evidente que a estratégia de fazer conhecer a história da filosofia é muito acertada. Se se espera que os jovens sejam capazes de perceber sua posição no mundo, na sociedade, e ainda sejam capazes de se colocar criticamente frente aos problemas do mundo atual, do seu país, claro está que o conhecimento da maneira com que a tradição trata dos seus problemas é ferramenta indispensável para tal empreendimento. Ainda que tenhamos muito chão pela frente nesta empreitada de construir as condições próprias para o trabalho, ao menos o método escolhido, de saída, nos parece adequado. Auxiliemos o jovem a se posicionar filosoficamente diante da vida, do mundo, mostrando os exemplos contidos na tradição, e as especificidades que unem 13 GRAMSCI, op. cit.; p.12. 60 este conjunto heterogêneo de pensadores. A nossa esperança é que, apoiando-se nos ombros destes homens representantes das gerações anteriores, nossos jovens consigam ver mais longe. 61 6. Bibliografia. FILHO, M. O ensino de filosofia no Brasil. Rio de Janeiro: Ministério da Educação e da Cultura – Biblioteca Nacional, 1959. GRAMSCI, A. Concepção dialética da história. 3. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978. JASPERS, K. Introdução ao pensamento filosófico. 3. ed. São Paulo: Cultrix, 1965. BIRCHAL, T; KAUARK, P; MARQUES, M. Filosofia: proposta curricular. Secretaria de Estado de Educação – Minas Gerais. Orientações Curriculares para o Ensino Médio – OCEM: ciências humanas e suas tecnologias. Brasília: Ministério da Educação - Secretária de Educação Básica, 2006. RUSSELL, B. The problems of philosophy. New York: Oxford University Press, 1997. 62