A NOVA ORDEM CIENTÍFICA NO MUNDO: O PARADIGMA SISTÊMICO 7 A NOVA ORDEM CIENTÍFICA NO MUNDO: O PARADIGMA SISTÊMICO Jean Sidcley Álvares Teixeira1 “Você não sente, não vê, mas eu não posso deixar de dizer, meu amigo, que uma nova mudança, em breve, vai acontecer... O que algum tempo era jovem, novo, hoje é antigo... E precisamos todos rejuvenescer...” Com esse verso de uma canção popular, interpretada e cantada por nomes variados da Música Popular Brasileira, mormente pelos rebeldes do período ditatorial das décadas de 60, 70 e 80, abre-se uma reflexão que vem ganhando terreno na discussão epistemológica e na configuração da metodologia científica no novo milênio. Trata-se da entrada do novo paradigma sistêmico. Para o desenvolvimento de tal reflexão e sua aplicação no contexto das ciências da administração, há que se visualizá-lo a partir da evolução dos variados paradigmas que vieram configurando a história das ciências na história do pensamento. E para a realização de tal intento, esta reflexão só se desenvolve com eficácia a partir de uma apresentação dos múltiplos modelos de Física que delineiam os caminhos que regem a ciência no mundo ocidental. Sabe-se que os princípios teóricos e metodológicos que regem a perspectiva de produção do conhecimento no ocidente sempre priorizaram uma dimensão linear e progressiva do processo de desenvolvimento de certezas e de construção de significados para os elementos que configuram a existência-humana-no-mundo. Assim, dentro da visão linear, apoiada nos princípios que regem o raciocínio lógico e discursivo, a construção do conhecimento, na relação especulativa do sujeito cognoscente com o objeto, numa tentativa de dominação imaterial e de posse interna de uma nova realidade, realiza-se numa construção de princípio, meio e fim, obedecendo à linearidade da existência lógica ou da leitura que o ser racional faz do mundo. 1 Especialista em Metodologia do Ensino Superior. Professor das disciplinas de Filosofia e Metodologia Científica da Faculdade de Ciências Administrativas de Curvelo. 107 REVISTA DA FACULDADE DE CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS DE CURVELO Na dimensão progressiva, o homem ocidental salienta o caráter preponderante do novo que se solidifica a partir da ruptura com o velho ou o antecedente. Dentro desta dimensão de progresso, de tempos em tempos, o conhecimento científico entra em franco processo de decadência e falência, devendo ser aprimorado, reciclado e, muitas vezes, substituído. Tendo como eixo teórico e metodológico de desenvolvimento do conhecimento a dimensão linear e progressiva, pode-se dividir o conhecimento ocidental em eras na história do pensamento, a saber: Era Mítica, Era Filosófica, Era Cristã e Era Científica, e a partir de então delinear uma discussão sobre os paradigmas ou modelos de física que configuraram a evolução do conhecimento na História, como se verá nas linhas que se segue. Assim, na ERA MÍTICA, período compreendido entre o século XV antes de Cristo até o século VI antes de Cristo a humanidade constrói suas certezas a partir das chamadas verdades míticas reveladas pelos poetas de Atenas. Sabe-se que o mito é uma verdade de fé que não explica a realidade, apenas apazigua o homem diante de um mundo que o assusta. Assim, a produção humana, no que tange ao conhecimento, alicerça-se numa postura dogmática e irrefutável das certezas. O homem apenas repete, em sua existência, o que os deuses realizaram no tempo arquetípico de origem de todas as coisas. O método alicerça-se, portanto, numa aceitação das certezas pela fé. As produções humanas encontram-se, em tal período, repletas de elementos intuitivos, de uma relação sentimental com os objetos do conhecimento. O homem do período mítico tem na fé politeísta o único caminho para a construção de suas certezas. Assim, diante das civilizações antigas, a intensidade da espiritualidade e a grande quantidade de mitos tornam-se referência para se perceber uma humanidade curiosa e inquieta por desvendar os enigmas dos fenômenos que regem o mundo. O desabrochar da ERA FILOSÓFICA, no século VI antes de Cristo, identifica-se com a descoberta do Logus ou razão na mente humana e se caracteriza por uma especulação racional dos elementos que configuram a existência-humana-no-mundo. Na dimensão progressiva do conhecimento ocidental, a filosofia substitui o mito como instrumento que apazigua o homem e a figura do poeta cede espaço para a indagação do filósofo. 108 A NOVA ORDEM CIENTÍFICA NO MUNDO: O PARADIGMA SISTÊMICO Apesar de estar alicerçada no uso correto da razão e numa preocupação com a lógica na configuração das certezas, a filosofia tem como identidade peculiar a dimensão apenas especulativa e questionadora. Vale dizer que a filosofia não resolve problema de ninguém, apenas os aumenta... Isto é, a função da filosofia é levantar o questionamento, a necessidade da pergunta e a consciência de que existe a inquietação existencial diante das indagações. A filosofia antiga foi, toda ela, desenvolvida pelos nobres de Atenas, que se ocuparam de construir um olhar contemplativo, a partir da razão, para os dilemas do conhecimento. O ideal do filósofo e o perfil do intelectual no mundo antigo alicerçavam-se numa especulação completamente alheia e descomprometida com a realidade prática ou o mundo da técnica e do trabalho. O fundamento paradigmático para tal período alicerça-se nas reflexões do primeiro enciclopedista dos pensadores do Ocidente. Trata-se de Aristóteles, um dos nomes mais importantes da filosofia antiga. Ele é considerado o fundador do período sistemático na história do pensamento e o pai da lógica ocidental. Para esse pensador, discípulo de Platão, o conhecimento racional precisa ser desenvolvido numa dimensão linear e lógica; por isso, deve ser reunido e sistematizado para fins de registro e novos aprimoramentos. É desse pensador a reflexão de que a filosofia tem uma história e está na história. Quando da produção de sua enciclopédia (ou o chamado Organon), Aristóteles percebeu a necessidade de uma reflexão sobre o MOVIMENTO, pois que o conhecimento filosófico no ocidente havia sido construído sobre dicotomias e dualismo, tendo como ponto de partida a percepção do movimento e das mudanças com os sentidos e a percepção da imobilidade e da permanência com a razão. Para Aristóteles, o desenvolvimento da FÍSICA ou da ciência do movimento tornava-se a chave para o estabelecimento de um conhecimento racional alicerçado no homem individual e no mundo concreto, em oposição às idéias platônicas de Homem e Mundo só verdadeiros no Mundo das Idéias, fora da caverna do Mundo Concreto. Ao criar a Física, Aristóteles lança no ocidente a ciência paradigmática por excelência. Há quem diga que, se se quiser saber como a humanidade vem compreendendo o mundo e a si mesma, há que se perguntar aos físicos. 109 REVISTA DA FACULDADE DE CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS DE CURVELO Na antigüidade, a física aristotélica considerava o movimento a passagem da Potência para o ato, isto é, a passagem de uma condição imperfeita para a perfeição. Portanto, tudo que é móvel é potência e se encontra em atitude de conquista do ato. No universo, só Deus é imóvel, é ato puro, certeza de que a perfeição existe. Deus é motor imóvel, pois faz mover todas as coisas para a perfeição. Todos os seres imperfeitos se desenvolvem a partir de quatro causas, que precisam ir sendo aprimoradas no processo de perfeição. Assim, a causa material é aquilo de que uma coisa é feita, a causa eficiente é o princípio gerador do fenômeno, a causa formal é a forma que o ser assume em sua existência e a causa final é a finalidade pela qual a coisa existe. Deus é o único incausado. Ele é sem princípio nem fim. É eterno. A mobilidade em uma das causas que configuram o ser imperfeito é sinal de sua condição de potência e, portanto, de necessidade de movimento. Essa reflexão paradigmática de Aristóteles é considerada uma teleologia, pois discute a perfeição como finalidade para a existência do ser. O movimento é abordado em sua dimensão qualitativa, tornando a reflexão sobre o movimento uma chave para uma reflexão metafísica sobre a evolução do ser em sua essência existencial. Como conseqüência de tais reflexões, vê-se que, na antigüidade, no auge da era racionalista e filosófica, ressalta-se uma “ciência” contemplativa, qualitativa e teleológica que procura conhecer, com a razão, a essência imutável dos objetos. O conhecimento técnico e prático, aplicado ao mundo do trabalho, é desprezível e ignorado. O método utilizado para a especulação e elevação das certezas é a lógica, como demonstração formal daquilo que a razão dispõe em sua configuração teórica e conceitual. O despontar da ERA CRISTÃ dá-se a partir da entrada do Cristianismo Oriental no Mundo ocidental, por volta do século I depois de Cristo. O período medieval, marcado pela decadência do Império Romano e sua derrocada, pelo estabelecimento do feudalismo e pelo crescimento do cristianismo em todo o ocidente, anunciam uma filosofia e “ciência” completamente encarnadas na nova configuração do mundo. Assim, aos poucos, nota-se a evolução de uma filosofia e ciência. Primeiro no período apologético (do século I ao IV), quando os cristãos recorrem à filosofia para a construção das defesas do cristianismo contra os ataques dos pagãos, depois no período patrístico (do século IV ao VIII), quando os padres da patrística, baseados na filosofia platônica, constroem uma filosofia eminentemente cristã e, finalmente, na 110 A NOVA ORDEM CIENTÍFICA NO MUNDO: O PARADIGMA SISTÊMICO escolástica, quando a filosofia sai dos mosteiros e passa a ser discutida nas primeiras universidades do mundo (construídas no fundo das catedrais nascentes na velha Europa) e se torna uma Teologia ou uma validação racional das verdades cristãs, a partir da cristianização de toda a reflexão aristotélica. Dessa feita, o trabalho de Santo Tomás de Aquino, no estabelecimento do pensamento escolástico ou teológico, torna-se a construção do paradigma da ciência no mundo medieval. No período da patrística, com a doutrina da iluminação, Santo Agostinho identifica o conceito da alma platônica com a reflexão bíblica sobre a alma enquanto hálito divino no ato da criação da humanidade, e a fé acaba por se tornar, no período medievo, o único caminho confiável para a construção do conhecimento. Com o estabelecimento da teologia na escolástica, Tomás de Aquino utiliza-se da física aristotélica e cristianiza o conceito de ato puro, demonstrando que a trajetória intelectual, filosófica e científica do homem ocidental medieval tem como ponto culminante a contemplação da perfeição divina na Igreja. Por isso, na Idade Média, a concepção paradigmática permanece alicerçada num desprezo pela técnica e numa procura das essências imutáveis a partir de uma abordagem qualitativa, teleológica e também teológica dos significados para os fenômenos. O despontar da ERA CIENTÍFICA é anunciado no Renascimento, quando os novos pensadores procuram resgatar a razão pura ou desvinculada da reflexão predominante na Idade Média. Os renascentistas, no encontro com o Racionalismo Grego, a partir de obras de Platão e Aristóteles que não haviam sido desvendadas no contexto medieval, querem dar uma dimensão técnica e prática ao uso dessa faculdade mental. Assim, pode-se dizer que o racionalismo que predomina na mente do homem a partir do Renascimento quer substituir a busca das essências imutáveis dos fenômenos pelo conhecimento de suas causas constitutivas. Aos poucos, grandes mudanças vão sendo processadas na mente humana e na nova configuração do mundo. A abordagem qualitativa cede espaço para uma abordagem quantitativa, a razão contemplativa é substituída pela razão ativa e técnica, a dimensão teleológica e teológica são vistas dentro da perspectiva progressiva do processo do conhecimento como entraves ao processo de desenvolvimento para os novos significados para os fenômenos. 111 REVISTA DA FACULDADE DE CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS DE CURVELO Várias são as contribuições de filósofos e físicos para a sustentação do paradigma científico. O grande alicerce para o alavancar dessas reflexões deve-se às meditações de Galileu e sua introdução da Matemática na reflexão sobre o movimento na Física. Para Galileu, ao realizar-se tal transformação, o homem se coloca frente aos objetos do conhecimento imbuído de mente secularizada, que procura quantificar e mensurar as causas constitutivas do fenômeno a ser conhecido sem os entraves dos efeitos teleológicos ou de qualquer culpa alicerçada na reflexão moral e ética. Com a física de Galileu, estava decretado o fim de qualquer abordagem racional dos fenômenos que estivesse alicerçada numa dimensão qualitativa e que analisasse os efeitos teleológicos e teológicos no processo de evolução e de conquista da perfeição dos seres. Além de secularizar a consciência humana, Galileu e Bacon, na reflexão sobre a necessidade de estabelecer uma ponte entre a reflexão racional e sua aplicação prática, lançam o Método Científico, baseado na indução e preconizam a necessidade da experimentação e da empiria como caminhos fundamentais no processo de construção das certezas. Aliado à necessidade de fundamentação paradigmática da era científica, o filósofo e matemático René Descartes torna-se o “pai” do racionalismo científico no mundo moderno. Com a frase Cogito, ergo sum, ou PENSO, LOGO EXISTO, o pensador resgata o pensar e a razão como os caminhos definidores da trajetória intelectual dos humanos na modernidade. Para o desenvolvimento de suas reflexões, Descartes, em suas chamadas Meditações Metafísicas, propõe uma meditação sobre a necessidade de descoberta das chamadas Idéias Claras e distintas no processo de construção do conhecimento e de geração da ciência. A razão pura se identifica com a técnica e com a prática. Por isso, o pensar da frase do filósofo liga-se estreitamente à prática científica. Além disso, na história da ciência e no desabrochar da reflexão epistemológica ou da filosofia da ciência, Descartes traz grandes contribuições sobre a urgência do método na ciência. Ele é considerado o teórico da Dedução e esse método preconiza a independência da razão pura e técnica frente à experimentação e à empiria. Com as reflexões de tais pensadores, estavam inauguradas as duas vertentes científicas que fundamentaram as verdades científicas no mundo moderno: o empirismo, que possui grandes substratos na indução, e o racionalismo, que alicerça seus princípios metodológicos na dedução. Apesar de apresentarem caminhos diversificados e, muitas vezes, até contrários, o ponto comum entre essas propostas e o estabelecimento do método experimental é que ambos foram considerados pelos modernos como os caminhos infalíveis para a construção das certezas. 112 A NOVA ORDEM CIENTÍFICA NO MUNDO: O PARADIGMA SISTÊMICO A fim de endossar ainda mais as certezas ancoradas no paradigma científico moderno, destaca-se a reflexão de Isaac Newton sobre o mecanicismo. Segundo suas diretrizes, tudo é racional em si mesmo, podendo tornar-se acessível às especulações científicas. Com as reflexões de Newton, o mundo e o homem são “coisificados”, tornando-se objeto de investigação da ciência que se divide, por sua vez, em múltiplos campos de investigação. A partir da divisão newtoniana da ciência em campos de especialização, a trajetória científica torna-se afunilada, no sentido de que o cientista deve receber uma formação geral no que diz respeito ao seu campo de investigação, mas deverá discernir, nesse processo de formação, uma área de especialização. Por isso é que se diz: “Tornar-se cientista é conhecer cada vez mais, de cada vez menos...” Sobre a era científica na modernidade (do século XVI ao XIX), há que se dizer que, uma vez consolidada a ciência, referenda em seu substrato paradigmático, o homem da modernidade apostou em uma ciência infalível capaz de desvendar todos os mistérios que circundam os fenômenos. Contudo, em fins do século XIX e início do século XX, a filosofia, as ciências humanas e a reflexão descomprometida de muitos pensadores foram as alavancas para o anúncio da crise científica no mundo. Assim, Freud, em sua reflexão científica sobre o inconsciente e a fundamentação da psicanálise, acaba por colocar em questão a certeza que reinava na mente humana de que o homem é capaz de controlar e explicar todas as coisas. A reflexão sobre o inconsciente devolve ao homem o ser mais difícil de ser conhecido, explicado e dominado, ou seja, ele mesmo. Por outro lado, Marx, em sua especulação sociológica sobre a organização social do mundo na trama da engrenagem capitalista, reflete sobre os problemas gerados pelo capitalismo, sobretudo a luta de classes e a desigualdade social e chega ao ponto de propor a supressão da tão aprimorada e louvada sociedade capitalista. Na Física, Einstein propõe a teoria da relatividade e este se torna o grande paradigma fundante da ciência no mundo contemporâneo. O 113 REVISTA DA FACULDADE DE CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS DE CURVELO conhecimento se torna efêmero e transitório, apesar de urgente e peça fundamental na engrenagem existencial de qualquer ser humano. A luta entre racionalismo e empirismo ou a discussão sobre a praticidade da indução e da dedução cedem espaço a uma concepção de método científico que preconiza a ciência como Teoria da Investigação, pois que o ponto de partida de uma pesquisa científica passa a se alicerçar na descoberta de um problema. Mas a sua conclusão ou a resolução do problema investigado torna-se um novo problema a ser investigado e desvendado posteriormente. Trata-se de um ciclo dialético de investigações que se alicerçam na relatividade das certezas. Estava decretada a era fenomenológica na existência humana. Isto é, trata-se da falência ou da perda de perenidade para todos os elementos que configuram a existência-humana-no-mundo. A perda dos significados, aliada à crise de certezas, torna-se o fundamento para o existencialismo, enquanto reflexão antropológica de uma humanidade que percebe o mundo como absurdo e, por isso, mergulha-se em angústia, revolta e necessidade do exercício da liberdade. A crise científica, a perda de perenidade nas questões de verdade acabam por gerar a crise moral, a crise das instituições (família, escola, religião, política, economia....) e todas as crises que permeiam a grande crise existencial geradora de depressão, “stress”, câncer e uma grande quantidade de perversões que nada mais são do que a falência do fervor ou da energia vital, que é o único combustível capaz de fundamentar a existência da humanidade no mundo fenomenológico. Contudo, a partir da segunda metade do século XX, uma nova consciência vem invadindo o mundo humano, um novo conhecimento que só se pode chamar de transcendente, espiritual. Começa com uma maior percepção de como nossas vidas seguem em frente. Notamos aqueles conhecimentos casuais que se dão no momento certo, e fazem aparecer os indivíduos certos, e de repente lançam nossas vidas numa nova e importante direção. Talvez, mais que quaisquer outras pessoas, em qualquer outra época, intuímos um sentido superior nessas misteriosas ocorrências. Sabemos que a vida é, na verdade, um desdobramento espiritual, pessoal e fascinante - um desdobramento que nenhuma CIÊNCIA, FILOSOFIA ou RELIGIÃO esclareceram completamente ainda. E 114 A NOVA ORDEM CIENTÍFICA NO MUNDO: O PARADIGMA SISTÊMICO sabemos outra coisa também: que tão logo compreendamos o que se passa, como utilizar esse processo alusivo e maximizar sua ocorrência em nossas vidas, a sociedade humana dará um salto quantitativo para um modo de vida inteiramente novo - um mundo que realize o melhor de nossa tradição - e criará uma cultura que sempre foi a meta da história. O abismo entre a ciência atual, suas conseqüências filosóficas e as subculturas fragmentadoras e alienantes, impostas ao homem contemporâneo pela sociedade tecnocrática, é gerador de um sentimento complexo, mistura de medo, angústia, insegurança, revolta e inferioridade perante uma tecnologia que lhe traz conforto e bem-estar, mas que não compreende. Por outro lado, sua educação, voltada apenas para a produtividade econômico-social, não lhe permite analisar profundamente esta ambivalência entre valores éticos e científicos. A crise em que se debate atualmente a humanidade tem origem nesta defasagem entre a ciência, geradora de tecnologia, riqueza e poder, e os sistemas de valores ultrapassados, destruídos por essa mesma ciência, mas que as sociedades ainda utilizam como padrão de conduta. Diferentemente do paradigma antigo, que utiliza um processo analítico e linear dos objetos do conhecimento, o paradigma sistêmico utiliza um modo sintético de interpretação, baseado em um pensamento filosófico holístico, no qual os fenômenos são compreendidos como partes de um padrão dinâmico de eventos interconetados. No processo do conhecimento e de construção da ciência, Sujeito e Objeto são colocados juntos, como partes de um quebra-cabeça, que, corretamente interpretado, permite a visualização do todo. O modo de pensar cartesiano-newtoniano, característico da ciência ocidental, com a dicotomia mente e corpo, é uma aberração para o paradigma sistêmico, que encara o homem e o mundo como seres em relação energética. Outra característica dessa abordagem paradigmática é a afirmação da existência de essências vitais no organismo, que seriam misturas de matéria e energia. Vale dizer que o grande substrato para o paradigma novo, que estará configurando o perfil das ciências no novo milênio, são as reflexões da Física quântica ou energética e estas, por sua vez, alicerçam-se nas milenares filosofias e tradições espirituais do mundo oriental. O pensamento oriental utiliza extensas cadeias de correspondências, a fim de racionalizar o cosmos, tal como a filosofia e ciências ocidentais anteriores à Renascença e ao desenvolvimento do Método Científico. 115 REVISTA DA FACULDADE DE CIÊNCIAS ADMINISTRATIVAS DE CURVELO Segundo essa cosmovisão, o cosmo e o homem obedecem às mesmas leis universais. O homem é um cosmo em miniatura (microcosmo), interagindo com o universo e participando de todo e qualquer acontecimento cósmico. Estamos, portanto, interligados ao cosmo de forma inextrincável. O homem é um microcosmo, um universo em si mesmo, diretamente relacionado às forças cósmicas do meio ambiente, o macrocosmo. A existência individual é inseparável da evolução cósmica em sua totalidade. Esse modo sistêmico de vincular o homem ao universo é que tem devolvido ao ser humano, em qualquer reflexão ou campo de especialidade científica, a consciência ecológica, a necessidade de estar em sintonia com a natureza e o desejo que tem incitado a espécie humana, de travar vínculos energéticos com as pessoas e com o universo. A ciência que desponta em tal paradigma rompe com a dimensão linear e os fenômenos passam a ser vistos em sua configuração cíclica, que se repetem no infindo ciclo energético de existência de todas as coisas. A dimensão progressiva cede lugar à dimensão tradicional e o homem passa a resgatar, no passado, os instrumentos desprezados no processo de evolução do conhecimento, e que agora se tornam fundamentais no processo de construção de novos significados. A ciência contemporânea, construída sob o signo do paradigma sistêmico, será holística, mística, intuitiva, racional, sentimental, ecológica, sensorial e até sensitiva... Essa já é para alguns e será, dentro em breve, para todos, o novo perfil do conhecimento no ocidente do novo milênio... Esse é o estabelecimento da profecia dos versos da canção popular brasileira que abriu este artigo: uma nova mudança em breve. Já está acontecendo... Referências Bibliográficas: ALVES, Rubem. Filosofia da Ciência. Ars Poética, 1997. CAPRA, Fritjof. O Tao da Física. São Paulo: Cultrix, 1990. CAPRA, Fritjof. O Ponto de Mutação. São Paulo: Cultrix,1993. CAPRA, Fritjof. A Teia da Vida. São Paulo: Cultrix, 1999. DESCARTES, René. Meditações.Pensadores, Abril Cultural. 1990. DI BIASE, Francisco. O homem holístico. Petrópolis: Vozes, 1999. REDFIELD, James. A Profecia Celestina. Nova Era, 2000. 116