Tenho câncer. E agora? Após o diagnóstico de um tumor, estresse, ansiedade, medo e preocupações surgem. Esses sentimentos, contudo, podem ser compreendidos e neutralizados O diagnóstico de um câncer afeta diversas áreas da vida de uma pessoa, e a parte emocional é só uma delas. “Logo após a notícia, os pacientes relatam que ficam quase que paralisados e com muito medo: de morrer, de ter dor e de sofrer. Mas depois isso tende a passar e, aos poucos, eles vão retomando as rédeas da vida e do tratamento. Isso é muito importante”, afirma Luciana Holtz, psicóloga e presidente do Instituto Oncoguia (SP). O momento do diagnóstico traz consigo ansiedade, estresse, medo e preocupação, sentimentos que por si só são nocivos para o tratamento. Estudos têm relacionado o estresse crônico com o enfraquecimento do sistema imunológico, que é responsável pela vigilância do organismo contra a multiplicação de células cancerígenas. As células natural killers, por exemplo, possuem a função de destruir células anômalas (modificadas) que poderiam se transformar em câncer. texto LEONARDO VALLE Esclarecendo as dúvidas Contra esses sentimentos, a saída é desmistificar a doença e criar um ambiente tranquilo e saudável para que o tratamento comece a se desenvolver. “O ideal é que a postura diante da doença seja positiva e pro-ativa, mas isso vai depender de cada pessoa. Não existe regra e não podemos cobrar essa positividade o tempo todo. Os altos e baixos emocionais vão existir e o importante é não ignorá-los”, reforça Luciana. Uma boa relação médico-paciente é essencial para o enfrentamento desse momento. Conversas 68 VIVASAÚDE francas, espaços para dúvidas, medos e decisões compartilhadas devem estar na pauta da relação. “A relação entre médico e paciente é longa, pois, mesmo com a cura, o médico acompanha o paciente muito tempo depois. Tal relação, por esse motivo, precisa ser de confiança. O médico deve passar toda a informação necessária para o paciente tomar decisões inteligentes no seu tratamento, mas sempre com cuidado para não gerar novas angústias”, assinala Paulo Hoff, diretor do Centro de Oncologia do Hospital Sírio-Libanês (SP). Primeiras consultas As primeiras consultas são importantes para que o paciente coloque todas suas dúvidas à mesa. Em linhas gerais, somos criados com preconceitos em relação ao câncer e este é o momento de esclarecê-los. “A última pergunta da visita deve ser a seguinte: existe alguma coisa que eu deveria ter perguntado que não perguntei? São muitas as questões importantes nesse primeiro momento, e o médico pode ajudar a lembrar algo que por ventura tenha sido esquecido”, orienta Hoff. “O ideal é que o médico explique claramente o que é a doença, como eles irão enfrentá-la e que o paciente saia de lá com um plano de ação”, completa. Durante o tratamento, também é possível que o paciente tenha contato com vários médicos diferentes: o cirurgião e o responsável pela quimioterapia. É fundamental que ele seja parte de um time. “O paciente precisa sentir que estão todos contra um inimigo comum”, pontua o médico. WWW.REVISTAVIVASAUDE.COM.BR WWW.REVISTAVIVASAUDE.COM.BR VIVASAÚDE 69 O diagnóstico do câncer pode trazer a tona temas da vida da pessoa, como problemas no relacionamento amoroso, na família, mudanças corporais, questões de trabalho, entre outros. Buscar um psicólogo ou psico-oncologista pode ajudar a atravessar essa fase de forma mais tranquila. “A terapia oferecerá um espaço de escuta e de atenção personalizada, no qual o paciente poderá desabafar sobre seus medos, inseguranças e fragilidades”, esclarece Luciana. “É importante destacar que a terapia não é para cuidar do câncer, e sim da pessoa que está enfrentando a doença. Isso é bem diferente”, completa. Um psiquiatra também pode ser consultado, pois, em alguns casos, se faz necessário o uso de medicamentos antidepressivos. “Isso evita que sintomas de angústia atrapalhem a evolução do tratamento”, ressalta Luciana. entrando nesta longa jornada sozinho”, recomenda Hoff. “E pode ser um grande desafio para o paciente, pois nem sempre estamos acostumados a pedir e a aceitar ajuda”, lembra Luciana. Em alguns casos, a família também pode precisar de suporte sobre as formas de lidar com a doença. Por esse motivo, alguns centros médicos também oferecem apoio psicológico para os parentes dos pacientes. “Costumamos dizer que quando alguém tem câncer, a família toda fica muito impactada. Então, ela também merece se cuidar e participar dessa nova realidade”, explica Luciana. “Toda a dinâmica familiar é afetada. Os familiares ficam preocupados com a logística do tratamento, com os cuidados em caso de efeitos colaterais e o que pode vir a acontecer se o tratamento não der certo. Por isso, é importante trabalhar a expectativa dos familiares”, acrescenta Hoff. Apoio familiar Vida normal O papel da família é importante, apoiando, respeitando, conversando e participando do tratamento. Uma dica é pedir para algum familiar ou amigo acompanhá-lo nas primeiras consultas. “Isso dá suporte e faz com que o paciente perceba que não está Sem ansiedade com práticas integrativas Algumas terapias complementares como a acupuntura podem ajudar no controle do estresse e da ansiedade que aparecem com o diagnóstico. “Ela apresenta uma efetiva ação no tratamento de um variado número de disfunções emocionais, entre elas a ansiedade e a depressão. Isso ocorre em decorrência da capacidade que o estímulo das agulhas tem de desencadear modificações na química cerebral, incrementando ou normalizando a produção de neurotransmissores como serotonina, noradrenalina e dopamina”, explica Dirceu Sales, presidente do Colégio Médico Brasileiro de Acupuntura (CMBA). Uma segunda opção é a ioga, que trabalha corpo e respiração. “O câncer traz efeitos colaterais como perturbações de humor, ansiedade, fadiga, dores e sensações de isolamento. Um programa de ioga buscará identificar os sintomas que mais afetam o bem-estar do paciente”, descreve a educadora física Ana Luisa Matsubara (SP) 70 VIVASAÚDE O câncer traz consigo a oportunidade de se reverem as prioridades de vida. Por isso, vale a pena fazer um balanço do que é realmente importante e buscar tempo para as atividades que deem mais sentido à vida. Além disso, o paciente deve procurar levar suas atividades cotidianas normalmente. “Por conta do tratamento, dos altos e baixos emocionais e de cuidados extras com a saúde, a vida muda e ajustes são necessários. Ainda assim a vida deve ser a mais normal possível”, diz Luciana. Outro ponto importante é procurar seguir um estilo de vida mais saudável. Uma dieta balanceada com vitaminas e minerais pode ajudar a afastar a fadiga e a dar mais energia durante o tratamento. Para completar, pesquisas apontam que praticar atividades físicas ajuda no tratamento e no enfrentamento da doença. “O exercício físico não pode ser forte e a atividade, de preferência, deve ser aeróbica. Pode-se, por exemplo, caminhar uma hora por dia, cinco vezes na semana, ou dar continuidade a atividades que a pessoa já pratica, como correr e andar de bicicleta”, orienta o oncologista. WWW.REVISTAVIVASAUDE.COM.BR NEOPLASIA MAMÁRIA MALIGNA”, DE MARCEL ROCHA BARBOSAI ET AL. Espaço de escuta ARTIGO “FONTES ESTRESSORAS NO PACIENTE COM DIAGNÓSTICO DE A intervenção de um psicólogo oferecerá um espaço de escuta e de atenção no qual o paciente poderá desabafar sobre seus medos, inseguranças e fragilidades FONTE: ANA LUISA MATSUBARA INTEGRA O STUDIO IYENGAR YOGA (SP); SAÚDE MENTAL WWW.REVISTAVIVASAUDE.COM.BR VIVASAÚDE 71