OMS Zika vírus e Eventos de Grande Porte

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OMS
Zika vírus e Eventos de Grande Porte
XVI SIGMA MUNDI
“DESAFIOS PARA A GOVERNANÇA GLOBAL NO SÉCULO XXI”
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE (OMS)
ZIKA VÍRUS E EVENTOS DE GRANDE PORTE
MARIANA MENDES
CAROLINE MENDES
BRASÍLIA,
2017
1. INTRODUÇÃO
A Organização Mundial da Saúde (OMS) é um órgão de coordenação para a saúde
dentro do sistema da Organização das Nações Unidas (ONU). Sua existência oficial foi
declarada em 7 de abril de 1948, depois de mais da metade dos membros da ONU ter assinado
sua constituição. Hoje, essa data é comemorada como o Dia Mundial da Saúde. Sua sede está
localizada em Genebra, na Suíça.
O objetivo da OMS pode ser definido como "a obtenção, por todos os povos, do
nível de saúde mais alto possível", com a saúde sendo definida de modo amplo como "um
estado de completo bem-estar físico, mental e social, em vez da mera ausência de doenças ou
enfermidades". A OMS trabalha para atingir esse objetivo nobre dirigindo e coordenando os
trabalhos acerca da saúde internacional.
Dentre suas responsabilidades estão: proporcionar liderança sobre questões críticas
para a saúde e se engajar em parcerias onde a ação conjunta é necessária; influenciar a agenda
de pesquisa e estimular a geração, tradução e disseminação de conhecimentos valiosos;
estabelecer normas e padrões e promover e acompanhar sua execução; e monitoramento da
situação de saúde e avaliação das tendências de saúde.
Diante desse contexto, é fundamental ser discutido por essa organização sobre o Zika,
uma doença viral emergente cuja evolução se destacou como um dos grandes desafios do
século XXI para a governança global, devido aos seus impactos não completamente
determinados e que podem alcançar maior magnitude em face à realização de eventos de
grande porte.
Doenças epidêmicas vetoriais emergentes (PUSTIGLIONE, 2016), durante várias
décadas, surgiram em diversos países do mundo com aumento da sua incidência bastante
significativa. Porém, apenas a partir de 1940, passam a ser descritas, principalmente em
regiões tropicais, doenças febris, até então desconhecidas, tais como as denominadas febres
hemorrágicas (Ebola, Hantavírus, Dengue, etc.) (MAGUIÑA VARGAS, GALÁN-RODAS,
2016).
O aparecimento de problemas novos de saúde incluindo o surgimento de novos agentes
infecciosos em diversos países de diferentes regiões, que independe do grau de
desenvolvimento socioeconômico da mesma, fragiliza bastante a “teoria da transição
epidemiológica” (LUNA, 2002). Essa teoria tem sido amplamente discutida e propõe que
houve uma mudança do perfil epidemiológico mundial, no qual as pessoas deixaram de ser
assoladas por doenças infecciosas, como a malária e a varicela, e passam a ser portadoras de
doenças crônicas e degenerativas, como a Diabetes Mellitus e a Hipertensão Arterial
Sistêmica (PUSTIGLIONE, 2016).
Em geral, vários fatores, além da negligência das autoridades cientificas e sanitárias,
podem ser apontados como determinantes para a emergência e reemergência das doenças
infecciosas, como os fatores demográficos, socioeconômicos, políticos, ambientais e os
dependentes dos serviços de saúde (LUNA, 2002).
Ilustrando essa grave condição, temos o vírus Ebola, detectado em 1988, inicialmente
no Zaire, em que nesse primeiro surto, causou alta mortalidade (88% dos casos constatados).
Após isso, se tornou epidêmica em 2014, afetando milhares de pessoas e se expandindo de
forma rápida, principalmente em Serra Leoa, Guiné e Libéria, sendo temida a sua
disseminação em áreas próximas, porém foi controlada antes disso (GOTUZZO HERENCIA,
2002, MAGUIÑA VARGAS, 2015b).
Outros destaques foram: a dengue, que a partir dos anos de 1970 afetou a América, mais
tarde, tornando-se endêmica, causando, até hoje, milhões de paciente e milhares de mortes
todos SOS anos (OPAS, 1997; WHO, 2014); e a Febre Chikungunya, doença endêmica nativa
da África Sub-Sahariana, inicialmente identificada no sudeste da Tanzânia, em 1953. Com o
decorrer do tempo chegou a Ásia e a Índia, atingindo a América apenas em 2013, causando
uma grande epidemia na região (SOURISSEAU et al, 2007, MAGUIÑA VARGAS, 2015a).
No fim de 2014, mais especificamente no mês de outubro, foi detectado um surto de
uma doença exantemática febril de origem e diagnóstico desconhecidos, com sintomas bem
comuns, como febre baixa ou nenhuma febre, exantema maculopapular (um tipo de erupção
cutânea caracterizado por uma área vermelha e plana na pele com pápulas pequenas e
confluentes), prurido (coceira), artralgia (dor nas articulações), especialmente nas mãos, e
edema (inchaço) de membros, com duração entre quatro e sete dias; identificada inicialmente
na Região Nordeste do Brasil, no estado do Rio Grande do Norte. Com o passar dos meses, o
número de incidência foi aumentando e outros casos foram observados em outros estados do
país e casos iguais descritos em alguns outros países da América (LOOS et al, 2014;
CAMPOS, BANDEIRA, SARDI, 2015; ZANLUCA et al, 2015).
As hipóteses diagnósticas iniciais para o novo surto foi de dengue ou Chikungunya.
Entretanto, os países tropicais da América, principalmente o Brasil, vêm passando por grandes
epidemias de dengue, desde a década de 1990, e as manifestações clinicas encontradas nos
enfermos foram bastante atípicas para a dengue, já que raramente os pacientes apresentavam
febre alta. Já a Chikungunya, doença introduzida no Brasil no ano de 2014, era menos
provável devido à artralgia leve que os pacientes apresentavam (RIBEIRO, KITRON, 2016,
ROTH et al, 2014).
Com isso, a etiologia da doença continuou sem ser identificada até abril de 2015,
quando pesquisadores encontraram em 16 das 46 amostras de soros de pacientes da Bahia
(CAMPOS, BANDEIRA, SARDI, 2015) e Rio Grande do Norte (ZANLUCA et al, 2015), o
vírus Zika (ZIKV), nunca antes encontrado no Brasil ou ainda no continente americano.
Não demorou muito para outros casos serem notificados em outros estados brasileiros,
sendo até o final de 2015, os casos autóctones da doença foram confirmados em laboratórios
de 19 das 27 unidades federativas (RIBEIRO, KITRON, 2016), além de disseminar por outros
vários países da América Latina e Caribe, além de casos reportados nos Estados Unidos e
Europa.
Dessa forma, em novembro de 2015, o Ministério da Saúde (MS) decretou Emergência
em Saúde Pública e, em fevereiro de 2016 a OMS classificou essa situação como emergencial
e de importância internacional, o que ajudou nas investigações e no desenvolvimento de
medidas de controle da doença nos países (ABRASCO, 2016).
Posto isso, esse estudo visa responder: “A Organização Mundial da Saúde possui ou
criará estratégias eficientes de combate ao Zika vírus em países com registro de surto, de
modo que não afetará a realização de eventos de grande porte?”.
Visando responder tal indagação, foi desenvolvido este estudo descritivo. Para sua
realização foi feito pesquisas na base de dados LILACS de artigos científicos em português,
espanhol e inglês sobre o Zika Vírus, usando como descritor a palavra Zika, além de sites
significativos, como o site da World Health Organization (WHO). Foram lidos os títulos e
resumos dos artigos e selecionados aqueles que possuíam maior clareza no texto e que
contribuíam para produzir este estudo.
2. REFERENCIAL TEÓRICO
O Zika vírus e sua origem
O Zika é um arbovírus da família Flaviviridae e o gênero Flavivirus com duas
principais linhagens genéticas identificadas, as cepas asiáticas e africanas, transmitido pela
fêmea Aedes aegypti. (BRITO, CORDEIRO, 2016; NUNEZ et al, 2016; PERRET, 2016). O
Zika vírus é filogeneticamente muito semelhante a outros vírus arbóreos da mesma família
que também compartilham da mesma forma de transmissão, como o vírus da dengue, da febre
amarela, encefalite japonesa, vírus do Nilo Ocidendal e da Chikungunya (VASCONCELOS,
2016).
Na lingua luganda, a palavra Zika apresenta como sentido “vegetação que cresceu
demais” ou “vegetação que tomou conta do lugar”, nome esse que foi dado a uma floresta na
República de Uganda. Foi nesse lugar que o vírus foi encontrado em macacos Rhesus durante
a realização de pesquisas sobre a febre amarela por uma rede de vigilância; por fim, o vírus
acabou recebendo o mesmo nome da floresta (DICK, KITCHEN, HADDOW, 1952).
Apesar da descoberta em macacos, naquele ano não foram relatados casos de infecção
em humanos. O segundo achado do vírus ocorreu em junho de 1948 em um mosquito, o
Aedes africanus, a aproximadamente 300 metros do achado anterior (DICK, KITCHEN,
HADDOW, 1952; DUFFY et al, 2009; HAYES, 2009).
Apenas no ano de 1952 que a infecção foi identificada, através de estudos de sorologia
em humanos na Uganda e na República Unida da Tanzânia. Após isso o vírus começou a se
espalhar na direção de oeste para leste, primeiramente por países africanos, em seguida, já nos
anos 60, na Ásia, e anos depois na Oceania, com alguns surtos identificados (MAGUIÑA
VARGAS, 2016; VIAL CLARO, AROS BRALIC, 2016).
Em 2007, um surto atingiu a Micronésia, em que 189 pessoas foram atingidas com
febre, erupção cutânea, artralgia e conjuntivite, sendo 49 casos identificados como caso
positivo de Zika vírus, 59 casos prováveis, com o registro de uma morte e vários casos graves
que precisaram de hospitalização. Já um surto maior ocorreu entre 2013 e 2014, na Polinésia
Francesa, sendo estimados 29.000 casos, com 29,34% com apresentação de quadro clinico,
além de nessas ilhas ter acontecido um aumento anormal da síndrome de Guillain-Barré, com
73 casos e mortes confirmadas. Outros surtos ocorreram em Nova Caledônia e Ilhas Cook
(DICK, KITCHEN, HADDOW, 1952; CAO-LORMEAU et al, 2014; SCHULER-FACCINI
et al, 2015).
Em 2014, um surto foi constatado na Ilha de Páscoa em que a infecção foi comprovada
em aproximadamente 50 pessoas, mas contida em semanas. No ano seguinte o Zika chegou ao
Brasil, e em maio foi confirmado o primeiro caso autóctone (nativo) do vírus no país
(ZANLUCA et al, 2015). Desde então, temos vivenciado a chegada e a propagação de um
novo vírus no continente americano com a população de 953 milhões de pessoas que não
tiveram contato anterior com a doença e estão completamente sem imunidade para a mesma.
Essa cronologia, da evolução da doença, pode ser mais bem observada na Figura 1.
Figura 1. Cronologia Epidemiológica da disseminação global do Zika vírus.
Legenda: ZIKV: vírus Zika; GBS: Síndrome Guillain-Barré; FIFA: Federação Internacional de Futebol. Fonte: RIBEIRO,
KITRON, 2016.
O Zika vírus e sua disseminação
A América tem passado por várias experiências como essas nos últimos 500 anos, com
algumas delas gerando consequências desastrosas para os habitantes nativos, como foi com a
varíola, sarampo, influenza e a febre amarela (MUSSO, 2015).
No caso do Zika vírus, muitos determinantes podem ser apontados como fatores de
risco para a doença. A América do Sul e a América Central possuem as condições climáticas,
geográficas e ambientais ideais para o desenvolvimento do vetor, isso associado com a baixa
condição socioeconômico da população e inadequadas políticas na área da saúde, falta de
monitoramento ambiental, educação em saúde inadequada, falta de saneamento ambiental, má
gestão de recursos hídricos e resíduos sólidos o que acaba somando para tornar os terrenos em
potenciais criadouros de larvas do mosquito transmissor.
Outro fator apontado por vários pesquisadores foi a transmissibilidade de o vírus
ocorrer por diferentes vias, incluindo a transmissão perinatal, transfusão de sangue ou
exposição ao sêmen infectado. Alguns autores isolados relataram ter encontrado o RNA viral
em amostras de leite materno, fluído amniótico, placenta, urina e saliva, embora a transmissão
não tenha sido documentada por estas vias (NUNEZ et al, 2016).
A forma como a doença vem se propagando mostra a grande resiliência do vírus, que
apresenta como reservatórios suspeitos macacos e roedores, por apresentar como vetor o
mosquito Aedes aegypt, o mesmo da dengue e da Chikungunya, presente em países tropicais,
no entanto casos esporádicos de turistas infectados pelo Zika vírus que retornam de áreas
afetadas pela doença têm sito notificados em muitos países onde as espécies do mosquito não
estão presentes.
Zika vírus e sua epidemia
A infecção pelo vírus Zika virou atualmente uma doença infecciosa emergente, que
desde suas primeiras infecções, contabiliza-se ter produzido cerca de um milhão de casos em
22 países e territórios das Américas e do Caribe registraram casos de transmissão autóctone,
sendo eles: Barbados, Bolívia, Brasil, Colômbia, Costa Rica, Curaçao, República
Dominicana, Equador, Guiana, El Salvador, Guiana Francesa, Guatemala, Guadalupe, Haiti,
Honduras, Martinica, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai, Porto Rico, Saint Martin,
Suriname e Venezuela. (ZANLUCA et al, 2015; VIAL CLARO, ARAOS BRALIC, 2016;
FAUCI, MORENS, 2016; WHO, 2016c).
É fundamental destacar que o surto demonstrou uma alta taxa de ataque, com um
número exorbitante de pessoas afetadas, chegando aos milhares e isso acabou gerando um
excesso de serviços nas emergências de hospitais públicos e privados. No entanto, é difícil
determinar os dados epidemiológicos exatos do vírus pelos sistemas de notificação oficiais,
uma vez que a notificação dos casos da doença não eram obrigatórios (PERNAMBUCO,
2015). Outro ponto que dificultou a sua identificação foi o fato da maioria das pessoas
infectadas pelo vírus, cerca de 80% delas, não apresentarem sintomas.
Quando a doença é sintomática, não se sabe ainda qual o período de incubação, ou seja,
o tempo decorrido desde a exposição até os sintomas, mas é provável que ocorra em poucos
dias, sendo eles semelhantes aos de outras infecções por arbovírus, tendo como principal
sintoma a erupção maculopapular, na maioria das vezes pruriginosas (PERRET, 2016; WHO,
2016c).
Evidentemente, as pessoas, mesmo que assintomáticas, são capazes de transmitir o vírus
a novos indivíduos através da picada de mosquitos infectados. (CASTELLANOS, 2016). Os
mosquitos Aedes picam, normalmente, durante o dia. Também é possível sua transmissão por
via sexual, e outras formas estão sob investigação como é o caso da transmissão vertical (de
mãe para o filho) e por transfusões sanguíneas (WHO, 2016c).
Em termos de diagnóstico da doença, quando o paciente é sintomático, concluir se ele
esta com a doença Zika apenas pela clinica que ele apresenta torna-se um enorme desafio
médico devido á semelhança com outras doenças do arbovírus, como dito anteriormente, por
isso, que em casos de suspeitas da infecção pelo vírus devido aos sintomas ou até o mesmo o
histórico recente de viagens, sendo ele residente ou que tenha viajado para uma zona de
transmissão ativa do vírus, o diagnóstico só pode ser confirmado através da análise
laboratorial do sangue ou algum outro fluido corporal, como a urina, a saliva ou o sêmen
(WHO, 2016c).
Mesmo com exame sorológico, ainda há dificuldade para o seu diagnóstico tendo em
vista que ele é dificultado pela reatividade cruzada com outros flavivirus, principalmente a
dengue. E apenas poucos laboratórios no Brasil e nos demais países têm a adequada
capacidade de diagnosticar a infecção do vírus através da identificação do RNA viral através
do método RT-PCR, pois, embora seja uma técnica simples, requer um alto nível de
especialização e equipamentos adequados, juntamente com uma amostra colhida no momento
certo, em pessoas que tem ou não os sintomas. Além disso, são necessários testes de sorologia
para o diagnóstico em casos agudos ou recentes. Infelizmente, estes testes não estão
disponíveis de forma comercial, além de sua baixa sensibilidade e especificidade em pacientes
que tem ou tiveram dengue, já que é estreita a relação entre o Zika e a Dengue
(CASTELLANOS, 2016; RIBEIRO, KITRON, 2016).
O tratamento para o Zika ainda é bastante restrito. Como a doença ocorre geralmente de
forma rápida, acaba por não exigir tratamento específico, sendo o paciente tratado de acordo
com os sintomas que apresente. Mas no geral, as pessoas com a doença, tendo ou não
sintomas, devem repousar muito, ingerir bastante liquido e tratar a dor e a febre com
medicamentos rotineiros. Caso haja piora do quadro clinico, deve ser procurado cuidado
médico mais especializado. Ressalta-se que até então, ainda não há nenhuma vacina
disponível (WHO, 2016c).
O Zika vírus e suas complicações
Atualmente, a maior preocupação relativa ao Zika são as complicações decorrentes da
infecção pelo vírus, principalmente nas mulheres grávidas e nos seus bebês. De forma
concomitante com o Zika um fenômeno houve o aumento anormal de casos da Síndrome de
Guillain-Barre, observada inicialmente na Polinésia Francesa e depois no Brasil, El Salvador,
Venezuela e Honduras, demonstrando uma provável relação causal, mas ainda sem ser
demonstrados sua incidência e os fatores de risco (VIAL CLARO, ARAOS BRALIC, 2016;
WHO, 2016b).
Contudo, o achado mais preocupante é o aumento significativo nos casos de
microcefalia e malformações do Sistema Nervoso Central (SNC) em recém-nascidos (RN),
relatado na região Nordeste do Brasil desde outubro de 2015. A associação temporal e
geográfica desse aumento com a epidemia do Zika vírus deixou médicos e autoridade de
saúde em alerta e causou uma preocupação na população. A partir daí, tem-se trabalhado na
investigação desse problema, a fim de determinar o tamanho e a magnitude do problema e foi
quando ampliou a investigação para estabelecer a possível transmissão vertical do vírus e sua
provável associação causal com danos neurológicos (VICTORA et al, 2016).
A microcefalia é uma síndrome congênita que abrange o desenvolvimento anormal do
cérebro e subsequente uma circunferência cefálica menor do que a normal. Em três meses,
entre o inicio da monitorização da microcefalia no Brasil, em outubro de 2015 e a atualização
pública do Ministério da Saúde, em janeiro de 2016, foram relatados 3.893 casos suspeitos de
microcefalia, em 21 das 27 unidades federativas e 764 municípios. Entre os 512 casos
analisados clinicamente, o diagnóstico foi confirmado em 230. Além desses achados no
Brasil, primeiro país a descrever e registrar tal alteração, dados da Polinésia Francesa também
sugerem um aumento nas malformações do SNC em RN e fetos durante os anos de 2014 e
2015 (ECDC, 2016; RIBEIRO, KITRON, 2016).
Com a descrição realizada da evolução da infecção pelo Zika vírus, demonstra-se uma
alteração no perfil da doença desde seu surgimento até hoje. No seu começo, na África e na
Ásia, ela possuía apresentação endêmica de pouca gravidade; já, atualmente, na América, a
doença apareceu com grandes surtos e epidemias, com sinais e sintomas comuns a população
e o aparecimento de sintomas neurológicos (KINDHAUSER et al, 2016).
Isso nos leva a pelo menos três razões diferenciais para a situação tão preocupante do
vírus: I) total de pessoas afetadas e velocidade de disseminação do vírus; II) gravidade das
manifestações possivelmente associadas ao vírus, incluindo a microcefalia nos filhos de mães
acometidas durante a gravidez e as sequelas neurológicas em parte das pessoas que
adoeceram; e III) situação crítica da Saúde Pública na maioria dos países afetados.
Zika vírus e a sua prevenção
Levando em consideração vários fatores supracitados, como a maior parte das pessoas
infectadas pelo vírus serem assintomáticas, a dificuldade diagnóstica da doença, o tratamento
ser apenas pelos sintomas, não haver uma vacina, a alta disseminação da doença, as
complicações decorrentes da mesma e os poucos estudos e conhecimento tornam a prevenção
contra a forma de transmissão da doença ainda a melhor e mais eficaz alternativa.
A grande proliferação do mosquito na América possui várias causas além do clima, tais
como: falta de uma ação comum realmente eficaz para combater os mosquitos, a expansão
urbana, constante migrações de áreas rurais para as cidades, mudanças climáticas e
aquecimento global e o aumento de viagens aéreas e marítimas (KOURI, GUZMAN,
BRAVO, 1986; ISTÚRIZ, GUBLER, BREA DEL CASTILLO, 2000).
Notavelmente, os métodos atuais para o controle do mosquito falharam, grande
evidência disso são as repetidas epidemias de dengue e pela introdução e disseminação do
Zika vírus e da Chikungunya. Por isso é fundamental, além de trabalhar mais nas técnicas
antigas, mas desenvolver outros métodos alternativos que sejam mais eficazes. Além disso, é
de fundamental importância o investimento em infraestrutura urbana, abastecimento de água,
saneamento, coleta de lixo e habitação; sem essas melhorias, nenhum método mais especifico
visando a população dos mosquitos ou transmissão de arbovírus será verdadeiramente eficaz
(MARCONDES, XIMENES, 2016; RIBEIRO, KITRON, 2016).
Além disso, é imprescindível, para que ocorra a diminuição do mosquito, a educação em
saúde da população, com campanhas de conscientização, deixando claro para os indivíduos
qual o seu papel no controle do mosquito. Ainda sobre medidas contra o mosquito, é relevante
que a população tome medidas contra as picadas dos mosquitos. Considerando também as
demais vias de transmissão da doença, outra importante forma profilática está em reduzir o
risco de transmissão sexual e diminuir os potenciais de complicações na gravidez
relacionados à doença.
O impacto do Zika vírus e a importância da OMS frente à governança global em eventos
de grande porte
O Zika vírus e suas prováveis complicações, como a microcefalia e a Síndrome de
Guillain-Barré, constituem um novo tipo de atemorização á saúde pública com consequências
em longo prazo para as famílias, comunidades e países, o que faz com que a doença seja de
interesse internacional. Frente a isso, a Organização Mundial da Saúde/Organização PanAmericana de Saúde (OMS/OPAS), como uma das primeiras medidas, declarou um alerta
epidemiológico em 1 de dezembro de 2015, recomendando a seus estados membros a
conceber e manter a capacidade de detectar e confirmar os casos de infecção pelo vírus Zika,
adequar e preparar os serviços de saúde a circunstanciais demandas adicionais a todos os
níveis de atenção à saúde e a maior demanda de serviços especializados para atendimento de
síndromes neurológicas, tal como fortalecer as atividades e consultas de pré-natal
(ZANLUCA et al, 2015; ECDC, 2016; MLAKAR et al, 2016, RUBIN, GREENE, BADEN
2016).
Dessa forma, a diretora da OMS, Margaret Chan, declarou: “Esta emergência não é o
vírus Zika, mas sua associação com microcefalia e outras desordens neurológicas como a
síndrome de Guillain-Barré, é uma medida de precaução, não podemos esperar que o
relacionamento fosse estabelecido” (MAGUIÑA VARGAS, 2016).
A posteriori, a OMS declarou emergência sanitária através do IHR (International Health
Regulations/Regulamento Sanitário Internacional) PHEIC (Procedures Concerning Public
Health Emergencies of International Concern/Procedimentos Relativos a Emergências de
Saúde Pública de Interesse Internacional), posto que este seja “um evento extraordinário que
constitui um risco para a saúde pública de outros estados através da propagação de doenças e
poderá necessitar de uma resposta internacional coordenada", o que resulta de uma situação
que pode ser exteriorizada como: grave, súbita, excepcionais ou imprevistas, pois é o que tem
implicações para a saúde pública além da fronteira nacional do Estado em questão e acabar
exigindo uma ação internacional imediata (MAGUIÑA VARGAS, 2016).
Atualmente a OMS/OPAS e parceiros estabeleceram a resposta estratégica ao Zika, que
coloca um maior foco na prevenção e gestão de complicações médicas causadas pela infecção
do vírus Zika. Até o momento, US$ 122,1 milhões são necessários para implementar o "Plano
de Resposta Estratégica ao Zika”, de julho de 2016 a dezembro de 2017.
Esse Plano de Resposta descreve quatro pilares/objetivo principais para apoiar os
governos e as comunidades nacionais na prevenção e gestão das complicações do vírus Zika e
na mitigação das consequências socioeconómicas:
•
Detecção – objetiva determinar o peso da doença para orientar as intervenções
de saúde pública;
•
Prevenção – prevenir complicações associadas à infecção pelo vírus por meio de
controle da proliferação dos mosquitos; comunicar divulgar os riscos à saúde das
pessoas e abranger as comunidades em práticas de prevenção;
•
Cuidados e Suporte – fortalecimento dos sistemas de saúde e socioeconômicos
devidos e apoio a população e comunidades afetadas por Zika e suas
complicações.
•
Pesquisa – dois objetivos: gerar dados e evidências necessárias para fortalecer a
saúde pública com orientações e intervenções para previnir, detectar e controlar
a infecção pelo Zika e gerenciar suas complicações; e, a mais curto prazo,
intensificar a investigação, desenvolvimento e disponibilidade de ferramentas de
controle do mosquito Aedes, testes de diagnóstico e vacinas (WHO, 2016a).
Por fim, a resposta da OMS também conta com um “Quadro Estratégico de Resposta ao
Zika”, que foi desenvolvido com a finalidade de ajudar os países a controlarem a doença do
vírus Zika de forma mais imediata. Esse quadro propõe as seguintes medidas:
• Definir e priorizar a investigação sobre a doença do vírus Zika, reunindo peritos e
parceiros;
• Intensificar a vigilância do vírus Zika e potenciais complicações;
• Reforçar as capacidades de comunicação dos riscos, para levar as comunidades a
compreenderem melhor os riscos associados ao vírus Zika;
• Reforçar a capacidade laboratorial para a detecção do vírus;
• Apoiar as autoridades sanitárias na implementação das estratégias de controlo dos
vetores, destinadas a reduzir as populações do mosquito Aedes;
• Preparar recomendações para os cuidados clínicos e o seguimento das pessoas com
complicações relacionadas com a infecção pelo vírus Zika, em colaboração com peritos e
outras organizações de saúde.
(WHO, 2016c)
A expansão da capacidades dos sistemas de saúde nos países afetados é uma das
prioridades do Plano Estratégico de Resposta, tanto para conseguir fortalecer os países para
lidarem melhor com a epidemia, conseguir enfrentar as consequência a curto e longo prazo e,
por fim, diminuir as consequências tanto nos territórios afetados impedindo que se espalhe
mais ainda por outros lugares.
Uma outra preocupação que aflinge os países e esteve muito presente em 2016, que foi
como encarar a epidemia quando se trata de eventos de grande porte como foi as Olimpíadas
no Brasil. Como a epidemia estava em alta e o país que sediou o evento era um dos mais
afetados, muitas dúvidas surgiram na época, como se seria possível dar continuidade ao
evento ou se teria que ser suspenso; além da insegurança geral que se instalou em todos os
envolvidos, os atletas que teriam que vir disputar, os turistas que viriam para assistir os jogos
e a própria população local por receber pessoas que viriam de todo o mundo, inclusive de
outras areas afetadas e também as pessoas que viesse poderia espalhar a doença pelo mundo.
As opiniões sobre o que seria feito, quais as melhores medidas, se adiava ou não as
olimpiadas, foram bastante controversas e dividias. O evento não foi cancelado e o Brasil
decidiu manter o evento na data planejada e para isso várias justificativas foram utilizadas. O
primeiro foi que os meses de agosto e setembro as temperaturas no Rio de Janeiro eram
relativamente baixas e, por isso, pelo que é observado e com a experiências que temos com as
epidemias de dengue, a transmissão de doenças pelo Aedes aegypt costumam ser muito
menor, além de que pesquisas realizadas pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) mostravam
que o mosquito tem capacidade mais baixa de transmissão em agosto, o que fazia com que
esperavam que os números fossem ainda menores. Com isso, se cancelassem ou adiassem os
Jogos Olimpicos eles ocorreriam mais próximo aos meses de calor, o que aumentaria muito os
riscos de infecção.
Segundamente, rebateram o ponto de que a vida dos turistas ao Brasil ajudaria a
dissemainar a doença aos outros países do mundo. Esse receio se baseava muito no ponto de o
Zika fosse uma doença local, o que não é verdade. Existem evidências de transmissão da
doença em vários países de acordo com a OMS, o que fortalece o argumento de que interferir
nas Olimpiadas não impedirá que a doença continue a se espalhar (PUFF, 2016).
Por tras da decisão brasileira, o Comitê Olimpico Internacional (COI) insistiu que a
realização dos jogos fossem mantida entre 5 e 21 de agosto. Em contrapartida, uma série de
cientistas nacionais e internacionais escreveram uma carta com destino à OMS e ao COI,
pedindo que o evento fosse adiado até que a ameaça do vírus desaparecesse ou que se
cogitasse a transferência da sede dos jogos para outra cidade. A OMS não acatou o pedido dos
cientistas (G1, 2016).
O Ministro da Saúde, Ricardo Barros, afirmou que o posicionamento dos cientistas era
exagerado. Disse que havia excesso de zelo e que a doença ja estava presente em muitos
países e que não seriam as Olimpiadas a propagar a doença. Segundo a OMS, 57 países de
todos o mundo registraram casos de Zika, entretanto em apenas oito paíse – Brasil, Colômbia,
Martinica, Panamá, Polinésia Francesa, Cabo Verde, Eslovênia e Estados Unidos – foram
encontrados casos de microcefalia e outras malformações fetais potencialmente associados ao
Zika. O grupo de cientistas continuou a alegar que as posições do governo brasileiro e da
OMS eram perigosas e que a linhagem do vírus no Brasil é distinta da que esta presente na
maioria dos 6o países (LIÑAN, 2016).
O governo brasileiro, juntamente com a OMS, traçaram estratégias focando em
camapanha educativa internacional tratando sobre os efeitos do Zika e o que está sendo feito
para controlar a epidemia, para, assim, evitar o impacto da doença nas Olimpiadas. No fim do
evento, o Brasil comemorou pelo sucesso, já que, segundo o Ministro Eliseu Padilha, nenhum
caso de zika foi registrado durante as olimpiadas, sendo que o Brasil recebeu 1,17 milhão de
visitantes, sendo que 410 mil deles eram estrangeiros (BOECKEL, 2016).
Com essa experiência dos Jogos Olimpicos de 2016, é necessário avaliar com atenção se
a decisão tomada foi relamente segura ou arriscada. No entanto, algumas lições podem ser
retiradas dessa vivência, como: 1) cada evento tem que ser avaliado individualmente; 2) todos
os riscos devem ser analisados em atenção ao maior risco-beneficio para a saúde da
população; 3) avaliar a situação no local em que irá receber o evento; 4) garantir/fiscalizar que
o país cumpra o Plano Estratégico Contra o Zika e o apoio que eles recebem da OMS. Por
fim, tem que haver bastante investimento na conscientização da população sobre medidas
preventivas individuais e coletivas, além de divulgação dos riscos de infecção, constante
atualização da situação no local através de boletins informativos e cooperação mundial entre
os países para que se mantenham firmes na luta contra o Zika vírus.
3. CONCLUSÃO
Mesmo com todos os avanços e descobertas sobre a doença, é necessário que se
percorra um longo caminho, pois ainda há muito que ser pesquisado e investigado com maior
profundidade. Não se conhece integralmente o seu comportamento epidemiológico e clínico,
sua associação com a complicação neurológica fetal e, na área de saúde materna, requer
estudos prospectivos para confirmar ou negar as descobertas. Também é fundamental
encontrar métodos novos e seguros de diagnóstico e vacinas e, por fim, encontrar medidas que
ajudem a controlar a doença.
Por fim, o Zika vírus tem sido um problema crescente e um grande desafio para
governança global do século XXI, principalmente em face ao seu impacto na saúde mundial e
às suas consequências em eventos de grande porte, como ocorrido nos Jogos Olímpicos do
Rio de Janeiro, em 2016, e, ainda, o que poderá ocasionar em eventos futuros.
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