Revista Madre Ciência Saúde – Vol. 1, Nº 1, 2016

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Revista Madre Ciência Saúde – Vol. 1, Nº 1, 2016
CONHECIMENTO E USO DE PLANTAS MEDICINAIS NO TRATAMENTO DE
DOENÇAS PELOS MORADORES ATENDIDOS NA UNIDADE BÁSICA DE SAÚDE
DA ILHA DE SANTANA/AP
Aline Silva Ramos¹
Jair Carvalho de Melo²
Karem Caroline de Lima Lopes²
Railane dos Reis Guimarães²
RESUMO
Este trabalho objetivou verificar o nível de uso e conhecimento dos moradores do distrito da
Ilha de Santana, município de Santana/AP, a respeito de plantas medicinais no tratamento de
doenças. A pesquisa foi de campo, descritiva, de abordagem quantitativa, com uma amostra
de 100 indivíduos, moradores da Ilha de Santana e usuários da Unidade Básica de Saúde
local, com idade superior a 18 anos, sem especificação de sexo, que residissem no local há
mais de 1 ano e que aceitassem participar livremente da pesquisa. Foram excluídos indivíduos
com problemas neurológicos que comprometessem a capacidade cognitiva, incapacidade de
fala/audição, os que preencheram inadequadamente o formulário de coleta de dados e os que
não aceitaram fazer parte da pesquisa. Os formulários de coleta de dados foram produzidos e
aplicados pelos pesquisadores, em abordagem individual na Unidade Básica de Saúde em
questão, acompanhados do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Os resultados
mostraram que nos dois grupos etários (18-49 anos e 50 anos ou mais), a maioria da
população relatou possuir conhecimentos sobre plantas medicinais, porém pouco
conhecimento no grupo mais jovem (69,51%) e muito conhecimento no grupo mais velho
(77,8%); igualmente, nos dois grupos, a maioria referiu usar plantas medicinais para tratar
doenças, porém com pouco uso no grupo mais jovem (50%), e muito uso no grupo mais idoso
(83,3%); foram mencionadas 81 plantas conhecidas e em uso pela população, prevalecendo 1
a 5 citações (69,5%) no grupo 1 (18-49 anos) e 6 a 9 citações (61,1%) no grupo 2 (50 anos ou
mais); foram mencionados 59 objetivos terapêuticos para as plantas citadas; a maioria dos
indivíduos dos dois grupos etários referiu-se muito satisfeito com os resultados obtidos com o
uso das plantas, porém num percentual menor no grupo mais jovem (84,1%) do que no mais
próximo da terceira idade (100%); o motivo para uso das plantas mais citado nos dois grupos
foi o fácil acesso (22,32% no grupo 1, e 27,59% no grupo 2); e a maioria dos indivíduos dos
dois grupos relatou ter recebido os conhecimentos sobre plantas medicinais de seus pais (63%
no grupo 1, e 45,8% no grupo 2). Os resultados mostraram-se semelhantes entre os dois
grupos na maioria dos quesitos avaliados, porém com uma perda observável no
conhecimento, uso e nível de satisfação no grupo mais jovem.
Palavras-chave: Plantas Medicinais.
Alternativas. Saúde Pública.
Ribeirinhos.
Medicina
Tradicional.
Terapias
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ABSTRACT
This study aimed to determine the level of use and awareness of residents of Santana Island
district, municipality of Santana / AP, about medicinal plants in treating diseases. The
research was field, descriptive and quantitative approach with a sample of 100 individuals,
residents of the island of Santana and members of the local Basic Health Unit, over the age of
18, without specifying gender, who resided in place for over 1 year and to accept freely
participate in the research. Subjects were excluded if they had neurological problems that
could compromise cognitive ability, inability to speech / hearing, that inadequately completed
the data collection form and those who did not accept to be part of the research. The data
collection forms were produced and applied by researchers in individual approach to basic
health unit in question, accompanied by the Term of Consent. The results showed that in both
age groups (18-49 years and 50 and older), most of the population reported having knowledge
of medicinal plants, but little knowledge in the younger group (69.51%) and knowledge in the
group more old (77.8%); also, in both groups, the majority reported using medicinal plants to
treat diseases, but with little use in the younger group (50%), and use in the older group
(83.3%); were mentioned 81 plants known and used by the population, prevailing 1-5 quotes
(69.5%) in group 1 (18-49 years) and 6-9 quotes (61.1%) in group 2 (50 or older ); They were
mentioned 59 therapeutic goals for the mentioned plants; most individuals in both age groups
referred very pleased with the results obtained from the use of plants, but in a smaller
percentage in the younger group (84.1%) than in the nearest senior citizens (100%); the
reason most cited for the use of plants in the two groups was the easy access (22.32% in
group 1 and 27.59% in group 2); and most of the individuals in both groups reported
receiving knowledge about medicinal plants from their parents (63% in group 1 and 45.8% in
group 2). The results were similar between the two groups in most variables evaluated, but
with a noticeable loss in knowledge, use and level of satisfaction in the younger group.
Keywords: Medicinal Plants. Riverside. Traditional medicine. Alternative Therapies. Public
Health.
INTRODUÇÃO
Durante muito tempo, os saberes tradicionais e populares foram desvalorizados e
subestimados pela comunidade científica ocidental, para não dizer ignorados e negados. Isso
aconteceu a partir da Revolução Científica que tornou o conhecimento mais estruturado e
mais prático, absorvendo o empirismo como mecanismo para se consolidar as constatações
dos métodos científicos a partir da sistematização das pesquisas.
Porém, os recursos da ciência moderna e do método científico ainda não conseguiram
alcançar e estar disponíveis para todas as populações, especialmente em um país continental
como o Brasil. Assim, muitas comunidades brasileiras continuam praticando seus saberes
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tradicionais, herdados de seus antepassados, especialmente no que diz respeito às práticas de
saúde.
As plantas medicinais constituem uma das práticas tradicionais mais difundidas na
população em geral, que procura como alternativa a cura de doenças e sintomas,
proporcionando uma melhoria na qualidade de vida e apresentando uma outra forma de
tratamento mais acessível a população de classe baixa. No entanto, esta alternativa terapêutica
ainda continua cercada de muito preconceito e, assim, desvalorização pelos serviços de saúde
convencionais e pelos profissionais neles presentes.
Esta pesquisa objetivou, então, analisar conhecimento e uso de plantas medicinais no
tratamento de doenças pelos moradores atendidos na Unidade Básica de Saúde da Ilha de
Santana/AP, identificando os seguintes aspectos: perfil da população; conhecimento da
população sobre plantas medicinais; diversidade de plantas conhecidas e em uso pela
população; objetivos terapêuticos para os quais a população usa cada tipo de planta; nível de
satisfação obtido pelos sujeitos ao realizar tratamento de doenças com plantas medicinais;
motivos que levaram a população a utilizar plantas medicinais; formas de transmissão do
conhecimento sobre plantas medicinais; comparando os resultados encontrados entre a
população mais jovem e a população mais velha.
METODOLOGIA
A pesquisa foi de campo, de caráter descritivo e quantitativo. O Universo pesquisado
foi o distrito da Ilha de Santana, um dos 7 distritos que compõem o município de Santana, no
estado do Amapá (AP). Os sujeitos avaliados foram os moradores do referido distrito e
usuários da Unidade Básica de Saúde (UBS) local, denominada UBS Ilha de Santana. Foi
selecionada uma amostra de 100 indivíduos, selecionados aleatoriamente, à medida em que os
pesquisadores visitavam a UBS e os indivíduos se enquadravam nos critérios de inclusão.
Este quantitativo foi definido com base no fluxo médio de usuários à referida UBS que,
segundo dados fornecidos pelos profissionais da mesma, em visita dos pesquisadores,
corresponde a 12 a 15 indivíduos por dia, com exceção das quintas e sextas-feiras. Assim, 100
indivíduos seria um quantitativo referente a quase 1 mês de atendimentos deste serviço de
saúde. Fizeram parte da amostra desta pesquisa indivíduos com idade maiores de 18 anos, de
qualquer sexo, que residam há mais de 1 ano no local de pesquisa e que aceitarem livremente
participar da coleta de dados. Foram excluídos da pesquisa indivíduos com problemas
neurológicos ou outro que comprometa a capacidade cognitiva, incapacidade de fala e/ou
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audição, os que preencherem inadequadamente os instrumentos de coleta de dados ou
desistirem, em qualquer momento da pesquisa, de se manterem como participantes.
Os dados foram coletados através da aplicação de formulários, produzidos pelos
pesquisadores e aplicados pelos mesmos, através da metodologia de entrevista
semiestruturada, aos sujeitos da pesquisa, durante visitas à Unidade Básica de Saúde.
Os sujeitos foram divididos em 2 grupos de análise: indivíduos com idade entre 18 e
49 anos, representando a população mais jovem ou adultos-jovens (Grupo 1), e os indivíduos
com idade superior aos 50 anos, representando a população mais idosa ou próxima da terceira
idade (Grupo 2). Do total de participantes da pesquisa, 82 foram enquadrados no Grupo 1,
enquanto que 18 foram enquadrados no Grupo 2. A análise dos dados foi feita através do total
absoluto e percentual das respostas dos indivíduos em cada quesito avaliado e, em alguns
quesitos, através do comparativo dos resultados encontrados no Grupo 1 e no Grupo 2.
A pesquisa seguiu os princípios da Resolução 466/12, do Conselho Nacional de Ética
em Pesquisas com Seres Humanos – CONEP, e foi encaminhado ao Comitê de Ética em
Pesquisa com Seres Humanos (CEP) do Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do
Amapá (IEPA), tendo sido aprovado por este para realização.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A) PERFIL DA POPULAÇÃO ESTUDADA
Quadro 01 – Perfil da População Pesquisada, em Frequência Absoluta e Percentual
Gênero
Idade
Estado civil
Possui filhos
Número de filhos
Tempo de moradia
Feminino
Fr. Abs.
%
72
72%
18 a 40 anos
Fr. Abs.
%
66
66%
Solteiro
Masculino
Fr. Abs.
%
28
28%
41 a 60 anos
Fr. Abs.
%
27
27%
Casado ou similar
Fr. Abs.
%
38
38%
Não
Fr. Abs.
%
17
17%
Nenhum
Fr. Abs.
%
17
17%
02 a 04 anos
Fr. Abs.
%
19
19%
Fr. Abs.
%
59
59%
Sim
Fr. Abs.
%
83
83%
1a5
Fr. Abs.
%
61
61%
05 a 09 anos
Fr. Abs.
%
22
22%
Fonte: Dados primários, 2015.
61 anos ou mais
Fr. Abs.
%
07
7%
Separado/Divorciado/
Viúvo
Fr. Abs.
%
03
03%
6 a 10
Fr. Abs.
%
22
22%
10 anos ou mais
Fr. Abs.
%
59
59%
17
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Gráfico 01 – Percentual de Escolaridade dos entrevistados
Fonte: Dados primários, 2015.
Gráfico 02 – Percentual de Ocupação dos moradores entrevistados.
Fonte: Dados primários, 2015.
Quanto ao perfil da população, observou-se, então, que a maioria da população é do
sexo feminino (72%), com idade entre 18 e 40 anos (66%), casada (59%), com filhos (83%),
com escolaridade igual ou superior ao ensino médio incompleto (58%), residindo há mais de
10 anos no local (59%) e não possui atividade remunerada (estão desempregados, são donas
de casa ou estudantes) (50%).
Acredita-se que a disponibilidade dos jovens na participação da pesquisa se efetivou
devido a entrevista ser realizada em logradouros públicos, locais mais frequentados pelos
jovens, enquanto que a população mais idosa na sua maioria fica mais em casa, devido a idade
e a outros fatores decorrentes do envelhecimento, como doenças que dificultem a locomoção.
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Quanto ao estado civil, percebeu-se que mais da metade dos entrevistados são casados,
ou seja, a família constituída, formal ou não, pode acarretar uma maior preocupação com a
questão da saúde, e, quanto à temática das plantas medicinais, pode-se supor que quanto
maior número de filhos das famílias mais custos elas tendem a ter, uma vez que os pais
precisam arcar com a educação dos filhos, por exemplo, podendo influenciar no maior uso das
plantas medicinais como alternativa de tratamento mais barato.
Os dados revelam que mais da metade dos moradores entrevistados residem há mais
de dez anos na Ilha de Santana. Esse longo tempo de moradia pode significar um aspecto
cultural muito forte arraigado a estes indivíduos, visto que a localidade é uma região isolada,
longe da área urbana, propiciando a criação de maior vínculo com o local, identidade cultural
muito intensa, podendo também ser um fator de influência no uso das plantas medicinais.
Logo, acredita-se que existe uma maior possibilidade de uso de plantas medicinais por
estes moradores, uma vez que são consideradas práticas tradicionais disseminadas na
população em geral, que procura como opção a cura de doenças e sintomas, visando uma
melhoria na qualidade de vida e apresentando uma outra forma de tratamento mais acessível a
população de classe baixa.
Quanto à escolaridade, constatou-se que a maioria dos entrevistados tem apenas o
fundamental incompleto e o médio completo. Assim, pode-se avaliar que o perfil do
ribeirinho com baixa escolaridade ainda está se mantendo elevado, pois 37% dos
entrevistados sequer concluiu o Ensino Fundamental. Porém, o percentual de indivíduos com
Ensino Médio completo ou Superior (completo ou incompleto) também foi relevante,
caracterizando 41% da população. É um percentual considerável, levando em conta a
realidade ribeirinha. No entanto, o índice de pessoas com Ensino Superior ainda mostrou-se
muito baixo (8%), apesar da maioria da população ser de idade produtiva. Então, observa-se
que a moradia em área ribeirinha não está associada a um determinado grau de escolaridade,
visto que a maior parte da população pesquisada possuía pelo menos o ensino médio
incompleto (58% dela). Tais resultados contrariam o conceito existente de que somente
pessoas com baixo poder econômico e pouca escolaridade moram em áreas ribeirinhas e
sejam as que mais utilizam plantas medicinais no tratamento de saúde.
Finalmente, sobre a ocupação, verificou-se que a maioria dos entrevistados estão
desempregados, são donas de casa, estudantes ou agricultores/pescadores (53%), atividades
caracterizadas como de baixa ou nenhuma renda; enquanto que 42% possuíam emprego
formal, informal ou eram autônomos (como catraieiros). Tal resultado pode vir a indicar o
baixo poder aquisitivo da população em geral, podendo direcionar para o uso de plantas
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medicinais pelos moradores, como uma alternativa mais barata no tratamento de doenças. As
ocupações apresentadas pelos moradores já eram esperadas, por ser uma área ribeirinha.
B) CONHECIMENTO E USO DE PLANTAS MEDICINAIS
Quadro 02 – Conhecimento e uso dos moradores sobre/de plantas medicinais, por grupo
etário.
Conhecimento
Uso
18-49 anos
50 anos ou +
18-49 anos
50 anos ou +
Fr. Abs.
Fr.
Abs.
Fr.
Abs.
Fr.
Abs.
%
%
%
%
02
2,44
00
00
06
7,32
00
0,00
Não
57
69,51
04
22,2
41
50,00
03
16,7
Sim, pouco
23
28,05
14
77,8
35
42,68
15
83,3
Sim, muito
82
100
18
100
82
100
18
100
Total
Fonte: Dados primários, 2015.
No que se refere ao conhecimento dos entrevistados, percebe-se que, do grupo de faixa
etária inferior (18 a 49), apenas 2,44% dos indivíduos respondeu não possuir conhecimentos
sobre o assunto, enquanto que, a maioria (69,51%) referiu possuir conhecimento, porém
pouco. Já no grupo de faixa etária superior (igual ou superior a 50 anos), aproximando-se da
terceira idade, 100% dos indivíduos relataram possuir conhecimentos sobre plantas
medicinais, sendo que 83,3% afirmando possuir muito conhecimento.
Isso demonstra que os moradores entrevistados têm conhecimento sobre as plantas
medicinais, no entanto, o fato de todos os indivíduos mais velhos terem afirmado possuir
conhecimento, com sua grande maioria referindo ter muito conhecimento, enquanto que os
mais jovens, em sua maioria, afirmaram ter pouco conhecimento, e um percentual referiu não
ter conhecimento, foi relevante. Esses resultados eram esperados e demonstram a perda deste
conhecimento que está acontecendo entre as gerações, indicando um déficit na transmissão
dessas informações, o que muito prejudicial para a identidade cultural amazônica e desta
comunidade, em particular.
No que se refere ao uso das plantas medicinais pelos moradores, no grupo de 18 a 49
anos, houve um percentual de 7,32% que referiram não fazer uso deste recurso no tratamento
de doenças, sendo que o maior percentual (50%) foi de indivíduos que responderam usar
plantas medicinais, porém pouco. Em contrapartida, no grupo de moradores com 50 anos ou
mais, todos referiram utilizar as plantas medicinais como recurso terapêutico, com a grande
maioria (83,3%) relatando utilizar muito este recurso.
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Esses dados concordam com os referentes ao nível de conhecimento dos dois grupos, e
também indica como esta prática, apesar de ainda ser muito presente na vida dessa população,
está se perdendo no decorrer do tempo, concentrando-se com mais intensidade na população
mais próxima da terceira idade.
C) DIVERSIDADE DE PLANTAS USADAS PARA TRATAMENTO DE SAÚDE
Quadro 03 – Diversidade de plantas medicinais em uso pela população entrevistada e
frequência absoluta de citações por planta.
Boldo
(34)
Babosa
(12)
Laranja ou
Laranjeira (4)
Jutaizeiro
(2)
Preciosa
(1)
Fava
(1)
Hortelã
(25)
Pariri
(10)
Jucá
(4)
Japana
(2)
Embaubeira
branca (1)
Virola
(1)
Andiroba (24)
Cajueiro
(10)
Erva doce
(4)
Gravioleira
(2)
Mucuúba
Branca (1)
Vick
(1)
Alho
(20)
Barbatimão
(10)
Camomila
(4)
Gengibre ou
Mangarataia
(2)
Arnica
(1)
Urucu
(1)
Limão
(19)
Arruda
(10)
Mucuracá
(3)
Favaca
(2)
Cumaru
(1)
Tento
(1)
Mastruz
(17)
Quebra-pedra
(8)
Eucalipto
(3)
Côco
(2)
Chapéu de
couro (1)
Taperebazeiro
(1)
Hortelãzinho
(17)
Pracaxi
(8)
Chicória
(3)
Capim santo
(2)
Menta
(1)
Sucupira
(1)
Erva Cidreira
(17)
None
(7)
Capim
marinho (3)
Capim
limão/lima (2)
Jatobá
(1)
Alecrim
(1)
Verônica
(14)
Catinga de
mulato (7)
Amor
crescido (3)
Abacateiro
(2)
Manjericão
(1)
Quina
(1)
Copaíba
(14)
Ameixeira
(7)
Alfazema
(3)
Biribazeiro
(1)
Salgueiro
(1)
Cacho da
banana (1)
Cana ficha (14)
Algodão /
Algodoeiro (6)
Picão
(2)
Periquito
(1)
Maria mole
(1)
Pião roxo
(1)
Anador
(14)
Pata da vaca
(5)
Pião branco
(2)
Gergelim preto
(1)
Açaí pena
(1)
-
Marupá ou
Marupazinho
(12)
Laranja da terra
(5)
Elixir
paregórico
(2)
Canela (1)
Brasileirinho
(1)
Goiabeira (12)
Pirarucu
(4)
Maracujá
(2)
Malvarisco (1)
Fonte: Dados primários, 2015.
Marcela
(1)
-
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O Quadro 03 mostra os dados sobre a diversidade das plantas medicinais em uso pela
população residente na Ilha de Santana, e o número de citações por planta. A partir das
informações apresentadas destaca-se a grande diversidade de plantas mencionadas pelos
entrevistados, totalizando 81 tipos diferentes de plantas, mencionadas de maneira isolada ou
em conjunto com outras plantas.
Dentre as plantas citadas, houve um intervalo de citações de 1 a 34 vezes por planta,
sendo que 30 plantas foram mencionadas apenas 1 vez; 25 plantas foram mencionadas entre 2
e 5 vezes; 16 plantas foram mencionadas entre 6 e 14 vezes; e 7 plantas foram citadas entre 17
e 34 vezes. A planta mais citada no uso pela população foi o boldo, mencionado por 34
moradores; seguido da hortelã, com 25 citações; Andiroba, com 24 citações; Alho, com 20
citações; e limão ou limoeiro, com 19 citações.
Observa-se, então, que o número de plantas medicinais citadas foi bastante
diversificado. Tais dados reafirmam que o uso e conhecimento de plantas medicinais no
tratamento de doenças são muito presentes na Ilha de Santana, caracterizando um quadro de
saúde muito importante.
Observa-se também no Quadro 04, abaixo, que no grupo de menor faixa etária, a
maioria dos indivíduos (69,5%) mencionou 1 a 5 plantas utilizadas para tratar doenças,
enquanto que no grupo de 50 anos ou mais, a maioria dos indivíduos (61,1%) citou entre 6 a
10 plantas utilizadas. Por fim, no grupo de 18 a 49 anos, apenas 01 indivíduo (1,2% do total)
citou mais de 10 plantas de seu uso, enquanto que no grupo de 50 anos ou mais, 03 indivíduos
(16,7%) mencionaram 10 plantas ou mais.
Quadro 04 – Número de plantas medicinais usadas pelos entrevistados, de acordo com o
grupo etário, em frequência absoluta e percentual.
Citações por Faixa Etária
Nº de Plantas citadas
18-49 anos
50 anos ou +
Fr. Abs.
%
Fr. Abs.
%
05
6,1
00
0,0
Nenhuma
57
69,5 04
22,2
1a5
19
23,2 11
61,1
6 a 10
01
1,2
03
16,7
Mais de 10
82
100 18
100
Total
Fonte: Dados primários, 2015.
As informações apresentadas demonstraram que o conhecimento e uso de plantas
medicinais refletem-se na transmissão do conhecimento e da cultura de gerações passadas
para as gerações mais recentes. Apesar dessa transmissão de conhecimento sobre o uso das
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plantas para a população mais jovem ainda ocorrer, tem diminuído, o que pode acarretar na
perda do conhecimento tradicional dos povos amazônicos.
O uso de plantas medicinais pode ser influenciado pela questão econômica, o alto
custo dos medicamentos e o difícil acesso a consultas pelo SUS, também pela dificuldade de
locomoção daqueles que residem em áreas rurais ou pela tendência atual de utilização de
recursos naturais como alternativa aos medicamentos sintéticos. As gerações mais antigas
conservam o conhecimento tradicional da utilização de espécies vegetais para o tratamento de
problemas de saúde, pois os mais velhos tendem a conhecer mais sobre assuntos de interesse
vital para a comunidade e são respeitados pelo seu saber. Reconhecendo a relevância da
sabedoria tradicional, se faz necessária a sua preservação a fim de proteger o conhecimento da
comunidade, que deve ser repassado ao longo de gerações e não se perder com o tempo
(VENDRÚSCOLO; MENTZ, 2006).
D) OBJETIVOS TERAPÊUTICOS PARA USO DAS PLANTAS
Quadro 05 – Objetivos terapêuticos citados pelos moradores entrevistados para o uso
das plantas medicinais
Cicatrização
Hidratação
Calmante
Dor geral
Malária
Erisipela
Ameba
Gastrite
Vômito
Hemorróida
Gripe
Impinge
Catapora
Cólica
Flatulência
Queimadura
Câimbra
Tosse
Febre
Constipação
Infecção
intestinal
Infecção
urinária
Hidratação
capilar
Relaxante
muscular
Prevenção de
AVE
Asma
Anemia
Infecção
Diabetes
Circulação
Osteoartrose
Bronquite
Inflamação
Colesterol
Dor de ouvido
Dor de cabeça
Dor muscular
Pedra nos rins
Pterígio
Dor no baço
Diarréia
Assepsia de
feridas
Higiene íntima
Inflamação
uterina
Emagrecer
Dor de
estômago
Distensão
muscular
Problemas no
fígado
Expectorante
Problema no
rim
Pneumonia
Dor de barriga
Hipertensão
Reumatismo
Sinusite
Tratar feridas
Dor muscular
Disenteria
Verminoses
-
Fonte: Dados primários, 2015.
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Conforme mostra o Quadro 05, foram citados 59 objetivos terapêuticos diferentes para
as 81 plantas citadas, caracterizando uma variedade muito grande de acometimentos de saúde
tratados com plantas medicinais por essa população. Houve uma frequência entre 1 e 9
objetivos terapêuticos citados para cada planta, sendo que para 29 plantas foi citado apenas 1
objetivo terapêutico; para 41 plantas foram citados de 2 a 5 objetivos de uso; e para 9 plantas
foram citados entre 6 e 9 objetivos terapêuticos. Também houve 3 plantas que foram citadas
mas os sujeitos que as mencionaram não souberam dizer para que elas eram usadas, cujas
indicações terapêuticas constaram no quadro como não mencionadas. As três plantas com
maior número de objetivos de uso mencionados foram o alho, a andiróba e a hortelã.
Castro et. al. (2001) destacam que o conhecimento popular não deve ser desprezado
pela ciência, pois este conhecimento, alicerçado sobre bases empíricas e em resultados
práticos, se contrapõe ao conhecimento científico, que se fundamenta em teorias comprovadas
experimentalmente com métodos aceitos pela classe científica.
E) NÍVEL DE SATISFAÇÃO COM OS RESULTADOS OBTIDOS
Quadro 06 – Nível de satisfação referido pelos sujeitos com os resultados do tratamento com
plantas medicinais, em frequência absoluta e percentual, por grupo etário.
Total por Faixa etária
Nível de Satisfação
18-49 anos
50 anos ou +
Fr. Abs.
%
Fr. Abs.
%
04
4,9
00
0,0
Não
09
11,0
00
0,0
Sim, pouco
69
84,1
18
100,0
Sim, muito
82
100
18
100
Total
Fonte: Dados primários, 2015.
O Quadro 06, acima, apresenta os níveis de satisfação dos moradores da Ilha de
Santana no que se refere aos resultados obtidos através do tratamento de problemas de saúde
por meio das plantas medicinais, de acordo com o grupo etário.
Pode-se observar que, no grupo de 18 a 49 anos, a maioria dos indivíduos (84,1%)
mostrou-se muito satisfeito com os resultados obtidos através do uso das plantas medicinais,
porém ainda houve um total de 11% dos indivíduos que referiram-se pouco satisfeitos e de
4,9% dos indivíduos que relataram-se não estar satisfeitos com os resultados encontrados. Já
no grupo de indivíduos com 50 anos ou mais, 100% dos indivíduos referiram-se muito
satisfeitos com os resultados de saúde obtidos através do uso das plantas medicinais.
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Este resultado também confirma que a transmissão da prática das terapias através de
plantas medicinais no meio da população ribeirinha da ilha de Santana tem sofrido grandes
mudanças com o passar das gerações. Um dos motivos pelo qual os indivíduos mais jovens
podem estar se mostrando menos satisfeitos, e até mesmo insatisfeitos com os resultados
dessa prática, enquanto os mais velhos mostraram-se 100% muito satisfeitos, pode ser a perda
da habilidade no desenvolvimento dessa técnica, na preparação das formas de uso, assim
como a menor frequência de uso. Além disso, sabe-se que as gerações passadas eram muito
mais vinculadas aos aspectos comunitários culturais e tradicionais, apegando-se fortemente a
eles e isso por torna-las mais propensas a avalia-los positivamente, bem como o oposto é
verdadeiro em relação às novas gerações.
F) FORMAS DE TRANSMISSÃO DO CONHECIMENTO
Quadro 07 – Formas de transmissão do conhecimento sobre as plantas medicinais, em
frequência absoluta e percentual, de acordo com os grupos etários.
Total por Faixa etária
Transmissão de Conhecimento
18-49 anos
50 anos ou +
Fr. Abs.
%
Fr. Abs.
%
27
27,0
07
29,1
Avós
63
63,0
11
45,8
Pais
05
5,0
04
16,7
Amigos
02
2,0
01
4,2
Capacitação
03
3,0
01
4,2
Mídia
100
100
24
100
Total
Fonte: Dados primários, 2015.
No Quadro 07, acima, apresentou-se os dados dos moradores sobre como adquiriram
os conhecimentos que possuem sobre as plantas medicinais, ou seja, quais meios transmitiram
estes conhecimentos a eles. Como esta era uma pergunta aberta, alguns indivíduos citaram
mais de uma forma de aquisição do conhecimento sobre plantas medicinais, o que resultou em
um total de respostas superior aos indivíduos de cada grupo etário.
No grupo etário de 18 a 49, foram registradas 100 respostas, das quais prevaleceu a
figura dos pais como principais transmissores desse conhecimento (63% das citações) e os
avós em segundo lugar (27%). Da mesma forma, estes foram os resultados prevalentes no
grupo etário de 50 anos ou mais, com percentual de 45,8% e 29,1%, respectivamente. No
grupo etário mais velho também destacou-se o papel dos amigos como transmissores de
conhecimento.
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Esse resultado já era esperado, visto que o uso de plantas medicinais faz parte da
chamada Medicina Tradicional, um conjunto de conhecimentos transmitidos de uma geração
para a próxima, dos pais para os filhos. E essa continua sendo a principal forma de se
transmitir esse conhecimento na realidade da Ilha de Santana. Isso aponta para a seriedade de
se investir nesse processo de transmissão, para que ele não pare, para que as novas gerações
não percam o interesse pelo assunto pois, caso isso aconteça, a cada geração haverá uma
perda consecutiva de conhecimento, até que ele acabe se esgotando. É preciso ajudar as
gerações mais antigas a continuar semeando esse conhecimento e as novas gerações a
continuar se interessando por ele.
O uso dos recursos vegetais está fortemente presente na cultura popular que é
transmitida de pais para filhos no decorrer da existência humana. Este conhecimento é
encontrado junto a populações tradicionais e/ou contemporâneas, e pelo que se tem
observado, tende à redução ou mesmo ao desaparecimento, quando sofre a ação inexorável da
modernidade (GUARIN NETO et. al., 2000).
G) MOTIVOS QUE LEVARAM AO USO DAS PLANTAS MEDICINAIS
Quadro 08–Motivos que levaram ao uso das plantas medicinais pela população
estudada, em frequência absoluta e percentual, de acordo com os grupos etários
18-49 anos
50 anos ou +
Motivos citados
F. Abs.
%
F. Abs.
%
Fácil acesso
27
22,32
08
27,59
Preço/Gratuidade
14
11,57
05
17,24
Maior confiança no caseiro
24
19,83
06
20,69
Prática familiar/Tradição
22
18,18
03
10,34
Bom resultado alcançado
08
6,61
00
0,00
“Não tem química”
05
4,13
01
3,45
Menos efeitos adversos
07
5,79
00
0,00
Falta de opção
14
11,57
06
20,69
121
100
29
100
Total
Fonte: Dados primários, 2015.
Para a construção dos resultados apresentados no Quadro 08, acima, vale mencionar
que as respostas eram abertas, portanto, cada indivíduo poderia citar mais de uma justificativa
de uso, motivo pelo qual o total de respostas para cada grupo etário superou o total de
indivíduos de cada grupo. Optou-se por utilizar o total de justificativas citadas, ao invés do
total de indivíduos de cada grupo, a fim de visualizar melhor os motivos mais fortes que têm
levado essa população a buscar nas plantas medicinais uma alternativa terapêutica. Das
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respostas abertas dadas por cada indivíduo, foram retiradas as palavras ou frases-chave
mencionadas no Quadro 09.
Observa-se que o motivo mais citado em ambos os grupos foi o fácil acesso, o qual
correspondeu a 22,32% das respostas do grupo de 18 a 49 anos, e 27,59% das respostas do
grupo de 50 anos ou mais. O segundo motivo mais citado pelo grupo etário mais jovem foi o
fato de possuir maior confiança no remédio caseiro do que nas demais terapias, o qual contou
com 18,83% das respostas deste grupo, e também constituiu a segunda maior razão para o uso
das plantas medicinais para o grupo etário mais velho, empatado à justificativa “falta de
opção”, ambas totalizando 20,69% das respostas deste grupo. A “prática familiar/tradição” foi
o terceiro motivo mais citado pelo grupo mais jovem, o que é um dado importante, que indica
que este grupo ainda se importa com a cultura familiar e comunitária tradicional. E, para o
grupo de 50 anos ou mais, o menor preço/gratuidade dos tratamentos através de plantas
medicinais também apresentou um percentual relevante de respostas (17,24%). Os motivos
menos citados foram os menores efeitos adversos, a ausência de química e o bom resultado do
tratamento com plantas medicinais, em ambos os grupos.
Esses dados confirmam a hipótese de que esta população ribeirinha está em busca de
alternativas terapêuticas mais acessíveis a ela do que as ofertadas nos serviços oficiais de
saúde. No entanto, a maior confiança no remédio caseiro e a valorização da tradição familiar
evidenciam o valor cultural e de identidade histórica que esse tipo de tratamento tem para essa
população e, possivelmente, para as populações tradicionais amazônicas em geral. Perder esse
conhecimento e essa prática é perder também, em consequência, parte da sua identidade, da
sua história e da sua especificidade cultural. Portanto, fica evidente que o uso das plantas
medicinais caracteriza muito mais do que um simples tratamento de saúde, fisicamente
falando, é uma prática que permeia toda a vida social destes indivíduos.
Calixto e Ribeiro (2004) já destacavam que as plantas medicinais têm um papel muito
importante na questão socioeconômica, tanto para as populações que vivem no meio rural,
como as que vivem no meio urbano. A utilização de espécies medicinais, na maioria das vezes
nativa da sua região, ou cultivadas em seu quintal, pode reduzir os gastos com medicamentos
sintéticos.
CONCLUSÃO
Os resultados confirmaram a hipótese de que o conhecimento e uso das plantas
medicinais na comunidade ribeirinha da Ilha de Santana são realidades ainda muito fortes e
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presentes, fazendo parte da identidade cultural e histórica dessa população, porém estes têm se
perdido nas novas gerações, o que caracteriza um grande problema que precisa ser mais
valorizado. É preciso que haja uma participação dos próprios profissionais de saúde no
resgate e valorização destes saberes, de maneira que as novas gerações, atuais e futuras,
possam continuar a compreender o grande significado do saber tradicional de seus
antepassados, especialmente no que diz respeito ao uso das plantas medicinais.
REFERÊNCIAS
CALIXTO, J.; RIBEIRO, E. O cerrado como fonte de plantas medicinais para uso dos
moradores de comunidades tradicionais do Alto Jequitinhonha, MG. In: Encontro Nacional
De Pós-Graduação Em Ambiente E Sociedade, 2., 2004, Indaiatuba. Anais... São Paulo:
ANPPAS, 2004.
CASTRO, H. G. de; FERREIRA, F. A. A dialética do conhecimento no uso das plantas
medicinais. Revista Brasileira de Plantas Medicinais, v. 3, n. 2, pp. 19-21, 2001.
GUARIM NETO, G.; SANTANA, S. R.; SILVA, J. V. B. Notas etnobotânicas de espécies de
Sapiendaceae jussieu. Acta Bot. Bras., São Paulo, v.14, n.3, set./dez. 2000.
VENDRÚSCOLO, G.S.; MENTZ, L. A. Levantamento etnobotânico das plantas utilizadas
como medicinais por moradores do bairro Ponta Grossa, Porto Alegre, Rio Grande do Sul,
Brasil. Iheringia, Ser. Bot., v.61, n.1-2, pp. 83-103, 2006.
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