Unidade 3 - Ginecologia Câncer de Endométrio CAPÍTULO 3 CÂnCER DE EnDOMéTRIO O Câncer de endométrio, nos Estados Unidos, é o câncer pélvico feminino mais comum. No Brasil, o câncer de corpo de útero perde em número de casos apenas para o câncer de colo uterino, sendo o segundo tumor pélvico mais comum. A incidência aproximada do câncer endometrial é de aproximadamente 6 a 8 casos por 100.000 mulheres por ano, com pico de incidência em mulheres na década de 55 a 65 anos. Embora, possa ocorrer em mulheres pré-menopausa, ou seja, com menos de 50 anos, em 25% dos casos e em 5% dos casos em mulheres com idade inferior a 40 anos. 1. fATORES DE RISCO O Câncer de Endométrio possui uma relação com a alta exposição isolada ao estrogênio.Acredita-se que o estímulo hormonal de estrogênio sem oposição (da progesterona), seja endógeno ou exógeno, cause alterações proliferativas no tecido endometrial, provocando uma hiperplasia que pode evoluir para uma neoplasia maligna. (Tabela 1) Tabela 1. Fatores de risco para desenvolvimento do Câncer de Endométrio Fatores de Risco para o Câncer de Endométrio Hiperestrogenismo Estados anovulatórios (endógeno ou exógeno) (ex: Síndrome dos ovários policísticos) Obesidade Hiperadrenocortisolismo Hipertensão arterial Menarca precoce Nuliparidade Menopausa Tardia Síndrome do câncer de cólon-retal Uso de Tamoxifeno não-polipóide hereditário Câncer de mama ou ovário prévio Cor branca Pólipos e hiperplasias endometriais Irradiação pélvica Diabetes mellitus Hipotireoidismo 119 Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas Maternidade Escola Assis Chateaubriand Existem casos de cânceres de endométrio que não possuem receptores hormonais, não tendo, portanto, fenômenos hiperplásicos. Este tipo de tumor ocorre em idosas sem hiperestrogenismo, relacionando-se com a baixa imunidade da faixa etária. 2. pREvENçãO Há evidências de que a terapia com progesterona possa reduzir a possibilidade de carcinoma endometrial em mulheres com ciclos anovulatórios, assim como em pacientes pós-menopausa que recebem terapia de reposição estrogênica. A detecção e a terapia adequada dos precursores da doença (hiperplasia com atipia e carcinoma in situ de endométrio) impedem o desenvolvimento subsequente do carcinoma endometrial. De modo geral, a prevenção do Câncer de Endométrio pode ser classiicada em prevenção primária e secundária. (Tabela 2) Tabela 2. Prevenção primária e secundária do Câncer de Endométrio Prevenção primária Combate à obesidade Tratamento de ciclos anovulatórios Terapia de reposição hormonal adequada no climatério Prevenção secundária Avaliação periódica de pacientes assintomáticas de alto risco Ultrassonograia transvaginal na menopausa Detecção de lesões precursoras em mulheres com sangramento uterino anormal 3. CLASSIfICAçãO HISTOLóGICA A maioria dos carcinomas endometriais são adenocarcinomas. Eles podem ser classiicados como endometrióides e não-endometrióides. (Tabela 3) ADENOCARCINOMA ENDOMETRIóIDE: O adenocarcinoma endometrióide típico é o mais comum (57 a 80% dos casos). As células são geralmente cilíndricas com núcleos mantendo a orientação basal, portanto, semelhantes a glândulas normais. A agressividade do tumor é inluenciada pelo padrão de crescimento de áreas sólidas, pela presença de atipia nuclear e pela presença de diferenciação escamosa. O grau histológico é considerado um bom indicador de agressividade em relação à invasão do miométrio, metástases e resposta à terapêutica. De forma geral, os endometrióides apresentam prognóstico melhor. 120 Unidade 3 - Ginecologia Câncer de Endométrio ADENOCARCINOMA NãO-ENDOMETRIóIDE: Os tumores não-endometrióides são de pior prognóstico do que os endometrióides e são menos comuns. O Carcinoma Mucinoso corresponde a cerca de 5% dos carcinomas endometriais. As células com mucina intracitoplasmática compõem mais de 50% do tumor. Esse tipo apresenta bom prognóstico, semelhante ao do carcinoma endometrióide. O Carcinoma Papilar Seroso representa 3 a 4% das neoplasias malignas do endométrio. É composto por células de padrão tubário, com alto grau de atipia nuclear, arquitetura complexa e necrose proeminente. Comporta-se agressivamente, promovendo metástases via linfática e hematogênica já no momento do diagnóstico, comprometendo precocemente o miométrio. O Carcinoma de Células Claras ocorre em menos de 5% dos casos. Compõe-se de células com núcleos extremamente atípicos e citoplasma abundante e claro. Seu comportamento é agressivo, tendendo a comprometer o espaço perivascular linfático e invadir o miométrio. O Carcinoma Misto é composto por 2 ou mais componentes não escamo-celulares com cada um ocupando 10% do tumor. O Carcinoma Indiferenciado é bastante raro, não possui diferenciação glandular, escamosa ou sarcomatosa. Caracteriza-se por um prognóstico muito desfavorável. Tabela 3. Classiicação histológica dos tumores endometriais (Adaptação de Berek-Hacker, 2000) Classiicação histológica dos tumores endometriais Adenocarcinoma endometrióide Adenocarcinoma não-endometrióide Endometrióide típico Carcinoma mucinoso Adenoacantoma Carcinoma papilar seroso Carcinoma adenoescamoso Carcinoma de células claras Carcinoma papilífero Carcinoma misto Carcinoma indiferenciado 4. ACHADOS CLÍNICOS Cerca de 40% das mulheres com sangramento vaginal anormal pósmenopausa terão um câncer do trato reprodutivo e na grande maioria é o câncer endometrial. Portanto, diante de um quadro de sangramento anormal deve ser considerado que ele é causado por um câncer, até que se prove o contrário. A estenose cervical pode provocar a formação de hematometra (acúmulo de sangue na cavidade endometrial) ou piometra (secreção purulenta), que são bastante sugestivos de carcinoma endometrial. A dor não é um sintoma comum, mas pode haver leves cólicas uterinas. O exame abdominal pode revelar massa amolecida na 121 Protocolos Clínicos e Diretrizes Terapêuticas Maternidade Escola Assis Chateaubriand região hipogástrica, devido a um aumento do volume uterino. Em doença avançada, pode ocorrer distensão abdominal secundária à ascite e linfonodos palpáveis na região ilíaca, decorrentes de metástases. A citologia vaginal é positiva em 40-80% dos casos, devido à extensão do tumor do endométrio até o colo do útero. (Tabela 4). Tabela 4. Achados Clínicos em Pacientes com Câncer de Endométrio Achados Clínicos em Paciente com Câncer de Endométrio Corrimento vaginal anormal (90%) Leucorréia (10%) Sangramento anormal (80%) Massa palpável 5. DIAGNóSTICO O diagnóstico deinitivo do câncer endometrial é realizado pelo exame histológico (biópsia), que pode ser realizado através da histeroscopia (padrão-ouro), curetagem uterina, biópsia aspirativa e ultrassonograia transvaginal. (Tabela 5). Tabela 5. Circunstâncias de Indicação de Biópsia do Endométrio Circunstâncias de Indicação de Biópsia do Endométrio Pré-menopausa: Obesidade extrema, anovulação crônica, sangramento anormal. Pós-menopausa: Obesidade extrema, sangramento uterino, piometra, endométrio> 4 mm, presença de células endometriais na citologia vaginal. 6. ESTADIAMENTO O estadiamento do Câncer de Endométrio é cirúrgico e tem importância para a escolha do tratamento. O sistema de estadiamento inclui características histológicas (tipo histológico, grau de diferenciação celular, profundidade de invasão miometrial, invasão linfovascular, extensão cervical), e extensão da doença além do útero (anexos uterinos, cavidade peritoneal, linfonodos, outros órgãos). Os locais de metástases mais comuns são pulmão e vagina. 7. TRATAMENTO O tratamento pode ser clínico, em casos selecionados, em extremos de idade (pacientes muito jovens ou muito idosas), utilizando-se de altas doses de progestágeno. O tratamento cirúrgico baseia-se na histerectomia e anexectomia bilateral e cirurgia de estadiamento. Pode ser necessário o tratamento complementar com radioterapia. O tratamento das recidivas depende da localização, do volume tumoral e das terapias anteriormente administradas. 122 Unidade 3 - Ginecologia Câncer de Endométrio 8. pROGNóSTICO Tumores maiores de 5 cm, idade superior a 51 anos e pós-menopausa estão associados à piora da sobrevida. Em tumores restritos ao corpo uterino (estágio I) a sobrevida em 5 anos é de 70-90%. Em tumores que invadem a cérvice (estágio II) a frequência cai para 60%. Nos tumores regionais que invadem a pelve (estágio III) a sobrevida em 5 anos é de 40%. Na doença pélvica avançada ou com metástase à distância (estágio IV) é <10%. Tumores com indiferenciação histológica, penetração miometrial profunda, com ausência de receptores para estrogênio e progesterona são os de pior prognóstico. 123