EDIFÍCIO DE COMÉRCIO E SERVIÇOS BURGO (Eduardo Souto Moura) NUNO LACERDA LOPES Construção e Inovação - fatores de desequilíbrio. Existem várias definições para Inovação, umas de caráter económico, outras de expressão tecnológica, no entanto todas apresentam um sentido de melhoria e de distinção como denominador comum. O sentido da Inovação pressupõe a constante procura do novo (reinventado ou não), com um objetivo muito focado na sua capacidade de gerar e/ou acrescentar valor numa organização ou numa estrutura, quer esta seja social, produtiva ou organizativa, sendo este um dos aspetos mais relevantes e determinantes da inovação. A necessidade em satisfazer uma procura e a capacidade em acrescentar mais-valia, gerando valor económico ou social, são condições essenciais na definição de um produto ou solução como Inovador. É frequente encontrarmos alguns autores a afirmar que a inovação pressupõe três “IS”: Inspiração, Integração e Implementação. Nesta medida, percebe-se que conceitos de criatividade, de procura, de satisfação de necessidades através da criação ao nível dos produtos, fórmulas, design, ou mesmo métodos de trabalho ou sistemas de organização, sempre com vista à criação de algo útil (produtos, processos ou serviços), são conceitos diretamente relacionados com Inovação, desde que a sua implementação, contribua para aumentar a competitividade e criar fatores de desequilíbrio. Entre outros aspetos, a criatividade é por conseguinte “(…) condição necessária à Inovação mas não é suficiente!” tal como refere Aurora Teixeira: “Inovação exige trabalho árduo, impõe ver as coisas de um modo diferente, aceitar novas possibilidades e alternativas e um pensamento flexível e aberto ao inesperado, tendo prazer nas descobertas e, sobretudo, gostando de tornar conhecido o desconhecido” (A. Teixeira, 2010). Muitas destas caraterísticas são particularidades que parecem naturais nos arquitetos, cujo ADN parece incluir muitos destes elementos distintivos que os tornam hoje num foco de interesse, dadas as suas capacidades criativas, que o desenvolvimento tecnológico permite agora, mais facilmente, concretizar e implementar. Paradoxalmente a arquitetura parece ser historicamente uma disciplina conservadora, tal como afirmava Adolf Loos (1870-1933) a “casa é conservadora”, ou mesmo Fernando Távora (1923-2005) quando acrescentou que a “arquitetura é conservadora por natureza”, ou seja, demora muito tempo a integrar a novidade, sejam novos materiais, processos, sistemas de construção ou modos de produção. Trazer o tema da Inovação para a Arquitetura, parece ser, nesta época de alteração de paradigma, cada vez mais uma necessidade urgente, e uma obrigação para qualquer academia, para qualquer centro de investigação e desenvolvimento, para qualquer empresa e, sobretudo, para qualquer investigador e profissional que se mova neste mundo global, cada vez mais “pequeno” e competitivo, onde a Inovação e a Interdisciplinaridade são condição “sina qua non” para a criação de um caminho em direção ao futuro. Construção e Inovação são, inevitavelmente, cada vez mais, estratégias essenciais num projeto ou edifício, são como a “Frente e o Verso” de um folha, cuja ideia ou história se vai desdobrando, nunca perdendo a relação entre as partes, complementando-se no todo. O edifício do Burgo que Eduardo Souto Moura nos oferece é exemplo desta nova temática e deste novo modo de pensar e de construir a Arquitetura. A fachada como construção A “fachada como arquitetura” poderia ser um outro título ou tema para uma abordagem sobre o projeto da Torre do Burgo que Eduardo Souto Moura constrói no Porto à margem da Avenida da Boavista. O projeto para a construção deste empreendimento imobiliário, teve início em 1981 e somente foi finalizado em 2001 devido a diversos fatores quase sempre reincidentes em todas as obras ou projetos de arquitetura. Contudo, pareceu-nos mais relevante colocar a questão da construção da fachada como o tema fundamental para a caraterização deste trabalho que tem na temática da invenção e sobretudo da Inovação grande parte da estratégia projetual do autor e nessa medida, grande parte da caraterização arquitetónica deste edifício. De um modo atrevido como gosta de colocar as questões diz-nos que “(…) de repente deu conta que os bombeiros já tinham decido a altura (70m), os consultores ingleses a modulação dos pilares (3 carros) e os engenheiros as espessuras das paredes (35 cm).” E, num primeiro olhar, parece que tudo fica para ser resolvido no exterior, na superfície de contacto entre o espaço interior e o exterior, algo que algumas das arquiteturas de finais dos anos 90 designaram como pele, como um elemento de composição e de criação de identidade que se sobrepõe ao edifício, à sua estrutura ou forma. O invólucro, a “pele”, o limite exterior do edifício na arquitetura contemporânea tem vindo a assumir o papel de um elemento de comunicação em vez do tradicional elemento arquitetónico clássico que o alçado desenha e que a fachada constrói. Na Torre do Burgo o projeto ia em sentido contrário do que era a prática habitual de Eduardo Souto Moura e sobretudo no que caraterizava a sua ideia de arquitetura, assente numa certa tradição construtiva, na escassez de matérias-primas e sobretudo em trabalhos de pequena ou média dimensão. As quase duas décadas de avanços e recuos no projeto, levou a que este fosse sujeito a muitas e diversificadas alterações. Alterações de forma, da relação das volumetrias, de morfologia, de materialização e de custos. Tudo foi, de um modo diferenciado e faseado, apresentado ao arquiteto que soube resistir aos assessores especialistas e a muita procura de otimização que, implica muita adulteração do projeto com vista a uma indesejada diminuição de valores e qualidade. Mas tal não se verificou neste projeto, construído neste país, que também sabe fazer grande. N. Lacerda Lopes, “Edifício de comércio e serviços – Burgo – Eduardo Souto Moura”, Frente e Verso, Ed. CIAMH, Porto, 2012, ISSN 2182-8237.