Luz entre os homens ALEXANDRINA DE BALASAR “Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?” É do salmo 22 (21) este versículo que o próprio Jesus rezou na sua paixão, exprimindo a profunda dor moral e espiritual, além de física, que sofreu. Segundo o evangelista Lucas, a esta interrogação seguiu-se a entrega confiante: “Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito!” (Lc 23,46) E a carta aos Hebreus interpreta o efeito da oração de Jesus afirmando que pela “sua piedade foi atendido” (Hb5,7). O dito salmo é admiravelmente expressivo da experiência que pode fazer a pessoa que, sendo atingida pelo sofrimento, o vive na atitude de profunda confiança em Deus e a Ele se entrega , dirigindo-lhe repetidamente o seu “grito de socorro”. Na verdade, confessa o salmista: “Ele não desprezou nem desdenhou a aflição do pobre, nem desviou dele a sua face; mas ouvi-o, quando lhe pediu socorro” (Sl 22, 25). Então, falará a todos das “maravilhas do Senhor, contará o que Ele fez” por quem lhe pediu ajuda (Sl 22, 31-32). Alexandrina Maria da Costa experimentou realmente a transfiguração da sua vida marcada pelo sofrimento e irradiou as maravilhas de Deus para as outras pessoas. Nasceu em Balasar, Póvoa de Varzim, diocese de Braga, no ano de 1904. Viveu com a mãe e uma irmã, já que o pai as abandonou. Desde criança começou a trabalhar na agricultura. Aos 14 anos, quando trabalhava na costura com a irmã e outra rapariga, sentindo que havia homens a invadir a casa com intensões de agressão, saltou de uma janela para a rua, o que deixou sequelas no seu corpo. Até aos 19 anos ainda se conseguia movimentar razoavelmente. A paralisia contudo foi-se agravando de tal modo que em 1925, aos 21 anos, ficou definitivamente de cama. Morreu em 1955, com 51 anos, exclamando: “Sou feliz porque vou para o céu”. Dotada de grande fé em Deus e de profunda devoção à Virgem Maria, começou por implorar a cura para a sua doença. Mas depressa compreendeu que a sua vocação seria a de compartilhar misticamente o sofrimento de Jesus Cristo. Ofereceu-se então como vítima pelos pecadores para obter a sua salvação. Recebeu repetidas graças místicas, com frequentes conversas com Jesus Cristo, que a associavam à sua paixão e à redenção dos homens. Assim, às sextas-feiras, quando fazia a via-sacra, sofria intensamente no seu próprio corpo a compaixão com Cristo. Em 1934, recebia dele a missão: “Por ti serão salvos muitos e muitos pecadores”. Essas experiências foram por elas escritas por recomendação do seu diretor espiritual. A partir de 1942 deixou de tomar alimentos, vivendo exclusivamente da comunhão diária da hóstia consagrada. No ano seguinte, para se verificar a autenticidade do prodígio, Alexandrina foi internada durante 40 dias, no Porto. O grupo de médicos que a observou e submeteu a vigilância assegurou que era “absolutamente certo” que em todo aquele período a paciente não tinha comido. bebido, defecado ou urinado. E quanto às faculdades mentais, o médico que examinou a doente declarou que a sua expressão era “viva, perfeita, afetuosa, boa e acariciadora”, mostrando uma “atitude sincera, sem preensões, natural”; mais, “fala de modo natural, inteligente, mesmo subtil; responde sem hesitações, até com convicção, sempre em harmonia com a sua estrutura psíquica e a construção sólida de juízos bem delineados em si e pelo ambiente”. Devido à bondade que irradiava da doente, ao fenómeno prodigioso de se alimentar somente da Eucaristia e ao bem espiritual que as pessoas experimentavam junto dela, a fama de Alexandrina começou a alastrar. Por isso, muita gente se deslocava em peregrinação até ao seu leito em busca de ajuda e aconselhamento espiritual. Ela sofria muito mas quando as pessoas a visitavam oferecia-lhes um sorriso nos seus lábios, o que as deixava impressionadas. A todas dirigia também palavras de conforto e de estímulo para uma vida melhor. Após a sua morte, milhares e milhares de pessoas continuaram a peregrinar até Balasar para conhecer melhor Alexandrina, visitar o seu túmulo na igreja paroquial e pedir-lhe a intercessão para as necessidades e aspirações do corpo e da alma. Entretanto, escreveram-se biografias, publicaram-se os escritos e a sua fama continuou a alastrar em Portugal, na Itália, na Irlanda e noutros países. Muitas pessoas testemunharam as graças divinas e mesmo milagres obtidos mediante a intercessão de Alexandrina. Decorreu o processo para sua beatificação, foi comprovado um milagre de que beneficiou uma emigrante portuguesa em França; e a celebração realizou-se em Roma no ano de 2004. Mesmo paralítica numa cama, Alexandrina de Balasar, com a sua vida, escritos, testemunhos e obra irradiou a luz de Cristo no mundo, transmitindo-a a muitas pessoas enquanto viveu e depois de morrer. Numa das conversas com ela, Cristo diz-lhe: “Quero que tu faças o que faria Eu hoje se andasse pelo mundo. Imita-me! Atrais a Mim a multidão das almas às quais Eu permito vir a ti”. De facto, o que acontecia é que as pessoas não iam como vinham para junto dela. Suscitava arrependimentos e mudanças na vida de muitas delas. Ela não saía de casa mas a sua vida percorreu o mundo: “Tu pregas com o teu sofrimento, com o teu exemplo. És a missionária do Altíssimo: é na tua cama de dor que és missionária como tanto desejaste”, dizia-lhe Cristo em 1952. Foi e é uma testemunha de Cristo de modo único e especial. Padre Jorge Guarda Este artigo pode ser encontrado também no meu blog, no seguinte endereço: http://padrejorgeguarda.cancaonova.pt