O CONTEÚDO SOBRE VÍRUS NOS LIVROS DIDÁTICOS DE

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Revista da SBEnBio - Número 9 - 2016
VI Enebio e VIII Erebio Regional 3
O CONTEÚDO SOBRE VÍRUS NOS LIVROS DIDÁTICOS DE CIÊNCIAS
Mariane Beatriz Karas (UFFS – Bolsista PROBIC/FAPERGS)
Erica do Espirito Santo Hermel (UFFS)
Resumo
O vírus é microscópico, então sua concepção limita-se à imaginação, afastando-o do
cotidiano, tornando-o relativamente abstrato. Como os livros didáticos são o principal recurso
utilizado em sala de aula, o conteúdo sobre vírus presente em 6 livros didáticos de Ciências
foi analisado. Considerou-se: adequação à série; clareza do texto; nível de atualização do
texto; grau de coerência entre as informações apresentadas; e se apresenta ou não textos
complementares e atividades, tendo como critérios: fraco; regular; bom; e excelente. As
informações acerca dos vírus ainda estão sendo abordadas nestes livros de forma muito
simplista e, muitas vezes, sem relacioná-los com nosso cotidiano, exigindo certa reflexão e
criticidade dos professores para seu uso adequado em sala de aula.
Palavras-chave: Virologia; Significação conceitual; Currículo.
Introdução
A temática vírus é ensinada no Ensino Fundamental, na disciplina de Ciências, e no
Ensino Médio, na disciplina de Biologia. De acordo com Junqueira e Carneiro (2013, p. 338):
Os vírus são estruturas constituídas por um genoma de DNA ou RNA, sem
capacidade de multiplicação independente e que dependem das organelas celulares
para sua proliferação. Eles não são capazes de utilizar energia nem apresentam a
maquinaria necessária para a síntese de suas próprias moléculas e, por isso, são
parasitas intracelulares obrigatórios, causando muitas doenças nos animais e plantas.
Crianças de 11-12 anos, cursando a sexta série, quando questionados sobre o vírus,
apresentam descrições curtas e confusas, informações vagas e pouco conhecimento a respeito:
[...] “O vírus é parecido com um mosquito comprido, tem duas asinhas e vive em
água parada, ele é muito pequeno”. “O vírus deve ter muitas células, deve ser como
um grão de areia”. “Parece um ovo quebrado, é muito pequeno e pode provocar
muitas doenças”. “O vírus é redondo, incolor”. “O vírus vive no computador”
(COLOMBARI; MELO, 2006).
Nessa pesquisa foi possível observar a confusão que os alunos fazem em relação aos
conceitos de vírus, células, animais e mesmo programas de computador. Essas concepções,
provavelmente, são oriundas das campanhas de combate ao mosquito da dengue, o que os
leva a associar vírus e mosquitos; às concepções equivocadas sobre vírus e células, devido ao
tamanho microscópico de ambos; à histórica preocupação com doenças e epidemias; e ao uso
generalizado dos computadores.
O vírus é microscópico, então sua concepção limita-se à imaginação, afastando-o do
cotidiano e tornando-o relativamente abstrato. Então, na tentativa de superar essa abstração e
qualificar o ensino da temática vírus, de modo a facilitar a compreensão pelos alunos, uma
série de metodologias têm sido utilizadas pelos professores, entre elas a produção de
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maquetes, apresentação do tema, construção de jogos didáticos, exibição de filmes, entre
outras (COLOMBARI; MELO, 2006; ROSADAS, 2012). No entanto, o principal recurso
utilizado em sala de aula para o ensino de Ciências ainda é o livro didático (GUIMARÃES;
MEGID NETO; FERNANDES, 2011).
Segundo Freitas e Rodrigues (2008) o livro didático atua como mediador na
construção do conhecimento, e é importante salientar que
O meio impresso exige atenção, intenção, pausa e concentração para refletir e
compreender a mensagem, diferente do que acontece com outras mídias como a
televisão e o rádio, que não necessariamente obrigam o sujeito a parar. O livro, por
meio de seu conteúdo, mas também de sua forma, expressa em um projeto gráfico,
tem justamente a função de chamar a atenção, provocar a intenção e promover a
leitura (p. 26).
Erros conceituais graves como preconceito, informações erradas e analogias
impróprias, além do risco à saúde dos estudantes, costumavam ser amplamente observados
em livros didáticos de Ciências (BIZZO, 2000). No entanto, Caimi (2014), analisando Guias
de Livros Didáticos referentes aos anos de 2008 e 2011, aponta “avanços na produção gráfica
e visual dos livros, na correção conceitual e na supressão de situações de estereótipos e
preconceitos” (p. 1). Megid Neto (2002, sem página) também observou melhorias nos últimos
anos relacionadas ao “aspecto gráfico e visual, na correção conceitual, na eliminação de
preconceitos e estereótipos da raça, de gênero ou de natureza sócio-econômica, na supressão
de informações ou ilustrações que podem propiciar riscos à integridade física do aluno”.
Todavia, nos livros didáticos ainda
persistem problemas quanto ao enfoque descontextualizado dos conteúdos; o pouco
protagonismo dos estudantes frente ao trabalho com o livro; à dissociação entre os
conhecimentos científicos e a vida cotidiana; à ênfase às atividades de memorização
e sistematização de informações, em detrimento de atividades complexas de
pensamento, dentre outros (CAIMI, 2014, p. 1).
Batista, Cunha e Cândido (2010), analisando a temática virologia em livros didáticos
de Biologia publicados no período 1997-2002, observaram que os mesmos apresentam
problemas relacionados aos conceitos empregados e à contextualização, interferindo no
processo de aprendizagem, o que levaria os alunos a adquirirem um conhecimento
equivocado. As obras baseiam-se em uma aprendizagem mecânica, desconsiderando os
conhecimentos prévios, não explicitando a importância de se estudar o vírus e não associando
esse conteúdo à realidade, o que levaria a uma diminuição da motivação e, consequentemente,
do aprendizado dos alunos.
Como o livro didático exerce uma grande influência no trabalho dos professores de
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Ciências e de Biologia, torna-se cada vez mais necessário a avaliação destes exemplares.
Assim, para assegurar a qualidade das obras adotadas pelas escolas, o Ministério da Educação
criou, em 1996, o Programa Nacional do Livro Didático (PNDL), para os anos finais do
Ensino Fundamental, para que os professores das diversas áreas de conhecimento pudessem
se orientar na escolha do livro didático a serem usados na escola. No entanto, os livros ainda
apresentam alguns problemas (CAIMI, 2014). Portanto, a presente pesquisa analisou o
conteúdo sobre vírus apresentado nos livros didáticos de Ciências recomendados pelo PNLD
2014.
Metodologia
No presente estudo foi realizada uma pesquisa qualitativa, do tipo documental
(LUDKE; ANDRÉ, 2001), onde foram analisados os conteúdos sobre vírus em 6 livros
didáticos de Ciências recomendados pelo PNLD 2014. Para tanto, foram analisadas as
coleções de livros didáticos de Ciências mais distribuídas, segundo o Fundo Nacional de
Desenvolvimento da Educação (BRASIL, 2015), os quais foram denominados L1, L2... L6,
sucessivamente (Quadro 1).
Quadro 1: Livros didáticos de Ciências analisados neste trabalho.
LIVRO
REFERÊNCIAS
L1
CANTO, Eduardo Leite do. Ciências Naturais 7° ano: Aprendendo com o cotidiano. 4. Ed. São Paulo: Moderna, 2012.
L2
CANTO, Eduardo Leite do. Ciências Naturais 8° ano: Aprendendo com o cotidiano. 4. Ed. São Paulo: Moderna, 2012.
L3
SHIMABUKURO, Vanessa. Projeto Araribá: Ciências 7° ano. 3. Ed. São Paulo: Moderna, 2012.
L4
SHIMABUKURO, Vanessa. Projeto Araribá: Ciências 8° ano. 3. Ed. São Paulo: Moderna, 2012.
L5
GEWANDSZNAJDER, Fernando. Projeto Teláris Ciências 7° ano: Vida na Terra. São Paulo: Ática, 2012.
L6
GEWANDSZNAJDER, Fernando. Projeto Teláris Ciências 8° ano: Vida na Terra. São Paulo: Ática, 2012.
A análise dos livros didáticos foi realizada em etapas, de acordo com a análise de
conteúdos (BARDIN, 2011), seguindo os preceitos éticos da pesquisa em Educação:
primeiramente, foi realizada uma leitura exploratória em cada livro, para verificar como o
conteúdo é apresentado. Após esta etapa, para análise, considerou-se os tópicos existentes nos
Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) sobre vírus. Para tanto, utilizamos os parâmetros
(adequação à série; clareza do texto; nível de atualização do texto; grau de coerência entre as
informações apresentadas; e se apresenta ou não textos complementares) e critérios (fraco;
regular; bom; e excelente) propostos por Vasconcelos e Souto (2003). As atividades propostas
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(questões propostas; atividades práticas; estímulo a novas tecnologias; trabalhos em grupo;
entre outros) e os recursos adicionais ou complementares (glossários; atlas; cadernos de
exercícios; guias de experimentos; guia do professor; entre outros) também foram analisadas
de acordo com eles.
Resultados e Discussão
Foi possível perceber algumas diferenças com relação à organização nos livros
didáticos analisados. L1 e L2 são divididos em capítulos e dentro destes há uma subdivisão de
temas. Já L3 e L4 encontram-se divididos em unidades e os conteúdos estão divididos em
temas dentro das unidades. L5 e L6, por sua vez, estão divididos em unidades e dentro destas
estão os capítulos.
No quadro abaixo (Quadro 2) é possível observar mais claramente as diferenças entre
os livros, principalmente com relação a sua organização. Além disso, buscamos expor os
percentuais referentes ao número de páginas dedicadas à temática vírus, em relação ao
numero total de páginas dos livros.
Quadro 2: Classificação dos dados obtidos dos livros didáticos de Ciências analisados em
relação ao número de unidades, de capítulos, do total de páginas e das páginas relacionadas à
temática vírus.
Número de
unidades –
módulos
Livro
Número de
capítulos - temas
Número total
de páginas
Páginas sobre
a temática
vírus
%
L1
3
19
271
4
1,47
L2
4
15
296
1
0,34
L3
8
48
232
2
0,86
L4
8
61
240
5
2,08
L5
4
29
352
13
3,69
L6
4
19
288
10
3,47
A partir deste quadro, é possível depreender que L5 foi o livro que mais abordou a
temática vírus, tanto em relação ao percentual, quanto ao número de páginas. Já L2, foi o que
apresentou o menor percentual e número de páginas dedicadas à temática.
Realizamos um estudo para verificar como o conteúdo científico é apresentado
(Quadro 3). É possível perceber que todos os livros didáticos analisados estão classificados
com conceitos “bom” ou “excelente” no que diz respeito à adequação do conteúdo e à clareza
do texto. O mesmo pode ser observado com relação ao grau de coerência e integração das
informações, entretanto, nesta categoria, a maioria dos resultados aponta para o conceito
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“bom”. Acreditamos que as informações acerca dos vírus ainda estão sendo abordadas nestes
livros de forma muito simplista e, muitas vezes, sem relacioná-los com nosso cotidiano.
Neste estudo, nenhum dos livros apontou conceitos que levassem a interpretações
incorretas. Ou seja, os conceitos apesar de simplistas, não induzem a erros. Apenas dois livros
(L2 e L3) não apresentaram textos complementares sobre a temática. Ainda, com relação ao
conteúdo, analisamos a presença ou ausência e o grau de abordagem dos seguintes assuntos:
estrutura viral; ciclos de replicação; bacteriófagos; vírus de plantas; vírus de animais; e saúde
humana.
Quadro 3: Análise do conteúdo teórico sobre vírus nos livros didáticos de Ciências.
Parâmetros
Adequação do
conteúdo
Clareza do
texto
Induz a
interpretação
incorreta?
Grau de
coerência e
integração das
informações
Apresenta
textos
complementares
L1
4
4
Não
4
Sim
L2
4
4
Não
4
Não
L3
4
3
Não
3
Não
L4
4
4
Não
4
Sim
L5
4
4
Não
4
Sim
L6
4
4
Não
4
Sim
Classificação: (1) ruim, (2) regular, (3) bom, (4) excelente. Se apresentar ou ter (sim) se não apresentar ou
não ter (não).
L1 contempla a temática virologia no capítulo “Diversidade da vida microscópica” e
utiliza quatro páginas para o conteúdo. Neste, a estrutura viral é abordada de forma simples,
sendo descrita como organismos formados por “um envoltório externo, dentro do qual se
abriga o que é chamado de material genético do vírus” (p. 179). Há uma imagem que
representa o vírus causador da gripe, na qual são identificadas estas duas estruturas. O
envoltório externo deveria ser chamado de capsídeo, o nome correto desta estrutura, ou, ao
menos, o livro deveria fazer uma menção explicativa a respeito. A saúde humana é abordada,
contemplando as seguintes doenças: AIDS, sarampo, caxumba, hepatite infecciosa, febre
amarela, dengue, catapora, varíola, raiva, poliomielite e paralisia infantil. As doenças apenas
são citadas e há uma breve explicação sobre a transmissão das mesmas. Sobre a AIDS há uma
nota que diz: “A AIDS é um tema tão importante que é estudado com detalhe no capítulo 15”
(p. 181), intitulado “Sexo, saúde e sociedade”. No tema doenças sexualmente transmissíveis
(DSTs) a AIDS é abordada de forma mais completa, onde há explicações sobre o que é a
doença e como ocorre a transmissão e a prevenção. Neste livro não são abordados os ciclos de
replicação, bacteriófagos, vírus de plantas e vírus de animais.
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Em L2 não há capítulo dedicado à temática vírus, porém, no capítulo 5, intitulado
“Respiração pulmonar”, há o tema “Distúrbios do sistema respiratório”, neste há uma página
que aborda os vírus, a qual intitula-se “Resfriados e gripes são viroses”. Apenas a saúde
humana é abordada, sem mencionar os outros assuntos.
Já em L3, há duas páginas dedicadas aos vírus e nestas são explicadas a estrutura viral:
“(...) são formados apenas por uma molécula de ácido nucleico, que pode ser DNA ou RNA,
envolvida por uma cápsula de proteína, chamada capsídeo” (p. 87). Há também imagens da
estrutura viral, mas nestas apenas está identificado o material genético. O livro faz menção
aos bacteriófagos: “alguns vírus tem estruturas para aderir ou se fixar a células, como o
bacteriófago, que tem cauda e fibras da cauda” (p. 87). Com uma imagem, a estrutura de um
bacteriófago é mais detalhada, ou seja, na imagem estão identificadas a cabeça (DNA e
capsídeo), cauda e fibras da cauda. Além disso, o livro apresenta as etapas de uma infecção
viral em uma bactéria. Sobre os vírus de plantas, o livro apresenta o vírus do mosaico do
tabaco. Uma imagem descreve sua estrutura (envoltório protéico e RNA) e há um pequeno
texto que descreve o tamanho do vírus, informando que “o primeiro vírus descoberto foi o do
mosaico do tabaco, que ataca plantações de tabaco” (p. 87). Vírus de animais são citados de
forma indireta, mas sem exemplificar: “Os vírus causam doenças ou infecções, chamadas
viroses. Podem parasitar animais, plantas e organismos unicelulares” (p. 88). Em relação à
saúde humana, o livro cita as seguintes doenças: caxumba, rubéola, raiva, sarampo, hepatite
infecciosa, dengue, gripe, poliomielite, herpes, febre amarela e AIDS, sobre estas há uma
breve explicação sobre a prevenção. Além disso, há um destaque sobre a AIDS, explicitando
o que significa o nome da doença, como se manifesta, apresentando uma sequência de
imagens mostrando a saída de um vírus HIV de um linfócito. Retrovírus e ciclos de replicação
não são abordados neste livro.
Em L4 também não havia nenhum capítulo dedicado para a temática vírus, mas foi
abordado em duas unidades. Na unidade 2 intitulada “Período de mudanças”, há um tema
intitulado “A gravidez, a gestação e o parto”, no final deste há duas páginas dedicadas às
DSTs. Neste espaço são citadas as DSTs mais comuns, entre elas: herpes genital, AIDS,
condiloma acuminado e hepatite B. Há pequenas explicações sobre o que causa as DSTs,
quais são as formas de transmissão, se tem cura e definição de portadores assintomáticos.
Além disso, há algumas atividades sobre a temática para serem desenvolvidas pelos alunos.
Na unidade 7, intitulada “Tum...tum...tum... o pulsar da vida”, há o tema “O sistema
imunitário”, neste há um texto sobre a AIDS, explicando o significado do termo HIV, como
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ocorre a manifestação da doença no organismo humano, como ocorre o diagnóstico e o
tratamento. Além disso, apresenta uma imagem obtida por microscopia eletrônica, que mostra
a saída de um vírus de uma célula infectada. Assim, sobre os vírus este livro aborda apenas a
saúde humana, não citando a estrutura viral, os ciclos de replicação, bacteriófagos, vírus de
plantas e de animais e retrovírus.
L5 dedicou 13 páginas para a temática no capítulo 6 “Os vírus e a saúde do corpo”.
Sobre a estrutura viral, o livro cita: “A organização dos vírus é muito simples: Eles são
envoltórios ou cápsulas de proteínas (às vezes, apresentam substâncias adicionais) que
abrigam o material genético” (p. 67). Há imagens dos vírus da poliomielite, do tabaco, da
gripe, do HIV e do bacteriófago, nas quais as estruturas são identificadas. Os ciclos de
replicação não são abordados, apenas há uma explicação sobre a reprodução dos
bacteriófagos, mas não cita os ciclos lítico e/ou lisogênico. A estrutura dos bacteriófagos é
abordada, e, além disso, há uma imagem obtida através de microscopia eletrônica mostrando
uma bactéria sendo atacada por vírus (bacteriófagos) e outra imagem mostrando a reprodução
de um bacteriófago. Em relação aos vírus de plantas, o livro cita o baculovírus e é explicado
que este vírus é utilizado para combater a lagarta da soja sem afetar outros animais ou plantas.
Sobre isso há uma imagem obtida por microscopia eletrônica, que mostra um baculovírus
infectando uma célula. Há também neste capítulo, uma imagem do vírus do mosaico do
tabaco, entretanto não há explicações a respeito. A saúde humana é abordada, inicialmente
com explicações sobre anticorpos, vacinas e soros. Posteriormente, foram abordadas as
doenças: dengue, raiva e AIDS, citando o que é a doença, quais são os sintomas, como deve
ocorrer à prevenção, e como é o tratamento. Sobre a dengue há fotografias da larva e do
mosquito e de um folheto de campanha de prevenção. Sobre a AIDS também há imagens
obtidas por microscopia óptica e eletrônica, mostrando o vírus aderido aos glóbulos brancos.
Rotavirose, poliomielite e hepatite viral são brevemente abordadas. Vírus de animais e
retrovírus não são citados.
Em L6, os vírus são abordados no capítulo 18, intitulado “Doenças sexualmente
transmissíveis”. Este livro aborda apenas a saúde humana, explicando o que são cada uma das
doenças, quais são os sintomas, como deve ocorrer à prevenção e qual é o tratamento. As
doenças são causadas por bactérias, protozoários e vírus. As virais citadas são: herpes, HPV,
hepatite B e AIDS. Há também imagens da estrutura viral do HPV, da hepatite B e da AIDS.
Mas não há descrições ou explicações sobre a estrutura dos vírus. Ciclos de replicação,
bacteriófagos, vírus de plantas e de animais e retrovírus também não foram abordados.
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Nesta pesquisa também foi verificado se os livros indicavam fontes complementares
de informação. É possível perceber que todos os livros contém em seus capítulos algumas
atividades, que tem relação direta com a temática (Quadro 3). Na maioria dos livros, exceto
L3, existem atividades multidisciplinares e que priorizam a problematização. Em relação a
fontes complementares de informação, todos os livros, exceto L3, indicam outras fontes para
que o aluno possa buscar mais informações sobre o assunto.
Quadro 4: Atividades propostas nos livros didáticos para complementação da aprendizagem.
Atividades
Sim
Não
Propõe questões ao final de cada capitulo/tema?
L1, L2, L3, L4, L5, L6.
Os que propõem as questões são: multidisciplinares?
L1, L2, L4, L5, L6.
L3.
L1, L2, L4, L5, L6.
L3.
As questões priorizam a problematização?
Atividades tem relação direta com o conteúdo trabalhado?
L1, L2, L3, L4, L5, L6.
L1, L2, L4, L5, e L6.
Indica fontes complementares de informação?
L3.
Sim = exemplares que apresentam. Não = exemplares que não apresentam.
Averiguamos também quais foram os recursos complementares presentes nos livros
didáticos (Quadro 4). Todos os livros apresentaram propostas para atividades de pesquisa e
todos, exceto L3, apresentaram textos informativos e sugestões de leitura. A maioria dos
livros não apresentou experimentos.
Quadro 5: Recursos complementares apresentados nos livros didáticos de Ciências analisados.
Recursos complementares
Sim
Não
Experimentos
L1, L2
L3, L4, L5, L6
Textos informativos
L1, L2, L4, L5, L6
L3
Sugestões de leituras
L1, L2, L4, L5, L6.
L3
Atividades de pesquisa propostas
L1, L2, L3, L4, L5, L6
Sim= quais exemplares apresentavam. Não= quais exemplares não apresentavam.
Algumas pesquisas relacionadas, direta ou indiretamente, ao tema vírus podem ser
encontradas na literatura sobre livros didáticos de Ciências e de Biologia, como o conteúdo
sobre vacinação (SUCCI; WICKBOLD; SUCCI, 2005), AIDS (TELES, 2006), dengue
(ASSIS; PIMENTA, 2013) e virologia (BATISTA; CUNHA; CÂNDIDO, 2010).
Analisando três livros didáticos de Ciências do 7º ano, publicados em 2004, 2006 e
2012, utilizados em duas escolas estaduais em Ilhéus – BA, Bomfim e Silva (2013)
observaram algumas deficiências em relação ao conteúdo, como na abordagem histórica,
adequação ao ano, atlas, caderno de exercícios e guia dos professores. No entanto,
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[...] de um modo geral os aspectos positivos dos livros didáticos predominam, como
exemplo, a clareza dos textos, nível de atualização, grau de coerência entre as
informações apresentadas, qualidade das ilustrações, grau de relação com as
informações contidas no texto, possibilidade de contextualização, além da presença
de alguns recursos adicionais (BOMFIM; SILVA, 2013, sem paginação).
Obtivemos resultados semelhantes na presente pesquisa. Também é importante
salientar que todos os livros didáticos analisados relacionaram os vírus a doenças. O vírus,
geralmente, é reconhecido por estar associado a doenças e epidemias. Desde a invenção da
agricultura e a constituição dos aglomerados humanos, do deslocamento provocado por
interesses comerciais, fome ou guerras, houve a disseminação de germes virulentos pelos
homens nas comunidades visitadas, levando a propagação de epidemias (UJVARI, 2003).
Atualmente, a disseminação de epidemias ainda é uma grande preocupação, visto a extensa
divulgação nas mídias (gripe aviária, H1N1, AIDS, dengue e Ebola, entre outras) e as
campanhas organizadas para o combate ou prevenção a elas no Brasil: dengue, AIDS, febre
amarela, etc.; e por meio da vacinação: H1N1, herpes, sarampo, rubéola, caxumba, febre
amarela, entre outras.
No entanto, os vírus também desempenham outros papéis, como o baculovírus que é
usado na agricultura como inseticida biológico atuando no controle da lagarta-da-soja
(MOSCARDI; SOUZA, 2002), citado apenas em L5. Além disso, estudos têm sido realizados
para usá-los, por meio de manipulação genética, como estratégia para o desenvolvimento de
vacinas, sob a forma de vetores vacinais (QUEIROZ, 2011).
O vírus também parece ter um papel na evolução humana devido a duradoura
interação que teve com o homem, pois, “[...] conjuntamente com outros parasitas, o vírus
provavelmente contribuiu para a pressão de seleção manter a diversidade do principal
complexo de histocompatibilidade (MHC) e uma forte resposta imune” (VAN BLERKOM,
2003, p. 14, tradução própria). A mesma autora ainda sugere que o “[...] compartilhamento de
vírus poderia ter afetado a diversidade de espécies hominídeas, tanto através da promoção
quanto da eliminação da divergência em populações hospedeiras menos resistentes” (p. 14,
tradução própria). Ou seja, é importante desassociar o vírus da imagem de um mero causador
de doenças, mostrando os outros papéis que eles desempenham na natureza. E isso deveria
constar dos livros didáticos, que são utilizados como material de pesquisa por alunos e
professores (GUIMARÃES; MEGID NETO; FERNANDES, 2011), a fim de evitar a
consolidação de significações conceituais equivocadas por parte de ambos.
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Considerações Finais
Devido à relevância do estudo dos vírus e da importância do livro didático enquanto
ferramenta de ensino, acreditamos na importância de estudos que verifiquem a validade de
seu uso. A partir deste estudo, percebemos algumas características comuns em relação ao
modo como os livros didáticos de Ciências abordam os vírus. Questões relacionadas às
doenças e à saúde humana foram tratadas em todos os livros analisados, fortalecendo a
imagem nociva de que os vírus existem para causar doenças, devendo ser combatidos e
erradicados.
O vírus foi apresentado de forma simplista, predominando seu aspecto estrutural,
sendo seu funcionamento abordado de modo superficial. Seus ciclos de replicação e mesmo a
variedade dos tipos de vírus não foram levantados em todos os livros.
O estudo dos vírus é um tema complexo, dificultado pelas dimensões microscópicas e
pela necessidade de abstração para uma melhor compreensão conceitual. Portanto, diferentes
abordagens, que propiciem a formação de conceitos significativos, são indispensáveis.
Este estudo reforça ainda mais a importância de uma escolha consciente dos livros
didáticos por parte dos professores, para que a coleção escolhida consiga abranger os
conteúdos necessários, para que não ocorram equívocos na interpretação e na significação
conceitual e para que, consequentemente, a aprendizagem dos alunos não fique
comprometida.
Referências
ASSIS, Sheila Soares de; PIMENTA, Denise Nacif; SCHALL, Virgínia Torres. A dengue nos
livros didáticos de Ciências e Biologia indicados pelo Programa Nacional do Livro
Didático. Ciência e Educação, Bauru, v. 19, n. 3, p. 633-656, jul./set. 2013. Disponível em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-73132013000300009>.
Acesso em: 07 maio 2016.
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70, 2011.
BATISTA, Marcus Vinicius de Aragão; CUNHA, Marlécio Maknamara da Silva;
CÂNDIDO, Alexandre Luna. Análise do tema virologia em livros didáticos de Biologia do
Ensino Médio. Revista Ensaio, Belo Horizonte, v. 12, n. 1, p. 145-158, jan./abr. 2010.
Disponível em: <http://www.portal.fae.ufmg.br/seer/index.php/ensaio/article/view/263/331>.
Acesso em: 07 maio 2016.
BIZZO, Nelio. Falhas no ensino de Ciências. Ciência Hoje, v. 27, n. 159, p. 26-31, 2000.
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BOMFIM, M. G; SILVA, Z. M. O livro didático de Ciências para o Ensino Fundamental:
uma reflexão. In: JORNADA BAIANA DE PEDAGOGIA (JORNAPED), 1., 2013, Ilhéus.
Anais
Eletrônicos. Ilhéus:
UESC,
2013.
Disponível
em:
<http://nead.uesc.br/jornaped/anais_2013/meio_ambiente/o_livro_didatico_de_ciencias_para_
o_ensino_fundamental-uma_reflexao.pdf>. Acesso em: 07 maio 2016.
BRASIL. Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação. Ministério da Educação e
Cultura.
PNLD:
Dados
estatísticos.
2015.
Disponível
em:
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