UNIVERSIDADE DO PORTO INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOMÉDICAS DE ABEL SALAZAR PÉ DIABÉTICO FACTORES COMPORTAMETAIS NA SUA PREVENÇÃO MARIA ANTONIETA BRAZ Dissertação de Mestrado em Ciências de Enfermagem 2007 MARIA ANTONIETA BRAZ PÉ DIABÉTICO FACTORES COMPORTAMETAIS NA SUA PREVENÇÃO Dissertação de candidatura ao grau de Mestrado em Ciências de Enfermagem submetida ao Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar Orientadora: Professora Doutora Maria Arminda S. Mendes Costa 2007 PENSAMENTO “Só envelhece Quem perde a capacidade de se encontrar e renovar” (G. Bevillacqua) AGRADECIMENTOS Esta dissertação contou com a ajuda e colaboração de amigos, colegas de trabalho e familiares. Gostaria de expressar toda a minha gratidão e o reconhecimento a todos que tornaram possível a sua concretização, a todos eles deixo aqui o meu agradecimento muito sincero em especial aos meus pais, pelo exemplo de vida, amor, compreensão, exemplo de honradez, responsáveis pelo meu desenvolvimento humano por ser o que sou hoje. Aos meus irmãos e sobrinhas que acrescentaram positivamente durante toda esta etapa. Ao Rui, meu marido pelo carinho, compreensão, companheirismo, que me proporcionou, ajuda, incentivo, mesmo com as minhas ausências. O meu reconhecimento à Professora Doutora Arminda Costa que não só se disponibilizou a orientar esta tese, como ao longo de todo o trabalho me incentivou com toda a sua sabedoria, capacidade de trabalho, organização e também calor humano. A todos de que de algum modo contribuíram para a realização deste estudo. Este trabalho não teria sido possível sem a autorização e colaboração do Centro de Saúde, concedidas para a aplicação da entrevista e sem a valiosa colaboração dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde participantes neste estudo. A todos O MEU MUITO OBRIGADO RESUMO De entre as complicações da diabetes, o Pé Diabético é a mais frequente e pode ser prevenida, numa grande parte dos casos, através da educação para a saúde. O estudo consiste numa investigação-acção de natureza descritiva comparativa que ocorreu de quarenta e cinco idosos diabéticos Tipo 2. Pretendeu-se responder às seguintes questões de Investigação: - Quais os factores de risco que predispõem ao desenvolvimento do Pé Diabético? Que comportamentos/conhecimentos apresentam os idosos diabéticos com os pés para a prevenção do Pé Diabético? Quais os comportamentos/conhecimentos dos idosos diabéticos após educação para a saúde? No primeiro momento a colheita de dados partiu da aplicação de uma grelha de observação dos pés para detectar sinais e sintomas e uma entrevista semi-estruturada para identificar os comportamentos de risco e conhecimentos e um questionário no segundo momento. O referencial metodológico baseou-se no modelo Predisponing, Reinforcing and Enabling Causes in Educational Diagnosis and Evoluation PRECEDE. Os resultados do estudo: - 91% dos idosos apresentavam higiene precária e 86,7% não tinham o hábito de examinar os pés. Evidenciam mais conhecimentos referentes à inspecção do calçado antes de usar (62,2%), não andar descalço (88,9%) e na lavagem dos pés (55,6%). - A maioria mostram, como factores de risco para o desenvolvimento do Pé Diabético, o calo (84,4%), unha hipertrofiada e esfarelada (66,7%), pele seca (88,9%), sensibilidade diminuídas e pulsos fracos (73,3%). - 77,8% relataram o uso de calçado inadequado, sendo o chinelo o mais frequente e 91,1% não usava meias adequadas. Conclui-se que a população avaliada desconhece as medidas preventivas do Pé Diabético. Após a implementação de uma acção de educação para a saúde, concluímos que houve melhoria significativa dos conhecimentos e comportamentos sobre os cuidados preventivos do Pé Diabético, pois mostram saber que é importante ter cuidados com os pés. Os cuidados em que os idosos diabéticos apresentam menos conhecimentos, são em relação à remoção de calos (22,2%), hidratação dos pés (24,4%) e na observação dos pés (22,2%), respectivamente. Consideramos, no entanto, que a educação para a saúde contribuiu signitivamente para a melhoria dos cuidados dos idosos diabéticos com os seus pés. Palavras-chave: Idoso, Pé Diabético, Educação, Conhecimento, Comportamento, Auto-cuidado. ABSTRAT Among the complications of diabetes, the Diabetic Foot is the most frequent and can be prevented, in most cases, through health education. The study consists of an investigation-action of descriptive comparative nature that occurred from 45 aged diabetic patients Type 2. It was intended to answer the following investigation matters: What are the risk factors that predispose to the development of the Diabetic Foot? What behaviour/knowledge do aged diabetic patients have with the feet to prevent the Diabetic Foot? What behaviour/knowledge do aged diabetic patients have after health education? In the first moment the gathering of data started with the application of an observation table of the feet to detect signs and symptoms and a semi-structured interview to identify the risk conducts and knowledge and an interview in a second moment. The methodological referential was based on the model Predisponing, Reinforcing and Enabling Causes in Educational Diagnosis and Evaluation – PRECEDE. The study results: - 91% of aged people showed precarious hygiene and (86,7%) didn’t have the habit of examining the feet. They showed more accurate knowledge in what concerns the inspection of footwear before using it (62,2%), not walking barefoot (88,9%), in washing the feet (55,6%). - The majority showed as risk factors for the development of the Diabetic Foot the callus (84,4%), the nail mycosis (66,7%), dry skin (88,9%), low sensitivity and weak pulses (73,3%). - 77,8% reported the use of inadequate footwear, being the slippers the most frequent and (91,1%) didn’t use the most adequate socks. One can conclude that the population observed ignores the preventive measures of the Diabetic Foot. After the implementation of an action on health education we concluded that there was a significant improvement of knowledge and behaviour on preventive care of the Diabetic Foot, showed to know that it is important to pay more attention to the feet. The precautions in which aged diabetic people show less knowledge is regarding the removal of callus (22,2%), drying and hydrating the feet (24,4%) and in the observation of the feet (22,2%), respectively. We consider, although, that the health education contributed significantly for the caring improvement of aged diabetic people with their feet. Keywords: Aged people, Diabetic Foot, Education, Knowledge, Behaviour, Selfcaring. ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1 - Pirâmide de idades, Portugal 1960-2000 -------------------------------------- 22 Figura 2 - Evolução da Proporção da população portuguesa jovem e idosa, 1960 - 2001 ----------------------------------------------------------------------------------------- 24 Figura 3 - Percentagem da população com 65 anos ou mais -------------------------- 25 Figura 4 - Percentagem da população com 85 anos ou mais -------------------------- 25 Figura 5 – Modelos de Educação para a Saúde ----------------------------------------- 79 Figura 6 – Modelo PRECEDE------------------------------------------------------------------- 84 ÍNDICE DE GRÁFICOS Gráfico 1 - População residente em Aveiro (idades <=14 anos e > a 65 anos) --- 26 Gráfico 2 - Óbitos por Diabetes Méllitus. Fonte: Tribuna médica, 21 de Julho de 2003. -------------------------------------------------------------------------------------------------- 51 Gráfico 3 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, segundo os problemas de saúde associadas ou complicações da diabetes. Porto, 2006. - 116 Gráfico 4 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, segundo as alterações dermatológicas como factor de risco para o desenvolvimento de Pé Diabético. --------------------------------------------------------------------------------------- 122 Gráfico 5 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, acerca dos cuidados essenciais com os pés em relação ao comportamento adequado e conhecimento certo após ensino. Porto, 2006. -------------------------------------------- 136 ÍNDICE DE QUADROS Quadro 1 - Recomendações do controlo glicémico para adultos diabéticos ---------- 57 Quadro 2 - Gerações de Educação para a Saúde ---------------------------------------- 76 Quadro 3 - Recursos humanos da Unidade de Saúde do estudo -------------------- 97 Quadro 4 - Momentos de Intervenção do estudo ------------------------------------------------ 100 Quadro 5 - Forma correcta de realizar os cuidados essenciais com os pés ------- 107 Quadro 6 - Significados/Sentimentos dos idosos em relação às complicações -- 143 Quadro 7 - Oportunidades dos idosos para orientações dos profissionais --------- 149 ÍNDICE DE TABELAS Tabela 1 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, segundo o sexo e faixa etária, em anos completos. Porto, 2006. ----------------------------------- 111 Tabela 2 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde de Salreu, segundo as características sócio-demográficas. Porto, 2006. ------------------------- 112 Tabela 3 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, segundo o tempo de diagnóstico de diabetes. Porto, 2006. ------------------------------------------ 114 Tabela 4 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, segundo perfil lipídico. Porto, 2006. ---------------------------------------------------------------------- 117 Tabela 5 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, segundo a glicemia em jejum e hemoglobina glicosilada. Porto, 2006. --------------------------- 118 Tabela 6 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade, segundo o índice de massa corporal e sexo. Porto, 2006. -------------------------------------------------------- 120 Tabela 7 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade, segundo as alterações circulatórias com factor de risco para o desenvolvimento do Pé Diabético. Porto, 2006. -------------------------------------------------------------------------- 123 Tabela 8 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, segundo as alterações motoras e estruturais como factor de risco para o desenvolvimento do Pé Diabético. Porto, 2006. ------------------------------------------- 124 Tabela 9 - Distribuição das pessoas diabéticas da Unidade de Saúde, segundo as alterações provenientes da neuropatia autónoma como factor de risco para o desenvolvimento do Pé Diabético. Porto, 2006. ------------------------------------------- 125 Tabela 10 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde de Salreu, segundo as alterações provenientes da neuropatia sensitiva como factor de risco para o desenvolvimento do Pé Diabético. Porto, 2006. -------------------------- 126 Tabela 11 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, acerca dos factores de risco segundo as questões referentes ao comportamento adequado e não adequado dos cuidados essenciais com os pés no primeiro momento. Porto, 2006. --------------------------------------------------------------------------- 128 Tabela 12 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, acerca dos cuidados essenciais com os pés em relação ao conhecimento certo e errado no pré ensino. Porto, 2006. ------------------------------------------------------------ 130 Tabela 13 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, acerca dos cuidados essenciais com os pés em relação ao comportamento adequado após ensino. Porto, 2006. ----------------------------------------------------------------------- 133 Tabela 14 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, acerca dos cuidados essenciais com os pés em relação ao conhecimento certo e errado pés após ensino. Porto, 2006. -------------------------------------------------------- 134 ÍNDICE RESUMO ABSTRACT ÍNDICE DE FIGURAS ÍNDICE DE GRÁFICOS ÍNDICE DE QUADROS ÍNDICE DE TABELAS INTRODUÇÃO ------------------------------------------------------------------------------------- 12 PRIMEIRA PARTE - ENQUADRAMENTO TEÓRICO CAPÍTULO I - ENVELHECIMENTO E SAÚDE 1 - DEMOGRAFIA E ENVELHECIMENTO ------------------------------------------------- 21 2 - ENVELHECIMENTO, VELHICE, IDOSO - A ANÁLISE DE CONCEITOS ---- 28 2.1 - CUIDAR O IDOSO-------------------------------------------------------------------------- 36 2.1.1 - O cuidado de Enfermagem à pessoa Idosa------------------------------------ 38 2.2 - POLÍTICAS DE SAÚDE PARA A TERCEIRA IDADE --------------------------- 43 CAPÍTULO I I - DIABETES MELLITUS 1 - A DOENÇA DIABETES MELLITUS ----------------------------------------------------- 49 1.1 - DEFINIÇÃO, CLASSIFICAÇÃO E CRITÉRIOS DE DIAGNÓSTICO ---------- 52 2 - PROGRAMA NACIONAL DE CONTROLO DA DIABETES MÉLLITUS ------ 58 CAPÍTULO III - O IDOSO COM PÉ DIABÉTICO E A EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE 1 - A DIABETES NO IDOSO ------------------------------------------------------------------- 62 1.1 - O IDOSO COM PÉ DIABÉTICO -------------------------------------------------------- 67 2- EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE ------------------------------------------------------------ 71 2.1 - TEORIAS E MODELOS DE EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE--------------------- 75 3 - ACTUACÇÃO DE ENFERMAGEM NA DIABÉTES ---------------------------------- 87 SEGUNDA PARTE - METODOLOGIA 1 - FINALIDADES/OBJECTIVOS DO ESTUDO ------------------------------------------ 93 2 - REFERENCIAL METODOLÓGICO ----------------------------------------------------- 94 2.1 - LOCAL DO ESTUDO ---------------------------------------------------------------------- 97 2.2 - PERÍODO DO ESTUDO ------------------------------------------------------------------ 98 2.3 - POPULAÇÃO/AMOSTRA DO ESTUDO --------------------------------------------- 98 2.4 - ASPECTOS ÉTICOS ---------------------------------------------------------------------- 99 2.5 - INSTRUMENTOS DE COLHEITA DE DADOS ------------------------------------- 99 2.6 - VARIÁVEIS EM ESTUDO ---------------------------------------------------------------- 101 2.6.1 - Variáveis relacionadas com o diagnóstico social - Dados demográficos -------------------------------------------------------------------------------------- 101 2.6.2 - Variáveis relacionadas com o diagnóstico epidemiológico - Dados clínicos ---------------------------------------------------------------------------------------------- 102 2.6.3 - Variáveis relacionadas com o diagnóstico comportamental ------------ 103 2.6.4 - Variáveis relacionadas com o diagnóstico educacional ------------------ 103 2.7 - RECOLHA E ORGANIZAÇÃO DA INFORMAÇÃO -------------------------------- 104 2.7.1 – Primeiro momento de avaliação--------------------------------------------------- 105 2.7.2 – Primeiro momento de avaliação -------------------------------------------------- 108 TERCEIRA PARTE - RESULTADOS E ANÁLISE DOS RESULTADOS 1 – PRIMEIRO MOMENTO DE AVALIAÇÃO 1.1 - DIAGNÓSTICO SOCIAL ------------------------------------------------------------------ 111 1.2 - DIAGNÓSTICO EPIDEMIOLÓGICO -------------------------------------------------- 113 1.3 - DIAGNÓSTICO COMPORTAMENTAL ----------------------------------------------- 127 1.4 - DIAGNÓSTICO EDUCACIONAL ------------------------------------------------------- 130 2 - SEGUNDO MOMENTO DE AVALIAÇÃO --------------------------------------------- 133 3 - CONCLUSÕES/SUGESTÕES ------------------------------------------------------------ 152 4 - CONSIDERAÇÕES FINAIS ---------------------------------------------------------------- 156 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS --------------------------------------------------------- 160 ANEXOS Anexo 1- Guião da entrevista I Anexo 2 - Grelha de observação Anexo 3 - Pedido de autorização ao C.S. Anexo 4 - Pedido de autorização à Coordenadora da Diabetes do Centro de Saúde Anexo 5 - Consentimento livre e esclarecido Anexo 6 – Monofilamento de Semmes-Weinstein e Diapasão Anexo 7 – Guião da entrevista II INTRODUÇÃO O envelhecimento humano tem sido motivo de destaque, pelo seu processamento em larga escala devido ao aumento da esperança média de vida, quer na Europa, quer no resto do mundo. É um processo natural e irreversível a que todos estamos sujeitos, mas nem sempre compreendido, sendo também um dos maiores desafios que teremos de enfrentar. Se em tempos longínquos os idosos viviam no seio da sua família sendo cuidados pelos seus membros até à morte, nos dias de hoje devido às mutações sociais e demográficas existentes na nossa sociedade, a ajuda dos familiares está gradualmente condicionada e limitada. Os idosos eram vistos pela sociedade como um grupo de saberes acumulados, sobrevalorizando-os em relação a outros grupos etários. Com a recente transformação das sociedades os idosos tornam-se num grupo particularmente vulnerável à exclusão social, estando a sua imagem estigmatizada. O envelhecimento é hoje visto como um desafio na transição do século. De acordo com o Instituto Nacional de Estatística (INE, Portugal, 2002, p. 3), “A intensidade do envelhecimento, os aspectos que envolve, assim como os novos desafios e oportunidades que se deparam a uma sociedade cada vez mais constituída por pessoas mais velhas, tornam este tema sempre actual exigindo uma análise multidimensional”. Segundo a World Health Organization (WHO)1 existe uma tendência para um aumento do número de pessoas idosas até ao ano de 2050, pelo que não podemos ficar alheios às repercussões económicas, políticas e sociais decorrentes deste fenómeno. De acordo com o INE (Portugal, 2002), o envelhecimento demográfico não evoluiu da mesma forma em todas as regiões do mundo, isto porque, os países desenvolvidos foram pioneiros no fenómeno de transição demográfica, com evolução segundo taxas negativas desde 1970 da população jovem. O processo de transição demográfica, caracterizado pela diminuição das taxas de mortalidade e a diminuição de fecundidade registada a partir da década de 80, tem proporcionado o aumento da população idosa. Dados da Organização Mundial de Saúde indicam que em 2000 existiam 600 milhões de pessoas com idade superior a 60 anos e que em 2025 serão 1.2 biliões, aumentando este número para 2 biliões em 2050 (Gonçalves, 2003). 1 In: http://www.who.int/ageing/en/ Portugal está a envelhecer. Dados do Instituto Nacional de Estatística indicam que residiam em Portugal 10 355 824 indivíduos, dos quais 4 999 964 eram homens e 5 355 860 eram mulheres, em que a proporção de idosos - 65 ou mais anos recenseados (16,4%) ultrapassando pela primeira vez a dos jovens - 0 aos 14 anos (16,0%). Algumas análises apontam para a alteração desta percentagem para 20% no ano 2020. A população portuguesa com mais de 65 anos teve um aumento de 140% de 1960 até 2001 data do último recenseamento da população (Instituto Nacional de Estatistica, 2002). O envelhecimento é hoje em dia uma realidade crescente e complexa pela forma como a sociedade percepciona este fenómeno e pela forma como a própria pessoa idosa se auto-percepciona. Se admitirmos que envelhecer é somente como nos refere Imaginário (2004), uma passagem para uma nova fase da vida da qual deve advir saúde, felicidade e uma atitude positiva podemos abordar esta temática com maior entusiasmo. Zimerman afirma que “… a velhice não é uma doença, mas sim uma fase na qual o ser humano fica mais susceptível a doenças” (Imaginário, 2004, p. 43). Nunes (2005) refere que o estado de saúde da pessoa idosa surge como soma de todas as situações que interferiram com o seu percurso de vida desde a infância, como o crescimento, a profissão, o rendimento, a escolaridade e suporte familiar. Outros factores que influenciam o envelhecimento, como determinantes da saúde, são a economia, o género, os aspectos sócio-culturais e políticos (WHO, 2000). A pessoa idosa possui características e necessidade próprias, decorrentes do processo de envelhecimento e portanto de doenças crónicas, muito frequentes neste grupo de indivíduos. A doença crónica associada ao envelhecimento populacional é dos principais responsáveis pelo desfasamento entre a curva de mortalidade e de morbilidade, ou seja, o afastamento entre a esperança de vida e a qualidade de vida (Paúl, 2001). As doenças crónicas, pela sua especificidade, abrangem uma grande variedade de quadros clínicos, tendo como característica comum, não terem cura ou serem de longa duração. Podem provocar invalidez, principalmente quando a causa ou as suas sequelas não são reversíveis, necessitando, por isso, de um controlo periódico, de observação e tratamento regulares que obrigam o doente a seguir determinadas terapêuticas. As doenças crónicas não tendem a desaparecer por si sós: para inverter esta situação há necessidade de investir em mudanças políticas de promoção em saúde e será preciso também implementar estratégias, já conhecidas e desenvolvidas pela ciência para abreviar o seu aumento, assim como reduzir os seus impactos (Organização Mundial de Saúde, 2003). Foi a Primeira Conferência Internacional da Promoção da Saúde em 1986 a grande impulsionadora do conceito de promoção da saúde, da qual resulta a carta de Otava, onde Promoção de Saúde é definida como “o processo que visa aumentar e capacitar os indivíduos e comunidades para controlarem a sua saúde, no sentido de a melhorar. E, para atingir um estado de completo bem-estar, físico mental e social o indivíduo ou o grupo devem estar aptos a identificar e realizar as suas aspirações, a satisfazer as suas necessidades e a modificar ou adaptar-se ao meio” (Carta de Otava 1986, cit in Direcção Geral da Saúde 2003, p.1). A palavra-chave deste conceito “capacitar”, que significa “fornecer meios e oportunidades, tornar possível, prático, simples, e dar poder legal, autorizar para...”, implica atribuir ao indivíduo e população o poder de decisão em matéria de saúde, alterando as responsabilidades, das instituições, dos dirigentes, dos profissionais e da tecnologia (Ribeiro 1994, p.43). Neste âmbito, na carta de Otava (1986), cit. por Carvalho (2002, p. 129), apresentou algumas estratégias a seguir: - construção de políticas de saúde pública; - reorientação dos serviços de saúde; - desenvolvimento de competências pessoais; - criação de ambientes de suporte; - reforço da acção das comunidades. A promoção da saúde visa criar condições que permitam aos indivíduos controlar a sua saúde e a dos grupos onde se inserem e agir sobre os factores que a influenciam, nomeadamente os determinantes da saúde através de vários meios e formas de actuação, permitindo tornar mais fáceis as opções mais saudáveis. Sucessivas reuniões internacionais seguiram o desenvolvimento do conceito de promoção da saúde com um cariz cada vez mais abrangente, reflectindo a evolução do contexto sócio-económico e político (Tavares, 2003). Foi neste contexto, de sucessivas mudanças que a educação para a saúde emerge como resposta à necessidade de novas investigações para os vários e multifacetados problemas de saúde (Baldaia, 2001). Porém, para que os indivíduos possam dirigir a sua saúde têm de ter acesso à educação pois só assim poderão tomar decisões de forma autónoma e responsável. Nesta perspectiva, a educação para a saúde, considerada como uma estratégia básica para a promoção da saúde, permite que o indivíduo possa adquirir conhecimento de si mesmo e do meio que o rodeia, podendo exercer mudanças nesse meio e na sua própria conduta (Costa & Lopez, 1998; González, 1998). O indivíduo fica assim, habilitado a definir os seus próprios problemas e necessidades, a compreender como pode resolver esses problemas com os seus próprios recursos ou com apoios externos, e a fomentar acções mais apropriadas para uma vida saudável e de bemestar (Costa & Lopez, 1998, p. 32). A maior esperança de vida, o aumento da população idosa a interacção de factores como a urbanização, sedentarismo e mecanização, as mudanças nos hábitos alimentares, têm sido apontados como determinantes sociais da crescente prevalência de doenças crónicas. Entre as doenças crónicas no idoso, além da hipertensão e a doença coronária, encontra-se a diabetes mellitus constituindo um sério problema de saúde pública. A diabetes mellitus é uma doença crónica considerada grave que afecta cada vez mais pessoas, assistindo-se a uma verdadeira pandemia desta patologia. O número de pessoas diabéticas tem aumentado inexoravelmente. Os números são preocupantes: só na Europa estima-se que existam 30 milhões de diabéticos (Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal, 2001) e, embora os cálculos possam divergir ligeiramente, no nosso país calcula-se que existam 300 000 portugueses com esta patologia (Ministério da Saúde, 2002). Só os países em vias de desenvolvimento contribuem com aproximadamente três quartos da carga global da diabetes (Organização Mundial de Saúde, 2002). Estima-se que, em 2025, teremos por volta de 250 milhões de diabéticos em todo o mundo (Bowker & Wade, 2002). Confirmando o aumento dos números, Pereira (2004) refere que a carga global de pessoas com diabetes mellitus em 2003, rondava os 194 milhões, prevendo para 2025 um aumento de 72%, passando para 333 milhões de pessoas com diabetes. Para Portugal a população diabética, no mesmo ano, rondava os 400 000, prevendo para 2025 uma população de mais de 1 milhão de pessoas com diabetes. Ainda de acordo com a literatura, 50% das pessoas diabéticas desconhece a sua doença, o que torna impossível o seu cuidado. Conviver com uma doença crónica como a diabetes mellitus requer conhecimento e habilidade específica para o autocuidado, além de necessitar de uma educação mais efectiva para as pessoas diabéticas e seus familiares, bem como para os próprios profissionais de saúde que trabalham com este grupo de pessoas. Vários estudos têm demonstrado que a satisfação do doente com os serviços de saúde, especificamente na relação com os profissionais se reflecte positivamente no seu autocuidado (Golin et al., 1996; World Health Organization, 2001). No que diz respeito à pessoa idosa, Cordeiro (1999) considera que a avaliação do seu estado de saúde é complexo, uma vez que resulta do conhecimento dos grupos, dos estilos de vida, das suas atitudes culturais e tem como objectivo fundamental a necessidade de saúde. No entanto sabemos que é nesta fase da vida que as pessoas se encontram mais propensas e vulneráveis ao aparecimento de determinadas doenças como o caso da diabetes, pois à medida que as pessoas envelhecem, o risco de desenvolver a doença também aumenta sendo deste modo um grupo consumidor de cuidados de saúde pelas suas complicações. Entre as complicações da diabetes destaca-se o Pé Diabético com características multifacetadas decorrentes da combinação de neuropatia sensitivo-motora e autonómica periférica crónica, doença vascular periférica e ainda das alterações biomecânicas com conduzem à pressão plantar anormal (Pedrosa et al., 1998). Muitos estudos surgiram em prol da prevenção do Pé Diabético, aumentando deste modo as recomendações clínicas quer a nível da conduta preventiva quer a nível do controlo das manifestações. O Pé Diabético, de acordo com a Circular Normativa de 24/04/2001 da Direcção Geral da Saúde, é uma das complicações mais graves da Diabetes Mellitus, sendo o principal motivo de ocupação das camas hospitalares pelos diabéticos e o responsável por 40 a 60% das amputações efectuadas. Segundo a mesma fonte, 15% da população diabética pode está sujeita ao aparecimento de lesões nos pés, nomeadamente pela presença de neuropatia sensitivo-motora e de doença vascular aterosclerótica. Estima-se ainda que, em Portugal, possam ocorrer anualmente cerca de 1200 amputações não traumáticas dos membros inferiores. Dados epidemiológicos sugerem que o risco de amputações é 15 vezes superior relativamente aos não diabéticos e cinco anos após a primeira amputação, mais de metades dos diabéticos correm o risco de sofrer amputação contralateral. Actualmente, 5 a 10% do orçamento mundial de saúde é gasto com a diabetes e em 2025, este valor poderá atingir os 40% em alguns países se as actuais previsões de prevalência da diabetes se cumprirem. A cada 30 segundos uma perna é amputada por diabetes em algum lugar do mundo. O alerta é da Federação Internacional de Diabetes. Valores da Organização Mundial de Saúde (2003) indicam que 3,2 milhões de mortes por ano em todo o mundo podem ser atribuídas à diabetes, o que equivale a 6 mortes por minuto. O conhecimento destes números, a par da consciencialização dos elevados custos económicos e humanos associados às amputações e ao facto de os problemas no Pé serem o motivo de internamento mais frequente do doente diabético, tem motivado os profissionais de saúde para a sua prevenção e tratamento. Um dos objectivos da Declaração de St. Vincent é a redução do número de amputações dos membros inferiores nos doentes diabéticos. A evidência internacional tem demonstrado que o cuidado e tratamento do Pé Diabético levam à obtenção de evidentes ganhos em saúde, através de uma diminuição acentuada do número de amputações. Permite também concluir que muito há ainda por realizar na prevenção do Pé Diabético. Em resposta a essa inquietação e por termos deparado com a falta de apoio e informação dos idosos diabéticos no local do estudo, surgiu o interesse em compreender melhor o universo de pessoas idosas diabéticas, definindo para o nosso estudo: - Descrever os comportamentos e conhecimentos dos idosos diabéticos na prevenção do pé dibético; - Identificar factores de risco que predispõem ao desenvolvimento do pé diabético; - Identificar os comportamentos e os conhecimentos na área da prevenção que os idosos diabéticos modificam após Educação para a Saúde. Com este trabalho esperamos encontrar algumas respostas às nossas questões, assim como obter dados que nos permitam reformular no futuro conteúdos e metodologias no sentido de ajudar os idosos diabéticos no seu autocuidado, contribuindo para a melhoria da sua qualidade de vida, reduzindo ou atrasando as complicações dos pés advindas da própria doença. Tendo por base as permissas apontadas anteriormente elaboramos as seguintes questões de investigação: - Quais são os comportamentos dos idosos diabéticos na prevenção do pé diabético? - Que conhecimentos têm os idosos diabéticos na área da prevenção do pé diabético? - Quais são os factores de risco que predispõem ao desenvolvimento do Pé Diabético nos idosos diabéticos da população estudada? - Quais são os comportamentos na área da prevenção do pé diabético que os idosos diabéticos modificam após uma acção educação para a saúde realizada pelos enfermeiros? - Quais são os conhecimentos, na área da prevenção do pé diabético, que os idosos diabéticos modificam após uma acção educação para a saúde realizada pelos enfermeiros? A fim de darmos respostas a estas questões desenvolvemos uma investigação-acção. Num primeiro momento recolhemos os dados relativos às variaveis em estudo: variáveis relacionadas com dados demográficas, com dados clínicos, com dados comportamentais e variáveis com dados educacionais, através de uma entrevista, observação dos pés do idoso, consulta de dados do processo do doente e/ou recolha de sangue para exames laboratoriais. Após a recolha de dados foi efectuado uma sessão de educação para a saude com a duração de 30 minutos e uma informação individual sobre o autocuidado com os pés. Como um dos objectivos consistia em avaliar se os idosos alteraram os comportamentos e conhecimentos apos a informação/formação, foi realizado um segundo momento (tres meses após o primeiro momento) de recolha destas variaveis em estudo, através de uma entrevista dirigida aos idosos. Participaram no estudo 45 idosos com o diagnóstico de diabetes do Tipo 2 que cumpriam cumulativamente os critérios: - Estar inscrito como diabético na Unidade de Saúde; - Atender a chamada telefonicamente para agendamento de consultas e aplicação das entrevistas nos dois momentos e para Educação para a Saúde no primeiro momento; - Ser capaz de dialogar, ouvir e responder às questões formuladas; - Ter idade igual ou superior a 65 anos; - Concordar em participar da pesquisa e assinar o termo de consentimento livre e esclarecido nos dois momentos do estudo. Estruturamos este trabalho em três partes. A primeira parte, constitui a fundamentação teórica considerada necessária e pertinente para este estudo, compreende quatro capítulos. No primeiro que denominamos “Envelhecimento e Saúde” fazemos uma abordagem genérica da problemática do envelhecimento da população, focando alguns aspectos demográficos, a delimitação de conceitos envelhecimento, velhice e idoso. Salientamos a problemática do cuidar o idoso no sentido de melhor perceber a importância dos cuidados gerontogeriátricos de enfermagem. No segundo capítulo fazemos referência a aspectos clínicos e epidemiológicos da diabetes mellitus e ao Programa Nacional do controlo da diabetes. No terceiro capítulo apresentamos a problemática do idoso com Pé Diabético e a Educação para a Saúde indispensável na sua prevenção. A segunda parte do nossso estudo é dedicada à investigação realizada na prevenção do Pé Diabético. Começamos por apresentar a finalidade e os objectivos do estudo, bem como as opções metodológicas no que se refere ao tipo de estudo, local da realização, população, recolha de informação, etapas do estudo e metodologia utilizada para o tratamento da informação. Na terceira e última parte procedemos à exposição dos aspectos metodológicos com a descrição dos resultados, a sua análise e finalmente apresentamos as conclusões, tecendo algumas considerações que possam motivar para a reflexão dos profissionais empenhados em colaborar com os idosos diabéticos na gestão da sua doença. Não pretendemos encontrar respostas definitivas e absolutas, queremos sim, que a reflexão seja aperfeiçoada pela partilha e por outros estudos que se possam seguir. PRIMEIRA PARTE – ENQUADRAMENTO TEÓRICO CAPÍTULO I - ENVELHECIMENTO E SAÚDE 1 - DEMOGRAFIA E ENVELHECIMENTO Durante muito tempo pensou-se que o envelhecimento da população era privilégio das sociedades desenvolvidas, mas sabe-se através dos dados demográficos que o problema é universal, no entanto, o impacto do aumento da proporção de idosos fazse notar mais nas sociedades desenvolvidas a partir da segunda metade do séc. XX em que o equilíbrio das gerações começa a ser alterado, ou seja, o ritmo de crescimento das pessoas idosas aumenta, enquanto que a população tem tendência a estabilizar os seus ritmos de crescimento e mesmo até a diminuir (Nazareth, 1999). O processo de envelhecimento baseia-se essencialmente em: “a) Espectacular desenvolvimento da ciência médica que permite assegurar um melhor estado de saúde e consequente descida das taxas de mortalidade; b) O desenvolvimento económico das sociedades; c) O aumento da qualidade de vida em geral, com melhores condições sociais, laborais e culturais; d) O aumento da esperança de vida” (Mateo 1996, p.147). O envelhecimento pode ser analisado sob duas grandes perspectivas: - individualmente, expressa-se através do aumento da esperança de vida dos indivíduos - demograficamente, traduz-se pelo aumento das pessoas idosas na população total, aumento esse relacionado pela diminuição da população jovem ou da população em idade activa (Instituto Nacional de Estatística, 2002). De acordo com Cónim (2005), associado a este acontecimento surge também o decréscimo da fecundidade humana a níveis insustentáveis para permitir a substituição das gerações, o que na ausência de fenómenos de origem demográfica (catástrofes naturais, epidemias, entre outros) conduz ao aumento da população idosa), sobre a qual vamos reflectir. Carrilho & Gonçalves (2004, p. 3) referem que “A população desencadeia o fenómeno do envelhecimento demográfico quando a sua dinâmica se caracteriza pelo aumento da importância das pessoas idosas no total da população”. De acordo com as mesmas autoras, o envelhecimento pode ocorrer no topo ou na base da pirâmide. As autoras referem ainda que ocorre pela base quando diminuem os efectivos idosos, mas em simultâneo diminuem ainda mais as outras faixas etárias, conduzindo a um aumento da população idosa no total da população; ocorre no topo da pirâmide quando o aumento da taxa de fecundidade é insuficiente para “travar” o envelhecimento. A análise demográfica permite prever com bastante clareza alguns cenários que se caracterizam pelo envelhecimento da população como um fenómeno que se faz acompanhar de várias dificuldades relacionadas com encargos sociais e económicos para as gerações futuras.Os últimos anos do século XX foram marcados na Europa e nos países industrializados por preocupações de natureza demográfica nomeadamente no que se refere ao envelhecimento e às respostas para o enfrentar, na tentativa de encontrar soluções e de prever a sua evolução futura. Pestana (2003, p.14) refere que os Governos Europeus têm desenvolvido esforços por facilitar a entrada de pessoas estrangeiras nas suas fronteiras, “… através de uma estratégia dos fluxos imigratórios que se pretende mais estratégica”. Este fluxo migratório embora demonstre um aumento significativo na mão-de-obra (pessoas que emigram para trabalhar noutros países) não altera expressivamente a tendência demográfica anteriormente descrita para os países europeus. Em Portugal, as alterações são idênticas às descritas anteriormente, podendo a estrutura demográfica ser observada na comparação das pirâmides de idades em 1960 e 2000 (Figura 1). Figura 1 - Pirâmide de idades, Portugal 1960 – 2000 Verifica-se também uma assimetria na distribuição em género, pois na maior parte dos países, as mulheres vivem mais anos que os homens. Dados da Organização das Nações Unidas (2002) revelam-nos que actualmente existem 328 milhões de mulheres com idade superior ou igual a 60 anos e apenas 265 milhões de homens. Esta discrepância acentua-se à medida que a população envelhece. Esta assimetria reflecte as diferentes esperanças de vida entre os sexos, justificada pela sobremortalidade masculina (Macedo, 2002). A esperança de vida à nascença no nosso País é de 80,3 anos para mulheres e de 73,5 anos para os homens (Direcção Geral da Saúde, 2004). Para Fernandes (1997), o envelhecimento demográfico não consiste apenas no aumento relativo das pessoas de 60 ou mais anos. Trata-se de um fenómeno de duplo envelhecimento, na base e no topo, com redução da mortalidade, aumento da esperança de vida, aumentando assim, os efectivos no topo da pirâmide. Com a redução da natalidade diminui o número de nascimentos, diminuindo os efectivos da base. Foi este declínio de fecundidade, associada a importantes modificações nos comportamentos sexuais e nas atitudes face à vida o principal factor natural responsável pelo actual desequilíbrio entre as gerações (Nazareth, 1999). Para Portugal, nos próximos anos, “a diminuição contínua do peso das gerações mais jovens será uma constante irreversível acentuando-se ainda mais o desequilíbrio quantitativo entre gerações e o consequente envelhecimento na base da pirâmide” (Nazareth 1999, p. 244). A resolução deste problema consistiria em contrariar a tendência do envelhecimento, por um lado, promover a fecundidade através de políticas demográficas eficazes, promovendo a maternidade e as condições de apoio às famílias e por outro lado, proporcionar a revitalização das estruturas demográficas envelhecidas (Fernandes, 1997). Segundo dados do Instituto Nacional de Estatística, entre 1960 e 2001 o fenómeno do envelhecimento demográfico traduziu-se por um decréscimo de cerca de 36% na população jovem e prevê-se que continuará a descer até 21% até 2050, segundo as projecções para a população mundial das Nações Unidas, e um aumento de 140% da população idosa. A proporção da população idosa, que representava 8,0% do total da população em 1960, mais que duplicou, passando para 16,4% em 2001 (Figura 2). Figura 2 - Evolução da população portuguesa jovem e idosa, 1960 - 2001 Em valores absolutos, a população idosa aumentou quase um milhão de indivíduos, passando de 708 570, em 1960, para 1 702 120, em 2001, dos quais 715 073 homens e 987 047 mulheres (Carrilho 2002). Outros dados, como as projecções do Departamento de Estatística da União Europeia, indicam que este número duplicará entre 2004 e 2025, atinjindo os 31,9%. Segundo estas projecções, em 2025, 22% da população terá com mais de 65 anos. Isto significa que em 2050 Portugal registrará um aumento de 58% na população com mais de 65 anos com respeito ao peso que esta parte da população tem na actualidade (Instituto Nacional de Estatistica, 2002). Acentua-se deste modo o envelhecimento demográfico e uma inversão das proporções da população jovem e a população idosa, registando-se um aumento (taxa anual de 2,3%) da população idosa em relação à população jovem e dentro da população idosa regista-se um aumento dos mais idosos em 5,1% (taxa média anual). Deste modo, o índice de envelhecimento passou de 68 idosos por 100 jovens em 1991 para 102 idosos em 2001. Até 2050, a população de todas as regiões envelhecerá, podendo mesmo situar-se nos 398 idosos por cada 100 jovens para qualquer dos cenários (Instituto Nacional de Estatística, 2004). Uma outra característica demográfica que se intensificou durante as últimas décadas do século XX foi a migração das zonas rurais para as urbanas. Os movimentos migratórios e a emigração levam a que haja diferenças entre as regiões em consequência das assimetrias sócio-económicas, verificando-se e de acordo com o Instituto Nacional de Estatistica (Portugal, 2002), o fenómeno do envelhecimento em Portugal não é homogéneo nos vários concelhos do país. Concluiu-se que o Norte detinha a mais baixa percentagem de idosos no continente, sendo o Alentejo, seguido do Algarve e do Centro detentores da maior percentagem de idosos. A faixa litoral evidenciava uma população menos envelhecida. Às Regiões Autónomas da Madeira e dos Açores pertenciam os menores índices de envelhecimento associados à maior taxa de fecundidade. Analisando a distribuição geográfica da população idosa, os mapas a seguir mostram a percentagem de população com 65 anos ou mais (Figura 3) e com 85 anos ou mais (Figura 4). Figura 3 - Percentagem da população com 65 anos ou mais Fonte: Instituto Nacional de Estatística (2002) Figura 4 - Percentagem da população com 85 anos ou mais Fonte: Instituto Nacional de Estatística (2002) Relativamente às condições sócio-económicas da população portuguesa com 65 anos ou mais, verificamos que é precisamente neste grupo etário que observamos as situações de maior severidade de pobreza e “…em que os níveis de privação decorrentes da escassez de recursos monetários são ainda mais elevados” (DecretoLei nº 232/2005). Em Portugal2, o Litoral e mais especificamente Aveiro (distrito do nosso estudo) sempre foi favorecido no que respeita à afluência da população, sobretudo a mais jovem pela procura de melhores oportunidades de emprego (Cunha, 2000). A década de 1970 marcou significativamente o acréscimo populacional, pois para além da forte atracção económica que o concelho representa, verificou-se também o retorno de emigrantes e de residentes nas ex-colónias portuguesas. Dados da mesma fonte, o envelhecimento demográfico da população no concelho de Aveiro regista um decréscimo da população jovem, de 1991 a 1998, de 10%, enquanto que no continente foi de 14%. Quanto à população idosa, residente no Concelho, tem vindo a aumentar (3,1% de 1991 para 1998), embora a ritmo menos acentuado que nos outros níveis geográficos. Dados mais recentes do INE (Portugal, 2005), apontam para um índice de envelhecimento em Portugal de 108,7% e em Aveiro o mesmo índice é de 92,4%. Da análise do Gráfico 1 podemos verificar um crescimento acentuado da população idosa ao longo dos últimos anos, com relação inversa ao crescimento da população jovem. Gráfico 1- População residente em Aveiro (idades <=14 anos e > a 65 anos) 2 In: http://portal.ua.pt/bibliotecad/default.asp?H1=2&H2=11&H3=1&H4=1&H5=0&num=608 16000 Nº de pessoas 14000 12000 10000 < 14 anos 8000 > 65 anos 6000 4000 2000 0 1991 2001 Ano 2004 Fonte: Instituto Nacional de Estatística As alterações sócio-demográficas do último século, que resultaram na modificação e, por vezes, inversão das pirâmides etárias, reflectindo o envelhecimento da população, vieram colocar aos governantes, às famílias e à sociedade em geral, desafios para os quais não estavam preparados. No capítulo que se segue definimos envelhecimento, velhice e idoso de forma a entendermos melhor esta problemática de demografia do envelhecimento. 2 - ENVELHECIMENTO, VELHICE, IDOSO – A ANÁLISE DE CONCEITOS A velhice não tem sido vista sempre do mesmo modo ao longo dos tempos, ainda nos dias de hoje, o seu conceito difere entre as várias culturas. “Muitas civilizações antigas com culturas de ouro (gold standart cultures) usavam jovens (guerreiros) na guerra e trabalhos pesados, reservando os idosos (senadores, etimologicamente senescentes) para funções de aconselhamento. Na cultura oriental a pessoa idosa simboliza sabedoria e experiência, é portadora de conhecimentos que vão sendo transmitidos às gerações seguintes, sendo um estádio da vida que todos esperam alcançar. Na sociedade ocidental, a velhice surge como um problema social, em que a pessoa idosa é alguém não produtivo, que perdeu as capacidades para o trabalho, para a vida social e caracterizado pela doença. Estes rótulos dão origem a atitudes, estereótipos e mitos da velhice, corroborando Fernandes (2002) quando afirma que existe uma visão negativa e preconceituosa acerca dos idosos, a qual se vai transmitindo, sobretudo às crianças e jovens, contribuindo para o não relacionamento intergeracional sendo fundamental para o desenvolvimento de valores universais e para a aprendizagem e formação dos indivíduos destes grupos etários. A velhice nem sempre é bem aceite pois ninguém gosta de envelhecer, de se tornar velho fisicamente pois vivemos numa sociedade que idolatra o corpo, a aparência física, a beleza. Segundo Lepecki (2001, pág. 9) “Assumimos o monstruoso dever de manter, por quantos anos de vida nos sejam dados, o vigor da juventude, esquecendonos de que para cada idade há o adequado vigor e a adequada beleza de corpo ou de alma”. Embarcamos no mito da juventude e tendemos a olhar a velhice como algo de negativo mas, mais importante do que nos preocuparmos com a longevidade devemos acentuar as nossas preocupações na qualidade de vida dos nossos idosos. Esta fase da vida pode ser encarada por muitos de uma forma positiva, significando uma oportunidade para desenvolver novas actividades ou interesses antigos, no entanto, quando se pretende continuar a ter um papel activo na sociedade, podem surgir algumas barreiras resultantes das representações colectivas que alimentam mitos dessa mesma velhice e das limitações a ela associadas. A velhice terá que ser compreendida na sua totalidade, enquanto processo complexo de envelhecimento, no qual existem padrões de ordem biológica, social, económica e cultural, agindo num sistema de relação Indivíduo, sociedade e meio ambiente, correspondente a toda a sua longa história de vida, determinado quer pelo seu património genético quer pelo seu património psico-social. O conceito de envelhecimento tem vindo a mudar de acordo com a evolução de conhecimentos e a cultura e relações sociais das várias épocas, sendo sempre preocupação e reflexão das sociedades. É a partir dos anos 80 que surgem publicações e investigações sobre esta problemática, prevendo-se que se prolongue ao longo de todo o século (Dubin, 2000). Assim, na segunda metade do século passado, emergiram dois conceitos fundamentais relacionados ao envelhecimento: o Envelhecimento Saudável e Envelhecimento Bem-sucedido. Estes conceitos prevaleceram até à década de 1990, altura em que o OMS introduz a noção de Envelhecimento Activo. Este último passa a assumir maior relevância a partir da Segunda Assembleia Mundial sobre o Envelhecimento, decorrida em Madrid, em 2002, a qual teve por objectivo definir normas sobre as políticas e os programas de melhoria da qualidade de vida das pessoas idosas. Envelhecimento não é doença, é um processo normal e variável podendo estar associados a vários factores tais como estilos de vida, alimentação e exercício. Tal como nos diz Serra (1999) a passagem dos anos traz consigo, gradualmente, o enfraquecimento muscular e o prejuízo de numerosas funções corporais e intelectuais. No entanto, nem todas as funções biológicas declinam ao mesmo tempo, assim, a heterogeneidade fisiológica é uma das características mais consistentes da população que chega a uma idade mais avançada. No entender de Costa (1998), envelhecimento trata-se de um processo comum a todos os seres vivos e que evoca um desenvolvimento contínuo, embora mais marcado durante as últimas fases da vida, culminando com a morte. Resulta da incapacidade da grande maioria dos organismos para se manter em estado funcional igual e inalterado, permitindo a regeneração contínua de todos os componentes do organismo à medida que se consomem e degradam. É também a incapacidade progressiva do organismo para se adaptar às condições variáveis do seu ambiente. No limite desta incapacidade ou quando determinadas modificações, consideradas normais, limitam a capacidade de auto-suficiência dos indivíduos para as suas actividades diárias e a sua capacidade de se relacionar intelectual e socialmente com os outros, poder-se-á falar em envelhecimento patológico. Processo de envelhecimento não é uma involução que leva ao isolamento, é sim um desenvolvimento que socializa. “Envelhecer é antes de mais uma arte…” (Nunes, 2005, p. 69). O envelhecimento não depende apenas de uma única causa, todas as causas que o determinam encontram-se relacionadas. Paúl (2005, p. 38) refere-se ao envelhecimento como um processo temporal cuja base genética e ambiental potencia de forma positiva ou negativa os resultados finais em relação ao modo como cada um envelhece. Também Squire (2005), Portugal (2004) e Berger (1995) defendem que o envelhecimento e a forma como decorre, dependem de vários factores. “Se é bem verdade que os determinantes individuais, biológicos, genéticos e psicológicos contribuem para a forma como o envelhecemos e para a ocorrência de doenças ao longo da vida, não podemos esquecer que o declínio das funções que se associa ao envelhecimento está intimamente relacionado com factores externos, comportamentais, ambientais e sociais” (Portugal, 2004, p.7). Nunes (2005) acrescenta a esta ideia que o estado de saúde da pessoa idosa emana como a soma de todas as situações que interferiram no seu percurso de vida desde a infância, o crescimento, a profissão, o rendimento, a escolaridade e o suporte familiar. Squire (2005) refere a este propósito que existe correlação positiva entre classe social e saúde, assim como com os recursos materiais que constituem importante influência na saúde. WHO (2000) corrobora esta ideia afirmando que a economia, os aspectos sócio-culturais e políticos influenciam o envelhecimento e são poderosos determinantes da saúde. Imaginário (2004) explica que para perceber o processo de envelhecimento é necessário compreender de forma holística os aspectos individuais e colectivos da vida. De acordo com Cordeiro (1999), e Pimentel (2001) o envelhecimento tem três componentes: - Processo de envelhecimento biológico, que resulta da vulnerabilidade crescente e de uma maior probabilidade de morrer, a que se chama senescência; - O envelhecimento social, relativo aos papéis sociais apropriados às expectativas da sociedade para este nível etário; - O envelhecimento psicológico, definido pela auto-regulação do individuo no campo de forças pelo tomar decisões e opções, adaptando-se ao processo de senescência e envelhecimento. Numa outra perspectiva, Berger (1995) considera os diferentes aspectos do envelhecimento em: - O envelhecimento físico – perda progressiva das capacidades do organismo para se renovar; - O envelhecimento psicológico – alteração dos processos sensoriais, cognitivos e afectivos do indivíduo; - O envelhecimento comportamental – modificações nos papéis e vida social do indivíduo reflectindo-se na sua personalidade; - Contexto social do envelhecimento – alteração da situação social, diz respeito, por exemplo, ao trabalho, ao rendimento económico, entre outros contextos. Estes quatro aspectos estão em constante interacção na vida de todas as pessoas idosas. Embora a influência de todos estes factores ainda nos nossos dias permaneçam em discussão, estamos cientes que o grupo dos idosos não pode nem deve ser considerado um grupo homogéneo, pois cada idoso tem uma identidade própria que devemos respeitar. Podemos, pois, afirmar que o envelhecimento, além de conter uma dimensão fisiológica, é um processo intrínseco vivenciado por cada ser humano de diferentes formas, dependendo da dimensão que nesse momento é percepcionada como a mais importante para a pessoa. Costa (1998) salienta que a pessoa que envelhece se constrói socialmente de diversas formas, consolidando valores, padrões de comportamento e costumes. Para Imaginário (2004), a diminuição da capacidade de adaptação do organismo às alterações do meio ambiente é o sinal mais evidente do envelhecimento e, aumenta com o avançar da idade. Jaques (2004) acrescenta que o ser humano evolui e vai modificando-se sendo a adaptação, em qualquer idade, a pedra de toque do sucesso biológico. Segundo Costa (2002), a forma como a pessoa idosa se comporta indica em que medida possui o desejo em se adaptar e modificar os seus comportamentos. No entanto, a economia, os aspectos sócio-culturais e políticos influenciam o envelhecimento e são poderosos determinantes da saúde WHO (2000). A complexidade dos factores que influenciam o envelhecimento permite-nos concluir que o processo de envelhecimento é, inquestionavelmente, um percurso único e singular. O processo de envelhecimento (compreendido desde o nascimento) constituirá o percurso identitário conducente a um estado de velhice que não se repete. As modificações induzidas pelo declínio da capacidade funcional dos órgãos vão-se reflectindo na pessoa. Netto e Ponte (2002) referem que os déficits da acuidade visual e auditiva são efectivas manifestações do processo de envelhecimento. Também a nível cerebral verificamos perda do peso e volume cerebral em cerca de 5 a 10 %, como nos indica Berger, (1995). Estas alterações justificam manifestações como a perda de memória, especialmente a curto prazo, mas não significam diminuição na capacidade cognitiva. Também a diminuição da capacidade adaptativa (Costa, 2002; Berger, 1995) surge como outra das repercussões do envelhecimento. É esta diminuição da capacidade adaptativa que torna a pessoa idosa mais susceptível e vulnerável ao processo patológico, aumentando nesta faixa etária, a prevalência de morbilidade e mortalidade (Squire, 2005; Portugal, 2004; Netto e Ponte, 2002; Costa, 2002; Berger, 1995). Netto e Ponte (2002) afirmam, inclusivamente, que a doença pode induzir alterações que, frequentemente, assumem contornos de maior gravidade e intensidade na pessoa idosa. Simultaneamente com as alterações fisiológicas podemos verificar alterações do olfacto e gosto, perda da acomodação ocular, diminuição da capacidade auditiva, diminuição da força muscular, aumento da pressão arterial, variações no peso corporal, modificações na estrutura e contornos corporais, modificações da pele e do sistema piloso. Por esta descrição, e segundo Berger (1995), podemos entender que no processo de envelhecimento são atingidos todos os sistemas do organismo e os efeitos dessas mudanças, dentro dos contextos ambientais específicos, modificam os comportamentos individuais. Trata-se no entanto, de processos normais e não de sinais de doença. Reconhecendo o envelhecimento como um processo, verificamos que o modo como este processo é vivenciado é único para cada pessoa e os seus efeitos díspares mesmo em indivíduos com a mesma idade biológica. Se por um lado será fácil reconhecer alguns dos aspectos próprios do envelhecimento, como as rugas, a diminuição das capacidades máximas de trabalho e resistência, por outro lado é de todo impossível atribui-los exclusivamente à velhice. A velhice não pode ser entendida com ideias preconcebidas, havendo assim necessidade de tentar clarificar o seu conceito. O processo de envelhecimento é um desenvolvimento que socializa,“Envelhecer é antes de mais uma arte…” (Nunes 2005, p. 69). Imaginário (2004) explica que para perceber o processo de envelhecimento é necessário compreender de forma holística os aspectos individuais e colectivos da vida. Para a mesma autora é também importante ter presente que as pessoas não envelhecem todas da mesma maneira. Nunes (2005) defende que este fenómeno impõe uma reflexão sobre temáticas importantes como, a qualidade de vida da pessoa idosa, o seu estatuto na sociedade, os meios de subsistência, idade de reforma, a solidariedade inter-geracional, entre outros. Também Santos (2003) nos mostra uma perspectiva interessante, referindo que o envelhecimento é diferente de velhice, dado que se o envelhecimento é um processo que começa assim que somos gerados e culmina na morte, a velhice ou os seus sinais e sintomas físicos e mentais só de manifestam de forma clara a partir de determinada idade. Costa (2002) apresenta o envelhecimento como um processo visto a 3 níveis. No primeiro nível, o envelhecimento é um processo biológico, segundo o qual o organismo existe no tempo e se altera fisicamente, resultando numa maior vulnerabilidade e probabilidade de morte. Num outro nível, mas intimamente ligado ao anterior, envelhecer é um processo “experiencial subjectivo” que se define como “ a auto regulação exercida através de decisões e escolhas para adaptação ao processo de senescência” (p. 37). A terceira perspectiva, a social, assenta no facto de que qualquer experiência é moldada pelo contexto social em que as pessoas se encontram. Netto & Ponte (2002) afirmam que este facto nos permite verificar que o envelhecimento produz efeitos diferentes de pessoa para pessoa. Squire (2005) acrescenta que o envelhecimento e a idade cronológica não estarão necessariamente relacionados. Nunes (2005, p. 67) sugere que “deveremos falar mesmo de várias idades, isto é, a idade cronológica, a idade biológica e a idade percepcionada pela pessoa”. Segundo esta autora, a idade cronológica não revela a dimensão biológica, física e psicológica do indivíduo. A idade biológica é também limitativa, pois o estado de saúde e autonomia influenciam pessoas de mesma idade de maneira diferente. A idade percepcionada pela pessoa será pois individual e subjectiva. É a idade que determina a velhice de uma forma mais simples. Paúl (1991) e Costa (1998) referem-se a quatro tipos de idades, podendo ser maiores ou menores do que a idade cronológica dos sujeitos: - a idade cronológica determinada pelo calendário, ou seja, pelo passar do tempo; - a idade biológica, medida pelas capacidades funcionais e vitais do organismo e pelo limite de vida dos sistemas orgânicos, que vão perdendo a sua capacidade adaptativa e de auto-regulação; - a idade social que se refere aos papeis e hábitos que o individuo assume na sociedade e na medida em que mostra os comportamentos esperados pela sua cultura num processo dinâmico de envelhecimento; - a idade psicológica que se refere ás capacidades comportamentais do individuo em se adaptar ao meio. É influenciada pelos factores biológicos e sociais mas envolve capacidades como a memória, a aprendizagem, a inteligência, as habilidades, os sentimentos, as motivações e as emoções, para exercer controlo comportamental ou auto-regulação. Berger (1995) refere que as alterações da idade nem sempre são previsíveis, e resultam não só do envelhecimento, mas também da doença, do meio envolvente e de certas características pessoais, assim como os estilos de vida constituem factores (o stress, a vida sedentária, o tabagismo, o alcoolismo, a obesidade, por exemplo) que poderão acelerar o processo de envelhecimento. O limite entre a normalidade e a patologia, ou entre um comportamento aceitável e inaceitável nunca é muito preciso. A idade não é o único factor que explica as dificuldades da pessoa que envelhece. Os efeitos do envelhecimento familiarizam-se assim, com a aprendizagem, o lazer, o tempo de trabalho, a oferta e a procura dos cuidados nas diferentes idades (Costa, 2002). De acordo com Rabin (2000), o envelhecimento tem de ser encarado numa perspectiva fisiológica em relação às mudanças que ocorrem no corpo, podendo existir diferentes idades fisiológicas em indivíduos com a mesma idade cronológica. É inegável que o envelhecimento se faz acompanhar de alterações orgânicas e funcionais graduais, precipitando as alterações psicológicas e sociais. No entanto, o avanço significativo na preservação e recuperação da parte biológica, não é igualmente acompanhado por medidas que mantenham a autonomia e capacidade funcional da pessoa idosa na sociedade. O conceito de envelhecimento bem sucedido surgiu na década de 60 e “…definia então quer um mecanismo de adaptação às condições específicas da velhice, quer a procura de um equilíbrio entre as capacidades do indivíduo e as exigências do ambiente” (Fonseca 2005, p. 281). O valor atribuído à independência, autonomia, saúde e estado funcional, reflectem motivos económicos, mais que motivos altruístas ou humanitários, falhando no reconhecimento da importância da interdependência e da subjectividade associada à percepção individual de um bom envelhecimento (Nolan, 2001). Por estas razões o conceito de envelhecimento bem-sucedido tem vindo progressivamente a ser abandonado em detrimento do de envelhecimento activo. A WHO3 (2002, p.12) criou o termo envelhecimento activo e definiu-o como “…o processo de optimização das oportunidades de saúde, participação e segurança, com o objectivo de melhorar a qualidade de vida à medida que as pessoas ficam mais velhas”. Este processo tem como objectivo aumentar a qualidade de vida, bem como a expectativa de uma vida saudável, para todas as pessoas que vão envelhecendo, independentemente das suas necessidades pessoais. Permite que as pessoas tenham a percepção do seu potencial para um bem-estar físico, social e mental ao longo da sua vida, a sua participação na sociedade e, oferece segurança, protecção e cuidados adequados, quando sejam necessários. O envelhecimento activo tem como princípios relevantes a interdependência e solidariedade entre gerações. De acordo com a WHO (2002, p.13), a sua abordagem centra-se “no reconhecimento dos direitos humanos das pessoas mais velhas e nos princípios de independência, participação, dignidade, assistência e auto-realização estabelecidos pela Organização das Nações Unidas”. Ou seja, reconhece o direito da pessoa mais velha à igualdade de oportunidades e tratamento em todos os aspectos da sua vida, durante o processo de envelhecimento, transferindo-lhes ao mesmo tempo a responsabilidade de participar em comunidade. O conceito de Envelhecimento Saudável não está muito documentado e é, por isso, pouco claro. Segundo Ramos (2003, p.794)4, o envelhecimento saudável resulta da “interacção multidimensional entre saúde física, saúde mental, independência na vida diária, integração social, suporte familiar e independência económica”. Esta perspectiva leva-nos a crer que este conceito aborda o envelhecimento de uma forma global, complexa e multifocal. Como refere a DGS (Portugal, 2004, p.3)5, “A promoção de um envelhecimento saudável diz respeito a múltiplos sectores, que envolvem nomeadamente a saúde, a educação, a segurança social e o trabalho, os aspectos económicos, a justiça, o planeamento e desenvolvimento rural e urbano, a habitação, os transportes, o turismo, 3 http://whqlibdoc.who.int/hq/2002/WHO_NMH_NPH_02.8.pdf In: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102311X2003000300011&lng=pt&nrm=iso 4 5 In: http://www.dgs.pt/upload/membro.id/ficheiros/i006346.pdf as novas tecnologias, a cultura e os valores que cada sociedade defende e que cada cidadão tem como seus”. Assim entendido, de acordo com Comissão Europeia para a II Assembleia Mundial sobre o Envelhecimento (2002)6, “…a preparação para um envelhecimento saudável começa com políticas e práticas de saúde pública que apoiem o bem-estar ao longo da vida. A promoção de um contexto político propício ao reforço da participação social, da prestação de cuidados, da realização pessoal e da dignidade dos idosos, favorece o envelhecimento saudável de homens e mulheres. A promoção de práticas de envelhecimento em actividade também poderá contribuir para esse objectivo”. Idoso, segundo a Diciopédia 99, é aquele que já viveu muito tempo, “tem muita idade, é velho”. Para Santos (2002) idoso representa a fase em que não se observam grandes alterações orgânicas, as modificações no modo de vida ocorrem em consequência da reforma e a pessoa sente-se capaz de satisfazer as suas necessidades. Na tentaviva de uniformizar critérios a OMS convencionou que idoso é todo o indivíduo com 65 e mais anos de idade, independentemente do seu estado de saúde e do sexo. As repercussões sociais, económicas, éticas, nos serviços de saúde e de acção social, obrigaram a repensar a definição de “velhice” e a estabelecer consensos em várias áreas, nomeadamente a adopção de estratégias adequadas para prolongar a vida e manter o bem-estar das pessoas idosas. Conhecer todos estes conceitos e identificar atempadamente alterações patológicas que possam surgir é uma competência dos profissionais de saúde, nomeadamente dos enfermeiros. A enfermagem dirige as suas intervenções no sentido da melhoria ou manutenção da actividade para proteger a autonomia e independência dos idosos. A enfermagem tem papéis determinantes para a qualidade de vida da população idosa ao nível da prestação de cuidados, do aconselhamento, da educação para a saúde, da coordenação de serviços de cuidados de saúde e da protecção (Tavares, 2002). 2.1 – CUIDAR O IDOSO Cuidar de idosos fez sempre parte das funções dos enfermeiros, muito embora a gerontologia fosse tida durante muito tempo como um sector onde se juntavam as 6 In:http://europa.eu.int/eurlex/lex/LexUriServ/LexUriServ.do?uri=CELEX:52002DC0143:PT:HTML enfermeiras de segunda categoria. Os primeiros documentos escritos sobre os cuidados a prestar aos idosos datam de 1909, não parando de crescer o interesse nesta área. No entanto, só na década de noventa, se inicia a reflexão sobre a dimensão expressiva do corpo como a totalidade, e sendo por isso ainda uma compreensão dos conceitos fluida, dispersa, fragmentada e de múltiplos sentidos (Lawler, 2001). Cuidar o idoso exige hoje respeito pelo ser humano como ser único, respeitando a liberdade do indivíduo para escolher os seus comportamentos, reconhecendo deste modo o indivíduo de uma forma global e holística e permite estabelecer as diferenças entre pessoas, prestando-lhe cuidados de uma forma mais individualizada e humanizante de acordo com as suas necessidades tão específicas para este grupo de indivíduos. Cuidar, ser cuidado, cuidar do outro ou de si próprio, “Quem, ao longo da sua vida, não conheceu cada um destes imperativos? Cuidar é, e será sempre, indispensável, não apenas à vida dos indivíduos mas à perenidade de todo o grupo social” (Colliére, 1989, p.15). O cuidado será, provavelmente, tão antigo como a existência da pessoa humana. A necessidade de cuidar e ser cuidado precede qualquer ofício e, até mesmo, uma profissão cientificamente organizada para o exercer (Collière, 1989). De acordo com o dicionário da Porto Editora on-line7 de língua portuguesa, cuidar deriva do latim cogitare – “pensar”, sendo definido como “aplicar a atenção a”, “tratar”, “interessar-se por”. Podemos dizer que o cuidar é uma característica inata ao ser humano; cuidar é o caminho primário para todo o ser no mundo e é a forma básica de estar na vida. Segundo Roach, todo o ser humano possui capacidades inatas que lhe permitem o cuidar (Waldon, 1995). Estas capacidades são designadas por Alberoni (1996) como impulsos que fazem parte da vida e possibilitam a vida. Deste modo, Roach afirma que a capacidade de cuidar está enraizada na natureza humana, considerando o cuidar/cuidado uma expressão da nossa humanidade e essencial para o nosso desenvolvimento e realização como seres humanos (Waldon, 1995), uma vez que “... desde que surge a vida que existem cuidados, porque é preciso ‘tomar conta’ da vida para que ela possa permanecer” (Collière 1989, p. 27). O cuidar e o cuidado para a enfermagem ao longo da sua história nem sempre tiveram a mesma importância. Vários factores são apontados como responsáveis na 7 In: http://www.infopedia.pt/default.jsp construção da imagem da profissão que abraçámos, ilustrando bem o ambiente onde nasceu, tendo como berço uma prática de caridade, feminilidade e obediência. Antes de Florence Nightingale, “...a enfermagem era um trabalho artesanal, uma arte manual, um voto religioso ao serviço do público”. Segundo Nóvoa, “... não era um serviço que exigia conhecimento (...) nem uma aprendizagem bem estabelecida (...) nem se organizava à volta de um saber” (Carvalho,1996, p. 41). Leininger compreende cuidar como “… acções e actividades com vistas a assistir, apoiar ou capacitar indivíduos ou grupos com necessidades evidentes ou antecipadas, a fim de melhorar a condição ou modo de vida humana ou para se defrontar com a morte” (Silva, 1997, p. 21) e cuidado como “… fenómeno abstracto e concreto, relacionado aos actos de assistência, de apoio ou de capacitação para ou por outros com necessidades evidentes ou antecipadas a fim de melhorar a condição ou modo de vida humana ou para se defrontar com a morte” (Silva, 1997, p. 21). Watson (2002, p. 55) considera que cuidar, “é o ideal moral da enfermagem, pelo que o seu objectivo é proteger, melhorar e preservar a dignidade humana. Cuidar envolve valores, vontade, um compromisso para o cuidar, conhecimentos, acções carinhosas e suas consequências”. Para Waldon, o cuidado é, neste contexto, o fenómeno resultante do processo de cuidar, sendo entendido como “…uma forma de vivência, de poder ser e de expressão, sendo uma postura ética (…), contribuindo com: o bem-estar geral, o desenvolvimento sustentável, a dignidade humana, a espiritualidade, a construção da história, a construção do conhecimento e a construção da vida” (Santos, 2001, p. 6). Na opinião de Hesbeen (2001, p.16), o cuidado é uma “…atenção positiva e construtiva prestada a alguém, com o objectivo de fazer algo por esse alguém ou com ele”. A Enfermagem, como profissão de ajuda, está intimamente ligada ao cuidar, procurando incessantemente ajudar o outro a viver e a fazer uso máximo das suas potencialidades, usando para isso o “...conhecimento, a alternância de ritmos, a paciência, a honestidade, a confiança, a humildade, a esperança e a coragem...” (Mayerhoff, 1990, p.25). Estes são, de acordo com o autor, os elementos básicos do cuidar. 2.1.1 – O cuidado de Enfermagem à pessoa Idosa O envelhecimento é hoje em dia uma realidade crescente e complexa, pela forma como a sociedade percepciona este fenómeno e pela forma como a própria pessoa idosa se auto-percepciona. Envelhecer como refere Imaginário (2004) é uma passagem para uma nova fase da vida da qual deve advir saúde, felicidade e uma atitude positiva podemos abordar esta temática com maior entusiasmo. Zimerman citado por Imaginário (2004, p. 43) afirma que “… a velhice não é uma doença, mas sim uma fase na qual o ser humano fica mais susceptível a doenças”. Esta susceptibilidade sugere a necessidade do cuidado à pessoa idosa, cuidado esse que pode advir de várias entidades da sociedade. O aumento de pessoas idosas poderia não constituir um problema social se tivéssemos uma outra forma de entender a velhice. Vários são os factores importantes relativamente aos fenómenos actuais do envelhecimento e dos cuidados aos idosos, como sendo as alterações da estrutura das relações familiares, a organização económica e social, a visão social do trabalho dos idosos, o desmoronamento do familismo tradicional. A dignidade e a qualidade de vida das pessoas idosas são um desafio para os enfermeiros como grupo social de maior vulnerabilidade, utilizando mecanismos destinados a promover e realçar a sua independência, participação, o autocuidado e autorealização. A enfermagem tem vindo a acompanhar tanto as preocupações com o envelhecimento humano, como o desenvolvimento técnico e científico, adoptando um conjunto de conhecimentos, baseados em investigações, necessários ao exercício da sua profissão de forma a clarificar o seu percurso em relação aos cuidados que prestam a um grupo populacional vulnerável (os idosos), com a finalidade de conseguir que a passagem para a velhice e os seus últimos anos, seja nas melhores condições de saúde e autonomia. Compete assim, ao enfermeiro, promover uma interacção harmoniosa entre o ambiente e o homem, fortalecer essas trocas e a integridade dos seres humanos, contribuindo assim, para a saúde e bem-estar do indivíduo. Só através da autonomia e dignidade adquiridas ao longo da vida, o idoso pode desfrutar da sua velhice de modo mais pleno. A especificidade dos cuidados possibilita uma prestação mais focalizada na pessoa idosa e depende de apurada sensibilidade, resultado de conhecimentos específicos e aptidões técnicas adquiridas pelo enfermeiro no campo da gerontologia (Caldas, 2000). A área da gerontologia encontra-se em franco desenvolvimento, dado que como já foi referido anteriormente, nos deparamos hoje em dia com uma população cada vez mais envelhecida. No entanto, observamos que a produção de conhecimento nesta área não acompanha a evolução do envelhecimento da população humana. Sendo o envelhecimento activo uma das grandes preocupações deste século, a intervenção da enfermagem torna-se indispensável, dado o seu papel importante na promoção da saúde, prevenção da doença e reabilitação. É essencial a investigação nesta área, como forma de dar à enfermagem bases científicas, que apoiem a sua prática e contribuam para melhorar a qualidade do cuidado, a qualidade de vida da pessoa idosa e a formação do(a) enfermeiro(a). Em Portugal e de acordo com um estudo realizado por Carreira & Costa (2005) sobre a produção do conhecimento científico em enfermagem gerontogeriátrica, verifica-se que apesar dos esforços desenvolvidos pelos(as) enfermeiros(as) portugueses, a investigação carece de maior investimento. As autoras referem que a maioria dos estudos têm como tema central o cuidado à pessoa idosa predominando a abordagem quantitativa, revelando que ainda há muitos assuntos a serem investigados, sobretudo no contexto de uma abordagem qualitativa. Gunter e Miller definem cuidado de enfermagem gerontológica como sendo “o estudo científico do cuidado de enfermagem ao idoso, caracterizado como ciência aplicada com o propósito de utilizar os conhecimentos do processo de envelhecimento, para o planeamento da assistência de enfermagem e dos serviços que melhor atendam à promoção da saúde, à longevidade, à independência e ao nível mais alto possível de funcionamento da pessoa idosa” (Duarte, 2002, p. 223). O cuidado à pessoa idosa exige a preparação dos profissionais para todas as eventualidade, pois, como refere Berger (1995, p.13), “a gerontologia apresenta múltiplas facetas (…) os cuidados em gerontologia são simultaneamente preventivos, curativos, paliativos e estão ligados à cronicidade e à saúde mental. Tanto são cuidados básicos com cuidados especializados”. É por este motivo que vários autores (Costa, 2002; Duarte, 2002; Ermida, 1999; Stevenson, 1997) afirmam a necessidade e inter e multidisciplinaridade na abordagem à pessoa idosa. Quando perspectivamos cuidados de saúde à pessoa idosa no seio da equipa multidisciplinar, devemos ter por objectivo comum a qualidade de vida da pessoa idosa. A promoção da saúde deve substituir o ideal da cura, incluindo o cuidar a redução dos factores de risco (Caldas, 2000). Neste sentido, a assistência de enfermagem gerontológica tem por objectivo: - Assistir integralmente ao idoso, à sua família e à comunidade na qual estiver inserido, auxiliando sua compreensão e facilitando sua adaptação às mudanças decorrentes do processo de envelhecimento: - Desenvolver acções educativas nos níveis primário, secundário e terciário de atenção à saúde do idoso; - Estimular a participação activa do idoso e, quando necessário, de seus familiares, em seu processo de auto cuidado, tornando-o (s), desta forma, os principais responsáveis pela manutenção de seu melhor nível de saúde e bem estar (Duarte, 2002, p. 224). Os cuidados a prestar aos idosos englobam inúmeras dificuldades. O corpo é muitas vezes concebido pelos enfermeiros na sua condição humana primária de corpo físico, dimensão anatómica e como tal precário, vulnerável e de equilíbrio instável (Teixeira & Lopes, 2002). É uma tarefa difícil e complexa, exigindo uma compreensão da realidade multifactorial do envelhecimento e do contexto político, económico e familiar que a ele está ligado. Para isso, devem estar conscientes da concepção que têm acerca do envelhecimento e da influência que esta exerce sobre os seus actos. Robertson (1991), citada por Costa (1998), referiu que o gosto dos Enfermeiros em trabalhar com pessoas mais idosas advinha de factores relacionados com a formação inicial e pela experiência agradável pelo trabalho, realçando a autonomia e independência das funções exercidas. Almeida (1998), num estudo conclui que os enfermeiros mantêm estereótipos sobre o envelhecimento e sobre o idoso com influência nas práticas dos cuidados. No entanto, mais do que em qualquer outro ramo de actividade, os enfermeiros estão lado a lado com os idosos que não estão só fisicamente doentes como têm dificuldades pessoais, familiares ou sociais, solidão e muitos outros aspectos. Neste contexto a comunicação torna-se, portanto, um instrumento indispensável para todos de modo a que o trabalho seja eficaz. O papel dos enfermeiros nos cuidados gerontogeriátricos constitui um desafio que lhes exige mudanças de mentalidade, de comportamento, do saber e do saber fazer. Necessitam de perceber a importância de ajudarem as pessoas idosas e sentirem-se realizadas, úteis e com significado nas suas vidas, em oposição à mera existência. No processo de cuidados ao idoso, o enfermeiro estabelece com este e família uma relação de ajuda, vertente do cuidar, permitindo-lhe uma forma de viver e bem-estar mais plena. A relação de ajuda vai para além da aplicação de técnicas e conhecimentos, pressupõe uma concepção unificada da pessoa, da ajuda, da maneira de fazer e de ser. Requer ainda por parte do enfermeiro conhecimento pessoal (crenças, valores, experiências passadas e teórico sobre os quais apoia as suas observações) o sentido que lhes dá em intervenções que decide aplicar. O enfermeiro leva a pessoa idosa a descobrir as suas potencialidades os seus recursos, dando-lhes a oportunidade de utilização conforme a sua escolha. Assim o enfermeiro avalia correctamente o nível de autonomia ou independência do idoso, as suas necessidades fundamentais, escuta as suas palavras e atende às suas escolhas de modo a que os seus cuidados sejam cuidados personalizados e globalizantes. É importante que estabeleça com as pessoas que têm necessidade de ajuda relações de qualidade de tal maneira que permita ao indivíduo expressar-se abertamente sem ter medo de ser julgado ou rejeitado. Para Berger (1995) a relação de ajuda visa sobretudo satisfazer as necessidades superiores (auto-estima e auto-regulação), promover o conforto psicológico e dar apoio necessário para nos confrontarmos com as dificuldades existentes. O cuidado de enfermagem ao idoso apresenta-se como um serviço à Comunidade especializando-se nos cuidados às pessoas que envelhecem independentemente da idade e saúde, com a finalidade de conseguir que a passagem do adulto à velhice e a sua vida nos últimos anos, seja nas melhores condições de saúde e de autonomia. Para identificar problemas da prática de cuidados “o grupo de Enfermeiros da unidade com idosos constrói-se, define-se, vive os cuidados que presta, para ver de forma diferente” (Costa, 1998, p.136). Cita ainda que “significativa é a informalidade com que o fazem e o prazer que nela colocam, como construção do que fazem”. Como diz (Caldas, 2000) a especificidade do cuidado possibilita uma prestação mais focalizada na pessoa idosa e depende de apurada sensibilidade, resultado de conhecimentos específicos e aptidões técnicas adquiridas pelo enfermeiro no campo da gerontologia. O enfermeiro, desta forma pode contribuir para uma mudança saudável de estilos de vida, reduzir o aparecimento de determinadas doenças e incapacidades, e diminuir a carga social que elas comportam através de educação para a saúde. A polivalência cada vez maior da prática de enfermagem torna a educação para a saúde ao idoso o instrumento básico e eficaz ao serviço dos indivíduos e da comunidade, porque “educar” também é “cuidar”. Educar os idosos, torna-se hoje o objecto principal dos nossos cuidados, porque a saúde é o recurso pessoal mais importante para uma vida de qualidade e há que preservar as competências físicas e mentais dos idosos garantindo-lhes a sua autonomia e independência. Numerosos estudos provam que a pessoa idosa tem capacidades que lhe permitem aprender o que contraria os preconceitos e os mitos existentes em torno desta questão. Ermida (1999) refere que em Portugal o idoso é tratado, na maior parte das situações e a nível quer dos cuidados hospitalares, quer dos cuidados primários, de modo fragmentado e ignorante da visão interdisciplinar exigida pela sua complexidade biopsico-social. Esta situação poderá resultar, conforme Costa (2002), em Portugal, a geriatria e gerontologia constituírem formação opcional para os profissionais de saúde. Na enfermagem, a formação nesta área “ insere-se numa perspectiva de cuidados de saúde primários. Aqui começa a periferização do saber geriátrico” (Costa, 2002, p. 50). Corroborando Caldas (2000, p. 2) “embora o método e as técnicas de enfermagem não sejam diferentes para a enfermagem gerontogeriátrica, existe uma especificidade demonstrada através do conhecimento das teorias do envelhecimento, do processo de envelhecimento normal e patológico e de todo o conjunto de conhecimentos necessários à prática da gerontologia”. Costa (2002, p. 51) acrescenta que “o cuidado de enfermagem geriátrico, como prática profissional específica e saber reconhecido (competências), engloba aspectos essenciais do sujeito que cuida (biografia e socialização), da ergonomia (situação e interacção profissional no contexto de trabalho) e da formação profissional (situação de formação) ”. Os idosos do século XXI são diferentes dos idosos de gerações mais antigas, têm um nível de instrução mais elevado e mais saúde, vivem mais anos, sendo importante que os vivam com mais qualidade. É inegável que o envelhecimento se faz acompanhar de alterações orgânicas e funcionais graduais, desencadeando as alterações psicológicas e sociais. Assim, a sociedade deve adoptar novos estilos de vida e novos padrões de consumo e de oferta adaptados à nova realidade existente. 2.2 - POLÍTICAS DE SAÚDE PARA A TERCEIRA IDADE As grandes preocupações com os idosos neste início do século não se limitam apenas à doença, existem outras situações mais problemáticas, como sendo a solidão, os contactos familiares e sociais, a carência de recursos económicos e recursos sociais, assim como a perda de autonomia que continuam a preocupar todo o sistema de cuidados. É com a Constituição de 1933 que se verificaram os primeiros avanços em termos de políticas de previdência social. No entanto, o regime de protecção social surge apenas associado aos trabalhadores assalariados, negligenciando uma grande parte da população. Simões (2004) acrescenta que apenas uma pequena percentagem de trabalhadores era abrangido por seguros sociais: cerca de 6,3% dos trabalhadores em 1942. Em 1946 foi criada a Federação das Caixas de Previdência que centralizou serviços até aí dispersos por vários sindicatos. Ainda segundo o autor supracitado (p. 135, 136) “em 1960, mais de metade dos homens com 65 anos ou mais ainda vivia do seu trabalho, situação que praticamente se inverte em 1981, onde já quase toda esta população tem acesso a pensão de reforma”, o número de pessoas idosas não pára de aumentar e as taxas de actividade de diminuir. O direito à Segurança Social mantém-se inscrito na Constituição da República Portuguesa após a última revisão em 1992. Ficaram assim, criadas condições para o aparecimento e desenvolvimento de bens dirigidos aos idosos, orientados por políticas sociais específicas em que o Estado não tem forçosamente de ser um prestador directo, mas sim garante da prestação desses serviços e um regulador das respectivas actividades (Simões, 2004). Segundo Fernandes (1997), Portugal não sentia, até à década de 70, os efeitos do envelhecimento demográfico, não constituindo preocupação social. Nesta altura, período conturbado na história do país pela Revolução de 25 de Abril de 1974, pôs fim a um regime totalitário que tinha estagnado o país social e economicamente durante vários anos. Foi neste instável contexto político que os governos são chamados a criar novas instituições e a desenvolver novas políticas sociais (Simões, 2004). Quando o primeiro Plano de Acção Internacional sobre o Envelhecimento foi adoptado em Viena (1982), teve como principal objectivo constituir-se a base das políticas públicas, através das directrizes e dos princípios gerais para enfrentar o desafio do envelhecimento8. Duas décadas depois surge a II Assembleia Mundial sobre o Envelhecimento (2002) onde foram assumidos assumidos pela Organização das 8 In: http://www.abep.nepo.unicamp.br/docs/anais/pdf/2002/Com_ENV_PO4_Fonte_texto.pdf Nações Unidas (ONU) dois documentos que enquadram as políticas para o envelhecimento nos próximos anos – o Plano Internacional de Acção para o Envelhecimento e a Estratégia Regional para a sua Implementação. O conceito de “Sociedade para todas as Idades”, tema principal da mesma Assembleia, foi o desafio lançado pela ONU aos governos de todo o mundo, comprometendo-se os mesmos a assegurar a plena protecção e promoção dos direitos humanos e liberdades fundamentais da pessoa idosa. O modelo adoptado no final dos anos 909, Envelhecimento Activo, que é o processo de optimização das condições de saúde, participação, segurança e qualidade de vida à medida que as pessoas vão envelhecendo, gerou um movimento global e uma mudança decisiva no planeamento estratégico de medidas e políticas dos vários países participantes. No entanto, para que este processo de envelhecimento decorra é importante assegurar a existência de uma responsabilidade individual, na manutenção de estilos de vida saudáveis e uma responsabilidade colectiva e articulada dos vários sectores políticos10. A Europa aderindo desde logo a este movimento e, na Vigésima Terceira Cimeira Económica Ocidental (1997)11, da Comissão das Comunidades Europeias, no âmbito da temática do envelhecimento demográfico – oportunidades e riscos, considerou as alterações políticas inerentes ao regime de trabalho, reduzindo os obstáculos ao exercício de uma actividade profissional, à flexibilidade do emprego e ao trabalho em tempo parcial, como um dos caminhos para promover o envelhecimento activo. Aderiu12 também ao conceito de construção de “Uma Europa para todas as Idades”, propondo estratégias que integrem medidas políticas eficazes dirigidas aos gruposalvo: deficiência e envelhecimento. Segundo a Direcção-Geral da Segurança Social, da Família e da Criança (Portugal, DGSSFC, 2005)13, o sector da Segurança Social tem um papel de relevo na promoção do envelhecimento activo, isto porque, acompanha a pessoa ao longo da sua existência. Assegura um conjunto de prestações específicas às pessoas idosas no sentido de garantir os seus rendimentos com vista à melhoria da sua qualidade de 9 In: http://whqlibdoc.who.int/hq/2002/WHO_NMH_NPH_02.8.pdf Direcção-Geral da Segurança Social, da Família e da Criança In: Revista Pretextos – Envelhecer; Lisboa 2004. ISSN 0874-9698 11 In: europa.eu.int/abc/doc/off/bull/pt/9707/p000519.htm 12 In: http://europa.eu.int/scadplus/leg/pt/cha/c11308.htm 13 In: Revista Pretextos 10 vida. A Lei nº 32/2002 – Lei de Bases da Segurança Social (Portugal, 2002) permite aos pensionistas de invalidez e de velhice, acumular as pensões com rendimentos de trabalho se desenvolverem uma actividade profissional. No que respeita à acção social, segundo a DGSSFC (Portugal, 2005), tem-se vindo a promover o desenvolvimento de uma rede de serviços e equipamentos sociais, que se encontram próximos dos que deles necessitam com o objectivo de manter as pessoas no seu meio de vida comum. Como alternativa à institucionalização, ao isolamento, solidão e insegurança, foram criados: o serviço de apoio domiciliário, o Centro de Dia, o Centro de Convívio e mais recentemente o Centro de Noite14. Em relação à saúde, em Portugal têm sido desenvolvidas políticas dirigidas às pessoas idosas quer de natureza preventiva quer de natureza reparadora. Neste contexto, foi aprovado o Programa Nacional Para a Saúde das Pessoas Idosas15 (Circular Normativa nº 13/ DGCG/ 2/7/2004 da DGS, Portugal), que visa atingir o objectivo preconizado pela OMS, de um envelhecimento activo e saudável. Este programa destina-se a ser implementado pelos profissionais dos Centros de Saúde, dos Centros Hospitalares e da Rede de Cuidados Continuados, tendo sido esta última criada em 2003 através do Decreto-lei nº 281 de 8 de Novembro. De acordo com a DGS (Portugal, 2004, p. 2), este programa visa essencialmente “obter ganhos de saúde, nomeadamente em anos de vida com independência e melhorem as práticas profissionais no âmbito das especificidades do envelhecimento”. O Plano Nacional de Saúde 2004-2010 (Portugal, 2004), que integra o programa supracitado, realça os cuidados inadequados às pessoas idosas que actualmente são notórios no nosso país, entre eles: - Ao nível dos cuidados de saúde primários não se faz um rastreio suficiente dos factores de fragilidade nos idosos; - Os cuidados de saúde, a todos os níveis, não estão organizados e são prestados por pessoal com insuficiente formação específica (no que respeita a cuidadores formais e informais); - Falta de planeamento de actividades alternativas para aqueles que saem do mercado do trabalho, levando ao isolamento, perda de relações sociais (podendo levar à depressão e ao suicídio); 14 In:http://www.portugal.gov.pt/Portal/PT/Governos/Governos_Constitucionais/GC15/Ministerios/MSST/ Comunicacao/Outros_Documentos/20040219_MSST_Doc_Novas_Respostas_Sociais.htm 15 In: http://www.dgs.pt/upload/membro.id/ficheiros/i006346.pdf -Retirada de autonomia aos idosos, projectando-os para o sedentarismo, muitas vezes “acamados” e “sentados” ao longo dos dias da sua vida. São assim criadas orientações estratégicas e intervenções, através do Plano Nacional de Saúde, no sentido de adequar os cuidados de saúde às necessidades das pessoas idosas, actuando de forma a maximizar a sua autonomia. No que respeita à doença, a população idosa é hoje a maior consumidora de cuidados de saúde, quer a nível ambulatório, quer a nível hospitalar, com maior duração média de internamentos, bem como o maior número de consultas. As necessidades crescentes em cuidados de saúde adequados à especificidade do envelhecimento determinam a caracterização das respostas cada vez mais globais eficazes e humanizadas que tenham em conta uma melhor organização e eficiência dos recursos existentes. Por isso, urge definir princípios que não sendo limitativos de acções inovadoras e específicos da actuação dos serviços e profissionais, num determinado contexto, orientem para cuidados humanistas, solidários e em equipa, proporcionando a interdisciplinaridade e fomentando o estabelecimento de redes Institucionais. No ano de 1998 foram criadas as orientações reguladoras da intervenção articulada do apoio social e dos cuidados continuados dirigidos às pessoas em situação de dependência (Despacho nº 407/98). Este despacho foi o resultado do trabalho levado a cabo pelo grupo de trabalho conjunto das Direcções-Gerais da Saúde e da Acção Social (Despacho de 5 de junho de 1996. Diário da República, 2ª série, nº 148). Posteriormente, no ano 2002 através da Resolução do Conselho de Ministros (nº 59/2002. Diário da República nº 69 de 22-5-2002) é definida a Rede Nacional de cuidados continuados integrados para desenvolver respostas integradas de cuidados de saúde e de apoio social e no ano de 2003, através do Decreto-Lei nº 281/2003 do Ministério da Saúde (Diário da República nº 259 de 8-11-2003) é reformulada a Rede de prestação de serviços de cuidados continuados no âmbito do sector saúde. Embora os enormes progressos das ciências da saúde, nas últimas décadas, tenham tido um papel preponderante no aumento da longevidade, a realidade portuguesa fica ainda aquém dos padrões médios europeus sendo acompanhada de situações de fragilidade e de incapacidade, frequentemente relacionadas com situações susceptíveis de prevenção. Aumentará nas próximas décadas o número de pessoas idosas que necessitarão de cuidados integrados de saúde e de apoio social, assim como o número de pessoas portadoras de doença crónica. Sendo assim, levará ao aumento da procura, por este grupo etário, de cuidados de saúde e de apoio social, aumentando de igual forma a utilização dos recursos dos hospitais. Neste contexto, os cuidados de saúde em geral e os cuidados continuados integrados, de modo especial, terão que dar resposta adequada a uma sociedade a envelhecer e com elevado potencial incapacitante. Esta tendência, com avultados encargos, só poderá ser contrariada com a prevenção da incapacidade e estimulação da autonomia e da independência do idoso (Campos, 2001). Neste âmbito do apoio e cuidados às Pessoas Idosas e às Pessoas o Governo criou metas que consistem na definição de políticas de saúde integradas no Plano Nacional de Saúde, as quais deverão permitir: - desenvolver acções mais próximas dos cidadãos idosos e das pessoas em situação de dependência; - promover, de forma adequada e com equidade, na sua distribuição territorial, a possibilidade de uma vida mais autónoma e de maior qualidade; - humanizar os cuidados; - potenciar os recursos locais; - ajustar-se à diversidade que caracteriza o envelhecimento individual e à perda de funcionalidade. O Programa Nacional para a Saúde das Pessoas Idosas reflecte a preocupação sentida pelo sector da Saúde em garantir a todos os cidadãos um envelhecimento com saúde, autonomia e independência tendo como objectivo geral obter ganhos em anos de vida com independência e assenta em três pilares fundamentais: - Promoção de um envelhecimento activo, ao longo da vida; - Maior adequação dos cuidados de saúde às necessidades específicas das pessoas idosas; - Promoção e desenvolvimento intersectorial de ambientes capacitadores da autonomia e independência das pessoas idosas (Direcção Geral da Saúde, 2004). Perante tudo o que foi dito, o que fazer? Reconhecendo os mais velhos como os grandes protagonistas deste novo caminho, estimulando-os a fazer mais, ser mais e crescer mais, criar redes de apoio aos idosos, formais e informais através de melhoria e promoção dos serviços de âmbito comunitário com equipas de multidisciplinares, tendo como objectivo potencializar o autocuidado, promover o envolvimento da família, melhorar o controlo da doença, a prevenção de complicações e redução da mortalidade. Abordamos de seguida a doença Diabetes Mellitus como parte relevante do nosso estudo. CAPÍTULO II - DIABETES MELLITUS 1 - A DOENÇA DIABETES MELLITUS “ A diabetes é uma doença invulgar e integrante. Os doentes sofrem uma sede insaciável mas urinam ainda mais do que bebem. Isto, porque a carne e os membros se fundem e desfazem em urina. A emaciação cedo se torna severa e a morte sobrevém rapidamente após uma vida dolorosa e miserável” (Areteo de Capadócia, II a.D). Remonta ao ano 1550 A.C., a descrição da doença caracterizada por fluxo urinário, documentada abundante num papiro egípcio descoberto durante escavações arqueológicas num túmulo em Tebas em 1862. No século II D.C., um médico grego, Areteo, utilizou pela primeira vez a palavra diabetes, que em grego significa sifão ou ser atravessado por água, assim, no século II antes de Cristo, Demétrio de Apamea deu-lhe o nome e Apolónio de Mênfis definiu-a como uma doença “do corpo como aqueduto” percorrido por abundante água entrada pela boca e saída como urina. Cerca de quatro séculos depois é que a caracterização da diabetes foi definida por Areteo de Capadócia como poliúria, polidipsia e emagrecimento progredindo para a morte. A medicina Indiana numa linha histórica independente anterior à Era Cristã identificou a doença: sede, fadiga, poliúria. No século XVI, um médico suíço verificou a existência de uma substância anómala na urina, que após a evaporação se transformava num pó branco, e que erradamente interpretou como sendo sal. Este estaria depositado nos rins e provocaria ”sede renal” (Duarte, 1997). Para a medicina Europeia, a descoberta da melitúria deve-se a Thomas Willis no Século XVII que numa visita domiciliária a uma diabética reparou num rego de formigas dirigido para o bacio de urina. Mergulhou o dedo e provou, verificando ser doce e pegajosa. Comunicou à Real Academia de Ciências Britânicas e daí em diante fazia-se o diagnóstico provando a urina. Um século mais tarde W.Cullen identifica um síndrome como urina insípida, começando a usar-se o nome “mellitus” que significa “loca”. Em meados do século XIX dois nomes ressaltam no domínio da diabetes, Claude Bernard (1813-1878) e Apollinaire Bouchardat (1806-1886). Bouchardat foi designado o primeiro diabetologista. Chegou à conclusão que a dieta de restrição de hidrocarbonatos é individualizada e levada até à pesquisa negativa da glicosúria matinal, individualizou o tratamento e dele responsabilizou o diabético. Descobriu também o valor do exercício físico dizendo ele aos seus doentes “o diabético tem de ganhar o pão que come com suor do seu rosto…”. Educava os seus diabéticos num autocontrolo de uma dieta de restrições de hidrocarbonos, comendo o menos possível e fazendo exercício físico. Foi o fundador da Clínica Pedagógica, hoje generalizadamente aceite como a única forma legítima de tratar diabéticos. A diabetes, conhecida desde a antiguidade egípcia, entrou no final do século XIX em plena época experimental-científica. Em 1921 foi descoberta a insulina permitindo que os diabéticos Tipo 1 sobrevivessem à doença. Desde os conhecimentos passados, muito se avançou no esclarecimento da etiopatogenia e na descoberta de novas terapêuticas e possibilidades de vigilância. Estas medidas demonstraram a sua eficácia. O século XX terminou sob a ameaça da pandemia da diabetes Tipo 2 (Duarte, 1997). A diabetes é uma doença metabólica que afecta um grande número de pessoas. Pela sua cronicidade e morbilidade elevada, implica um elevado investimento em cuidados de saúde constantes e consequentemente em elevados custos humanos, económicos e sociais, tornando-se desta forma num dos maiores problemas de saúde a nível mundial. Neste contexto, vários esforços têm sido mobilizados por governos e comunidades científicas de modo a impedir o crescimento desta doença, considerada já uma pandemia do século. A diabetes mellitus manifesta-se por uma desordem metabólica de etiologia múltipla com destruição das células-beta do pâncreas que tem como função disponibilizar a glicose às células com consequente insensibilidade ou deficiência de insulina. É caracterizada por uma hiperglicemia crónica com distúrbios no metabolismo dos hidratos de carbono, lípidos e proteínas, resultantes de deficiências na secreção ou acção da insulina, ou de ambas. Muitas vezes os sintomas clássicos como perda de peso, polidipsia, poliúria e polifagia estão ausentes, no entanto, poderá existir hiperglicemia em grau suficiente para causar alterações funcionais ou patológicas por um longo período, antes do estabelecimento do diagnóstico (American Diabetes Association, 2006 - ADA). A diabetes mellitus é uma doença característica dos países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento. Estima-se que 10% dos gastos globais em saúde sejam utilizados no tratamento de complicações da diabetes como sendo a cegueira, doenças cardiovasculares, doença renal crónica, amputações dos membros inferiores e a elevada mortalidade que não têm preço (Ministério da Saúde, 2002). Estes custos traduzem-se na diminuição da produtividade do indivíduo por incapacidade temporária ou definitiva. A sua prevalência é difícil de calcular, na medida a ser uma doença muitas vezes assintomática e o número de casos de uma população conhecidos não corresponder à prevalência real da doença. Só na Europa, o número de pessoas atingidas por esta doença ronda os 30 milhões (Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal 2001; Duarte, 1997). A situação portuguesa revela-se igualmente preocupante. Embora no nosso país a informação sobre a taxa de incidência e prevalência seja ainda escassa, dados do Instituto Nacional de Saúde, apontam para uma prevalência de 4,7%, correspondendo a cerca de 500 mil diabéticos (Duarte, 1997; Ministério da saúde, 1995; Silva & Ribeiro, 2000). A Incidência da diabetes mellitus tem vindo a aumentar, acompanhando a industrialização das sociedades e o envelhecimento da população. A sua incidência e prevalência aumentam com a idade, estando na sua etiopatogenia factores genéticos, sedentarismo, hábitos de vida e alimentares errados. De salientar que, de acordo com dados estatísticos oficiais, as taxas de mortalidade por diabetes mellitus padronizadas pela idade tem vindo a aumentar. O Gráfico 2 ilustra o número de óbitos por diabetes mellitus nos últimos três meses do ano 2002, verificando-se que este trágico acontecimento continua a aumentar. Gráfico 2 - Óbitos por Diabetes Méllitus 440 500 450 400 350 300 250 200 150 100 50 0 374 333 Outubro Novembro Dezembro Fonte: Tribuna médica, Julho de 2003 Um estudo realizado com a colaboração dos Médicos Sentinela permitiu obter dados mais concretos sobre a incidência da diabetes mellitus no nosso país. Na população inscrita, verificou-se uma taxa de incidência, entre 1992-1999, de 270,3 por 100.000 habitantes. O grupo etário dos 65 a 74 anos é o que apresenta uma taxa mais elevada, independentemente dos sexos. Segundo este estudo, o diagnóstico da doença foi feito ocasionalmente em 63,5% dos casos tendo, apenas 33,2% dos casos apresentados sintomas ou sinais suspeitos. Dos casos identificados, 2,4% eram diabéticos Tipo 1 e 97,6% eram Tipo 2. Apenas se registaram diferenças significativas entre os sexos nos doentes com diabetes Tipo 2. Os autores verificaram também, que os diabéticos Tipo 1 foram mais vezes hospitalizados que os Tipo 2 e que o diagnóstico dos diabéticos Tipo 1 foi essencialmente efectuado com base em sintomas e sinais suspeitos, enquanto que nos outros diabéticos foi resultado de um achado ocasional. Estima-se, também, uma média anual de 26.810 novos casos por ano, 643 Tipo 1 e 26.167 Tipo 2 (Falcão et al., 2001). A longo prazo e segundo a American Diabetes Association (2006) implica grandes danos: disfunção e falência de vários órgãos, progredindo para complicações macrovasculares, retinopatia, nefropatia levando a insuficiência renal, neuropatia periférica com riscos de úlceras nos pés, amputações entre outras. Em casos mais graves pode desenvolver-se cetoacidose, ou um estado hiperosmolar não-cetónico que pode conduzir ao coma e, na ausência de tratamento adequado, à morte. De salientar que, antes do estabelecimento da hiperglicemia crónica que acompanha o quadro clínico clássico da diabetes, passa por um estágio de distúrbios do metabolismo da glicose, caracterizado por valores glicémicos situados entre a normalidade e a faixa diabética (Aiviertcan Diabetes Associaton – ADA -, 2004). As complicações que podem advir da diabates mellitus incluem as complicações agudas e crónicas. Dentro das complicações agudas, encontram-se a cetoacidose diabética (CAD), e o coma hiperosmolar não cetonico (CHNC) podendo ter complicações muito graves se não tratadas a tempo. Em relação às complicações crónicas surgem as alterações ateroescleróticas: complicações microvasculares (lesões dos pequenos vasos sanguíneos - retinopatia, nefropatia e neuropatia), complicações macrovasculares (lesões dos grandes vasos sanguíneos - doença coronária, cerebral, dos membros inferiores e hipertensão arterial), complicações neuro, macro e microvasculares (Pé Diabético e outras complicações como disfunção sexual e infecções) (Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal, 2001, p.100). Perante este panorama, a diabetes surge como alvo de Prevenção Primária Integrada, exigindo um melhor conhecimento da doença. Assim, para melhor conhecimento da doença, continuamos o seu estudo com o seu conceito e epidemiologia. 1.1 - DEFINIÇÃO, CLASSIFICAÇÃO E CRITÉRIOS DE DIAGNÓSTICO Diversas tentativas de classificar a diabetes mellitus têm sido propostas baseadas no Indíce de Massa Corporal, na idade, etiologia, evolução e no tratamento indicado. Devido ao avanço tecnológico e novos conhecimentos científicos sobre a patologia das várias categorias da diabetes, tanto o Expert Committee on the Diagnosis and Classification e Association of Diabetes (constituído pela American Diabetes Association) como a World Health Organization propuseram nova classificação da diabetes e dos seus distúrbios. A primeira classificação aceite de diabetes mellitus foi publicada, pela Organização Mundial de Saúde em 1980 (World Health Organization, 1980) e, numa forma modificada (World Health Organization, 1985), sendo aceite sendo utilizada internacionalmente. Esta representou um compromisso entre classificação clínica e etiológica e permitiu classificação de pessoas e doentes, mesmo quando causa ou etiologia era desconhecida. De acordo com a nova classificação é associado o conceito de estágios clínicos da diabetes que variam desde a anormalidade, passando pela tolerância à glicose diminuída e ou glicemia de jejum alterada, até à diabetes propriamente dita. Qualquer dos estágios, pré-clínicos ou clínicos, pode caminhar em ambas as direcções, progredindo para o estado diabético ou revertendo para a normalidade da tolerância à glicose (Aiviertcan Diabetes Association, 2004). Actualmente, segundo American Diabetes Association (2006) a diabetes mellitus está classificada em quatro classes: - Diabetes Tipo 1, resulta da destruição das células beta, que geralmente conduz a uma deficiência absoluta de insulina. - Diabetes Tipo 2, resulta de um defeito progressivo na secreção de insulina sobre uma tendência oculta de resistência à insulina - Outros tipos específicos de diabetes, devidos a outras causas (defeitos genéticos na função das células βeta, defeitos genéticos na acção de insulina, doenças do pâncreas exócrino, induzida por fármacos ou produtos quimicos) - Diabetes Mellitus Gestacional, diagnosticada durante a gravidez. A diabetes Tipo 1 representa 5-10% da população diabética e manifesta-se essencialmente nas crianças e jovens, podendo também, ocorrer em adultos ou idosos. As causas, embora ainda não totalmente esclarecidas, apontam para uma alteração no sistema imunitário do doente, que desencadeia uma reacção auto-imune com destruição das suas próprias células βeta com uma predisposição genética múltipla e relacionada com factores ambientais ainda mal definidos (ADA, 2006). Ainda que podendo diferir, geralmente o seu aparecimento é brusco e, principalmente quando os valores de glicemia já são muito elevados, os sinais e sintomas como a poliúria, a polidipsia, a polifagia e a perda de peso, podem tornar-se evidentes (Levy, 1999). A diabetes Tipo 2, em que os indivíduos têm resistência à insulina e, em geral, uma deficiência de insulina relativa, mais que absoluta, não dependendo da administração de insulina exógena para a sua sobrevivência. A sua evolução é lenta e frequentemente não dando qualquer sinal ou sintoma de forma que, quando é diagnosticada, já tem alguns anos de evolução, podendo também coe-existirem algumas complicações associadas. Ocorre mais tipicamente no adulto obeso, representando 90-95% da população diabética (ADA, 2006). Não se conhecendo etiologias específicas, as causas do seu aparecimento podem estar relacionadas com uma tendência hereditária e com hábitos de vida menos saudáveis como sendo a obesidade, o sedentarismo e uma alimentação incorrecta. Outros factores de risco como a hipertensão, a hiperlipidémia, a diabetes gestacional, as doenças do pâncreas e as doenças endócrinas podem aumentar a susceptibilidade à diabetes Tipo 2 (American Diabetes Association, 2002; Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal, 2001; Duarte, 1997). A categoria "Diminuição da Tolerância à Glucose" (ATG e AGJ) é classificada como um estádio de anomalia da regulação da glucose e refere-se a um estádio metabólico intermédio entre homeostase normal da glicose e diabetes, uma vez que pode ser observada em qualquer situação de hiperglicemia com concentrações da glicose em jejum que são inferiores às necessárias para diagnosticar diabetes mellitus, mas superiores ao valor "normal" de referência, (igual ou superior a 6,1 mmol L -110 mg/ dL - e inferior a 7,0 mmol L -126 mg/ dL) não sendo considerada diabetes (American Diabetes Association, 2002). A classe quatro, Diabetes Gestacional, inclui os grupos anteriormente classificados como Deficiência Gestacional da Tolerância à Glucose (DGTG) e Diabetes Mellitus Gestacional (DMG). Esta classificação implica um estádio de normoglicemia no qual são classificadas as pessoas que apresentam evidências de um processo patológico que pode conduzir a diabetes mellitus, ou nas quais ocorreu uma reversão da hiperglicemia. Os requisitos, para diagnósticar uma pessoa com sintomatologia grave e alta hiperglicemia, são diferentes dos necessários numa pessoa assintomática com valores de glicemia apenas ligeiramente acima do valor limite. Uma hiperglicemia grave detectada em condições infecciosas, traumáticas, circulatórias ou outro pode ser transitória e não deve por si só ser considerada como diagnóstico de diabetes. O diagnóstico numa pessoa assintomática nunca deve ser feito com base num único valor anormal de glicemia, é indispensável pelo menos mais um teste à glicose com resultado positivo, quer em jejum, ao acaso ou numa prova de tolerância à glicose oral (PTGO) e vigilância até confirmação. Nestes casos é fundamental ter em consideração alguns factores adicionais tais como etnia, história familiar, idade, obesidade e patologias concomitantes, antes de fazer o diagnóstico. O diagnóstico clínico de diabetes é, muitas vezes, sugerido pela presença de sintomas como o aumento de sede e do volume urinário, infecções recorrentes, perda de peso inexplicável e, em casos graves, sonolência e coma. Os novos critérios de diagnóstico de diabetes mellitus são a diminuição do valor de diagnóstico da concentração plasmática da glicose em jejum de 126 mg/dl e valores superiores, ou sintomas de diabetes e uma glicose plasmática ao acaso de 200 mg/dl e valores superiores (ADA, 2006). Na diabetes Tipo 2 é a forma mais comum da diabetes qualquer uma delas pode ser predominante, geralmente, ambas estão presentes no momento em que esta forma de diabetes se manifesta clinicamente. O tratamento do diabetes Tipo 2 baseia-se em estratégias de educação e de modificações do estilo de vida que incluem a suspensão do fumo, aumento da actividade física, hábitos alimentares saudáveis e, se necessário, uso de antidiabéticos orais. Entre os objectivos do tratamento do doente diabético Tipo 2, destacam-se com frequência na literatura, os seguintes: uma adequada compensação metabólica de modo a prevenir a descompensação aguda (hipoglicemia, cetoacidose), evitando ou minimizando os riscos de complicações tardias; retardar ou evitar o aparecimento ou a progressão das complicações tardias; proporcionar ao paciente bem-estar físico, psicológico e social; contribuir para melhorar a qualidade de vida e oferecer terapêutica educacional sobre diabetes. De acordo com as recomendações do Grupo de Estudos da Diabetes da Associação Portuguesa de Médicos de Clínica Geral (APMCG), o tratamento da diabetes Tipo 2 inclui aspectos importantes como: - Controlo da diabetes – Modificações do estilo de vida (hábitos alimentares saudáveis, exercício físico, redução da ingestão de álcool e abstinência tabágica; - Tratamento oral e se necessário tratamento insulínico; - Tratamento dos factores de risco independentes (redução da tensão arterial para valores iguais ou inferiores a 130/85 mmHg nos doentes sem nefropatia e redução dos valores de LDL.c (lipoproteínas de baixa densidade) para valores iguais ou inferiores a 100 mg/dl (Associação Portuguesa dos Médicos de Clinica Geral, 2002). O peso corporal também é um factor importante para a regulação do tratamento na diabetes, sendo o Índice de Massa Corporal (IMC) a medida que permite definir o peso excessivo e a obesidade - IMC é superior no sexo feminino a 26 Kg/m2 e no sexo masculino a 27 Kg/m2 -. (Grupo Europeu de Consenso para a Diabetes, 1993; Duarte, 2002). Um Índice de massa corporal superior a 25 Kg/m2 é considerado peso excessivo, superior a 30 Kg/m2 é obesidade (Duarte, 2002). A American Diabetes Association (2002) preconiza que todo o plano de tratamento a instituir, deva ser individualizado, resultando de um esforço comum entre o diabético, a sua família e a equipa de saúde. O tratamento da diabetes Tipo 1 com insulina injectável é imprescindível. Em relação ao tratamento da diabetes Tipo 2, a mudança no estilo de vida, o combate ao stress, a prática regular de exercício físico, o controlo periódico de peso e o combate à obesidade e ao sedentarismo, tornam-se medidas essenciais no controlo da diabetes e na prevenção das suas complicações. O esquema terapêutico na diabetes assenta basicamente na chamada Tríade Terapêutica, que inclui a alimentação, o exercício físico e a medicação. Estes três pilares assumem igual importância dos dois tipos de diabetes e o desequilibro de um deles reflecte-se directamente nos outros, impedindo que o tratamento seja eficaz (Associação Protectora dos Diabéticos de Portugal, 2001; Duarte, 1997). Assim, a educação torna-se o aspecto mais importante no controlo do doente diabético, pois esta interage simultaneamente com os três pilares. De facto, a comunidade científica tem vindo a alertar para o facto dos estilos de vida praticados nos países desenvolvidos ou em vias de desenvolvimento, poderem contribuir de forma inquestionável para o aumento da incidência e prevalência da diabetes. Aliás, observa-se que cerca de 80% destes doentes têm excesso de peso (Cox & Gonder-Frederick, 1992) e, sabendo que a prevalência desta patologia aumenta paralelamente com a obesidade, a sua redução confere benefícios de saúde e, especificamente nos diabéticos Tipo 2, melhora o seu controlo glicémico (Leong & Weston, 2001; Santiago & Mesquita, 1999). Quadro 1 - Recomendações do controlo glicémico para adultos diabéticos Controlo glicémico Objectivo HbA1c <70% Glicose plasmática capilar pré-prandial 90 – 130 mg/dl (5,0-7,2 mmol/l Glicose plasmática capilar pós-prandial máxima <180 mg/dl (menor 10,0mmol/l) Tensão arterial < 130/80mmHg Lipidos: LDL <100 mg/dl (< 2,6 mmol/l); Triglicéridos < 150 mg/dl(< 1,7 mmol/l); HDL > 40 mg/dl (> 1,1mmol/l) Fonte: Guia Clínico Prático da Diabetes (American Diabetes Association, 2006) Os estudos clínicos prospectivos demonstraram o valor do rigoroso controlo glicémico como parte integrante da estratégia terapêutica através do autocontrolo da glicemia sanguínea e da determinação da hemoglobina glicosilada (HbA1c) de acordo com o controlo glicémico do diabético, contribuindo para uma diminuição das taxas de retinopatia, nefropatia e neuropatia (ADA, 2006). Assim, qualquer plano de tratamento deve reconhecer a educação para o autocontrolo como um componente integral de assiatência ao diabético. 2 - PROGRAMA NACIONAL DE CONTROLO DA DIABETES MELLITUS O Programa Nacional de Controlo da Diabetes Mellitus tem como objectivos: - Promover a formação actualizada em diabetologia dos profissionais que fazem parte do programa; - Cumprir os objectivos de St. Vincent; - Implementar medidas de prevenção primária, secundária e terciária; - Promover a integração dos cuidados prestados aos diabéticos, através da complementaridade técnica dos recursos necessários; - Promover a prestação de cuidados de qualidade (Direcção Geral da Saúde, 1995). Da reunião de St. Vincent (1989), realizada em Itália e organizada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e pela Federação Internacional da Diabetes (IDF), resultou a famosa Declaração de St. Vincent, que preconiza como objectivos gerais: - A melhoria constante da saúde, especificamente da qualidade e quantidade de vida; - A prevenção e tratamento da diabetes e das suas complicações, intensificando a investigação nesta área. (Grupo Europeu de Consenso para a Diabetes Mellitus Não Insulino Dependente, 1993, p. 5). No âmbito dos objectivos do tratamento da diabetes, outras recomendações são divulgadas no sentido de aliviar os sintomas mediante controlo metabólico: melhorar a qualidade de vida mediante a prevenção das complicações agudas e crónicas e das modificações no estilo de vida; diminuir a mortalidade; tratar as doenças intercorrentes da diabetes, (Grupo Europeu de Consenso para a Diabetes Mellitus Não Insulino Dependente, 1993). Portugal incluído nessa reunião, assim como os restantes países, aceitaram estas recomendações, investindo simultaneamente no sistema de vigilância epidemiológica sobre a diabetes, de modo a traçar objectivos de acordo com as necessidades identificadas. No percurso de evolução do primeiro programa de luta contra a diabetes, que remonta no nosso país, a 1973 e após Portugal ter subscrito, em 1989, a Declaração de St. Vincent, foram sucessivamente criadas, em 1992, 1995 e 1998, novas estratégias nacionais de combate a esta doença. Uma série de medidas têm vindo a ser desenvolvidas na área da prevenção da diabetes e das suas complicações. Em Portugal, o Ministério da Saúde tem vindo a seguir medidas específicas, inseridas na actualidade da política de saúde da Organização Mundial de Saúde. Assim, um dos objectivos gerais do Ministério da Saúde (1999, p. 49) para 2002 era “Proporcionar, a todos os diabéticos, o acesso a todas as vertentes do Programa Nacional de Controlo da Diabetes ”. Este programa, elaborado de acordo com os objectivos previstos pela declaração de St. Vincent, inclui a implementação do guia do diabético, o aperfeiçoamento do sistema de informação, a prevenção primária, a prestação de cuidados, reforçando programas e acções de informação dirigidas ao doente diabético de modo a responsabilizá-lo no seu auto controlo. A prevenção com acompanhamento rígido e educação dos pacientes e dos profissionais de saúde, pode prevenir até 85% dos casos de amputação. A meta da Organização Mundial da Saúde é uma redução de 50% das taxas de amputação. Correspondeu ainda ao estabelecimento de uma parceria, assente num pacto de solidariedade, consolidada num protocolo de colaboração em Outubro de 1998, pelo Ministério da Saúde, indústria farmacêutica, agentes de distribuição de produtos farmacêuticos, farmácias, profissionais de saúde e diabéticos, com o principal objectivo de melhorar a acessibilidade aos materiais de autovigilância e tratamento do diabético. O referido protocolo de colaboração extinguiu-se em Dezembro de 2002, tendo sido efectuado um aditamento para a sua prorrogação até Junho de 2003. A avaliação do referido protocolo permitiu concluir, através da diminuição anual do número de internamentos hospitalares por descompensação diabética, que se começou a verificar, que os diabéticos terão aumentado a sua autovigilância. O Ministério da Saúde reconhece, ainda, a necessidade de serem aumentados esforços dos gestores dos serviços de saúde, dos médicos, dos enfermeiros e dos diabéticos no sentido de serem adequadas, ao quadro das actuais reformas do Serviço Nacional de Saúde, novas estratégias que permitam, no futuro imediato, obter maiores ganhos em saúde, através de uma redução das principais complicações da diabetes. Neste sentido, o Ministério da Saúde determina que sejam elaboradas: - Propostas normativas e orientações de carácter técnico, científico e estratégico que promovam a redução das principais complicações da diabetes, incluindo no que respeita à inovação terapêutica e tecnológica; - Propostas de criação dos suportes de informação necessários à monitorização do Programa de Controlo da Diabetes Mellitus; - Propostas de necessidades formativas de médicos, farmacêuticos e enfermeiros no âmbito do Programa de Controlo da Diabetes Mellitus; - Propostas de necessidades formativas dos diabéticos, no que se refere à educação terapêutica para o autocontrolo da diabetes; - Propostas de acordos, protocolos e parcerias estratégicas com entidades de diversos sectores, com vista à melhor prossecução dos objectivos constantes do Programa; - Elaboração periódica de estudos epidemiológicos, com representatividade nacional, sobre a prevalência da diabetes em Portugal; - Avaliação anual do desenvolvimento regional e nacional dos rastreios sistemáticos da retinopatia diabética, nefropatia diabética e Pé Diabético e do desenvolvimento da implementação de consultas hospitalares de alto risco obstétrico para a diabetes; - Avaliação anual dos ganhos de saúde obtidos, a nível nacional, em termos de redução do número de cegueiras por retinopatia diabética, de amputações major dos membros inferiores, de casos de insuficiência renal terminal e de acidentes cardiovasculares em diabéticos; - Avaliação anual da evolução dos consumos das tiras-reagentes para pesquisa de glicemia, glicosúria e cetonúria e das lancetas, seringas e agulhas para vigilância e tratamento da diabetes; - Avaliação anual do impacte financeiro da aplicação das medidas propostas. Assim, é importante utilizar metodologias activas, que apelem à criatividade, que não sejam apenas cognitivas, mas que envolvam aspectos emocionais, assim como a auto estima e motivação dos indivíduos. É importante todo o contributo que os métodos e técnicas possam fornecer, no entanto deve-se ter presente que a aprendizagem resulta da soma de todas as influencias que colectivamente determinam os conhecimentos, as crenças, as atitudes e os comportamentos relacionados com a promoção, manutenção e recuperação da saúde (Ministério da Saúde, 2002). Tendo sido a Educação para a Saúde aceite em muitos países como parte integrante do tratamento da diabetes, durante muitos anos só um número reduzido de pessoas com diabetes não insulino-dependentes é que recebiam ensino adequado. No começo dos anos 80, um grupo de organizações dedicadas à diabetes elaboraram as Normas Nacionais para Programas de Educação do paciente diabético. Em 1993, um grupo de trabalho fez a revisão destas normas e denominou-as de “Normas Nacionais para Programas de Educação no Autocuidado da Diabetes”. A American Diabetes Association (2002) desenvolveu directrizes úteis para planear qualquer tipo de ensino a utentes diabéticos: -Explicação dos aspectos gerais da diabetes Mellitus, classificação, sintomas, diagnóstico e tratamento; -Desenvolvimento de um plano de alimentação, explicação da interacção entre consumo de alimentos e actividade física; -Monitorização da glicemia e corpos cetónicos na urina; - Instrução sobre a acção de insulina ou os hipoglucemiantes orais, tipos de tratamento a técnica de injecção; - Explicação sobre os ajustes de insulina, incluindo os estabelecimento de objectivos de glicemia e concentração de hemoglobina glucosilada, os benefícios e riscos de melhor controlo da glicose. - Instrução sobre sintomas, tratamento e prevenção da hipoglicemia e cetoacidose diabética, revisão das directrizes para os dias em que está doente e métodos de urgência, como a administração de glucagón. - Análise das complicações crónicas, incluindo a prevenção, detecção, tratamento e reabilitação; revisão da importância dos cuidados regulares dos pés e da pele; - Ajuda da adaptação psicológica necessária para viver com a doença crónica e importância do apoio familiar; - Estratégias de mudanças de conduta, estabelecimentos de objectivos, redução de factores de risco e resolução de problemas; - Explicação dos estudos actuais de investigação e sua aplicação, relevância dos cuidados, a educação e tratamentos actuais. Apesar de existirem populações com grande número de doenças crónicas, onde se organizam programas de educação para a saúde, presume-se que exista um grande número de pessoas com pouco acesso a esta informação. O ensino sobre diabetes tem oportunidades de acreditação dos programas e certificação dos profissionais e ao mesmo tempo incorporar métodos reconhecidos para facilitar a mudança de comportamentos (Redman, 2003). Várias abordagens têm sido feitas para ajudar o utente a lidar com o reconhecimento e controlo de sintomas, no entanto a maioria dos utentes não fazem uso dessas abordagens, apesar disso o sucesso dos doentes com diabetes tem demonstrado o que se pode conseguir com investigação, políticas, padrões e serviços de apoio de controlo da diabetes. CAPITULO III - O IDOSO COM PÉ DIABÉTICO E A EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE 1 - A DIABETES NO IDOSO A diabetes é uma das doenças importante na população de idade avançada, estando presente em pelo menos 20% dos indivíduos com mais de 65 anos. Este grupo etário com diabetes têm maior taxa de mortalidade precoce, incapacidade funcional e doenças coexistentes especialmente pelas suas complicações como a hipertensão e acidente vascular cerebral que os indivíduos sem diabetes (ADA, 2006). Apresenta risco de complicações tardias e é provável que o indivíduo tenha tido hipoglicémia assintomática não detectada durante vários anos antes de ser feito o diagnóstico. Embora neste grupo etário também se diagnostiquem alguns casos de diabetes Tipo 1, na grande maioria trata-se de diabetes Tipo 2. Quanto à etiologia da diabetes no idoso, existem muitos factores importantes na fisiopatologia da hiperglicémia que podem contribuir para o aparecimento de uma elevada taxa de diabetes Tipo 2, como a deterioração das funções das células Beta pancreáticas causada pela idade e a deterioração da acção de insulina. Por outro lado o aumento de tecido adiposo corporal e/ou uma diminuição da massa muscular e diminuição da actividade física neste grupo etário contribui também para a insulinoresistência. Ainda, a prevalência de outras doenças coexistentes e o uso de determinados fármacos podem de igual modo contribuir para o aparecimento de hiperglicémia (Duarte, 1997). Em termos de saúde pública, este enigma tem cada vez maior importância dado que a população idosa continua a aumentar. A prevalência da diabetes vai pois aumentando à medida que a idade avança. Assim, enquanto que a diabetes Tipo 1 tem uma prevalência de cerca de 4% no grupo etário dos 30-40 anos, sobe para 10% aos 60 anos e 20% aos 80 anos de idade. A tolerância Diminuída à Glicose (TDG) na população em geral é de 10%, nos idosos sobe para 20% (Sagreira, 2002). Destes números podemos dizer que urge fazer o diagnóstico precoce da diabetes neste grupoetário. O diagnóstico da diabetes no idoso pode fazer-se através de análises clínicas de rotina sem sintomatologia, com quadro clínico (cansaço, emagrecimento, polidípsia, poliúria ou polifagia, ou ainda por, manifestações isoladas ou em associações, como por exemplo balanites, vulvovaginites, ou infecções urinárias de repetição, etc). Casos existem em que a diabetes se manifesta no decurso de uma intercorrência grave, como o enfarte do miocárdio ou de um acidente vascular cerebral, apresentando-se sobre a forma de cetoacidose (Sagreira, 2002). Ainda segundo o mesmo autor, a abordagem do idoso deve ser feita no seu “todo” e não em termos de glicémia. É importante conhecer o seu contexto familiar e social em que está inserido, bem como os factores físicos e psíquicos relacionados com a idade. É fundamental, perante o diagnóstico de diabetes no idoso, fazer uma apropriada psicoterapia de apoio, ao indivíduo e família. Em caso de não haver família é necessário obter apoio domiciliário ou um centro de dia onde alguém se envolva na sua terapêutica. Menos importante é conhecer a sua condição económica, que outras patologias e terapêuticas fazem, se há perda de visão, dificultando ou impossibilitando a autovigilância e administração de terapêutica. Embora a tolerância à glicose vá diminuindo com a idade, os critérios de diagnóstico são iguais aos do adulto, no entanto, dado que a glicémia aumenta com a idade terá que se ter muita precaução, podendo delimitar negativamente o doente e toda a sua família. Os critérios de diagnóstico segundo a American Diabetes Association (2002) são: sintomas clássicos e glicemia plamática ocasional maior ou igual a 200 mg/dl (11.1 mmol/l) ou Glicemia plamática jejum maior ou igual 126mg/dl (7.0 mmol/l), ou ainda, glicemia plasmática maior ou igual 200mg/dl, às 2h após sobrecarga de 75 g de glicose oral. Qualquer um destes critérios deverá ser confirmado por uma segunda confirmação. Depois de se fazer o diagnóstico, é importante pensar num plano de tratamento, nomeadamente no que respeita à alimentação, educação e exercício físico. Tratamento da diabetes mellitus no idoso O estabelecimento de um plano de tratamento a longo prazo para um diabético idoso deve ter em conta a esperança de vida, disponibilidade dos serviços de apoio, problemas económicos, problemas de saúde coexistentes como trantornos psiquiátricos e cognitivos, complicações da diabetes, limitação do estado funcional e outros. É também importante ter em conta factores importantes existentes nestas idades como sendo a má dentição, alterações reumatismais, alterações do gosto, vista, olfacto e diminuição da audição, conduzindo a dificuldade na comunicação, na preparação dos alimentos. A intervenção dietética com redução de peso num diabético idoso obeso melhora a hiperglicémia, reduzindo a resistência à insulina. A alimentação tem que ser bem recomendada, tomando em consideração os seus gostos, disponibilidades económicas, possibilidades de confecção, tentando modificar o menos possível os seus hábitos de toda uma vida, que têm a ver, muitas vezes com questões culturais, sociais e religiosas. Há muitas vezes neste grupo etário anorexia por solidão, por depressão e até favorecida pelas alterações do olfacto e paladar que surgem nestas idades. Assim, leva-nos a que cada caso seja único, procurando a maior simplicidade possível nos esquemas propostos (Sagreira, 2002). A educação do idoso, em face destes problemas é mais difícil, mais demorada, exigindo mais paciência e mais tempo. É importante o ensino dos cuidados de higiene, nomeadamente com os pés onde quase sempre é necessária a ajuda de terceiros para tratar de calosidades, cortar unhas, vigiar o aparecimento de lesões, etc. A autovigilância, ou em caso de impossibilidade, a mesma deve ser feita por terceiros, nunca deve ser dispensada. A monitorização da glicemia no domicílio tem-se tornado nos últimos anos mais acessível graças aos aparelhos de leitura, havendo um maior rigor na determinação. Um idoso que vive só e não consegue aprender, deverá recorrer ao Centro de Saúde para a determinação da glicemia. O exercício físico, associado a um regime alimentar adequado, pode ser suficiente, em muitos casos, para um equilíbrio satisfatório. O exercício físico leva a uma melhoria do metabolismo glucídico, por redução da insulino-reseistência relacionada com a idade, e aumento da sensibilidade periférica à insulina. Por outro lado, pode também conduzir a diminuição do tecido adiposo, aumento de massa muscular, melhoria da hipertensão arterial e da dislipidémia, prevenindo desta forma complicações graves. No entanto, há limitações à prática de exercício na presença de doença cardiovascular, osteoartroses, doença vascular cerebral. Nestes casos terá que ser adaptado a todos os problemas presentes. A marcha é o mais recomendado nestas idades. Essencialmete deve-se lutar e investir numa educação do idoso diabético logo após o seu diagnóstico, de modo a manter um equilíbrio glicemico e prevenir os factores de risco. Levá-lo a adquirir hábitos de vida saudável, o que por vezes se consegue com hábitos de lazer. O sucesso resulta do estabelecimento de uma interacção positiva entre equipa de saúde, doente e família (Sagreira, 2002). Complicações da diabetes no Idoso Como complicações da diabetes, mais frequente e grave destaca-se a neuropatia nas suas formas sensitiva, motora e autonómica que determina o pé neuropático, que pela ausência de dor, silencia a instalação e progressão das lesões. Em consequência da neuropatia diabética, surgem modificações que podem ser de uma forma súbita relacionada com traumatismos, ou de uma forma lenta e progressiva relacionada com o processo degenerativo de todas as suas estruturas e na presença de neuropatia sensitiva, estas modificações progridem, sem percepção do próprio. As úlceras do pé, frequentemente, passam despercebidas pelos profissionais de saúde, quando poderiam ser detectadas e tratadas através da observação aos pés. Podemos também verificar pela literatura a relação da neuropatia com a duração da doença (15% após 20 anos ou 50% após 25 anos de doença) e com a idade do doente, sendo mais frequente se a diabétes se manifesta depois dos 40 anos de idade (Carvalho, 1997, in Duarte 1997). É assim, uma complicação mais frequente na diabetes de longa duração. Neste contexto torna-se urgente e cada vez mais evidente uma estratégia que inclua a educação da pessoa diabética e do pessoal de enfermagem, tratamento multidisciplinar visando a redução do desenvolvimento e progressão das lesões do pé e amputações e benefícios para a pessoa diabética e seus familiares, bem como para o orçamento do estado. Na observação dos pés ao doente deve-se identificar factores de risco como sendo: - alterações primárias da estática - pé plano, dedos em martelo, hallux valgus, devendo ser feita a correcção adequada; - Má higiene, sapatos inadequados, corte de unhas errado; - Micoses interdigitais - ensino dos cuidados de higiene e tratamento antifúngico; - História de claudicação ou ausência de pulsos - é indispensável o reforço da educação dos cuidados com o pé; - História de parestesia e/ou a detecção de alterações da sensibilidade; - A presença de calosidades que garantem a presença de anomalias nas pressões obrigando à sua remoção bem como à correcção/alívio dessas pressões (Caldeira 1997). O aconselhamento para prevenir complicações de neuropatia é fundamental: lavagem com água tépida e diária, secagem rigorosa, especialmente nos espaços interdigitais, aplicação de creme hidratante, sem passar na zona interdigital; tratar calosidades com pedra-pomes, lima de cartão; tratar as unhas, não cortar demasiado rentes, nem com cantos arredondados, evitar as tesouras utilizando de preferência uma lima, não as deixando crescer; tratar micoses, usar palmilhas adaptadas para corrigir as alterações de estática (Caldeira, 1997). A vasculopatia diabética ou pé isquémico caracteriza-se pela ausência de pulsos à palpação (artérias pediosas e tibial), um aumento da ateriosclerose, sempre bilateral, atingindo mais as artérias abaixo do joelho e sempre sensível à dor. A úlcera do pé isquémico é diferente da do pé neuropático, com uma placa de necrose em qualquer ponto de pressão. À Observação deparamo-nos com unhas deformadas, grossas sem brilho, palidez, diminuição da temperatura, atrofia muscular, ausência de pulsos, rarefacção pilosa; eminências ósseas, necroses em zonas de pequenos traumatismos, pontas dos dedos, bordos dos calcanhares sendo dolorosas, secas e de bordos finos. A observação dos pés é uma parte essencial, no tratamento, se bem que por vezes, negligenciada podendo através de um bom exame físico detectar-se a maioria das lesões ulcerosas e pré-ulcerosas, avaliar as suas causas e identificar os doentes em risco de virem a ter problemas no futuro e programar-se o tratamento. Deve fazer-se a observação da ponta para a região mais próximal procurando sinais de ulceração, maceração, eritema, fissuras e calosidades. Devem ser observados todos os espaços interdigitais e unhas. Os principais locais de alterações são os correspondentes às cabeças dos metatarsos, nós dos dedos, calcanhares e maléolos (Caldeira, 2002). O Aconselhamento deve ser feito em relação à higiene como referida anteriormente para a neuropatia. As meias devem ser lisas e sem costuras, sapatos largos, maleáveis, sem costuras internas, sendo de preferir os de atacador e de sola de borracha, o exercício com marcha lenta parando à menor dor e exercício de Burguer deitado, elevar os membros e fazer movimentos de flexão e extensão do pé. (Caldeira et. al, 2002). A educação do doente visa também o reconhecimento de lesões dérmicas no pé ou perna. A vigilância do pé, a educação do diabético, levando a que adopte medidas preventivas de cuidados de higiene e auto-observação permitirão a detecção precoce do risco, sua prevenção ou correcção. É importante fazer acompanhamento do diabético e fazer a prevenção de amputação através de: inspecção regular -1º consulta e depois anualmente; identificar o pé de risco; educação do diabético e família nos cuidados a ter com os pés; uso de calçado adequado; tratamento da patologia não ulcerativa, calos e unhas. Em relação à prevenção de complicações da diabetes, é importante distinguir no idoso uma diabetes recém diagnosticada de uma diabetes de longa duração, na medida em que o aparecimento das complicações está relacionado com o grau e duração da hiperglicemia. O idoso com diabetes de longa duração está mais sujeito a essas complicações, pois a reduzida esperança de vida já não permitirá o seu aparecimento. Outras complicações não menos importantes consideram-se: - factores químicos correspondentes aos calicidas e pomadas agressivas; - traumatismos físicos causados pelo calor, botijas, lareiras; - factores mecânicos referentes à contusões e às hiperpressões em consequência da falta de sensibilidade, deformações dos pés e uso de calçado inapropriado; - infecção permite a rápida evolução das lesões para necrose, gangrena e amputação; - retinopatia diabética; - nefropatia; - hipertensão e dislipidémia; - sedentarismo; - tabagismo; - condições socioeconómicas (Pereira, 2005). As complicações vasculares seja a microangiopatia, seja a aterosclerose dos grandes vasos mais marcada e precoce, levam a internamentos sucessivos. A complicação aguda que mais surge nestas idades é a hipoglicemia, constituindo uma ameaça à vida dos idosos levando ao coma, crise convulsiva ou psicose aguda, precipitar acidentes cardivasculares como o enfarte do miocárdio ou acidente vascular cerebral. É assim, de extrema importância e obrigatório fazer a prevenção da hipoglicemia, fazendo ensino ao doente e família referente à prevenção e seu tratamento (Sagreira, 2002). A organização dos cuidados de saúde é fundamental na prevenção e tratamento das complicações dos pés dos diabéticos independentemente do seu estatuto social. 1.1 – O IDOSO COM PÉ DIABÉTICO A diabetes depois de instalada, seja de uma forma súbita ou lenta pode evoluir para complicações, indo interferir em todas as estruturas do pé com repercussões morfológicas e funcionais, podendo evoluir para Pé Diabético, necrose, gangrena e amputação de uma forma silenciosa e assintomática. As complicações do pé são um dos problemas mais graves e dispendiosos da diabetes mellitus e constituem a razão mais comum para internamento das pessoas com esta patologia e, não raro, o custo do tratamento para um único problema do pé excede o custo anual total para o controlo ambulatório da condição metabólica do indivíduo (Levin, 1995). Um estudo realizado por Rojas (2003) demonstra que a permanência hospitalar dos diabéticos nos Estados Unidos é superior a um mês e que 44% dessas pessoas ficam hospitalizados por mais de 3 meses. Pé Diabético é uma entidade multissistémica, com componentes neurológicos, vasculares, osteoarticulares e infecciosos em graus de associação variável que se não for precocemente diagnosticada e tratada, leva a uma alta percentagem de amputações com consequências graves a nível pessoal, familiar e social (Horta & Pinto, 2004). De acordo com a Circular Normativa de 24/04/2001 da Direcção Geral da Saúde, é uma das complicações mais graves da Diabetes Mellitus, sendo o principal motivo de ocupação das camas hospitalares pelas pessoas portadoras de diabetes e o responsável por 40 a 60% de todas as amputações efectuadas por causas traumáticas. O International Consensus on the Diabetic Foot (2001) considera o Pé Diabético como o conjunto de alterações ocorridas no pé, decorrentes de neuropatia, micro e macrovasculopatias e aumento da susceptibilidade à infecção, devido às alterações biomecânicas que levam a deformidades e surge na sequência das complicações tardias da diabetes. Em Portugal a diabetes é considerada a segunda causa de amputações “major” unilateral dos membros inferiores e a primeira causa de amputações “minor” e “major” bilatarais, sendo que o número de amputações major seja calculado em 300 por ano (Pereira, 2004). Estima-se ainda que, em Portugal, possam ocorrer anualmente cerca de 1200 amputações não traumáticas dos membros inferiores, resultando num esforço acrescido do membro remanescente, que iniciará problemas em apenas um ano e meio, quer se tenha provido ou não de prótese o membro amputado. Estudos epidemiológicos mostram que a úlcera do Pé Diabético precede 85% das amputações dos diabéticos. Pelo menos 50% das pessoas diabéticas de longa duração desenvolvem complicações neurológicas, uma vez que a neuropatia é raramente diagnosticada antes do quinto ano da doença, nos doentes diabéticos Tipo 1. Em estudos realizados com doentes diabéticos Tipo 2, foi detectada neuropatia em 8% no momento do diagnóstico, atingindo os 40% a 50% ao fim de 20 anos da doença (Kozak, 1996; Armstrong, 1998; Pereira, 2004)). Ortegon et al. (2004) num estudo sobre prevenção e tratamento do Pé Diabético, afirmam que 80% das amputações são precedidas de úlceras nos pés. Num outro estudo, Pedrosa et al. (1998) referem que a prevalência da neuropatia sensitivo-motora periférica crónica é de 30 a 70% e a da doença vascular periférica é de 10 a 20% e cerca de 80 a 90% das úlceras são originadas por traumas extrínsecos. Com os avanços da medicina, tem sido possível prolongar a esperança média de vida das pessoas diabéticas. Assistimos ao aparecimento de complicações micro e macrovasculares da doença nomeadamente alterações morfo-funcionais do pé, entidade tão conhecida como Pé Diabético. A sua prevenção é o principal tratamento. Alguns aspectos são decisivos na redução da incidência de úlceras e das amputações dos membros inferiores devendo os diabéticos serem informados sobre esta complicação, da sua evolução e das suas consequências. A educação dos doentes diabéticos relativamente aos cuidados a terem com os pés, o acompanhamento regular, a melhoria do controlo glicemico pode reduzir a incidência de complicações do Pé Diabético. Assim, os doentes devem receber informação de forma a tornarem-se membros activos das equipas que os cuidam e não terem apenas uma atitude passiva, pois comportamentos correctos podem reduzir de forma significativa o risco de úlcera do Pé Diabético. A literatura mostra que para controlar a infecção implicam o encorajamento do diabético para a auto-monitorização das glicemias com vista a obtenção de um bom controlo metabólico. A observação dos pés deve ser feita em todas as oportunidades e o reforço da educação sobre higiene, tratamento de calosidades e hidratação devem ser igualmente reforçadas bem como a protecção dos pés, com calçado adequado. O exercício físico, o controlo da tensão arterial, a redução dos lípidos também são muito importantes para combater a insuficiência arterial. Segundo o Consenso Internacional do Pé Diabético (2001), os cinco pilares para os cuidados adequados com os pés baseiam-se em: observação dos pés frequente; identificação dos mais propensos a desenvolver lesões; conscientização do diabético, família e dos profissionais da saúde sobre a importância de um exame pormenorizado para a saúde dos pés; utilização de meias e sapatos adequados, evitando o aparecimento de traumatismos e, por último, o tratamento das patologias não ulcerativas. A educação é uma estratégia essencial na redução das condições de risco para a morbilidade do membro inferior e prevenção da perda do mesmo. Acções desta natureza justificam-se porque num período de três anos, após uma amputação dos membros inferiores a percentagem de sobrevida do indivíduo diabético é de 50% e no prazo de 10 anos o índice de mortalidade é de 39% a 68% (Zavala & Braver, 2000; Pedrosa et al., 2001). Para Silva & Tozzi (1999), o factor fundamental no sucesso do tratamento dos diabéticos com alteração dos membros inferiores consiste no reconhecimento da situação clínica apresentada. O pé com pele seca e com fissuras hoje, poderá ser o pé com gangrena amanhã. É evidente que as complicações crónicas da diabetes, em especial o Pé Diabético, são a maior causa de morbilidade e mortalidade das pessoas diabéticas, implicando em consequências clínicas e socioeconómicas. Porém, é possível prevenir o surgimento dessas lesões, por meio de atitudes voltadas para a educação, tais como, cuidados com os pés no domicílio, redução de factores de riscos e realização de exames anuais completos (Zavala & Braver, 2000; Pedrosa et al., 2001). As úlceras e as amputações dos pés são as principais causas de morbilidade, incapacidades, custos emocionais e físicos para as pessoas portadoras de diabetes. O reconhecimento e tratamentos precoces dos factores de risco podem prevenir ou retardar o aparecimento de prognósticos adversos (ADA, 2006). O tratamento ideal do Pé Diabético requer uma abordagem multidisciplinar, é importante para um bom prognóstico para as pessoas com úlceras no pé ou pés de alto risco, fazer anualmernte um exame completo do pé e proporcionar educação sobre cuidados pessoais ao pé a todos os diabéticos de modo a identificar factores de risco. Para prevenir todos estes problemas é fundamental a educação do diabético. A educação para a saúde tem vindo a ser internacionalmente reconhecida como parte integrante dos esforços para prevenção da doença, sendo uma parte essencial da prática de todos os profissionais de saúde. A prática de Educação para a Saúde baseia-se num conjunto de teorias, de resultados de investigação e em competências que devem ser aprendidas e aplicadas. Passaremos de seguida a descrever algumas dessas teorias. 2 - EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE Sucessivas reuniões internacionais apelam à implementação de actividades de educação para a saúde, apoiando-se na evolução do conceito de saúde, entendido como um recurso, um estado positivo de bem-estar individual e comunitário. Perspectivam a educação para a saúde como processo de capacitar os indivíduos e comunidades a aumentar o controlo sobre os factores que determinam a saúde através de diferentes meios e formas de actuação permitindo decisões informadas, livres, responsáveis em defesa da saúde. A orientação para se atingir o bem-estar pode ser adquirida através do processo de educação para a saúde, sendo este um acto interminável, em que o seu principal objectivo fundamenta-se na formação permanente e no exercício do sentido da responsabilidade. Na permanente e incessável busca de uma definição para “educação para a saúde” ressalva-se a incidência de opiniões na relação saúde/bem estar o que implícita educação para a saúde como fundamento para o bem-estar do indivíduo que por sua vez proporcionará um bem-estar comunitário. A educação para a saúde tem por função facilitar mudanças de estilos de vida, de forma voluntária, através da adopção de comportamentos que permitam melhorar, restabelecer ou mesmo recuperar a saúde (Amorim, 1999). Na perspectiva da modificação de comportamentos, a definição de Green anteriormente citada, é vista como um grande passo por referenciar acções diversas da educação para a saúde. No entanto, não inclui aspectos importantes como a cultura, valores individuais ou colectivos, a motivação e auto-estima, que se julga, hoje, serem essenciais num processo de educação para a saúde. Neste sentido, Tones e Tilford (1994) propõem que educação para a saúde é “toda a actividade intencional conducente a aprendizagens relacionadas com saúde e doença (...), produzindo mudanças no conhecimento e compreensão nas formas de pensar. Pode influenciar ou clarificar valores; pode proporcionar mudanças de convicções e atitudes; pode facilitar a aquisição de competências; pode ainda, conduzir a mudanças de comportamentos e de estilos de vida” (Tones e Tilford 1994, p. 11). Desta definição de Educação para a Saúde podemos deduzir os factores que influenciam as tomadas de decisão, sendo para isso, importantes as convicções e valores pessoais, conhecimentos e apoios sociais, entre outros. Nesta perspectiva, os factores psicossociais e ambientais são determinantes para o empowerment. O conceito de empowerment torna-se difícil traduzir para a nossa língua e “tem a ver com a relação recíproca que se estabelece entre os indivíduos e o seu meio físico e social (...). Quer isto dizer que não só o meio ambiente pode exercer uma poderosa influência sobre os indivíduos, como estes também podem exercer a sua influência sobre o meio que os rodeia” (Carvalho, 2002, p.124). O modelo de empowerment, dito de investigação acção participativa é caracterizado por decisões voluntárias e conscientes. Enfatiza a compreensão em relação à componente do conhecimento, suplementando-a com um processo de clarificação de valores e crenças, pelo qual terão de passar os educandos antes do momento de opção de uma escolha voluntária e consciente (Carvalho, 2002). A clarificação de crenças e valores requer a dinâmica de discussão de grupo, podendo ser necessário suplemento de informação, ensino ou mesmo pesquisa individual. O maior propósito do modelo é criar consciência de questões chave e desenvolver competências necessárias para o desenvolvimento do empowerment individual e colectivo. A criação de consciência crítica necessita de ser complementada pelo empowerment das crenças, sentimentos e competências. Por outro lado, às competências de tomada de decisão devem-se adicionar competências de saúde e de vida, promovendo desta forma uma escolha verdadeira e voluntária. A combinação da criação de uma consciência com a provisão de competências maximiza as possibilidades de gerir os constrangimentos ambientais (Carvalho, 2002). O modelo empowerment assume, ainda, que os alvos de educação não são em exclusivo o público em geral, devendo também englobar os profissionais de saúde ou outras pessoas que possam agir como advogados nas mudanças ambientais por pressão política. Os resultados deste modelo emergem do processo educacional, pretendendo-se maximizar uma escolha genuína e voluntária (Tones & Tilford, 1994). Numa perspectiva clássica, educação para a saúde, foi definida como uma actividade passiva, referenciada na altura como educação sanitária, Wood (1926) descreve-a “como a soma de experiências e impressões que influenciam favoravelmente os hábitos, atitudes e conhecimentos, relacionados com a saúde do indivíduo e comunidade” (cit in Navarro 2000, p.13). Pela análise deste conceito, constata-se que, educação para a saúde é vista como uma intervenção informal em que se enfatiza a dimensão cognitiva, se valorizam atitudes, conhecimentos e comportamentos. Não faz referência, a outras dimensões, nem dá espaço para a participação do indivíduo ou comunidade nas suas escolhas. Green (1980) citado por Green et al. (1998, p.30) define educação para a saúde como “qualquer combinação de experiências de aprendizagem planeadas com o objectivo de facilitar mudanças voluntárias de comportamento que conduzam à saúde”. Nesta definição existe um grande esforço para englobar variáveis e estratégias inerentes a um processo educativo. É uma definição operacional no sentido em que, o termo combinação denota a necessidade e importância da complementaridade dos métodos educativos relacionando-os com os objectivos definidos, permitindo atender à unicidade de cada indivíduo. Green & Kreuter (1991), definiram Educação para a Saúde como qualquer combinação planeada de experiências de aprendizagem realizada de forma a predispor, capacitar e reforçar o comportamento voluntário que promove a saúde dos indivíduos, grupos e comunidades. A educação para a saúde é reconhecida como uma das estratégias em que se deve basear as mudanças dos sistemas para poder alcançar a ”saúde para todos”. O conceito de educação para a saúde tem vindo a sofrer alterações ao longo dos tempos, sendo resultado da influência de factores sociais, políticos, culturais e económicos. Até à década de 70, os programas educacionais davam ênfase à transmissão da informação (apostando no conhecimento), sem ter em consideração factores psicossociais e económicos. Ao longo dos anos, vários autores têm contribuído para a clarificação deste modelo. Na década de 70, defende-se que um indivíduo toma uma decisão com vista a um comportamento saudável quando esta é determinada, fundamentalmente, por quatro variáveis psicológicas: - Percepção da susceptibilidade a determinada doença; - Percepção da gravidade da doença; - Percepção dos benefícios de determinadas acções; - Percepção das barreiras a essas acções (Conner, 1994). Os comportamentos saudáveis são racionalmente determinados pela percepção das pessoas em relação às ameaças da saúde. A estas percepções, o indivíduo atribui um valor, que o leva a acreditar, ou não, na eficácia das acções tendentes à melhoria da sua saúde. Em função destas crenças, é possível predizer diferentes comportamentos relacionados com a saúde, a nível da prevenção e promoção da saúde. As várias percepções referidas anteriormente podem ser influenciadas por variáveis demográficas (idade, raça, sexo, etnia), psico – sociais (personalidade, classe social, grupos de pressão), estruturais (conhecimento que o indivíduo tem da doença e contactos anteriores com a mesma). Por volta dos anos 80, com o aparecimento de várias doenças relacionadas com os comportamentos e atitudes dos indivíduos, os programas de educação para a saúde, baseados em teorias de mudança de atitudes e comportamentos, passaram a valorizar as relações existentes entre o conhecimento, convicções e normas sociais. Embora o conhecimento seja uma condição necessária, para que se processe mudança de certa prática ou comportamento, outras variáveis como a atitude terão de ser mudadas para que um determinado comportamento nocivo seja alterado para um saudável (Carvalho, 2002). Actualmente, a educação para a saúde não tem como finalidade única, modificar comportamentos ou hábitos relacionados com os problemas de saúde, visa sobretudo uma maior responsabilidade individual e colectiva nas opções relativas à saúde e bemestar (Pestana, 1996). Não existe uma definição única de educação para a saúde, sendo que o traço comum implícito em todas como um processo de ensinoaprendizagem que orienta para mudanças favoráveis. Nas diferentes concepções, educação para a saúde, é descrita como um valor; toda a educação pretende ajudar o educando a adquirir conhecimentos (saber), a desenvolver a sua personalidade (saber ser), a saber fazer (práticas). Para isto é necessário que o educando compreenda, analise, seja capaz de reflectir, avaliar e adquirir competências ou habilidades (San Martín, Pastor, 1988 cit in García Martínez, 2000). A educação para a saúde deve ser uma prática contínua, não deve estar focalizada em dar informação e mudar comportamentos. Quando apropriada, respeita o direito à diferença em relação às escolhas individuais, realidades culturais, sociais, familiares, profissionais, formas de comunicar, crenças e expectativas, permitindo a interacção dos saberes e representações, autonomizando indivíduos, grupos e comunidades nas escolhas que diariamente é necessário fazerem-se, incutindo um caracter reflexivo, partilhado e não directivo ou imposto. A Educação para a Saúde é uma estratégia da Promoção da Saúde, tradicionalmente associada à transmissão de conhecimentos ou prescrições, no sentido de prevenir a doença. No entanto, o seu conceito e prática têm vindo a modificar-se como referido anteriormente. Considera-se, hoje, que a educação para a saúde deve ser perspectivada como um processo pedagogicamente orientado para o desenvolvimento de competências individuais e colectivas que facilitem a tomada de decisões informadas, autónomas e responsáveis em defesa da saúde (Pestana, 1996). Para que se conseguir pôr em acção estas práticas educativas vários são as teorias e modelos que contribuem para as mudanças de atitudes, é no que fazem ou não fazem, que reside a maior possibilidade de melhorar a saúde. Uma ideologia do “dever da saúde” permeia, assim, a passagem do indivíduo passivo para o indivíduo responsável. Vamos de seguida apresentar algumas teorias e modelos que têm vindo a ser mais usados, aos diferentes níveis de intervenção de educação para a saúde, com indivíduos, grupos e comunidades. Não é nossa intenção descrever todos os modelos que compõem as diferentes gerações, limitamo-nos a descrever concepções e modelos que serviram de apoio para a construção do nosso estudo e instrumento de colheita de informação. 2.1 - TEORIAS E MODELOS DE EDUCAÇÃO PARA A SAÚDE Os indivíduos são uma das unidades básicas da teoria da educação para a saúde. De forma a explicar o comportamento humano e influenciá-lo, os profissionais preocupados com comportamentos saudáveis têm que compreender o indivíduo. O desenvolvimento da educação para a saúde emerge de modelos que ajudam no planeamento dos programas de educação para a saúde, fundamentando-se em teorias sobre as perspectivas individuais, interpessoais e da comunidade. Existem várias concepções de modelos de educação para a saúde, uns apoiam-se ou fundamentam-se nos objectivos que seguem, outros nas dimensões que abrangem e ainda outros nas técnicas que utilizam (Navarro, 2000). De acordo com Moreno et al, (2000) as variações nas diferentes concepções coincidem com mudanças sociopolíticas, a evolução da nosologia e dos factores de risco. Por outro lado, todas elas parecem desenvolver-se apoiadas por um “foco de atenção” (Santos, 2000). No sentido de melhor ilustrar estas diferentes classificações parece útil fazer referência às três etapas evolutivas da educação para a saúde, descritas por (Moreno et al, 2000). Quadro 2 - Gerações de Educação para a Saúde Geração Conceito de 1ª Geração 2ª Geração 3ª Geração Ausência de doença Objectivo vital Recurso vital Proporcionar informação: Adquirir habilidades Desenvolver capacidades normas e condutas benéficas para a saúde de análise Transmissão de Promover novas condutas Participação e Educação para a Saúde Objectivos Metodologia Práctica conhecimentos. interacção. Paternalismo Aprendizagem contextual Unidireccional Educativa Papel Educador Prescritivo Unidireccional controlada Bidireccional, procura a pela tecnologia autonomia das pessoas Controlador do processo Mediador da comunidade aprendizagem Papel Educando Passivo Passivo em função do Participativo. A acção conhecimento. educativa não faz sentido Activo em função do sem o protagonista prescritivo Fonte: Adaptado de Moreno et al, 2000 A primeira geração da educação para a saúde é referenciada de “Educação para a Saúde Informativa”. Este modelo identifica-se com uma linha autoritária, e outra democrática. A primeira obriga o indivíduo a seguir normas para uma boa saúde e, democrática, reclama o uso de uma informação neutra. Em todo o caso trata-se de um processo de transmissão de conhecimentos, com intenção “prescritiva”, numa concepção bancária de educação. A esta geração corresponde o “foco divulgativo” do princípio que a informação é determinante para a mudança de atitudes, da qual resulta a mudança de comportamentos. As práticas de educação para a saúde baseadas neste modelo são influenciadas pelo modelo biomédico de saúde, centradas no ensinar como processo de comunicação de conhecimentos, direccionada para a prevenção e tratamento de doenças, cimentadas em prescrições e recomendações, de profissionais de saúde, recorrendo a uma metodologia autoritária ou paternalista, unidirecional, decidindo o sentido da mudança dos indivíduos (Santos, 2000). O conceito de saúde subjacente a este foco é um conceito redutor fundamentando-se, quase e exclusivamente nos aspectos biológicos da doença. Este modelo, actualmente, está desacreditado, “na realidade está perfeitamente demostrado que a informação, por si só, não é geradora de atitudes e que os comportamentos relacionados com a saúde dependem de um grande conjunto de atitudes de vária ordem, das quais, uma pequeníssima parte se relaciona com a saúde” (Kemm 1991, cit in Navarro 2000, p.16). “Educação para a Saúde centrada no comportamento” corresponde o “foco comportamental”, e abrange os modelos com a finalidade de modificar comportamentos/problema. A saúde é descrita como resultado do comportamento individual, determinado por estímulos do meio onde está inserido. O processo educativo centra-se na aprendizagem com a finalidade de promover mudanças de comportamentos. A educação para a saúde passa a ser interpretada como um processo a aplicar a pessoas ou grupos com comportamentos/problema. Este tipo de intervenção foi sobretudo desenvolvido nos anos 60, devido à necessidade de se encontrar respostas para a morbilidade elevada relacionada com a patologia cardiovascular e oncológica associada a estilos de vida não saudáveis (Moreno et al, 2000). O seu desenvolvimento centra-se sobretudo na promoção de comportamentos saudáveis, a informação é apenas uma parte do processo. Neste sentido, inicia-se a discussão sobre os factores intervenientes no processo educativo (sociais, culturais e a análise das motivações e resistências) e exploram-se as características a privilegiar nos instrumentos educativos propensos às mudanças, centrados nos comportamentos dos indivíduos. Santo (2000) faz uma crítica a este “foco comportamental”. Tratando-se de uma abordagem adaptativa, em que o objectivo é atingir a melhor adaptação ao meio, esta geração coloca o indivíduo numa posição reducionista. Os estudos são centrados no comportamento e negligenciam-se as outras dimensões humanas. Para se considerar uma intervenção de educação para a saúde com carácter formativo devem-se trabalhar os processos cognitivos e atitudicionais, que permitam a modificação do comportamento, tornando uma acção consciente, racional e voluntária. A primeira geração apoia-se nos modelos informativos, considera que a informação é o elemento essencial de todo o processo educativo. De acordo com Amorim (1999) é vulgarmente aceite que os modelos informativos sofrem influência do modelo biomédico, centrando-se sobretudo na prevenção da doença aos níveis da prevenção primária, secundária e terciária persuadindo o indivíduo a escolher estilos de vida que reduzam o risco de contrair doenças e ou facilitar a sua recuperação. O conceito de saúde que subejaz a estes modelos é um conceito negativo, patogénico, entendido como “ausência de doença” (García Martínez et al, 2000). O aparecimento dos modelos de 2ª geração mudou a intervenção da educação para a saúde de forma significativa. Estrutura-se uma abordagem mais globalizante como a opção por estilos de vida saudáveis e desvalorizando o simples aconselhamento clínico, fomentando-se na negociação e na colaboração, de modo a que os indivíduos possam ser informados e ajudados a tomar decisões livres e conscientes. Esta geração é mais inovadora, apoia-se nos modelos que se centram no comportamento dos indivíduos, dando, especial importância ao papel dos estímulos ambientais e às consequentes respostas observáveis. O seu desenvolvimento apoiou-se em várias teorias da aprendizagem, nas que explicam as mudanças de comportamentos e atitudes. Propõe um alargamento dos princípios de aprendizagem de forma a incluir o processo cognitivo. A atitude, pode ser definida como “posição mental...relativamente a uma ideia, objecto ou pessoa” (Gleitmon, 2002, p. 562) ou prespectivada como “gostos e aversões, frequentemente expressos como declarações de opinião” (Bennett; Murphy, 1999, p. 49). Toda a atitude é uma combinação de crenças, sentimentos, avaliações e uma predisposição para agir em conformidade. Pensa-se que as atitudes têm influência sobre os comportamentos. A atitude é uma predisposição (favorável ou desfavorável) para com um determinado acto, que pode ser a saúde. As atitudes aprendem-se ao longo da vida, podem ser medidas recorrendo-se a escalas. Desta forma têm tido grande interesse, para o estudo da problemática de educação para a saúde (Bennett; Murphy, 1999). Os modelos que melhor a caracterizam são o modelo de comunicação persuasiva. A terceira geração é designada de “Educação para a Saúde Crítica”. Foi impulsionada pela Declaração de Alma-ata (Programa de saúde para todos no ano 2000). Nela preconiza-se a participação comunitária, vista como um conjunto de processos através dos quais os indivíduos e as famílias assumem responsabilidades para a sua própria saúde e bem-estar, aumentando a capacidade de contribuir para o desenvolvimento individual e colectivo. Esta perspectiva vai emergindo lentamente, resultando das limitações das duas gerações anteriores, apoiando-se numa cultura social e democrática, propondo alternativas de mudanças sociais, na tentativa de reduzir as desigualdades e potenciar a participação comunitária (Moreno et al, 2000). Estes modelos são citados de modelos críticos e participativos. Caracterizam-se pela interacção dialéctica entre os indivíduos e a sua realidade, incluindo a tomada de consciência social, gerando a participação do indivíduo e do grupo ou comunidade. Pensa-se que o reconhecimento de um certo fracasso, está focalizado nas mudanças de comportamentos individuais, realizando-se uma proposta de mudança social. Preocupam-se com os processos de interacção entre as pessoas e a realidade, incluindo a tomada de consciência social, procurando a participação do indivíduo e do grupo (Moreno et al, 2000). Nestes modelos, o processo de educação para a saúde emerge dos princípios democráticos e de negociação. É decisão do grupo quais são os temas prioritários, quem são os indivíduos que vão participar, ou seja, leva-se a cabo o processo a partir da realidade e não recaindo sobre ela. Desta forma, a educação para a saúde desenvolve-se em situações socialmente vivenciadas, nas quais o educador se envolve, desempenhando o papel de guia, ajudando a formular os objectivos e a sua concretização (Moreno et al, 2000). Na figura 5 apresenta-se sumariamente os modelos que se integram as diferentes gerações da educação para a saúde. Figura 5 - Modelos de Educação para a Saúde 1ª Geração Modelos informativos Behaviorismo Condicionamento clássico Condicionamento operante Condicionamento vicário Cognitivismo Aprendizagem significativa 2ª Geração Atitude Modelo de Fishbein e Ajzen Comunicação Persuasiva Motivação Modelos Próprios Educação para a Saúde Modelos de crenças na saúde Modelo PRECEDE 3ª Geração Investigação acção participativa Das diferentes gerações, na opinião de García Martínez et al (2000), deduzem-se três tendências da educação para a saúde: - Tendência curativa – baseada no que hoje é considerado como uma apreciação negativa de saúde (ausência de doença), só actua quando a doença se manifesta, e com uma perspectiva individualista do seu tratamento; - Tendência preventiva – justifica-se num conceito positivo de saúde e norteiase no sentido da prevenção da doença. Esta tendência leva-nos a acredita de que as pessoas que recebem informação adoptam comportamentos e estilos de vida que asseguram a saúde, o que pressupõe conhecimento conduzindo à adopção de comportamentos e práticas ditas saudáveis; - Tendência de promoção – também se apoia num conceito positivo de saúde. É vista como um processo de persuadir as pessoas a aumentar o controlo da sua saúde, o que pressupõe novos factores que lavam a estilos de vida saudáveis e a reduzir aqueles que se consideram prejudiciais para a saúde, mediante o acordo de medidas políticas e educativas dirigidas a indivíduos e comunidades. Todas as teorias gerais da motivação orientam para as várias situações de aprendizagens (Slavin, 1994, cit in Redman, 2003). Na corrente behaviorista, a motivação está relacionada com o reforço de comportamento e com a personalidade, referindo que a motivação é uma tendência para se esforçar em direcção a determinadas metas como afiliação ou realização. As teorias de expectativa da motivação afirmam que a motivação de uma pessoa para alcançar uma determinada meta depende da percepção de mudança que possuem do sucesso, bem como do valor que atribuem a esse mesmo sucesso (Redman, 2003). A motivação é algo que activa e orienta a conduta de acordo com as crenças de saúde. Os modelos de educação para a saúde que pertencem à 3ª geração têm vindo a emergir lentamente, surgindo das limitações dos modelos das gerações anteriores. Apoiam-se numa cultura social e democrática. Sugerem alternativas de mudanças sociais, na tentativa de reduzir as desigualdades e potenciar a participação comunitária. Estes modelos são citados na literatura de modelos críticos e participativos. Caracterizam-se pela interacção dialéctica entre os indivíduos e a sua realidade, incluindo a tomada de consciência social, gerando a participação do indivíduo e do grupo ou comunidade. Pensa-se que o reconhecimento de um certo fracasso, está focalizado nas mudanças de comportamentos individuais, realizando-se uma proposta de mudança social. Preocupam-se com os processos de interacção entre as pessoas e a realidade, incluindo a tomada de consciência social, procurando a participação do indivíduo e do grupo (Moreno et al, 2000). Modelo de crenças de saúde O modelo de crenças de saúde constitui uma referência teórica para explicar e predizer uma grande variedade de comportamentos de saúde. Parte do pressuposto que existem mediadores cognitivos (crenças) que interagem entre si, para produzir mudanças comportamentais. É um modelo usado para compreender o que leva os indivíduos a fazer ou não uma tão grande variedade de acções quanto à saúde. Não menos importante é a “disposição para a acção” que pode ser entendida como a atitude do indivíduo perante a possibilidade de fazer qualquer acção em prol da sua saúde. O indivíduo pode perceber os benefícios, as barreiras, a sua susceptibilidade e a gravidade da doença, mas se atribui pouco valor à saúde, o grau de adesão a uma acção proposta acaba por ser baixa, logo a disposição para essa acção pode ser nula. Ao longo dos anos, vários autores têm contribuído para a clarificação deste modelo, Becker, na década de 70, postula que um indivíduo toma uma decisão com vista a um comportamento saudável quando esta é determinada, fundamentalmente, por quatro variáveis psicológicas: a) Percepção da susceptibilidade a determinada doença; b) Percepção da gravidade da doença; c) Percepção dos benefícios de determinadas acções; d) Percepção das barreiras a essas acções (Conner & Norman, 1994). Os comportamentos saudáveis são racionalmente determinados pela percepção de vulnerabilidade das pessoas às ameaças à saúde. A estas percepções, o indivíduo atribui um determinado valor, que o leva a acreditar, ou não, na eficácia das acções tendentes à melhoria da sua saúde. Em função destas crenças, é possível predizer diferentes comportamentos relacionados com a saúde, a nível da prevenção e promoção da saúde. Modelo PRECEDE O desenvolvimento da educação para a saúde, emerge de esquemas ou modelos que ajudam no planeamento dos seus programas, fundamentando-se em teorias sobre as perspectivas individuais, interpessoais e comunidade/população, proporcionando aos educadores de saúde esquemas prontos a utilizar no processo da educação para saúde. Um desses modelos é o modelo PRECEDE de Green e seus colaboradores de 1980, também o referencial escolhido para o nosso estudo pelas suas características por ser um modelo referenciado para diagnosticar e planear práticas educativas, saúde, partindo do princípio de que um problema social ou a qualidade de vida de uma pessoa podem ser influenciados por factores comportamentais e/ou não- comportamentais. Neste contexto, o uso do modelo PRECEDE proporciona percepções específicas no que diz respeito à avaliação, bem como conduz a um alvo altamente focalizado para as intervenções pertinentes. A importância da utilização de um referencial metodológico para o desenvolvimento programas de educação em saúde está em privilegiar efetivamente os princípios de participação da populaçãoalvo, favorecendo a discussão racional das controvérsias de grande interesse (Green et al, 1980). Este modelo é composto por sete fases, denominadas de: diagnóstico social, diagnóstico epidemiológico, diagnóstico comportamental e ambiental, diagnóstico educacional, ordenação e organização, diagnóstico administrativo e avaliação. Na primeira fase, designada de fase de diagnóstico social, procede-se à determinação das percepções que as pessoas têm de suas próprias necessidades ou qualidade de vida e suas aspirações para o bem comum de modo a atingir metas sociais, econômicas, culturais e ambientais desejadas. A finalidade desta fase é estabelecer um consenso sobre as prioridades. Importante salientar que os problemas de saúde não são definidos apenas pelas percepções da comunidade, mas através da utilização de dados epidemiológicos e clínicos determinados em rigorosas investigações científicas. A segunda fase é intitulada de diagnóstico epidemiológico que tem por objetivo estudar os problemas referidos pela população-alvo sob o ponto de vista epidemiológico. Nesta fase é importante determinar dois aspectos: quais os problemas de saúde que interferem na qualidade de vida desta população e que têm magnitude epidemiológica e quais os factores ou causas ambientais ou comportamentais que contribuem para a ocorrência desses problemas. Após a determinação desses aspectos, é essencial categorizar os problemas de saúde encontrados e selecionar aquele que mereça intervenção educacional. Na fase 3 - diagnóstico comportamental e ambiental - os investigadores identificam e analisam os dados que levam ao diagnóstico das causas do comportamento, os factores ambientais e sua ligação com os problemas que foram identificados no diagnóstico social e epidemiológico. A finalidade desta terceira fase é estabelecer as causas comportamentais que interferem no problema de saúde utilizado para intervenção educacional. Os factores ambientais são definidos como aqueles externos ao indivíduo e que podem ser modificados para apoiar o comportamento saudável. À fase 4 corresponde o diagnóstico educacional, onde se identificam os comportamentos relacionados ao estado de saúde ou qualidade de vida e que interessam aos investigadores e aos idosos diabéticos por fornecerem pistas para a descoberta das suas causas. São identificados os factores que podem ser alterados e que podem sustentar o processo de mudança dos factores ambientais e comportamentais, factores ditos predisponentes (conhecimentos, atitudes, valores, percepções), factores facilitadores (aspectos pessoais e recursos da comunidade que permitam ao indivíduo ter um comportamento desejado) e os factores reforçadores, onde se engloba tudo o que possa contribuir para a manutenção de um comportamento. Os factores que predispõem são aqueles antecedentes do comportamento que suprem a racionalidade ou motivação para que o comportamento exista, tais como as habilidades, os conhecimentos exigidos para a ocorrência de um comportamento desejado, as atitudes, as crenças, os valores e as percepções. Estes factores facilitam ou limitam a motivação pessoal para mudança. Dentre os factores predisponentes, destacam-se o conhecimento, as crenças e as atitudes. Qualquer comportamento adoptado pode ser explicado em função da influência destes factores. Ocasionalmente ocorrem excepções, decorrentes de forte motivação, que podem suprir a deficiência de recursos ou recompensas. O comportamento fortemente recompensado pode ocorrer na ausência de crenças pessoais a respeito do seu valor. A fase 5 corresponde à ordenação e organização dos factores identificados na fase anterior. É ainda, nesta fase, que se planifica a avaliação das atitudes dos utentes, dos recursos e práticas de saúde. Segue-se a fase 6, diagnóstico administrativo, onde são incluídos todas as componentes de um programa: objectivos, conteúdos, recursos materiais entre outros. Esta fase caracteriza-se pela capacitação e supervisão de profissionais envolvidos no programa educativo a ser implementado. A fase 7 corresponde à avaliação do programa, mais concretamente o impacto produzido e os seus resultados, ou seja, o trabalho que abarca o modelo como um todo. O modelo PRECEDE preconiza três níveis pelos quais um programa de educação em saúde pode ser avaliado: avaliação do processo; avaliação do impacto e avaliação dos resultados. A avaliação do processo fornece informações sobre a implementação e administração do programa educativo. A avaliação do impacto considera a influência do programa na modificação de conhecimentos, de atitudes e de comportamentos do público-alvo. E a avaliação dos resultados estima os efeitos reais sobre a saúde da populaçãoalvo, produzidos pelo programa. Estes efeitos estão relacionados com a redução das taxas de morbidade e mortalidade e dos índices de incidência e prevalência da doença (Green et al., 1980). Vários são os estudos que demonstraram a eficácia do modelo PRECEDE, quanto à sua aplicabilidade no planeamento de programas educativos como sendo os estudos de Ferreira (1999) e Colombo (2000), dentre outros. O estudo de Ferreira (1999) observou uma diferença significativa entre o conhecimento teórico em relação à dieta e a prática dos pacientes, sendo que eles tinham pouco conhecimento, mas executavam a dieta com poucos erros. Já o estudo de Colombo (2000) concluiu que para determinação dos factores de risco para a doença coronária é essencial o planeamento de uma acção educativa. Este modelo apresenta vários passos a respeitar no planeamento de uma intervenção de educação para a saúde, ver figura 6. Figura 6 – Modelo PRECEDE Outra conduta Outra conduta Maus Antecedentes (indícios prévios) Más (castigos) Conduta Bons Consequências Boas (recompensas) Diagnosticar os factores predisponentes e reforçadores Seleccionar o problema de comportamento Estabelecer prioridades entre os problemas Fonte: Adaptado Moreno e tal, 2000 Na sequência do que se tem vindo a referir, no dizer de alguns autores, a educação para a saúde pode ser conceptualizada, como toda e qualquer combinação de experiências de aprendizagens planeadas, com a vista ajudar os indivíduos em mudanças voluntárias e conscientes, com a finalidade de lhes permitir experiências de aprendizagens a diferentes níveis, que lhes permitam integrar aspectos cognitivos (conhecimentos), afectivos (atitudes e valores) e psicomotores (capacidades) do comportamento de modo a adquirir comportamentos saudáveis, indo de encontro com atitudes promotoras da saúde. Com intervenções educativas, na área da educação para a saúde, pode-se ajudar os indivíduos adoptarem comportamentos mais saudáveis se forem definidos objectivos adequados. Estes devem descrever de uma forma “clara e precisa, o que o formando deve ser capaz de ficar a saber, saber fazer, saber ser, no fim de um momento do processo de aprendizagem” (Ferrão, 2000, p. 123). Como se tem vindo a referir uma intervenção educativa deve provocar modificação nos diferentes domínios da aprendizagem: Cognitivo, afectivo e psicomotor. A compreensão destes três domínios de aprendizagem é crucial para implementar educação para a saúde de forma eficaz (Lancaster et al, 1999). O domínio cognitivo é o nível onde é aprendido e armazenado o conhecimento básico, diz respeito à memória, reconhecimento e compreensão. É considerado a parte mais objectiva do processo da aprendizagem, onde se agregam as experiências e percepções prévias. Durante este processo o indivíduo constrói relações entre experiências anteriores e os novos conceitos, para formular novos significados. Para que a educação para a saúde se torne eficaz, o educador tem de, em primeiro lugar, avaliar as capacidades cognitivas do educando para que as expectativas e planos do educador sejam dirigidos para a fase correcta. Ensinar acima ou abaixo do nível de entendimento do utente leva a frustração e desânimo (Lancaster et al, 1999; Bruceclayton & Stock, 2002). O domínio afectivo é o procedimento que reflecte sentimentos, valores, crenças, necessidades e opiniões. Descreve mudanças nas atitudes e no desenvolvimento de valores, sendo assim, considerado a parte mais inatangível do processo de aprendizagem, pois, cada indivíduo vê e interpreta os acontecimentos de forma diferente. O educador deve ter a capacidade para avaliar e não julgar os educandos e estabelecer uma relação de confiança. Deve também ponderar o que o indivíduo, a família ou mesmo a comunidade pensam, estimam e sentem. Deste modo, o educador deve envolver o indivíduo no processo, para obter o seu ponto de vista em relação à solução dos problemas. (Lancaster et al, 1999; Bruceclayton et Stock, 2002). O domínio psicomotor envolve a aprendizagem de um novo procedimento, designado o domínio da realização. Ao avaliar a capacidade do utente para adquirir a destreza pretendida, o educador deve avaliar a capacidade física, intelectual e emocional do educando. A aprendizagem é habitualmente efectuada pela demonstração de um procedimento ou tarefa, podendo-se recorrer a uma demonstração passo a passo, com uma demonstração de retorno pelo educando, para solidificar e avaliar o grau de desempenho alcançado (Lancaster et al, 1999; Bruceclayton et Stock, 2002). É difícil mudar qualidades profundas fixadas tais como valores, atitudes, crenças e interesses. É papel importante do enfermeiro fazer educação para a saúde de modo a que se processem mudanças para alentar novos comportamentos de forma a promover uma vida saudável e prevenir complicações em doenças crónicas como sendo a Diabetes Mellitus e mais concretamente o Pé Diabético. 3 - ACTUAÇÃO DA ENFERMAGEM NA DIABETES Os cuidados de saúde exigem a colabração entre utentes e profissionais de saúde de modo a existir uma comunicação aberta e honesta a respeito dos valores pessoais e profissionais. Os profissionais de saúde devem assegurar que a ética dos cuidados respeita o papel dos doentes na tomada de decisão sobre o tratamento e outros aspectos da prestação de cuidados. Segundo o National Diabetes Education Program, (1998), o programa de educação para a saúde ao doente diabético tem como objectivos: aumento da consciência pública da seriedade da diabetes, factores de risco e prevenção; promoção eficaz de autocontrolo, melhoria dos conhecimentos dos profissionais de saúde e promoção de políticas que melhorem a qualidade e o acesso aos cuidados. Viver bem coma diabetes exige uma adaptação psicossocial para conseguir um autocontrolo eficaz da doença, para isso, o diabético tem que obter conhecimentos e atitudes sobre a própria doença. Segundo a American Association of Diabetes Educators (1999) o ensino de diabetes é definido como um processo interactivo, colaboarador e contínuo implicando o diabético e o formador, sendo também considerado uma modalidade terapêutica importante dos cuidados ao diabético e suas famílias. O papel principal do enfermeiro em diabetes é fornecer uma experiência terapêutica acessível aos doentes, suas famílias para melhorar os resultados em saúde e a sua qualidade de vida. O alcance geral da prática de um enfermeiro formador em diabetes possui dimensões mutáveis devido à natureza multidisciplinar dos profissionais de saúde e às mudanças dos sistemas de saúde. Segundo a American Association of Diabetes Educators (2000), para assegurar a qualidade na prática profissional do ensino ao diabético, existem padrões a seguir sendo eles: apreciação, uso de recursos, planeamento, implementação, documentação, avaliação e resultados. - Apreciação - o formador em diabetes deve fazer uma avaliação cuidadosa e individualizada das necessidades com a participação do diabético e família. A avaliação das necessidades deve incluir: a história do doente e história clínica; uso de medicação; apoio familiar e social; ensino anterior de diabetes, conhecimento real e competências; práticas habituais de controlo de autocuidado; uso de sistemas de prestação de cuidados; factores físicos e psicossociais incluindo a idade, mobilidade, destreza manual, acuidade visual, capacidade de atenção e de concentração; factores que influenciam a aprendizagem, motivação para aprender e crenças de saúde. - Uso de recursos - deve esforçar-se para criar um contexto educacional que conduza à aprendizagem, proporcionando serviços acessíveis; - Planeamento - O plano educacional deve ser desenvolvido a partir de informação obtida na avaliação das necessidades, centrado no diabético e família; - Implementação – Deve fornecer serviços acessíveis e proporcionar ensino individualizado sempre progressivo para o controlo do autocuidado e melhoria dos resultados; - Documentação – O formador deve documentar completa e rigorosamente o ensino com registos e as estratégias comportamentais, fornecendo desta forma dados para análise científica e económica e também, servindo de dados para a continuidade dos cuidados; - Avaliação e resultados – A avaliação sendo dirigida aos resultados e à melhoria da qualidade deve ocorrer periodicamente. Deve usar medidas de resultados como custo/eficácia, mudanças de sistemas de prestação de cuidados, mudanças no conhecimento, atitudes, capacidades e comportamentos (avaliação de glicemia, cuidados com os pés) e mudanças nas crenças de cuidados de saúde. Na fase de avaliação de necessidades, o enfermeiro determina a natureza das necessidades identificadas bem como da motivação para aprender, definindo os objectivos com o indivíduo. A avaliação ao longo de todo o processo de educação para a saúde deve ocorrer em intervalos periódicos, para verificar se os objectivos estão a ser alcançados e se há necessidade de re-ensino, acompanhamento e, ou reformulação de estratégias de aprendizagem para alguns indivíduos, especialmente em indivíduos com problemas crónicos de saúde, como ocaso de doentes com risco de desenvolver Pé Diabético (Redman, 2003). Um formador em diabetes é definido como um profissional de saúde que adquiriu especialidade naquilo que é essencial para o conhecimento e competências nas ciências biológicas e sociais, comunicação, aconselhamento e ensino e que tem experiências dos cuidados a pessoas com diabetes. O papel do formador em diabetes no âmbito da prática possui dimensões mutáveis devido à natureza multidisciplinar dos profissionais de saúde e à mudança dos sistemas de saúde. O enfermeiro pode ajudar o diabético, utilizando-se de qualquer um ou de todos os métodos, de modo a oferecer assistência com o autocuidado. Autocuidado é o desempenho ou a prática de atividades que os indivíduos realizam em seu benefício para manter a vida, a saúde e o bem-estar. Quando o autocuidado é efetivamente realizado, ajuda a manter a integridade estrutural e o funcionamento humano, contribuíndo para o desenvolvimento humano (Orem-1991). Refere ainda a autora que autocuidado é a prática das ações que os indivíduos iniciam e executam pôr si mesmos para manter, promover, recuperar e/ou conviver com os efeitos e limitações dessas alterações de saúde, contribuindo para sua integridade e funcionamento. O conceito de autocuidado de Orem possui uma aplicação pragmática na prática de enfermagem, oferece uma maneira singular de ver o fenômeno de enfermagem. Continuando na linha de pensamento de Orem, quando um doente apresenta déficit de auto cuidado a enfermagem mostra o quanto ela é necessária. Isto ocorre quando as habilidades do indivíduo de autocuidado são insuficientes para satisfazer as suas necessidades. Neste caso, o enfermeiro actua como provedor de autocuidado, estabelece o plano de ação junto do doente, delegando a sua responsabilidade, a do doente e a de outros profissionais, para que as necessidades sejam satisfeitas. A estratégia educativa do autocuidado baseia-se em facilitar as mudanças das pessoas no estádio da sua história pessoal, familiar e social, ou seja, a informação dada que sugere mudança, só terá êxito quando a pessoa tem suficientes motivos para realizar essa mudança. A teoria de Orem (1991) é formada por três construtos teóricos: teoria do autocuidado; teoria das deficiências autocuidado e a teoria dos sistemas de enfermagem. O primeiro construto engloba o autocuidado, a sua actividade, a sua exigência terapêutica, assim como os requisitos para o autocuidado. Quando existe deficiência o enfermeiro pode ajudar o indivíduo, utilizando um ou todos os métodos de modo a oferecer assistência com autocuidado através de cinco métodos de ajuda: agir ou fazer para o outro; guiar o outro; apoiar o outro; proporcionar um ambiente que promova o desenvolvimento pessoal quando se torna incapaz de satisfazer causas futuras ou actuais de acção; e por último ensinar o outro. A teoria de Sistemas de Enfermagem, em que o sistema de enfermagem, se baseia nas necessidades de autocuidado e nas capacidades do doente em executar as actividades desse autocuidado. Orem identificou três classificações de sistemas de enfermagem para satisfazer os requisitos de autocuidado: - O sistema de enfermagem totalmente compensatório que está representado por uma situação em que o indivíduo é incapaz de “empenhar-se naquelas acções de autocuiaddo que exigem locomoção autodirigida e controlada e movimento manipulativo, pessoas socialmente dependentes dos outros para continuação da sua existência e bem-estar. - O sistema de enfermagem parcialmente compensatório que está representado por uma situação em que tanto o enfermeiro quanto o paciente executam medidas ou outras acções de cuidado que envolvem tarefas de manipulação ou de locomoção. - O sistema de apoio-educação, em que a pessoa consegue, pode e deve aprender a executar medidas de autocuidado terapêutico de ordem interna ou externa, apesar de não conseguir sem auxílio. As exigências do doente resumem-se à tomada de decisão, controlo de comportamentos e habilidades. O papel do enfermeiro é o de promover a pessoa a um agente de autocuidado e corroborando Orem os indivíduos possuem potencial para aprendizagem e o desenvolvimento. A maneira pela qual um indivíduo satisfaz as suas necessidades de autocuidado não é intuitiva, trata-se de um comportamento aprendido. Os factores que afectam a aprendizagem incluem a idade, a capacidade mental, a cultura, a sociedade e o estado emocional do indivíduo e se a pessoa não consegue aprender medidas de autocuidado, outros devem aprender e promovê-los (Orem 1985). Na diabetes, a forma como os doentes são educados a gerir a sua doença reflecte-se directamente no tratamento e na prevenção das complicações, pois, é através dessa educação que o diabético aprende a viver com a sua doença, mantendo um quotidiano compatível com uma boa qualidade de vida (Graça, 2001). De facto, vários trabalhos sobre a importância da educação do paciente no conhecimento, nos comportamentos de autocuidado e no controlo metabólico evidenciaram resultados positivos (Brown, 1988). Actualmente, os programas de autocontrolo da diabetes têm, como objectivo principal, promover a aquisição de poder por parte do diabético, em detrimento do mero cumprimento do regime terapêutico (Redman, 2001). Estes programas, tendo em conta o impacto que a diabetes tem na vida do doente, apostam na auto-eficácia do diabético, de modo a capacitá-lo a identificar e estabelecer objectivos realistas, resolver problemas, gerir o stress inerente à doença e mobilizar recursos sociais adequados. Isto porque, segundo Gagliardino e Etchegoyen (2002), uma das razões para os fracos resultados na diabetes é a falta de participação no tratamento, sendo esta o factor chave de sucesso que exige motivação, conhecimentos e adesão a um regime complexo e difícil em termos de estilo de vida. Abordando a educação numa perspectiva economicista, o investimento na educação do diabético também parece trazer benefícios, pois reduz o pesado fardo socioeconómico que esta patologia acarreta. Isto porque, como já referido, o controlo desta doença, especificamente o controlo da glicemia, reduz significativamente o risco das suas complicações. Vários foram os trabalhos que demonstraram que a educação no diabético conduziu a uma redução dos custos (American Diabetes Association, 2003; Boavida, 2001; Gray et al., 2001). Orem (1991) define a enfermagem como serviço humano, um modo de auxiliar homens, mulheres e crianças e não um produto que pode ser tocado. É uma acção voluntária, uma função da inteligência prática dos enfermeiros, de acusar condições humanamente desejadas nas pessoas e seus ambientes. A enfermagem difere de outros serviços humanos pala maneira como focaliza os seres humanos. As actividades de enfermagem são para a autora habilidades especializadas que capacitam enfermeiros a promover cuidados de enfermagem a indivíduos ou unidades multipessoais, conceitualizadas como uma unidade. Partindo de todo este suporte teórico, passaremos a uma análise empírica acerca de todos estes aspectos referenciados, através da apresentação, análise e interpretação dos dados do estudo realizado. SEGUNDA PARTE – METODOLOGIA 1 - FINALIDADES/OBJECTIVOS DO ESTUDO Considerando-se que o idoso portador de Diabetes Mellitus pode contribuir através do auto-cuidado para a prevenção de úlceras dos pés e, dessa maneira, prevenir e/ou reduzir o número de amputações delas decorrentes, o presente estudo tem como finalidade identificar os factores de risco para para o desenvolvimento do Pé Diabético dos idosos com mais de 65 anos na área da prevenção. Pretendemos realizar uma investigação-acção, no sentido de responder a algumas questões fundamentais: - Quais são os comportamentos dos idosos diabéticos na prevenção do pé diabético? - Que conhecimentos têm os idosos diabéticos na área da prevenção do pé diabético? - Quais são os factores de risco que predispõem ao desenvolvimento do Pé Diabético nos idosos diabéticos da população estudada? - Quais são os comportamentos na área da prevenção do pé diabético que os idosos diabéticos modificam após uma acção educação para a saúde realizada pelos enfermeiros? - Quais são os conhecimentos, na área da prevenção do pé diabético, que os idosos diabéticos modificam após uma acção educação para a saúde realizada pelos enfermeiros? Dentro das complicações da diabetes, o Pé Diabético é a mais frequente e pode ser prevenido através da educação em saúde. Desta forma, os objectivos orientam-se no sentido de responder às questões formuladas anteriormente, sendo eles: - Descrever os comportamentos dos idosos diabéticos relacionados com os pés; - Descrever os conhecimentos dos idosos diabéticos relacionados com os pés; - Identificar os factores de risco dos idosos diabéticos estudados que predispõem ao desenvolvimento do Pé Diabético; - Determinar a efectividade da educação para a saúde realizada aos idosos diabéticos na mudança dos conhecimentos e comportamentos na área da prevenção. 2 - REFERENCIAL METODOLÓGICO No clima actual de rápidas mudanças nas práticas de cuidados de saúde é de importância vital identificar e resolver problemas clínicos da prática de enfermagem fornecendo oportunidade para implementar mudanças nos contextos da prática e simultaneamente avaliar o sucesso dessas mesmas mudanças. Os enfermeiros têm utilizado a investigação-acção na prática clínica em benefício dos cuidados aos doentes, tais como métodos de prestação de cuidados, mudança no estatuto de saúde em saúde comunitária e no desenvolvimento de novos papéis de enfermagem devido à aquisição de poder e à criação de ferramentas para uma maior eficácia. Carpenter (2002) refere que a investigação-acção é uma metodologia dos tempos actuais em que as mudanças nos cuidados de saúde são rápidos, daí o esforço dos profissionais de enfermagem para encontrarem soluções para os problemas através da implementação de mudança, observação e avaliação das mudanças durante a implementação. O investigador é membro activo da investigação, participando no planeamento, implementação e avaliação da acção com resultado numa mudança de uma prática de enfermagem mais significativa e encontrando respostas entre a teoria e a prática. Os investigadores mudam assim o seu comportamento, a sua organização ou a sua comunidade. Facilita formação reflexiva do profissional, promove o seu posicionamento investigativo face à prática e a sua própria emancipação (Moreira, 2001), tem revelado constituir uma intensificação da prática reflexiva, pois combina o processo investigativo e a reflexão crítica com a prática de ensino, tornando esta mais informada, mais sistemática e mais rigorosa. Segundo Ainscow (2000, cit. Sanches, 2005)), a investigação-acção obriga a que os próprios grupos-alvo assumam a responsabilidade de decidir quais as mudanças necessárias e as suas interpretações e análises críticas que são usadas como uma base para avaliar e decidir qual o próximo passo a dar no processo de investigação, o que aumenta a qualidade do processo e a eficácia do estudo. Usada na investigação qualitativa, não é entendida pelos tradicionalistas como “verdadeira” investigação, uma vez que está ao serviço de uma causa, a de “promover mudanças sociais” (Bogdan & Biklen, 1994, p. 292), e porque é um tipo de investigação aplicada no qual o investigador se envolve activamente. Neste contexto o nosso estudo é de natureza descritiva, onde analisamos os comportamento que podem trazer riscos para o desenvolvimento de problemas relacionados com os pés de pessoas diabéticas da Unidade de Saúde onde foi realizado o estudo, de modo a prevenir o Pé Diabético, o que faremos utilizando a metodologia de investigação-acção. Para verificar os objectivos propostos no presente estudo, utilizámos como referencial metodológico o Modelo Predisponing, Reinforcing and Enabling Causes en Educatinal Diagnosis and Evoluation - PRECEDE de Green e tal. (1980) pelas características atrás referidas com vista ao diagnóstico educativo e avaliação. Este modelo estabelece um método para a determinação de conteúdos de programas de educação em saúde, partindo do princípio de que um problema ou a qualidade de vida de uma pessoa podem ser influenciados por factores comportamentais e/ou não comportamentais e proporciona compreensões específicas no que diz respeito à avaliação. As informações obtidas nas primeiras quatro fases do modelo PRECEDE permitemnos determinar os conteúdos do programa educativo que acompanham as necessidades dos idosos diabéticos estudados. Apenas sentimos necessidade de usar 5 fases do Modelo, fase 1 - Diagnóstico social -, fase 2 - Diagnóstico epidemiológico -, fase 3 -Diagnóstico comportamental -, fase 4 - Diagnóstico educacional - e a última fase 7 – avaliação -, as quais passamos a relacionar com o nosso estudo. Para a obtenção dos dados correspondentes aos diagnósticos social e epidemiológico, fase 1 e 2 do modelo PRECEDE, construímos uma primeira fase da entrevista (Anexo 1) com questões abertas e fechadas contendo dados demográficos (sexo, idade, estado civil, apoio de outrem) e as características clínicas como sendo o tipo de diabetes, tempo de diagnóstico, tipo de tratamento, doenças associadas e exames laboratoriais e transcritas de seguida para a informação da grelha de observação para serem calculadas as percentagens (Anexo 2). Para a obtenção dos dados correspondentes às fases 3 e 4 do modelo PRECEDE construímos uma segunda parte da entrevista (Anexo 1), confirmar contendo variáveis comportamentais e educacionais que dizem respeito ao comportamento esperado pelos idosos diabéticos: higiene dos pés, corte das unhas, uso de calçado, remoção de calos, lavagem e secagem dos pés, hidratação dos pés, uso de calçado e meias adequados. Ainda na fase 4 do Modelo para a obtenção dos dados relacionados aos factores que podem predispor e possibilitar e reforçar o comportamento com os pés, a partir de três categorias analíticas, definidas a priori por nós. Os núcleos foram: o significado das complicações, advindas da diabetes mellitus; significado da importância dos cuidados com os pés; e as orientações recebidas dos profissionais. Para a fase 1, denominada diagnóstico social, em que a sua finalidade é estabelecer um consenso sobre as prioridades, ou seja, as causas ou os factores que interferem na qualidade de vida das pessoas. No presente estudo, o diagnóstico social foi investigado através dos dados demográficos e sociais (Sexo, Idade, Estado civil, Grau de instrução e apoio de outrem). A fase 2, diagnóstico epidemiolólgico, tem por objectivo analisar os problemas da população e após a sua determinação, é essencial categorizar os problemas de saúde encontrados e seleccionar aquele que mereça intervenção educacional. Nesta perspectiva, foi eleito por nós, como problema de saúde, o Pé Diabético e os aspectos relacionados com a sua prevenção. Para esta fase no nosso estudo, investigámos as características clínicas, tais como o tipo de diabetes, o tipo de tratamento, tempo de diagnóstico, doenças associadas ou complicações, exames laboratoriais e o risco de ulcerações nos pés. Na fase 3, diagnóstico comportamental e ambiental, identificam-se os comportamentos e analisam-se os dados que levam ao diagnóstico das causas do comportamento, os factores ambientais (definidos como aqueles externos ao indivíduo e que podem modificados para apoiar o comportamento saudável) e a sua ligação com os problemas que foram identificados no diagnóstico social e epidemiológico. O diagnóstico comportamental foi desenvolvido nesta investigação por meio da realização de uma entrevista e da utilização de uma grelha de observação, pelo que identificámos os comportamentos das pessoas diabéticas acerca dos cuidados com os seus pés, conforme referida anteriormente. A fase 4, diagnóstico educacional, onde se identificam e analisam os factores que podem ser alterados, ou seja, os factores que predispõem, possibilitam e reforçam comportamentos de riscos para o desenvolvimento de problemas relacionados com o pé. Entre os factores que predispõem, analisámos o conhecimento dos idosos diabéticos acerca dos cuidados com os pés. Desse modo, é importante que o educador em saúde investigue o que os idosos diabéticos sabem acerca de cuidados com os pés, analise este conhecimento à luz das suas crenças e valores, permitindo, assim, perceber o problema da não-realização ou da realização inadequada dos cuidados com os pés. Os factores que possibilitam o comportamento de cuidados com os pés referem-se ao siginificado e importância com os pés. Os factores que reforçam são aqueles que o diabético recebe de outros (conjugue, profissionais e outros) estimulando ou não a mudança de comportamento. Na última fase, fase 7 do Modelo referimo-nos à avaliação do impacto e avaliação dos resultados do nosso estudo. 2.1 - LOCAL DO ESTUDO O estudo foi desenvolvido numa Unidade de Saúde da Administração Regional de Saúde do Centro. Os serviços prestados estão de acordo com os serviços prestados num Centro de Saúde, sendo que o Despacho Normativo nº 97/83, artigo 2º, diz que um Centro de Saúde é uma unidade integrada, polivalente e dinâmica, prestadora de cuidados primários, que visa a promoção e a vigilância da saúde, a prevenção, o diagnóstico e o tratamento da doença, dirigindo-se, globalmente, a sua acção ao indivíduo, à família e à comunidade. Esta Unidade de Saúde tem inscritos 6.919 utentes, sendo 3.326 do sexo masculino e 3.593 do sexo feminino. Quanto à sua implantação encontra-se isolado, tratando-se de um complexo que se encontra em bom estado de conservação. Os recursos humanos referem-se a todos os profissionais do Serviço Nacional de Saúde da freguesia a que pertence a Unidade de Saúde, conforme o quadro seguinte: Quadro 3 - Recursos humanos da Unidade de Saúde do estudo Categoria Profissional Nº de Profissionais Médicos de clínica geral 4 Enfermeiros 2 Administrativos 2 Auxiliares de Acção Médica 2 Em Janeiro de 2006 havia nesta Unidade de Saúde 192 utentes com diagnóstico de diabetes mellitus, não tendo qualquer consulta programada para a especificidade da doença. De salientar ainda que existem utentes diabéticos sem diagnóstico da doença. 2.2 - PERÍODO DO ESTUDO O estudo realizou-se no período de Março de 2006 a Fevereiro de 2007. Foi conduzido mediante dois momentos, sendo o primeiro composto de aplicação de uma grelha de observação e entrevista para identificar sinais e sintomas e comportamentos de risco dos idosos que possam desenvolver Pé Diabético. Foram aplicadas antes da realização de uma sessão de educação para a saúde com duração de cerca de 30 minutos e informação individual sobre auto-cuidados com os pés. O segundo momento ocorreu após um período de no mínimo 3 meses da intervenção educativa, na qual os utentes diabéticos foram reavaliados, quanto aos conhecimentos adquiridos e alterações de comportamentos no primeiro momento do estudo, através de um questionário. 2.3 - POPULAÇÃO/AMOSTRA DO ESTUDO A população do estudo representou todos os utentes diabéticos com diagnóstico de diabetes mellitus inscritas na Unidade de Saúde, num total de 192 pessoas diabéticas. Para a composição da amostra, adoptamos os seguintes critérios de inclusão: - Estar inscrito como diabético na Unidade de Saúde; - Atender a chamada telefonicamente para agendamento de consultas e aplicação das entrevistas nos dois momentos e para Educação para a Saúde no primeiro momento; - Ser capaz de dialogar, ouvir e responder às questões formuladas; - Ter idade igual ou superior a 65 anos; - Concordar em participar da pesquisa e assinar o termo de consentimento livre e esclarecido nos dois momentos do estudo. A amostra foi constituída por 45 (n = 45) indivíduos inscritos na lista de diabéticos que atenderam aos critérios de inclusão. Embora inicialmente houvesse dificuldade na aquisição da lista de diabéticos inscritos, a taxa de resposta foi quase de 100%, apenas duas pessoas disseram não poder comparecer por motivos de indisponibilidade temporal. As entrevistas e a observação aos pés foram realizadas num gabinete, apenas com a nossa presença, de modo a favorecer um ambiente calmo e de privacidade. 2.4 - ASPECTOS ÉTICOS Antes de se proceder à recolha de dados, foram tidos em consideração alguns aspectos éticos. O projecto de investigação foi encaminhado à Direcção do Centro de Saúde junto com uma carta de pedido de autorização, obtendo aprovação logo de seguida (Anexo 3). Foi também encaminhada à Coordenadora da Diabetes do mesmo Centro de Saúde da qual recebemos autorização para a realização do estudo (Anexo 4). Os participantes foram elucidados sobre os objectivos do estudo assim como a confidencialidade dos dados, para que a sua colaboração fosse voluntária, fornecendo um consentimento livre, esclarecido e autorizado sobre a sua participação. A assinatura desse termo foi precedida de todas as explicações quanto à natureza do estudo, aos objectivos e ás informações essenciais à compreensão do mesmo, sendolhe assegurado o anonimato e o sigilo das informações fornecidas (Anexo 5). 2.5 - INSTRUMENTOS DE COLHEITA DE DADOS Tendo em conta o tipo de estudo, o local, os seus participantes e metodologias utilizadas e ponderando ainda a opinião de alguns autores que nos dizem qualquer que seja a tecnica de recolha, esta deve possibilitar uma compilação de dados tanto quanto possível em profundidade e em consoância com os objectivos e suporte teorico utilizado. Neste sentido, procurámos construir e utilizar um instrumento de recolha de informação que nos pareceu mais indicado e adequado, capaz de nos dar as respostas procuradas. Assim, este estudo foi conduzido mediante dois momentos de intervenção. No primeiro momento num ambiente calmo e só na nossa presença, utilizamos: - entrevista semi-estruturada para identificação do comportamento e conhecimento dos idosos sobre prevenção do Pé Diabético (Anexo 1) e seu significado, com duração de cerca de 30 (trinta) minutos; - grelha de observação, constituída pelos dados clínicos e factores de risco para o desenvolvimento do Pé Diabético, ou seja, pesquisa de alterações neuropáticas, isquémicas e dermatológicas (Anexo 2), com duração de cerca 20 (vinte) minutos. Pré-teste do instrumento de colheita de dados O guião da entrevista foi aplicado a 4 pessoas diabéticas (8,8% da amostra). Em primeiro lugar os idosos diabéticos foram esclarecidos do estudo. As entrevistas foram transcritas na íntegra e de forma literal. De seguida foi realizada uma análise do material, com a finalidade de acrescentar, reformular ou retirar alguma questão, afim de adequar os instrumentos aos objectivos da pesquisa. Após o teste piloto, a entrevista foi considerada em condições de ser aplicada no presente estudo. Para assegurar que este instrumento de medida fosse representativo do domínio a avaliar, foi submetido à análise de peritos (médicos e enfermeiras), de forma a verificar a sua validade de conteúdo. No segundo momento de avaliação e para a aplicação da entrevista e observação dos pés, os idosos foram acomodados num gabinete, somente na presença do investigador, de modo a favorecer um ambiente calmo e de privacidade. A taxa de resposta foi de 100%. As estratégias implementadas nos dois momentos estão descritas no Quadro… Quadro 4 – Momentos de Intervenção do estudo 1º Momento Objectivos 2º Momento - Descrever os comportamentos e os - Descrever comportamentos / conhecimentos dos idosos diabéticos conhecimentos dos idosos diabéticos - Identificar factores de risco - Identificar factores de risco - Elaborar uma acção de Educação - Avaliar alteração de comportamentos para a Saúde e conhecimentos dos idosos após Educação para a Saúde Estratégias - Organizar e agendar consultas por - Organizar e agendar consultas por telefone telefone - Preparar a sala - Elaborar e aplicar uma entrevista - Elaborar e aplicar o roteiro da - Realizar observação aos pés entrevista - Recolha e tratamento dos dados - Elaborar e realizar uma acção de Educação para a Saúde - Elaborar uma grelha de observação - Realizar observação aos pés - Recolha e tratamento dos dados Instrumento de - Entrevista semi-estruturada - Entrevista colheita de dados - Grelha de Observação - Observação Resultados - Proporcionar ambiente motivante e - Melhorar comportamentos e esperados de relação de ajuda e empatia aumentar conhecimentos dos idosos - Identificar comportamentos de risco e diabéticos conhecimentos apresentados pelos - Diminuir os factores de risco idosos detectados no 1º momento - Detectar sinais e sintomas que possam desenvolver Pé Diabético Para a apresentação dos resultados referentes às fases 1, 2, 3 e 4 do modelo PRECEDE, os dados foram apresentados em números absolutos e relativos em tabelas utilizando o método descritivo. Para a elaboração dos instrumentos de colheita de dados, foram definidas as seguintes variáveis conforme descritas a seguir. 2.6 - VARIÁVEIS EM ESTUDO As variáveis são propriedades inerentes à variação e atribuição de valores. Na investigação científica compreende-se, como e porquê, os valores de uma variável mudam e como eles estão associados aos diferentes valores de outras variáveis (FORTIN, 1999). No âmbito de uma pesquisa científica, quando se tem em conta a variedade, as inúmeras e complexas experiências pessoais, fica claro que quase todos aspectos dos seres humanos e do ambiente podem ser consideradas variáveis. Então, as variáveis aparecem como qualidades, propriedades ou características de objectos, de pessoas ou de situações que são estudas numa investigação. Sendo assim o nosso estudo foi orientado no sentido de se identificar factores de risco para desenvolvimento do Pé Diabético e descrição de conhecimentos e comportamentos dos idosos para a sua prevenção. Tendo em vista estas premissas e considerando que se trata de um estudo descritivo de análise qualitativa, consideramos quatro blocos de variáveis, de acordo com as fases do Moddelo PRECEDE: variáveis relacionadas com o diagnóstico social - dados demográficos, variáveis relacionadas com o diagnóstico epidemiológico - dados clínicos, variáveis relacionadas com o diagnóstico comportamental, variáveis relacionadas com o diagnóstico educacional. 2.6.1 - Variáveis relacionadas com o diagnóstico social - Dados demográficos Sexo: foram considerados indivíduos do sexo feminino e masculino Idade: a idade foi agrupada, segundo as faixas etárias, em classes com amplitude de 10 anos, variando dos 65 anos aos 84 anos. Estado civil: considerado casado, solteiro, viúvo, divorciado, outro Grau de instrução: Primeiro ciclo, Segundo ciclo, outro Apoio de outrem: foi considerado o apoio do marido/esposa, ou de outros como filhos, vizinhos ou instituições. 2.6.2 - Variáveis relacionadas com o diagnóstico epidemiológico - Dados clínicos Tempo de Diagnóstico: foi estabelecido em anos completos de 0 a 5; 6 a 10, de 11 a 15 e superior a 15 anos. Tipo de tratamento: foi considerado o uso de antidiabéticos orais e insulina. Doenças associadas ou complicações: estabelecemos a presença de hipertensão arterial, obesidade, problemas visuais, osteoartroses, diminuição da sensibilidade, … Exames laboratoriais: glicemia em jejum, colesterol, triglicerideos, hemoglobina glicosilada, foram obtidos da ficha de DiabCare dos doentes diabéticos e/ou foram pedidas análises no dia da entrevista. Em circunstâncias normais, deve procurar-se atingir e manter valores de glicémia em jejum entre 80 e 140 mg%, pós-prandiais inferiores a 180 mg% e ao deitar valores inferiores a 160 mg%. A HbA1c deverá ser inferior a 7%, com um máximo admissível de 7.5%. Para o estudo da Glicemia em jejum e Hemoglobina glicosilada, e para o Índice de Massa Corporal e Tensão Arterial, utilizámos como valores de referência, os preconizados nas normas de Controlo da Diabetes Mellitus Não Insulino-Dependente. Assim são considerados valores clinicamente significativos quando: - a glicemia em jejum se situa acima dos 140 mg/dl; - a HbA1c é superior a 7,5%; - a TA sistólica e diastólica apresentam valores superiores a 160/95 mmHg (Grupo Europeu de Consenso para a Diabetes, 2001; Duarte, 2002). Avaliação do risco de desenvolvimento do Pé Diabético, ou seja, sinais e sintomas, foram consideradas como variáveis as alterações neuropáticas, isquémicas e dermatológicas que favorecem o aparecimento do Pé Diabético. Alterações estruturais e motoras: verificada pela inspecção de sinais de dedo em garra, hálux em martelo, elevação do dorso plantar e calosidades. Alterações provenientes da neuropatia autónoma: observadas pela presença de pele seca e fissuras. Alterações proveniente de neuropatia sensitiva: identificadas pelos testes de sensibilidade táctil, com pulso de monofilamento de Scmmcs-Weinstein de 10 gramas e a sensibilidade vibratória com o uso de diapasão de 128 HZ, além de queixas subjectivas como parestesias, adormecimento, formigueiro, queimor, cãibras. Alterações circulatórias: identificadas pela palpação dos pulsos pediosos e tibiais posteriores, rubor, claudicação, edemas, varizes, ausência de pelos e verificação da temperatura dos pés. Alterações dermatológicas: foram consideradas pela presença do aumento da humidade interdigital de aspecto de massa branca, unhas esfareladas, hipertrofiadas com presença de calosidades, unha encravada e corte inadequado das unhas. 2.6.3 - Variáveis relacionadas com o diagnóstico comportamental Para seleccionar as vaiáveis relacionadas com o comportamento dos idosos diabéticos da amostra com os seus pés, fundamentamo-nos no Consenso Internacional do Pé Diabético (2001). Assim, os comportamento esperados para a prevenção do Pé Diabético são os seguintes: Lavar os pés diariamente com água e sabão neutro, utilizando uma “bucha” macia, especialmente entre os espaços interdigitais; Secar os pés, com toalha macia, especialmente entre os espaços interdigitais; Raspar, calosidades com “pedra-pomes”nos locais durante as lavagens dos pés; Hidratar os pés com creme (região plantar, dorsal, calcanhar) e pernas com excepção dos espaços interdigitais, preferencialmente três vezes ao dia; Cortar as unhas no formato quadrado, não rentes à pele, lixando as pontas. Caso as unhas estejam encravadas, procurar tratamento podológico, Usar calçado adequado ao formato dos pés, ou seja, macio, sem costuras, com altura e comprimento que permitam a mobilização dos pés sem causar pontos de atrito, usar palmilhas, quando o calçado permitir; Usar meias claras, de algodão e sem costuras; Andar sempre calçado; Verificar a presença de corpo estranho dentro dos calçados, antes de o calçar; Examinar os pés, com a ajuda de um espelho ou de outra pessoa, para identificar presença de micoses, rachaduras, fissuras, calos, ressequimento, ferimentos, bolhas; Para analisar o comportamento, utilizamos os termos adequado e não adequado. Foi considerado comportamento adequado quando as respostas às questões formuladas eram iguais às preconizadas pelo Consenso Internacional do Pé Diabético e não adequado quando as respostas não coincidiam com o mesmo. 2.6.4 - Variáveis relacionadas com o diagnóstico educacional As variáveis que apresentamos são: conhecimento, ou seja, significado e importância dos cuidados com os pés e orientações de profissionais de saúde. Conhecimento Para seleccionar as varáveis relacionadas com o conhecimento da pessoa diabética acerca dos cuidados com os pés, fundamentamo-nos igualmente no Consenso Internacional do Pé Diabético (2001) recomendando para um Programa de educação do diabético, o seguinte: inspeccionar diariamente os pés, inclusive as áreas interdigitais; procurar auxílio de outra pessoa quanto não conseguir fazer o exame do pé; lavar regularmente os pés, secando-os bem, especialmente entre os dedos; andar sempre calçado, evitar andar descalço, dentro e fora de casa e usar sempre meias sem costuras, trocando-as diariamente; evitar o uso de meias com internas ou externas; remover calos com ajuda de um profissional e não usar agentes químicos para os remover; inspeccionar e palpar a parte interna dos sapatos antes de se calçar; cortar as unhas de forma recta e evitar cortar as unhas, se a visão estiver diminuída; usar loções hidratantes para a pele ressequida; fazer exame regular aos pés e notificar ocorrência de bolha, corte, ou qualquer ferimento à equipe de saúde. Para mensurar o conhecimento, utilizámos o termo certo e errado. Foi considerado conhecimento certo quando as respostas dos idosos diabéticos às questões formuladas eram iguais às preconizadas pelo Consenso Internacional do Pé Diabético (2001) e errado quando isso não acontecia. Outros aspectos foram analisados ao interrogar os diabéticos para obtenção dos dados referentes aos factores que possibilitam e reforçam o comportamento em relação aos cuidados com os pés escolhemos as seguintes variáveis: Orientações dadas pelos profissionais de saúde indispensáveis para o autocuidado do diabético. 2.7 - COLHEITA E ORGANIZAÇÃO DA INFORMAÇÃO Para além de analisar um problema, pretendemos identificar factores de risco na população em estudo para de seguida podermos centrar a educação para a saúde de acordo com as necessidades encontradas. Com este tipo de estudo pretendemos “obter mais informação, quer seja sobre as características de uma população, quer seja sobre os fenómenos em que existem poucos trabalhos de investigação” (Fortin, 1999, p. 161). 2.7.1 – Primeiro momento de avaliação Utilizámos os dados decorrentes da observação e da entrevista e avançar numa interpretação qualitativa com vista a identificar e descrever problemas que necessitem de mudança e agir para melhorar a prática e avaliar os efeitos da acção desenvolvida. Assumimos o papel de investigador mantendo uma postura subjectiva, interpretação lógica em que os dados vão sendo colhidos, analisados e construídos. Procurámos estar atentas às primeiras impressões, e adoptar uma atitude de intervenção sistemática, comparada com as experiências. O primeiro momento teve início em conseguir a lista de diabéticos da Unidade do estudo com respectivo número de telefone, procedendo-se de seguida ao agendamento de consultas para aplicação da entrevista, observação física, realização do teste monofilamento e da sessão de Educação para a Saúde. A entrevista foi aplicada numa sala, com privacidade, longe de ruídos e confortável para os entrevistados, afim de não ter interferência na emissão das respostas. Inicialmente explicámos qual era o objectivo do estudo.No âmbito da colheita de informação sobre os comportamentos e conhecimentos que o idoso diabético tem com os seus pés, as nossas questões da primeira parte do guião da entrevista semiestruturada (Anexo…) incidiram sobre a forma e a frequência com que lavam e examinam os pés e que tipo de calçados e meias usam, que cuidados têm com as unhas, se andam descalços e se têm hábito de observar o calçado antes de o usar, ou seja, o seu comportamento e conhecimento acerca dos cuidados com os pés. Na segunda parte da entrevista as questões incidiram sobre o significado, e importância dos cuidados com os pés e orientações recebidas pelos profissionais de saúde, identificando assim, as lacunas na informação/educação. Para o exame físico foi usada a grelha de observação para a colheita das alterações neuropáticas, isquémicas e dermatológicas (Anexo 2). O idoso diabético foi acomodado adequadamente numa maca, em decúbito dorsal, expondo os pés. Utilizámos a observação e palpação para identificar: - Alterações dermatológicas, como unhas espessas (esfareladas, hipertrofiadas e com presença de massa branca endurecida), unha encravada, corte inadequado das unhas e aumento da humidade interdigital de aspecto de massa branca; - Alterações circulatórias, o preenchimento capilar, rubor, pulsos pediosos e tibial posterior, temperatura, claudicação, ausência de pelos, edemas; - Alterações neuropáticas autónomas, a pele seca, fissura, pele macerada; - Alterações provenientes de neuropatia motora, deformações, calosidades; - Alterações provenientes de neuropatia sensitiva, como o queimor, adormecimento, formigueiro, cãibras, parestesias. Fez-se ainda os testes de sensibilidade. Antes da realização dos testes, foi solicitado ao diabético que ficasse tranquilo, concentrado na demonstração da aplicação do monofilamento na mão. Foi realizado e conforma as Directivas Práticas sobre tratamento e prevenção do Pé Diabético, o teste do monofilamento que é determinado através da inspecção aos pés do paciente utilizando o monofilamento de 10 g (5,07 Semmes-Weinstein), o diapasão (128 Hz) e/ou boneca de algodão (Anexo 6). Para a realização do teste vibratório, percutiu-se o diapasão de 128 Hz para que ele vibrasse apoiado em saliências ósseas da região maleolar interna e externa; região medial da perna e na primeira proeminência metatarsiana. Através deste exame, pode-se localizar pontos dos pés em risco de ulceração, podendo determinar a presença ou ausência de sensibilidade táctil e uma possível neuropatia. Após a colheita dos dados e para a organização dos mesmos realizamos a codificação e o transporte dos dados para uma aplicação de dados do programa Microsoft Office Access. Foram também organizados dados da entrevista para uma melhor interpretação dos mesmos. Por fim, tendo em conta serem pessoas idosas com algumas dificuldades inerentes ao envelhecimento, de forma simples e cuidada e face a face foi realizada uma acção de Educação para a Saúde sobre os cuidados essenciais com os pés baseados no Consenso Internacional sobre Pé Diabético sendo esquematizados a seguir no Quadro 5. Quadro 5 – Forma correcta de realizar os cuidados essenciais com os pés Cuidados com os Forma correcta Finalidade pés Lavagem pés diariamente Diária, com água morna, um pé de Evitar contaminação e promover cada vez sabão neutro a desinfecção da pele Toalha macia, usando uma Evitar a humidade e instalação extremidade para cada pé de fungos e bactérias Remoção de calosidades Assídua e depois da lavagem e Evitar grandes expessuras, com lima de papel secagem (tecidos amolecidos) causando ulcerações Hidratação da pele Aplicação de um creme (Ph5) na Evitar pele seca e fissuras Secar regiões interdigitais região plantar, dorsal e calcanhar com excepção dos espaços interdigitais Corte de unhas Periódico, ao nível do dedo, não Contararia o crescimento e muito rentes, sem arredondar os espaça a necessidade de corte cantos, mas sim polir Observação dos pés Examinar os pés com ajuda de um Reconhecimento de sinais: espelho ou de outra pessoa Alterações da temperatura; Edema dos pés e pernas; Sensação de peso; Dor; Falta de sensibilidade, Deformações; Zonas avermelhadas; Unhas espessas ou encravadas; Calosidades Evitar situações de risco, identificar precocemente os sinais de lesão e procurar auxílio dos profissionais de saúde Andar descalço Nunca andar descalço Evitar ferir os pés Verificação de calçado Virar o sapato para baixo e verificar Evitar pressão do corpo estranho com a mão se existe algum corpo contra o pé e fazer ferida estranho dentro Calçado adequado Largos, onde os dedos estejam à Evitar pressões e lesões vontade, sem costuras internas, maleáveis e ainda, de preferir os de atacador e de sola de borracha Tipo de meias Meias claras, de algodão e sem Evitar e detecção lesões costuras e adaptadas à época Fonte: Consenso Internacional sobre Prevenção do Pé Diabético (2001) Os dados obtidos sobre os sentimentos dos idosos em relação às complicações com os pés, através da segunda parte da entrevista, foram analisados qualitativamente, pois a análise qualitativa permite-nos apreender o carácter multidimencional dos fenómenos na sua dimensão natural, bem como captar os diferentes significados da experiência vivida, auxiliando a compreensão entre o indivíduo e o seu contexto (Biasoli-Alves, 1989). Esta análise qualitativa teve como finalidade conhecer a importância dada pelos idosos diabéticos, aos cuidados com os pés, assim como as orientações dadas pelos profissionais. Critérios de selecção das categorias Foi escolhida a análise temática que consiste em descobrir as unidades de sentido que compõem uma comunicação cuja presença ou frequência tenham algum significado para o objectivo analítico visado (Rodrigues & Leopardi, 1999). Desta forma, a análise de conteúdo foi realizada em três etapas (Minayo, 1994): - Pré-análise, em primeiro lugar, as entrevistas foram transcritas de forma literal, realizadas várias leituras flutuantes do material colhido, permitindo um contacto exaustivo do material, com a finalidade de nos impregnarmos do seu conteúdo. - Exploração do material, correspondeu à codificação visando alcançar o núcleo de compreensão do texto, sendo feito recortes do texto em unidades de registo; a escolha de regras de contagem; a classificação e a agregação dos dados. - Tratamento dos resultados obtidos e interpretação: As informações fornecidas pela análise foram postas em relevo, através de operações simples em percentagem. Dessa forma, foram feitas interpretações, procurando desvendar os conteúdos conforme apresentado nos resultados da investigação. 2.7.2 – Segundo momento de avaliação O segundo momento, como já referenciado anteriormente pelo Quadro 4 foi iniciado após 3 meses decorridos do primeiro momento com agendamento de consultas por telefone, no qual os idosos diabéticos foram reavaliados, quanto aos conhecimentos adquiridos e alterações que eles introduziram na forma de agir com com os pés em relação ao primeiro momento do estudo, através de uma nova entrevista (Anexo 7) e observação. Os dados foram colhidos a partir da aplicação de uma entrevista estruturada com o propósito de fazer a comparação dos comportamentos e conhecimentos da primeira intervenção, visando avaliar o impacto das medidas preventivas junto à população assistida, ou seja, da acção de Educação para a Saúde. Este segundo momento teve como resultados esperados melhorar os comportamentos com aumento de conhecimento dos idosos diabéticos e diminuir os factores de risco verificados no primeiro momento. Os dados são apresentados e analisados em duas partes distintas, a primeira, correspondentes ao primeiro momento de intervenção e na segunda parte serão apresentados os dados que resultaram da análise dos comportamentos e conhecimentos dos idosos diabéticos após a acção de Educação para a Saúde. Estes são apresentados em quadros, tabelas e gráficos, para sistematizar e realçar a informação com maior significado. TERCEIRA PARTE - RESULTADOS E ÁNÁLISE DOS DADOS 1 - PRIMEIRO MOMENTO DE AVALIAÇÃO 1.1 - DIAGNÓSTICO SOCIAL Em termos sócio-demográficos verificamos que estamos perante um grupo envelhecido, com média de idades acima dos 70 anos e com pouca ecolaridade. Conforme indica a Tabela 1, das 45 (100%) idosos diabéticos investigados, houve predomínio do sexo feminino 46,6% (21/45) conforme o descrito por outros estudos, um deles de Calsolari (2002). De acordo com a literatura, este factor pode estar relacionado com a maior procura de assistência e auto-cuidado realizado pelas mulheres. Um estudo do "American Diabetes Association Consensus Group" mostra que o risco para o desenvolvimento de úlcera dos pés é maior entre os diabéticos do sexo masculino, com mais de 10 anos de diabetes e que apresentam complicações microvasculares. O grupo mais representativo nas mulheres é na faixa etária compreendida entre 65 e os 74 anos, enquanto que nos homens a classe que predomina é dos 75 aos 84 anos. Tabela 1 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, segundo o sexo e faixa etária, em anos completos. Porto. SEXO FAIXA ETÁRIA (anos) Masculino Nº % Feminino Nº % TOTAL Nº % 65 a 74 75 a 84 14 6 31,1 13,3 21 4 46,6 8,8 35 10 77,8 22,2 TOTAL 20 44,4 25 55,4 45 100,0 A faixa etária predominante situa-se entre 65 e 74 anos (77,7%), confirmando dados recentes da American Diabetes Association (2006) quando refere que pelo menos 20% dos doentes com mais de 65 anos sofrem de diabetes. Este grupo de diabéticos do Tipo 2, faz-nos repensar as estratégias educativas e assistenciais para esta população, ao considerar que o envelhecimento se caracteriza por mudanças físicas, psíquicas e sociais que acometem indivíduos com sobrevida prolongada, conforme já referênciado na fundamentação teórica. Neto (1994) refere que os problemas dos idosos são, predominantemente, de ordem neurológica, ocorrendo diminuição da capacidade intelectual, alterações da memória, raciocínio lógico, entre outros, podendo dificultar a capacidade de interiorizar as orientações essenciais à prevenção do Pé Diabético. Tabela 2 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde de Salreu, segundo as características sócio-demográficas. Porto. SEXO Masculino Nº % Feminino Nº % TOTAL Nº % 18 2 40,0 4,4 15 10 33,3 22,2 33 12 73,3 26,7 20 44,4 25 55,5 45 100,0 15 5 33,3 11,1 18 7 40,0 15,5 33 12 73,3 26,7 TOTAL 20 44,4 25 55,5 45 100,0 Apoio de outrem Esposa/Marido Sózinho Outros (filhos, família,…) 12 6 2 26,6 13,3 4,4 6 15 4 13,3 33,3 8,8 18 21 6 40,0 46,7 13,3 TOTAL 20 44,3 25 55,4 45 100,0 7 13 15,5 28,8 5 20 11,1 44,4 12 33 26,7 73,3 20 44,3 25 55,5 45 100,0 Estado civil Casado Viúvo TOTAL Grau de instução Não analfabeto Analfabeto Situação laboral Activo (agricultura) Não activo TOTAL Relativamente ao estado civil verificamos diferenças entre os sexos, apesar do universo do sexo masculino 20 (100%) ser inferior ao sexo feminino 25 (100%) deparamo-nos com 18/45 (40%) dos homens são casados e apenas 15/45 (33,3%) das mulheres são casadas. De referir que 7/45 (15.6%) das mulheres e 5/45 (11,1%) dos homens são analfabetos, o que leva a necessidade de uma adequação do ensino, para que haja uma maior compreensão e motivação por parte destas pessoas. Toda a informação transmitida às pessoas passa por um processamento complexo, que é a aprendizagem, funcionando como aquisição e assimilação de novos padrões e novas formas de perceber, pensar e agir, modificando-se continuamente, pela aquisição de novos conhecimentos, atitudes, hábitos e valores de forma a ajudar este grupo de idosos a alcançar melhor qualidade de vida. Ao considerar a complexidade da diabetes mellitus pode-se inferir que esta condição compromete o processo de educação em saúde dos diabéticos (Alvieida et al. 2002). A educação como via de prevenção pode reduzir até 50% das amputações, assim, torna-se essencial a consciencialização dos profissionais de saúde da atenção básica quanto a importância na prevenção do Pé Diabético. Quanto ao apoio de pessoas significativas nos cuidados com a diabetes, a maioria das mulheres 15/45 (33,3%) refere cuidar da sua patologia sozinha, 6/45 (13,3%) têm o apoio do marido e 4/45 (8,9%) são apoiadas pelos filhos ou outros familiares. Por sua vez, 12/45 (26,7%) dos homens sentem-se apoiados pelas esposas, enquanto que 6/45 (13,3%) cuidam sozinhos da sua diabetes. Os restantes 2/45 (4,4%) têm o apoio dos filhos, família ou vizinhos. Perante os resultados encontrados na nossa população, parece incidirem os diferentes papeis do género da nossa sociedade actual, na medida em que a maioria das mulheres tratava da doença sozinha não tendo o apoio do marido ou familiares enquanto que os homens referiram ser apoiados pelas suas esposas ou familiares no tratamento da sua doença, indo ao encontro ao papel da mulher de providênciadora de cuidados à família, em que as esposas estão mais envolvidas na gestão da diabetes dos seus maridos, do que os maridos nos cuidados à diabetes das duas esposas (Heavy et al., 1993). No que respeita à situação laboral, uma grande percentagem dos indivíduos de ambos os sexos, 44,4% das mulheres e 28,8% dos homens, já não se encontram activos por motivo de reforma, invalidez, ou outras situações, no entanto de referir que uma grande parte tanto homens como mulheres continuam a trabalhar na agricultura (26,7%). 1.2 - DIAGNÓSTICO EPIDEMIOLÓGICO A diabetes implica frequentemente mudanças no estilo de vida, dificultando a adesão ao tratamento. Muitas das complicações presentes na diabetes mellitus são já sentidas pela maioria dos elementos da nossa amostra, a hipertensão, problemas visuais, a diminuição da sensibilidade nos membros inferiores são os mais frequentes na população estudada. Os dados obtidos em relação às condições clínicas dos idosos diabéticos quanto ao tempo de diagnóstico da diabetes, tipo de tratamento, análise clínicas e factores de risco para o desenvolvimento do Pé Diabético, são apresentados a seguir. Tabela 3 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, segundo o tempo de diagnóstico de diabetes. Porto. TEMPO DE DIAGNÓSTICO Nº % 0 a 5 anos 6 a 10 anos 11 a 15 anos 16 a 20 anos > 20 anos 11 8 13 9 4 24,4 17,8 28,9 20,0 8,9 TOTAL 45 100,0 Com o passar do tempo de diagnóstico aumenta a probabilidade de apresentar comprometimentos e na nossa amostra a maioria apresenta tempo de diagnóstico superior a 11 anos, em que 13/45 (28,9%) dos idosos diabéticos têm entre onze (11) e quinze (15) anos de diabetes, 9/45 (20%) entre desasseis (16) e vinte (20) anos e 4/45 (8,9%) mais de vinte (20) anos de tempo de diagnóstico, evidenciando aumento com a progressão da idade e da doença. Verificou-se que 11/45 (24,4%) dos idosos diabéticos encontravam-se no começo da doença, até cinco (5) anos de diagnóstico e 8/45 (17,8%) tinham entre seis (6) e dez (10) anos. Outros dados da nossa grelha de observação (Anexo 2) mostram uma pequena diferença significativa entre os sexos em relação ao tempo de diagnóstico. Os resultados mostraram que nas mulheres a duração média é de 10,8 anos, enquanto que nos homens a duração média é de 12,7 anos. De acordo com Pedrosa (2003), um problema relevante deve-se ao diagnóstico tardio, pois 50% dos pacientes com DM desconhecem ter a doença e descobrem com alguma complicação em vários estádios de evolução. São muito sos estudos realizados destacando que quando o diabético recebe apoio contínuo por uma equipa multiprofissional, consegue efectivamente reduzir a progressão de complicações crónicas. Importante referir que tantos os homens como as mulheres, 20/45 (44,4%) tinham história de úlcera cicatrizada e três homens e uma mulher apresentavam úlcera activa (Anexo 2). De salientar que estes quatro idosos diabéticos tinham diabetes há mais de 12 anos, evidenciando o factor tempo referido anteriormente no aparecimento das complicações crónicas da doença, como já demonstrado por outros autores (American Diabetes Association, 2001), referindo que as pessoas têm grande probabilidade de apresentar doença vascular periférica e portanto maior risco de desenvolver úlceras e de amputação sendo fundamental a identificação dos factores de risco. Harris et al. (1992) alvitram que alguns pacientes com diabetes mellitus Tipo 2 podem permanecer por 10 anos ou até mais tempo com a doença, antes de ser feito o diagnóstico isto explica muitos casos cuja primeira manifestação é o aparecimento de uma complicação crónica. De acordo com a literatura o diagnóstico da diabetes mellitus Tipo 2 geralmente é feito após um período médio de 5 anos, permitindo a instalação de complicações, estando já presentes no momento do diagnóstico. Investigando a idade de início do tratamento da diabetes mellitus com medicação, verificamos que, através da comparação das percentagens em ambos os sexos, o tratamento com antidiabéticos orais foi instituído logo após o diagnóstico. Neste contexto faz-nos reflectir sobre o tempo da doença que decorreu sem ser diagnosticada. Em relação ao tipo de tratamento, 45 (100%) dos idosos diabéticos referiram que assumem a dieta como fazendo parte do tratamento, que a maioria (quanto ??) não cumpre. Verificou-se que 17/45 (37,8%) homens e 23/45 (51,1%) mulheres fazem uso de agentes orais para o controlo da diabetes, 3/45 idosos diabéticos do sexo masculino e 2/45 do sexo feminino fazem uso de insulina (Anexo 2). Os dados encontrados são semelhantes aos da literatura, o estudo de Bernardes, Penteado, Martins (1993), 68,5% dos idosos diabéticos investigados utilizava antidiabéticos orais e 31,5%, insulina. No estudo de Milman et al. (2001), 56% das pessoas diabéticas utilizavam antidiabéticos orais e 26%, insulina. O tratamento tem como objectivo alcançar o controlo metabólico de forma a prevenir ao máximo as complicações, tornando-se assim, variável durante o curso da doença devido às alterações do estilo de vida, do estado físico e do estado emocional da pessoa portadora de diabetes. Rodrigues et al (1996) relatam que dentro das várias estratégias para a adesão do tratamento da diabetes, os profissionais de saúde devem investir em acções educativas ao idoso diabético, dirigidas ao tratamento e prevenção das incapacidades que podem limitar a vida como as alterações vasculares e as amputações. As acções de educativas devem ser avaliadas quanto ao impacto de adesão ao tratamento, isto é, avaliar o conhecimento e atitude do diabético. Gráfico 3 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, segundo os problemas de saúde associadas ou complicações da diabetes. Porto. 77,8 64,4 44,4 Hipertensão Problemas visuais Diminuição da sensibilidade 26,8 Problemas cardíacos 80 70 60 50 % 40 30 20 10 0 Dos problemas de saúde analisados prevaleceu a hipertensão arterial sistémica em 35/45 (77,8%) dos idosos diabéticos, conforme nos indica o Gráfico 3 dos quais 17/45 (37,8%) são do sexo masculino e 18/45 (40%) são do sexo feminino. Estudos têm verificado que a associação da diabetes com a hipertensão representa maior factor de risco para o desenvolvimento de outas patologias (Milagres, 2002), além de que, a hipertensão arterial é pelo menos duas vezes mais frequente em diabéticos que na população geral. A diabetes mellitus duplica a mortalidade cardiovascular, aumenta as doenças cerebrovasculares, e o risco aumenta acentuadamente com a presença simultânea de Hipertensão. Este facto contribui para a importância de se consciencializar o diabético à adesão ao tratamento, na medida em que a soma dos factores de risco favorece o risco de complicações cardiovasculares, aumentando os riscos de aparecimento de lesões nos pés de difícil cicatrização e consequentemente as amputações. Rodrigues et al. (1996), relatam que dentro das várias estratégias para a adesão ao tratamento da diabetes, a equipe de saúde deve investir em acções educativas ao idoso diabético voltadas para o tratamento e prevençãodas incapacidades que podem limitar a vida como as alterações vasculares e amputações. Podemos verificar ainda pelo Anexo… que a diminuição da sensibilidade nos membros inferiores 29/45 (64,4%) em que 13/45 (28,9%) são do sexo masculino e 16/45 (35,6%) do sexo feminino. Os problemas visuais estão presentes em 20/45 (44,4%) diabéticos dos quais 11/45 (24,4%) são homens e 9/45 (20%) são mulheres, sendo estes os problemas também mais frequentes. Existem outros problemas presentes como as patologias referentes ao sistema cardiovasculares, no entanto, não se sabe se está relacionado com a diabetes. Tabela 4 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, segundo perfil lipídico. Porto. Nº % Colestrol (mg/dl) 100 a 149 150 a 199 200 a 239 ≥ 240 4 10 13 18 8,9 22,2 28,9 40,0 TOTAL 45 100,0 Triglicerideos (mg/dl) < 150 150 a 199 200 a 300 11 17 17 24,4 37,8 37,8 TOTAL 45 100,0 Perante a análise da Tabela 4, podemos verificar que o perfil lipídico revelou que 18/45 (40%) dos idosos diabéticos estavam com colesterol total acima de 240 mg/dl em que a média masculina ronda os 211mg/dl e a média feminina os 228 mg/dl (Anexo…). Em relação aos triglecerideos, observamos que 17/45 (37,8%) apresentam valores entre 200 e 300 mg/dl, com igual média entre os homens e mulheres. Podemos concluir destes dados que existe uma grande percentagem de indivíduos que apresentam valores lipídicos superiores ao limite aceitável. No nosso estudo apenas 6 homens (13,3%) são fumadores e 9 (20%) bebem bebidas alcoólicas no momento do estudo (Anexo 2). Considerando as complicações e doenças associadas como factores de risco pode verificar-se que em 100% dos idosos diabéticos, estas estão presentes levando-nos a destacar o agravamento de problemas com os pés. A educação do paciente e da sua família é importante para a adesão ao tratamento. O conhecimento dos factores de risco e as mudanças no comportamento são essenciais para que o paciente consiga realizar estas mudanças. Tabela 5 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, segundo a glicemia em jejum e hemoglobina glicosilada. Porto. Nº % Glicemia em jejum (mg/dl) 70 a 110 111 a 125 126 a 139 140 a 199 200 a 300 1 6 10 16 12 2,2 13,3 22,2 35,6 26,7 TOTAL 45 100,0 Hemoglobina glicosilada (HbA1c) 4 a 6,3% 6,4 a 7,5% > 7,5% 10 19 16 22,2 42,2 35,6 TOTAL 45 100,0 Analisando os níveis glicémicos dos idosos diabéticos do nosso estudo na Tabela 5 estavam com mau controlo em que verificamos que 16/45 (35,6%) apresentam glicemia em jejum alterada entre 140 e 199 mg/dl e 12/45 (26,7%) apresentam glicemia acima de 200 mg/dl, com média de 142,9 mg/dl (Anexo…), evidenciando-se deste modo que os valores médios de glicemia em jejum em ambos os sexos ultrapassam largamente o limite aconselhado, sendo que a glicemia média nos homens (175 mg/dl) é superior do que nas mulheres 159 mg/dl (Anexo 2). Podemos verificar ainda pela análise da Tabela 5 que os valores relativamente à HbA1c, são idênticos em ambos os sexos, nas mulheres (7,05%) e nos homens (7,27%) situando-se ainda dentro do limite aceitável, embora com valores já elevados. No entanto, podemos verificar que 16 idosos diabéticos na totalidade da nossa amostra têm HbA1c maior que 7,5%, ultrapassando os limites desejáveis e considerado já um valor de risco. A sua manutenção dentro dos valores desejáveis está relacionado com um decréscimo no aparecimento de complicações tais como retinopatias, neuropatia, nefropatia e até doenças cardiovasculares para além de evitar as complicações imediatas como são os casos de hipoglicemia (American Diabetes Association, 2002). Nos idosos os objectivos são fundamentalmente, o controlo da sintomatologia, evitando grandes oscilações da glicémia e hipoglicémias, a prevenção ou atraso do risco das complicações e a criação de condições para a manutenção de uma boa qualidade de vida. A hipoglicémia nos idosos é uma preocupação acrescida e pode-se considerar aceitável uma oscilação dos valores glicémicos entre 140 mg% e 200 mg% em qualquer ocasião do dia. Torna-se necessário um controlo mais rigoroso do perfil dos níveis de glicose para uma melhor prevenção da doença. O parâmetro da hemoglobina glicosilada constitui-se em uma das pedras angulares que podem retardar o desencadeamento e/ou controlar as doenças associadas ao diabetes, melhorando, dessa forma, a qualidade de vida dessas pessoas (Lehto et al., 1996). Cabe ressaltar que a prevenção das complicações crónicas microangiopáticas e neuropáticas está associada ao rígido controlo dos níveis glicéricos dentro dos valores de normalidade. Num estudo, Berrnardes, Penteado e Martins (1993) referem que houve associação de amputação com níveis de glicemia superior ou igual a 200 mg/dl. De acordo com a maioria dos especialistas, considera-se importante para a autovigilância da doença, a avaliação do controlo metabólico da diabetes, sendo apontado como factor fundamental na etiologia das complicações neuropáticas, as quais predispõem ao desenvolvimento das úlceras e consequentemente das amputações (Reiber et al, 1998; Zavala & Braver, 2000). Uns dos parâmetros vulgarmente utilizados nessa avaliação são a Glicemia em jejum, pois os seus valores estão razoavelmente relacionados com o controlo da patologia e a Hemoglobina glicosilada ou Glico-hemoglobina (Hb A1c) que reflecte o nível médio das glicemias nos últimos 2 a 3 meses. O controlo da glicemia é um desafio que todos os diabéticos enfrentam, pois vários estudos têm recomendado para que os diabéticos mantenham níveis de glicemia quanto possível da normalidade, evitando assim as complicações a longo prazo. Monitorizar a glicemia é fundamental para o auxílio na realização dos ajustes entre todas as acções que envolvem o tratamento da diabetes (American Diabetes Association, 2004). A doença por si só, possui riscos para o aparecimento de neuropatias e quando associadas ao tempo de duração da doença com valores de glicemia anormais, resultam no aumento da incidência de doenças neurológicas e vasculares e consequnetemente a aumento dos riscos de aparecimento e desenvolvimento do Pé Diabético. O descontrolo metabólico e a longa evolução da doença levam os diabéticos a apresentarem neuropatia periférica, com diminuição da sensibilidade dos pés, formação de calos e consequentemente, a formação de úlceras e amputações (Calsolari 2000). Além disso, as infecções são factores determinantes para piorar as lesões, podendo evoluir para amputação caso não seja instituído o tratamento precoce e adequado. Quando esta doença está mal controlada, pode representar um elevado encargo social e económico, para o indivíduo e para a sociedade. No entanto, é possível controlar a doença e reduzir as complicações nas pessoas mediante um bom controlo glicémico. Numa perspectiva do empowerment, a educação na diabetes é vista como uma colaboração entre o profissional de saúde e o doente para que este possa tomar decisões informadas acerca da gestão da sua doença (Anderson et al., 2000). Assistese assim, a uma redefinição de papéis, relacionamento e responsabilidades entre educadores e diabéticos. Kozak et al. (1996), argumentam que os diabéticos em virtude do perfil da doença são mais susceptíveis de desenvolver uma infecção do pé que qualquer outro indivíduo, o mau controlo glicémico causa o crescimento de bactérias e devido à precariedade de oxigenação dos tecidos no pé isquémico são menos capazes de gerar uma resposta imune. A literatura reitera que o bom controlo de glicemia dos diabéticos é determinante na melhor evolução a longo prazo relacionado com as complicações vasculares ou neurológicas. Tabela 6 - Distribuição dos idosos diabéticose da Unidade, segundo o índice de massa corporal e sexo. Porto. SEXO Índice de Massa Corporal (Kg/m²) Masculino Feminino TOTAL Nº % Nº % Nº % 30 a 34 35 a 39 0 0 0,0 0,0 3 2 12,0 8,0 3 2 6,7 4,4 40 a 44 45 a 49 >50 9 7 4 45,0 35,0 20,0 13 3 4 52,0 12,0 16,0 22 10 8 48,9 22,2 17,8 TOTAL 20 100,0 25 100,0 45 100,0 Ao analisarmos a existência de obesidade estabelecida pelo índice de massa corporal, encontramos que em 20/20 (100,0%) das pessoas do sexo masculino foi maior que 30,0 Kg/m2 e no sexo feminino em 25/25 (100%) foi também maior que 30 Kg/m2 sendo o peso médio nos dois sexos de 73,51 Kg, correspondendo a obesidade, concluindo assim, que as médias apontam para obsidade em toda a população estudada. Embora o índice de massa corporal permita a avaliação rápida e prática da obesidade é terminante lembrar que este índice possui algumas limitações, de modo que as pessoas com problemas de edemas, com musculatura, entre outras, podem apresentar índices falsamente altos (Mancini, 2001). A relação peso/estatura de Índice de Massa corporal, com a massa expressa em quilogramas e a estatura em metros. Valores elevados de índice de massa corporal estão associados a várias doenças crónicas como sendo a diabetes devido ao sobrepeso especialmente na meia-idade (50-65 anos), acima dos 80 anos magreza e perda de massa corporal são o maior problema. O comportamento do índice de massa corporal através do avanço da idade é semelhante ao que acontece com o peso, havendo declínio por volta dos 70 a 75 anos (Coellho, 2004). Actualmente a maioria das pessoas diabéticas com diabetes mellitus Tipo 2 estão acima do peso ideal. Davidson (2001) coloca que de 80 a 90% das pessoas diabéticas do Tipo 2 são obesas, sendo que a obesidade origina resistência à insulina e consequentemente uma descompensação glicémica. Para Brandle et al. (2003), a cada aumento de 10 kg/m2 de IMC, os custos directos com o tratamento em diabetes podem aumentar em torno de 10 a 30%. A relação da diabetes mellitus com a obesidade é conhecida desde as mais antigas descrições da doença, deste modo, é pois importante que haja um tratamento rigoroso da obesidade, sendo desejável que a pessoa diabética esteja próxima do seu peso ideal, contribuindo para a diminuição de hiperglicémia, hiperlipidémia, hipertensão e proteinúria. A avaliação das alterações clínicas dos diabéticos investigados identificou a presença de várias alterações que podem desenvolver complicações nos pés, tanto a nível dermatológico, circulatório, estruturais e motoras, como as provenientes da neuropatia diabética, apresentadas a seguir. Gráfico 4 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, segundo as alterações dermatológicas como factor de risco para o desenvolvimento de Pé Diabético. 91 66,7 51,2 Presença de massa branca interdigital Unhas hipertrofiadas e esfareladas Presença de unha encravada 5,6 Corte inadequado da unha 100 90 80 70 60 % 50 40 30 20 10 0 Em relação às alterações dermatológicas, no Gráfico 4, podemos verificar que o corte inadequado das unhas esteve presente em 41/45 (91%) dos idosos diabéticos em que 30/45 (66,7%) apresentavam unhas hipertrofiadas espessas e esfareladas, 23/45 (51,1%) dos pés observados apresentaram descamação da pele com massa branca nos espaços interdigitais, sendo cerca de metade da percentagem do sexo masculino. Importante referir que 7/45 (15,6%) idosos diabéticos apresentavam unha encravada (Anexo…). Estes dados são idênticos aos do estudo de Scapim (2004), onde encontrou que 71,7% apresentavam uma boa higiene dos pés, todavia em 49% e 48% com unhas espessas, hipertrofiadas. Estas alterações ocorrem essencialmente, pela falta de cuidados higiénicos com os pés, realização de cuidados inadequados, ausência de tratamento preventivo e de controlo, além de ausência de organização dos serviços de saúde para a implantação de programas de prevenção. Por outro lado, crê-se que o auto-cuidado pode ser deficiente devido à faixa etária deste grupo, bem como as dificuldades visuais, presentes na população estudada. Perante todo este panorama, deve estimular-se o auto-cuidado ou envolver a família neste processo, apontando no sentido da promoção da saúde e melhorar a auto-estima. Tabela 7 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade, segundo as alterações circulatórias com factor de risco para o desenvolvimento do Pé Diabético. Porto. SEXO ALTERAÇÕES CIRCULATÓRIAS Edema Pulsos diminuídos Ausência de pêlos Diminuição da sensibilidade táctil Masculino Feminino TOTAL Nº % Nº % Nº % 9 16 14 20,0 35,6 31,1 8 17 16 17,8 37,8 35,6 17 33 30 37,8 73,3 66,7 11 24,4 14 31,1 25 55,6 No que se refere às alterações circulatórias, as mais frequentes foram a diminuição dos pulsos tibial e pedioso em 33/45 (73,3%) dos idosos diabéticos, não havendo diferenças significativas entre os sexos, seguido da ausência de pelos em 30/45 (66,7%). Podemos verificar também pela Tabela 7, que uma grande percentagem de idosos diabéticos apresentavam diminuição da sensibilidade táctil em 25/45 (55,6%), não havendo diferenças significativas entre os sexos, sendo que 11/45 (24,4%) são homens e 14/45 (31,1%) são mulheres. De salientar que 17/45 (37,8%) apresentavam edema dos membros inferiores. Sabe-se que o comprometimento vascular e neurológico periférico está relacionado com a diabetes mal controlada, levando a altrações do fluxo sanguíneo e à consequente diminuição da sensibilidade periférica e amputação. Reiber (1996), certifica que decorridos 3 anos após uma amputação a percentagem de sobrevida é de 50% e no prazo de 5 anos o índice de mortalidade é de 39 a 68%. Assim, torna-se necessário que os diabéticos usem calçado adaptado, uso de palmilhas individualizadas para a distribuição de zonas de pressão normal para evitar a recorrência de feridas na população do estudo, se pode verificar que 20/45 (44,4%) idosos diabéticos já tiveram úlcera e 4/45 (8,9) apresentam úlcera em fase activa (Anexo 2). A avaliação dos pulsos merece da parte do examinador muita atenção, e quando necessário deve pedir-se ajuda de um especialista, na medida em que o diabético pode ter pulsos não palpáveis pelo comprometimento arterial, no entanto pode apresentar boa perfusão devido à circulação colateral compensatória. A verificação dos pulsos nos indivíduos portadores de diabetes é fundamental na detecção de isquémia, oclusão arterial, no entanto, a sua presença não elimina a possibilidade de doença vascular periférica. A isquémia além de comprometer a nutrição dos tecidos de modo a originar feridas, dificulta a sua cicatrização. A evolução da úlcera nos pés pode estar relacionada com o edema geralmente de origem multifuncional, como nefropatia, trombose venosa e edema neuropático. A redução da circulação nos pés pode ser avaliada pelo doppler envolvendo as artérias mais distais, indicando a insuficiência arterial, factor muito importante na evolução de uma lesão nos pés (Consenso Internacional sobre o Pé Diabético, 2001). Tabela 8 - Distribuição dos idosos diabétiocs da Unidade de Saúde, segundo as alterações motoras e estruturais como factor de risco para o desenvolvimento do Pé Diabético. Porto, 2007. ALTERAÇÕES ESTRUTURAIS E MOTORAS Calos Dedo em garra Elevação do dorso plantar SEXO Masculino Nº % Feminino Nº % TOTAL Nº % 18 9 40,0 20,0 20 6 44,4 13,3 38 15 84,4 33,3 5 11,1 1 2,2 6 13,3 Em relação às alterações estruturais e motoras, no nosso estudo e perante a Tabela 8, podemos verificar que a maioria dos idosos diabéticos apresentavam calos, em 84,4% (38/45), acompanhadas de outras alterações sugestivas de neuropatia periférica, não havendo diferenças significativas entre os sexos, e o dedo em garra estava presente em 33,3% (15/45), factor de risco que pode condicionar o aparecimento de novos pontos de pressão nos pés e estimular o aparecimento de úlceras. Podemos ainda verificar que a elevação do dorso plantar está presente em 13,3% (6/45), que associado a uma diminuição da sensibilidade predispõe também ao aparecimento de úlceras. Entre os factores de risco para o desenvolvimento do Pé Diabético, importante salientar-se a presença de alterações estruturais e motoras provenientes da neuropatia diabética. As alterações estruturais e motoras resultam em deformidades do pé. Esta condição dificulta a adaptação de calçados para as pessoas diabéticas os quais são fabricados para a população em geral. Em relação aos problemas relacionados com as deformidades nos pés, Mendes & Novakoski (2000), narraram num estudo realizado com idosos que 81,4% dos idosos diabéticos também apresentaram calosidades. O agravamento das alterações estruturais e motoras está relacionado, também, com a falta de cuidados de higiene concedidos aos pés pelas pessoas diabéticas. No entanto, a falta de conhecimento dos cuidados essenciais com os pés, bem como as condições económicas como referido anteriormente são factores predisponentes para esta condição. Portanto, esta questão deve ser valorizada pelos profissionais que actuam na assistência e educação em diabetes. Em relação aos calos, preconiza-se medidas de higiene e hidratação, amolecimento e “raspagem” quando necessário. Quando ocorre a redução da humidade da pele é sequência da lesão dos nervos que comandam as glândulas cutâneas produtores de suor originando uma pele mais seca e quebradiça podendo levar à formação de calos e calosidades. Essa anormalidade facilita a formação de fissuras com quebra da barreira natural contra infecções proporcionando a formação de úlceras e amputações. Tabela 9 - Distribuição das pessoas diabéticas da Unidade de Saúde, segundo as alterações provenientes da neuropatia autónoma como factor de risco para o desenvolvimento do Pé Diabético. Porto. ALTERAÇÕES PROVENIENTES DA NEUROPATIA AUTONÓMICA Pele seca SEXO Masculino Nº % Feminino Nº % TOTAL Nº % 18 22 40 40,0 48,9 88,9 Fissura TOTAL 1 2,2 4 8,8 5 11,1 19 42,2 26 57,6 45 100,0 No que se refere às alterações provenientes da neuropatia autonómica, apuramos a presença de pele seca em 40/45 (88,9%) idosos diabéticos investigados, sendo 18/45 (40%) homens e 22/45 (48,9%) mulheres. A fissura foi encontrada em 4/45 (8,8%) das mulheres e apenas num homem (2,2%) num total de 5/45 (11,1%), conforme podemos ver na Tabela 9. Estes problemas podem estar associados à falta de higiene e de hidratação. Pedrosas et al. (1998) referem que a neuropatia autonómica provoca uma redução ou ausência da capacidade de secreção de suor nos pés, tornando a pele seca e favorecendo o aparecimento de rachaduras e fissuras, sobretudo nos calcanhares. Tabela 10 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde de Salreu, segundo as alterações provenientes da neuropatia sensitiva como factor de risco para o desenvolvimento do Pé Diabético. Porto. ALTERAÇÕES PROVENIENTES DA NEUROPATIA SENSITIVA Cãimbra Adormecimento Sensação queimadura Parestesias SEXO Masculino Nº % Feminino Nº % TOTAL Nº % 10 3 15 6 10 3 12 6 20 6 27 12 22,2 6,7 33,3 13,3 22,2 6,6 26,7 13,3 44,4 13,3 60,0 26,7 Pelos resultados apresentados na Tabela 10 verificamos que as alterações provenientes da neuropatia sensitiva, idosos diabéticos referiram dor acompanhada de cãibras em 44,4% (20/45), adormecimento em 13,3% (6/45), sensação de queimadura em 60,0% (27/45) e parastesias em 26,7% (12/45)). As alterações provenientes da neuropatia sensitiva através dos testes de sensibilidade táctil com o monofilamento de 10 g, a sensibilidade vibratória com o diapasão de 128 Hz, são apresentados em seguida são que dos 45/45 (100%) idosos diabéticos, 44/45 (97,8%), tiveram a sensibilidade vibratória presente, apesar de que em 36/45 (80,0%) idosos diabéticos existia pelo menos um ponto de comprometimento com o diapasão. Um único idoso não apresentou sensibilidade local na cabeça metatarsiana. 38/45 (84,4%) apresentavam sensibilidades táctil e dolorosa comprometidas assim como os pulsos pedioso e tibial posterior estavam diminuídos em pelo menos um dos membros inferiores em 39 idosos diabéticos (86,7%). De salientar que 33,3% (15/45) dos idosos diabéticos investigados apresentam entre 1 e 4 pontos sem sensibilidade ao monofilamento, representando assim, um risco com relação à sensibilidade protectora plantar (Anexo…). Cabe referir que a sensibilidade táctil com o monofilamento de 10 g foi considerada com ausência de protecção plantar, quando a pessoa diabética era incapaz de sentir o filamento de 10 g em 4 ou mais pontos, entre os dez pontos estabelecidos no estudo, conforme os parâmetros de Wunderlich et al. (1998) e Ahroni (2000). A causa da perda progressiva da sensibilidade dolorosa é devida ao depósito de glicose nos nervos, ocorrendo a diminuição progressiva dos impulsos nervosos, principalmente nos pés (American Diabetes Association, 2004). A dor ou desconforto pode ser abordado pelo comprometimento do nervo, neste caso, o exercício com pesos não são recomendados devido ao alto impacto sobre os pés ou pressão do calçado provocando úlceras. Na diabetes Tipo 2, que representa a totalidade da população do presente estudo, as úlceras de origem vascular geralmente iniciam com dor que aliviam com repouso, alterações cutâneas, as chamadas, úlceras isquémicas. Com todos estes agravantes, os cuidados e orientações com os diabéticos devem ser elevados de forma a prevenir complicações futuras, indo de encontro à estratégia de atendimento proposta pelo Ministério da Saúde, como sendo atribuição de cada profissional que actua nos programas de educação e prevenção no contexto de atenção integral à saúde. Deste modo, antes do aprecimento de lesões nos pés, devem ser implementadas medidas de prevenção e tratamento, na perspectiva de impedir ou atrasar o desenvolvimento deste processo. Vários autores alertam para a necessidade e importância de um programa de acompanhamento de uma equipe multiprofissional, tentando encontrar soluções de acordo com a realidade (Pedrosa et al, 1998; Organização Mundial de Saúde, 2003). O acompanhamento e orientações de forma a contribui para o autocuidado e controlo do metabolismo são importantes na medida de atingir níveis de glicemia satisfatórios. Perante isto, os profissionais devem ser reflexivos e estabelecer empatia de modo a conhecer o indivíduo contribuindo desta forma para uma colaboração da parte do diabético. 1.3 - DIAGNÓSTICO COMPORTAMENTAL Sendo a diabetes uma “doença da sociedade” a sua prevenção e controlo residem em grande medida nos comportamentos das pessoas portadoras desta doença. Os cuidados essenciais com os pés são apresentados no diagnóstico comportamental, ou seja, os comportamentos adoptados pelos idosos diabéticos para a prevenção do Pé Diabético no que diz respeito à lavagem diária dos pés; secagem dos espaços interdigitais; hidratação diária dos pés; corte de unhas; observação dos pés; tipo de meia; tipo de calçado; verificação de calçado antes de usá-lo. Tabela 11 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, acerca dos factores de risco segundo as questões referentes ao comportamento adequado e não adequado dos cuidados essenciais com os pés no primeiro momento. Porto. Cuidados Essenciais com os Pés Comportamento adequado Nº % Lavagem pés diariamente Secar regiões interdigitais Remoção de calosidades Hidratação da pele Corte de unhas Observação dos pés Andar descalço Verificação de calçado Calçado adequado Tipo de meias 4 3 6 3 4 6 40 12 10 4 8,9 6,7 13,3 6,7 8,9 13,3 88,9 26,7 22,2 8,9 Comportamento não adequado Nº % 41 42 39 42 41 39 5 33 35 41 91,1 93,3 86,7 93,3 91,1 86,7 11,1 73,3 77,8 91,1 De acordo com o primeiro contacto directo com o diabético e dentro dos factores de risco relacionados com os cuidados essenciais com os pés, Tabela 11, encontramos que 41/45 (91,1%) dos idosos diabéticos apresentavam higiene inadequada, com igual percentagem para o corte inadequado das unhas e para o tipo de meias inadequado. Outros factores de risco com elevada frequência foram encontrados, em 42/45 (93,3%) dos idosos diabéticos não tinham como hábito secar os espaços interdigitais e hidratar os pés. Além disso, 39/45 (86,7%) das pessoas referiram não ter o hábito de examinar os pés e todos eles apresentavam calosidades em várias regiões dos pés. Foi também possível através da análise das respostas verificar que 33/45 (73,3%) não verificava o calçado antes de o usar e 35/45 (77,8%) não utilizava calçado adequado. Os idosos diabéticos descreveram os chinelos e “calçado normal” (51,2%) como o calçado mais utilizado. 5/45 (11,1%) dos idosos diabéticos referiram gostar andar descalços em casa e 22,4% não sabiam que a diabetes pode levar ao desenvolvimento de problemas nos pés. Considerou-se calçado inapropriado, conforme descrito no estudo de Pace et al. (2002), aqueles que eram apertados, de biqueira fina, abertos e sem atacadores. Estudos da literatura assinalam os pontos de alta pressão como as calosidades, deformidades, amputação dos dedos podem ser corrigidos ou prevenidos com calçado confortável ou especiais auxiliados com palmilhas (Frytschi, 2001; Associação Americana de Diabetes, 2002). O calçado para as pessoas diabéticas devem ser cómodos e acolcheados. A aquisição deste tipo de calçado reflecte dificuldades de ordem económica, bem como a aquisição de palmilhas, cremes e outros artefactos para a prevenção de problemas nos pés, gerando um sentimento de impotência e, muitas vezes, de revolta. O uso de meias macias pode reduzir de igual forma a pressão sobre os pés. Importante realçar que as respostas dos idosos diabéticos estudados sobre a remoção de calosidades, incidiram a maior parte das vezes de forma errada, sendo feita com uso de materiais cortantes, lixas e produtos químicos, o que pode gerar consequências indesejáveis para a pessoa diabética e gerando riscos para o desenvolvimento de Pé Diabético. Continuando na análise da Tabela 11 e em relação ao comportamento adequado obtivemos que 10/45 (22,2%) usam calçado adequado e 12/45 (26,7%) verificam o calçado antes de o usar e apenas 6/45 (13,3%) referem fazer observação diária aos pés. Apenas é de notar que existe uma reduzida percentagem dos idosos diabéticos que têm raros cuidados essenciais com os pés. Apesar de a maioria dos idosos diabéticos referir lavar os pés diariamente, à observação verifica-se que não coincide com a realidade, notando-se sinais de pouca higiene nomeadamente espaços interdigitais húmidos de cheiro característico, unhas sem higiene e de grande tamanho. As unhas têm o seu papel de protecção dos dedos. Devido à sua localização distal, são facilmente expostas a traumatismos, o que proporciona um risco elevado de traumatismos e lesões. “As alterações estruturais das unhas, introduzidas pela diabetes e suas complicações - neuropatia e vasculopatia - conduzem não só à perda da sua função primordial - função protectora como as convertem em agentes agressores dos tecidos circundantes” (Pereira, 2004). O tamanho da unha é uma questão fundamental que o utente/ família devem ter em consideração. O corte das unhas deve ser feita de forma que a extremidade livre faça um ângulo de 90º com as margens. Polir o bordo livre das unhas contraria o seu crescimento e espaça a necessidade do corte. Quando estes factores estão associados ao alto índice de calos ou à diminuição da sensibilidade predispõem o sujeito ao aparecimento de lesões e aumenta mais o risco quando não há o hábito de examinar frequentemente os pés. Esta afirmação pode ser fundamentada por Hernandes (2000) quando nos diz que as complicações dos membros inferiores estão directamente relacionada a uma deficiência na educação dos clientes diabéticos, que tem baixa percepção dos riscos e das medidas de prevenção. 1.4 - DIAGNÓSTICO EDUCACIONAL A seguir, apresentamos a descrição do conhecimento dos idosos em relação aos cuidados com os pés no primeiro momento de intervenção, na prevenção do Pé Diabético os quais fazem parte do diagnóstico educacional e que são factores que podem proporcionar a motivação para a mudança de hábitos: lavagem dos pés; secagem dos pés; remoção de calos; hidratação dos pés; corte das unhas; exame dos pés; andar descalço; verificação do calçado antes de usá-lo; calçado adequado; tipo de meias. Tabela 12 - Distribuição dos idosos diabétiocs da Unidade de Saúde, acerca dos cuidados essenciais com os pés em relação ao conhecimento certo e errado no pré ensino. Porto. Cuidados Essenciais com os Pés Conhecimento certo Nº % Conhecimento errado Nº % Lavar os pés diariamente Secar regiões interdigitais Raspar calosidades Hidratar os pés Cortar as unhas Observar os pés Andar descalço Verificar o calçado Usar calçado adequado Usar meias adequadas 25 10 21 10 7 12 40 28 13 8 20 35 24 35 38 33 5 17 32 37 55,6 22,2 46,7 22,2 15,6 26,7 88,9 62,2 28,9 17,8 44,4 77,8 53,3 77,8 84,4 73,3 11,1 37,8 71,1 82,2 Dos conhecimentos preventivos investigados e de acordo com os resultados podemos verificar, como apresentado na Tabela 12 que existem algumas perguntas com respostas correctas em que 40/45 (88,9%) conhecem a necessidade de não andar descalço e 28/45 (62,2%) relataram fazer a inspecção do calçado antes de o usar. Dos 45 idosos diabéticos sondados, 25/45 (55,6%) reconhecem a importância da lavagem diária dos pés, 13/45 (28,9%) sabem qual o tipo de calçado adequado e 12/45 (26,7%) conhecem a necessidade da observação dos pés. Podemos ainda verificar que 10/45 (22,2%) referiram que os pés devem ser hidratados e que os espaços interdigitais devem ser bem secos, 8/45 (17,8%) têm conhecimento correcto em relação ao tipo de meia e 7/45 (15,6%) em relação ao corte de unha correcto. Perante a avaliação das práticas preventivas habitualmente praticadas deparamo-nos com um alto risco de esta população vir a desenvolver Pé Diabéticos se não forem tomadas medidas de prevenção. Quanto ao conhecimento errado, 38/45 (84,4%) não sabem a maneira correcta de cortar as unhas, 37/45 (82,2%) não têm conhecimento do tipo de meia que deve usar e 35/45 (77,8%) não reconhecem a necessidade de secar os espaços interdigitais e hidratação dos pés. Em relação à observação dos pés 33/45 (73,3%) referiram não saber dessa importância. A falta de conhecimento das pessoas investigadas quanto ao tipo de calçado foi observada em 32/45 (71,1%) idosos diabéticos. Nos resultados apresentados, podemos pois, verificar pela Tabela anterior que uma grande maioria dos inquiridos em relação a todos os cuidados essenciais com os pés apresentam conhecimentos preventivos precários, o que nos leva a afirmar que existe uma relação significativa entre o comportamento praticado e os conhecimentos preventivos que este grupo de pessoas possue. Podemos desta forma concluir que a informação dos idosos dibéticos do estudo é insuficiente e salienta-se a necessidade de estabelecer estratégias de ensino preventivas e terapêuticas que tenham em conta e envolvam a pessoa diabética no seu meio familiar e sociocultural. Estes resultados merecem uma reflexão atenta, pois alguns dos investigados tentam negar a sua doença e procuram demonstrar tranquilidade e domínio da doença, mesmo sabendo que não tinham conhecimentos suficientes que pudessem levá-los a um autocontrolo mais eficaz, quando nos dizem: “…ter diabetes não me causa problemas, levo uma vida normal” “os cuidados que tenho é que faço dieta e não como açúcar, é difícil, porque não posso comer nada…” “estou conformada, o que posso fazer?” Quando questionámos os idosos diabéticos do nosso estudo sobre as orientações recebidas pelos profissionais de saúde, quase todos reponderam que nunca tinham recebido orientações, apenas 10/45 afirmaram ter recebido alguma informação anterior pela investigadora e 4/45 em consultas de referência. “o médico só passa as receitas e os exames, nunca diz nada…” “sabia que tinha que fazer dieta e não comer açúcar, nunca ninguém me disse nada dos pés, nem sabia nada disso…” “alguma coisa que ouvi falar, foi consigo da outra vez…” “nunca ninguém me tinha falado nada, estou agora a ouvir pela primeira vez” “foi na consulta pela Sra enfermeira, mas preciso de receber mais orientações, porque esta doença é muito má…” Entende-se destas falas e ao longo da pesquisa que fundamentalmente os inquiridos apenas têm conhecimentos adquiridos do senso popular, não conseguindo deste modo o diabético encontrar novos mecanismos de adaptação e conscicialização de novos estilos de vida de forma a que possa procurar mudança no seu comportamento para prevenção de complicações nomeadamente o Pé Diabético. Podemos deste modo esperar que o cumprimento das orientações dadas se faça à medida que lhes é dada a oportunidade para conhecer os problemas e aprender a lidar com eles. O enfermeiro, como prestador de cuidados e educador do idoso diabético, poderá ser um elemento elementar no desenvolvimento de conhecimentos através da promoção de educação em saúde aos pacientes diabéticos, proporcionando-lhe hábitos de vida saudáveis. É de igual importância que o enfermeiro desperte no diabético a motivação para o autocuidado, procurando mudanças de comportamentos e atitudes a fim de conquistar a auto-estima, a vontade de aprender, controlar e viver com a sua doença. 2 - SEGUNDO MOMENTO DE AVALIAÇÃO Evidências cientifícas sugerem que a variação no cumprimento das recomendações preventivas e terapêuticas constituem um factor importante no que diz respeito às diferenças das respostas ao tratamento das doenças crónicas. A intervenção nos factores de risco requer uma colaboração da pessoa, sendo ela o agente directo da mudança necessária no estilo vida, comportamento, conhecimento e competências, para uma melhor qualidade de vida. Neste segundo momento de avaliação apresentamos os dados referentes à avaliação da mudança de comportamentos e conhecimentos dos idosos diabéticos após acção de Educação para a Saúde no primeiro momento. Fazemos posteriormente a comparação dos comportamentos e conhecimentos antes e depois da Secção de Educação para a Saúde e sua discussão. Assim, os resultados esperados nos idosos diabéticos incluem o conhecimento e as capacidades necessárias para prestar cuidados adequados aos seus pés, comportamentos desejáveis e melhoria dos resultados de saúde. Passamos de seguida a apresentar os resultados. Nas Tabelas 13 e 14 apresentamos os comportamentos adequados/não adequados e o conhecimento certo/errado acerca dos cuidados essenciais em relação à higiene com os pés, cuidados gerais com pés e cuidados essenciais com calçados e meias, respectivamente, com o intuito de compreender a discrepância entre o comportamento e o conhecimento acerca dos cuidados essenciais com os pés. Tabela 13 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde em relação ao comportamento adequado com os pés após ensino. Porto. Cuidados Essenciais com os Pés Comportamento adequado Nº % Lavagem pés diariamente Secar regiões interdigitais Remoção de calosidades Hidratação da pele Corte de unhas Observação dos pés Andar descalço Verificação de calçado Calçado adequado Tipo de meias 25 22 11 15 30 15 44 41 21 37 55,6 48,9 24,4 33,3 66,7 33,3 97,8 91,1 46,7 82,2 Comportamento não adequado Nº % 20 23 34 30 15 30 1 4 24 8 44,4 51,1 75,6 66,7 33,3 66,7 2,2 8,8 53,3 17,8 Como podemos verificar na Tabela 13, dos 45 (100%) idosos diabéticos que receberam a informação, quase todos, 44/45 (97,8%) responderam não andar descalço, 41/45 (91,1%) mencionaram verificar o calçado antes de usá-lo, 37/45 (82,2%) usam meias apropriadas e 30/45 (66,7%) aprenderam a melhor forma de cortar as unhas para prevenir complicações. Podemos verificar que apenas 25/45 (55,6%) dos idosos diabéticos apresentam comportamento adequado da lavagem dos pés diária, sendo na maioria das vezes, conforme relatam os idosos diabéticos, esta actividade relizada de uma forma mecanizada quando tomam banho e são tratados como o resto do corpo. Importante referir aqui, o uso de produtos de limpeza não aconselháveis e também o uso de água muito quente, porque a sensibilidade dos pés pode estar diminuída, causando riscos de lesão nos pés. Ao analisarmos o comportamento não adequado acerca dos cuidados essenciais com os pés, podemos observar que dos 45 (100%) idosos diabéticos investigados 34/45 (75,6%) continuam a apresentar calosidades ou removem os calos com lixas inadequadas, 30/45 (66,7%) não têm hábito de hidratar e observar os pés diariamente, 32/45 (71,1%) continuam a usar calçado aberto em casa e para sair, a maior parte com costura e 15/45 cortam as unhas de forma incorrecta (33,3%), o tipo de sabonete para lavagem dos pés. Tabela 14 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde em relação ao conhecimento certo e errado após ensino. Porto. Cuidados Essenciais com os Pés Conhecimento certo Nº % Conhecimento errado Nº % Lavagem pés diariamente Secar regiões interdigitais Remoção de calosidades Hidratação da pele Corte de unhas Observação dos pés Andar descalço Verificação de calçado Calçado adequado Tipo de meias 42 38 35 34 40 35 44 45 35 40 3 7 10 11 5 10 4 0 10 5 93,3 84,4 77,8 75,6 88,9 77,8 97,8 100.0 77,8 88,9 6,7 15,6 22,2 24,4 11,1 22,2 8,8 0,0 22,2 11,1 Da análise da Tabela 14 podemos concluir que a maioria dos idosos diabéticos mostram ter conhecimento acerca dos cuidados essenciais com os pés. Dos 45 (100%) idosos diabéticos investigados, todos mencionaram verificar o calçado antes de usá-lo. Os 44/45 (97,8%) reconhecem a necessidade de nunca andar descalço, 42/45 (93,3%) reconhecem a importância da lavagem diária dos pés, 40/45 (88,9%) que as unhas devem ser cortadas de forma recta e sabem qual o tipo de meia a utilizar, 38/45 (84,4%) responderam que os espaços interdigitais devem ser secados e 35/45 (77,8%) referiram que os pés devem ser examinados diariamente com igual número de idosos diabéticos que reconhecem a maneira de remoção de calos. O estudo de Barbui & Cocco (2002), cit por Scapim (2004) concluiu que as pessoas diabéticas sabiam que os cuidados adequados com os pés eram necessários, porém o autocuidado não era realizado correctamente, apesar de mais de 60% utilizarem calçados fechados e de 85% referirem lavar pés com água e sabão e enxugá-los adequadamente. Os mesmos autores ainda referem que, apesar dos idosos diabéticos investigados referirem a importância do cuidado com os pés na prevenção de complicações, porém apenas 50% os examinam diariamente. Em relação ao conhecimento errado, podemos afirmar que dos 45 (100%) idosos diabéticos investigados 11/45 (24,4%) não mencionaram a hidratação dos pés diária, 10/45 (22,2%) desconheciam a maneira correcta de remoção de calos e davam importância à observação dos pés. A falta de conhecimento por parte das pessoas diabéticas quanto ao cuidado com as regiões interdigitais, ao tipo de meias e à maneira correcta do corte de unhas, também, foi observada pelas autoras, as quais constataram que apesar da informação oferecida, 4 delas, ainda, andavam descalças. No Gráfico 5, verificamos a discrepância entre o comportamento de cuidados dos idosos diabéticos em relação ao conhecimento destes cuidados, acerca da prevenção do Pé Diabético. Gráfico 5 - Distribuição dos idosos diabéticos da Unidade de Saúde, em relação ao comportamento adequado e conhecimento certo no pré e pós ensino. Porto. 50 45 40 35 30 25 20 15 10 5 Pré ensino Comportamento Adequado Comportamento Adequado Pré ensino Conhecimento Correcto Tipo de meias Calçado adequado Verificação de calçado Andar descalço Observação dos pés Corte de unhas Hidratação da pele Remoção de calosidades Secar regiões interdigitais Lavagem pés diariamente 0 Pós-ensino Conhecimento Correcto Em relação ao cuidado essencial lavar os pés diariamente, avaliámos que dos 45 (100%) idosos diabéticos investigados, 25/45 (55,6%) referiram comportamento adequado e 42/45 (93,3%) apresentavam conhecimento certo. A higiene da pele é fundamental para a manutenção do corpo saudável, no diabético é necessário que mantenha a pele limpa para que a qualquer sinal de alteração possa ser detectado de imediato como sendo a alteração da cor, elevações e dermatoses, entre outras., a maioria 44/45 (97,8%) apresentava comportamento adequado. Mendes & Novakosky (2000), num estudo de uma população idosa, chegaram à conclusão de irregularidades nas condições de higiene, em que 74,4% não secavam os espaços interdigitais e 65,2% tinham dificuldade em cortar as unhas. Esta falta de orientação pode desencadear outros processos infecciosos interferindo na manutenção metabólica do indivíduo. No que diz respeito ao cuidado essencial, secar os espaços interdigitais, encontrámos que 22/45 (48,9%) referiram comportamento adequado apesar de 38/45 (84,4%) apresentarem conhecimento certo. Os dados obtidos, em relação ao exame físico dos pés, apontaram a presença de humidade e massa branca interdigital em 25/45 (55,6%) dos idosos diabéticos, o que pode nos levar a pensar que o comportamento em relação à secagem inadequada dos espaços interdigitais é um dos factores predisponentes para o aparecimento de complicações nos pés neste grupo. Com relação ao cuidado essencial, hidratar os pés diariamente, somente 15/45 (33,3%) idosos diabéticos apresentaram comportamento adequado dos 35/45 (77,8%) que tinham conhecimento certo. Foi possível verificar que apesar de ser reduzido o grupo que tem conhecimento acerca deste cuidado ainda é mais reduzido o grupo que o realiza. No presente estudo, 40/45 (88,9%) dos idosos diabéticos apresentam os pés com pele seca e 5/45 (11,1%) com fissuras. Podemos concluir que eles não detêm conhecimentos sobre a importância e maneira adequada de hidratar os pés e consideramos que se torna fundamental a procura de estratégias efectivas para que haja a incorporação de comportamentos adequados, como nos mostram os exertos das entrevistas e que apresentamos a seguir: “Quando ponho creme ponho no pé todo…também entre os dedos” “Depois do banho aplico creme quando a pele está muito seca… sim, em todo o lado” “Quando tomo banho passo no corpo e nos pés, porque tenho a pele muito seca” “Não, não… não costumo fazer isso, limpo os pés e pronto…” “Ponho creme no verão porque ando de chinelas e os pés ficam mais macios e ficam mais bonitos” “Eu,…eu não faço isso, …isso é para as mulheres” Parece-nos que para o grupo estudado este comportamento não faz parte dos cuidados assumidos e que para muitos é uma necessidade desconhecida havendo outras questões que intervêm no comportamento das pessoas como sendo o sexo, auto-imagem, bem como os seus hábitos diários e costumes. Reflectindo acerca destes depoimentos, podemos verificar que existe uma associação entre a realização de cuidados com os pés como sendo cuidado da mulher, o que pode levar a dificuldade em achar o cuidado importante como prevenção de Pé Diabético. Podemos assim concluir que neste grupo existe grande desconhecimento da necessidade da hidratação dos pés, e quando existe nem sempre é executado de forma correcta e nos locais certos. Cabe ao enfermeiro alertar e motivar os diabéticos da importância deste cuidado evitando problemas de úlcera e até mesmo comprometendo a vida dessas pessoas. Dos idosos diabéticos 45 (100%) que têm conhecimento certo acerca da remoção dos calos, apenas 11/45 (24,4%) apresentam comportamento adequado. Deduz-se dos dados que a maioria das pessoas diabéticas investigadas apresentam calosidades e este factor é, assim, considerado predisponente para as complicações nos pés. Este factor é derivado de modificações do posicionamento e da mobilidade de um/ou de ambos os pés que originam zonas de maior pressão obrigando a pele a ficar mais espessa surgindo a hiperqueratose e consequentemente este processo é facilitador de ulcerações através de hemorragias subcutâneas ou articulares e rotura da pele, ficando deste modo exposta a infecção. De salientar que o processo de envelhecimento associado à diabetes causa alterações músculo-osteoarticulares, assim como de alterações nervosas e de irrigação. Progridem de uma forma silenciosa, sem dor e assintomática quando a insenssibilidade neuropática está presente e que associadas à infecção podem evoluir para necrose e amputação. Por outro lado, a alta incidência de calosidades pode indicar o uso de calçado inadequado, ausência de palmilhas e falta de cuidados com os pés. O comportamento das pessoas diabéticas em relação à presença de calosidades é explicado pelos exertos das entrevistas: “Corto os calos quando aparecem com uma faca até desaparecer” “Tiro o calo com calicida, disseram-me que era bom para acabar com eles…” “Tenho aí esses malditos… que me doem tanto… mas não sei como tirá-los” “Ás vezes tiro com uma lixa, mas dói muito…” “Não costumo tirar, mas este aqui dói-me muito, nem consigo andar calçado ” Podemos observar quanto à remoção de calosidades, neste grupo, além de se verificar falta de conhecimento, quando se faz é realizada de forma incorrecta, sendo feita com uso de materiais cortantes e lixas o que pode levar a consequências graves para a pessoa: o desenvolvimento de Pé Diabético. As alterações sensitivo-motoras e autonómicas, as calosidades, associadas a comportamentos negligentes e conhecimentos insuficientes, levam-nos a concluir que os idosos do nosso estudo correm altos riscos de virem a desenvolver “pé neuropático”. A prevenção desta condição leva à identificação de um diagnóstico precoce e uma correcção e protecção de imediato, com educação e mudanças de comportamentos deste grupo de pessoas. Em relação às unhas, quando existem alterações estruturais deixam de ter a função de protecção dos pés, além de se tornarem uma agressão para os mesmos. As alterações dermatológicas das unhas podem ser de vária ordem: hematoma subungueal, onicólise traumática, onicomicose, onicogrifose, onicocriptose, entre outros. No nosso estudo, relativamente ao corte das unhas, apenas 4/45 (8,9%) apresentam comportamento adequado (corte da unha em formato quadrado), apesar de 25/45 (55,6%) referir conhecimento certo da forma de cortar as unhas. A dificuldade de realizar este cuidado correctamente é devido à falta de educação, à idade avançada e aos problemas apresentados pelas pessoas investigadas, conforme se pode analisar nos seguintes exertos das entrevistas: “corto as unhas de vez em quando, quando estão grandes e me aleijam no sapato…cortoas redondas” “Tenho que cortar sempre nos cantos porque me aleija” “tenho este problema nas unhas, parece farinha lá de dentro, tiro essa massa com a ponta da tesoura de vez em quando” “Corto as unhas com uma tesoura forte que tenho porque essas unhas são muito duras e grossas… aí uma vez por mês, às vezes tenho de pedir à minha mulher para me ajudar, porque não consigo chegar lá muito bem…sabe?” “é a minha mulher que as corta, eu não consigo dobrar-me, é ela que me faz praticamente tudo” “Corto sempre as unhas muito rentinhas nos cantos para não deixar encravar” “Eu já não consigo cortar as unhas, não vejo muito bem e de vez em quando peço à minha filha para as cortar” Nestes enxertos realçamos o cuidado com o corte das unhas por pessoas diabéticas com acuidade visual prejudicada. Ochoa-Vigo & Pace (2005) afirmam que quando uma pessoa diabética tem dificuldade visual ou outro tipo de limitação, uma outra pessoa deveria ser preparada para realizar esse cuidado, avaliando os pés diariamente em busca de lesões. Ainda em relação ao corte das unhas, Scapim (2004) encontrou que 65% dos idosos diabéticos investigados cortavam as unhas de forma inadequada. De ressaltar que dos 7 idosos diabéticos que apresentaram conhecimento da maneira correcta de cortar as unhas, apenas 4 o realizam de forma adequada. Este dado é de extrema importância para a reflexão do profissional de saúde uma vez que é um procedimento quotidiano e simples e mesmo assim não é realizado correctamente. Ao analisarmos a realização do exame diário dos pés dos idosos diabéticos verificamos que dos 45 (100%) apenas 15/45 (33,3%) referiram realizar o exame diário aos pés, apesar de 35/45 (77,8%) apresentarem conhecimento certo. O calçado é o meio de se protegerem os pés de agressões, contudo o seu uso quase exclusivamente adaptado ao comprimento do pé, ligado à moda e aos interesses económicos, sem preocupações com as pessoas que sofrem de certas patologias como sendo a diabetes. Quando um diabético pretende adquirir sapatos, deve fazê-lo sempre de tarde, quando os pés estão mais edemaciados. Devem ser macios, maleáveis, de preferência de couro, sem costuras interiores, biqueira redonda, tacão com ligeira altura (2-2,5 cm), de atacadores, de sola macia e flexível, usar palmilhas de protecção e enquanto novos, não andar mais de 2 horas. No que se refere ao uso de calçado adequado, encontramos que dos 35/45 (77,8%) idosos diabéticos com conhecimento certo, apenas 21/45 (46,7%) mostram usar este tipo de calçado, usando frequentemente calçado aberto em casa e na rua. Ainda no que se refere a este comportamento, obtivemos dos 45 (100%), que 5 deles andavam descalços em casa. Podemos verificar este comportamento nos exertos que se seguem: “No verão uso sempre sandália, não consigo andar com sapatos porque me doem muito os pés” “Em casa gosto de andar descalça, tenho os pés mais frescos e não estão apertados” “Uso sapatos e sandália para sair…, em casa uso chinelos” “Costumo andar de ténis quase sempre, mesmo no campo” “Quando chego a casa do campo calço logo os chinelos para andar com os pés mais à vontade” “Uso sapatos com e sem costuras para sair, no campo uso botas” De acordo com um estudo realizado por Neill (2002) acerca do tipo de calçado em pessoas diabéticas, sem ferida, os utentes apenas usavam sapatos especialmente adequados para o efeito, após terem tido severos problemas dos pés ou úlceras. Como estamos perante um grupo essencialmente agrícola, é preciso considerar que nem sempre as pessoas diabéticas têm condições económicas para adquiri-los. Reconhece-se que o calçado adequado é de extrema importância, uma vez que a maioria dos traumatismos dos pés provém de calçados de tamanho inadequado; excessivamente baixos ou pontudos; feitos de material inadequado ou com saltos muito altos. Dada a falta de sensibilidade do Pé Diabético, este processo evolui sem a valorização do doente, cabendo ao enfermeiro explicar o grau de risco destas situações e insistir na sua correcção (Sauders, 2002). Segundo Pereira (2004), na ausência de sensibilidade, os diabéticos devem ser considerados inaptos para experimentar e adquirir directamente os sapatos. Neste caso, o utente deve ser ajudado por um técnico de saúde e indispensável observar detalhadamente o pé direito e o esquerdo, no que concerne ao grau de sensibilidade, deformações zonas de pressão e edema, sem esquecer a avaliação dos recursos económicos, bem como do sistema de saúde em que se encontra inserido. A cultura também pode ter um papel importante na determinação e adesão ao uso apropriado de calçado. Segundo Neil (2002), em algumas áreas geográficas, o uso de sapatos não é valorizado, especialmente em casa e no tempo quente. De acordo com este autor uma grande percentagem de diabéticos caminha descalço, no escuro, o que aumenta a probabilidade de lesões. Sabe-se também que “ Uma percentagem significativa de lesões nos pés diabéticos, feridas e fracturas patológicas surgem em consequência de «pancadas» que ocorrem durante a noite, quando o diabético se levanta da cama e se desloca descalço aos sanitários, pisa um corpo estranho ou tropeça na cama ou na cadeira” (Pereira, 2004). A educação, para mudar padrões vincados de comportamento, requer sensibilidade e insistência na vida dos pacientes (Neil, 2002). Para atingirmos estes objectivos a 100%, cada diabético deveria ter o calçado fabricado de acordo com o molde dos seus pés, o que se tornaria altamente dispendioso. Tal como refere Anderson et al (2000), as crenças e comportamentos de saúde são influenciadas pelos factores socioeconómicos. No caso dos sapatos, existe a alternativa a ortóteses (palmilhas previamente confeccionadas para o caso), tendo em conta que, nos doentes em situação de elevado risco, as deformações devem ser tratadas, se possível, por meios não cirúrgicos. Os moldes dos sapatos e as deformidades variam de pessoa para pessoa, tal como os pés, que também mudam em todas as pessoas, de acordo com as diferentes etapas da vida. As palmilhas funcionam como interface entre o pé e o sapato, com duas superfícies distintas, no respeitante à forma e, por vezes, aos próprios materiais de construção. As grandes vantagens assentam no facto de estas poderem ser destacadas e aplicadas em diferentes pares de sapatos, serem de preços acessíveis e poderem responder às diferentes necessidades para cada um dos pés. Em relação ao comportamento de verificar o calçado antes de o usar, obtivemos que apenas 12/45 (26,7%) dos 28/45 (62,2%) idosos diabéticos que têm conhecimento certo, têm como hábito realizar este cuidado antes de se calçar. Para proteger os pés dos diabéticos existem também as meias que devem ser de cor clara de modo a exporem algum exsudado existente, sem costuras e elástico e de material adaptado à estação do ano. No caso de fracos recursos económicos devem calçar-se do avesso e cortar os elásticos. No que se refere ao tipo de meia, apenas 8/45 (17,8%) que possuem o conhecimento referente ao tipo de meia indicada pelo Consenso Internacional do Pé Diabético e apenas metade usavam o tipo de meia adequado, utilizando meias de algodão. sem costuras e de cor clara. “No verão uso mais meias claras e finas, no Inverno uso meias de lã e escuras por causa do frio” “Uso sempre meia fina preta por causa do luto do meu marido” “As minhas meias são de qualquer qualidade, finas no verão e grossas no Inverno…costumo usar meias ao contrário para não entrarem as bruxas comigo” Perante os resultados do nosso estudo, podemos concluir que apesar dos conhecimentos e os comportamentos se relacionarem, existe uma grande diferença entre o que as pessoas sabem àcerca dos cuidados com os pés e aquilo que realmente fazem. Podemos verificar que existe escasso conhecimento acerca deste cuidado, por isso cabe-nos, a nós enfermeiros, fornecer subsídios para que a pessoa diabética possa reavaliar o seu comportamento acerca dos cuidados com os pés. Nos dados e nos exertos dos idosos diabéticos deste estudo, observámos que adoptavam comportamentos inadequados com os pés, apesar dos conhecimentos sobre os cuidados e forma de realiza-los e da noção do risco de amputação. O conhecimento parece ser necessário mas não é suficiente para produzir competências e autocuidado adequado. Portanto, é possível concluir que existe uma lacuna entre o saber e o fazer, o que nos remete a analisar a atitude apresentada pelos idosos diabéticos. Perante o exposto é de extrema importância tentar compreender o comportamento destas pessoas. Esta constatação merece ser objecto de novas investigações. Os resultados encontrados e algumas das conclusões da pesquisa resultante da análise de conteúdo realizada são apresentados em quadros a fim de melhor os evidenciar. Em cada um é reproduzida a frequência atribuída às categorias e/ou subcategorias identificadas. No conjunto dos entrevistados, as respostas relativamente ao diagnóstico educacional foram agrupadas em significado/sentimentos e oportunidades para as orientações. duas categorias: Relativamente ao que os idosos sentem e significa ter ou vir a ter complicações com nos pés foi definida a categoria, significado/sentimento em relação às complicações com os pés com 67 indicadores divididos em três subcategorias: reconhecer complicações, desconhecer complicações e a importância dos cuidados com pés, respectivamente; Quadro 6 - Significado/sentimento dos idosos diabéticas em relação às complicações Categorias Subcategorias Indicadores Freq. T. Ind. T. Ind. Ind. Subcat Cat. Reconhecimento “Antes não tinha esta preocupação” (E4), das complicações (E6),(E15),(E21),(E34),(E40) 6 “Preocupa-me muito” (E3),(E4),(E20) 3 “Posso ter que cortar o dedo” (E11),(E40) 2 “Não sabia, agora já sei e preocupo-me” (E12),(E25) “ 2 “Tenho muito cuidado” (E20),(E42),(E45) 3 “Somos obrigados…” (E14),(E44) 2 Desconhecimento “Não tenho com os pés…” das complicações (E5),(E9),(E16),(E23), (E33),(E35),(E44) 18 7 “…o meu problema é a perna que me dói” (E12),(E13),(E18),(E25),(E41) 5 “…o meu problema foi uma micose nos dedos mas já passou” (E1) 1 “Tenho dois calos mas não é da diabetes” (E1),(E19),(E31),(E38) 4 “Já tenho estes calos há muitos anos” (E2) 1 “O problema são estes dedos, um em cima do outro que não me deixam andar” (E3), Significado / (E10) 2 Sentimentos Importância dos “Tenho pavor em imaginar…” (E4),(E10), cuidados (E14),(E25),(E27),(E36) 6 “…desde o 1º dedo, pé, perna e outra perna” (E7),(E18),(E25) 3 “…marcou-me muito” (E18),(E25),(E33), (E38) 4 “O meu medo são os pés” (E8),(E13),(E22) 3 “…cortou a unha rente e o dedo caiu” (E25) 1 “…deixou-me apavorada” (E27),(E39) 2 “…são complicações perigosas” (E5),(E9), (E11),(E18),(E43) 5 20 “…já vivenciei isso…ficamos cismados” (E12),(E17),(E26),(E34),(E44) 5 29 Na subcategoria reconhecimento, encontramos como unidade de significado sentimentos de preocupação e sentimentos de obrigação dos idosos diabéticos com a doença e a complicação com os pés. Os enxertos abaixo mencionados trazem sentimento de preocupação com a doença e reconhecimento das suas complicações. “Antes de ter esta doença eu não tinha esta preocupação. Sempre que me feria cicatrizava logo. Acho que o formigueiro que sinto nos pés é da diabetes,… sinto que é o fim”. “O problema é este dedo que está torto. As maiores complicações dos diabetes são os pés, não é? Posso ter que cortar o dedo por estar assim…. Preocupa-me, muito!” “Eu não sabia que acontece isso, se me ferisse demorava a cicatrizar. Agora já sei, já tenho conhecimento e preocupo-me” “Ter complicações é o fim da vida, é ir para o cangalheiro, por isso preocupa-me” “Preocupo-me porque já não consigo dobrar-me para chegar aos pés e tratar deles e a minha mulher também já vê pouco” “às vezes quero tratar dos pés mas não consigo, porque já não vejo bem e tenho medo de me cortar” Quanto à unidade de significado, sentimento de obrigação é preciso compreender que a mudança de um determinado comportamento implica em primeiro lugar a identificação do motivo pelo qual as pessoas se comportam de determinada maneira, para posteriormente envolvê-los em um processo de consciencialização, motivação e educação. Os enxertos abaixo expressam estes sentimentos. “Tenho muito cuidado porque dizem que é perigoso”. “... somos obrigados a trata, se tivermos algum problema”. “Tem sinais que acabam por se tornar um alerta constante para quem tem esse problema, esse tipo de doença. Comecei a ouvir…, também li alguma coisa e isso fica na cabeça de uma forma tal que a gente passa a ter mais cuidado com os pés, coisas que às vezes eu nem olhava para eles,...”. “Antes de você me dizer eu não tinha essa preocupação. Quando me aleijava cicatrizava logo, agora tenho mais cuidado”. “Somos obrigados a ter cuidado se não quisermos ter problemas com os pés” Como é possível observar nos enxertos anteriores, após o reconhecimento da diabetes como um problema, alguns dos idosos diabéticos deste estudo estiveram mais alerta para os riscos que afectam os pés, no entanto, a disposição das pessoas 67 para adoptarem mudanças em seu estilo de vida é um processo complexo que envolve a percepção das causas e dos riscos da doença que os acometem. É de vital importância para todo o diabético apreender conhecimentos sobre a doença para que possa adquirir comportamentos saudáveis e colaborar para a compensação da sua doença. Entretanto, sabemos que é necessária uma disposição interior para mudança de hábitos e de estilo de vida. Quando comparamos com o estudo de Stuchi (2004), em que se utilizou a técnica de medo, apresentando uma fotografia de um pé com lesões, para mostrar a necessidade de avaliação periódica dos pés e o autocuidado, foi identificado que a estrutura perdas e ganhos, moldada nas mensagens, não foi influente, os entrevistados mantiveram o comportamento de risco à saúde e aos pés, logo, a comunicação persuasiva não foi capaz de modificar as crenças de comportamento de controlar a diabetes. Neste contexto é fundamental que o Enfermeiro desperte no idoso diabético motivação para o exercício de acções de autocuidado, procurando mudança de comportamentos, atitudes a fim de conseguir auto-estima, vontade de aprender e controlar a própria doença. É importante realçar, no nosso estudo que a maior motivação para o comportamento de cuidados com os pés é o medo e o pavor que apresentam em os ferir ou ter complicações. Isto justifica-se com situações que mostram estar carregada de experiências negativas, ligadas à amputação, sofrimento, dor e fim da vida. Encontramos que, na análise qualitativa das falas dos idosos diabéticos deste estudo, eram realizados vários comportamentos inadequados ao que correspondia risco de desenvolver problemas nos pés, alguns destes comportamentos eram realizados mais baseados nas crenças e nos hábitos destas pessoas. A lacuna entre o que sabemos fazer e o que de facto acontece é uma fonte de frustração para pessoas diabéticas e profissionais de saúde. A educação para o autocuidado em diabetes é essencial, apesar de ser complexa e emocionalmente desafiadora. Para o autocuidado da diabetes mellitus é necessário ajustar a doença, ou seja, a questão biológica, física ao mundo psicológico e ambiental das pessoas portadoras desta doença. Por outro lado, em relação à segunda subcategoria, desconhecer complicações, entende-se que para alguns idosos, reconhecem os pés apenas como sustentação do corpo e deambulação e confirmam ter outros problemas não relacionados com a diabetes não conseguindo deste modo identificar as alterações provenientes da circulação alterada, neuropatia diabética e alterações dermatológicas como problema. Com o passar do tempo de doença o idoso diabético passa a despertar para os riscos que envolvem problemas nos pés, riscos estes relacionados à amputação que, aparentemente, é o grande medo dos idosos diabéticos deste estudo. A unidade de significado desconhecimento das alterações que geram complicações nos pés está fundamentada nos seguintes enxertos: “Eu acho que não tenho problema nenhum nos pés; Está tudo normal. Se tiver eu não sei. O meu problema é a perna que me dói muito.” “Eu posso dizer que graças a Deus já estou curado, mas o problema não é a diabetes, há dois anos eu fiz tratamento a uma micose nos dedos e nas duas unhas dos dedos grandes dos pés. E agora eu estou bem” “…Tenho um problema na unha do pé. Já foi arrancada duas vezes e ela está dolorida e oca e ela incomoda-me a andar. Acho que o meu problema não é pela diabetes, não sei o que é isto.” “…Não tenho nenhum problema nos pés. Tenho dois calos no meu pé, mas não é da diabetes. Já os tenho há muitos anos.” “…Tenho um problema com estes dois dedos que estão um em cima do outro e não me deixam andar porque me dói” Ao analisar o relato dos idosos diabéticos, preocupamo-nos ao detectarmos a falta de reconhecimento da dimensão do risco em relação aos pés. De salientar ainda destacar a falta de percepção de que as alterações, especialmente a dificuldade de caminhar, estrutura motora e as alterações dermatológicas do pé, constituem risco para úlceras nos pés. Podemos daqui tirar a conclusão que estes idosos diabéticos apresentam dificuldade em compreender que estas alterações podem vir a gerar-lhe problemas nos pés. Podemos ainda concluir que este grupo de idosos apresentam uma possível “falso sentimento de controlo” sobre a doença, levando a desvalorizar a importância dos cuidados com os pés, pois como já referenciado anteriormente, em termos de sintomatologia, a diabetes tipo 2 é considerada uma doença silenciosa, pelo que os doentes raramente experienciam sintomas desagradáveis. Por outro lado, as complicações decorrentes da diabetes facilmente são confundidas com situações pertencentes ao processo de envelhecimento, fazendo crer na pouca gravidade da diabetes. Frases usadas pelos profissionais de saúde como “o seu açúcar está um pouco alto” ou “deve ter mais cuidado com a alimentação” podem ser entendidas como “suaves”, não contribuindo para a percepção da verdadeira gravidade da diabetes (Doherty et al., 2000). Na terceira subcategoria, referente à importância dos cuidados dos pés encontrámos os sentimentos em relação à possibilidade de ter problemas com os pés, delimitando como unidade de significado a experiência com a amputação de familiares e outros traduzida pelos sentimentos de medo, pavor, trauma, preocupação, perigo e angústia. Para expressar o medo e o pavor em ter problemas com os pés os idosos diabéticos referiram: “Eu tenho pavor em imaginar complicações nos pés. Porque eu acompanhei um tio meu, desde de cortar o primeiro dedo, o pé, a perna e até a outra perna. Na época eu era muito criança e marcou-me muito.... foi passando o tempo e eu tenho mais cuidado. Nunca pensei que fosse pela diabetes.... eu tenho um trauma muito forte com os pés”. “É porque eu acho que a diabetes começa pelos pés. Eu já vi um senhor que tinha diabetes e ele feriu o dedo do pé e começou a aprodecer, ficou horrível. Eu vi aquilo e fiquei apavorada.” “Meu medo são os pés, porque as pontas dos dedos ficam dormentes, com formigueiro. Meu medo é esse, de machucar os pés, depois é difícil de cicatrizar..,” “Uma vizinha minha que também é diabética não tem os dois dedos grandes do pé, porque ela cortou a unha rente, encravou e de repente “Puft” o dedo teve que ser cortado, e o outro, alguém pisou no pé dela, e ela não percebeu, quando foi ao médico já estava preto e tiveram que amputar, isso deixou-me tão apavorada, ”. “Eu tenho cuidado para não aleijar os pés. Toda a gente fala para ter cuidados com os pés por causa da diabetes. Eu tenho medo que isso aconteça”. “Eu tenho pavor em imaginar complicações nos pés”. “Meu irmão amputou os dedos dos pés. Foi ficando roxo, roxo e precisou de cortar os dedos e ele não é diabético. Isso fez com que eu sentisse medo de ter problemas com os pés. Para ele apareceu de repente....”. As afirmações como estas evidenciam o desconhecimento do risco de sofrer problemas com os pés. Pensamos que estes idosos possuindo apenas conhecimentos adquiridos do senso popular, não é fácil encontrar estratégias de adaptação, nem o conscializa da necessidade de novos estilos de vida e do real problema. No entanto, podemos perceber nas falas anteriores que os idosos diabéticos deste estudo têm construído sentimentos de medo e pavor sobre a possibilidade de amputar alguma parte dos pés. A realidade da amputação é muito difícil de aceitar e quando se trata dos pés com funções importantes, mesmo que as pessoas aparentemente não demonstrem ou não tenham consciência disso, a sua possibilidade gera sentimentos de angústia e preocupação, dando a sensação de perigo de morte, conforme podemos verificar pelos enxertos a seguir: “Fico preocupado. Por enquanto, eu não penso que isso me possa acontece ”. “Ah, sim! São complicações bem perigosas prá pessoa, pra familia, pra tudo… . Eu já vivenciei isso, numa pessoa da família, (a sogra do meu irmão), eu acho que é muito perigoso é importante ter cuidado”. “O meu vizinho teve problemas com os pés, precisou cortar 2 dedos porque inflamou e não sarava. Ficou cego. Ficamos cismados naquilo, corta um dedo, depois vai cortando... As vezes precisa cortar até a perna. Eu fico preocupada”. “Às vezes penso nessa possibilidade e fico muito angustiada e com muito medo” Cintra (1998) refere que, quando as pessoas se defrontam com novas acontecimentos, experimentam emoções que adquirem um sentido subjectivo e expressam a qualidade que a nova experiência tem para elas. Portanto, o medo configura-se de acordo com a experiência pessoal de cada um, adquirindo nesse processo qualidades diferentes. Menciona ainda que o medo acaba estimulando as pessoas a procurarem informações sobre sua doença, tratamento e prognóstico, potencializando assim a preocupação e tudo aquilo que pode resultar em acções para o cuidado preventivo e terapêutico. Considera-se que é a partir da aceitação das mudanças comportamentais, reconhecer os seus sentimentos e receios que o idoso diabético adquire maiores condições de tomar decisões que o ajudem a encontrar o equilíbrio necessário. A importância de se reconhecer no outro a diabetes e as suas complicações possibilita reflectir àcerca do controlo da diabetes e das complicações nos pés. O conviver com alguém que vivenciou determinada situação propicia a adopção de medidas preventivas e/ou curativas, o que parece contribuir para colocar a pessoa como agente do seu próprio cuidar. Em relação à questão, alguma vez recebeu orientações dadas pelos profissionais, consideramos a categoria oportunidades para as orientações dadas pelos profissionais que se apresenta em duas subcategorias: receber orientações e esperar orientações agrupadas em 53 indicadores. A subcategoria que mais indicadores englobou foi receber orientações com 39 indicadores seguindo-se esperar orientações com 14 indicadores. Quadro 7 – Oportunidades dos idosos diabéticos para orientações dos profissionais Categorias Subcategorias Indicadores Receber “Não, nunca ninguém me disse nada” (E1), orientações (E2),(E3),(E5),(E7),(E8),(E9),(E10),(E12), Freq. T. Ind. T. Ind. Ind. Subcat Cat. (E13),(E19),(E21),(E23),(E24),(E25),(E27), (E28),(E33),(E35),(E41),(E44) 21 “Quase não venho ao médico” (E1),(E19), (E45) 3 “O médico só passa receitas” (E5),(E19), (E35) 3 “Pouca informação…O médico só me diz Oportunidades para fazer dieta” (E12),(E13),(E18),(E25), para as (E31) orientações “Foi só a Sra. Enfermeira” (E4),(E14),(E15), (E21),(E34),(E40),(E44) Esperar “Tenho que receber mais informação” orientações (E4),(E15),(E19),(E34),(E44) 5 7 39 5 “Preciso saber mais para me tratar” (E4), (E34),(E35) 3 “…se não já tinha tirado estes calos” (E1), (E10),(E23) 3 “Mesmo sabendo é difícil…” (E12),(E25), (E42) 3 14 Quando questinados sobre as orientações recebidas pelos profissionais de saúde e em relação à subcategoria receber orientações, uma grande maioria afirmou que nunca tinham recebido qualquer orientação como podemos vericar pelos enxertos das entrevistas: “Não, nunca ninguém me disse nada” “O médico só passa receita e exames” “Não sabia que podia ter problemas com os pés, quase não venho ao médico” “Só venho ao médico quando já não tenho medicamentos” Para os idosos diabéticos que receberam alguma informação era insuficiente, no entanto, estas informações recebidas deixaram-nos mais conscientes em relação aos cuidados com os pés como podemos verificar pelos enxertos: 53 “Recebi pouca informação sobre os problemas com os pés, o médico só me diz que tenho que fazer dieta” “As orientações que recebi foi pala Sra. Enfermeira, que me disse que tenho que ter cuidados com os pés” “Só foi a Sra enfermeira quando me esteve a ver os pés” “Agora já tenho algum cuidado com os pés, desde que estive aqui consigo” “Fiquei mais consciente dos cuidados” “Aprendi alguma coisa num livro” “Foi aqui consigo, quando me esteve a ver os pés, mas é difícil tirar estes calos” Na segunda subcategoria encontramos idosos que referiram necessitar de receber mais informações e orientações sobre os cuidados com os pés, porque mesmo como pudemos verificar com as nossas conclusões anteriores, tendo conhecimento acerca dos cuidados com os pés não os colocavam em prática, por não conseguirem, por não acreditarem que podiam ter problemas com os pés ou ainda por não haviam se consciencializado da importância do autocuidado? Podemos confirmar com as falas a seguir: “Acho que tenho que receber mais informações para entender melhor” “…, eu queria saber alguma coisa para poder tratar-me” “… pois nunca me disse nada senão já tinha tirado estes calos…” “Mesmo sabendo é difícil conseguir fazer direitinho” Destes enxertos, pensamos que só se pode esperar o cumprimento das orientações dadas ao cliente/família à medida que lhe é dado oportunidade para reconhecer os problemas e aprender a lidar com eles. Actualmente os doentes estão mais exigentes e mais participativos no seu tratamento. Em relação aos diabéticos isto é fundamental, visto envolver, entre outros aspectos, a mudança de comportamentos e o desenvolvimento de acções de autocuidado. Para este grupo estudado faltam mais informações e orientações de forma mais intensa para convecê-los a ter novovs hábitos em relação aos cuidados a ter com os pés. Ficou evidente a necessidade da implantação de serviços de Consulta de Enfermagem para doentes diabéticos na Unidade de Saúde do estudo. O momento da consulta é oportuno para a interação profissional/diabético, o diabético ao entrar na consulta espera além da receita, receber orientações, esclarecer dúvidas e informações sobre a sua doena e tratamento. O Enfermeiro como membro da equipa de saúde poderá ser um elemento multiplicador de conhecimentos através da promoção e educação em saúde, como já refrido anteriormente, aos idosos diabéticos proporcionando-lhe hábitos de vida saudáveis que possibilitem maior segurança e melhor autocuidado assim, como uma convivência mais feliz no seio familiar e no contexto social. 3 – CONCLUSÕES/SUJESTÕES O envelhecimento dos nossos dias tornou-se mais activo e com melhor qualidade de vida devido ao surgir de novos conhecimentos científicos e à descoberta de novas tecnologias na área da saúde bem como as alterações políticas actuais, originando mudanças em toda a estrutura económica e demográfica das populações. Sendo os idosos um grupo etário portador de doenças crónicas como a diabetes mellitus, como profissionais de saúde, devemos investir na qualidade de vida da pessoa idosa e orientar a nossa conduta para agir de acordo com os seus direitos e para a possibilidade de viver dignamente. A diabetes mellitus é uma doença crónica que aumenta a sua incidência proporcionalmente ao aumento da idade. O processo de envelhecimento leva a alterações fisiológicas, como alterações visuais, auditivas e na locomoção que podem dificultar o auto-cuidado e propiciar a instalação de complicações crónicas, dentre elas o Pé Diabético, demonstrando assim a necessidade de acompanhamento e o desenvolvimento de actividades educativas voltadas para a sua prevenção. A melhor estratégia para prevenir a diabetes mellitus Tipo 2 é enfatizar em especial a adopção de estilos de vida saudáveis com dieta e exercício físico regulares, junto com a supressão de fumo. O sucesso resulta grandemente do estabelecimento de uma interacção positiva entre enfermeiro, doente e família. A experiência humana torna-se útil sempre que sejamos capazes de a reverter a favor do Homem. Quando nos questionávamos acerca dos conhecimentos dos diabéticos sobre a sua doença, algo nos inquietava, sobretudo em relação à prevenção do Pé Diabético. Com a metodologia eleita, e face à análise da informação por nós recolhida e analisada, passamos à apresentação das principais conclusões que nos parecem mais pertinentes. Vamos também utilizar este momento para propor algumas sugestões que poderão contribuir para melhorar a formação dos idosos diabéticos e deste modo contribuir para a prevenção do Pé Diabético, melhorar a sua qualidade de vida, dando ao mesmo tempo um contributo na redução de custos em saúde. Os resultados por nós obtidos no primeiro momento resultaram de uma amostra constituída por 45 idosos diabéticos inscritos na Unidade de Saúde do nosso estudo. Após a caracterização dos mesmos concluímos que os nossos participantes são a maioria do sexo feminino, com idades compreendidas entre 65 e 84 anos de idade, a população apenas tem o ensino primário a viver em meio rural. Foi nosso objectivo saber quais os factores de risco das pessoas diabéticas para o desenvolvimento do Pé Diabético. Em termos clínicos, o tempo médio do diagnóstico da diabetes encontra-se acima dos 11 anos e uma grande parte o diagnóstico foi feito a partir dos 50 anos de idade o que vai de encontro ao aparecimento da diabetes Tipo 2. Na população estudada o tratamento era essencialmente com antidiabéticos orais e iniciou-se praticamente logo após o seu diagnóstico o que significa que poderiam já ter a doença há mais tempo sem saber. O controlo glicémico, a manutenção da Tensão Arterial e dos níveis glípidicos são alguns factores que complementam uma boa qualidade de vida do idoso diabético, no entanto verificamos que a hipertensão esteve presente em 77,8% dos idosos, 40% apresentava o colestrol acima de 240 mg/dl e 35,6% uma Hemoglobina glicosilada acima de 7,5%. Em relação aos cuidados com os pés, os resultados permitem-nos dizer que no geral, quase 100% dos idosos diabéticos apresentavam higiene precária e não tinham o hábito de examinar os pés. A maioria dos idosos diabéticos apresentaram como factores de risco para o desenvolvimento do Pé Diabético o calo, a micose ungueal, a pele seca, a sensibilidade diminuídas e pulsos fracos. Após a verificação dos cuidados realizados pelos idosos diabéticos com os pés vários relataram o uso de calçado inadequado, sendo o chinelo o mais frequente. Os idosos devem ser consciencializados que os seus pés devem ficar livres de qualquer trauma devido a serem mais sensíveis, diminuindo os riscos de lesões. Devem reconhecer os sinais precoces de risco e saber cuidar dos seus pés diariamente com medidas simples como a higiene, observação e uso de calçado adequado. Cabe lembrar que a prevenção primária e secundária do Pé Diabético está dentro de um contexto, não só da prevenção de um membro mas de um indivíduo com diabetes mellitus. Um outro objectivo do nosso estudo foi saber quais os comportamentos e quais os conhecimentos dos idosos diabéticos acerca dos cuidados com os pés e ainda, procuramos saber o que os idosos diabéticos pensam da importância desses cuidados e as informações recebidas pelos profissionais de saúde. Desta forma foi possível concluir que existe deficiência nos cuidados associados aos factores de risco que aumentam a possibilidade do desenvolvimento do Pé Diabético, demonstrando a necessidade dos idosos diabéticos em aprenderem medidas de auto-cuidado para a prevenção, tais como a higiene adequada, o uso de calçados apropriados, a observação dos pés, o cuidado adequado com as unhas, a hidratação cutânea dos pés e o tratamento adequado das lesões existentes. Com os resultados ainda podemos concluir, a falta de educação/formação dos idosos diabéticos e a falta de acompanhamento por parte dos profissionais de saúde. Assim, pelo descrito concluise que emerge a necessidade de programação de uma consulta de diabetes nesta Unidade de Saúde. Verificamos que o conhecimento dos idosos diabéticos em relação à doença e suas complicações, como o Pé Diabético eram insuficientes. Os dados do estudo mostram uma grande prevalência de alterações e alerta-se para a importância do atendimento em relação aos pés dos idosos diabéticos visando uma assistência global e preventiva para evitar complicações futuras. Recomenda-se, a educação deve ser aplicada às categorias de alto risco, especialmente quando os recursos são escassos. O reconhecimento do pé em risco e de lesões iniciais é da responsabilidade dos profissionais de saúde, exames incompletos dos pés são descritos como até 50% dos pacientes que se submetem a amputações (Consenso Internacional sobre o Pé Diabético, 2001). Após a implementação de uma acção de Educação para a Saúde, no segundo momento de avaliação, concluímos que houve melhoria significativa do comportamento sobre cuidados preventivos do Pé Diabético. Conclui-se ainda, que a população avaliada desconhece as medidas preventivas do Pé Diabético. Embora a maioria dos idosos diabéticos da nossa amostra saibam que é importante ter todos os cuidados com os pés, para muitos deles referem dificuldades em realizá-las devido a hábitos de sedentarismo e a problemas de saúde relacionados ou não com a diabetes, na maioria, com a idade. No que se refere ao conhecimento sobre cuidados preventivos do Pé Diabético, nos dois momentos do estudo, também houve melhorias. No primeiro momento observouse que este grupo evidencia escassos conhecimentos sobre a prevenção do Pé Diabético tal como outros estudos o têm demonstrado. Os conhecimentos são mais elevados nos cuidados andar descalço em que praticamente todos os idosos diabéticos apresentaram não ter o hábito de andar descalço e na lavagem diária dos pés. Neste último cuidado, no entanto deparamo-nos com evidências de que não é prática comum terem este comportamento, e inspecção do calçado antes de o usar. Este grupo evidência menos conhecimento nos cuidados que dizem respeito ao corte das unhas, ao tipo de meia, à importância da hidratação e secagem dos pés. Estes resultados são sobreponíveis com o desconhecimento do calçado adequado e o défice na observação dos pés. Os motivos apontados para as dificuldades em relação ao exame dos pés relacionam-se ao tempo de diagnóstico de diabetes menos de um ano, não reconhecem que têm problemas nos pés. No segundo momento, em geral, os idosos diabéticos desta amostra possuem conhecimentos razoáveis nas variáveis estudadas mas as suas práticas não correspondem aos conhecimentos adquiridos. Verificámos que os cuidados onde os diabéticos evidenciam maiores conhecimentos são referente à inspecção do calçado antes de usar, sabem que não podem andar descalços, na lavagem dos pés, na forma do corte das unhas e o tipo de meias. Os cuidados em que os diabéticos apresentam menos conhecimentos, são em relação à remoção de calos, secagem e hidratação dos pés e essencialmente na observação dos pés respectivamente. Nos enxertos dos idosos diabéticos deste estudo, apreendemos que desconhecem a relação entre os problemas com os pé e a diabetes mellitus. No entanto, quando reconhecem a gravidade da doença trazem consigo sentimentos negativos como medo, ansiedade e preocupação para o cuidado com os pés. Diante do exposto, verificamos uma discordância entre o comportamento e o conhecimento no grupo estudado. 4 – CONSIDERAÇÕES FINAIS Face a diabéticos com baixo nível de escolaridade, idade avançada ou outras situações específicas, o educador deverá envolver os familiares que apoiem o doente. Os conhecimentos acerca da doença e seu tratamento darão um contributo para que o diabético compreenda a importância da sua realização e deste modo adira mais. Os resultados deste estudo mostraram a gravidade das complicações relacionadas aos pés dos idosos estudados, como importante factores de risco para as lesões dos pés reiterando que intervenções básicas podem contribuir para a sua redução. Alvitraram também para a necessidade de elaboração de um protocolo de atendimento com realce no processo educativo junto do idoso, familiares e profissionais, visando uma maior adesão ao tratamento e controlo da diabetes mellitus bem como intensificando medidas preventivas em relação a cuidado com os pés. Neste contexto, a prevenção é um dos pontos fundamentais para melhorar o prognóstico desta patologia. O enfermeiro tem um papel preponderante na articulação com todos os membros da equipa de saúde, devendo ter uma actuação baseada na evidência de acordo com os princípios científicos da enfermagem. Acreditamos que a alta prevalência de factores predisponentes para o desenvolvimento de Pé Diabético da nossa casuística se deva a algumas características da região do estudo, zona rural, sem condições de receberem acompanhamento médico especializado, com condições precárias de higiene e baixos níveis socio-económico e cultural. Cuidar do doente diabético/família numa perspectiva holística é uma missão complexa e multifacetada, de qualquer forma as medidas gerais são um complemento a ter em consideração. É preciso enfatizar que no processo de adaptação às limitações decorrentes da doença, a enfermagem tem um papel no sentido de que as acções da equipe de saúde levem em conta a multidimensionalidade do conceito da qualidade de vida. Muitas outras investigações são necessárias para que se possa contribuir de forma mais significativa para a compreensão destes fenómenos e, para a elaboração e implementação de estratégias mais eficazes a na formação de educadores em diabéticos. A utilização de programas de educação, facilmente reprodutíveis nos centros de saúde, pode colaborar na redução das taxas de amputação de membros inferiores em pacientes com diabetes mellitus. Os resultados deste estudo demonstraram a necessidade de investir na educação para a saúde e acompanhamento do idoso diabético de acordo com o grau de risco e controlo domiciliário contribuindo para a redução do custo da doença e de internamentos, para a melhoria do seu prognóstico e para a prevenção das úlceras nos idosos diabéticos portadores de diabetes. Foi importante constatar os factores que interferem nas complicações dos pés, uma vez que a doença crónica, como é a diabetes mellitus dificulta o bem-estar do diabético e consequentemente pretendeu-se demonstrar com esta reflexão que os diabéticos do local de estudo apresentam graves indícios de alterações de risco para desenvolver complicações nos pés. Algumas limitações estão subjacentes a este estudo e portanto, os resultados devem ser interpretados tendo em conta estas limitações. As principais limitações do estudo prendem-se com o tipo de amostragem aleatória utilizada, o que interfere na representatividade da amostra implicando que os resultados não possam ser generalizados à população diabética Tipo 2. Uma outra limitação está relacionada com o facto do nosso estudo se confinar unicamente a uma área geográfica restrita, o que também contribui para que os resultados não possam ser generalizados a nível regional ou nacional. Assim, seria desejável que o estudo fosse replicado com uma amostra alietória e com uma representatividade geográfica mais alargada. Outra limitação refere-se ao intervalo de tempo de avaliação nos dois momentos realizada com o objectivo de avaliar a efectividade dos programas de educação em portadores de diabetes mellitus para prevenir úlceras do Pé Diabético, no entanto, concluiu-se que, após intervalo de no mínimo 3 meses a um ano da aplicação do programa, intervenções educativas breves reduzem a incidência de úlceras e melhoram os cuidados com os pés. No presente estudo, mesmo considerando que após a intervenção educativa alguns dos pacientes mantêm comportamentos não adequados, os benefícios obtidos com a intervenção foram evidentes. As medidas preventivas do Pé Diabético aumentaram após acção educativa, indicando uma aquisição de conhecimentos por parte dos idosos, sobretudo no que diz respeito aos cuidados com os pés. Apesar destas limitações o estudo apresenta alguns aspectos positivos do ponto de vista metodológico que o enriqueceram. Destacamos a elaboração de um instrumento adaptado à realidade da nossa população, que nos permitiu avaliar os conhecimentos acerca dos cuidados com os pés e que poderá ser utilizado em estudos futuros. Face à importância da relação profissional de saúde/utente nos comportamentos de adesão em relação aos cuidados com pés seria importante estudar esta vertente assim como também considerar esta mesma adesão na perspectiva dos profissionais de saúde. As nossas propostas vão de encontro à autogestão e educação da diabetes, preconizando estratégias de intervenção a nível do contexto social e comunitário das interacções dos profissionais de saúde e dos resultados em saúde e qualidade de vida. Em termos de investigações futuras gostaríamos de ver desenvolvidos trabalhos na população com diabetes tipo 2, onde factores como a motivação, o suporte social e as barreiras à realização dos cuidados com os pés sejam estudadas mais profundadamente. Parece-nos importante a implementação de reuniões de formação na área da diabetes, onde os técnicos de saúde possam reflectir e partilhar experiências, no sentido de melhorar os cuidados prestados à população diabética. Esperamos com este trabalho, contribuir para o conhecimento das variáveis intervenientes no processo de prevenção do Pé Diabético e sensibilizar os profissionais de saúde para uma abordagem psicossocial do idoso com diabetes. Só desta parceria do educador para a saúde com oidoso, poderão surgir objectivos comuns e exequíveis, que facilitarão as mudanças necessárias à manutenção da saúde do idoso diabético. Esta experiência de investigar foi enrriquecedora e aliciante, constituindo um importante momento de aprendizagem. Permitiu-nos desenvolver os conhecimentos necessários para a elaboração de um trabalho desta natureza e aprofundar conhecimentos a vários níveis, nomeadamente na temática do Pé Diabético e em especial na educação para a saúde além de ficarmos sensibilizados para continuar a investir e investigar nesta área. Deixamos assim, o apelo para que se reflicta nesta problemática, que a melhoria da situação em que vivem os idosos diabéticos reside não só, mas também na Enfermagem que exercemos, nos Cuidados que prestamos e nas Pessoas que somos. BIBLIOGRAFIA Ahroni, J. H. (2000). Preventing diabetic foot complications. Advances in skin and wound care, 13 (1), 38-30. Alberoni, F., & Veca, S. (1996). O altruísmo e a moral. (4ªed). Lisboa: Bertrand Editora. Almeida, M. L. (1999). Cuidar o idoso: Revelações da Prática de Enfermagem. In, M. A. Costa et al. O Idoso. Problemas e Realidades. Coimbra: Manual Sinais Vitais. Editora Formasau. Alvieida, F. A. et al (2002). 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ANEXOS Anexo 1- Guião da entrevista I ENTREVISTA - INSTRUMENTO DE COLHEITA DE DADOS - PÉ DIABÉTICO FACTORES COMPORTAMENTAIS PARA A SUA PREVENÇÃO DIAGNÓSTICO SOCIAL E EPIDEMIOLÓGICO 1 - Sexo - M ou F Estado Civil ___________ Habilitações Literárias ___________ Com quem vive ___________ Situação laboral _____________Actividade____________ 2 - Sente apoio de alguém para realizar os cuidados essenciais com os pés? (sozinha(o), marido ou esposa, filhos, outros). 3 - Que doenças apresenta associadas à diabetes? Deficiência visual, locomutora, artroses… DIAGNÓSTICO COMPORTAMENTAL 1 - Lava os pés (com água e sabão neutro) todos os dias? Com que frequência deve ser feito? 2 - Como seca os pés? (Toalha comum, macia, papel ou outro)? 3 - Seca entre os dedos sempre que os pés ficam molhados? Acha que não é preciso? 4 - O que usa para remover os calos? (lixa de papel, metal, pedra-pomes ou calicida?) quando o faz? 5 - Aplica creme hidratante entre os dedos? Porquê? 6 - Hidrata os pés todos os dias? Sabe a sua importância? 7 - Como corta as unhas? (rente ao dedo redonda, rente ao dedo quadrada?) Como devem ser cortadas? 8 - Usa calçado aberto (só em casa, em casa e para sair, só para sair ou não usa?) Deve usar? 9 - Tem por hábito andar descalço? Sabe o perigo que corre? 10 - O calçado que usa é folgado, apertado, macio, de couro, sintético…?) Como deve ser? 11 - Que tipo de meia usa? (claras, sem costuras, algodão, sintético ou lã, sem elásticos?) Como devem ser? 12 - Inspecciona os sapatos antes de os calçar? Porquê? Usa palmilhas de protecção? Para quê? 13 - Examina os pés com que frequência? (diariamente, semanalmente, …?) DIAGNÓSTICO EDUCACIONAL 1 - O que sente e o que significa para si, ter ou vir a ter complicações nos pés? 2 - Quais as vantagens de realizar cuidados com os pés? 3 - Existe algo ou alguém que estimula a realizar os cuidados com os pés? 4 - Já alguma vez recebeu orientações dos profissionais acerca dos cuidados a ter com os pés? De quem? Anexo 2 - Grelha de observação Anexo 3 - Pedido de autorização ao C.S. Anexo 4 - Pedido de autorização à Coordenadora da Diabetes do Centro de Saúde Anexo 5 - Consentimento livre e esclarecido UNIVERSIDADE DO PORTO INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOMÉDICAS ABEL SALAZAR Termo de Consentimento Livre e Informado Chamo-me Maria Antonieta Braz e estou a desenvolver um estudo sobre prevenção do Pé Diabético, com o objectivo de conhecer e detectar situações de risco correspondentes a lesões que quando ligadas a infecções podem ser responsáveis pela trágica e rápida evolução para necrose, gangrena e amputação. Esta pesquisa é necessária porque possibilitará a avaliação da situação dos cuidados do idoso diabético, por meio de entrevista e observação dos pés melhorando posteriormente a qualidade dos cuidados. A sua participação não trará riscos ou desconfortos, mas esperamos que traga benefícios futuros para toda a população idosa que necessita de atendimento para cuidados por parte do Centro de Saúde. Se estiver de acordo em participar no estudo, posso garantir que as informações fornecidas serão confidenciais e só serão utilizadas nesta pesquisa. Assinatura da investigadora de campo:_________________________________________ Artigo I. Artigo II. Consentimento Pós-informação Eu, (nome completo do familiar participante)____________________________________, fui esclarecido(a) sobre a pesquisa acima e concordo em colaborar e que os meus dados sejam utilizados estritamente na realização deste estudo. _______________,_____de ____________de 200_. Assinatura:_______________________________________ou digital________ impressão Nota: Este documento tera 2 cópias, uma ficará na nossa posse participante. e outra com o Anexo 6 – Monofilamento de Semmes-Weinstein e Diapasão Anexo 7 – Guião da entrevista II ENTREVISTA - FASE 1 INSTRUMENTO DE COLHEITA DE DADOS - PÉ DIABÉTICO: FACTORES COMPORTAMENTAIS PARA A SUA PREVENÇÃO DIAGNÓSTICO COMPORTAMENTAL QUESTÃO 1 Lava os pés todos os dias? 1 - sim 2 - não 3 - às vezes. Qual a frequência? ____________________________ 4 - só quando toma banho. Qual a frequência? _________________ QUESTÃO 2 O que usa para lavar os pés? 1 - sabão 2 - sabonete comum 3 - sabonete neutro 4 - água 5 - outro? ___________________ QUESTÃO 3 Seca os pés entre os dedos, sempre que lava os pés? 1 - sim 2 - não 3 - às vezes QUESTÃO 4 Para remover calos usa? 1 - lixa de papel e creme hidratante 2 - lixa de metal e creme hidratante 3 - pedra-ume ou pedra-pomes e creme hidratante 4 - pedra normal e creme hidratante 5 - substância química (calicida) 6 - outro? ___________________ QUESTÃO 5 Aplica creme hidratante? 1 - entre os dedos e na sola do pé em cima, na sola e no calcanhar 2 - em cima e na sola do pé 3 - em cima, na sola e no calcanhar 4 - em cima, na sola, entre os dedos e no calcanhar? QUESTÃO 6 Aplica creme hidratante nos pés, todos os dias? 1 - sim 2 - não 3 - às vezes QUESTÃO 7 Corta as unhas? 1 - rente ao dedo quadrada (reta) 2 - rente ao dedo redonda (cortando os cantos) 3 - não rente ao dedo redonda (cortando os cantos) 4 - não rente ao dedo quadrada (reta) Se você não corta, quem faz? _________________________ QUESTÃO 8 Usa calçado aberto? 1 - só em casa 2 - em casa e para sair 3 - só para sair 4 - não usa QUESTÃO 9 O calçado que usa quanto à estrutura é? 1 - folgado 2 - apertado 3 - justo 4 - macio e confortável QUESTÃO 10 O calçado que usa quanto ao aspecto interno é? 1 - sem costura 2 - com costura 3 - deixa marca nos pés 4 - com e sem costura QUESTÃO 11 Usa palmilhas no calçado? 1 - fechado 2 - aberto 3 - tanto faz 4 – nenhum QUESTÃO 12 Anda descalço? 1 - só em casa 2 - em casa e na rua 3 - na rua 4 - nunca anda descalço QUESTÃO 13 Usa meias de que cor? 1 - claras e com costura 2 - claras e sem costura 3 - escuras e com costura 4 - escuras e sem costura 5 - escuras e claras sem costura 6 - escuras e claras com costura 7 - outro? ____________________ QUESTÃO 14 Que tipo de meia usa? 1 - de algodão 2 - de fio sintético 3 - de lã 4 - outro? ____________________ QUESTÃO 10 Verifica o calçado por dentro antes de usá-lo? 1 - sim 2 - não 3 - às vezes QUESTÃO 16 Examina os pés? 1 - diariamente 2 - semanalmente 3 - mensalmente 4 - trimestralmente 5 - anualmente Quem examina? _______________________ ENTREVISTA – FASE 2 INSTRUMENTO DE COLHEITA DE DADOS - PÉ DIABÉTICO: FACTORES COMPORTAMENTAIS PARA A SUA PREVENÇÃO DIAGNÓSTICO EDUCACIONAL QUESTÃO 1 Os pés devem ser lavados (com água e sabão) todos os dias 1 - sim 2 - não 3 - às vezes. Qual a frequência? ____________________________ 4 - só quando toma banho. Qual a frequência? _________________ QUESTÃO 2 Deve-se lavar os pés com 1 - sabão 2 - sabonete comum 3 - sabonete neutro 4 - água 5 - outro? ___________________ QUESTÃO 3 Deve-se enxugar entre os dedos, sempre que os pés ficam molhados 1 - sim 2 - não 3 - às vezes QUESTÃO 4 Para remover calos deve-se usar 1 - lixa de papel e creme hidratante 2 - lixa de metal e creme hidratante 3 - pedra-ume ou pedra-pomes e creme hidratante 4 - pedra normal e creme hidratante 5 - substância química (calicida) 6 - outro? ___________________ QUESTÃO 5 Deve-se aplicar creme hidratante 1 - entre os dedos e na sola do pé 2 - em cima e na sola do pé 3 - em cima, na sola e no calcanhar 4 - em cima, na sola, entre os dedos e no calcanhar? QUESTÃO 6 As unhas devem ser cortadas 1 - rente ao dedo quadrada (reta) 2 - rente ao dedo redonda (cortando os cantos) 3 - não rente ao dedo redonda (cortando os cantos) 4 - não rente ao dedo quadrada (reta) Se você não corta, quem faz? _________________________ QUESTÃO 7 Deve-se usar calçado aberto 1 - só em casa 2 - em casa e para sair 3 - na rua 4 - não usa QUESTÃO 8 O calçado que deve-se usar quanto à estrutura é 1 - folgado 2 - apertado 3 - justo 4 - macio e confortável QUESTÃO 9 O calçado que se deve usar quanto ao aspecto interno é 1 - sem costura 2 - com costura 3 - deixa marca nos pés 4 - com e sem costura QUESTÃO 10 Deve-se usar preferencialmente que tipo de meia 1 - de algodão 2 - de fio sintético 3 - de lã 4 - outro? ____________________ QUESTÃO 11 Deve-se andar descalço 1 - só em casa 2 - em casa e na rua 3 - na rua 4 - nunca anda descalço QUESTÃO 12 Devem-se usar palmilhas no calçado 1 - fechado 2 - aberto 3 - tanto faz 4 - nenhum QUESTÃO 13 Deve-se verificar o calçado por dentro antes de usá-lo 1 - sim 2 - não 3 - às vezes QUESTÃO 14 Os pés devem ser examinados 1 - diariamente 2 - semanalmente 3 - mensalmente 4 - trimestralmente 5 - anualmente Quem examina? _______________________