Paulo César Nóbrega, 50 Nasci e me criei em São Vicente, uma cidade litorânea no Estado de São Paulo. Como grande parte dos jovens da minha geração, comecei a usar drogas na adolescência. Em 1972, aos 16 anos, já consumia maconha, alucinógenos e drogas injetáveis, inclusive cocaína. Fazia isso por vontade própria, e não como uma forma de rebeldia ou contestação. Era um uso intenso que, em pouco tempo, me envolveu com o tráfico de drogas. Em 1985, acabei sendo preso na cidade de São Paulo e, ao realizar os exames de rotina do sistema penitenciário, fiquei sabendo que tinha sido contaminado pelo vírus da aids. HIV + Inicialmente, fiquei chocado. Mas não sabia direito o que era o HIV e a aids e, por isso, continuei usando drogas e compartilhando seringas com outros detentos na prisão, onde fiquei até 1993. Lá não havia nenhuma orientação ou ação preventiva. Pelo contrário: a dificuldade de se conseguir seringas fazia com que os presos usassem o mesmo material para consumir drogas injetáveis. A aids começou a se manifestar ainda na prisão, por meio da tuberculose. Tive três infecções e, por causa dessa doença, passei a receber medicamentos antiretrovirais. Continuava consumindo drogas e minha reação aos medicamentos era muito ruim. Só retomei o tratamento, de forma séria, em 1999, após abandonar definitivamente as drogas, inclusive o álcool. Nessa época, freqüentava um grupo de ajuda mútua em São Vicente e convivia com outros soropositivos. Decidimos, então, fundar a ONG Hipupiara (www.hipupiara.org.br), numa referência a um monstro marinho que faz parte do folclore da minha cidade. A ONG foi criada para surgiu para promover a união das pessoas vivendo com HIV e melhorar a qualidade de vida delas. Sofri muito com o preconceito em torno da minha soropositividade, inclusive por parte da minha própria família. Também perdi várias oportunidades de emprego por ser HIV positivo. Então, em 2001, comecei a trabalhar como pescador e acabei me aposentando em 2005, aos 50 anos de idade, em conseqüência de doenças oportunistas relacionadas à aids. Hoje, levo uma vida normal. Livre das drogas, mantenho-me fiel ao tratamento. Trabalho como voluntário da ONG Hipupiara, contatando usuários de drogas na cidade e encaminhando-os para os serviços de tratamento e assistência. A ONG cresceu e realiza também ações de redução de danos, assistência jurídica, profissionalização de adolescentes, criação de frentes de trabalho e projetos de prevenção foram sendo incorporados. Com toda a informação que acumulei sobre o HIV e a aids, consegui enfrentar e vencer o preconceito. Os portadores do HIV e os usuários de drogas não devem se fechar ou evitar falar sobre seus problemas. Ao contrário: temos que ajudar uns aos outros e trabalhar para que todos tenhamos uma vida melhor. www.unodc.org/br