pág.213 Imunidade do trato genital inferior e

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Immunology of the human genital tract and immune response directed to the human papillomavirus
Resumo
O estabelecimento de que a infecção pelo papilomavírus humano é o principal fator
associado à gênese das neoplasias intra-epiteliais cervicais e do câncer cervical estimulou
o desenvolvimento de vacinas profiláticas e terapêuticas com o intuito de se prevenir as
referidas lesões cervicais. O entendimento da imunidade relacionada à infecção por este
vírus forma a base para tais pesquisas. A imunidade celular direcionada contra este vírus
constitui-se em importante fator para a eliminação do mesmo, no entanto os principais
alvos e tipos de respostas que medeiam a destruição deste agente, não estão totalmente
estabelecidos. O presente artigo resume os principais mecanismos envolvidos na resposta
imunológica contra a infecção pelo papilomavírus humano e como este vírus se evade
do sistema imune. Este agente não provoca resposta imunológica sistêmica, no entanto
a maioria das mulheres infectadas não apresenta sintomas clínicos e é capaz de eliminar
totalmente o vírus.
At u ali z a ç ã o
Imunidade do trato genital inferior e mecanismos
defensivos contra o papilomavírus humano
Adriana Bittencourt Campaner1
Roberto Euzébio dos Santos1
Maria Antonieta Longo Galvão 1
Tsutomu Aoki1
Palavras-chave
Papilomavírus humano
Imunologia
Trato genital inferior
Keywords
Human papillomavirus
Immunnology
Lower genital tract
Abstract
The establishment of the human papillomavirus infection as a major cause of cervical
intraepithelial neoplasia and cervical cancer, has spurred the development of prophylatic
and therapeutic human papillomavirus vacines for prevention of these cervical lesions.
Knowledge of the immunity to the human papillomavirus infection forms the basis for such
endeavors. The cellular immunity to this virus is implicated as an important factor for the
elimination of this agent, but the main targets and types of responses that mediate human
papillomavirus clearance are not established. This article summarizes the main mechanisms
involved in the immune response to infections caused by this virus and how it can evade
the immune system. Human papillomavirus do not provoke strong systemic antibody or
T-cell reponses. Furthermore the majority of those infected women do not display clinical
symtoms and are able to clear the virus.
Departamento de Obstetrícia e Ginecologia da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo – Faculdade
de Ciências Médica da Santa Casa de São Paulo
1
FEMINA | Abril 2007 | vol 35 | nº 4
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Imunidade do trato genital inferior e mecanismos defensivos contra o papilomavírus humano
Introdução
Atualmente se aceita que a infecção persistente pelo
papilomavírus humano (HPV) é o fator de risco mais importante relacionado ao desenvolvimento das neoplasias
intra-epiteliais e do carcinoma cervical, sendo a presença
deste vírus considerada, pela maioria dos autores, como
necessária para o desenvolvimento dessas lesões (Dalstein et al., 2003; Munoz et al., 2003). Diversos trabalhos
encontrados na literatura têm demonstrado a presença do
HPV de alto risco em mais de 90% das neoplasias cervicais
e das lesões de alto grau. Infecção por múltiplos tipos virais
também é freqüentemente encontrada (Walboomers et al.,
1995; Munoz et al., 2003).
Apesar da ligação entre a infecção pelo HPV e as lesões
intra-epiteliais escamosas estar bem estabelecida, existe clara
discrepância entre a freqüência de mulheres infectadas pelo
HPV e aquelas que desenvolvem neoplasias intra-epiteliais
e carcinomas cervicais. Estudos atuais revelam que a maioria
das infecções por este agente é transitória, com eliminação
espontânea do vírus através da ativação do sistema imune, em
mais de 80% dos indivíduos infectados no período médio de
18 a 24 meses (Moscicki et al., 1998; Franco et al., 1999).
As razões para esta variação na história natural deste
vírus são pouco conhecidas; no entanto, se aceita que outros
co-fatores devem ser importantes no desenvolvimento da
neoplasia. Assim, a evolução destas lesões vai depender do
tipo e persistência da infecção pelo HPV, fatores genéticos,
alimentares e ambientais e, principalmente, do estado geral
e imunológico do hospedeiro (Pinto et al., 2002; Parellada
& Pereira, 2003; Castle et al., 2004; Moodley et al., 2005;
Spence et al., 2005).
Pesquisas realizadas nas últimas décadas têm-se voltado
para a resposta imune desencadeada pelo hospedeiro ao vírus
HPV. Apesar de ser a mesma ainda pouco compreendida, há
evidências de que desempenha importância relevante no controle das infecções por este vírus, determinando se a infecção
será debelada ou persistente, bem como a extensão e severidade das lesões e o sucesso da terapia (Tjiong et al., 2001;
Sanclemente & Gill, 2002; Gonçalves & Donadi, 2004).
A imunidade do trato genital inferior
O sistema imune pode ser visto como órgão que se
encontra distribuído pelo corpo fornecendo defesa ao
hospedeiro contra patógenos. No sistema imune, diversos
compartimentos distintos podem ser definidos, cada qual
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FEMINA | Abril 2007 | vol 35 | nº 4
especialmente adaptado para gerar resposta aos agentes
nocivos ali localizados. O sistema imune de mucosas é
considerado importante compartimento localizado próximo
às superfícies, por onde a maioria dos patógenos penetra.
As mucosas são particularmente vulneráveis a infecção.
Constituem-se em barreiras finas e permeáveis para o interior
do organismo em razão de sua atividade fisiológica variada:
troca de gases (pulmões), absorção de alimentos (intestinos),
atividades sensoras (olhos, nariz boca e garganta) e reprodução (útero e vagina). A necessidade de permeabilidade
dessas superfícies cria vulnerabilidade óbvia à infecção não
sendo surpreendente que a maioria dos agentes infecciosos
invada o corpo humano por essas vias (Mestecky & Fultz,
1999; Janeway et al., 2002).
O trato genital pode ser dividido em dois compartimentos:
vagina e ectocérvice, que hospedam flora comensal, e útero
e tubas, os quais são estéreis. A esterilidade da endocérvice
está relacionada às variações dos níveis hormonais do ciclo
menstrual. O epitélio escamoso estratificado da vagina e
ectocérvice é necessário para manter barreira mecânica, enquanto que o epitélio colunar da endocérvice pode permitir
o influxo antigênico. Sofisticada barreira funcional é também
mantida pelo muco cervical que apresenta capacidade de
filtrar microorganismos (Johansson & Lycke, 2003).
O sistema imune do trato genital é parte do sistema
imunológico relacionado a mucosas, englobando extensa área
de cerca de 400 m2 (Mestecky & Fultz, 1999; Johansson &
Lycke, 2003; Wira & Fahey, 2004). Assim como na imunidade
sistêmica, o sistema imune relacionado às mucosas também
é dividido em imunidade humoral e celular. Apresenta três
níveis de imunidade: o primeiro está relacionado às mucosas,
constituindo a barreira do epitélio cérvico-vaginal; o segundo está localizado nos linfonodos regionais e o terceiro é a
imunidade sistêmica. Diferentemente de sítios bem definidos
como as placas de Peyer no trato gastrointestinal e dos agregados linfóides na árvore brônquica, têm sido identificadas,
na submucosa cérvico-vaginal, especialmente da zona de
transformação da cérvice, células plasmáticas e linfócitos
com tendência à formação de agregados linfocitários, onde
os antígenos seriam capturados e processados (Mestecky &
Fultz, 1999; Johansson & Lycke, 2003).
Além dos agregados linfóides já mencionados, onde podem
ser encontrados linfócitos T CD4 e CD8 e células plasmáticas
produtoras de imunoglobulinas (Ig), a mucosa do trato genital
contém células com capacidade de apresentação antigênica,
tais como macrófagos e células dendríticas. A grande maioria
dos linfócitos intra e sub-epiteliais está localizada na zona
Imunidade do trato genital inferior e mecanismos defensivos contra o papilomavírus humano
de transformação cervical, sugerindo que este sítio apresenta
acentuada atividade imunológica. Sugere-se que os linfócitos
intra-epiteliais cervicais seriam, predominantemente, CD8 e
os sub-epitelias CD4 (Tjiong et al., 2001; Mestecky & Fultz,
1999; Johansson & Lycke, 2003; Modotti et al., 2005).
No trato genital inferior, a primeira linha de defesa contra
qualquer infecção estabelecida é a imunidade humoral através
da produção de anticorpos. A população de linfócitos locais
é constituída principalmente de linfócitos B, os quais são
capazes de desencadear a referida resposta. Diversas imunoglobulinas estão presentes nas secreções cérvico-vaginais
normais, sendo parte importante na defesa do hospedeiro
pelo bloqueio da aderência do agente nas células epiteliais
da mucosa (Tjiong et al., 2001; Modotti et al., 2005).
Em contraste com outras secreções mucosas do organismo,
maior quantidade de Ig G do que de Ig A são encontradas
no trato genital feminino. Os níveis destas imunoglobulinas
apresentam influência hormonal, variando durante o ciclo
menstrual; são derivadas do compartimento sistêmico, bem
como de produção local (sugere-se que a Ig G local seria derivada do plasma enquanto que a Ig A produzida localmente).
Aqui, a maioria das moléculas de Ig A é polimérica e consiste
de proporções semelhantes de Ig A1 e Ig A2 (no muco cervical
a maior parte das moléculas de Ig A é do formato polimérico e
nas secreções vaginais iguais proporções das formas monomérica
e polimérica estão presentes); já no plasma, trato respiratório
e trato intestinal alto, Ig A1 é o tipo predominante (Johansson
& Lycke, 2003; Modotti et al., 2005).
No entanto, frente a uma infecção viral ou na presença
de lesões neoplásicas e pré-neoplásicas, a principal reposta
imune desencadeada é do tipo celular. A população de linfócitos muda dramaticamente; os linfócitos T citotóxicos e
as células natural killer predominam, compondo quase três
quartos das células imunes responsivas (Tjiong et al., 2001;
Johansson & Lycke, 2003; Wira & Fahey, 2004).
Na fase de reconhecimento antigênico da resposta imune
celular, os antígenos devem ser capturados pelas células
apresentadoras de antígenos (APC), isto é, as células de
Langerhans locais, com intuito da ativação de linfócitos T
virgens. Estes linfócitos são células de vital importância na
imunidade celular cervical e por não reconhecerem antígenos
livres, necessitam de células apresentadoras de antígenos
que contenham MHC (complexo principal de histocompatibilidade) em sua superfície, para que se tornem ativadas
(Cutler & Jotwani, 2004; Forte, 2004).
O MHC é uma região do cromossomo 6 responsável por
produzir glicoproteínas que são expressas na superfície da
maioria das células do corpo humano, permitindo que o
sistema imune reconheça o “próprio” e o “não-próprio” do
organismo. Estas podem ser do tipo I ou II. O MHC classe I é
expresso em quase todas as células nucleadas do organismo
e é responsável pela ativação das células T CD8; já o de classe
II é expresso principalmente pelas células imunocompetentes,
incluindo linfócitos, monócitos, macrófagos, células dendríticas
e células endoteliais, sendo responsáveis pela ativação das
células T CD4 (Cutler & Jotwani, 2004; Forte, 2004).
Os antígenos capturados pelas APC são processados
dentro de compartimentos celulares especializados, em
pequenas partículas de informações que são utilizadas para
iniciação da resposta imune. Estas células apresentadoras
migram através de linfáticos locais em direção aos respectivos
linfonodos de drenagem. Quando de sua chegada aos linfonodos, apresentam os antígenos às células T paracorticais em
repouso e evocam resposta proliferativa antígeno-específica,
resultando em migração e acúmulo de células T e B ativadas
para o sítio de infecção via sangue periférico e linfáticos. As
células precursoras da imunidade celular e humoral, localizadas
nas zonas T e B dos linfonodos, são estimuladas, resultando
finalmente na produção de células T helper, T citotóxicas e
imunoglobulinas nos sítios mucosos efetores, tais como
lamina própria e epitélio (Tjiong et al., 2001) (Figura 1).
Figura 1 – Passos envolvidos na resposta imune celular no trato genital.
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Imunidade do trato genital inferior e mecanismos defensivos contra o papilomavírus humano
Imunidade direcionada contra o
papilomavírus humano
A história natural da infecção pelo HPV pode seguir três
possíveis rotas: completa eliminação viral após fase aguda,
infecção latente e infecção ativa e progressiva. A maioria das
mulheres se infecta nos primeiros anos do início da atividade
sexual, por volta dos 15 aos 25 anos, sendo comum a infecção
repetida e por múltiplos tipos oncogênicos. No entanto, a maioria
destas infecções são geralmente transitórias e clinicamente
não insignificantes, embora possam desencadear alterações
citológicas e histológicas temporárias (aproximadamente 80%
dos casos regridem espontaneamente). Entretanto, a regressão
das NIC parece estar relacionada à idade das pacientes, sendo
mais freqüente abaixo dos 30 anos. Felizmente, poucas mulheres
se tornam persistentemente infectadas e é este pequeno grupo
que apresenta risco substancial para o desenvolvimento de
NIC e câncer. Apenas 1% das infecções persistentes por tipos
de alto risco progredirá para o carcinoma invasor (Moscicki et
al., 1998; Franco et al., 1999).
Em relação a este vírus, sabe-se que o mesmo não se
dissemina pelo organismo; não existe viremia aparente,
sendo a imunidade do trato genital crucial no controle de
sua replicação. A infecção e o aparecimento das lesões relacionadas ao HPV são dependentes de completo programa
de diferenciação dos queratinócitos cervicais. O vírus infecta
inicialmente os queratinócitos da camada basal, no entanto
altos níveis de expressão das proteínas virais tardias (principais imunógenos que o HPV sintetiza) ocorrem apenas nas
camadas mais superficiais. O ciclo de replicação toma longo
tempo e mesmo em condições propícias, o tempo entre a
infecção e a liberação de partículas virais completas demora
no mínimo 3 semanas, visto que este é o tempo necessário
para completa diferenciação e descamação dos queratinócitos. Na realidade, o período para aparecimento das lesões é
altamente variável, podendo significar semanas até meses,
indicando que o vírus pode efetivamente ludibriar o sistema
imune (Tjiong et al., 2001; Sanclemente & Gill, 2002; Parellada
& Pereira, 2003; Padilla-Paz, 2005).
Existem diversas razões pelas quais este agente é tão
evasivo. Embora o epitélio seja boa barreira primária à
infecção, qualquer brecha no mesmo facilita o acesso do
HPV à camada basal onde ocorre baixa replicação viral, sem
lise celular. Como conseqüência, a infecção pelo HPV não
é acompanhada de processo inflamatório, não existindo
exposição antigênica disponível para ser detectada pela
vigilância imunológica do hospedeiro, isto é, as células de
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Langerhans. Após período de latência, ocorre acelerada
replicação do DNA viral nas células diferenciadas levando
ao aparecimento de lesões características. Entretanto, as
células do epitélio escamoso possuem baixa capacidade de
apresentação antigênica, apesar do número de cópias virais
por célula. Durante todo o processo de maturação celular
no epitélio as células infectadas permanecem intactas, visto
que o vírus não destrói nem lisa a célula. Dessa maneira,
durante todo seu ciclo de vida o HPV permanece protegido
no interior destas células, o que resulta em infecção crônica
e persistente (Sanclemente & Gill, 2002; Parellada & Pereira,
2003; Padilla-Paz, 2005).
A patogênese viral resultaria da interação entre a virulência
deste patógeno e a deficiente resposta imune do hospedeiro.
O equilíbrio existente entre o agente indutor e a imunidade
do indivíduo irá determinar a persistência, progressão ou
regressão do processo de transformação neoplásica (Majewski & Jablonska, 1998; Parellada & Pereira, 2003; Castle
et al., 2004).
Os mecanismos efetores da vigilância imunológica contra
este vírus incluem a imunidade inata (imunidade inespecífica)
e a antígeno específica ou adquirida (ambas imunidades humoral e celular). As citocinas, isto é, peptídeos mediadores
locais, representam o componente principal da imunidade
inespecífica direcionada contra o HPV. De modo geral, a
imunidade inata está associada com a produção destes e
outros mediadores pelos macrófagos e neutrófilos locais
e pelas células infectadas por este agente. Os principais
efeitos relacionados a estas substâncias incluem a inibição
da expressão dos genes virais e proliferação celular, estímulo
à apoptose, estímulo ao tráfego ou trânsito de leucócitos
para o sítio de infecção e inibição da angiogênese tumoral
(Majewski & Jablonska, 1998; Castle et al., 2004; Gonçalves
& Donadi, 2004).
No entanto, é a imunidade mediada por células que participa de maneira decisiva na luta contra a expressão viral,
considerando-se principalmente a atividade dos linfócitos
CD8 e CD4 (Tjiong et al., 2001; Gonçalves & Donadi, 2004;
Padilla-Paz, 2005). Como exposto anteriormente, para o
reconhecimento das proteínas virais, existe a necessidade de
sua liberação do interior das células infectadas, seguida de
captura pelas células de Langerhans, visto que os linfócitos
não reconhecem partículas antigênicas isoladas.
Modelos animais provêem evidências do tipo de resposta celular encontrada na infecção por este vírus. Nicholls
et al., 2001, ao analisarem os eventos que acompanham o
desaparecimento das lesões da papilomatose oral canina,
Imunidade do trato genital inferior e mecanismos defensivos contra o papilomavírus humano
concluíram que esta doença animal pode ser considerada
modelo apropriado de imunidade direcionada ao HPV. Os
referidos autores observaram que a regressão das lesões
papilomatosas foi precedida por emigração das células de
Langerhans intra-epiteliais, seguida de migração para o
tecido infectado de células CD4 e em menor número de células CD8 (estas últimas atingiram pico justamente quando
as verrugas apresentaram remissão completa). Numerosos
queratinócitos apoptóticos foram demonstrados nas lesões
em regressão, sendo que os autores enfatizam a presença
dos mesmos na defesa local, visto que se correlacionam
temporal e espacialmente com a infiltração linfocitária e o
desaparecimento das lesões.
A habilidade do sistema imune em destruir a lesão é refletida pela capacidade de detecção por parte das células de
Langerhans. Existem evidências de que o HPV poderia ocasionar
depleção destas células. Assim, sua ausência ou diminuição
das mesmas poderia levar à ineficiente resposta imune primária. Sugere-se que inicialmente, a depleção no número destas
células seja por efeito citopático direto ou como resultado no
aumento do trânsito das mesmas em direção aos linfonodos,
levando o agente a ser apresentado aos linfócitos. Seguir-se-ia,
dessa maneira, o desenvolvimento de lesões intra-epiteliais.
Na seqüência, algum sinal imunológico local desencadearia o
aumento das referidas células de Langerhans com intuito de
apresentação antigênica e destruição viral.
Postula-se que as células de Langerhans (elemento
fundamental da fase aferente da resposta imune celular)
também desempenhem papel relevante no mecanismo de
defesa humano contra tumores, com relação positiva entre
a infiltração celular e o prognóstico. Em relação à ação das
mesmas sobre as células neoplásicas, Hubert et al., 2001,
realizaram estudo no qual cultivaram queratinócitos transformados, os quais reproduziam as características de lesões
intra-epiteliais cervicais in vivo. Demonstraram alto índice de
apoptose de queratinócitos infectados mediante a adição de
células dendríticas à cultura, quando comparados a culturas
sem esta adição. No entanto, a atividade citotóxica destas
células não afetou os queratinócitos normais. O contato
entre as células dendríticas e as tumorais foi considerado
pré-requisito para a atividade citotóxica das primeiras. Os
referidos autores sugerem que na carcinogênese cervical
quanto maior a infiltração de células dendríticas e de apoptose
celular melhor será o prognóstico das pacientes.
Melhor prognóstico na presença de infiltração por células
de Langerhans também foi observado por alguns autores em
pacientes portadoras de câncer cervical invasivo, bem como
outros tipos de neoplasias malignas tais como as de pulmão,
gástrica, de tireóide e de laringe. A maioria dos autores relata
que quanto maior a infiltração das células de Langerhans
maior será a sobrevida e o tempo livre de doença, menor o
número de metástases em linfonodos e menor o índice de
recorrência loco-regional.
Assim, quando da presença da infecção viral o organismo
prepara, na maioria das vezes, resposta celular efetiva culminando com a regressão das lesões ano-genitais. A regressão
das mesmas é acompanhada de grande infiltração de linfócitos
do tipo CD4 e também CD8 (elementos principais da fase
eferente da resposta imune celular) e células natural killer.
Arany e Tying, 1996, avaliaram pacientes portadoras de lesões
genitais desencadeadas pelo HPV quanto à resposta após
aplicação de interferon. Observaram que nas pacientes com
melhor resposta ocorreu maior infiltração de linfócitos T e
células natural killer (todas com sinal de ativação) e maior
produção local de citocinas.
De Gruijl et al., 1996, deduziram que, ao ocorrer resposta T celular bem sucedida ao vírus HPV, os queratinócitos
infectados são lisados liberando antígenos virais no espaço
extracelular. Nesta localização, os linfócitos B capturam estes
fragmentos virais e desenvolvem anticorpos Ig G específicos.
Estes achados são consistentes com suas observações de que
níveis elevados de Ig G estavam freqüentemente associados
a pacientes que debelaram a infecção e eram infreqüentes
naquelas com doença persistente. Provavelmente, as mulheres
que persistiram com suas lesões não sofreram resposta imune
celular com exposição de antígenos virais pela lise das células
infectadas; assim, o estímulo antigênico não estava presente
para desencadeamento de resposta humoral.
Assim, o propósito de se estudar e entender os fatores
que regulam a resposta imunológica direcionada contra o
HPV é o de auxiliar no desenvolvimento de imunoterapias e
vacinas que possam combater eficazmente a infecção causada
por este agente, prevenindo o desenvolvimento de lesões
precursoras e neoplásicas no trato genital inferior.
FEMINA | Abril 2007 | vol 35 | nº 4
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Imunidade do trato genital inferior e mecanismos defensivos contra o papilomavírus humano
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