UNIVASF – Universidade Federal Vale do São Francisco Maria Letícia Alves Gomes ESFERA CELESTE- Um modelo de representação do céu : Uma abordagem histórica Juazeiro – BA Dezembro 2013 INTRODUÇÃO Figura1: Xilogravura de Flammarion Um missionnaire du moyen àge raconte qu'il avait trouvé le point où le ciel et la Ierre se touchent... “Um missionário da Era Medieval disse que ele havia encontrado o ponto aonde o céu e a Terra se tocam...” A figura que abre esta introdução retrata de forma brilhante a curiosidade humana pela esfera celeste, curiosidade que vem desde as civilizações mais antigas. A xilogravura de Flammarion, é assim chamada porque a sua primeira aparição foi documentada em 1888 no livro L' atmosfera: mètèorologie populaire (“A Atmosfera : Meteorologia Popular”) de autoria do astrônomo francês Camille Flammarion. Ela retrata a vontade que muitas pessoas tinham e diga-se de passagem, ainda tem hoje; a de conhecer o outro lado da Terra, o que está oculto, de ver além do próprio planeta Terra. Desde tempos remotos o céu desperta fascínio no imaginário humano. Observando-o à noite ou durante o dia temos a impressão, a mesma que os observadores das antigas civilizações humanas tiveram, de que os astros estão incrustados numa enorme esfera. Essa impressão levou à concepção do modelo geocêntrico de Universo. De acordo com esse antigo modelo, a Terra era um ponto fixo no centro dessa enorme esfera vazia, onde estavam incrustados todas as estrelas. Esta esfera que girava ao redor da Terra, recebeu o nome de Esfera Celeste. Esse modelo ainda hoje muito utilizado por astrônomos, além de representar o universo visto a partir da Terra, ajuda na determinação das posições e dos movimentos aparentes dos astros. No entanto não lhe é mais dada uma conotação física, considerada nos moldes cosmológicos antigos; mas hoje é tratada como um modelo geométrico, uma abstração matemática. Ao tratar sobre a Esfera Celeste, não podemos desprezar as concepções dos povos antigos sobre a visão que tinham do céu e que de uma forma ou de outra contribuíram para o modelo de universo estabelecido atualmente e, muito menos não citar a ciência que norteia o tema exposto: a Astronomia. COMO SURGIU A ASTRONOMIA Antes de respondermos a essa pergunta, precisamos saber primeiramente o que é Astronomia: é a mais antiga ciência que estuda as características físicas, o movimento e a evolução dos corpos celestes. Desde os primórdios da história humana até diversos povos como: os mesopotâmicos, os egípcios, os indianos, os persas e os chineses, foram os primeiros grupos a observarem os corpos celestes. Com essas observações feitas a olho nu, eles conseguiam saber os períodos ideais para a plantação, colheita e outras atividades agrícolas. Com toda essa necessidade de regular os cultivos foram criadas as estações do ano e os calendários. É importante destacar que a disciplina da Física serviu muito para a Astronomia, fazendo com que estimulassem cada vez mais a atividade cientifica, tanto na Física como na Matemática e na Mecânica. Dentre todas essas observações foi criando-se um caráter místico para os corpos celestes, sendo assim, surgiu uma nova área da Astronomia, a Astrologia (Horóscopos, comportamento das pessoas com base nos corpos celestes, etc.) Com o passar do tempo, a Astronomia foi se modernizando e criando um novo nome: A Astronomia Moderna, que obteve esse nome em meados do século XX e se diferenciava da Astronomia Antiga devido as suas técnicas de observação, descrição, formulação de leis na óptica, no eletromagnetismo, na mecânica e na Matemática. E é através dessa Astronomia Moderna que descobrimos cada vez mais os segredos do Universo! Figura 2 VISÕES DO CÉU Observando o céu, os antigos procuraram estabelecer teorias que pudessem explicar a estrutura do mundo que viam. Como não havia telescópios, as primeiras observações foram feitas a olho nu, o que demonstrava pouca precisão. Há quem pense que foi o italiano Galileu Galilei que construiu o primeiro telescópio; mas é dada a Hans Hippershey, fabricante de lentes neerlandês, o mérito. Com um detalhe: era um tubo de lentes construído para observação de objetos à distância com finalidade bélica e não para observar do cosmos. Porém Galileu, ao saber da façanha, idealizou várias versões do aparelho a partir de experimentações e polimento do vidro e logo estava apontando-o para o céu noturno, sendo considerado o primeiro homem a usá-lo para investigações astronômicas. Citaremos agora concepções dos povos antigos sobre o “mundo” que os rodeava. SUMÉRIOS Os sumérios pensavam sobre o Universo, por volta do século XX a.C.: Aforma da Terra era a mesma que a do casco de um barco de cabeça para baixo, com seus limites circundados pelo mar. Limitando esse mar, uma cadeia de montanhas não só apoiava a cúpula do céu, como também permitia o acesso a ele, que tinha cor azul porque era constituído de pedras preciosas. O Sol girava ao redor da Terra, alternado-se com a Lua; durante o dia, pelo céu, e à noite, sob a Terra. Esses dois astros, mais as estrelas e os planetas, haviam sido colocados no céu pelos deuses, com o objetivo de espalhar sua influência em benefício da humanidade, orientando o destino dos seres humanos e permitindo a construção de um calendário para a agricultura e festas religiosas. CHINESES Na China antiga existiam vários modelos de Universo. Um deles supunha que o céu era uma cúpula sobre a Terra, cercada pelo mar. Mais tarde, no século IV a.C., já se imaginava a Terra esférica, envolvida por estrelas. Finalmente, no século II, se imaginou que o céu era vazio, sem substâncias e limites, estando o Sol, a Lua, e as estrelas flutuando livremente. Esse conceito curiosamente coincide com pontos de vista sobre o Universo desenvolvidos quase dois milênios mais tarde. Na visão da antiga China, o Universo constituía um grande organismo, no qual as coisas do céu e as coisas terrestres estavam interligadas, de forma que o que acontecia em uma parte afetava a outra. O comportamento dos homens interferia no céu, e este influía no comportamento humano, principalmente dos governos, sendo o imperador, o centro do império, representado pelo polo celeste norte, o centro de rotação do céu, pois tudo girava em torno de um ou de outro. INCAS No passado da região onde hoje se situa a América Latina, os incas constituíram um grande império, com uma cultura muito elaborada. Assim como em outras culturas do mundo antigo, tinhase ali um bom conhecimento do céu, representado principalmente nas atividades religiosas, ainda que não desprovido de sentido prático. A excelente qualidade visual do céu andino permitiu aos incas estabeleceremo conceito de constelações escuras, zonas negras dentro do conjunto brilhante da Via- Láctea, diferentemente de outros povos, que as nomeavam de acordo com os grupamentos de estrelas. Nas manchas, eles viam diversas figuras representativas de animais, como a serpente, a perdiz, e a lhama, animal de grande importância na cultura andina. Tinham conhecimento de diversos fenômenos astronômicos, e os eclipses e cometas eram razões para grandes temores, pois, sendo raros e efêmeros, eram percebidos como rupturas na regularidade do céu. EGÍPICIOS Para estes povos, a Astronomia, tinha um caráter prático ligado à contagem do tempo e correspondia a uma visão de mundo relacionada ao rio Nilo, em torno dos qual eles desenvolveram sua economia e cultura. Seu modelo de Universo era o de uma caixa comprida e estreita, com o lado mais longo acompanhando a direção do rio. A tampa da caixa era o céu, onde brilhavam as estrelas sustentadas pelos deuses. O eclipses solares e lunares eram explicados por ataques que os dois astros sofriam de serpentes que habitavam esses rios. No verão, em virtude das inundações, o rio saía do leito, fazendo com que o Sol ficasse mais alto no céu. Cada civilização contribuiu de forma diferente para a atual compreensão do céu, porém uma influenciou de modo particular: o pensamento da Grécia antiga desenvolvida entre os séculos VI e V a.C. NO século VI A.C., o grego Anaxímenes (? a.C.- 525 a.C.) pensava as estrelas como se estivessem presas a uma esfera de cristal que girava em torno da Terra. Não é uma teoria estranha, já que temos a impressão que as estrelas girando no céu parecem estar fixas e distribuídas nele, formando uma superfície curva. A famosa “esfera das estrelas fixas” foi uma ideia tão plausível que passou a fazer parte das explicações sobre o Universo até o início dos tempos modernos, nos últimos séculos. ESFERA CELESTE Imaginando um filósofo grego do século IV a.C. e uma pessoa olhando o céu a olho nu hoje, em pleno século XXI, veriam muita diferença? Excetuando a poluição das grandes cidades, não haveria grandes diferenças, pois o movimento dos astros apresentam uma regularidade que se repete de forma idêntica por milhares de anos. A impressão seria a mesma para os dois observadores; a de estarmos no meio de uma grande esfera ou abóbada onde estariam incrustadas as estrelas e demais corpos celestes. Essa impressão levou à concepção do modelo geocêntrico de Universo, que persistiu durante milênios. De acordo com este modelo antigo, a Terra era um ponto fixo no centro de uma enorme esfera vazia, onde estavam incrustadas todas as estrelas visíveis. Esta que tanto. Esta esfera que girava ao redor da Terra , recebeu o nome de Esfera Celeste. Havia quem imaginasse que as estrelas eram furos nessa esfera por onde entrava a luz celestial, oriunda dos reinos divinos. MOVIMENTO DOS ASTROS NO CÉU O Sol O Sol é um astro luminoso, uma estrela pequena, de aproximadamente 1.400.000 km de diâmetro, uma massa de gás incandescente, cerca de 333.000 vezes a massa da Terra, enviando energia ao espaço graças às reações nucleares que ocorrem em seu interior. É ele o responsável pela sustentação da vida em nosso planeta, e no entanto, pouco prestamo-lhe atenção em nosso dia-a-dia. Movimento Diário do Sol Ele surge no horizonte leste (oriente), "caminha'' no céu elevando-se durante um certo tempo e depois abaixando-se, desaparece no horizonte oeste (ocidente). Ele sempre torna a aparecer no dia seguinte, no horizonte leste. A esse movimento aparente do Sol, completando um período, damos o nome de Movimento Diário do Sol. (Figura 3) Mas, o que causa esse movimento diário do Sol? Analisemos o sistema Terra - Sol. Houve época na história da humanidade em que se acreditava que a Terra era o centro do Universo e tudo o mais, ou seja, estrelas, planetas, a Lua, o Sol, etc., girava em torno dela. Isso era tido como uma verdade incontestável! Mas, em termos de movimento, e se a Terra fosse como um carrossel? Imaginemo-nos num carrossel que se põe a girar... Observamos as pessoas fora dele e elas parecem girar no sentido oposto ao do carrossel! E nós sabemos que elas na verdade estão paradas! Assim, fazendo uma comparação da Terra com um carrossel e o Sol com quem está fora do carrossel, parece-nos lógico que o movimento do Sol que vimos durante o dia, é na verdade da Terra em torno de si mesma! Como dizia Nicolau Copérnico, que esforço enorme deveria ser feito para que os céus girassem ao redor da Terra ao invés do contrário. Hoje sabemos que na verdade ao girar em torno de si mesma, a Terra é que provoca o movimento aparente diário do Sol (como no exemplo do carrossel, o movimento do carrossel é que provoca o movimento aparente das pessoas fora dele). Figura 3: O Movimento Diário do Sol Estrelas Os povos primitivos acreditavam que as estrelas eram objetos localizados a uma igual distância de nós, sobre uma redoma invertida suspensa sobre a Terra. Acreditavam que as estrelas eram fixas, porque elas mantinham suas posições umas com relação às outras. Como em qualquer lugar sobre a Terra podemos "ver'' essa "redoma'', daí surgiu a noção de uma esfera invisível, onde estariam as estrelas "fixas'', envolvendo a Terra (Figura 4). Figura 4: A Esfera das Estrelas Fixas da Antigüidade Aristóteles (384 a.C. a 322aC.) pensava que se a Terra girasse ao redor do Sol, então o deslocamento das estrelas mais próximas em relação às mais distantes deveria ser visível. Considerando que ele não foi capaz de detectar esse movimento, a conclusão seria que ou as estrelas estavam muitíssimo mais distantes do que se pensava na época ou então a Terra estaria imóvel no espaço. Embora sabendo que poderia acontecer das estrelas estarem suficientemente distantes para não poder detectar seu deslocamento, Aristóteles preferiu optar pela ideia da Terra em repouso do que a das estrelas distantes. Muito mais tarde, quando o Sistema Copernicano do Universo, com o Sol no centro foi aceito, os esforços para detectar o movimento aparente das estrelas ainda não obtiveram sucesso; contudo, naquele tempo acreditava-se que as estrelas se deslocavam no espaço e que estavam muito distantes da Terra para que seus deslocamentos pudessem ser observados. PARALAXE ESTELAR Nós podemos observar a posição de uma estrela com relação as suas vizinhas de um determinado conjunto de estrelas. Ao observá-la em intervalos de seis meses, ou seja, quando a Terra estiver na direção oposta a anterior, com respeito ao Sol no espaço, nós podemos vê-la na direção de um outro agrupamento. Nós temos assim um deslocamento aparente da estrela, que ocorre com objetos próximos observados com respeito a objetos distantes, de posições diferentes. Tal método é também utilizado por engenheiros e agrimensores no cálculo de distâncias em terrenos, etc. Um modo relativamente simples de perceber a paralaxe consiste em observar um objeto próximo a você com respeito a posição aparente dele entre objetos mais distantes, ora com um olho aberto somente, e ora com o outro. A paralaxe de uma estrela, é a metade do ângulo definido entre a primeira observação e a segunda seis meses depois, quando ocorre um deslocamento aparente máximo da estrela. Figura 5: Paralaxe Estelar CONCLUSÕES FINAIS Quem já não admirou um céu estrelado e com uma bela lua cheia? Além de ser mais contemplativo à noite, inspira poetas e casais apaixonados... E sem esquecer de grandes homens que tem o olhar voltado para o céu: os astrônomos. Hoje se sabe muito sobre o universo, mas não tudo, e talvez nunca se saiba. Há mais perguntas que respostas. Mas, em um ponto muitos concordam, a resposta para o mistério da vida pode estar lá em cima, muito além das esferas celestes... BIBLIOGRAFIA CDA – CDCC – USP/SC – 16/06/2000. A esfera celeste. Disponível em: <http://www.cdcc.usp.br/cda/aprendendo-basico/esfera-celeste/esfera-celeste.htm>. Acessado em: 08 de Janeiro de 2014. Cunha, Flávio. Como surgiu a Física. Disponível em: <www.fisicareal.com/atual.doc>. Acessado em: Acessado em 09 de Janeiro de 2014. Kantor C, Paoliello L, Menezes de L C, et. al. Quanta Física 2º ano. Editora PD 1ª edição. São Paulo 2010. Madeira, Daniel. A ilustração de Flammarion. 2012. Disponível em: <http://danscientia.blogspot.com.br/2012/05/ilustracao-de-flammarion.html>. Acessado em: 08 de Janeiro de 2014. Wikipedia. Telescópio. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Telescopio>. Acessado em: 09 de Janeiro de 2014.