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Meio ambiente e Serviço Social: desafios ao exercício profissional
Environment and Social Work: challenges to professional practice
MARIANE SAUER*
EDALÉA MARIA RIBEIRO**

RESUMO – O presente trabalho tem como objetivo problematizar os desafios que a questão socioambiental
demanda ao exercício profissional do Serviço Social, a partir de pesquisa documental e empírica realizada.
Grande parte dos assistentes sociais que atuam na área socioambiental está inserida no âmbito da
construção de empreendimentos causadores de impacto ambiental, como usinas hidrelétricas. Os principais
desafios que o profissional do Serviço Social enfrenta são a falta de conhecimento da profissão a respeito da
temática socioambiental, a incipiente produção teórica e a discussão nos espaços acadêmicos nos quais o
Serviço Social se faz presente. Diante dessa realidade, se faz urgente a ampliação do debate acerca desta
demanda, envolvendo, em diferentes níveis, a categoria profissional, os conselhos regionais e o federal da
profissão e o fortalecimento de movimentos sociais, buscando alternativas para seu enfrentamento com
vistas à construção de um novo mundo possível.
Palavras-chave – Serviço Social. Desenvolvimento socioambiental. Impacto ambiental.
ABSTRACT – The objective of this paper is to critically question, based on desk research and empirical
investigation, the challenges social workers face concerning socio-environmental issues. Most social workers
in the socio-environmental field perform professional activities for infrastructure enterprises that are directly
or indirectly engaged with great environmental impact, such as hydroelectric plants. The main challenges
professional workers deal with regarding this subject are the lack of knowledge about socio-environmental
themes, fledgling theoretical production and little discussion in the academic areas in which social work is
present. Given this reality, it is very urgent to expand the debate of this demand, involving, at different
levels, the professional category, regional and federal councils and the strengthening of social movements,
seeking alternatives for coping with the construction of a possible new world.
Keywords – Social Work. Socio-environmental. Environmental impact.
*
Graduada em Serviço Social pelo Centro Socioeconômico da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis –
SC/Brasil. E-mail: [email protected].
**
Doutora em Serviço Social pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Professora da Universidade Federal
de Santa Catarina (UFSC), Florianópolis – SC/Brasil. E-mail: [email protected].
Submetido em: novembro/2012. Aprovado em: dezembro/2012.
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Meio ambiente e Serviço Social: desafios ao exercício profissional
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A questão socioambiental
A questão ambiental é reconhecida atualmente como uma problemática de caráter
predominantemente social e político. É social, visto que o homem se constrói e se constitui como tal
neste espaço, e faz parte do meio ambiente, convivendo com todos os demais seres vivos
concomitantemente, construindo-o e modificando-o ao longo dos anos, uma vez que nenhuma forma de
vida existe à parte do sistema a que pertence; é político, pois depende em muito das decisões e ações das
quais nos valemos diariamente, da forma como nos relacionamos com a natureza. Assim, “meio
ambiente” não é um espaço exterior ao homem, com o qual não se tem nenhuma relação ou
responsabilidade; ao contrário, nós – seres humanos – somos o meio ambiente, assim como todas as
outras vidas deste planeta.
A questão ambiental, pois, é aqui entendida enquanto o modo pelo qual a sociedade se relaciona
com o meio em que vive em todas suas facetas. Sob essa perspectiva, relacionando-a com os processos
sociais e políticos, faz-se uso do termo “questão socioambiental”, para não limitá-la tão somente à
relação entre flora e fauna.
Desta forma, a questão socioambiental deve ser expandida para além da ideia de preservação das
áreas naturais (SANTOS, 2006), como resultado de uma análise das desigualdades sociais na atualidade.
Estas estão sempre associadas às lutas sociais em prol da defesa do meio ambiente, efetivadas e/ou
apoiadas por movimentos sociais, campanhas nacionais e mobilizações gerais – uma vez que muitos
processos de investigação sobre as mudanças ambientais globais minimizam ou reduzem a especificidade
dos processos sociais e políticos e sua relação com as mesmas.
A conexão entre o social e o natural se limita, na maioria das vezes, ao propósito de internalizar
normas ecológicas e tecnológicas às teorias e às políticas econômicas, deixando à margem a análise do
conflito social e das questões políticas que atravessam o campo ambiental. Os processos de destruição
ecológica mais devastadores, assim como de degradação socioambiental (perda de fertilidade dos solos,
marginalização social, desnutrição, pobreza e miséria extrema, dentre outros), têm sido resultado das
práticas inadequadas do uso do solo e dos recursos naturais, que dependem de padrões tecnológicos e
de um modelo depredador de crescimento, que maximizam lucros em curto prazo, revertendo seus
custos sobre os sistemas naturais e sociais (VIEIRA; MAIMON, 1993).
A Conferência das Nações Unidas sobre o Homem e o Meio Ambiente, realizada em 1972,
1
foi um marco considerável, dando início a uma série de discussões acerca do meio ambiente no
âmbito mundial. Nos anos 80 aparecem na cena pública no Brasil movimentos sociais em prol do meio
ambiente, visando à relação homem-natureza, ocasionados por todo um conjunto de processos
econômicos, políticos, jurídicos, sociais e culturais – de forma que a questão socioambiental materializase enquanto questão social no país.2 São exemplos o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB),
Movimento Sem-Terra (MST), Associação Mineira de Defesa Ambiental (AMDA), dentre outros
movimentos em suas mais diversas matizes.
A partir da Conferência das Nações Unidas sobre o Homem e o Meio Ambiente, ocorrida em
1972, a questão do meio ambiente passa a ser amplamente publicizada em todo o mundo, inclusive no
Brasil. Neste período, houve uma intensificação de movimentos sociais, que se fortaleceram
politicamente, constituindo-se no mundo inteiro um movimento ambientalista de caráter universal com
objetivos comuns, relacionando o homem e sua relação com o meio ambiente, marcando o início do
movimento ambientalista.
Nos anos 70, na Europa tem-se a criação do PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente) e da CMMAD (Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento), contribuindo
para as discussões a nível mundial. No Brasil, no final dos anos 70, vimos a criação de dois grandes
movimentos: o MST – visando ao direito à terra, à reforma agrária e à justiça social – e o MAB – visando à
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garantia de indenizações e reassentamentos às populações atingidas por barragens, seguindo-se a esse a
criação da Comissão Regional dos Atingidos por Barragens (CRAB).
Ressaltam-se ainda, como forças internas motivadoras da ampliação da temática, a superação do
mito desenvolvimentista, o aumento da devastação amazônica e a formação de uma nova classe média
influenciada por debates acerca da qualidade de vida (JACOBI, 2000).3
No inicio dos anos 80, como resposta à pressão de movimentos, associações e ONGs, e ainda com
a presença de Organismos Internacionais de Financiamento das Obras, ocorre no Brasil a criação do
CONAMA (Conselho Nacional de Meio Ambiente), através da Lei 6938/81 – tendo então por finalidade
definir e implementar a Política Nacional de Meio Ambiente, cujo objetivo foi o de “preservação,
melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando a assegurar, no país, condições
ao desenvolvimento socioeconômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da
vida humana [...]” (BRASIL, 1981). O CONAMA é um órgão consultivo e deliberativo do Sistema Nacional
do Meio Ambiente (SISNAMA), também criado em 1981, que estabelece um conjunto articulado de
órgãos, entidades, regras e práticas responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade ambiental. Foi a
partir deste momento que os estudos dos danos ambientais passaram a ser considerados para toda a
atividade que cause modificações no meio ambiente.
O próprio Banco Mundial, cedendo às pressões dos movimentos ambientalistas, passou a
orientar para a criação de departamentos de meio ambiente junto às empresas do setor elétrico, em sua
maioria privatizadas e executoras de obras causadoras de impacto ambiental, além de condicionar os
financiamentos das obras à criação de leis ambientais em diversos países.
Todas estas ONGs, órgãos e movimentos foram essenciais para a formação de uma nova
consciência ambiental no seio da sociedade, de modo que, a partir da criação do CONAMA, passou-se a
ter um novo enfoque para a “questão ambiental”, compreendendo como impacto ambiental
qualquer alteração das prioridades físicas, químicas e biológicas do meio
ambiente, causadas por qualquer forma de matéria ou energia resultante das
atividades humanas que, direta ou indiretamente afetem a saúde, a segurança e
o bem estar da população; as atividades sociais e econômicas; a biota; as
condições estéticas e sanitárias do meio ambiente e a qualidade dos recursos
ambientais (CONAMA, 1986).
Esta compreensão de impacto ambiental considerando a saúde, a segurança e o bem-estar da
população envolve necessariamente pensar as consequências sociais decorrentes dos “impactos
ambientais”,4 bem como das profissões que têm uma atuação direta e/ou indireta na questão. Daí a
pertinência de aprofundarmos a relação entre questão socioambiental e Serviço Social.
A questão socioambiental e o Serviço Social
Entendendo a questão socioambiental atual enquanto consequência da incipiente estruturação
de políticas sociais e econômicas que fazem uso de um modelo de crescimento depredador dos recursos
naturais, vê-se a possibilidade de atuação do Serviço Social nesta temática enquanto campo emergente
de intervenção profissional, uma vez que o atendimento aos usuários e suas demandas englobam
necessariamente o espaço em que estes habitam e os recursos disponíveis para atendê-las.
As demandas referentes à questão socioambiental se apresentam no dia a dia profissional
atreladas a situações específicas com as quais o assistente social se depara, entremeadas por questões de
Saúde, Assistência Social, Habitação, dentre outras. Diante desta configuração, se faz importante que a
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profissão passe às demandas que estão emergindo nos últimos anos, buscando qualificar-se para
incorporá-las e respondê-las no exercício profissional cotidiano.
De acordo com Carnevale apud Reigota (2005), não há isolamento entre o ecológico e o social;
estes se complementam, mas se faz necessário que o assistente social esteja atento para esse novo
campo de trabalho sempre voltado para a interdisciplinaridade, uma vez que outros profissionais que
trabalham na área podem contribuir com a prática profissional do Serviço Social, de modo que haja
reciprocidade, compartilhando termos, significados e experiências em comum. A sua apreensão crítica
pode influenciar e modificar práticas conservadoras centradas no estudo das partes e em ações
mitigadoras dos impactos ambientais.
Diante disso, cabe perguntar: que competências técnicas, teóricas e políticas o assistente social
teria para atuar no trato à questão socioambiental? Essas competências articulam os diferentes atores e
suas demandas junto a construções, desabamentos, programas de habitação e pesquisas em geral – em
que o estudo socioeconômico seja parte imprescindível –, oferecendo respostas às consequências sociais
advindas dos impactos ambientais, bem como formulação de políticas públicas para tal fim? O assistente
social está pronto para lidar com as demandas que se colocam atualmente na área socioambiental?
Ao pensar em uma situação do cotidiano do assistente social, pode-se apontar a questão de
moradias localizadas em “áreas de risco” (áreas insalubres, sem condições sanitárias ou próximas a
encostas). Estas significam alternativas de vida para pessoas que, não tendo onde viver, foram ocupando
morros e locais periféricos, de forma que é tarefa do poder público responder e encontrar soluções
viáveis para estes sujeitos, seja através de remanejamento populacional, contenção de encostas, dentre
outras soluções viáveis.
Seja por conta da construção de empreendimentos de infraestrutura habitacional, urbanização
em geral, situações de calamidade, ou questões que versam sobre Assistência Social, Saúde, Educação,
dentre outros, no momento em que políticas públicas buscam responder às necessidades da população,
espaços tradicionais e novos espaços consolidam-se. Em se tratando de uma área de atuação ainda nova,
os assistentes sociais são desafiados a se atualizar e a se apropriar das novas demandas. O ato de intervir
nessa realidade implica necessariamente pensar as consequências ambientais de nossas ações; ademais,
intervir na realidade significa pensar novas formas de combate à fome, desigualdade e subalternidade, o
que, por sua vez, implica pensar a forma como as políticas sociais estão estruturadas, tendo em vista a
sustentabilidade da vida social.
Desta forma, existem temáticas que atravessam a prática do assistente social no âmbito
socioambiental que são de extrema importância para seu aprofundamento e qualificação profissional na
área. Exemplo destas são a Política Nacional de Meio Ambiente, legislações do CONAMA e instrumentais
como o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e outros assuntos relacionados, como a temática da
sustentabilidade.
Diante disso, cabe ressaltar que a temática “sustentabilidade” nunca esteve tão em foco a nível
mundial como atualmente. A Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, criada pelas
Nações Unidas em 1983, e citada anteriormente, definiu desenvolvimento sustentável em relatório
publicado como o desenvolvimento que visa a satisfazer as necessidades da geração atual sem
comprometer a capacidade das gerações futuras e possibilitar que as pessoas atinjam um nível
satisfatório de desenvolvimento social e econômico e de realização humana e cultural, fazendo, ainda,
um uso racional dos recursos naturais (ONU, 1987). É a partir da criação desta comissão e do uso do
termo “desenvolvimento sustentável” que é definido o foco à nova Conferência das Nações Unidas, desta
vez denominada Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, realizada em
1992 no Rio de Janeiro (RIO 92), na qual refletiu-se sobre a questão ambiental e o desenvolvimento
econômico, vinculando meio ambiente e economia.
O termo “desenvolvimento sustentável” é muito controverso e existem diversas posições acerca
dele. Concorda-se aqui com Brügger (1993) que a raiz do problema já inicia no uso da palavra
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“desenvolvimento”, sendo interpretada na atual lógica do sistema capitalista como sinônimo de
crescimento, quando na verdade são termos muito diferentes. A explicação atual da tendência neoliberal
para a associação entre desenvolvimento e crescimento parte do pressuposto de que o mercado é o
maior mecanismo de recursos econômicos e da satisfação das necessidades dos indivíduos e sustenta que
a intervenção estatal é antieconômica e antiprodutiva, pois desestimula o capital a investir e os
trabalhadores a trabalhar, não consegue eliminar a pobreza, tornando-a pendente das ações estatais,
considerando a intervenção estatal como uma violação à liberdade econômica, moral e política.
Entretanto, entende-se que a questão não se dá dessa forma, sendo que o mercado não pode – e
não quer – controlar as relações sociais, que não são alvo de seus interesses. O termo “crescimento” é de
cunho quantitativo, ao contrário do que se entende aqui por desenvolvimento. Este, segundo Brügger
(1993), deveria incluir os aspectos éticos do termo, e não apenas números. Desenvolvimento é entendido
enquanto melhoria das condições de vida (humana e não humana) de forma real e aplicável, integrando o
social e o ecológico, e não apenas dados acerca do crescimento econômico de uma população – que
podem mascarar o real significado de “desenvolvimento”. Crescimento econômico não resulta
necessariamente em desenvolvimento se os recursos gerados não forem utilizados para o fim específico
de desenvolver, no sentido de melhorar as condições de vida.
Dessa forma, a maneira pela qual o termo vem sendo apreendido e divulgado na atualidade traz a
ideia de um desenvolvimento dentro do sistema capitalista em que vivemos, para que sejam realizados
ajustes estruturais em seu interior, realizando uma mitigação dos danos causados. Esta posição ignora o
fato de o próprio sistema ser uma forma depredadora dos recursos naturais, no qual o consumo é o foco
central, enquanto que muitas vezes é colocada como escolha a diminuição no padrão de
desenvolvimento e consumo justamente naqueles países menos desenvolvidos, que não constituem a
raiz do problema. Ocorre, portanto, a culpabilização do pobre, colocando a pobreza como principal causa
da degradação ambiental, quando na verdade a pobreza é apenas um reflexo do sistema produtivo, no
qual o pobre – enquanto parcela numerosa da população –, na busca pela sua sobrevivência, acaba
fazendo uso intensivo dos recursos naturais (SILVA, 2010). Desvia-se assim o foco da verdadeira raiz do
problema, que é a estruturação das políticas sociais e econômicas no atual sistema produtivo e não a
pobreza em si.
Existem, portanto, diferentes formas de interpretação acerca do meio correto para obtenção da
dita sociedade ecologicamente sustentável, concepções que vão desde a mera realização de ajustes até a
posição que defendo, de mudança da atual lógica produtiva. Entretanto, faz-se uso aqui do termo
“desenvolvimento sustentável” – apesar da compreensão que comumente se faz dele – pela falta de
outro termo que exprima a continuidade da vida humana em equilíbrio com as demais vidas no planeta.
Para tanto, o termo aqui é entendido enquanto “aquele que invoca uma nova ética onde se faz
necessária uma redefinição do que seja o ‘bem-estar’, material e espiritual, em função da maioria da
população, revertendo concomitantemente o presente estado de degradação da vida” (BRÜGGER, 1993,
p. 137). Ou seja, a lógica de construção do sistema em si já não funciona, pode-se dizer que a questão
não é sobre se o termo que é apropriado ou não, mas sim a interpretação que se faz sobre ele. Faz-se
necessária, portanto, uma profunda reflexão acerca do tema, para que ele seja apreendido de forma
crítica e ampliada, de maneira que não seja apenas um mascaramento das relações de degradação que
continuam a se perpetuar.
Em pesquisa anteriormente realizada, buscando explicitar a inserção dos assistentes sociais na
área socioambiental, as demandas colocadas e os desafios, identificou-se a inserção destes em fins dos
anos 80, momento em que se verifica a ampliação das discussões acerca da questão ambiental no Brasil.
Nesse estudo também constatou-se que é no setor privado que a demanda para intervenção profissional
em responder à questão socioambiental mais se explicita. Demandas estas que também se identificam
nas poucas produções teóricas existentes. Estas se explicitam através da sua inserção em empresas
ambientais que prestam serviço terceirizado para empresas construtoras de empreendimentos
causadores de impacto ambiental – principalmente usinas hidrelétricas. Aí identificou-se quatro
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principais demandas que chegam ao profissional de Serviço Social: remanejamento da população
atingida, educação ambiental, comunicação social e monitoramento.
As demandas nesta área vão desde o processo de licenciamento ambiental do empreendimento,
durante seu processo de implantação, até o momento posterior à formação do reservatório, através das
ações de monitoramento da população descritas anteriormente, bem como a elaboração de um
diagnóstico socioeconômico.
Desafios e perspectivas do Serviço Social na esfera socioambiental
Tendo em vista os dados explicitados acima, observa-se que a profissão vem incorporando as
demandas socioambientais em espaços sócio-ocupacionais do setor privado há aproximadamente 30
anos. Entretanto, tal experiência é desconhecida no meio acadêmico e profissional em geral. Já no setor
público a intervenção profissional é bastante recente, principalmente a partir da consolidação da política
urbana no início dos anos 1990, com a implantação de programas habitacionais. Assim, estando a
profissão inserida tanto no âmbito privado quanto público, cabe ao assistente social realizar uma leitura
atenta da realidade – conforme pautado em seu projeto ético-político – seja em forma de pareceres
sociais, estudos socioeconômicos, trabalhos de grupos, dentre outras atividades em situações que
envolvam o meio social em conflito com o meio físico. São instrumentais que perpassam a prática
profissional da profissão, já apropriados historicamente em diversas subáreas de atuação.
Assim, é de extrema importância a realização, no meio socioambiental, de estudos
socioeconômicos bem fundamentados sobre as comunidades locais e a capacitação para que possam
enfrentar as questões que emergem, através do programa de comunicação social, realizando orientações
acerca de informações técnicas sobre os efeitos do empreendimento para as comunidades, e da
formação de lideranças para a garantia dos direitos das mesmas, incentivando a articulação com
parcerias como MAB, CRAB e demais movimentos ambientalistas (COLITO, 1999).
Verifica-se o quanto o Serviço Social se faz importante neste âmbito, garantindo os direitos da
população durante todo o processo de construção da usina hidrelétrica, mediando e conciliando
interesses que são, na maioria das vezes, antagônicos. Dessa forma, a leitura e análise que o assistente
social faz da realidade é muito importante, uma vez que as demandas individuais trabalhadas em campo
podem gerar demandas coletivas, que devem ser levadas ao encontro de novas conquistas sociais. O
estudo deve envolver ainda, de acordo com Colito (apud PINTO, 1999), a subjetividade e as
representações que os sujeitos constroem, compreendendo-os enquanto sujeitos de emoções,
sentimentos e valorações, visando à forma como tudo é pensado e simbolizado, de modo a compreender
a realidade dinâmica e contraditória dos processos sociais, que trazem em si muitos significados ocultos,
que cabe ao profissional desvelar. Essa mediação é essencial quando existe um conflito – no caso destes
empreendimentos, conflito de interesses entre a população e a concessionária do empreendimento –, e
o meio ambiente passa a ser objeto de conflito quando traz consigo um impacto ambiental que enfrenta
valores sociais, éticos e políticos.
Ou seja, o conflito passa a existir uma vez que o impacto ocasionado no meio ambiente por conta
da construção de empreendimentos interfere na vida e no direito humano. Este impacto resulta em
consequências ambientais, sendo estas os impactos gerados também para a população, na medida em
que esse impacto é permeado pelas lutas econômicas e políticas, se tornando assim objeto de conflitos
sociais. No caso da construção das usinas hidrelétricas, tendo por base Colito (1999), o conflito pode
surgir por conta de diversos fatores, como a questão do remanejamento das famílias, o tamanho dos
lotes em que elas serão reassentadas, valor da terra e benefícios indenizatórios a serem pagos, cobertura
real dos prejuízos, as novas moradias a serem construídas (tipo, tamanho, material), dentre outros.
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Cabe ressaltar que o estudo socioeconômico é considerado competência da profissão desde
1993, garantido por lei através da elaboração da Lei de Regulamentação da Profissão. É utilizado pelo
assistente social em diversas áreas, como em prefeituras, hospitais e diversos órgãos públicos e ONGs,
para concessão de benefícios. Assim, o estudo socioeconômico realizado pelo assistente social possibilita
um olhar social sobre as situações postas, com base no referencial teórico da profissão – aprofundado em
políticas públicas e direitos sociais –, voltando-se para as necessidades humanas. Faz-se uso, portanto, de
uma visão estrutural, em que todo o contexto político, social e econômico é levado em conta, não se
atendo a critérios rígidos e sim compreendendo cada situação como única e singular.
O assistente social busca – na maioria das vezes – conciliar os interesses de ambas as partes,
visando sempre o melhor para as famílias atingidas. A sua atuação é muito importante dentro dos
programas estabelecidos, uma vez que pode lutar pela garantia dos direitos das famílias atingidas,
lutando pela ampliação dos critérios utilizados pelos empreendimentos para concessão dos benefícios, e
considerando as especificidades de cada situação, quando profissionais de outras áreas podem muitas
vezes não atentar para tal.
Entretanto, observou-se, na pesquisa realizada, como maiores desafios a falta de reconhecimento
legal e órgão fiscalizador e regulamentador do meio social, dificultando a ação junto ao empreendedor.
Isto porque, quanto ao meio ambiente, tem-se em Santa Catarina a FATMA e a nível nacional o IBAMA – a
quem o empreendedor deve satisfação quanto ao meio ambiente. Mas no tocante à população não há
nenhum órgão específico controlando, o que deixa muitas questões à mercê da parcialidade, uma vez
que, não havendo um órgão fiscalizador do meio social, ocorre que os estudos técnicos realizados pelos
assistentes sociais, quando enviados aos órgãos ambientais, carecem de análise técnica, pois nem o
IBAMA nem a FATMA dispõem de assistente social no quadro de funcionários.
Considerações finais
Pode-se compreender o quanto ainda há para avançar no que concerne à atuação socioambiental
do Serviço Social, de modo a apreender as novas demandas e os desafios aqui apontados. Compreendese que os desafios colocados à profissão são diversos, conforme as diferentes questões que se colocam
no dia a dia profissional.
Os desafios que se põem ao Serviço Social giram em torno de duas questões centrais elencadas: a
questão do reconhecimento legal e a falta de um órgão fiscalizador do meio social no que se refere à
construção de empreendimentos. Sem um órgão fiscalizador, não se efetiva uma análise técnica dos
estudos que são realizados em campo pelos assistentes sociais. Todos estes fatores fazem com que a
garantia dos direitos fique fragilizada; por um lado, pode se perceber que existe a pressão dos
movimentos sociais buscando a garantia dos direitos da população e, por outro, a falta de parâmetros
definidos a nível legal faz com que os direitos e deveres do empreendedor fiquem muito vulneráveis e
passíveis de diversas interpretações. Soma-se a isso a falta de um espaço de representação da categoria
profissional junto aos órgãos oficiais, fato que se mostrou bastante preocupante na fala das profissionais,
para a definição da implementação e fiscalização das ações profissionais e garantia da inserção do Serviço
Social na área. Estes são dois desafios conectados, pois uma vez que se consiga a fiscalização do meio
social nas ações geradoras de impacto ambiental, se poderá lutar pela inserção do assistente social neste
espaço de fiscalização.
Ademais, a partir da análise realizada em torno da questão socioambiental, afirma-se a
necessidade de ampliação do campo de trabalho na área para além do trabalho específico junto à
construção de empreendimentos. Esta ampliação se deve muito, também, à atuação dos conselhos
estaduais e federais da profissão, de forma a incentivar e fiscalizar a atuação socioambiental do Serviço
Social, se colocando, pois, como um desafio aos próprios conselhos. Desta forma, entende-se que a
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atuação destes pode se dar principalmente a partir de dois lócus, em concordância com as propostas
informadas pelo CRESS-SC.5 Primeiramente junto aos órgãos ambientais, orientando para a contratação
de assistentes sociais, de forma a caracterizar a importância destes na realização de pareceres e análises
referentes ao meio socioambiental, legitimando este novo espaço de atuação e, também, fazendo
convênios e parcerias com as empresas para fornecer suporte técnico na gestão social do processo de
avaliação ambiental. Os conselhos podem atuar também junto às universidades, mostrando as lacunas no
processo de formação dos profissionais para atuação na área socioambiental, incentivando a
implementação das grades curriculares e implantando cursos específicos de capacitação, visando à
discussão acerca destas questões. A falta de produção teórica é outro aspecto relevante, pois acaba
fazendo com o que os profissionais não se sintam aptos a trabalhar na área, chegando até os campos de
atuação bastante despreparados – conforme se observou nas falas das entrevistadas – e fazendo
também com que as empresas deem preferência a profissionais que possuam instrumentais teóricos
acerca da temática, um mínimo de propriedade teórica, quando da abertura de vagas para contratação.
Um dos elementos que contribuem para isto é a insuficiência desta discussão durante a formação
profissional, podendo fazer com que os profissionais que iniciam na área não aprofundem suas
concepções acerca de meio ambiente e o que se entende por questão socioambiental, pois chega-se até
a faculdade com concepções próprias que acabam se consolidando sem haver discussão crítica das
mesmas, sem serem problematizadas efetivamente.
A ampliação do debate se torna essencial, portanto, pois muito da posição que assumimos
atualmente com relação à atuação profissional – em todas as áreas de atuação – em grande parte se
deve aos momentos de discussão e aprofundamentos teóricos que ocorrem dentro da universidade, que
fazem com que se desenvolva um senso crítico para a leitura da realidade.
Entende-se, por fim, que é justamente a ampliação do debate que poderá fazer com que os
profissionais possam compreender a questão socioambiental de maneira estrutural, sem que as
possibilidades de atuação se limitem somente à reparação de danos decorrentes da construção de usinas
hidrelétricas, conforme vem ocorrendo. Desta forma, se torna primordial que se pense na construção de
uma nova ordem societária, na qual se busque a sustentabilidade da vida humana no planeta, visando à
luta pela continuidade da mesma – de acordo com o conceito de sustentabilidade aqui elaborado –,
integrando direitos sociais e ambientais.
Essa nova ordem somente pode se tornar possível com o fortalecimento dos movimentos sociais
no bojo da sociedade, pois a sociedade civil unida possui uma força motriz inigualável; somos nós
enquanto sujeitos sociais que fazemos a atual ordem: fomos nós que a constituímos e nós que a
perpetuamos, e só cabe a nós o poder de transformá-la.
Referências
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http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L6938.htm.
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Florianópolis, n. 17, 1993.
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APED/NAEA, 1993.
1
A conferência foi realizada na cidade de Estocolmo (Suécia) em 1972, quando se reuniram 113 países para tratar acerca de
questões ambientais, sendo o primeiro encontro mundial a respeito do tema. Participaram ainda mais de 400 instituições
governamentais e não governamentais.
2
Considera-se aqui o conceito-base utilizado por Iamamoto (2004), que define questão social enquanto o conjunto de
expressões da desigualdade social, originadas pelo modo de produção capitalista, conforme a concepção Marxista – embora
a questão socioambiental não seja referenciada pela autora enquanto expressão da questão social. Entretanto, o descaso
com o qual a questão socioambiental vinha sendo tratada nas últimas décadas levou a diversas consequências de cunho
social, como o problema das barragens, desabamentos, condições sanitárias, dentre outras. Assim, amplia-se a compreensão
da questão social, entendendo que esta abarca a questão do meio ambiente, na medida em que o modo de produção
capitalista atual é determinante para a constituição das contradições que formam a questão socioambiental.
3
Para maiores detalhes da trajetória dos movimentos ambientalistas no Brasil, vide Jacobi (2003).
4
Entende-se que seja mais prudente a utilização do termo “impacto socioambiental” pelo fato de englobar o impacto às
populações; entretanto, neste momento faço uso do termo oficial para não gerar conflito conceitual.
5
Comunicação pessoal realizada em visita ao órgão em outubro de 2009.
Textos & Contextos (Porto Alegre), v. 11, n. 2, p. 390 - 398, ago./dez. 2012 |
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