ANÁLISE NUMÉRICA DO EFEITO DE DISPOSITIVOS DE PONTA DE ASA SOBRE A EFICIÊNCIA AERODINÂMICA DE AEROFÓLIOS J. F. T. DE CARVALHO1, L. M. DA ROSA2 1 2 Universidade Federal do Rio Grande do Sul, PROMEC Universidade Regional de Blumenau, Departamento de Engenharia Química E-mail para contato: [email protected] RESUMO – Este estudo visa analisar e quantificar a influência da utilização de dispositivos de ponta de asa em um aerofólio em escala real. Para tal, duas configurações são consideradas: uma sem dispositivo de ponta de asa, e outra com uma terminação do tipo Hoerner. Para a quantificação das forças, dos coeficientes aerodinâmicos e da eficiência aerodinâmica, análises numéricas foram realizadas com a técnica da fluidodinâmica computacional, utilizando o código OpenFOAM. A turbulência foi estimada com o modelo Spalart-Allmaras. Resultados obtidos indicam que a utilização de terminação do tipo Hoerner acarreta em maior eficiência aerodinâmica. 1. INTRODUÇÃO A necessidade de eficiência aerodinâmica no transporte aéreo têm levado ao desenvolvimento de novas configurações e tecnologias. O formato ideal de aerofólio é o elíptico. No entanto, este formato também é o mais complexo para ser construído. Dispositivos de ponta de asa são utilizados a fim de minimizar os efeitos característicos nas extremidades de aerofólios, minimizando as forças de arraste e em muitos casos maximizando a força de sustentação do aerofólio. Tais dispositivos podem também propiciar diminuição no arraste induzido, e aumento na economia de combustível durante o voo (Peng e Jinglong, 2012). Alguns modelos de pontas de asa reduzem o arrasto induzido através do deslocamento dos vórtices para "fora". Estudos de aerofólios de aeronaves comerciais são encontrados em literatura, uma vez que a ciência de asas é uma das principais aplicações da aerodinâmica (Suresh et al., 2015). No entanto, sua aplicação em escalas reduzidas, como no caso de aeromodelos. é escassa. Asas nessa aplicação possuem como característica fundamental elevada força de sustentação, mesmo na presença de escoamentos com baixo número de Reynolds. A predição dos coeficientes aerodinâmicos (como CD e CL) é fundamental no projeto de superfícies aerodinâmicas. Através da mecânica dos fluidos computacional, a estimativa desses coeficientes é uma alternativa viável do ponto de vista físico, mas que devem ser verificadas e validadas com experimentos ou através de banco de dados como o AGARD (Advisory group for aerospace research and development), ou o AIAA (American institute of aeronautics and astronautics), os quais podem ser comparados e utilizados como referência para a validação de simulações e códigos numéricos de fluidodinâmica computacional. Desta maneira, o presente trabalho apresenta um estudo comparativo das forças e coeficientes aerodinâmicos, preditos para o escoamento turbulento ao redor de duas configurações de aerofólio. 1 2. METODOLOGIA NUMÉRICA As equações governantes do escoamento consistem nas equações da conservação de massa, e na equação de transporte de quantidade de movimento. Considerando o escoamento para um fluido compressível, as equações da continuidade e de transporte de quantidade de movimento, estão apresentadas abaixo (Maliska, 2013). 𝜕𝜌 𝜕𝑡 𝜕 𝜕𝑡 + 𝛻 ⋅ (𝜌𝑈) = 0 (1) 2 (𝜌𝑈) + 𝛻 ⋅ (𝜌𝑈𝑈) = −𝛻𝑃 + 𝛻 ⋅ [µ𝑒𝑓𝑓 (𝛻𝑈 + (𝛻𝑈)𝑇 − 𝛿ij 𝛻𝑈)] + 𝑓𝑖 3 (2) onde 𝜌 é a massa específica do ar, U é a sua velocidade, e P representa a pressão. A viscosidade efetiva µeff agrega contribuições tanto da viscosidade laminar quanto da viscosidade turbulenta, esta última determinada de acordo com o modelo de turbulência aplicado. Desta maneira, µeff = µlaminar + µturbulento. Neste trabalho, a turbulência foi modelada utilizando o modelo Spalart-Allmaras. Em trabalhos anteriores, verificou-se a capacidade deste modelo em predizer com acurácia as forças aerodinâmicas atuantes em um aerofólio em escala reduzida (Carvalho et al., 2015). O modelo Spalart-Allmaras resolve uma equação de transporte modelada para a viscosidade cinemática turbulenta (Spalart, 2000). As geometrias consideradas consistem em um aerofólio sem nenhum dispositivo de ponta de asa (Figura 1), e outro com a configuração Hoerner (Figura 2). Em ambas as geometrias, foi utilizado um perfil simétrico Epler 423, com o bordo de ataque com 0,012 m, bordo de fuga com 1,072×10-6 m, corda na ponta de 0,2 m, corda na raiz de 0,3 m, envergadura de 2,73 m, e 1,13 m de comprimento de asa retangular. Estas asas foram submetidas a um fluxo de ar paralelo à corda do perfil, com velocidade constante de 24 m/s. Figura 1 – Vistas superior e frontal do aerofólio sem dispositivos. Figura 2 – Vistas superior e frontal aerofólio com ponta Hoerner. 2 Para a obtenção dos resultados numéricos, utilizou-se um código que calcula o escoamento incompressível em estado estacionário ("simpleFoam"). Neste solver, o algoritmo SIMPLE é utilizado para acoplar os campos de velocidade e pressão. Balanços de massa e movimento foram calculados até atingir os resultados totalmente convergentes, ou um número máximo de iterações estipulado em 1000, no qual as variáveis desejadas não apresentaram variação. A solução final apresentou erros residuais de 6,8 ×10-5 para a velocidade e de 6,2 ×10-4 para a pressão. As malhas avaliadas para este estudo foram geradas automaticamente, possuindo os tamanhos de 117.013, 328.566, 1.122.487 volumes de controle para a asa "limpa", sendo compostas predominantemente por elementos hexaédricos. Também foi inserida uma camada de prismas ao redor da superfície do perfil aerodinâmico, regiões de refino nas pontas das asas e na região da esteira aerodinâmica formada nas extremidades. Adotou-se o procedimento apresentado por Roache (2008) para determinar o erro inerente à malha. Com isto, as malhas definidas para a condução do estudo possuem cerca de 1,1 milhão de volumes de controle, o que acarreta em valores de GCI iguais a 0,07% e 4,95% para a predição de CL e CD, respectivamente. Esta malha tem um valor médio de 70 para y+ no aerofólio. 3. RESULTADOS NUMÉRICOS Os resultados numéricos dos coeficientes aerodinâmicos obtidos utilizando o código OpenFOAM para a velocidade constante de 24 m/s indicam que a asa com ponta Hoerner apresenta menor força de arraste em comparação à asa limpa. Houve também pequeno decréscimo na força de sustentação. No entanto, o ganho aerodinâmico desse modelo com a configuração de ponta Hoerner justifica a melhor eficiência aerodinâmica da asa Hoerner. Os valores obtidos são sumarizados na Tabela 1. Tabela 1 – Resultados numéricos coeficientes aerodinâmicos (adimensionais). Arraste [N] Sustentação [N] CL CD Eficiência Asa limpa 18,84 172,40 0,3887 0,0425 9,14 Ponta Hoerner 18,42 169,94 0,3832 0,0415 9,22 Estes resultados podem ser justificados observando-se a fluidodinâmica ao redor das pontas das diferentes asas consideradas. Figura 3 – Linhas de corrente no aerofólio sem dispositivo de ponta de asa. 3 4. CONCLUSÕES Através de simulações realizadas em escala real para uma asa de aeromodelo, observouse que a geometria considerando ponta de asa na configuração Hoerner apresenta menores forças de arraste e de sustentação, bem como um benefício quando avaliada a qualidade aerodinâmica, quando comparando com uma ponta sem dispositivo específico. Observou-se também a adequação da metodologia numérica utilizada, que possibilitou a obtenção dos resultados apresentados, evitando custos inerentes a medições em túnel de vento. Isto permite o aprofundamento deste estudo, com a consideração de diferentes configurações de dispositivos de ponta de asa, e definição de uma geometria ótima para aplicação em aeromodelos. 6. REFERÊNCIAS CARVALHO, J. F. T.; ROSA, L. M.; NABINGER, E. Avaliação do escoamento subsônico em aerofólio considerando diferentes modelos de turbulência através da técnica de fluidodinâmica computacional. 1º Workshop Norte-Nordeste de CFD aplicado a engenharia e ciências correlatas, Campina Grande, 2015. KARTHIK, T.S.D. Turbulence models and their applications. Department of Mechanical Engineering IIT Madras: 10th Indo German Winter Academy, 2011. KIM, M. H.; TAK, N.; NOH, J. M. Study on influence of turbulence model selection on prediction of flow distribution and hot spot fuel temperature in prismatic HTGR cores. Engineering Applications of Computational Fluid Mechanics Vol. 8, No. 2, pp. 263-273 (2014). LAUNDER, B.E.; REECE, G. J.; RODI, W. 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