O CONHECIMENTO DOS ENFERMEIROS SOBRE O MANEJO DA DOR EM PACIENTES ONCOLÓGICOS Andréa Mara Vilas Boas da Silva Nascimento ¹ Imna Mirella Rocha Lourenço ² RESUMO: O câncer continua trazendo desconforto e sofrimento para aqueles que o vivenciam e, apesar dos avanços em seus diagnósticos e tratamento, a dor é um sintoma frequentemente experimentado pelos pacientes. Os pacientes sofredores de dor neoplásica vivenciam uma gama de desconfortos de ordem física, psíquica, social e espiritual. Neste sentido, o alívio da dor constitui um direito do doente, que deve ser atendido pelos profissionais de saúde, sendo fundamental que estes profissionais saibam como controlar a dor de pacientes com câncer, que reajam contra mitos e conceitos principalmente sobre as drogas disponíveis e que se mantenham atualizados. O enfermeiro é o profissional da área da saúde que permanece mais tempo junto ao paciente com dor, portanto, tem a oportunidade de contribuir muito para aumentar o conforto do paciente e aliviar sua dor, através de cuidados especiais oferecidos para o conforto do paciente, de modo que ele possa desenvolver sua capacidade funcional e sobreviver sem dor. Diante deste contexto, o objetivo do presente estudo foi realizar uma revisão de literatura, com o propósito de verificar o conhecimento dos profissionais enfermeiros sobre o manejo da dor em pacientes oncológicos. Palavras-chave: Câncer. Dor oncológica. Enfermagem ABSTRACT: The cancer keeps bringing discomfort and suffering for those who experience it and, despite advances in its diagnosis and treatment, pain is a symptom often experienced by patients. Patients neoplastic pain sufferers experience a range of discomforts of a physical, mental, social and spiritual. In this sense, pain relief is a right of the patient, which must be attended by health professionals, it is essential that these professionals know how to control the pain of cancer patients, which react against myths and concepts especially about drugs available and remain updated. The nurse is the healthcare professional who spends more time with the patient in pain, so we have the opportunity to do much to enhance patient comfort and relieve your pain, through special care offered to the comfort of patient so that he can develop their functional capacity and survive without pain. Given this context, the objective of this study was to conduct a literature review, in order to check the knowledge of nurses about pain management in cancer patients. Keywords: Cancer. Oncological pain. Nursing. _______________________________________________________ ¹ Bacharel em enfermagem pela Universidade do Estado da Bahia de Salvador, Pós-graduanda do Curso de Especialização em Enfermagem na área de oncologia. Atualiza Pós-graduação. ² Bacharel em enfermagem pela Universidade Federal do Vale do São Francisco, Pós-graduanda do Curso de Especialização em Enfermagem na área de oncologia. Atualiza Pós-graduação. 2 1 INTRODUÇÃO Mais de 12,7 milhões de pessoas no mundo são diagnosticadas todo ano com câncer e cerca de 7,6 milhões de pessoas morrem vítimas da doença (IASP, 2008). O termo câncer é empregado para designar mais de uma centena de diferentes doenças (BRASIL, 2009). Os sintomas mais frequentemente relatados por pacientes com câncer avançado são dor (64%), anorexia (34%), constipação intestinal (32%), fadiga (32%) e dispneia (31%) (CORADAZZI E OLIVEIRA, 2011). O controle da dor do câncer é um assunto que tem despertado interesse e questionamentos na comunidade médico-científica e, também, entre outros profissionais da saúde que lidam, diretamente, com o paciente portador da dor oncológica (SAMPAIO; MOURA; RESENDE, 2005). O enfermeiro é um dos profissionais que trabalha de forma direta com o paciente oncológico, não só durante seu tratamento, mas também na fase paliativa da doença, quando a dor é o sintoma mais freqüente e causa de sofrimento desse paciente. Dessa forma, o estudo teve como objetivo revisar a literatura científica para verificar o conhecimento dos profissionais enfermeiros sobre o manejo da dor em pacientes oncológicos. 1.1 REFERENCIAL TEÓRICO Conhecido há muitos séculos, o câncer foi amplamente considerado como uma doença dos países desenvolvidos e com grandes recursos financeiros. Há aproximadamente quatro décadas, a situação vem mudando, e a maior parte do ônus global do câncer pode ser observada em países em desenvolvimento. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estimou que, no ano 2030, podem-se esperar 27 milhões de casos incidentes de câncer, 17 milhões de mortes por câncer e 75 milhões de pessoas vivas, anualmente, com câncer. O maior efeito desse aumento vai incidir em países de baixa e média renda (BRASIL, 2011). 3 No Brasil, as estimativas para o ano de 2012 serão as mesmas para o ano de 2013 e aponta a ocorrência de aproximadamente 518.510 casos novos de câncer, reforçando a magnitude do problema do câncer no país. Os tipos mais incidentes serão os cânceres de pele não melanoma, próstata, pulmão, cólon e reto e estômago para o sexo masculino; e os cânceres de pele não melanoma, mama, colo do útero, cólon e reto e glândula tireóide para o sexo feminino (BRASIL, 2011). Segundo o Instituto Nacional do Câncer, 80% dos pacientes com câncer em progressão experimentarão dor em algum momento da evolução da doença. Afirma também que a dor é uma das mais freqüentes razões de incapacidade e sofrimento para estes pacientes (BRASIL, 2001). O fenômeno doloroso segue descrito na história da humanidade, sendo interpretado e tratado conforme a concepção vigente de cada época. A experimentação sempre esteve presente e a utilização de ervas e outras medidas foram se consolidando pelos resultados obtidos na observação empírica, constituindo um corpo de conhecimentos que embasam, ainda, muitas das intervenções atuais. Séculos de busca pelo saber e constatou-se que nos últimos 20 anos, são inúmeros os trabalhos que apontam para a sub-identificação e sub-tratamento da dor, apesar do expressivo número de publicações sobre o tema (CHAVES; LEÃO, 2004). A dor é um fenômeno humano passível de explicação do ponto de vista da filosofia, mas que ao mesmo tempo, requer compreensão, sendo um fenômeno da ordem da subjetividade e, portanto, carregado de significado para quem a sente (CHAVES; LEÃO, 2004). A Associação Internacional para o Estudo da Dor (IASP) define a dor como uma experiência emocional, com sensação desagradável, associada à lesão tecidual presente, potencial ou descrito nos termos de tal dano. Trata-se de uma manifestação subjetiva, que envolve mecanismos físicos, psíquicos e culturais (CALIU; PIMENTA, 2005). A dor pode ser classificada de acordo com o seu mecanismo fisiopatológico em dor nociceptiva e dor neuropática. A primeira compreende a dor somática e visceral e ocorre diretamente por estimulação química ou física de terminações nervosas normais, resultante de danos teciduais no qual a mensagem de dor viaja dos receptores de dor (nociceptores), nos tecidos periféricos, através de neurônios 4 intactos, até a medula espinhal e estruturas corticais e sub-corticais e, a segunda, resulta de alguma injúria a um nervo ou de função nervosa anormal em qualquer ponto ao longo das linhas de transmissão neuronal, dos tecidos mais periféricos ao sistema nervoso central (RANG et al, 2007). Ainda quanto a sua classificação, a dor pode ser caracterizada em aguda e crônica, distinguindo entre si por seu tempo de duração, em que a dor aguda tem início súbito e duração limitada e a dor crônica é uma dor prolongada no tempo, normalmente com difícil identificação temporal e/ou causal, que causa sofrimento, podendo manifestar-se com várias características e gerar diversos estádios patológicos (ALVES NETO, et al, 2009). Para Moreira Júnior & Souza (2003) dor aguda é funcional e pode ser considerada basicamente uma resposta fisiológica ao dano tecidual, enquanto que a dor crônica envolve mecanismos psicológicos e comportamentais que conferem ainda mais complexidade ao caráter subjetivo desse tipo de dor. Na experiência dolorosa, além da etiologia e do seu caráter temporal, os aspectos sensitivos, emocionais e culturais são indissociáveis e devem ser igualmente investigados. Como evidenciado anteriormente, a dor é a manifestação mais freqüente em pacientes com câncer e pode ocorrer em qualquer momento durante a doença resultando em desconforto para os pacientes, portanto a queixa de dor deve ser sempre valorizada e respeitada para que as intervenções sejam implementadas de formas eficazes. A dor associada ao câncer possui etiologia multifatorial, podendo ser relacionada ao tumor primário ou suas metástases, à terapia anticancerosa e aos métodos de investigação. Seu controle merece prioridade por várias razões, uma vez que o não tratamento da dor causa sofrimento desnecessário. A dor prejudica a atividade física, o apetite e o sono, podendo debilitar ainda mais o paciente (DUCCI & PIMENTA, 2003). As estimativas da prevalência da dor no câncer têm variado bastante, principalmente pela falta de padronização nas definições de dor e nas medidas usadas para avaliá-la, e por causa da heterogeneidade de condições de dor nociceptiva e neuropática (IASP, 2008). De acordo com a estimativa da Organização Mundial de Saúde (OMS), das cinco milhões de pessoas que morrem de câncer a cada ano, quatro milhões 5 morrem com dor não controlada. Entretanto, muito do sofrimento provocado pela dor é desnecessário, pois mais de 90% dos casos de dor no câncer podem ser efetivamente controlados (DUCCI; PIMENTA, 2003). Segundo o INCA a prevalência da dor em pacientes com câncer aumenta com a progressão da doença, estima-se que 30% dos pacientes com câncer recebendo tratamento apresentem dores moderada a intensa em contrapartida aos 60 a 90% de manifestação dolorosa dos pacientes com câncer avançado (BRASIL, 2001). É condição imprescindível que os profissionais de saúde saibam como controlar a dor de pacientes com câncer avançado, que reajam contra mitos e conceitos principalmente sobre as drogas disponíveis e que se mantenham atualizados (BRASIL, 2001). Para que o tratamento seja efetivo é necessário reconhecer que a dor no câncer tem origem multifatorial, isto é, o sucesso no tratamento da dor requer uma avaliação cuidadosa de sua natureza, entendimento dos diferentes tipos e padrões de dor e conhecimento do melhor tratamento. No entanto, apesar do considerável progresso científico e farmacológico, a dor continua sendo substancialmente subtratada (BRASIL, 2001). O enfermeiro é o profissional da área da saúde que permanece mais tempo junto ao paciente com dor, portanto, tem a oportunidade de contribuir muito para aumentar o conforto do paciente e aliviar sua dor, através de cuidados especiais oferecidos para o conforto do paciente, de modo que ele possa desenvolver sua capacidade funcional e sobreviver sem dor. Assim, o adequado preparo de enfermeiros é estratégia fundamental para o controle da dor e demais sintomas prevalentes em pacientes com câncer avançado, uma vez que, avaliam a resposta a terapêuticas e a ocorrência de efeitos colaterais, colaboram na reorganização do esquema analgésico e propõem estratégias não farmacológicas, auxiliam no ajuste de atitudes e expectativas sobre os tratamentos, preparam os doentes e treinam cuidadores para a alta hospitalar (BRASIL, 2001). 6 2 METODOLOGIA A revisão bibliográfica do tipo descritiva foi o método adotado para a pesquisa. Noronha e Ferreira (2000) definem revisão bibliográfica como estudos que analisam a produção bibliográfica em determinada área temática, dentro de um recorte de tempo, fornecendo uma visão geral ou um relatório do estado-da-arte sobre um tópico específico, evidenciando novas idéias, métodos, subtemas que têm recebido maior ou menor ênfase na literatura selecionada. Taylor e Procter (2001) ratificam a definição de Noronha e Ferreira (2000), pois definem revisão de literatura como uma tomada de contas sobre o que foi publicado acerca de um tópico específico. Para o desenvolvimento do estudo foram utilizados como referências artigos científicos publicados em revistas eletrônicas brasileiras de elevado prestígio na comunidade científica, bases de dados da internet como Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), LILACS e SCIELO, utilizando como base os artigos publicados entre os anos de 2000 e 2012, com o auxílio dos seguintes descritores: câncer; dor e enfermagem. De acordo com os descritores utilizados foram encontrados 37 artigos, destes 10 se identificaram com o assunto. Foram incluídos nesse trabalho: pesquisas e livros mais recentes e/ou de referência sobre o tema. A busca realizada foi limitada aos artigos publicados em português, espanhol e inglês. Outras referências encontradas manualmente, a partir da busca inicial, foram consideradas. 7 3 RESULTADOS E DISCUSSÃO O problema da dor no paciente com câncer é preocupante e exige atuação eficaz dos profissionais de saúde para seu manejo (MORAES, 2007). Por isso, fazse necessário, antes de se programar a terapêutica complementar, o conhecimento sobre a dor associada ao câncer, suas causas e os mecanismos fisiopatológicos envolvidos. Considerando que o processo doloroso prejudica o doente com câncer em todas as suas dimensões (física, psicológica, social e espiritual), a sua abordagem deve ser ampla e de forma integral, devendo ser visto como um ser biopsicossocial que apresenta não apenas uma doença ou uma dor, mas todo o sofrimento ocasionado por ela (SAMPAIO; MOURA; RESENDE, 2005). Os resultados e discussões desse estudo foram analisados em 3 categorias: a) a problemática da dor em pacientes com câncer, b) o manejo da dor oncológica pela equipe multidisciplinar e c) o conhecimento do enfermeiro acerca do manejo da dor oncológica. 3.1 A problemática da dor em pacientes com câncer A preocupação com a compreensão da dor do paciente oncológico tem aumentado muito nestes últimos anos, assim como os recursos terapêuticos, mas a dor ainda permanece sem resposta satisfatória. Esse tema continua incomodando muitos profissionais da saúde, estimulando-os a buscar respostas nas pesquisas, para melhor avaliação e seu controle (SILVA; ZAGO, 2001). A dor é uma manifestação freqüente em neoplasias malignas em todas as fases e se acentua com a evolução da doença. Pode estar presente em 20% a 50% dos doentes no início do tratamento e ocorrer em cerca de 70% - 90% daqueles com doença avançada (SILVA & PIMENTA, 2003), muitas vezes, por ação direta do tumor, invadindo e comprimindo vasos e terminações sensitivas ou decorrente do próprio tratamento oncológico, destacando-se os procedimentos operatórios, a radioterapia e a quimioterapia (IKSILARA, 2004). 8 Por conseguinte, por ser algo subjetivo, difícil de interpretar ou descrever, muitas vezes, a dor é subdiagnosticada e subtratada, principalmente em pacientes com câncer, nos quais as variáveis psicológicas e outras comorbidades clínicas contribuem para a inadequada abordagem da dor e, consecutivamente, queda da qualidade de vida (PENA; BARBOSA; ISHIKAWA, 2008). Os estudos evidenciam que a dor, quando não aliviada, limita o indivíduo nas atividades de vida diária, altera o apetite, o padrão de sono, a deambulação, a movimentação, o humor, o lazer, as atividades profissionais, sociais e familiares. Nos doentes com câncer a dor pode desencadear frustração, processo depressivo, isolamento social e familiar, exacerbação do medo e da dor. A dor, quando não tratada adequadamente, afeta a qualidade de vida dos doentes e de seus cuidadores em todas as dimensões: física, psicológica, social e espiritual (SILVA & PIMENTA, 2003). Dentre os fatores que influenciam a sensação dolorosa, evidenciam-se os sentimentos e as experiências emocionais como mágoa, luto, temor, angústia e culpa. Portanto, a reação a um estímulo doloroso é individual, depende do estado físico e emocional do sujeito em situação a dor (SILVA; ZAGO, 2001). O alívio da dor oncológica é um trabalho delicado, que demanda conhecimento técnico e científico por parte do profissional que presta cuidado e, sobretudo, sensibilidade para atender a todas as necessidades do paciente, quer sejam físicas, emocionais, psicossociais e espirituais e, posteriormente, intervir não somente no quadro doloroso, mas também no sofrimento decorrente da dor e da doença (FONSECA; BRITTO, 2009). Assim, o relato da experiência dolorosa pelo paciente aos profissionais de saúde é fundamental para a compreensão do quadro álgico, implementação de medidas analgésicas e avaliação da eficácia terapêutica. 3.2 O manejo da dor oncológica pela equipe multidisciplinar É fundamental, salientarmos a importância da multidisciplinaridade e da interdisciplinaridade, diante das necessidades do paciente oncológico. O tratamento 9 da dor oncológica é complexo, e seu sucesso terapêutico requer múltiplos esforços para a obtenção de bons resultados. A abordagem do paciente oncológico deve ser ampla e de forma integral; ele deve ser visto como um ser biopsicossocial que carrega não apenas uma doença ou uma dor, mas todo o sofrimento causado por ela. É preciso ressaltar que a avaliação da experiência dolorosa não é um procedimento simples, visto tratar-se de fenômeno individual e subjetivo, cuja interpretação e expressão envolvem elementos sensitivos, emocionais e culturais. Os objetivos da avaliação são caracterizar a experiência dolorosa em todos os seus domínios, identificar os aspectos que possam estar determinando ou contribuindo para manifestação dos sintomas, aferir as repercussões da dor no funcionamento biológico, emocional e social do indivíduo. Acredita-se que o insuficiente controle da dor deva-se à avaliação inadequada (SILVA; ZAGO, 2001). A experiência dolorosa é um fenômeno individual e, para caracterizá-la, devem ser realizadas avaliações sistemáticas. O registro de tais informações permite que os dados sejam compartilhados entre os diversos plantões e a equipe multiprofissional, possibilitando melhor assistência. A comunicação entre o doente e os profissionais que o atendem é de extrema importância para compreensão do quadro álgico e de seu alívio (PIMNENTA; SILVA, 2003). O alívio da dor e do sofrimento aumenta a tolerância dos pacientes aos procedimentos diagnósticos e terapêuticos do câncer, proporcionando ao doente maior bem estar, melhora funcional e melhor qualidade de vida (SAMPAIO; MOURA; RESENDE, 2005). Sendo assim, Silva e colaboradores (2007) relatam que o controle da dor é mais efetivo quando há o emprego de uma abordagem multimodal, que abranja, tanto intervenções farmacológicas, quanto não farmacológicas. Apesar dos esforços no sentido de se construir um novo modelo que possa ir ao encontro da integralidade na assistência, ainda predomina na maioria das escolas um modelo centrado na racionalidade técnica, na transmissão do conhecimento, numa ótica de que para assegurar a qualidade da formação, o exercício profissional, deva ser precedido de uma sólida base científica. Essa formação, essencialmente voltada para a dimensão biológica favorece o despreparo desses profissionais para enfrentar as outras dimensões presentes em sua prática profissional (LIMA; RIBEIRO, 2002). 10 Talvez esse fato justifique os resultados do estudo com abordagem multiprofissional realizado por Menossi & Lima (2004), os quais constataram que entre os tratamentos utilizados para o alívio da dor das crianças e adolescentes com câncer, o recurso medicamentoso destaca-se como a principal intervenção a ser utilizada, evidenciando a predominância do eixo biológico. Outro aspecto relevante foi à referência à dor de forma compartimentalizada, diferenciando a dor física/orgânica e a dor psicológica/emocional o que os fizeram concluir que a separação entre dor física e dor psíquica é limitante, dado que o físico e o psíquico não são isoláveis. A avaliação da dor é um importante passo para o planejamento do cuidado. Ela impõe não apenas a determinação do problema físico do paciente, mas também os elementos psicológicos, sociais e emocionais do seu sofrimento e deve ser realizada, em conjunto, por todos os profissionais que acompanham o paciente (SILVA; ZAGO, 2001). Entretanto, para poder proporcionar aos pacientes esse cuidado, é fundamental que os profissionais desenvolvam conhecimentos sobre a dor e, por meio dele, alcance condições de avaliar e dimensionar a sua complexidade (WATERKEMPER; REIBNITZ, 2010). Portanto, é preciso uma avaliação conjunta dos profissionais, que possibilite a percepção dos diferentes componentes envolvidos na dor que se evidencia no paciente com câncer e conseqüentemente, permita a escolha da melhor forma de intervenção entre as possibilidades terapêuticas existentes e a avaliação da eficácia da terapêutica escolhida, considerando-se as peculiaridades de cada paciente e cada família. 3.3 O conhecimento do enfermeiro acerca do manejo da dor oncológica A dor é um dos sinais e sintomas que o paciente com câncer mais apresenta e relata. O seu controle para o alívio do desconforto e sofrimento é uma das preocupações mais presentes no dia-a-dia do enfermeiro que trabalha com esse tipo de paciente, assim, a atuação do profissional, de modo independente e colaborativo, 11 compreende a identificação de queixa álgica e a seleção de estratégias para seu controle (WATERKEMPER; REIBNITZ, 2010). Se no tratamento de pacientes com dor é necessário considerar vários fatores que interagem no processo, ressalta-se a importância de analisar e compreender a dor como decorrente desses fatores, e não isoladamente, visto que o objetivo do tratamento é a reabilitação global do indivíduo e não apenas corrigir um dos aspectos isolados de sua expressão sintomática. Nesse sentido, a avaliação da dor, pelo enfermeiro, é o ponto fundamental para o planejamento do tratamento e do cuidado (SILVA; ZAGO, 2001). Assim, o enfermeiro deve exercer seu papel no controle da dor, uma vez que tem responsabilidade na avaliação diagnóstica, na intervenção e monitorização dos resultados do tratamento, na comunicação das informações da dor do paciente, como membro da equipe de saúde (SILVA; ZAGO, 2001). Portanto, vem se evidenciando a atuação do enfermeiro no manejo da dor, pois, geralmente, pela maior proximidade junto aos que necessitam de cuidados, é ele quem faz a identificação do quadro álgico, avaliação da dor, notificação, quando necessário, à equipe médica, implementação da terapêutica prescrita e avaliação da analgesia, além de desempenhar outras atividades relacionadas à reabilitação global do indivíduo (SILVA; LEÃO, 2007). Neste sentido, o enfermeiro pode utilizar diversas técnicas não invasivas, no controle da dor no doente com câncer, que incluem medidas de ordem educacional, física, emocional, comportamental e espiritual (PIMENTA; FERREIRA, 2006). Porém, os enfermeiros apontam a falta de conhecimento para atuar de forma mais efetiva, utilizando outras intervenções além do recurso medicamentoso e a falta de autonomia como obstáculos ao cuidado desses pacientes (MENOSSI; LIMA, 2004). O estudo realizado por Silva & Zago (2001) ratificam a descrição acima ao concluírem que os critérios utilizados pelos enfermeiros para avaliarem a dor crônica do paciente oncológico demonstram que eles baseiam-se na sua empatia com o paciente, nas respostas emocionais e sociais dos pacientes, porém, também explicitam noções insuficientes sobre o tema. As suas impressões estão fundamentadas na cultura popular sobre a dor, determinada por suas crenças e valores. Assim, esse processo não é sistemático, não há utilização de protocolos, é 12 essencialmente subjetivo e inadequado, incoerente com o conhecimento científico que deve fundamentar a prática profissional. Um estudo desenvolvido por Fonseca & Britto (2009), em uma unidade de cuidados paliativos, também revelou que não há instrumento específico para o registro das informações sobre a avaliação da dor e os itens que existem no histórico de enfermagem e prescrição são pouco abrangentes. Além disso, os enfermeiros e os demais profissionais não aplicam nenhuma escala de avaliação da dor. Por este motivo, a avaliação da dor dos pacientes com câncer, realizada pelas enfermeiras que atuam em cuidados paliativos, acontece de forma individualizada e assistemática sem seguir protocolos ou instrumentos de avaliação. Além da lacuna da falta de embasamento científico para avaliação e registro da dor em pacientes oncológicos, a análise da atuação do enfermeiro no tocante ao manejo da dor, tem evidenciado a falta de registro adequado quanto ao quadro álgico desses pacientes. Pimenta & Silva (2003) apontam que os registros de enfermagem sobre a dor em pacientes oncológicos são limitados, uma vez que houve pouca coincidência entre os registros e a avaliação dos pacientes sobre seu quadro álgico quanto ao local, intensidade, duração, qualidade e prejuízos advindos da dor. Assim as autoras concluíram que a adoção de um padrão de avaliação diária do doente, especificamente sobre dor, possa contribuir para o aperfeiçoamento da assistência de enfermagem. Outra questão apresenta relevância quanto ao preparo desses profissionais no manejo da dor oncológica, qual seja: a objeção dos enfermeiros em expressarem suas dificuldades diante do sofrimento causado pelo câncer e pela dor. Assim, o modo como alguns enfermeiros valorizam o cuidado multidisciplinar não está baseado na integração de conhecimentos específicos de outras disciplinas mas, sim, para suprir a sua insegurança em lidar especificamente com os comportamentos psicossociais do paciente oncológico com dor (SILVA; ZAGO, 2001). Assim, a incerteza, a tensão do trabalho a importância e a percepção do peso da tarefa de cuidar do paciente oncológico com dor produzem um desconforto e uma baixa auto-estima nos enfermeiros. Daí a necessidade deles aprimorarem seus conhecimentos e habilidades para poderem com segurança e eficiência cuidar do paciente com dor e de sua família (SILVA; ZAGO, 2001). 13 4 CONCLUSÃO A abordagem holística do tratamento do câncer lida não só com os aspectos físicos, os sintomas do paciente, mas também com sua atitude emocional e suas crenças, a sua habilidade em se recuperar e a sua capacidade de resolver os seus problemas emocionais. Hoje se tem um consenso quanto ao caráter subjetivo e multifatorial da dor, o que requer uma abordagem de tratamento especializada e multidisciplinar, de modo a identificar e resolver os problemas de comunicação e mensuração da dor e a ampliar os cuidados terapêuticos oferecidos ao paciente e suporte prestado à família e cuidadores, e à equipe de saúde. Apesar da existência de recursos tecnológicos, dentre eles, profissionais competentes, equipamentos e medicamentos de última geração, instrumentos de avaliação e protocolos, o atendimento a esses pacientes pode apresentar lacunas que inviabilizam a constituição de um cuidado integral. Assim, compreendemos que a composição de distintos saberes, a partir da ação articulada dos profissionais é um dos fatores necessários para a concretização desse cuidado. Os enfermeiros descrevem que suas ações são limitadas pela falta de conhecimento de como intervir na dimensão afetiva ou expressiva. Assim, o cuidado prestado é baseado no modelo médico, no qual os profissionais têm maior segurança. Os resultados deste estudo levam-nos a perspectiva de que a educação continuada é necessária para eliminar a ignorância disseminada dos profissionais de saúde sobre o câncer, a dor e o controle da dor no câncer, pois, a atenção deve ser dada a todos os aspectos do sofrimento – físico, psicológico, social e espiritual. Devido à magnitude do problema do cuidado com o paciente oncológico com dor, expostos neste estudo, fazem-se necessárias intervenções que venham transformar esse cuidado. Como estratégia, consideramos que o currículo de graduação de enfermeiros deva inserir conteúdos sobre o tema. Em nível institucional, a educação continuada é a recomendação para se alcançar às metas de qualidade do cuidado a esses pacientes. 14 REFERÊNCIAS ALVES NETO, A.; COSTA, C. M. C.; SIQUEIRA, J. T. T., TEIXEIRA, M. J. Dor: princípios e prática. Porto Alegre: Artmed, 2009. p.27-55, 145-71. BRASIL. Ministério da Saúde. Instituto Nacional de Câncer. Cuidados paliativos oncológicos: controle da dor. 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