CONGRESSO “NA IBÉRIA E NA DIÁSPORA: HISTÓRIA DE JUDEUS E MOUROS (SÉCULOS XVI-XVII) José Alberto Rodrigues da Silva Tavim (IICT, Lisboa; CIDEHUS, Universidade de Évora; CITCEM, Universidade do Porto) “O Diálogo dos Crentes (séculos XVI-XVII)” Nesta comunicação vou reflectir sobre os “excertos” de crença que surgem nos processos inquisitoriais, em que se verifica ou se revela um diálogo de vários intervenientes: judeus recentemente convertidos que conversam entre si, no escuso de lugares como as tabernas e as casa de prostituição, acerca das convicções religiosas que ali sobressaem sobre a religião assumida; diálogos destes, em espaços de convivência social, com judeus de sinal e mouros de sinal, assim como com mouriscos, em que se exaltam os indícios da pureza monoteísta das religiões judaica e islâmica face a uma interpretação da religião cristã como comparativamente degradada; diálogos dos judeus sobre os cristãos-novos entendidos como não judeus, a não ser quando estes recorriam a serviços religiosos de outros judeus no exterior; e esses outros diálogos em que as frases são substituídas pelos actos de solidariedade, verdadeiras alternativas à palavra e à acção imediata – o diálogo dos cristãosnovos com as comunidades judaicas assumidas no exterior, e com as quais pretendiam manter o vínculo de uma identidade sócio-religiosa, pensando porventura naquelas como futuros locais de exílio, ou seja, portos seguros nos mares tempestuosos das perseguições inquisitoriais, fazendo chegar-lhes doações várias, esmolas, etc; mas também da corrente contrária dos enviados que alimentavam estas cripto-comunidades de apetrechos e ensinamentos religiosos; e esse diálogo sub-reptício de figuras judaicas gradas com o Ocidente, de onde tinham fugido mas para o qual também olhavam como possível porto de salvação, o que acarretaria neste caso todo um processo de reintegração que obrigava a uma transformação religiosa e a um diálogo selectivo sobre o seu passado com as organizações objectivadas para a defesa da ortodoxia da fé, como a Inquisição. Lidamos neste estudo com indivíduos que, embora letrados, não pertenciam, na sua maioria, a uma elite intelectual, onde se denotam, para parafrasear David Graizbord, atitudes mais reveladoras de uma adaptação realística do que de irónico cepticismo – a não ser a partir do momento em que se confronta a (nova) religião adoptada.