Baixar - Oncologia D`Or

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www.revistaonco.com.br
dezembro/janeiro/fevereiro 2016
º
!NOsN
Oncologia para todas as especialidades
apoio:
Entrevista
Os cirurgiões Rodrigo Frota e Murilo Luz
trazem uma visão promissora sobre a robótica
em cirurgias oncológicas e veem o Brasil
registrar um crescimento expressivo no uso
da tecnologia, com novos equipamentos
e equipes em formação
Política de saúde
Relatório da OMS sugere ligação entre a
incidência de câncer e a ingestão de
alimentos embutidos, mas especialistas
sugerem cautela
Do bem
Câncer ocupacional é assunto
ignorado no Brasil
Tumores neuroendócrinos,
a “zebra” da oncologia
imunoterapia | colorretal | gliomas | hemato
Conselho
editorial
I – Cancerologia clínica
Oncologia clínica:
Aline A. Porto Rocha Lima (SP)
Ana Carolina Leite (CE)
Antonio Carlos Barcellos Bassani (SP)
Antonio Evandro de Araújo Jr. (TO)
Bruno Carvalho Oliveira (DF)
Bruno de Araújo L. França (RJ)
Bruno Pinheiro Costa (RJ)
Carlos Eduardo Sampaio dos Santos (RJ)
Claudio Calazan do Carmo (RJ)
Cristiane Amaral dos Reis (TO)
Daniel Herchenhorn (RJ)
Davimar M M Borducchi (SP)
Duilio Rocha Filho (CE)
Eduardo Cronemberger (CE)
Eduardo Jorge Medeiros (RJ)
Fabiane Kellem O. S. Cesário (SP)
Fernando Correia Cruz (RJ)
Gilberto Luiz da Silva Amorim (RJ)
Glauber Leitão (PE)
Leonardo Atem (CE)
Markus Gifoni (CE)
Henrique Zanoni (SP)
Jacques Bines (RJ)
Jayme José Gouveia (PE)
Jose Eduardo de Almeida Lamarca (RJ)
Luiz Alberto Mattos (PE)
Maria de Lourdes Lopes de Oliveira (RJ)
Martha Tatiane M. dos Santos (DF)
Múcio de Alcantara Leister (RJ)
Patricia Maira C. A. de Sousa (DF)
Rogerio Pastore Bassit (SP)
Valeska Marques de Menezes Machado (DF)
Editores clínicos nacionais
André Moll
Anderson Silvestrini
Carlos Gil Ferreira
Daniel Herchenhorn
Juliane Musacchio
Paulo Sérgio Perelson
Rodrigo Abreu e Lima
Editores clínicos regionais
Onco& Brasília
Lucianno Henrique P. dos Santos
Onco& Rio de Janeiro
Andréia Melo
Onco& Nordeste
Markus Gifoni
Onco& São Paulo
Caetano da Silva Cardial
Carlos Frederico Pinto
Revisão Médica
Ana Carolina Nobre de Mello
II - Onco-hematologia:
Andresa Lima Melo (DF)
Gustavo Bettarello (DF)
Joana Curi (PE)
João Glasberg (SP)
José Lucas Pereira Junior (DF)
Renata Lyrio Rafael Baptista (RJ)
Paulo Henrique A. Soares (DF)
Roberto Penello (SP)
Vitor César da Silva Sforni (DF)
III – Patologia
Alessandra F. Nascimento (RJ)
IV – Cuidados paliativos e dor
Lisiana Wachholz Szeneszi (RJ)
V – Radioterapia
Carlos Manoel M. Araújo (RJ)
Celia Maria Paes Viegas (RJ)
Denise Magalhães (RJ)
Felipe Erlich (RJ)
Maria Feijóo (RJ)
Robson Ferrigno (SP)
VI – Qualidade
Adriana Crespo (RJ)
Edivaldo Bazilio (DF)
Stela Maris (SP)
VII – Gestão
Carlos Loures (DF)
Flavio José Reis (DF)
Helio Calabria (RJ)
Leonardo Nunes (RJ)
Sergio Cortes (RJ)
Adriana Alves de Souza Scheliga (RJ)
Andrea Farag Lago Martinez (RJ)
Ano 6 • número 30
dezembro/janeiro/fevereiro 2016
Publisher Simone Simon
[email protected]
Impressão: Ipsis Gráfica
Tiragem: 30 mil exemplares
Editorial Jiane Carvalho
[email protected]
ISSN: 2179-0930
Jornalista Ana Paula Gonçalves
[email protected]
Jornalista responsável: Jiane Carvalho
(MTb 23.428/SP)
Direção de arte/Prepress Ione Franco
[email protected]
Comercial Bruno Lima
[email protected]
Colaboraram nesta edição: Álvaro Garces, André da Luz Moreira,
Daniela Barros, Davimar M. Borducchi, Jacques Bines, Juliana
Todaro, Juliane Musacchio, Lisiana Szeneszi, Marlene Oliveira,
Martha San Juan França, Murilo Luz, Ricardo Vezzani, Rodrigo
Frota, Viviane Santos
Revisão Patrícia Villas Bôas Cueva
4
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
Acompanhe a Onco&
no Facebook e no Twitter
A revista Onco& – Oncologia para todas as especialidades, a partir de 2015 é uma realização da Associação
de Pesquisa Clínica (APC), com apoio da Oncologia D’Or.
Traz informações sobre oncologia a profissionais de
todas as especialidades médicas. De circulação Trimestral, tem distribuição nacional e gratuita por todo o
território nacional. A reprodução do conteúdo da revista é permitida desde que citada a fonte. A opinião
dos colaboradores não reflete necessariamente a
posição da revista.
realização:
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(21) 2126 0150
sumário
entrevista
07
Rodrigo Frota e Murilo Luz falam sobre o desenvolvimento da cirurgia
robótica e das vantagens da técnica usada na oncologia
capa
15
Tumores neuroendócrinos, ainda pouco conhecidos e de difícil diagnóstico
gliomas
22
Avanços no tratamento dos tumores primários no sistema nervoso central
Jacques Bines
hemato
26
Alternativas de manejo em urgências onco-hematológicas
Davimar M. Borducchi e Juliana Todaro
imunoterapia
30
Imunoterápicos ganham espaço no combate às neoplasias
Álvaro Garces
colorretal
36
Abordagem multidisciplinar no tratamento do câncer do reto
André da Luz Moreira e Ricardo Vezzani
políticas de saúde
40
Associação entre alimento processado e câncer volta ao debate
curtas
45
Novidades sobre pesquisas, parcerias e eventos: um giro pelo mundo
da oncologia
curtas D’Or
46
As últimas notícias sobre o Grupo Oncologia D’Or
palavra do gestor
47
Atualização profissional constante
do bem
50
Brasil ignora câncer ocupacional e expõe trabalhadores ao risco
especial asco
54
Cuidados paliativos: Com uma visão multiprofissional, evento foca em
garantir o acesso dos pacientes aos cuidados paliativos e melhorar a
comunicação relacionada à especialidade
especial ASH 2015
56
Pesquisas acrescentam evidências de que a terapia genética pode melhorar
os resultados de pacientes com doenças sanguíneas hereditárias e imunológicas
holofote
60
Veja quem se destacou nos principais eventos da área
especial evento D’Or
62
Com 165 convidados nacionais, 11 internacionais e mais de 2 mil inscritos, III
Congresso Internacional Oncologia D’Or supera as expectativas
mundo virtual
63
Sites e aplicativos que ajudam médicos a se manter sempre atualizados
para o diagnóstico e tratamento de seus pacientes
campanha
64
Fique por dentro das ações sobre câncer que ganharam destaque na mídia
e nas redes sociais
acontece
65
Acompanhe as novidades de congressos, simpósios, encontros de atualização
e outros tantos eventos da área
calendário
66
Programe-se: eventos e congressos que estão por vir
Desafios dos tumores neuroendócrinos,
do diagnóstico ao tratamento
T
UMORES NEUROENDÓCRINOS – RAROS, DE DIFÍCIL
DIAGNÓSTICO E AINDA POUCO CONHECIDOS ATÉ
PELA CLASSE MÉDICA – SÃO O TEMA DA PRINCIPAL
reportagem desta edição da Onco&. A proposta é
levar a informação mais atual e detalhada sobre esse
tipo de câncer, cujo símbolo é o laço listrado de
preto e branco, imagem associada a doenças difíceis
de reconhecer. A reportagem mostra a complexidade dessa neoplasia, cujos sintomas nem sempre
apontam na direção correta e muitas vezes podem
ser confundidos com doenças mais comuns, como
síndrome do intestino irritável, úlcera péptica, gastrite, asma ou pneumonia.
No espaço destinado à entrevista, optamos por
trazer a visão de dois cirurgiões especializados em
robótica. Por meio de joysticks, similares aos utilizados em videogames, médicos realizam cirurgias
de alta complexidade mesmo que não estejam fisicamente presentes. Essa história de sucesso, que
ainda tem muito a evoluir, é contada por Murilo
Luz e Rodrigo Frota. Eles narram as suas trajetórias,
comentam sobre a realidade nacional e as expectativas em relação à técnica robótica.
Como parte da proposta de manter a classe médica atualizada em relação aos grandes eventos, a
Onco& apresenta nesta edição o Especial ASCOCuidados Paliativos, escrito por Lisiana Szeneszi, e
o Especial ASH 2015, por Juliane Musacchio, que
trazem os principais estudos e as tendências dos
dois eventos realizados no fim de 2015.
Na seção Do Bem, um tema relevante para toda
a sociedade, mas posto em segundo plano pelas autoridades: o câncer ocupacional. Provocado pelo
contato prolongado de substâncias químicas no ambiente de trabalho, ele ainda é subnotificado no
Brasil. A situação resulta em investimentos deficitários na prevenção, descaso dos profissionais de
saúde e dificuldades para o Ministério do Trabalho
e Previdência Social (MTPS) fiscalizar irregularidades nas indústrias.
Em Política de Saúde, o tema é o relatório da
Organização Mundial de Saúde (OMS) que associa
alguns tipos de câncer à ingestão de alimentos processados, conhecidos como embutidos. Além de
bacon, salsicha, presunto, linguiça, entre outros, a
pesquisa apontou a carne vermelha como um dos
produtos com provável risco carcinogênico. Apesar
do alerta da OMS, oncologistas ouvidos pela reportagem sugerem cuidado na análise da informação,
já que a incidência de câncer depende da quantidade e da frequência da ingestão dos produtos,
entre outros fatores.
Nos artigos desta edição, destacamos os textos
sobre os avanços no tratamento do câncer do reto,
de autoria de André da Luz Moreira e Ricardo Vezzani, sobre a utilização da imunoterapia nos
tratamentos oncológicos, de Álvaro Garces, e as
novidades nos tumores primários do Sistema
Nervoso Central (SNC) em metástases cerebrais,
de Jacques Bines.
Boa leitura!
Simone Simon
Publisher
Contato: [email protected]
6
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
entrevista
Divulgação
Inteligência artificial
O uso da cirurgia robótica já é uma realidade bem-sucedida,
inclusive no Brasil
Rodrigo Frota
* Consultor técnico e cirurgião do
Programa de Cirurgia Robótica
da Oncologia D’Or – São Luiz/RJ,
fellow em laparoscopia e cirurgia
robótica pela Cleveland Clinic
(EUA) e primeiro secretário da
Sociedade Brasileira de Urologia
(Seccional Rio de Janeiro)
Divulgação
Contato:
[email protected]
Por Daniela Barros
A
S MÃOS SÃO ROBÓTICAS, O CÉREBRO É HUMANO.
INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL TRABALHANDO LADO A
LADO COM A RACIONAL. PARECE CENA DE FICÇÃO
científica, porém já temos disponíveis tecnologias
que atuam a serviço da vida. Por meio de joysticks,
similares aos utilizados em videogames, médicos
realizam cirurgias de alta complexidade mesmo que
não estejam fisicamente presentes. O raciocínio é
deles, a execução é da máquina.
O início
Murilo Luz
* Urologista pós-graduado em
uro-oncologia e cirurgia robótica
pela McGill University (Montreal/
Canadá) e coordenador do
Programa de Cirurgia Robótica –
da Oncologia D’Or – São Luiz/SP
Contato:
[email protected]
Os robôs foram concebidos como forma de ampliar as possibilidades cirúrgicas dos médicos além
dos limites da laparoscopia convencional. A história do uso de robôs na cirurgia começa com o
Puma 560, utilizado por Kwoh e cols., em 1985,
para realizar uma biópsia neurocirúrgica com
grande precisão. Três anos depois, Davies e cols.
realizaram uma ressecção transuretral da próstata
também utilizando o Puma 560. Esse sistema eventualmente levou ao desenvolvimento do PROBOT,
um robô programado especificamente para a ressecção transuretral da próstata.
Enquanto o PROBOT estava sendo desenvolvido, também surgia o ROBODOC, um sistema robótico designado para auxiliar, com muita precisão,
nas cirurgias de substituição do quadril. Ele foi o
primeiro robô aprovado pelo FDA.
Nessa mesma época, no fim da década de 1980,
um grupo de pesquisadores da Nasa que trabalhava
com realidade virtual interessou-se por essa informação para desenvolver um novo conceito em telecirurgia. Eles se uniram a cientistas do Stanford
Research Institute (SRI) com o objetivo de capacitar
o cirurgião a operar à distância com o auxílio de
um robô.
As Forças Armadas Americanas tomaram conhecimento desse projeto e se interessaram pela possibilidade de reduzir a mortalidade nos campos de
guerra ao levar, ainda que virtualmente, o cirurgião
até o soldado ferido. Eles pretendiam alocar o
doente em um veículo equipado com o robô cirúrgico para ser operado remotamente por um médico.
Mas foi somente em 1999 que a cirurgia robótica se consolidou nos Estados Unidos. Em 2008,
ela chegou ao Brasil.
Cirurgia robótica na oncologia
Os avanços na medicina, que passaram pela cirurgia convencional (aberta), pela laparoscópica,
até chegar na robótica, têm mudado também o
papel do médico nesse cenário. O novo contexto
inclui robôs de alta complexidade. Dessa forma, é
preciso uma nova formação: tanto conceitual, para
digerir as mudanças, quanto teórica, para incorporá-las em sua prática.
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
7
A oncologia é uma das especialidades que mais
se beneficiaram da cirurgia robótica, e os tumores
urológicos apresentam excelentes resultados.
Conversamos sobre o tema com Murilo de Almeida Luz, urologista pós-graduado em uro-oncologia e cirurgia robótica pela McGill University
(Montreal/Canadá) e coordenador do Programa de
Cirurgia Robótica – Rede D’Or São Luiz/SP, e com
Rodrigo Frota Indio do Brasil Ferraz, consultor técnico e cirurgião do Programa de Cirurgia Robótica
Rede D’Or São Luiz/RJ, fellow em laparoscopia e cirurgia robótica pela Cleveland Clinic (EUA) e primeiro secretário da Sociedade Brasileira de Urologia
(Seccional Rio de Janeiro). Eles narram as suas trajetórias, comentam sobre a realidade nacional e
suas expectativas.
pecialização em urologia oncológica, inscrevi-me
para o fellowship em laparoscopia urológica na Cleveland Clinic, sob a supervisão de Inderbir Gill,
grande referência mundial nesse tema.
Ao chegar em Cleveland, surpreendi-me ao observar que 60% das cirurgias renais e de bexiga
eram feitas por laparoscopia, 20% eram robóticas e
20% abertas; enquanto as cirurgias de próstata
eram feitas 60% por tecnologia robótica, 20% por
laparoscopia e 20% eram abertas.
A partir de então tive o meu interesse pela cirurgia robótica despertado. Entendi que essa técnica seria o futuro na área cirúrgica. Nesse contexto,
estendi o meu fellow para laparoscopia e cirurgia robótica (tecnicamente denominada cirurgia laparoscópica robô-assistida).
Onco& – Como surgiu o interesse por tecnolo-
Luz – Meu grande foco sempre foi a uro-onco-
gia robótica e onde vocês fizeram suas especializações?
logia, ou seja, o estudo e o cuidado dos pacientes
com tumores urológicos. Atualmente não há
como dissociar essa subespecialidade da cirurgia
robótica. Durante os três anos que passei na Universidade McGill, no Canadá, estive em constante
atuação na cirurgia robótica, e esse interesse aumentou naturalmente.
Frota – Durante a minha residência em cirurgia geral (pré-requisito para residência em urologia),
desenvolvi um grande interesse
por laparoscopia. Foi quando observei que, no Brasil, não se falava nessa técnica aplicada em
urologia. Pesquisando, descobri
que nos Estados Unidos (estávamos em 2001) os grandes centros
já o faziam. Desse modo, após
terminar a residência e a es-
Onco& – Com qual tipo de tecnologia vocês trabalham?
Frota – Dentro da tecnologia Da Vinci® Surgical
System, a plataforma Si, com a qual trabalho, é a
única no mercado nacional. O novo modelo de plataforma Xi foi lançado no mercado americano no
fim de 2013. Segundo informações da empresa que
comercializa essa plataforma robótica no Brasil, ele
ainda está em processo de registro pelas agências
reguladoras e deve demorar cerca de um a dois anos
para chegar ao nosso mercado.
Luz – Trabalhamos hoje com o Sistema Da Vinci®
em sua geração Si, que é a mais moderna disponível
em nosso país.
Onco& – Quais são as possibilidades cirúrgicas
desse robô? Quais são as que o senhor executa?
Frota – Com esse robô podemos realizar as mesmas cirurgias que são feitas pela técnica aberta ou
8
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
laparoscópica. A grande vantagem dessa tecnologia está na cirurgia oncológica (considerada de maior complexidade), na qual as pinças articuladas, o filtro de tremor, a visão 3D e a maior precisão de movimentos
oferecem ao paciente uma otimização de resultados funcionais. Além
disso, confere também as vantagens da cirurgia minimamente invasiva
(menor tempo de internação, menor sangramento, melhor resultado
estético e retorno mais rápido às atividades cotidianas). Dessa forma,
hoje na urologia realizamos prostatectomia radical, inclusive para cirurgias de alto risco com linfadenectomia estendida, nefrectomia parcial
e radical, além das cirurgias para tumores de bexiga e testículo.
Luz – O Da Vinci® é utilizado nas mais diversas áreas, destacadamente
na urologia, ginecologia, cirurgia geral, colorretal e bariátrica. Áreas
de menor uso, mas de grande interesse, são cirurgia de cabeça e pescoço, torácica, cardíaca e hepatobiliar. Executo mais comumente cirurgias de próstata e rim com essa tecnologia e colaboro com equipes
das mais diversas áreas.
Onco& – Todos os tumores podem ser operados por meio da cirurgia robótica? Quais são as limitações atuais?
Frota – Basicamente todos os tumores podem ser operados pela técnica robótica. As limitações, como em qualquer técnica cirúrgica, são
a curva de aprendizado do cirurgião e o seu tempo de experiência. É
muito importante salientar que na cirurgia robótica a curva de aprendizado é bem menor que na cirurgia laparoscópica. A expansão da tecnologia ocorreu mundialmente exatamente por esse motivo, fazendo
com que os cirurgiões abertos (convencionais) aprendessem a técnica
robótica para oferecer aos seus pacientes as vantagens da cirurgia minimamente invasiva. Os tumores complexos podem caracterizar uma
contraindicação relativa a essa abordagem.
Luz – Praticamente todos os tumores abdominais ou torácicos podem
ser abordados com essa tecnologia, a depender de características específicas da neoplasia e do paciente, além do treinamento do cirurgião.
Os tumores muito volumosos, em múltiplas áreas do abdômen, ou firmemente aderidos a outras estruturas podem caracterizar contraindicações a essa abordagem.
Onco& – Por favor, comentem as principais diferenças, vantagens
e desvantagens considerando o uso da técnica convencional e laparoscópica x robótica:
Vantagens
Desvantagens
Robótica
Laparoscópica
– Menor tempo de internação
– Menor perda sanguínea
– Recuperação mais rápida
– Melhor visualização de
estruturas (por ex., nervos
e vasos)
– Melhor ergonomia para o
cirurgião
– Menor curva de aprendizado
em comparação à laparoscópica
– Menor tempo de
internação
– Menor perda sanguínea
– Recuperação mais
rápida
– -Melhor visualização de
estruturas (por ex., nervos
e vasos)
– Menor custo em comparação à robótica
– Feedback tátil
– Maior facilidade de
treinamento
Aberta
– Custo
– Curva de aprendizado
– Maior sangramento
Fonte: Frota R, Turna B, Barros R, Gill IS. Comparison of radical prostatectomy techniques:
open, laparoscopic and robotic assisted.Int Braz J Urol. 2008 May-Jun;34(3):259-68.
Luz – As principais diferenças são a ergonomia para o cirurgião, a visualização em três dimensões e os instrumentos multiarticulados, que
permitem movimentos muito mais precisos e delicados.
Em relação às vantagens, embora muitos estudos ainda sejam necessários na avaliação dessa técnica, já foi possível observar ganho em
perda sanguínea, tempo de internação e recuperação funcional em algumas áreas estudadas.
A principal desvantagem ainda é o custo elevado tanto a para aquisição do equipamento quanto para os insumos descartáveis usados a
cada cirurgia.
Onco& – Quais são os resultados de eficácia das cirurgias robóticas? Em termos de sobrevida e segurança, há diferença quando
comparadas às outras técnicas?
Frota – A grande vantagem da cirurgia robótica está nos resultados
operatórios, que incluem menor trauma aos tecidos, menor sangramento, menor tempo de internação e menos dor. No que concerne
aos resultados funcionais, tem-se a recuperação de funções que possam
ser atingidas por um procedimento.
Por exemplo, na cirurgia para o câncer de próstata, a incontinência urinária e a função sexual costumam ser grandes preocupações.
Mas com a cirurgia robótica é possível minimizar tais efeitos adversos
dos procedimentos cirúrgicos.
Nos tumores renais, o robô possibilita a realização de uma cirurgia
parcial minimamente invasiva (o que preserva melhor a função renal)
em casos onde anteriormente seria feita a retirada total do órgão ou
uma cirurgia de maior porte pela via convencional. Sendo assim, não
há diferença em sobrevida, mas sim em termos de segurança.
Do ponto de vista oncológico, resultados iniciais demonstraram equivalência, e ainda aguardamos estudos prospectivos de
longo prazo.
Frota – O quadro a seguir traz um resumo adaptado de um artigo publicado em conjunto com um grupo da Cleveland Clinic, em 2008,
no International Brazilian Journal of Urology, onde comparamos as três
técnicas para realização de prostatectomia radical. Ele responde bem
à pergunta.
Luz – Os estudos realizados até o momento apontam ótimos níveis
de segurança relacionados ao método. Do ponto de vista oncológico,
resultados iniciais demonstraram equivalência, e ainda aguardamos
análises de sobrevida a longo prazo.
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
9
Onco& – O que dizem os estudos disponíveis?
Frota – A cirurgia robótica replica resultados da cirurgia aberta em relação ao controle oncológico,
oferecendo aos pacientes as vantagens da cirurgia
minimamente invasiva e ao cirurgião convencional
uma menor curva de aprendizado. Os resultados
de estudos internacionais retrospectivos apontam
para benefícios na cirurgia robótica, porém sabemos que estudos randomizados em pacientes cirúrgicos são sujeitos a vieses.
Luz – Em praticamente todos os pacientes com
neoplasias urológicas, ginecológicas e do trato gastrintestinal, cabe a discussão sobre o uso de cirurgia
robótica e potenciais benefícios relacionados à técnica. O paciente deve ter condições clínicas adequadas para tolerar o pneumoperitônio, bem como
uma posição fixa durante o tempo de execução do
procedimento, sempre sob anestesia geral combinada ou não a outras técnicas.
Onco& – Já é possível avaliar a preferência dos
pacientes em relação a essas técnicas?
Luz – São raros os estudos que comparem de maneira prospectiva e randomizada as técnicas convencionais com as robóticas. Séries retrospectivas
demonstraram, na maioria das vezes, resultados semelhantes ou com tendência a melhores resultados
com cirurgia robótica quando comparada a outras
técnicas. Particularmente notou-se que a curva
de aprendizado e a chance de conversão são menores.
Onco& – Como avaliar se o
caso do paciente é para cirurgia robótica em oncologia?
Frota – Os cirurgiões com experiência em cirurgia robótica
podem oferecer aos seus pacientes essa via de acesso na grande
maioria dos tumores. A indicação
da via vai depender da experiência do profissional.
Frota – Sim, atualmente vem aumentando progressivamente a procura dos pacientes pela cirurgia robótica. Eles buscam as vantagens que a tecnologia
pode oferecer, de uma cirurgia segura (seja de pequeno, médio ou grande porte), com melhores resultados funcionais e resultados oncológicos já
sedimentados pela cirurgia aberta (convencional).
Luz – Certamente. Com maior acesso a informação,
muitos pacientes atualmente querem discutir mais
amplamente a utilização dessa tecnologia em seus
casos. Muitos vão preferir o uso da robótica após avaliarem os riscos e os benefícios. O mais importante é
a participação ativa do paciente nessa decisão.
Onco& – Quem paga pelos custos do uso da
tecnologia robótica? Os planos de saúde já
aderiram?
Frota e Luz – Até o momento as operadoras ainda
não cobrem os custos relacionados à cirurgia robótica, já que adotam como referência o rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde (ANS), no
qual a robótica ainda não figura.
Onco& – Em 2012, havia apenas três robôs cirúrgicos disponíveis no Brasil. Como se deu o
crescimento nestes últimos três anos para essa
tecnologia?
Frota – Estamos acompanhando a tendência mundial. Com o apoio de grandes empresas de saúde
investindo na tecnologia, o paciente passa a ter conhecimento disso e, consequentemente, há maior
procura. Hoje, no Brasil, estamos vivendo o cresci-
10
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
mento da cirurgia robótica, com 15 plataformas instaladas e mais cinco já em processo de instalação.
Devemos terminar 2016 com 25 a 30 plataformas
em funcionamento.
Onco& – Quais são as inovações mais relevantes
da nova plataforma robótica?
rurgia robótica no Brasil se deu nos últimos três
anos. Temos perto de 15 sistemas instalados no
país. O maior número de médicos treinados e a padronização dos principais procedimentos foram os
principais responsáveis por esse crescimento.
Frota – As inovações mais relevantes são as que nos
permitem maior liberdade de movimentos, como
os filtros de tremores, a melhor visualização de estruturas, o menor trauma aos tecidos, a ergonomia
para o cirurgião, oferecendo segurança e otimização
de resultados para os pacientes. Podemos citar
como as mais recentes inovações a fluorescência e
a plataforma de portal único.
Onco& – Não podemos avaliar somente o au-
Luz – As mais recentes inovações são a fluorescên-
mento do número de equipamentos. Em termos
de treinamento de equipes e profissionais aptos
a trabalhar com eles, como estamos?
cia, a plataforma de portal único e os diferentes instrumentos que estão sendo aprovados para uso no
Brasil atualmente.
Frota – Estamos na fase de expansão do treina-
Onco& – Quais desafios ainda enfrentamos em
mento de cirurgiões. Segundo a empresa que certifica o treinamento, existem no Rio de Janeiro
atualmente 30 cirurgiões em atividade na cirurgia
robótica. Porém, o nosso objetivo é fazer com que
esse número aumente significativamente para que
os nossos pacientes possam usufruir das vantagens
dessa tecnologia.
nosso país em termos de tecnologia na medicina?
Luz – Realmente o crescimento expressivo da ci-
Frota – Sem sombra de dúvida, o grande desafio
Luz – O número de médicos que utilizam a cirur-
hoje ainda é o custo. Quando se discute a cirurgia
robótica, não se argumenta mais sobre o método,
já sedimentado cientificamente, mas sim sobre os
valores. Toda nova tecnologia em seu início tem um
custo elevado e depois se torna acessível. O mesmo
vai acontecer com a cirurgia robótica.
gia robótica é restrito e ainda precisamos buscar
formação em universidades estrangeiras. Os treinamentos disponíveis são oferecidos pela indústria
que comercializa os robôs. Porém, já estamos em
fase de implantação de programas de especialização
bem estruturados no país.
Luz – O ganho de tecnologia ainda se dá inicialmente em grandes instituições privadas e, posteriormente, será absorvido pelas escolas médicas, o
que atrasa o desenvolvimento de novos profissionais e a disseminação da técnica.
Existem, no Rio de
Janeiro, atualmente
30 cirurgiões em
atividade na cirurgia
robótica. O objetivo
é fazer com que esse
número aumente
significativamente
para que os pacientes possam usufruir
das vantagens
dessa tecnologia
Fontes:
– Kwoh YS, Hou J, Jonckheere EA, et al. A robot with improved absolute positioning accuracy for CT guided stereotactic
brain surgery. IEEE Trans Biomed Eng. 1988;35:153–161.
– Davies B. A review of robotics in surgery. Proc Inst Mech Eng. 2000;214:129–140.
– Lanfranco AR, Castellanos AE, Desai JP, Meyers WC. Robotic Surgery: A Current Perspective. Ann Surg. 2004 Jan;
239(1): 14–21.
– BBC. The surgeon who operates from 400km away. Disponível em: http://www.bbc.com/future/story/20140516-ioperate-on-people-400km-away. Acesso em: 04/12/2015.
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
11
capa
Tumores neuroendócrinos,
raros e de difícil
diagnóstico
Eles são geralmente pequenos, alguns menores que 1
centímetro; podem ocorrer em quase qualquer parte do
corpo e necessitam de uma série de testes especializados
para serem reconhecidos
Por Martha San Juan França
T
ODO MUNDO CONHECE O LAÇO COR-
DE-ROSA QUE SIMBOLIZA A SOLIDARIEDADE E O COMPROMETIMENTO NA LUTA
contra o câncer de mama e, mais recentemente, o laço azul, identificado com a
campanha de combate e prevenção ao câncer de próstata. Mas pouca gente ouviu
falar – oncologistas inclusive – do laço listrado preto e branco, associado a doenças
difíceis de reconhecer, especialmente os tumores neuroendócrinos. Até recentemente
esse grupo de cânceres era considerado
raro, e até mesmo hoje seus sintomas são
difíceis de diagnosticar e frequentemente
confundidos com os de outros males.
É por isso que os tumores neuroendócrinos têm como símbolo internacional a
zebra. Segundo a explicação da International
Neuroendocrine Cancer Alliance (INCA),
em alguns países os professores costumam
lembrar aos estudantes de medicina:
“Quando você ouvir o som de cascos se
aproximando, pense em zebras, não em cavalos”. Eles querem dizer que os médicos
são ensinados a pensar nas possibilidades
mais óbvias quando fazem um diagnóstico.
Mas, em determinadas situações, eles precisam procurar as “zebras”.
Por exemplo, muitos sintomas visíveis
de tumores neuroendócrinos (rubor, diarreia, cólicas, chiado parecido com asma)
são semelhantes aos de outras doenças mais
comuns – síndrome do intestino irritável,
doença de Crohn, úlcera péptica, gastrite e
outros distúrbios digestivos, asma ou pneumonia. Para dificultar ainda mais, esses tumores são geralmente pequenos, alguns
podem ser menores que 1 centímetro;
podem ocorrer em quase qualquer parte do
corpo e são de tipos diferentes, necessitando de uma série de testes especializados
para serem reconhecidos. E, finalmente,
não se confirma a existência de um grupo
de risco para esse grupo de doenças.
Por tudo isso, em 2010 foi criada em
Berlim, na Alemanha, a INCA (não confundir com o brasileiro Inca – Instituto Nacional de Câncer), formada por grupos de
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
15
Eles são geralmente
pequenos, alguns
menores que 1
centímetro; podem
ocorrer em quase
qualquer parte do
corpo e necessitam
de uma série de
testes especializados para serem
reconhecidos
16
pacientes e oncologistas de diversos países, com o
objetivo de levar mais conhecimento sobre os cânceres neuroendócrinos para a comunidade de saúde
e o público em geral. “A necessidade de mudar as
coisas para ajudar os pacientes nos levou a formar
esse grupo”, afirma Grace Goldstein, presidente da
INCA e diretora do Carcinoid Cancer Foundation
dos Estados Unidos, no site da entidade (http://incalliance.org/). A organização instituiu o 10 de novembro como o Dia Mundial de Conscientização
sobre os Tumores Neuroendócrinos (Net Cancer
Day), para chamar a atenção sobre a doença.
Como em outros países, também no Brasil muitos médicos não estão familiarizados com tumores
neuroendócrinos (TNEs na sigla em português) e,
portanto, são menos propensos a suspeitar desse
câncer em suas investigações iniciais. “Para ter uma
ideia do retardo no tratamento, algumas vezes os
pacientes passam por psiquiatras, relacionando
com sintomas nervosos, mal-estar e flushing
(rubor)”, diz Felipe José Fernández Coimbra, diretor do Departamento de Cirurgia Abdominal do
A.C. Camargo Cancer Center. “Como os marcadores são menos comuns e os exames convencionais
não apontam esses tumores, eles só chegam até nós
quando a doença se espalhou.”
Relembrando: convencionou-se classificar os tumores a partir do local de origem. Assim, é comum
agrupar os diferentes tipos de câncer: de pulmão, de
mama, linfomas, de pele etc. No entanto, os tumores
neuroendócrinos podem incidir sobre praticamente
todos os órgãos do corpo, sendo mais frequentes os
de origem no trato gastroenteropancreático e pulmonar. TNEs passou a ser então um termo genérico para
designar um grupo de cânceres pouco comum, muitas vezes de crescimento lento e heterogêneo, a partir
de células do sistema endócrino que produzem determinados hormônios destinados a regular processos fisiológicos do organismo.
Quando esses tumores aparecem, podem produzir uma quantidade excessiva desses hormônios,
o que gera os quadros clínicos descritos acima – ou
não. “Muitas vezes, a evolução é lenta, trata-se de
um tumor indolente, com baixo índice de metástase
ou de proliferação celular”, afirma Coimbra. “Em
outras vezes, o tumor tem um comportamento extremamente agressivo, principalmente se for pouco
diferenciado, com um índice de replicação muito
alto e resistente à terapia.”
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
É conhecido o caso de Steve Jobs, criador da
Apple, que teve diagnosticado por acaso um tumor
neuroendócrino no pâncreas, ao realizar uma tomografia, e passou por um procedimento cirúrgico
para a sua retirada em 2004. Não se sabe ao certo
se a equipe médica que o acompanhou tinha certeza de que o havia curado ou se ele mesmo se recusou a fazer um tratamento convencional. O fato
é que Jobs não passou por sessões de rádio ou quimioterapia. O tumor espalhou-se e alcançou o fígado. Apesar de ser submetido a um transplante,
Jobs morreu da doença em outubro de 2011, sete
anos depois.
Aumento de casos
Segundo as estatísticas internacionais, um diagnóstico correto de TNEs pode levar uma média de
cinco a sete anos. Se esses tumores forem detectados no início do seu desenvolvimento, muitas vezes
podem ser curados, geralmente com cirurgia. No
entanto, uma pesquisa conduzida pela INCA
aponta que 60% a 70% dos pacientes são diagnosticados em um estágio avançado da doença. Nesses
casos, ela raramente é curada, embora os sintomas,
muitas vezes, possam ser controlados durante vários anos.
A incidência e a prevalência dos TNEs são difíceis de determinar até mesmo devido à forma como
eles são classificados no CID (Classificação Internacional de Doenças). A confusão começa no nome:
embora esse grupo de tumores tenha sido identificado como uma doença específica em meados do
século 19, no século 20 ela foi descrita como carcinoide, para diferenciá-la dos adenocarcinomas,
morfologicamente distintos e de comportamento
mais agressivo. Em meados do século, ficou claro
que esses tumores podiam ser tão malignos e se espalhar pelo corpo como os outros tipos de câncer,
e a literatura médica começou a substituir o termo
por TNEs.
A INCA relata uma incidência estimada em
5,25 casos novos de TNEs por 100 mil habitantes,
com pico na sexta e sétima décadas de vida. No Brasil não há esse tipo de estatística. Nos Estados Unidos, calcula-se que existam mais de 100 mil pessoas
vivendo com esse câncer, considerando o seu caráter indolente e a longa sobrevida mesmo quando
há metástase. No entanto, nas últimas décadas, essa
estatística começou a mudar, pois constata-se que
há um aumento significativo na incidência e na prevalência desses tumores.
“Os motivos são variados”, considera Rachel
Riechelmann, diretora científica do Grupo Brasileiro de Tumores Gastrointestinais (GBTG) e chefe
da Pesquisa Clínica do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp). “A população está ficando mais velha, as pessoas fazem mais check-ups
e existe um maior conhecimento sobre a doença.
Além disso, nos últimos anos houve uma melhoria
nos métodos diagnósticos radiológicos e endoscópicos.” Por tudo isso, o GBTG estabeleceu neste ano
as diretrizes brasileiras de tratamento, ouvindo várias especialidades por causa da diferença de sintomas e especificidades de tratamento.
O consenso sobre esses tumores deve ser divulgado ainda no primeiro semestre de 2016. O Brasil
será então um dos poucos países com orientação
estabelecida para TNEs sobre o tipo de monitoramento que deve ser feito em cada situação, quais os
exames necessários e quantas vezes por ano eles
devem ser realizados, levando em conta a realidade
do nosso sistema de saúde e os tratamentos aprovados pelos órgãos governamentais. As diretrizes
devem cumprir um papel didático e dar segurança
no momento da decisão, principalmente em hospitais distantes e sem fácil acesso ao conhecimento
gerado nos grandes centros universitários.
Tipos de tumor
Atualmente, os TNEs são classificados de várias
maneiras, conforme a localização de origem, a
expressão hormonal e o grau histológico. Os mais
comuns são aqueles encontrados no trato gastrointestinal alto (TGE), correspondendo a 61% dos
casos diagnosticados. Entre eles, o intestino delgado
representa o sítio mais frequente (34%), seguidos
de reto (20%), cólon (19%), estômago (7%), pâncreas (7%) e apêndice (6%). Os TNEs de grau 1 têm
crescimento mais lento, menor proliferação celular
e melhor prognóstico; os de grau 2, mais heterogêneos clinicamente e de maior proliferação; e os carcinomas neuroendócrinos, pouco diferenciados,
são caracterizados por um alto índice de proliferação e comportamento mais agressivo.
A classificação também pode levar em conta o
órgão ou tecido de origem embrionária. Por exemplo, procedentes do intestino anterior ou foregut
(pulmão, brônquios, gástricos, duodenais timo e
vias biliares), intestino médio ou midgut (intestino
delgado, apêndice e cólon proximal) e intestino
posterior ou hindgut (cólon distal, reto, trato geniturinário). Além disso, a classificação está relacionada com a existência de sintomas clínicos
produzidos pela liberação hormonal. São os tumores funcionantes e não funcionantes.
Dependendo do seu sítio de origem, os TNEs
secretam peptídeos vasoativos, como a serotonina
5 (5-HT), além de sintetizar e armazenar outros
hormônios em excesso, como gastrina, que estimula o estômago a secretar ácidos e enzimas, provocando úlceras pépticas; insulina, que reduz os
níveis de glicose no sangue; glucagon, que provoca hiperglicemia; catecolamina, ligada à hipertensão; peptídeos intestinos vasoativos (VIP), que
causam diarreia; e somatostatina, que inibe quase
todos os hormônios do intestino, retardando sua
motilidade e prejudicando a absorção de nutrientes. Quando esses hormônios são liberados em excesso no organismo e produzem síndromes
clínicas, são chamados funcionantes. Os não funcionantes não causam esses sintomas, tornando o
diagnóstico mais difícil.
Um dos sintomas mais característicos dos
TNEs, mas não necessariamente presente em todos
os casos, é a síndrome carcinoide, que produz diarreia, rubor facial e eventualmente palpitações e falta
de ar ou tosse. No começo, esses sintomas podem
ser pouco frequentes, mas aos poucos aumentam e
podem se tornar crônicos. Nem sempre estão
relacionados com a localização do tumor, mas, na
maioria dos casos, com o excesso de setoronina,
que é decomposta em 5-HIAA (ácido 5-hidroxiindolacético) e liberada na urina.
No caso de pacientes com suspeita clínica da
doença, o teste de urina por 24 horas para verificação dos níveis de 5-HIAA é um marcador bastante
utilizado, embora o seu uso possa ser prejudicado
pelo consumo de alguns alimentos (banana, abacate, abacaxi e nozes) ou por medicamentos (inibidores da bomba de prótons como o omeprazol)
e infecções crônicas. Outro marcador bastante
comum seria a cromogranina A (CgA), elevada em
60% a 80% nos portadores de TNEs, independentemente do sítio primário, além de outros também
testados no sangue, que podem ser utilizados para
diagnosticar tanto tumores funcionantes como não
funcionantes.
Um dos sintomas
mais característicos
dos TNEs, mas não
necessariamente
presente em
todos os casos,
é a síndrome
carcinoide, que
produz diarreia,
rubor facial,
eventualmente
palpitações e
falta de ar ou tosse
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
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Com tantas variáveis, o consenso é
estabelecer equipes
multidisciplinares
para o tratamento
da doença, incluindo cirurgiões,
clínicos, médicos
nucleares,
radiologistas
intervencionistas e
patologistas, que
trabalham juntos
na avaliação dos
diferentes casos
18
Embora a especificidade seja menor do que os
níveis de 5-HIAA na urina, o uso desses marcadores, principalmente a CgA, pode ser mais seguro,
especialmente na detecção de recidiva do tumor
carcinoide. Técnicas de imagem e radiografias, além
da endoscopia, podem ser também de grande ajuda
para descobrir os tumores e identificar sua propagação. “Uma cuidadosa avaliação com exames complementares é parte fundamental do manejo dos
tumores neuroendócrinos”, afirma Duílio Rocha,
chefe do Serviço de Oncologia Clínica do Hospital
Universitário Walter Cantídio, da Universidade Federal do Ceará, e oncologista da Clínica Fujiday.
“O que torna os tumores neuroendócrinos uma
situação fora do convencional é que não existe um
protocolo muito claro sobre o seu encaminhamento”, lembra ainda o oncologista. “É preciso usar
a experiência e o bom senso, ficar alerta para os sinais incrivelmente heterogêneos do paciente e tentar
acompanhar o seu perfil biológico.” Muitas vezes
isso também muda, complementa Rocha. “O tumor
pode começar indolente com um bom prognóstico
e em algum momento se tornar mais agressivo. Por
isso também é uma doença que precisa demais de
diversos especialistas, que trabalham em conjunto
para oferecer o melhor tratamento.”
Equipe multidisciplinar
Na grande maioria das vezes, os TNEs têm um
comportamento distinto dos tumores mais frequentes. Os de intestino, por exemplo, não costumam
ser identificados até que surjam as metástases, ao
contrário dos adenocarcinomas de cólon e reto, que
apresentam sinais como obstrução e sangramento.
Os TNEs de pâncreas podem ser menos agressivos
que os adenocarcinomas e acometem normalmente
o corpo ou a “cauda do pâncreas”.
“A avaliação é específica para cada tipo de
tumor, para cada grau de estadiamento e para cada
paciente”, lembra Raphael Leonardo Cunha de
Araújo, cirurgião do Serviço de Digestivo Alto do
Hospital do Câncer de Barretos. “Sem contar que o
plano inicial de tratamento deve ser reavaliado e revisto a cada três meses, pois o quadro clínico pode
mudar. Sem contar também que muitos tratamentos e tecnologias mais modernas ainda são pouco
disponíveis e aprovados no SUS e até mesmo pelos
planos de saúde.”
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
Com tantas variáveis, o consenso é estabelecer
equipes multidisciplinares para o tratamento da
doença, incluindo cirurgiões, clínicos, médicos nucleares, radiologistas intervencionistas e patologistas, que trabalham juntos na avaliação dos
diferentes casos. Um profissional muito importante
nesses casos é o radiologista intervencionista, uma
especialidade médica pouco conhecida do público
em geral, cujo objetivo é realizar procedimentos e
cirurgias minimamente invasivas visando o diagnóstico e o tratamento de doenças.
Entre suas atribuições está a biópsia percutânea
guiada por tomografia computadorizada ou por ultrassonografia, conforme a localização e as características do tumor. E, quando necessário, o
tratamento por cateterismo ou quimioembolização,
indicado principalmente no caso de tumores primários do fígado. É um tratamento infinitamente
menos invasivo, cuja tecnologia envolvida melhorou bastante, mas infelizmente não é definitivo”,
afirma o radiologista intervencionista José Hugo
Mendes Luz, do Inca e do Centro de Oncologia
Rede D’Or. “Ele é indicado para pacientes que não
são candidatos a tratamentos como ressecção cirúrgica ou ablação cutânea por radiofrequência.”
Essa última modalidade baseia-se na introdução
percutânea de uma agulha fina pelo médico radiologista intervencionista, guiada por algum método
de imagem, como tomografia ou ultrassonografia,
e ligada a uma corrente de radiofrequência emitida
diretamente na lesão tumoral. Também é considerada pouco invasiva, segura e eficaz para tumores
malignos e por isso tornou-se mais frequente. “Há
oito anos, costumava fazer uma ablação por mês.
Hoje, faço duas por semana”, afirma Mendes Luz.
Vários estudos recentes consolidaram o uso de
outras terapias indolores e não invasivas nas doenças avançadas ou metastáticas. Os análogos de somatostatina (octreotide e lanreotida), cujo alvo
terapêutico são os receptores de somatostatina existentes na superfície das células de TNEs, mostraram
não só atividade antitumoral como aumento de sobrevida nos tumores de baixo grau, tanto no intestino como no pâncreas. Tais substâncias são
marcadas com radionuclídeos e também mostram
a localização das células cancerígenas no corpo
mesmo quando os tumores têm tamanho reduzido
e baixo metabolismo.
“A cintilografia dos receptores de somatostatina
(Octreotide-Indio-111 e Octreoscan) deve ser utilizada de preferência para TNEs de baixo grau que
expresse o subtipo 2 de receptores de somatostatina, como os carcinoides intestinais e o gastrinoma”, afirma Michel Pontes Carneiro, especialista
em medicina nuclear do Inca. “O exame também
serve para quantificar a densidade dos receptores
no prognóstico de resposta ao tratamento.”
Outros fármacos são utilizados pela medicina
nuclear em TNEs com características morfológicas
e funcionais diferentes, como o MIBG para produtores de catecolaminas. Para tumores metastáticos
e inoperáveis, principalmente quando não respondem ao tratamento quimioterápico, utiliza-se uma
substância similar ao octreotide que também tem
afinidade pelos receptores de somatostatina (DOTATATE), com o radionuclídeo Lutecio-177. Nos
grandes centros oncológicos, utiliza-se como radiatraçador o 68-Gálio-DOTANOC. Apesar de essas
substâncias estarem disponíveis comercialmente
no Brasil, elas não são cobertas pelo SUS, afirma
Pontes Carneiro.
Tratamento
Com a doença localizada, o principal tratamento para os tumores neuroendócrinos é a cirurgia. Em casos de tumores bem diferenciados, a
ressecção, preservando os órgãos, é possível e traz
bons resultados. Ela também é indicada como tratamento paliativo, com o objetivo de evitar complicações, como obstrução de um órgão ou
sangramento. E também para controlar os sintomas
hormonais no caso das síndromes carcinoides. Cirurgias com ressecção podem ter um papel importante no controle da doença e na melhoria de
sobrevida mesmo quando há metástase. Nesses
casos, também podem ser realizados procedimentos
radiológicos, como a embolização, que restringe a
chegada de sangue e nutrientes ao tumor.
“É muito comum que os TNEs, principalmente
os que acometem órgãos abdominais, tenham metástase no fígado”, comenta Felipe Coimbra, do
A.C. Camargo. “Nesse caso, o tratamento tem de
ser direcionado, para evitar o desenvolvimento de
múltiplos nódulos que podem crescer e substituir
as células normais, atrapalhando o funcionamento
do órgão e causando insuficiência.” Segundo Coimbra, dependendo do caso, pode-se indicar até
mesmo o transplante de fígado, como ocorreu com
Steve Jobs.
Tratamentos sistêmicos incluem, além dos
análogos de somatostatina, a quimioterapia e
novas medicações-alvo que interferem nos mecanismos de desenvolvimento do tumor. No Brasil,
utiliza-se, quando não há outras opções, o interferon, que promove a estimulação do sistema
imunológico e pode ser ministrado isoladamente
ou em combinação com um análogo de somatostatina. Sua utilidade é limitada pelos efeitos colaterais, que podem ser severos, e pela forma de
administração por injeção, diariamente ou várias
vezes por semana.
Nos últimos anos, novas drogas direcionadas
para partes específicas das células cancerígenas
(medicamentos-alvo) se mostraram promissoras no
tratamento de tumores neuroendócrinos que iniciam no pâncreas e no caso dos carcinoides – entre
elas o everolimus e o sunitinibe, drogas que reduzem o fornecimento de sangue e retardam o crescimento e a disseminação de células cancerosas. Mais
recentemente foram anunciados resultados promissores com o telotristat etiprate, medicamento da Lexicon, que age sobre a serotonina produzida em
excesso nas células dos TNEs e que levam à síndrome carcinoide. Em todas as situações, é preciso
avaliar a tolerância e quais as melhores opções e
combinações de medicamentos.
“Ainda temos muito a entender sobre a fisiopatologia, e consequentemente, sobre o melhor tratamento dos TNEs, devido à diversidade de suas
apresentações”, afirma a oncologista Maria de Lourdes Lopes de Oliveira, coordenadora do Grupo de
Tumores Gastrointestinais da Oncologia D’Or. “Os
pacientes podem ser submetidos à cirurgia do
tumor primário e das metástases, a terapias locais
ou ao uso de quimioterápicos. Uma boa classificação histopatológica, um bom estadiamento e a discussão multidisciplinar impactam diretamente no
prognóstico.”
Para tumores
metastáticos
e inoperáveis,
principalmente
quando não
respondem ao
tratamento quimioterápico, utiliza-se
uma substância
similar ao
octreotide que
também tem
afinidade pelos
receptores de
somatostatina
(DOTATATE), com o
radionuclídeo
Lutecio-177
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
19
gliomas
Novidades nos tumores primários
do sistema nervoso central (SNC)
e em metástases cerebrais
O
DIAGNÓSTICO DOS GLIOMAS – TANTO OS DE ALTO
– TEM SIDO FEITO,
HISTORICAMENTE, E EXCLUSIVAMENTE, COM BASE
nos aspectos histológicos. Isso tem sido, no entanto, associado à alta variabilidade em termos de
análise e baixos níveis de reprodutibilidade.
Há grandes mudanças em curso! O desenvolvimento da patologia clínica e as novas descobertas
relacionadas à tumorigênese vêm desvendando os
mecanismos genéticos e moleculares particulares
das várias patologias classificadas como “gliomas”,
permitindo a individualização dos diagnósticos,
que se tornam mais precisos, e abrindo caminho
para a pesquisa de novos agentes terapêuticos.
Com isso, podemos projetar um futuro de tratamentos personalizados, a exemplo do que ocorre
em tumores de mama, pulmão, cólon e, mais recentemente, melanoma.
Em um curto espaço de tempo, foram descritas
alterações características de gliomas, que permitem
desde o diagnóstico de um tumor, em contraposição à presença de células reativas, até a caracterização do tumor, com informações relacionadas ao
comportamento clínico da doença, bem como da
resposta aos tratamentos disponíveis.
Apresentamos a seguir as alterações mais em voga
e que, em diversos estudos, têm apresentado estreita
relação com um ou mais aspectos relacionados à
caracterização dos gliomas – diagnóstico (incluindo
diferenciação de tecidos não tumorais), curso clínico
e/ou prognóstico da doença e resposta aos tratamentos existentes (seja químio ou radioterapia).
Divulgação
COMO OS DE BAIXO GRAUS
Jacques Bines
"Coordenador do Grupo de
Neurologia da Oncologia D'Or,
graduado em Medicina pela UFRJ
com residência em Oncologia
Clínica pelo Instituto Nacional
de Câncer (Inca) e fellow do
Instituto Jules Bordet - Bélgica
Contato:
[email protected]
22
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
IDH1 e 2 – Isocitrato desidrogenase
A mutação do gene IDH1 (e, menos frequentemente, IDH2) está comumente associada aos gliomas de baixo grau (e ao que ainda chamamos, hoje
em dia, de glioblastoma – GBM – secundário) e é
rara em GBM primário (50% a 80% versus 5%, respectivamente).
Esse gene codifica a proteína de mesmo nome,
que está envolvida no metabolismo da glicose e é
uma das primeiras alterações genéticas e/ou moleculares encontradas na patogênese dos gliomas.
Quando presente, permite distinguir com clareza
um glioma difuso de áreas de gliose ou outras alterações não neoplásicas, como isquemia ou dano por
radioterapia, e está associada, nos gliomas, a um
melhor prognóstico.
A presença dessa mutação pode ser determinada por imuno-histoquímica e está frequentemente associada à metilação de MGMT (que
veremos a seguir).
MGMT
São as iniciais, em inglês, de metilguanina-DNA
metiltransferase. É um gene que codifica a enzima
de mesmo nome, cuja função é reparar danos ao
DNA. Após a ação da quimioterapia, a enzima remove o grupo alquil depositado na cadeia, recuperando o DNA e conferindo resistência ao tumor.
Em uma parcela variável dos gliomas (em até
70% a 80% dos oligodendrogliomas, por exemplo),
esse gene está metilado – uma mudança epigenética
(que se caracteriza por não alterar a estrutura do gene,
mas modifica sua expressão), que impede a sua transcrição, tornando o tumor mais sensível às alterações
provocadas pela quimioterapia, e esta, mais efetiva.
Em diversos estudos, vemos resultados mais
marcantes nos pacientes cujo tumor apresenta essa
alteração, com evidências de aumento de sobrevida
global.
Além da resposta, a presença dessa alteração parece indicar uma maior chance de pseudoprogressão
ao longo do tratamento com químio e radioterapia.
A pesquisa da metilação da MGMT é feita por
meio da técnica de PCR (reação em cadeia da polimerase) e está incorporada à avaliação rotineira dos
gliomas; tem valor prognóstico em GBM e, em alguns casos, como em pacientes acima de 70 anos,
pode ajudar a definir o tratamento a ser seguido.
Nova classificação – O “desaparecimento” do oligoastrocitoma
Com base nas novas informações, baseadas nas
alterações moleculares descritas, a caracterização
dos tumores parece ser mais homogênea, com o potencial de diminuir dúvidas e discussões quanto a
real “identidade” do tumor. Isso é particularmente
útil no caso de tumores ditos “mistos”, em particular o oligoastrocitoma, que tem rendido inúmeras
discussões e incertezas e impõe uma difícil avaliação em relação ao comportamento clínico e consequentemente dificuldade na decisão quanto ao
tratamento a ser empregado.
Tais dúvidas parecem estar sendo dirimidas –
na próxima atualização da classificação da OMS, esperada para 2016, não haverá mais a entidade “oligoastrocitoma”.
Co-Deleção 1p19q
A deleção do braço curto do cromossoma 1 (1p)
e/ou do braço longo do cromossoma 19 (19q) é característica marcante dos tumores oligodendrogliais, sendo rara no GBM. Sua presença confere
melhor prognóstico e também melhor resposta aos
tratamentos existentes – tanto à radioterapia quanto
aos agentes alquilantes, comumente utilizados.
Sua pesquisa é feita através de hibridização in
situ por fluorescência (FISH). Sua testagem é recomendada em todos os pacientes com oligodendroglioma – é importante notar que a ausência desses
achados não elimina esse diagnóstico. Além disso,
sua utilização pode ser importante em casos de tumores anaplásicos ou em situações em que a morfologia não é conclusiva – nesta situação a presença
da (co-)deleção comprova a existência de tumor de
linhagem oligodendroglial.
TERT
O gene TERT codifica a transcriptase reversa da
telomerase, que adiciona telômeros à cadeia de
DNA, impedindo os processos normais de senescência celular e/ou apoptose; a mutação desse gene,
que parece constituir evento precoce nos gliomas,
a exemplo da mutação IDH, aumenta a transcrição
e a atividade da telomerase, tornando as células
“imortais” – uma das características fundamentais
da célula neoplásica.
“Velho” tratamento, com aplicação agora
comprovada
Após muitas discussões, muitos estudos e incertezas, uma apresentação no Congresso Americano de Oncologia Clínica (American Society of
Clinical Oncology – ASCO), do estudo RTOG
9802, em 2014, mostrou, em pacientes com gliomas de baixo grau, com mais de 40 anos de idade
ou ressecção subtotal do tumor, que a adição de
quimioterapia ao tratamento padrão levou ao aumento de sobrevida global.
O esquema quimioterápico utilizado foi o
“velho” PCV – procarbazina, lomustina e vincristina. Feito por seis ciclos, imediatamente após a radioterapia, promoveu o aumento da sobrevida de
7,8 para 13,8 anos, quando comparado à radioterapia isolada.
A melhora demonstrada tornou obrigatória a
consideração do tratamento sequencial – rádio e
quimioterapia – para os pacientes portadores de
gliomas de baixo grau.
Após muitas
discussões, uma
apresentação na
ASCO, do estudo
RTOG 9802, mostrou, em pacientes
com gliomas de
baixo grau, com
mais de 40 anos
de idade ou
ressecção subtotal
do tumor, que a
adição de quimioterapia ao tratamento
levou ao aumento
de sobrevida global
Novo tratamento, associado à químio e
radioterapia, no tratamento adjuvante
Os achados do clássico estudo EORTC/NCIC
foram confirmados e reforçados, com a publicação
do seguimento de cinco anos, em 2009, que mostrou
o benefício da adição de temozolamida à radioterapia
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
23
Os trabalhos e
evidências recentes
têm mostrado a
possibilidade de
tratamento de
múltiplas lesões
cerebrais com
radiocirurgia
(quando não
utilizada ou
indicada a cirurgia)
ao invés da
radioterapia
de crânio total,
tratamento
tradicionalmente
utilizado
como tratamento adjuvante do glioblastoma multiforme (GBM).
A quimioterapia – temozolamida – utilizada por
via oral, concomitante à radioterapia e por seis
meses após o término da rádio, foi associada a significativo aumento de sobrevida mediana em cinco
(5) anos – de menos de 2% para quase 10%.
Desde então, os múltiplos ensaios e pesquisas
clínicas envolvendo dezenas de medicações tidas
como promissoras em estudos de fase II não revelaram nenhum benefício concreto.
Em 2011, um novo tratamento, denominado
“TTF – Tumor Treating Fields”, demonstrou benefício no tratamento de GBM recidivado. Utiliza-se um
aparelho que gera correntes elétricas, transmitidas
através de condutores permanentemente aplicados
sobre o couro cabeludo do paciente; seu mecanismo
de ação é baseado no bloqueio da divisão celular por
efeito dos campos elétricos gerados, freando ou inibindo o crescimento tumoral. Houve menos toxicidade e melhor qualidade de vida quando comparado
à quimioterapia, sem diferença em termos de sobrevida. O trabalho levou à aprovação do mecanismo
como forma de tratamento nessa situação clínica.
A sequência lógica foi o estudo desse mesmo
mecanismo no tratamento da doença recém-diagnosticada, em associação ao tratamento padrão –
químio e radioterapia. O estudo, chamado EF14,
foi apresentado no Congresso da ASCO de 2015 e
revelou melhora da sobrevida mediana – de 16 para
19 meses (em 2 anos, 43% vivos versus 29 do tratamento padrão); um aumento pequeno, mas significativo, e que levou à aprovação pelo FDA
(Federal Drug Agency – agência norte americana
responsável pelo controle de medicamentos), em
outubro último, para o tratamento de GBM, conforme utilizado no estudo – em conjunto com rádio
e quimioterapia. Pequeno passo, mas que mostra
algum avanço, depois de mais de quase duas décadas de frustrações e falta de novidades.
Metástases cerebrais
Tem havido um grande aumento na detecção
de metástases cerebrais, particularmente de lesões
assintomáticas. Parte desse aumento pode ser atribuído ao grande número de exames realizados.
24
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
Outro dado que chama atenção é o aumento gradativo da sobrevida dos pacientes, como consequência do melhor controle das neoplasias, mesmo
em estágio IV, através do uso de quimioterapia sistêmica convencional e da crescente utilização de
medicamentos-alvo. Um exemplo marcante e representativo ocorre com portadoras de câncer de
mama que apresentam superexpressão do gene
HER2, cujo tratamento incorporou terapias antiHER2 como trastuzumabe – além de sobrevida
muito maior, que permite mais tempo para o desenvolvimento e manifestação clínica dessas metástases, essas pacientes, em particular, têm o SNC
como um dos sítios “preferenciais” de recaída.
Com a percepção dessa mudança de apresentação – a detecção de lesões mínimas, subclínicas
e assintomáticas –, o foco do tratamento das metástases cerebrais também tem mudado: ao invés
de uma paliação de curto prazo, como era a regra,
hoje em dia devemos encarar essa situação pensando em sobrevida de longo prazo, utilizando os
tratamentos de forma cuidadosa e procurando
aliar a isso a preocupação com a toxicidade inerente ao tratamento e seu impacto na qualidade de
vida do paciente.
Os trabalhos e as evidências recentes têm mostrado a possibilidade de tratamento de múltiplas
lesões cerebrais com radiocirurgia (quando não
utilizada ou indicada a cirurgia) ao invés da
radioterapia de crânio total, tratamento tradicionalmente utilizado. A radiocirurgia, não mais
limitada ao “máximo de três lesões”, está associada
a controle equivalente (embora com maior risco
de recidivas cerebrais subsequentes), sem alteração, no entanto, em termos de mortalidade e com
importante menor impacto em cognição e qualidade de vida.
Outro aspecto marcante relacionado ao tratamento dessas lesões é o desenvolvimento, em anos
recentes, de novos medicamentos, em geral alvoespecíficos, que apresentam boa penetração na barreira hematoencefálica, chegando em alguns casos
a atingir taxas de reposta semelhantes às observadas
em lesões metastáticas em outros locais, como fígado e pulmão.
Ao contrário de drogas mais antigas, como ca-
pecitabina, metotrexate, etoposide e temozolamida, esses novos agentes alcançam taxas de resposta de mais de 30%, chegando a 70%-80%
quando em associação com radioterapia – caso de erlotinibe, inibidor
de tirosina quinase, utilizado no tratamento de adenocarcinoma de
pulmão. Outras drogas com atividade comprovada incluem:
Dabrafenibe e vemurafenibe – utilizados em portadores de melanoma com gene BRAF mutado – são ambos inibidores da quinase
BRAF, impedindo a proliferação celular, e apresentam taxa de resposta
de 30% a 40% em lesões cerebrais.
Gefitinibe – mecanismo de ação e atividade semelhantes
aos do erlotinib
Há outras medicações em estudo e/ou já incorporadas ao arsenal
terapêutico, como T-DM1 (trastuzumabe emtansina), em mama, e ceritinibe, em pulmão, que também apresentam, ao menos incialmente,
altas taxas de resposta em metástases cerebrais, semelhantes às descritas anteriormente.
O novo patamar de resposta demonstrado por algumas dessas medicações nos permite pensar em iniciar o tratamento de alguns de nossos pacientes com medicação sistêmica exclusiva, reservando outras
terapias, notadamente a radioterapia, para momentos subsequentes,
evitando efeitos colaterais ou toxicidade indesejados, sem prejuízo para
o resultado terapêutico desejado.
Considerações finais
As recentes descobertas têm aumentado muito o conhecimento
acerca dos tumores que acometem o SNC – notadamente os gliomas.
Com isso, podemos vislumbrar – após um relativo período de “estagnação” – novas perspectivas para o tratamento desses tumores.
Da mesma forma, uma nova “leva” de novos agentes (e baseados
nos mesmos tipos de descoberta) tem se mostrado eficaz no tratamento
de metástases, num “território” antes considerado “inexpugnável” –
uma clara demonstração de progresso!
Referências bibliográficas:
– Hirose Y, Sasaki H, Abe M, et al. Subgrouping of gliomas on the basis of genetic profiles. Brain Tumor Pathol 2013;30:203-8.
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Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
25
hemato
Urgências onco-hematológicas
Divulgação
N
A PRÁTICA CLÍNICA, COMUMENTE VIVENCIAMOS
URGÊNCIAS RELACIONADAS ÀS NEOPLASIAS HE-
MATOLÓGICAS, POIS ESSE GRUPO É COMPOSTO
de doenças caracterizadas por uma rápida proliferação celular, crescimento tumoral e/ou resposta ao
tratamento.
Neutropenia febril
Davimar M. Borducchi
* Especialista em hematologia
e hemoterapia pela Sociedade
Brasileira de Hematologia e Hemoterapia, médica hematologista do
Central Clinic e professora afiliada
de hematologia e oncologia
da FMABC
Divulgação
Contato:
[email protected]
A neutropenia febril (NF) é definida pelo National Comprehensive Cancer Network (NCCN)
como uma temperatura oral > 38,3º ou > 38º por
mais que 60 minutos em pacientes com contagem
de neutrófilos inferior a 500/mcl ou inferior a
1.000/mcl com previsão de queda desse valor em
48 horas.
Trata-se da principal complicação relacionada
ao tratamento, em que a introdução empírica e precoce de antimicrobianos está associada a ganho na
sobrevida superior a 90%.
Nas últimas décadas, observa-se uma alteração
no perfil de incidência de patógenos, com redução
dos gram-negativos e aumento dos gram-positivos.
Isso se deve ao uso de quinolonas como profilaxia
infecciosa.
Manejo clínico
Juliana Todaro
* Graduada em medicina
pela Faculdade de Medicina
do ABC, especialista em
hematologia e hemoterapia
Contato:
[email protected]
26
A avaliação inicial da NF visa determinar um
possível foco, permitir o entendimento quanto ao
diagnóstico do paciente, seu antecedente quimioterápico, o uso de antibioticoterapia profilática ou
corticoesteroides, a presença de cateter venoso central, sintomas relacionados à mucosite e/ou antecedente de infecção por agentes com alteração do
perfil de sensibilidade a antimicrobianos.
Esses pacientes deverão ser prontamente submetidos à contagem de neutrófilos e à coleta de culturas
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
(sangue, urina e secreções). A hemocultura será coletada de sangue periférico e cateter.
Atualmente, estratifica-se a NF em risco conforme os critérios estabelecidos no instrumento
Multinational Association for Supportive Care
(MASCC — Tabela 1), que utiliza os dados clínicos
associados à gravidade do quadro, como presença
de sintomas, desidratação e hipotensão, idade e antecedentes relevantes (infecção fúngica prévia,
doença pulmonar obstrutiva crônica etc.).
O objetivo do uso desse instrumento é avaliar
quem são os pacientes em que não haverá necessidade de uma internação hospitalar imediata
(baixo risco) e que poderão ser acompanhados
ambulatoriamente.
Assim, a NF de baixo risco tem como opção receber terapia antimicrobiana por via oral. Classicamente, utiliza-se a combinação de amoxacilina/
clavulanato ao ciprofloxacino. Porém, mais recentemente, o uso de moxifloxacino demonstrou semelhante segurança e eficácia.
Os pacientes de alto risco receberão em regime
de internação hospitalar antimicrobianos de amplo
espectro por via endovenosa. A escolha terapêutica
deve considerar os fatores epidemiológicos relacionados ao centro em que o paciente recebe o tratamento, ou seja, o perfil de sensibilidade dos germes
encontrados no local, assim como a necessidade de
maior cobertura para gram-positivo, como na presença de cateter, lesões de pele e mucosite.
Geralmente, utilizam-se em monoterapia cefalosporinas antipseudomonas (ceftazedima e cefepime), piperacilina-tazobactan ou carbapenêmicos.
Quando há forte suspeita clínica de gram-positivo,
associa-se a essa conduta um glicopeptídeo como a
vancomicina ou considera-se a teicoplamina.
Tabela 1. MASCC
Características
Pontos
Intensidade de sintomas:
Assintomático
5
Sintomas leves
5
Sintomas moderados ou graves
3
Ausência de hipotensão
5
Ausência de doença pulmonar obstrutiva crônica
4
Portador de tumor sólido ou ausência de infecção fúngica
4
Ausência de desidratação
3
Não hospitalizado ao aparecimento da febre
3
Idade menor que 60 anos
2
Pontuação ≥ 21 são considerados de baixo risco
Após 48 horas da introdução dos antimicrobianos, nos pacientes instáveis em monoterapia sugere-se ampliar a cobertura para gram-positivo ou
mudar o regime para um carbapenêmico. Quando
a febre persistir por mais de quatro a seis dias, é necessário iniciar terapia antifúngica.
Segundo recomendações do ESMO, a suspensão precoce de antimicrobianos pode ocorrer
quando os neutrófilos estiverem acima de 500/mcl,
em paciente afebril e assintomático, ou quando inferior a 500/mcl e afebril por cinco a sete dias; à exceção de leucemias agudas e continuidade de
tratamento com quimioterapia em altas doses.
Hiperleucocitose e leucostase
Define-se, genericamente, a hiperleucocitose
como contagem de leucócitos superior a 100.000/μL.
Entretanto, a morbimortalidade relacionada a esse
valor varia entre os diversos tipos de leucemia. Por
exemplo, na leucemia mieloide aguda (LMA), um
paciente com 50.000/μL leucócitos pode ser extremamente sintomático e, na leucemia linfoide crônica (LLC), valores até três vezes maiores podem
não causar repercussão clínica.
Entre as principais complicações associadas à
hiperleucocitose destaca-se a leucostase. Trata-se
de uma obstrução vascular desencadeada pela alta
contagem de leucócitos, levando à hipóxia tecidual. A hiperleucocitose pode também ocasionar
síndrome de lise tumoral e coagulopatia vascular
disseminada.
Duas são as teorias que explicam a fisiopatologia da leucostase: a primeira se baseia na alteração
da viscosidade em função do volume celular, elucidando um maior acometimento nas neoplasias de
origem mieloide. A segunda, na lesão endotelial gerada por citocinas inflamatórias.
Manejo clínico
O diagnóstico de leucostase é realizado através
do aparecimento de sinais e sintomas em pacientes
com diagnóstico de leucemia, os quais se apresentam conforme o órgão-alvo, mais frequentemente
pulmão e sistema nervoso central (SNC).
Assim, são sugestivas de acometimento pulmonar a presença de dispneia, taquipneia e hipoxemia,
acompanhada de estertoração na ausculta e imagem
radiológica compatível com infiltrado intersticial. No
SNC, observa-se confusão, vertigem, cefaleia, zumbido, turvação visual, alteração do nível de consciência e ataxia. Nesses casos, realiza-se tomografia
computadorizada (TC) ou ressonância magnética
(RNM), com o objetivo não apenas de confirmar tal
achado, mas também de descartar sangramento associado. Outras manifestações comuns incluem a isquemia de membro, trombose e priapismo.
A leucostase é uma emergência clínica, e seu tratamento é baseado na hiperleucocitose, ou seja,
suporte clínico, principalmente prevenção de lise tumoral e citorredução, o que pode ser realizado quimicamente com a terapia de indução e hidroxiureia
ou através da leucoaférese, a qual, é comumente emOnco&
Entre as principais
complicações
associadas à
hiperleucocitose
destaca-se a
leucostase. Trata-se
de uma obstrução
vascular desencadeada pela alta
contagem de
leucócitos, levando
à hipóxia tecidual
dezembro/janeiro/fevereiro 2016
27
pregada em pacientes de alto risco. Seu uso é imperativo em situações
de priapismo é uma das poucas situações cujo seu uso é imperativo. Estudos recentes demonstram que o mais importante na hiperleucocitose
sem sinais de leucostase é a citorredução química precoce.
Síndrome de lise tumoral
A síndrome de lise tumoral (SLT) é comumente observada nas neoplasias com alto índice proliferativo e com boa sensibilidade à quimioterapia, sendo ocasionada pelo produto de degradação da célula
maligna, o qual libera no plasma íons intracelulares, ácidos nucleicos
e seus metabólitos, levando a hiperuricemia, hipercalemia, hiperfosfatemia e hipocalcemia. São patologias a ela relacionadas as leucemias
agudas e os linfomas não Hodgkin de alto grau.
Manejo clínico
A abordagem da lise tumoral se baseia nos níveis de ácido úrico,
pois a insuficiência renal, considerada uma das suas principais morbimortalidades, é relacionada ao depósito dos cristais de urato nos túbulos renais, que pode se associar à precipitação de fosfato de cálcio.
Assim, nas neoplasias hematológicas é importante ao diagnóstico
e durante o tratamento avaliar o risco para SLT e iniciar precocemente
hidratação vigorosa e drogas uricosúricas. Os pacientes devem receber
em torno de 3 L/m2 de solução isotônica ou hipotônica salina em 24
horas e ter o seu balanço hídrico e peso monitorizados.
Com relação às drogas uricosúricas, são utilizados ou pela via oral
um inibidor da xantina oxidase, o alopurinol, ou pela via endovenosa
um recombinante exógeno da oxadase úrica, a rasburicase.
Apesar de o alopurinol ser uma droga de fácil acesso em diferentes
serviços, em pacientes com níveis muito elevados de ácido úrico a desvantagem de sua ação é que ela se inicia apenas após 24 a 72 horas. A
dose ideal é de 300-450 mg/m2 — entretanto, essa dosagem deve ser
reavaliada em pacientes com clearances de creatinina inferiores a 0,33
ml/s, pois o seu metabólito oxipurinol é metabolizado por essa via.
Nos pacientes com insuficiência renal, a dose deve ser reduzida para
200-100mg.
Cada vez mais utilizada nos casos de alto risco pela sua rápida
atuação (4 horas), a rasburicase deve ser administrada na dose de
0,2 mg/kg por um período de até três dias. Essa medicação reduz
significantemente o número de diálises, assim como permite o início
precoce de quimioterapia e de maneira mais segura.
Síndrome de compressão medular
A definição da síndrome de compressão medular associa os achados radiológicos (compressão do saco dural e seus componentes —
medula espinhal e/ ou cauda equina por uma tumoração extradural) à
presença de sinais e sintomas (dor intensa e progressiva, paralisia,
perda sensorial e disfunção esfincteriana).
Manejo clínico
Diante da suspeita clínica de compressão, idealmente o paciente
deverá ser submetido a uma avaliação por ressonância nuclear magnética, exame de maior acurácia para esse diagnóstico.
A conduta inicial implicará na introdução de corticosteroides (CE).
Realiza-se um bolus de CE em alta dose, seguida da manutenção que poderá então ser complementada pela via oral. Assim, uma dose de 10 mg
de dexametasona é aplicada, seguida da dose fracionada de 16 mg/dia.
Um manejo rápido é fundamental para minimizar déficits.
Nos casos em que for verificada a presença de instabilidade, é aceitável tanto a realização de procedimento cirúrgico quanto de radioterapia, os quais são também indicados em caráter preventivo.
A cirurgia será bastante útil quando o tumor primário responsável
pela compressão medular for desconhecido.
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28
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
imunoterapia
Avanços da imunoterapia
na oncologia
A
RELAÇÃO ENTRE ONCOLOGIA E IMUNOLOGIA VEM
DESDE O SÉCULO XIX, QUANDO O MÉDICO WIL-
Divulgação
LIAM COLEY INFUNDIU BACTÉRIAS MORTAS EM
uma lesão tumoral de um paciente com sarcoma,
causando redução do tumor. Desde então, grandes
avanços têm sido realizados no que diz respeito à
compreensão sobre a interação entre o sistema imunológico e o crescimento/desenvolvimento tumoral.
Para que ocorra rápida e eficiente resposta
imune citotóxica contra o tumor, é necessário que
ocorra uma interação rápida e complexa entre vários diferentes tipos celulares e o sistema imune –
os linfócitos T CD8+ (células T citotóxicas) e as
subclasses Th1/Th2 dos linfócitos T CD4+ (células
T “helper”). Linfócitos CD8+ e CD4+ iniciam a distinção entre “self” e “não self”, sob a atuação da chamada “sinapse imune”.
A “sinapse imune”
Álvaro Garces
* Oncologista da Oncologia D'Or
Contato:
[email protected]
30
Um dos fenômenos mais amplamente estudados em imunologia é a capacidade dos linfócitos T
de distinguir antígenos “self” dos “não self”, que são
apresentados pelas células apresentadoras de antígenos (APCs), como as células dentríticas. De maneira geral, a citotoxicidade das células T CD8+ é
regulada pela presença e orientação espacial de uma
série de receptores estimulatórios e inibitórios, cuja
expressão é regulada por citocinas. Esse processo é
chamado de “sinapse imune”:
O sinal coestimulatório mais importante nas células T naïve é o CD28, que se liga ao B7-1 e ao B7-
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
2 (CD80/86) nas APCs. Esse processo coestimulatório é regulado pelas moléculas agonistas e pelos sinais inibitórios tanto das APCs quanto das células T,
frequentemente referidas como moléculas de “immune checkpoint”. Exemplos de moléculas coinibitórias ou “immune checkpoint” incluem a proteína
4 associada ao linfócito T citotóxico (CTLA-4), “programmed cell death-1” (PD-1), TIM3 e LAG3.
Evasão tumoral da vigilância imune
Um importante processo a ser entendido é
como o sistema imune poderia influenciar na progressão tumoral – a chamada “imunoedição do câncer”, que envolve três fases:
– Fase de eliminação: consiste na resposta inata
e adaptativa a antígenos específicos associados ao
tumor, dependente da função das células efetoras
NK, linfócitos T e B.
– Fase de equilíbrio: ocorre entre a destruição
imunomediada, a resposta do sistema imune adaptativo e a persistência de clones de células malignas.
– Fase de escape imunológico: quando os clones
malignos desenvolvem a habilidade de evadir à resposta adaptativa do sistema imune.
Existem vários mecanismos de escape à vigilância do sistema imune:
– Perda ou alteração de antígenos específicos
ou da maquinaria antigênica. Os tumores podem
perder a expressão do MHC-1 ou alguma outra
função da maquinaria intracelular necessária para
o transporte de antígenos tumorais para a super-
fície, o que é importante para o reconhecimento
pela célula T.
– Os tumores podem promover tolerância
imune no seu microambiente através de manipulação de citocinas, o que pode aumentar a infiltração
de células T regulatórias, por exemplo. Essas células
podem ativamente suprimir a proliferação de CD4+
e CD8+, os quais poderiam reconhecer os antígenos
tumorais.
– As células tumorais podem regular a hiperexpressão de moléculas de “immune checkpoint” tais
como PD-1 e o ligante do PD-1 (PD-L1), que promovem exaustão das células T periféricas.
Várias abordagens terapêuticas têm sido propostas e estudadas no sentido de promover a resposta imunológica para controlar o tumor,
incluindo o uso de citocinas, células T (inibidores
de “checkpoint” etc.), manipulação de células T, vacinas, entre outros.
Citocinas
Foram um dos primeiros tratamentos imunoterápicos utilizados na oncologia. Alguns exemplos:
– Interleucina 2 (IL-2): atua tanto na função citotóxica da célula T como na célula T regulatória.
Os efeitos dependem, em parte, da dose e do tempo
de administração. Em altas doses, IL-2 promove atividade citotóxica das células T efetoras CD8+ e das
NK; promove também diferenciação das células T
CD4+ em suas subclasses Th1 e Th2. Em doses menores, IL-2 parece preferencialmente expandir populações de células T reg.
Embora o uso de IL-2 tenha sido suplantado
pelos inibidores de “checkpoint”, IL-2 em alta
dose promove resposta objetiva duradoura em um
pequeno grupo de pacientes com melanoma e carcinoma de células renais, servindo assim como
prova de que o sistema imune pode eliminar células tumorais.
Interferon (IFN) alfa-2b
Promove resposta das células efetoras Th1-mediadas, tais como secreção de IL-12. IFN-alfa é
usado como tratamento adjuvante no tratamento
de melanoma de alto risco embora seu impacto na
sobrevida global seja controverso.
Bacillus Calmette-Guerin (BCG)
Derivado do Mycobacterium bovis atenuado,
induz resposta imune inflamatória quando injetado
na bexiga. É utilizado no tratamento do câncer de
bexiga superficial.
“Checkpoint inhibitors” CTLA-4
A proteína 4 associada ao linfócito T citotóxico
(CTLA-4) foi descoberta em 1987 e exerce função
regulatória negativa sobre a ativação das células T.
Está presente na superfície dos linfócitos T CD4+ e
T CD8+, onde tem maior afinidade com os receptores coestimulatórios CD80 e CD86 (B7-1 e B7-2)
das APCs. Sua ação final relaciona-se a bloquear a
ativação das células T CD4+ e CD8+, ativação essa
que seria desencadeada pelas APCs.
O anticorpo anti-CTLA-4 – ipilimumabe – foi
o primeiro inibidor de “checkpoint” a ser aprovado,
baseando-se no aumento de sobrevida global de pacientes com melanoma metastático. Dois estudos
de fase III mostraram ganho de sobrevida global em
pacientes com melanoma avançado, tratados com
ipilimumabe, tanto em 1ª quanto em 2ª linha de
tratamento. Ipilimumabe também foi aprovado
como tratamento adjuvante para melanoma de alto
risco como alternativa ao interferon.
Várias abordagens
terapêuticas têm
sido propostas e
estudadas no sentido
de promover a resposta imunológica
para controlar o
tumor, incluindo o
uso de citocinas,
células T (inibidores
de “checkpoint”
etc.), manipulação
de células T, vacinas,
entre outros
PD-1 e PDL-1/2
“Programmed cell death 1” (PD-1) é uma proteína transmembrana expressa nas células T, B e
NK. É uma molécula inibitória que se liga ao PDligante 1 (PD-L1 ou B7-H1) e PD-L2 (B7-H2).
PD-L1 é expresso na superfície de vários tipos
de tecidos, incluindo células tumorais e hematopoiéticas, enquanto PD-L2 é mais restrito às células
hematopoiéticas. A interação PD-1 e PD-L1/2 causa
inibição direta da apoptose das células tumorais,
promove exaustão das células T periféricas e
conversão das células T efetoras em células T regulatórias (Treg). Células NK, monócitos e células
dentríticas também expressam PD-1 e/ou PD-L1.
O tratamento com os anticorpos inibitórios
IgG4 PD-1 nivolumabe e pembrolizumabe confere
aumento de sobrevida global em pacientes com
melanoma metastático. O nivolumabe também se
mostrou eficaz em aumentar a sobrevida global de
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
31
pacientes com câncer de pulmão não pequenas células. Hoje, tanto
nivolumabe quanto pembrolizumabe são aprovados para pacientes
com melanoma e câncer de pulmão não pequenas células na Europa
e nos EUA.
O nivolumabe teve aprovação pelo FDA para o tratamento de câncer de pulmão não pequenas células do tipo escamoso após progressão
de doença ao tratamento inicial com quimioterapia à base de platina.
A aprovação foi baseada nos resultados obtidos pelo estudo CheckMate017. Esse estudo mostrou maior sobrevida global entre os pacientes que receberam nivolumabe (9,2 meses) em relação aos pacientes
tratados cm quimioterapia padrão – docetaxel (6 meses). Pacientes tratados com nivolumabe tiveram taxa de resposta de 20% comparada a
apenas 9% dos pacientes tratados com docetaxel (P = 0,008).
Nivolumabe também já foi aprovado pelo FDA para o tratamento
de câncer de pulmão não pequenas células não escamoso. O estudo
CheckMate057 publicado neste ano mostrou que pacientes com câncer
de pulmão não pequenas células não escamoso que tiveram progressão
de doença após tratamento à base de platina beneficiam-se do tratamento com nivolumabe quando comparados aos pacientes que receberam docetaxel (sobrevida global de 12,2 x 9,3 meses, taxa de resposta
de 19% x 12% e duração de resposta de 17 x 6 meses, respectivamente).
Pembrolizumabe também foi recentemente aprovado pelo FDA
para pacientes com câncer de pulmão não pequenas células. O estudo
KEYNOTE-001 avaliou a segurança e a eficácia dessa medicação e,
como resultados, a taxa de resposta foi de 19%, com mediana de duração de resposta de 12,5 meses, sobrevida livre de progressão de 3,7
meses, além de sobrevida global de 12 meses.
Esses e outros anticorpos que têm como alvo PD-1 ou PD-L1 demonstraram atividade clínica em vários tipos de tumor e estão sendo
estudados em uma série de protocolos de fase III. Entre os tumores
em avaliação, destacam-se câncer colorretal, câncer de células renais,
linfomas de Hodgkin e não Hodgkin, câncer de bexiga e de cabeça
e pescoço.
Combinações de tratamentos
Diversos estudos clínicos estão em andamento investigando a combinação de vários inibidores de “checkpoint”, com base nos resultados
obtidos com a monoterapia.
A associação de bloqueadores de CTLA-4 e de PD-1 é o que está
mais avançado: ipilimumabe concomitante a nivolumabe demonstrou
aumento da taxa de resposta com significância estatística em comparação a monoterapia com ipilimumabe no tratamento de melanoma
metastático. Como esperado, a taxa de toxicidade graus 3 e 4 foi também maior com o tratamento combinado.
Outros estudos associando ipilimumabe e nivolumabe estão em
andamento para o tratamento de câncer de pulmão não pequenas cé-
32
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
lulas, câncer epitelial de ovário, carcinoma colorretal, linfoma de
Hodgkin, rim e sarcoma.
Expansão ex vivo de infiltrado tumoral linfocitário
Linfócitos do infiltrado tumoral (TILs) representam uma população
imunológica que reconhece o antígeno tumoral mas que pode ter desenvolvido um fenótipo de “exaustão”.
Expansão ex vivo de TILs utiliza tecido tumoral fresco e culturas
com IL-2 para estimular expansão in vitro de TILs. Antes da infusão
de TILs pós-expansão, o paciente recebe quimioterapia não mieloablativa (ex.: ciclofosfamida) ou irradiação corporal total, com o objetivo de depletar células Treg inibitórias e outros linfócitos nos
pacientes, para aumentar a taxa de expansão in vivo das TILs. Os TILs
estimulados in vitro, compostos principalmente de CD8+ e, em menor
grau, de linfócitosT CD4+, são reintroduzidos nos pacientes em altas
doses junto com IL-2 também em alta dose, onde eles podem reconhecer antígenos tumorais específicos em um microambiente que
agora é menos propenso à tolerância. Em uma série de pacientes com
melanoma avançado, 56% daqueles que receberam infusão de células
T tiveram resposta objetiva.
Vírus oncolíticos
Podem mediar os efeitos antitumorais de várias formas. Sua produção pode ter como objetivo:
– infectar células tumorais de maneira preferencial às células
normais;
– promover a apresentação de antígenos associados aos tumores;
– ativar os sinais de perigo que promovem um microambiente com
menor tolerância imune;
– servir como veículos de transdução para a expressão de citocinas
imunomodulatórias.
O talimogene laherparepvec (TVEC), que utiliza um vírus de
Herpes simplex tipo 1 atenuado, promove a apresentação de células
dendríticas, as quais fazem a apresentação antigênica. Em um estudo
randomizado comparando TVEC com GM-CSF isolado, injeções intratumorais de TVEC produziram taxa de duração de resposta duradoura comparado a GM-CSF intratumoral isolado.
Vários outros vírus têm sido estudados.
Vacinas
Já de longa data tenta-se fazer com que a imunidade adaptativa reconheça os antígenos relacionados ao câncer para que se obtenha resposta antitumoral.
A única vacina aprovada atualmente para o tratamento de câncer
avançado é o sipuleucel-T – uma preparação de células dendríticas autólogas modificadas que tem como alvo a fosfatase ácida prostática
(PAP). Tal tratamento demonstrou benefício, em
termos de sobrevida global, em homens com adenocarcinoma de próstata resistente a castração.
Vacinas continuam sendo testadas, especialmente em tumores “imunogênicos” como melanoma. Até o momento, não se conseguiu aumento
de sobrevida ou redução de recidivas de maneira
significativa, mas atualmente esforços têm sido feitos no sentido de desenvolver vacinas de maneira
mais individualizada.
Critérios de resposta imunorrelacionados
Os padrões de resposta ao tratamento com
agentes imunoterápicos diferem dos das chamadas
drogas-alvo e da quimioterapia citotóxica em vários
importantes aspectos:
– O pacientes podem apresentar uma piora
transitória da doença, manifestada pela progressão de lesões conhecidas ou pelo surgimento de
novas lesões antes que a doença se estabilize ou
que ocorra regressão do tumor. Assim, é necessário cuidado antes de abandonar a terapia precocemente.
– As respostas podem demorar muito mais
tempo a aparecer, quando comparado à quimioterapia citotóxica, e a continuação de regressão tumoral é frequentemente observada mesmo após fim
do tratamento.
– Alguns pacientes que não preenchem os critérios de resposta objetiva podem ter períodos prolongados de doença estável.
Assim, critérios de resposta imunorrelacionados
foram propostos para avaliar o padrão de resposta
dos inibidores de “checkpoint” e outras imunoterapias. Isso é importante porque a aplicação dos critérios tradicionais do RECIST em pacientes tratados
com imunoterapia poderia levar à interrupção precoce do tratamento de maneira indevida.
Na prática clínica, pacientes em imunoterapia
com aparente aumento da doença tumoral devem
ser avaliados cuidadosamente para sinais e sintomas
de progressão. Na ausência de sinais claros de progressão sintomática, a repetição dos exames de imagem deve ser feita antes de se considerar falha à
terapia imune.
Preditores de resposta à terapia imune
Uma importante questão na utilização da imunoterapia seria selecionar quais pacientes melhor se
beneficiariam desse tratamento.
O biomarcador candidato mais estudado é o
PD-L1. Vários trabalhos retrospectivos e prospectivos têm mostrado uma tendência a melhor resposta
em pacientes com tumores “PDL-1 positivos”. Contudo, estudos com nivolumabe e pembrolizumabe
em melanoma identificaram pacientes tratados com
bloqueio de PD-1 e que tiveram boa resposta ao tratamento, mas eram considerados “PDL-1 negativos”. Isso sugere que a relação entre a expressão de
PD-L1 no microambiente tumoral e o benefício clínico do bloqueio de PD-1 é bem mais complexo e
necessita de maior investigação e entendimento.
Dados preliminares sugerem que tumores com
alta taxa de mutações somáticas (melanoma cutâneo em pele exposta ao sol, câncer de pulmão não
pequenas células e câncer colorretal com instabilidade de microssatélite) têm maior chance de se beneficiar de bloqueio imune quando comparados a
tumores com baixas taxas de mutações somáticas.
A imunoterapia tornou-se uma importante modalidade terapêutica para pacientes com melanoma
e câncer de pulmão não pequenas células. Proporciona aumento de sobrevida global e ótima tolerância. No Brasil, é necessário que políticas públicas
de saúde sejam discutidas para que esses tratamentos inovadores e eficazes estejam disponíveis para
nossos pacientes. É fundamental definir como incorporar essas novas terapias no âmbito nacional
para que nossa população tenha acesso e também
se beneficie desse tratamento.
Os padrões de
resposta ao
tratamento com
agentes imunoterápicos diferem dos
das chamadas
drogas-alvo e da
quimioterapia
citotóxica em
vários importantes
aspectos
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
33
colorretal
Diferentes abordagens no
tratamento do câncer do reto
O
CÂNCER COLORRETAL
Divulgação
André da Luz Moreira
* Coloproctologista do HUPE/UERJ,
Research/Clinical Fellowship –
Colorectal Surgery, Cleveland
Clinic OH USA
Divulgação
Contato:
[email protected]
Ricardo Vezzani
* Radiologista do Hospital
Copa D’Or, fellowship em câncer de
reto pelo Royal Marsden Hospital,
London - UK
Contato:
[email protected]
36
(CCR)
É UMA IMPOR-
TANTE CAUSA DE MORBIDADE E MORTALIDADE
E CORRESPONDE A APROXIMADAMENTE 9% DE
toda a incidência mundial de câncer. Além disso, ele
é o terceiro câncer mais comum e a quarta causa
de morte por câncer em todo o mundo. Usualmente, o CCR afeta homens e mulheres igualmente1.
O número de casos novos de câncer de cólon e
reto estimado para o Brasil, em 2016, é de 16.660
em homens e de 17.620 em mulheres. Sem considerar os tumores de pele não melanoma, o câncer
de cólon e reto em homens é o segundo mais frequente na região Sudeste e o terceiro nas regiões Sul
e Centro-Oeste. Nas regiões Nordeste e Norte, ele
ocupa a quarta posição. Para as mulheres, é o segundo mais frequente nas regiões Sudeste e Sul.
Nas regiões Centro-Oeste, Nordeste e Norte, é o terceiro mais frequente2. A estimativa mundial de
mortes por CCR em 2012 foi de 694 mil pacientes.
Já a sobrevida média global estimada em cinco anos
é de 55% nos países desenvolvidos e 40% nos países em desenvolvimento.
Aproximadamente 30% do CCR está localizado
no reto. As diferenças anatômicas entre o cólon e o
reto, especialmente o reto extraperitoneal, determinam as distintas formas de tratamento e prognóstico
oncológico. Nos últimos 20 anos, houve grande
evolução no manejo do câncer de reto, incluindo a
abordagem cirúrgica, radiológica e oncológica.
Abordagem cirúrgica
Inicialmente, o conceito de excisão total do mesorreto (TME), desenvolvida pelo Dr. Heald, ajudou
a sistematizar e a disseminar os princípios técnicos
de uma ressecção oncológica nos tumores de reto
distais. Nessa abordagem, a ressecção completa de
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
toda a gordura perirretal, denominada de mesorreto, acarreta uma linfadenectomia adequada nesses
tumores3 (Figura 1).
Estudos patológicos ressaltaram a importância
da margem circunferencial livre mantendo intacta
a fáscia mesorretal, também denominada de holly
plane. O envolvimento da margem circunferencial
parece ser o principal fator associado à recidiva
local após a ressecção dos tumores de reto distais4.
Outro importante avanço foi relacionado à margem distal. Inicialmente, uma margem distal maior
que 5 cm era aceita para tumores de reto. Atualmente, aceitamos margens distais livres de até 2 cm
para tumores não submetidos à radioterapia e de
até 1 cm para tumores submetidos à terapia neoadjuvante. Assim, muitos pacientes que eram submetidos à ressecção abdominoperineal de reto (RAP)
e colostomia definitiva no passado podem agora ter
o esfíncter preservado e a continuidade intestinal
mantida. A técnica cirúrgica adequada possibilita
um melhor controle local da doença, diminuindo
o risco de recidiva locoregional de aproximadamente 20% para menos de 10%.
Nos últimos anos, a abordagem laparoscópica
para a TME tem sido cada vez mais utilizada. Estudos
randomizados têm mostrado a vantagem da via laparoscópica na recuperação pós-operatória e no tempo
de internação quando comparada à via aberta, porém
com resultados oncológicos semelhantes5. A cirurgia
robótica tem sido utilizada para a dissecção do reto
distal com possíveis vantagens relacionadas à preservação dos nervos pélvicos e a uma menor disfunção
urinária e sexual pós-cirúrgica, especialmente nos pacientes obesos do sexo masculino, que apresentam
uma pelve muito estreita. Porém, isso ainda precisa
ser provado em estudos prospectivos e controlados.
os pacientes. São adquiridas sequências de alta resolução pesadas em T2 e sequências funcionais em difusão em múltiplos planos. Além do estadiamento
local, alguns fatores prognósticos que aumentam o
risco de recorrência local e metástases à distância
também são identificados com acurácia satisfatória
pela RM, incluindo o acesso à fáscia mesorretal (margem cirúrgica potencial), invasão vascular venosa
extramural e linfonodos laterais pélvicos. A RM também tem sido utilizada para avaliação de resposta da
terapia neoadjuvante relacionada a downstaging e
downsizing, possibilitando assim uma melhor estratégia cirúrgica6 (Figura 2).
Abordagem oncológica
Figura 1. Excisão total do mesorreto (TME) com
preservação da fáscia mesorretal (holly plane)
Abordagem radiológica
O estadiamento pré-operatório também apresentou significativos avanços. A tomografia computadorizada (TC) com contraste trifásico continua sendo
o método de escolha para o estadiamento de doença
metastática, entretanto, tem pouca definição para a
avaliação do T e do N nos tumores de reto distais. A
seleção adequada dos pacientes para o tratamento
neoadjuvante é baseada principalmente no estadiamento locorregional, naqueles que não tiveram
doença metastática detectada (M0). Estudos mostraram ótima acurácia da RM para o estadiamento local
da doença e consolidaram o método como indispensável para esse fim. O protocolo mais utilizado inclui
um aparelho de alto campo (1,5 ou 3,0 Tesla), com
o paciente em decúbito dorsal, sem a utilização de
qualquer meio de contraste venoso ou luminal, sem
preparo intestinal, apenas com o uso de antiespasmódico endovenoso ou intramuscular imediatamente antes do início do exame. A RM é realizada
com bobina de superfície, que tem acurácia semelhante às bobinas endorretais, sem desconforto para
Historicamente, a combinação de radioterapia
e quimioterapia pós-operatória era usada no sentido de diminuir a recidiva locorregional e melhorar
a sobrevida em tumores de reto localmente avançados. Nas últimas duas décadas, a utilização de radioterapia e quimioterapia neoadjuvantes se tornou
mais popular, principalmente após a publicação do
German Trial em 20047. Atualmente, a terapia
neoadjuvante combinada com a TME se tornou o
principal tratamento para os pacientes com adenocarcinoma de reto localmente avançado (estágios
TNM II e III). O protocolo mais utilizado é chamado de long-term, com uma dose de 50,4Gy em
aplicações fracionadas durante cinco semanas associado à quimioterapia com 5-fluouracil na primeira
e quinta semanas, seguido de cirurgia radical após
oito semanas do término da neoadjuvância. Entretanto, existe uma tendência nos últimos anos de
prolongar esse intervalo para até 12 semanas no
sentido de aumentar os índices de downstaging e
resposta patológica completa (pCR). A espera cirúrgica mais prolongada nos pacientes respondedores
parece não estar associada a uma maior morbidade
operatória possivelmente causada pelos efeitos
adversos da radioterapia.
A resposta tumoral à radioterapia tem surgido
como um importante fator prognóstico em relação
a controle local e sobrevida. A terapia neoadjuvante
é capaz de proporcionar uma significativa resposta
com downstaging em uma grande parcela dos tumores (Figura 3). Até 20% dos pacientes respondedores à neoadjuvância podem apresentar pCR pós
ressecção do reto.
Estudos randomizados têm mostrado
a vantagem da via
laparoscópica na
recuperação
pós-operatória e no
tempo de internação
quando comparada
à via aberta, porém
com resultados
oncológicos
semelhantes
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
37
Alguns pacientes irão desenvolver o que
chamamos de resposta clínica completa, definida como o desaparecimento da lesão, tanto
no exame físico como no exame endoscópico e
de imagem.
O grupo de São Paulo da doutora Angelita
Haarb-Gama tem proposto o tratamento não
cirúrgico desses pacientes, chamado de Watch
and Wait8. Essa modalidade de tratamento
ainda é controversa, uma vez que ainda não
temos instrumentos com acurácia necessária
para definir quais pacientes com resposta clínica completa apresentam real pCR e estariam
curados sem cirurgia radical, com preservação
do ânus e do reto. É provável que uma combinação de marcadores radiológicos, bioquímicos e relacionados à biologia molecular seja
necessária para avaliar com acurácia os pacientes que de fato tiveram pCR sem necessitar de
cirurgia para confirmação anatomopatológica.
A abordagem por via transanal de tumores
tem sido estudada como opção à cirurgia radical
nos tumores estágio TNM I, especialmente
T2N0, candidatos a RAP, com resposta quase
completa a neoadjuvância e/ou com elevado
risco cirúrgico. Nesses casos, uma ressecção
transanal envolvendo toda a parede do reto até
a gordura periretal é realizada com auxílio de
CO2 (pneumorreto) utilizando diferentes plataformas como o TEM, TEO ou TAMIS, buscando
a preservação do reto e do ânus9.
Conclusão
Recentemente, diversos avanços foram alcançados no tratamento do câncer de reto distal
envolvendo diversas áreas da medicina. Um
time multidisciplinar composto de médicos especializados em cirurgia colorretal, oncologia
clínica, radioterapia e patologia deve ser reunido para customizar as decisões de modo a
atender da melhor forma possível a necessidade
dos pacientes e melhorar os resultados oncológicos tanto de recidiva local quanto de sobrevida relacionada ao câncer.
Figura 2. Ressonância magnética pré e
pós-neoadjuvância mostrando resposta
do tumor significativa
Referências bibliográficas:
1. Haggar FA, Boushey RP. Colorectal Cancer Epidemiology: Incidence, Mortality, Survival, and Risk Factors.
Figura 3. Resposta pós-radioterapia e
quimioterapia neoadjuvante. Lesão
ulcerada na peça cirúrgica após nove
semanas do término da neoadjuvância
38
Clinics in Colon and Rectal Surgery. 2009;22(4):191-197
Revista Brasileira de Cancerologia 2014; 60(1): 63.
2. http://www.inca.gov.br/wcm/dncc/2015/por-tipos.asp
3. Heald RJ, Moran BJ, Ryall RD, Sexton R, MacFarlane JK. Rectal cancer: the Basingstoke experience of total
mesorectal excision, 1978-1997. Arch Surg. 1998 Aug;133(8):894-9.
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Virchows Arch. 2014 Feb;464(2):129-34.
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neoadjuvant chemoradiotherapy and local excision (ACOSOG Z6041): results of an open-label, single-arm,
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dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
políticas de saúde
Pesquisa reforça associação
entre alimentos processados
e câncer
Relatório da OMS sugere ligação entre a maior incidência de
alguns tipos de câncer à ingestão de alimentos embutidos,
como salsicha, presunto, linguiça, entre outros
Por Ana Gonçalves
A
ASSOCIAÇÃO ENTRE O CONSUMO DE ALGUNS TIPOS DE ALIMENTO E A
CRESCENTE INCIDÊNCIA DE CÂNCER NA POPULAÇÃO JÁ É BASTANTE
COnhecida. Mas um estudo recente, divulgado em outubro
pela Organização Mundial de Saúde (OMS), recoloca o tema no centro
do debate e reforça a necessidade de discutir a possibilidade de impor
limites para a indústria de alimentos em relação ao uso de conservantes e outros aditivos potencialmente cancerígenos, além de encontrar
as maneiras mais eficazes de alertar a população sobre os riscos envolvidos na manutenção de hábitos alimentares pouco saudáveis.
O relatório da OMS associa alguns tipos de câncer à ingestão de alimentos processados, também conhecidos como embutidos. Além de
bacon, salsicha, presunto, linguiça, entre outros, a pesquisa apontou a
carne vermelha, incluindo as de porco, bode, cavalo e partes do boi,
como um dos produtos com provável risco carcinogênico. As evidências
partiram de um estudo realizado por mais de 20 anos pela Agência Internacional de Pesquisa do Câncer (IARC), um instituto vinculado à
OMS que associou mais de 12 tipos de câncer, especialmente o colorretal, ao consumo de alimentos processados e de carnes vermelhas em países com dietas distintas.
Os alimentos embutidos, classificados por conterem sal e outros
produtos que realçam o sabor e elevam o tempo de conservação,
foram inseridos no Grupo 1 dos carcinogênicos, nocivos à saúde humana, onde também estão elencados tabaco, amianto, fumaça de diesel, entre mais de 100 outros componentes avaliados. O relatório
evidenciou que, a cada 50 gramas de carne processada ingerida por
dia, o risco de câncer colorretal aumenta em 18%.
40
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
A oncologista e coordenadora do Grupo de Tumores Gastrointestinais Oncologia D’Or, Maria de Lourdes Lopes de Oliveira, ao avaliar a
publicação da IARC, explicou que os alimentos embutidos, consumidos
isoladamente, não são fator determinante para o desencadeamento da
doença. “Trata-se de uma questão multifatorial,
onde o indivíduo precisa, além da alta ingestão desses alimentos, ter predisposição genética associada
à dieta e aos demais fatores ambientais, como obesidade, sedentarismo, tabagismo, entre outros componentes facilitadores para o desencadeamento do
câncer”, explica.
Para a especialista, o estudo da OMS deve ser
avaliado com cautela, uma vez que as afirmações
pontuadas devem levar em consideração a população e a realidade a qual ela se aplica. “Se observarmos a cultura alimentar dos americanos, por
exemplo, percebemos uma dieta excessivamente
rica em embutidos ao longo do dia, o que não condiz com os hábitos alimentares dos brasileiros, de
uma maneira geral. Da mesma forma que a população oriental tem uma incidência maior de câncer
de estômago, por consumir muitos alimentos defumados, o que não é nossa realidade. Sabemos que
existem, cada vez mais, características próprias dos
tipos de câncer para cada população e nunca devemos radicalizar nas dietas – nem para menos, nem
para mais. É preciso haver um equilíbrio”, esclarece
Maria de Lourdes.
Além dos processados, explica a especialista,
existem outros alimentos com alta carga de conser-
vantes (nitritos e nitratos), como o leite e a própria
água conservada em garrafinhas plásticas. ”A incidência maior está associada, geralmente, à ingesta
dos alimentos processados. Mas tudo que leva conservante apresenta, na verdade, um risco se consumido excessivamente.”
Sobre a inserção dos alimentos processados
no Grupo 1 dos carcinogênicos, Maria de Lourdes
explica que, quando consumidos em pequena
quantidade, eles não levam a um aumento do
risco de câncer, se comparados ao tabaco, enquadrado na mesma categoria. “Esses alimentos estão
todos incluídos no Grupo 1 dos carcinogênicos,
mas, se correlacionarmos o câncer a essas substâncias causadoras, o tabaco fica muito superior
aos embutidos, embora estejam todos incluídos
no mesmo grupo.”
A nutricionista oncológica Geórgia Silveira de
Oliveira Bentes, especialista em terapia enteral e parenteral e membro da Sociedade Brasileira de Nutrição Oncológica, classifica o estudo de metanálise
relevante e impactante ao considerar o perfil agressivo que a indústria alimentícia adotou nas últimas
quatro décadas em relação à conservação dos alimentos. “O processamento a vácuo e de esterilização, através da inclusão dos aditivos para não haver
perda e contaminação, agregou aos consumidores
um preço a se pagar no que diz respeito à saúde.
Hoje, os embutidos estão presentes na mesa de
todas as classes econômicas, e todos acabam adquirindo o mesmo potencial de risco”, salientou.
Em relação à necessidade da suspensão dos embutidos na dieta alimentar, a nutricionista ressalta
que, para proibir esses alimentos, antes teriam de
ser proibidos também o consumo de álcool e cigarro, o que não é o caso. “O estudo é bem claro.
Ele não revela que esses alimentos levam ao diagnóstico de câncer independentemente da proporção
ingerida. Pessoas que não foram acometidas pela
doença certamente se beneficiarão desse estudo, entrando na linha da prevenção”, pondera. “Se a pessoa come uma fatia de bacon ou uma salsicha por
semana, por exemplo, isso não vai gerar o aumento
de câncer, desde que ela equilibre sua dieta com alimentos protetores ricos em fibras, vegetais, legumes,
frutas e peixe, melhorando o trânsito intestinal”,
completa Maria de Lourdes.
Além dos processados, existem outros
alimentos com
alta carga de
conservantes
(nitritos e nitratos),
como o leite e a
própria água
conservada em
garrafinhas plásticas
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
41
Ingestão de carne vermelha
Embora os
dados científicos
demonstrem uma
associação positiva
entre o consumo do
produto e o desenvolvimento de
câncer colorretal,
não é possível
descartar outras
explicações para
os resultados
observados
(ex. fatores confundidores, vieses)
A carne vermelha também foi incluída no estudo, que associou o seu consumo à incidência de
alguns tipos de câncer, em especial o colorretal.
Mas, apesar de ser fonte de gordura saturada e contribuir para o aumento do colesterol, é um alimento
que contém aminoácidos essenciais para o organismo, para o fortalecimento do sistema imunológico e para a construção muscular. Além disso,
contém ferro – mineral que compõe a hemoglobina,
de suma importância para o transporte de oxigênio
aos tecidos, zinco para o sistema imunológico e vitaminas do complexo B, que participa da formação
de células vermelhas e davmanutenção do sistema
nervoso central.
De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), existem diferenças no tipo
e na qualidade das evidências científicas revisadas
para as carnes vermelhas e para as processadas.
Para a carne vermelha, a classificação proposta
pela IARC é de provável risco carcinogênico
42
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
(Grupo 2). Isso significa que, embora os dados
científicos demonstrem uma associação positiva
entre o consumo do produto e o desenvolvimento
de câncer colorretal, não é possível descartar outras explicações para os resultados observados
(ex. fatores confundidores, vieses). Já para as carnes processadas a evidência disponível é considerada convincente (Grupo 1), ou seja, não existem
dúvidas de que as carnes processadas são carcinogênicas.
Para a agência, cabe destacar que os resultados
do relatório da IARC acrescentam novos dados aos
achados publicados no relatório da OMS de 2003
(Diet, nutrition and the prevention of chronic diseases), que apontaram para uma relação provável
entre o consumo de carnes processadas e o câncer
colorretal.
Adicionalmente, esses resultados corroboram as
recomendações da 2ª edição do Guia Alimentar
para a População Brasileira, do Ministério da Saúde
(http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/publicacoes/guia_alimentar_populacao_brasileira.pdf):
(a) limitar o uso de alimentos processados; (b) evitar o consumo de alimentos ultraprocessados; (c)
reduzir o consumo de carnes vermelhas (que são
excessivamente consumidas no país), substituindoas por carnes de frango, peixes, ovos e legumes.
Portanto, a Anvisa reforça as recomendações do Ministério da Saúde publicadas na 2ª edição do Guia
Alimentar para a População Brasileira.
Geórgia lembra que, hoje, os animais são alimentados com rações contendo organismos geneticamente modificados – os transgênicos,
identificando na carne vermelha um alto nível de
glifosato – herbicida presente na ração dos animais.
“Não é pela transgenia que se tem o perigo ao ingerir esses alimentos, mas pelo glifosato, que tem o
potencial carcinogênico. A preocupação da ingestão
de carne vermelha está associada ao teor de gordura
saturada, que pode sim aumentar alguns tipos de
câncer gástrico, próstata, pâncreas e de trato de reto
e intestino. Mas, nesse estudo, foi citado o glifosato”, completou.
Regulação
No que se refere à regulação do limite para o uso dos conservantes nos alimentos, o relatório
da IARC não identifica os fatores presentes nas carnes vermelhas e processadas que seriam responsáveis pelos efeitos observados, o que dificulta a adoção de medidas específicas para esses produtos, informa a Anvisa. “De toda forma, a fiscalização e a regulação da produção das carnes
vermelhas e das carnes processadas é de competência do Ministério da Agricultura, Pecuária e
Abastecimento. A Anvisa possui competência para regulamentar o uso de aditivos utilizados nesses
produtos e também os limites máximos de contaminantes.”
Para isso, a Agência baseia-se na avaliação do Join Expert Committee for Food Additives
(JECFA), um comitê científico internacional de especialistas administrado pela Food and Agriculture Organization (FAO) e pela OMS. O JECFA se reúne desde 1956 e realiza a avaliação do risco
associado ao consumo de aditivos alimentares, contaminantes, toxinas de ocorrência natural e resíduos de medicamentos veterinários em alimentos, assessorando o Codex Alimentarius, que é
um fórum internacional de normatização do comércio de alimentos estabelecido pela ONU em
suas decisões”, esclarece a Agência.
O Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS), composto pela Anvisa, pelas Vigilâncias
Sanitárias Estaduais, Municipais e do Distrito Federal, é responsável por realizar o monitoramento
desses produtos. Dentro do Programa de Monitoramento de Aditivos e Contaminantes (PROMAC)
são monitorados os aditivos nitrito e nitrato de sódio ou potássio e corantes artificiais e naturais
em carnes processadas. Em caso de resultados insatisfatórios, as vigilâncias locais realizam as ações
sanitárias para penalidades e recolhimentos.
Existe amplo consenso científico e no âmbito de políticas públicas nacionais e internacionais
de que o enfrentamento dessas doenças requer a adoção de diversas medidas que sejam capazes
de modificar favoravelmente o sistema alimentar, o ambiente e as informações disponíveis ao consumidor. O consumidor precisa ser educado e motivado a fazer escolhas corretas para obter uma
alimentação equilibrada.
Dentro do Programa
de Monitoramento
de Aditivos e
Contaminantes
(PROMAC) são
monitorados os
aditivos nitrito
e nitrato de sódio
ou potássio e
corantes artificiais
e naturais em carnes
processadas
http://scienceblog.cancerresearchuk.org/2015/10/26/processed-meat-and-cancer-what-you-need-to-know/
Imagens disponibilizadas pela Dra. Maria de Lordes Lopes de Oliveira.
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
43
curtas
A FDA aprovou, nos Estados Unidos, as cápsulas
de ixazomibe, o primeiro inibidor de proteassoma administrado semanalmente por via oral, indicado, em
associação com lenalidomida e dexametasona, para o
tratamento de pacientes com mieloma múltiplo que receberam pelo menos um tratamento anterior. A Solicitação de Aprovação de Novo Fármaco foi submetida
pela Takeda, fabricante do fármaco, à FDA em julho de
2015 e, em setembro, o medicamento recebeu o status
de revisão prioritária. A ixazomibe ainda não está aprovada para uso no Brasil, mas em breve será submetido
para avaliação da Anvisa.
iStockphotos
Droga para tratamento oral
do mieloma múltiplo é
aprovada
FDA concede designação de “terapia
inovadora” para avelumabe
A agência reguladora americana FDA
(Food and Drug Administration) concedeu à
droga avelumabe, anticorpo monoclonal antiPD-L1 IgG1, desenvolvido pela aliança entre
Merck e Pfizer, a designação de “terapia inovadora” para o tratamento de pacientes com carcinoma metastático de células de Merkel (CCM), cuja doença tenha progredido após pelo menos
um ciclo de quimioterapia. A designação é utilizada para acelerar o desenvolvimento e a avaliação de medicamentos. O CCM é um tipo raro e agressivo de câncer de pele. Atualmente não existe nenhuma terapia aprovada
especificamente para o tratamento da doença no estágio metastático. A designação de “terapia inovadora” baseia-se na avaliação preliminar dos dados
clínicos do estudo global de fase II, JAVELIN Merkel 200, que analisa a segurança e a eficácia de avelumabe em pacientes com CCM metastático cuja
doença tenha progredido após pelo menos um ciclo de quimioterapia. Os
resultados desse estudo de fase II devem ser apresentados nos próximos
congressos de 2016.
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
45
Grupo Oncologia D’Or apresenta
experiências do sistema Lean
Representantes do Instituto de Oncologia do Vale (IOV) e do
Grupo Acreditar, clínicas pertencentes ao Grupo Oncologia D’Or,
estiveram em São Paulo, em dezembro, partilhando suas experiências e resultados na segunda edição do Lean Summit Saúde – um
evento promovido pelo Lean Institute, que teve por finalidade
avançar na aplicação do conhecimento do sistema pelas organizações de assistência à saúde no Brasil.
Para detalhar o sistema no setor de oncologia, seus desafios e
oportunidades, estiveram presentes no evento os especialistas
Carlos Frederico Pinto (diretor executivo do IOV) Edivaldo Bazílio
dos Santos (diretor Assistencial e de Qualidade do IOV), Stela
Maris Antunes Coelho (gerente de Lean Office do IOV), entre outros. O projeto A3 “Fluxo de Radioterapia Quinta D’Or” foi selecionado entre os 10 melhores projetos, em nível nacional, para ser
apresentado no encontro. O IOV representa, hoje, a experiência
mais consistente desse sistema na saúde no Brasil, originado na
linha de montagem da Toyota, sendo reconhecido internacionalmente por sua excelência técnica e gerencial, resultado de um esforço permanente para desenvolver processos e pessoas.
Divulgação
Tratamento humanizado
Durante o tratamento
contra o câncer, o paciente
pode sentir uma mistura
de sentimentos capazes de
deixá-lo sob forte estresse.
Nesse momento tão delicado, o tratamento humanizado é capaz de proporcionar bem-estar e tranquilidade. Foi pensando nisso que a Unidade Sorocaba do Grupo Oncologia D’Or, localizada em Botafogo,
Rio de Janeiro, proporciona desde meados de 2015 a prática da
Yoga. O projeto, que conta com o apoio do Instituto Hermógenes,
é capaz de reduzir o estresse, melhorar a qualidade de vida, fortalecer o sistema de defesa do próprio organismo e, ainda, melhorar a capacidade respiratória. A atividade acontece todas as terças
– exceto feriados – das 8 às 11 horas.
46
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
Divulgação
curtas D’Or
Rio ganha primeiro
centro multidisciplinar de
atendimento oncológico
O Rio de Janeiro conta agora com o primeiro centro de oncologia com atendimento multidisciplinar,
integrado ao Hospital Quinta D´Or. Os cariocas
podem consultar todos os especialistas que compõem
a junta médica em um só lugar em vez de percorrer
diferentes clínicas. É uma forma de facilitar a vida dos
pacientes e de garantir o atendimento humanizado e
especializado necessário para o diagnóstico e tratamento do câncer. O Centro de Oncologia do Quinta
D´Or ampliou sua atuação para todas as áreas da oncologia e possui equipes especializadas no acompanhamento gastrointestinal, de tórax, próstata, transplante de medula óssea, entre outros, contando com
cirurgiões oncológicos, oncologistas clínicos, hematologistas, hepatologistas, radiologistas intervencionistas, nutricionistas, fisioterapeutas, psicólogos e outros
profissionais. O projeto é pioneiro no estado do Rio
de Janeiro. “Estruturamos o Centro de Oncologia do
Hospital Quinta D´Or sobre os pilares de alta tecnologia e especialização, presentes nos melhores centros
de tratamento oncológico do mundo. Estamos muito
orgulhosos de poder oferecer isso aos pacientes do Rio
de Janeiro”, afirma o diretor institucional do Grupo
Oncologia D´Or, Carlos Gil. Para a criação do centro
multidisciplinar no Rio, foram investidos R$ 30 milhões em infraestrutura e equipamentos de ponta.
palavra do gestor
Atualização profissional constante
O
MUNDO MODERNO EXIGE DO PROFISSIONAL
DE SAÚDE O DESENVOLVIMENTO DE NOVAS
HABILIDADES E A RECICLAGEM CONTÍNUA DO
Rodrigo Abreu e Lima
Diretor executivo da
Oncologia D’Or
Contato:
[email protected]
conhecimento. A educação continuada é uma das
pedras fundamentais do Grupo Oncologia D’Or
para o desenvolvimento e aperfeiçoamento dos
profissionais de saúde e colaboradores. Na medicina, há necessidade de fazer com que o médico
esteja sempre à frente das descobertas e novidades.
Pensando nisso promovemos, anualmente,
ações que corroboram com essa prática de atualização constante da equipe. Criamos uma agenda
de eventos e firmamos grandes parcerias com nossos fornecedores, que possibilitam acesso ao que
há de mais atual em termos de informação e pesquisa, não só em oncologia como nas demais especialidades médicas.
Exemplo disso é o Congresso Internacional
Oncologia D’Or, iniciativa de sucesso que vem se
tornando ferramenta essencial de integração e
atualização do corpo médico, da equipe multidisciplinar, do próprio grupo gestor e colaboradores
de todas as unidades.
Em sua terceira edição, realizada em novembro de 2015, mais de R$1 milhão foram investidos. Os módulos de especialidades passaram de
seis para 12 e houve um salto expressivo no número de inscritos, que passou de 523 para mais
de dois mil desde a primeira edição, em 2013.
Foram 165 convidados, entre especialistas do
grupo e de instituições nacionais, e 11 especialistas internacionais.
Como novidade, incluímos na programação do
evento o módulo ‘Gestão em Saúde’, trazendo profissionais não só do grupo Oncologia D’Or como
representantes dos planos de saúde e de toda a cadeia de fornecedores para discutirem as melhores
práticas referentes ao tema e a busca de soluções.
Incluímos, ainda, o I Congresso Multidisciplinar Oncologia D’Or, ratificando a importância de
fomentar a educação continuada também para os
profissionais de enfermagem, farmácia e psicologia do Grupo. O módulo ‘Saúde e Mídia’, outra
novidade na última edição do Congresso, possibilitou um bate-papo entre especialistas e jornalistas, esclarecendo temas em oncologia que são
destaques na grande imprensa.
Além do Congresso Internacional realizamos
simpósios, que visam integrar nosso corpo clínico
nacional, espalhado pelas 32 clínicas da Oncologia D’Or em todo o Brasil.
Conduzidos pelos pilares da educação continuada, assistência e pesquisa, que devem nortear as ações de uma instituição de saúde de
vanguarda, firmamos parceria com o Instituto
D’Or Pesquisa e Ensino (IDOR), da Rede D’Or,
para efetiva participação nos estudos e avanços
científicos na saúde, seja por meio de pesquisas
clínicas, básicas ou transnacional. Essa associação possibilitará, em alguns casos, acesso do
paciente a medicamentos promissores que estejam sendo testados, em diversos níveis aqui e
no exterior.
A Revista Onco& é outro exemplo do empenho
da Oncologia D’Or para manter seu corpo clínico
– e os médicos em geral – atualizados com as novidades em termos de diagnóstico e tratamento
das diversas neoplasias. Promove com isto, além
da atualização dos profissionais, o debate entre especialistas do próprio grupo e médicos parceiros
de outras especialidades, essencial para perseguir
o melhor tratamento para seus pacientes.
Para este ano, já planejamos nosso calendário
de eventos científicos, além de continuar incentivando a participação de nosso corpo clínico nos
grandes congressos nacionais e internacionais. O
trabalho é manter o foco na busca pela informação,
indispensável para que nossos pacientes tenham
acesso aos melhores tratamentos disponíveis na
atualidade.
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
47
apoio
Biossimilares trazem
tecnologia e tratamento
ao alcance de todos
N
A VANGUARDA TECNOLÓGICA DO SETOR FARMACÊUTICO,
MEDICAMENTOS AMPLIAM O ACESSO E REDUZEM AS DES-
divulgação: Hospira
PESAS DE SISTEMAS DE SAÚDE AO REDOR DO MUNDO.
48
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
Considerados a maior fonte de inovação e pesquisas
do mercado farmacêutico no mundo, os medicamentos
biológicos há década, vêm evoluindo e salvando vidas.
Grande parte das frentes de pesquisa nesse segmento está
direcionada para o tratamento de doenças crônicas como
diabetes, hepatite, artrite reumatoide, câncer e patologias
agudas como infarto do miocárdio, derrames e tromboembolismos. No entanto, todo esse avanço tecnológico
e científico traz um alto valor de desenvolvimento, onerando consideravelmente os sistemas público e privado
de saúde.
Para ampliar o acesso a essas terapias consideradas mais
eficientes e modernas, porém mais caras, algumas companhias passaram a desenvolver os chamados medicamentos
biossimilares – versões altamente similares aos medicamentos biológicos que apresentam a mesma segurança e eficácia
comprovada dos medicamentos de referência, a Hospira é
pioneira e líder global desse segmento.
Essa nova classe de medicamentos já está aprovada
por diversos órgãos reguladores de países como Austrália, Estados Unidos, Brasil e União Europeia, permitindo
maior acesso dos pacientes a esse importante tipo de medicamento. Para justificar os altos investimentos em biossimilares e utilizar todo o seu potencial, as agências
reguladoras precisam manter o apoio aos processos de
extrapolação.
“A extrapolação é um processo utilizado na aprovação de um medicamento biossimilar que
permite tratar o mesmo universo de doenças que o biológico de referência. Ela é baseada em uma
totalidade de evidências produzidas por meio de análises rigorosas em laboratório e pesquisas
clínicas, demonstrando que o biossimilar apresenta estrutura e função altamente semelhantes ao
biológico de referência”, acrescenta o diretor médico da Hospira do Brasil, Sérgio Teixeira.
“Essas pesquisas analíticas devem ser extensivas, mas é importante lembrar que, no caso
do Biossimilar, não existe nenhuma justificativa científica para exigir ensaios clínicos desnecessários para cada indicação de tratamento aprovada para o produto de referência, fato que
aumenta os custos envolvidos sem qualquer necessidade, completa Teixeira.
Remsima é o primeiro medicamento biológico aprovado pelo regulador brasileiro, a Anvisa,
pela via de comparabilidade. O estudo de comparabilidade é necessário porque, de acordo com
as regras previstas na resolução normativa RDC 55/2010 da Anvisa, a biossimilaridade precisa
ser comprovada por comparação direta com o produto biológico de referência (os produtos devem
ser comparados em um mesmo estudo clínico e usando os mesmos procedimentos).
Em um estudo de fase III envolvendo 606 pacientes, o Remsima atingiu seu principal objetivo de equivalência terapêutica com o medicamento originador. O estudo demonstrou que,
após 30 semanas de tratamento, 73,4% dos pacientes que receberam Remsima conseguiram
uma melhora maior ou igual a 20% nos sintomas de artrite reumatoide em comparação com
69,7% dos tratados com o medicamento originador (informações baseadas nos critérios da
American College of Rheumatology). Ainda dentro do mesmo estudo, 42,3% dos pacientes do
grupo que recebeu Remsima apresentaram melhora dos sintomas de artrite reumatoide maior
ou igual a 50% comparativamente com 40,6% dos tratados com o medicamento originador. O
perfil de segurança e tolerabilidade também demonstrou equivalência de Remsima para o medicamento originador (informações também baseadas nos critérios da American College of
Rheumatology).
“O pacote robusto de análises comparativas entre Remsima e o medicamento originador,
comprovando a eficácia e a segurança do biossimilar infliximabe no tratamento da artrite reumatoide e também com dados de suporte em espondilite anquilosante, nos habilitou a usar o
conceito de extrapolação e receber a aprovação da Anvisa para usar o biossimilar Remsima no
tratamento para todas as indicações do produto referência, sem a necessidade de testes clínicos
adicionais”, explica o diretor médico da Hospira do Brasil, Sérgio Teixeira.
“Remsima
é o primeiro
medicamento
biológico aprovado
pelo regulador
brasileiro, a Anvisa,
pela via de
comparabilidade.”
Este material obteve suporte e apoio de Hospira – dezembro/2015
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
49
do bem
Câncer ocupacional ainda é
assunto ignorado no Brasil
Boa qualidade do ar no trabalho é fundamental para prevenir
neoplasias; contato com agentes químicos pode ocasionar
cânceres de pulmão, bexiga, mesotelioma e outros
Por Viviane Santos
O
CÂNCER OCUPACIONAL, PROVOCADO PELO CON-
TATO PROLONGADO DE SUBSTÂNCIAS QUÍMICAS
NO AMBIENTE DE TRABALHO, É SUBNOTIFICADO
no Brasil. A situação reflete em investimentos deficitários na prevenção, descaso dos
profissionais de saúde e dificuldades
para o Ministério do Trabalho e Previdência Social (MTPS) fiscalizar irregularidades nas indústrias.
“Os trabalhadores não têm noção
de que a exposição a determinados
agentes químicos pode ocasionar tumores malignos e quadros de intoxicação”, avalia a epidemiologista
Ubirani Barros Otero, chefe da área de
Exposição Ocupacional, Ambiental e
Câncer do Instituto Nacional de Câncer (Inca). Por outro lado, ela diz que
algumas indústrias minimizam o problema ao informar aos funcionários
que as substâncias não são tóxicas.
A dirigente do Inca conta que a
absorção dérmica e respiratória de
produtos químicos, a longo prazo,
pode ocasionar náusea, vômito, dor
de cabeça, doenças crônicas respiratórias graves e outros sintomas pouco
específicos. Por isso, é comum o médico informar diagnóstico errado ou
não associar a neoplasia ao câncer
ocupacional.
50
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
Ela afirma que os médicos e os profissionais de
saúde não perguntam ao paciente se ele lida com
substância química no trabalho. Sendo assim, o
Inca não recebe informações para registrar casos de
câncer ocupacional no Brasil. Para mudar essa informação, o órgão federal pretende, em 2016, capacitar peritos médicos brasileiros e divulgar
publicações como “Diretrizes para a Vigilância do
Câncer Relacionado ao Trabalho”, lançada pelo Inca
em 2012.
Principais tumores
De acordo com a Organização Mundial de
Saúde (OMS), os tumores malignos de pulmão, bexiga e mesotelioma são os mais frequentemente relacionados às atividades profissionais. De acordo
com estudos internacionais de 1981, Ubirani estima que em 2015 os casos de câncer ocupacional
cheguem a mais de 20 mil no Brasil.
Maria Del Pilar Estevez Diz, coordenadora da
oncologia clínica do Instituto do Câncer do Estado
de São Paulo (Icesp), lembra a alta incidência de
câncer de pele no Brasil, mais presente em pessoas
de pele, cabelos e olhos claros que não se protegem
adequadamente da exposição solar.
Agricultores, profissionais da construção civil,
de portos e praias, carregadores e ambulantes têm
contato diário com o sol e podem não perceber o
risco à saúde, frisa a médica. A discussão sobre câncer ocupacional chamou sua atenção quanto à necessidade de começar a indagar aos pacientes sua
profissão e risco ocupacional para iniciar levantamento.
A OMS informa que os tumores hematológicos
surgem, entre o contato com as substâncias tóxicas até a manifestação da doença, de 1,5 a 15 anos
depois. Já os tumores sólidos aparecem em até 20
após a exposição a agentes cancerígenos. A dirigente do Inca diz que o diagnóstico de mesotelioma, tumor raro e agressivo que atinge pulmão
e outros órgãos, pode ser feito até 30 anos ou mais
após desligamento da indústria ou afastamento da
área de risco.
Criar alternativas
“A qualidade do ar no ambiente de trabalho é
fundamental para prevenir neoplasias. Se o local estiver impregnado de agentes químicos, aumenta o
risco de câncer e de outras doenças crônicas respiratórias graves”, ressalta a especialista do Inca. Ela
frisa que não há limite seguro de exposição. Por
isso, sugere que universidades e indústrias invistam
em tecnologias para criar outras substâncias semelhantes em substituição às tóxicas.
Normas regulamentadoras (NR) de segurança
e saúde no trabalho do MTPS existem para prevenir doenças ocupacionais. Há regras para agentes
carcinogênicos como asbesto ou amianto (causador da mesotelioma), benzeno (leucemias), entre
outros. Em 2014, foi criada a portaria 9, de 7 de
outubro, do MTPS e Ministério da Saúde, que estabelece a lista nacional dos agentes cancerígenos
para humanos.
Entre as substâncias relacionadas, destaque para
produção de alumínio, arsênio e seus compostos
inorgânicos, todas as formas de amianto, benzeno,
indústria de transformação da borracha, compostos
de cromo e de níquel, exaustão de motor diesel, formaldeído, poeiras de couro e de madeira, poluição
do ar, radiação e outros. “A partir desse reconhecimento, espera-se aumentar a discussão sobre o
tema e fomentar a prevenção”, anseia Jeferson Seidler, coordenador-geral de Fiscalização e Projetos
do Departamento de Segurança e Saúde no Trabalho, ligado ao MTPS.
“Controle capenga”
Na opinião da dirigente do Inca, “o controle de
agentes químicos é capenga no Brasil”. O amianto,
por exemplo, que é proibido em mais de 50 países
do mundo, ainda é usado no país. Ela considera a
discussão desse assunto muito importante, pois a
população precisa de informação.
O dirigente do MTPS esclarece que a utilização
de todas as formas de amianto/asbesto é proibida
no Brasil, com exceção do uso controlado do asbesto crisotila (amianto branco, principal tipo da
substância). A engenheira de segurança do trabalho
Fernanda Giannasi, que atuou durante 30 anos na
fiscalização do MTPS em São Paulo e fundou a Associação Brasileira de Expostos ao Amianto (Abrea),
calcula que existem 13 fábricas no país que ainda
usam amianto na produção de telhas e chapas para
divisórias e forros.
O mesotelioma, um dos tumores ocasionados
pelo contato com amianto, pode ser diagnosticado
até 30 anos após o desligamento do trabalho. Fernanda conta que, de 1997 a 2015, milhares de aposentados doentes ingressaram na Justiça, o que
resultou em 4 mil acordos extrajudiciais com a indústria, cujos valores são inferiores aos determinados pelo órgão público.
Mortes no mundo
Apesar de o amianto ser um dos mais conhecidos carcinogênicos do mundo, Fernanda lamenta a
subnotificação nos centros de saúde. De acordo
com a OMS, 125 milhões de trabalhadores no
mundo estão expostos ao amianto e 107 mil funcionários morrem por ano devido a doenças relacionadas a esse contato.
Seidler relata que a indústria é obrigada a identificar e avaliar os riscos da atividade e adotar medidas específicas para cada caso, de acordo com
normas brasileiras e internacionais de risco ocupacional. Entre elas, alterar a organização do trabalho
nos procedimentos, adotar rodízios de trabalhadores para reduzir o tempo de exposição e obrigar o
uso de equipamentos de proteção individual (EPI),
em especial proteção respiratória.
“O objetivo é que a exposição do trabalhador a
cancerígenos seja igual a zero. Não há nível seguro
de exposição. Processos devem ser hermeticamente
fechados, com ventilação exautora ou outras formas
de controle na fonte. Como complemento para aumentar a proteção, deve-se fornecer e exigir o uso
de EPI adequado ao risco, além de treinar o trabalhador sobre o uso correto”, informa o representante do MTPS.
Normas regulamentadoras (NR) de
segurança e saúde
no trabalho do MTPS
existem para
prevenir doenças
ocupacionais.
Há regras para agentes carcinogênicos
como asbesto ou
amianto (causador
da mesotelioma),
benzeno (leucemias),
entre outros
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
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Faltam fiscais
No entanto, na prática, o cumprimento da lei não é plenamente
fiscalizado pela falta de auditores fiscais do trabalho. Em 1996, havia
3,4 mil fiscais no país. Hoje são 2,5 mil, sendo que menos da metade
deles dedica-se à segurança e à saúde no trabalho. O coordenador da
área diz que outros empecilhos são a extensão territorial do Brasil e a
quantidade insuficiente de veículos adequados para chegar a áreas de
difícil acesso. Por isso, ele reconhece que é baixa a qualidade das informações sobre acidentes e doenças do trabalho.
De janeiro a dezembro de 2014 houve 122.098 ações de fiscalização no Brasil em setores econômicos brasileiros. Desse total,
foram contabilizadas 2.329 visitas na indústria química, onde trabalhavam 550.710 pessoas. Os fiscais registraram 1.584 notificações, 2.790 autuações, 66 embargos/interdições e 150 acidentes.
Na indústria de metal, num universo de quase 1,8 milhão de funcionários, foram realizadas 6.269 visitas, que ocasionaram 5.710
notificações, 7.079 autuações, 356 embargos/interdições e 268 acidentes. O infrator recebe multa administrativa. Em caso de risco
grave e iminente, a atividade ou setor de serviço pode ser interditada até adequações.
Melhorar notificação
A fiscalização do trabalho gera prevenção permanente, diz Seidler.
Além disso, a Fundacentro, órgão vinculado ao MTPS, dedica-se à pesquisa em segurança e saúde no trabalho, promove cursos, palestras e
estudos sobre o tema. Ele sugere que as indústrias com risco cancerígeno aproveitem a Semana Interna de Prevenção de Acidentes (Sipat)
para abordar o tema todo ano.
Na sua opinião, é necessário melhorar a identificação e o reconhecimento de casos de câncer ocupacional no Brasil, e desenvolver mais
estudos quanto à exposição a agentes cancerígenos e sua relação com
o trabalho e efetiva prevenção nas indústrias.
Origem da neoplasia ligada ao trabalho
Saiba quais agentes químicos causam neoplasia
Fator ocupacional
Tipo de câncer
Indústria da borracha
bexiga, leucemia, linfoma, pulmão,
estômago
Limpeza de chaminés
pele (escroto), pulmão
Fundição de ferro e aço
pulmão
Pintor
pulmão, mesotelioma, bexiga
Indústria de alumínio
pulmão, bexiga
Soldador
olhos (melanoma)
Amianto (todas as formas)
laringe, pulmão, mesotelioma, ovário
Radiação ionizante
sistema nervoso central, mama, cólon,
rim, leucemia, pulmão, esôfago, glândulas salivares, pele, estômago, tireoide,
bexiga
Radiação ultravioleta
pele
Benzeno
leucemias
Fonte: International Agency for Research on Cancer – IA
52
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
A primeira associação de neoplasia
com a atividade ocupacional foi descrita em 1775 pelo cirurgião inglês
Percival Pott. Ele observou a elevada
frequência de câncer de bolsa escrotal
em limpadores de chaminé. A fuligem
impregnada na chaminé, decorrente
da queima de carvão, continha agentes
cancerígenos (em geral hidrocarbonetos policíclicos), que aderiam à pele
do escroto. Essa absorção foi facilitada
devido à precariedade da higiene pessoal na época. Após longo período de
latência, muitos trabalhadores manifestaram o câncer ocupacional.
(Fonte: Ubiratan de Paula Santos,
pneumologista do Instituto do Coração
– Incor, em São Paulo)
especial ASCO cuidados paliativos
Por Lisiana Szeneszi – [email protected]
Coordenadora do andar de internação de pacientes onco-hematológicos do
Hospital Quinta D’Or, médica clínica da Oncologia D’Or, especialista em
clínica médica pela AMB e pela Sociedade Brasileira de Clínica Médica
H
ISTORICAMENTE, OS CUIDADOS PALIATIVOS FORAM UM EUFEMISMO
PARA CUIDADOS DE FIM DE VIDA.
NO ENTANTO, NAS ÚLTIMAS TRÊS
DÉCADAS FOI INTRODUZIDO O TERMO “CUIDADOS DE SUPORTE”, QUE
coincide com o foco dos cuidados paliativos, que nos dias de hoje têm
por objetivo assistir os doentes oncológicos, trabalhando com o oncologista clínico e uma equipe multiprofissional, para melhorar a qualidade de vida dos pacientes com câncer e seus sintomas, manejo de
toxicidades dos tratamentos oncológicos, e auxiliar também familiares
e cuidadores em seu dia a dia.
Com uma visão multiprofissional (oncologia clínica, cirurgia oncológica, cuidados paliativos, radioterapia, fisioterapia, psicologia, nutrição,
farmácia e outros), o Simpósio de Cuidados Paliativos da ASCO de 2015
– que contou com 675 participantes, entre eles médicos de diferentes especialidades clínicas, cirúrgicas, pesquisadores e demais categorias de
profissionais da saúde, de 34 países – teve seu foco em melhorar o acesso
54
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
dos pacientes aos cuidados paliativos e melhorar a comunicação relacionada à especialidade, com pacientes, familiares e cuidadores.
As sessões orais e também os pôsteres foram subdivididos em grandes áreas: base biológica dos sintomas e manejo e prevenção de toxicidades, cuidados de fim de vida, avaliação e acesso aos sintomas dos
pacientes e qualidade de vida, psico-oncologia, cuidados psicossociais
e espirituais.
Nas primeiras apresentações foi explorado o que há de novo no
controle da dor oncológica, com uma abordagem multidisciplinar.
Foram mostrados uma avaliação eficiente e tratamento da dor por neuropatia periférica pós-quimioterapia. Com esse foco para a dor de origem neuropática, para a qual encontramos maiores dificuldades de
manejo, foram citados os benefícios não só das terapias farmacológicas
e físicas convencionais, mas também o papel da radioterapia como importante recurso e a realização de procedimentos pela radiologia intervencionista como crioablação, bloqueios neurolíticos e/ou axiais,
valiosos para dor refratária a opioides.
Dentro do tratamento de dor, principalmente como manejo da “dor
total”, em uma sessão educacional foram apresentados os tratamentos
complementares, como acupuntura, massagens, musicoterapia, suplementos alimentares, terapias com ervas em oncologia, sem substituir
as terapias convencionais, mas como algo a mais para alívio de sintomas, contribuindo para o bem-estar físico e psicossocial dos pacientes,
sempre com adequada avaliação médica e análise de possíveis interações com a terapia padrão.
A radioterapia, que conta na atualidade com alta tecnologia, com
possibilidades cada vez maiores de personalizar o tratamento nos diferentes tipos de câncer em que tem a correta indicação, e que com
isso traz muito menos efeitos adversos e em alguns casos sem incômodos para o paciente, e com resultados rápidos, foi apresentada neste
Simpósio de Cuidados Paliativos também em muitas outras sessões,
como eficiente no controle de outros sintomas e/ou desconforto do paciente oncológico, mostrando a intercomunicação da tecnologia, a
visão humanitária e a radioterapia paliativa.
Acompanhando os avanços na oncologia personalizada, falou-se a
respeito de cuidados paliativos personalizados, mostrando a importância dos biomarcadores como preditores de toxicidade de tratamentos oncológicos e para a manutenção da qualidade de vida a partir dos
benefícios da farmacogenômica, que nos possibilita saber qual a droga
certa para qual paciente e qual a dose ideal.
Nas sessões relacionadas à área de cuidados de fim de vida, a médica Vicky A. Jackson, do Hospital Geral de Massachusetts, apresentou
a importância da efetiva integração da oncologia com os cuidados paliativos, em um modelo de coparticipação no cuidado em um momento tão delicado tanto para o paciente como para cuidadores e
familiares, e os benefícios em melhorar a qualidade de vida deles.
Também nas sessões de abordagem do controle de sintomas e toxicidades, pelo menos duas apresentações foram sobre o manejo, mais
uma vez multidisciplinar, da caquexia, que é um processo multifatorial
e que não teve progressos em seu tratamento nas últimas duas décadas.
Novas medicações, um derivado sintético oral da Grelina, e um modulador seletivo de receptor androgênico podem mudar essa história,
já que o primeiro mostrou aumento de massa muscular e apetite em
estudos de fase III (ROMANA 1 e 2) em pacientes com anorexia por
câncer de pulmão, e o segundo mostrou redução da perda muscular
relativa, mas questionável, nos estudos fase III (Power 1 e 2) em pacientes também com câncer de pulmão (NSCLC).
Com resultados modestos, mas como uma esperança para novos
futuros estudos, foi apresentado o CALC – Trial com o uso de um inibidor de neurokina (Via NK-1), usado atualmente como potente antiemético, o aprepitant, como antitussígeno em pacientes com câncer
de pulmão.
Falando ainda sobre suporte aos sintomas e toxicidades de tratamentos em oncologia, a ASCO apresentou seu guideline para o uso de
estimuladores de colônias de granulócitos para profilaxia da redução
de neutrófilos e da neutropenia febril, escrito a partir de uma revisão
da literatura científica na área feita de 2005 a 2014.
Outro estudo apresentado (Alliance A221301) foi sobre o uso de
Olanzapina como prevenção de náuseas induzidas por quimioterapia,
que mostrou como conclusão que pode ser usada se associada a um
antagonista do receptor 5-HT3 (aprepitant) e dexametasona, com aumento do controle das náuseas e vômitos agudos e tardios pós-esquemas quimioterápicos altamente emetogênicos.
Com uma visão econômica para evitar desperdícios e/ou terapias
desnecessárias que não tragam benefícios e para melhorar o padrão de
assistência em cuidados paliativos, foi apresentada uma campanha nacional como iniciativa da American Board of Internal Medicine (ABIM)
em parceria com a American Academy of Hospice and Palliative Medicine (AAHPM), que consiste em uma Lista de 5 Boas Práticas, escolhas baseadas em evidência (choosing wisely), em que se recomenda:
1. Não usar cateteres para alimentação enteral em pacientes com demência avançada, estimular sempre a alimentação por via oral. 2. Não
adiar a indicação de cuidados paliativos para pacientes com doenças
graves que tenham qualquer distress físico, social, psicológico e social.
3. Não implantar cardiodesfibriladores em pacientes com doenças irreversíveis ou sem perspectivas de tratamento, se não estiver de acordo
com os objetivos de tratamento do paciente e familiares. 4. Não recomendar mais que dose única de radiação para dor óssea oncológica,
se o paciente tiver expectativa de vida curta, sem outras possibilidades
de tratamento. 5. Não usar medicações tópicas em gel específicas,
como haldol para controle de náuseas, que não tenham real benefício
e levem ao aumento de terapias concomitantes.
Muitas foram as discussões sobre os temas que continuam um
grande desafio para nós médicos, como prognósticos em doenças oncológicas e dificuldades em comunicação de notícias difíceis, com boas
perspectivas com a melhoria do acesso aos cuidados paliativos e com
a implementação de mais ações educativas nessa área.
Uma das apresentações mais importantes foi da ASCO e da
AAHPM, de um Guia de Cuidados Paliativos Primários. As duas organizações fizeram em parceria as recomendações para cuidados paliativos de alta qualidade para os pacientes com câncer. Foi um grande e
importante passo para a disseminação de boas práticas em cuidados
paliativos no mundo.
A partir desse guia, a ASCO recomenda que cuidados paliativos
sejam integrados como rotina aos cuidados oncológicos, precocemente, em todo e qualquer paciente com doença oncológica metastática, ou que tenha sintomas de difícil controle, visando a melhora da
sua qualidade de vida, controle adequado de sintomas e aumento da
satisfação de seus familiares e/ou cuidadores e promovendo maior integração dos cuidados paliativos à oncologia clínica, cirurgia oncológica e radioterapia.
Os cuidados paliativos vêm sendo recomendados pela Organização
Mundial de Saúde (OMS) desde os anos 90, tendo desenvolvimento
lento nesse período, com iniciativas de ações globais de implementações iniciais pela própria OMS. Eles apresentam benefícios quando
iniciados precocemente, com melhora na qualidade de vida e satisfação
de pacientes e familiares, além de redução de mortalidade, já demonstrada em estudos (ENABLE I, II e III). Nos últimos anos estamos vendo
ações mais efetivas como esta da ASCO/AAHPM, além de projetos
como o GAPRI, também americano, para controle adequado da dor,
ou o ATOME, em 12 países da Europa, para maior acesso aos opioides,
e vários outros também para disseminação e educação em cuidados
paliativos, para melhorar o acesso e as boas práticas. Será que uma
nova fase se aproxima? Os cuidados paliativos deixarão de ser vistos
como falta de perspectiva e sim como vida bem vivida em pacientes
com doenças graves?
Onco&
dezembro/janeiro/fevereiro 2016
55
especial ASH 2015
Por Juliane Musacchio – [email protected]
O 57º Congresso da Sociedade Americana de Hematologia (American
Society of Hematology – ASH) ocorreu entre os dias 5 e 8 de dezembro
de 2015, em Orlando, e contou com a participação de mais de 20 mil
médicos de todo o mundo.
Terapia gênica experimental
Novas pesquisas acrescentaram mais evidências de que a terapia
genética, uma técnica experimental que envolve a correção ou substituição de genes mutantes ou de mau funcionamento, pode melhorar
os resultados de pacientes com doenças sanguíneas hereditárias e imunológicas, bem como algumas formas de neoplasias hematológicas.
Os pacientes com doenças hematológicas graves podem não ter alternativas terapêuticas e depender de hemotransfusões ao longo da vida
ou de um transplante de medula óssea. Para esses pacientes, as terapias
gênicas experimentais têm sido uma promessa na melhoria dos resultados e, até mesmo, na cura de doenças com prognósticos sombrios.
Enquanto os esforços anteriores foram associados com toxicidade
e aumento de risco para leucemia aguda associada ao tratamento, pois,
em alguns casos, o tratamento pode ser pior que a doença, alguns médicos hematologistas têm feito grandes progressos na solução desses
56
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
problemas. Como resultado, pelos métodos atuais, foi demonstrada
uma melhoria da segurança e eficácia no tratamento de uma série de
doenças.
Em vários estudos, foi apresentada uma promessa de terapia gênica
continuada de lentivírus, com uma abordagem em que o material genético saudável é entregue a uma célula, através de um vírus não transmissível.
Em um desses trabalhos apresentados, com pacientes com betatalassemia, verificou-se que eles podem se tornar independentes de hemotransfusão, após receberem a terapia gênica lentiviral. Em outros
dois estudos, foi demonstrada a utilização da terapia genética com a
utilização de um vetor lentivírus para reconstruir o sistema imunológico de pacientes que sofrem de duas doenças hematológicas raras:
síndrome de Wiskott-Aldrich e imunodeficiência combinada severa,
também conhecida como “doença do menino da bolha”.
Em outro estudo apresentado, foi realizado o primeiro ensaio clínico com a utilização de células do sistema imunológico do doador
projetadas para prevenirem a progressão de doença oncológica, após
o transplante de células-tronco. Finalmente, em outro estudo, foram
demonstrados resultados promissores com o uso de células imunológicas geneticamente modificadas do próprio paciente para erradicar o
mieloma múltiplo.
Terapia genômica
Sabe-se que as variantes genéticas estão associadas com a gravidade
de doença e as complicações relacionadas ao tratamento em crianças
com doenças onco-hematológicas.
Os recentes avanços tecnológicos na sequenciação do genoma têm
permitido aos pesquisadores descobrir pequenas alterações no DNA,
que estão associadas aos desfechos clínicos específicos ou às características de doença.
Com mais acesso ao grande público, os investigadores tornaramse, cada vez mais, capazes de identificar as variações genômicas que
podem levar às terapias personalizadas destinadas à correção de mu-
tações genéticas ou à prevenção de complicações em populações específicas de alto risco.
Como os diferentes tipos de tratamento que visam às anormalidades moleculares específicas de doenças onco-hematológicas já melhoraram drasticamente os resultados de alguns pacientes, os
pesquisadores continuaram a descobrir pistas genéticas que lançam
luz sobre o risco de recaída, potenciais complicações relacionadas ao
tratamento e a probabilidade de melhora na sobrevida.
Em dois estudos, foram apresentados novos rumos sobre mutações
genéticas em crianças com leucemia linfoblástica aguda (LLA) que indicam maior risco de dano ósseo debilitante associado à quimioterapia.
Em outro estudo, foi examinado o uso potencial de análise genética
em tempo real na personalização dos regimes de quimioterapia para
crianças com LLA-B. Finalmente, os investigadores descobriram variantes genéticas que podem estar associadas ao desenvolvimento de
desordens autoimunes que levam às síndromes hemorrágicas.
Medidas de suporte para doenças onco-hematológicas
Em um estudo foi avaliado o problema comum de crianças com
leucemia linfoblástica aguda (LLA) em remissão, que não aderem corretamente aos regimes de manutenção com medicamentos orais, colocando-se assim em risco de recaída.
Pela primeira vez, foi realizado um ensaio clínico onde se comparou
sangue armazenado por um período de tempo prolongado com o sangue recentemente estocado. Os resultados desse estudo (observados em
crianças com anemia grave em Kampala, Uganda) poderão influenciar
as decisões de política de saúde globais relativas à duração aceitável de
armazenamento de sangue em todo o mundo. Uma vez que foi visto
que não houve diferença relacionada ao tempo em que o sangue permaneceu estocado, as transfusões se tornarão mais acessíveis para os
pacientes que, muitas vezes, não têm acesso aos hemocomponentes.
Dois estudos adicionais foram apresentados para avaliar o problema de eventos tromboembólicos associados ao câncer. Em um desses estudos, foram discutidas as diretrizes sobre a dose de heparina de
baixo peso molecular para evitar a trombocitopenia induzida pela quimioterapia, um evento adverso imunológico relativamente comum.
Em outro ensaio clínico foi verificado que a varfarina não está associada a um aumento de eventos tromboembólicos recorrentes e hemorrágicos graves, quando comparada ao uso contínuo de heparina
de baixo peso molecular. Sendo assim, a varfarina é uma alternativa
aceitável à heparina de baixo peso molecular para os pacientes com
trombose associada à doença oncológica.
Finalmente, em um estudo foram demonstrados os melhores resultados em 30 anos para os pacientes com anemia aplástica grave,
com a adição do eltrombopague, um agonista oral do receptor de trom-
bopoietina, ao regime de tratamento padrão. Foram incluídos 88 pacientes, e o tratamento foi bem tolerado pela maioria deles. Dois pacientes interromperam o eltrombopague por causa de reações cutâneas
graves e seis pacientes se retiraram do estudo antes de seis meses, porque houve progressão de doença ou refratariedade ao tratamento.
Terapias direcionadas para doenças onco-hematológicas
Novas abordagens extremamente específicas para o tratamento de
pacientes com leucemia, linfoma e mieloma múltiplo foram apresentadas nesse congresso, o que representou uma tremenda expansão das
opções de terapia oral e intravenosa para os pacientes com doenças
onco-hematológicas.
As formas de tratamento para as neoplasias hematológicas estão
evoluindo muito rapidamente, assim como as ideias recentes sobre as
assinaturas genéticas de doenças, que continuam a informar o desenvolvimento de terapias específicas e identificar novos usos para aqueles
medicamentos que já estão aprovados.
Essas terapias são mais eficazes e potencialmente mais seguras que
a quimioterapia padrão, já que são proteínas alvo-específicas e produtos de genes mutados, deixando outras células ilesas. Apesar de esses
tipos de tratamento ilustrarem o progresso que os pesquisadores fizeram nos últimos anos, mais opções são necessárias para melhorar os
resultados dos pacientes, e de maneira cada vez mais personalizada.
Em uma das apresentações em sessão plenária, foram mostrados
os resultados de um tratamento promissor para a leucemia mieloide
aguda (LMA), que tem como alvo uma mutação genética específica. A
midostaurina é uma medicação experimental que inibe muitas enzimas, incluindo-se a FLT3 mutada.
Foram analisados 717 pacientes, com idade entre 18 e 60 anos,
com diagnóstico de LMA com mutação em FLT3, que receberam midostaurina (360) ou placebo (357) por via oral, em adição à quimioterapia padrão, além de um ano de tratamento de manutenção com a
nova medicação.
O tempo mediano para qualquer falha em atingir a remissão, recaída ou óbito em pacientes que receberam a midostaurina foi
de oito meses, em comparação com apenas três meses no braço do
tratamento padrão. Foi visto que a quimioterapia padrão com midostaurina melhorou significativamente a sobrevida global mediana
(74,7 meses versus 26,0 meses no grupo que recebeu somente a terapia padrão).
Esses resultados sugerem que a midostaurina melhora os resultados em adultos jovens com LMA que tenham a mutação FLT3, quando
adicionada ao regime de quimioterapia padrão. Esse foi o primeiro estudo genético conduzido em uma doença para a qual não há novos
medicamentos aprovados para uso desde 1990.
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
57
Já outro estudo foi por um caminho inverso: em vez de desenvolver uma terapia que pudesse sugerir um novo alvo, os pesquisadores
“reutilizaram” orituximabe, um agente imunológico anti-CD20 já utilizado para tratar uma variedade de doenças onco-hematológicas, para
o tratamento de pacientes com leucemia linfoblástica aguda de células
B (LLA-B), para melhorar os resultados em adultos, que normalmente
respondem mal ao tratamento.
Foram distribuídos 220 pacientes aleatoriamente para receber quimioterapia com ou sem o rituximabe, com um total de 16 a 18 infusões. Após um seguimento mediano de 30 meses, os pacientes que
receberam rituximabe tiveram uma menor incidência de recaída em
comparação àqueles que não o fizeram (18% no braço do rituximabe
versus 30,5% no grupo controle).
Além disso, 65% dos pacientes no grupo do rituximabe alcançaram
uma sobrevida livre de eventos em dois anos, comparados com 52%
daqueles que não receberam a medicação. Por esse estudo, sugere-se
que a adição de rituximabe à terapia padrão melhora a sobrevida livre
de eventos nos pacientes adultos com LLA-B.
Dois estudos clínicos foram realizados para identificar as melhores
opções terapêuticas para os pacientes com mieloma múltiplo recorrente ou resistente ao tratamento. As duas medicações, ixazomibe e
daratumumabe, receberam a aprovação pelo FDA (Food and Drug Administration) nos Estados Unidos em novembro de 2015, com base
nos novos dados.
Em um desses estudos, foi demonstrada uma taxa de sobrevida
livre de progressão significativamente melhor pela adição de ixazomibe
(20,6 meses versus 14 meses) ao tratamento padrão (lenalidomida e
58
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
dexametasona) para pacientes com mieloma múltiplo em recidiva ou
resistente ao tratamento.
No segundo estudo, em mieloma múltiplo, é oferecida uma abordagem totalmente nova para tratamento com o daratumumabe, uma
terapia-alvo anti-CD38, em combinação com lenalidomida e dexametasona, que representa uma melhoria significativa sobre as opções
atuais para esses pacientes em recidiva ou refratariedade.
Por fim, três estudos tiveram resultados impressionantes com
novas medicações para o tratamento de pacientes com leucemia linfocítica crónica (LLC). Um estudo com ibrutinibe, um inibidor oral da
tirosina quinase de Bruton, em pacientes com LLC/linfoma linfocítico
B não tratados previamente, ressalta a promessa de terapia direcionada
para os pacientes idosos. Os pacientes que receberam ibrutinibe alcançaram uma taxa de sobrevida global em 24 meses de 97,8% versus
85,3% nos pacientes tratados com clorambucil.
Em outro estudo, a combinação de idelalisibe oral com bendamustina e rituximabe (tratamento padrão para LLC em recidiva ou refratariedade) em pacientes com LLC recidivada ou resistente ao
tratamento aumentou drasticamente a sobrevida livre de progressão,
além de aumentar também a sobrevida global.
Por último, mas não menos importante, em um estudo com um
grupo de pacientes com LLC de alto risco com del 17p, foi sugerido
que o venetoclax, uma terapia oral anti-BCL2, melhorou as taxas de
resposta de uma forma que não tinha sido visto antes nessa população
em particular. Nesse estudo de fase II, a taxa de resposta global foi de
79,4%. De todos os respondedores, 84,7% ainda mantiveram a resposta aos 12 meses.
apoio Lado a Lado
Humanizar a saúde e engajar o
homem a cuidar de si mesmo
Divulgação Instituto Lado a Lado
Por Marlene Oliveira
O
Instituto Lado a Lado pela Vida vem trabalhando intensamente desde 2012 no movimento nacional Novembro
Azul com o objetivo de promover uma mudança de paradigmas em relação à ida do homem ao médico para a realização
de exames preventivos. Nossa missão é humanizar a saúde, de
norte a sul do Brasil, através do diálogo, acolhimento e da promoção do bem-estar físico e emocional.
O Novembro Azul é um modelo brasileiro que dialoga com
todos os homens, não importando a região onde residam. E nestes
três anos muitos foram os desafios e as vitórias, mas a lição que
fica e se renova a cada edição é que a saúde do homem não pode
se restringir apenas a próstata.
Orientar sobre o câncer de próstata e a importância da prevenção é sem dúvida, fundamental, afinal, a cada ano são diagnosticados cerca de 69 mil novos casos da doença no Brasil. O reconhecimento da relevância deste trabalho ficou claro durante a homenagem no Senado Federal ao Instituto Lado a Lado pela Vida,
que ocorreu no dia 9 de novembro de 2015, em uma iniciativa da
Senadora Ana Amélia. No entanto, o Instituto entende que o seu
desafio é ainda maior: conscientizar o homem de que a sua saúde
não pode ser pensada apenas sob o ponto de vista da próstata.
Os homens, além do câncer de próstata, são as principais vítimas de doenças cardiovasculares no Brasil, além de mortes causadas por violência, incluindo os acidentes de carro. Por isso, a necessidade premente de orientá-los para que passem a pensar na
sua saúde como um todo.
E para isso, uma mudança de atitude e hábitos há muito arraigados na mente masculina torna-se necessária. Deixar de lado
velhos preconceitos, a ilusão de que se é uma fortaleza, de que a
doença só acontece com os outros e o que é pior, que ir ao médico ou cuidar-se é sinal de fraqueza. Isto não cabe mais nos dias
atuais.
Já está mais do que na hora de todos entendermos que o engajamento da sociedade precisa ser na luta contra as doenças em
geral e não apenas contra o câncer. E esta nova atitude passa por
se evitar os fatores de risco, como o tabagismo, a obesidade, o uso
do álcool e o sedentarismo, incluindo-se o abandono do hábito de
só procurar ajuda médica quando surgem os sinais de doenças.
Até porque, tão fundamental quanto o papel da sociedade
civil organizada na conscientização e dos agentes públicos na
oferta de serviços de saúde está a atitude do cidadão de se cuidar
mais e melhor.
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
59
holofotes
19º Congresso Brasileiro de Oncologia Clínica (SBOC 2015)
SBOC
R
relevante para a troca de experiência entre oncologistas
nacionais e internacionais. O mote desta edição foi
“Oncologia Sem Fronteiras”, reforçando o intuito de fortalecer a interação continental.
ealizado entre os dias 29 de outubro e 1º de
novembro, na cidade de Foz do Iguaçu (PR), o
tradicional evento da Sociedade Brasileira de
Oncologia Clínica (SBOC) se manteve como espaço
Mesa da cerimônia de abertura
Equipe Astellas
Magno Araujo e Rodrigo Scudeiro
(Expressa)
Leonardo Atem
Evanius Wiermann e Gustavo Fernandes
Paulo Perelson
Glauber Leitão e Flávio Reis
Carlos Loures e Rodrigo Abreu e Lima
ONCOLOGIA
D’Or
III Congresso Internacional Oncologia D’Or
C
om mais de 2 mil inscritos, 12 módulos, 165 convidados nacionais e 11 internacionais, o III Congresso Internacional Oncologia D’Or foi realizado
Heráclito de Brito Gomes Jr., Eduardo Loyo, Bruno Blate, Rodrigo de Abreu e Lima
Rodrigo Abreu e Lima e Daniel Herchenhorn e Sergio Côrtes
Luisa Adão e Andre Moll
60
René Adam
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
nos dias 13 e 14 de novembro, no Rio de Janeiro. Em relação aos temas, as novidades do III Congresso foram os
módulos Saúde e Mídia, Hematologia e Imunoterapia.
João Pantoja
Helio Calábria, Rodrigo Abreu e Lima
e Leonardo Nunes
Thais Abreu, Leonardo Ragel e
Rafaela Pozzobom
Carlos Frederico Pinto
Paulo Rodrigues
Marlene Oliveira, Simone Simon,
Jorge Moll, Lydianne Oliveira,
Andre Moll e Daniel Herchenhorn
Maria de Lourdes Oliveira
Gilberto Amorim
Rio de Janeiro ganha unidade NEOTÓRAX
NEOTÓRAX
O
Grupo Oncologia D’Or inaugurou, em novembro,
sua nova unidade especializada em oncologia
torácica. O NEOTÓRAX – Núcleo de Excelência
em Oncologia Torácica – tem a proposta de oferecer ao paciente um tratamento completo em um único lugar com a
coordenação dos especialistas Carlos Gil e Tatiane Montella.
Paulo de Biasi Cordeiro, Anderson Nassar
Guimarães, Luiz Paulo Loivos e André Moll
Aureliano Mota C. de Souza, Felipe Saddy,
Rui Haddad, Carlos Eduardo Teixeira e
André Luciano Pereira
Carlos Gil, Hisbello Campos,
José Waldir de Vasconcelos, Leopércio
Júnior, Mariano Zalis, Tatiane Montella,
Marcelo Ibiana e João Pantoja
Rui Haddad, Juliane Musacchio e
João Pantoja
Paulo Perelson e Mauro Zamboni
Lúcia Fontenelle, Mauro Zamboni, Eduardo
Medeiros, André Moll e Rodrigo A. e Lima
Carlos Terra, Paola Perdigão e
Tatiane Montella
Equipe completa NEOTÓRAX
XXXV Congresso Brasileiro de Urologia
SBU
O
Grupo Oncologia D’Or esteve presente no XXXV
Congresso Brasileiro de Urologia, entre os dias
31 de outubro e 4 de novembro, no Centro de
Convenções Sul América, no Rio de Janeiro. O evento,
Luiz Carlos Vasconcelos e
Meiri Oliveira
considerado o maior do segmento na América Latina, reuniu cerca de 5 mil especialistas e trouxe os maiores nomes
da urologia mundial, oferecendo debates interessantes, reforçando conceitos e trazendo novidades.
Moises Eliahu Mizrahi, Débora Fonseca
e Juan Eugenio Mayser Roca
Estande da Oncologia D’Or
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
61
especial evento D’Or
Evento supera as expectativas
Fotos: Agência Photocamera
C
Heráclito de Brito Gomes Junior, Eduardo Loyo, Rodrigo Abreu e Lima
e Daniel Herchenhorn
om 12 módulos, 165 convidados nacionais, 11 internacionais e
mais de 2 mil inscritos, o Rio de Janeiro sediou nos dias 13 e 14
de novembro o III Congresso Internacional Oncologia D’Or. A
edição deste ano trouxe como novidades a criação dos Módulos de Gestão
e de Qualidade, de Hematologia, de Imunoterapia e de Mídia e Saúde,
além do I Congresso Multidisciplinar e da XII Maratona Urológica. O CEO
da Rede D’Or, Heráclico de Brito Gomes Junior, destacou a relevância
do grupo no cenário nacional. “Temos 30 hospitais, realizamos mais de
22 mil cirurgias e atendemos a 20 mil internações por ano. Queremos ser
reconhecidos por médicos e pacientes como um local de referência em
saúde”, disse. Rodrigo Abreu e Lima, diretor executivo da Oncologia D’Or,
destacou por sua vez os planos para o próximo evento, em 2016. “Teremos um módulo de Pesquisa Clínica e Inovação e outro de Robótica, dentro do objetivo de incluir temas relevantes para a oncologia.”
Maratona Urológica
Imunoterapia
Paradigmas de triagem e tratamento do câncer de próstata
Uso combinado com outras terapias no centro do debate
Na palestra “Rastreamento, detecção e tratamento minimamente invasivo”, parte da XII Maratona Urológica,
o especialista internacional Herbert
Lepor apontou a necessidade de afinar
os métodos de detecção e manejo do
câncer de próstata. Integrante da Johns
Hopkins University Society of Scholars,
Herbert Lepor
Lepor lembrou da eficácia das técnicas atuais para a neoplasia, como
o uso do teste PSA, a realização de biópsia e o ultrassom transrretal
aleatório guiado, seguido por um tratamento curativo agressivo. “A
taxa de mortalidade por câncer de próstata caiu 40%”, afirma Lepor.
“Essa redução significativa da mortalidade, contudo, foi conseguida
submetendo muitos homens a uma biópsia e a um tratamento desnecessários. ” O objetivo daqui em diante, afirma o médico, é preservar essa “impressionante redução da mortalidade do câncer de próstata”, enquanto são melhorados os paradigmas de triagem, detecção
e tratamento. Segundo Lepor, isso será alcançado através da utilização
do 4KScore, da ressonância magnética (MRI alvo biópsia), da avaliação de risco molecular e da terapia focal.
Com grandes avanços na última
década, e considerada a alternativa
mais promissora para o tratamento oncológico, a imunoterapia deve registrar
um novo salto nos próximos anos. Na
palestra “Estudos e cenários em câncer
de pulmão”, o oncologista Lucianno P.
dos Santos apresentou uma série de esLucianno P. dos Santos
tudos que estão em desenvolvimento e que são aguardados pela comunidade médica. “São mais de 100 estudos testando drogas
imunoterápicas e suas possíveis combinações, com quimioterapia,
com vacinas em doses diferentes etc,” diz Santos. Entre os estudos
apresentados pelo oncologista estão o Keynote 189, que começa em
2016, e que tem dois braços em avaliação: um com a associação de
pembrouzumabe e pemetrexebe e outro com placebo e pemetrexebe.
“Não sabemos ainda as combinações ideais, como a imunoterapia adjuvante e neoadjuvante, o uso com vacinas combinadas, ou mesmo
o inibidor de tiroquinase EGFR”, diz Santos.
62
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
mundo virtual
Onco& recomenda
Sites e aplicativos sobre oncologia voltados tanto para médicos, com novidades e informações
sobre a área, como para pacientes, com dicas de prevenção e assistência ao doente
Apoio na palma da mão
Aplicativos para tablets e smartphones que ajudam médicos a se manter sempre atualizados e no melhor
caminho para o diagnóstico e tratamento de seus pacientes
Figure 1
ProDoctor CID
O Figure 1, uma espécie de “Instagram
para médicos” criado pelo canadense
Joshua Landy, é um aplicativo que compartilha imagens aos profissionais de saúde,
onde podem ser postados e visualizados
exames e fotos de pacientes (sem identificá-los) para discussão de casos clínicos e
tratamentos em tempo real.
As imagens ficam dispostas por especialidades médicas ou por anatomia. Além
disso, o aplicativo disponibiliza uma ferramenta de bloqueio facial ou para marcas que possam identificar o
paciente, preservando sua identidade. O acesso ao app pode ser
feito apenas por profissionais médicos, desde que autorizado pela
equipe que verifica os perfis cadastrados. Gratuito, está disponível
para Android e iOS e pode ser acessado pela web.
rias de doenças.
Disponível para dispositivos com a plataforma IOS, o
ProDoctor CID é um produto da ProDoctor Software Ltda., que
desenvolve softwares para consultórios, clínicas e pequenos
hospitais.
https://itunes.apple.com/us/app/figure-1-medical-cases-for/id645948529?mt=8
http://apps.prodoctor.net/cid
IMOC
Com o objetivo de trazer aos usuários
deste aplicativo, de forma imediata e atualizada, o que há de mais recente e relevante
no que se refere a estudos clínicos sobre os
diversos tipos de câncer, o IMOC foi idealizado para ser mais uma ferramenta para
a comunidade de oncologia e hematologia.
Destinado especificamente aos médicos e
demais profissionais de saúde, o aplicativo
só cadastra pessoas físicas, com número do
Conselho Regional de Medicina válido.
Disponibiliza e-book, formato eletrônico, com versão mais
recente do Manual de Oncologia Clínica do Brasil, além de
videoaulas e calculadora de fórmulas médicas, que facilitam o dia
a dia do usuário.
O aplicativo tem por finalidade facilitar o acesso do usuário à consulta da Classificação Internacional de Doenças –
CID10, indispensável aos profissionais
médicos. Contendo todos os códigos atualizados (pelo número, nome ou descrição
da doença), o app possibilita a criação de
uma lista de Favoritos, com os códigos
mais utilizados, facilitando sua visualização, além de fácil navegação através da
hierarquia de capítulos, grupos e catego-
Portal SBOC
A Sociedade Brasileira de Oncologia
Clínica lançou o aplicativo Portal SBOC
para que seus associados tenham acesso ao
conteúdo do site de maneira mais fácil,
através de informações como notícias, estudos clínicos e eventos, entre outros.
O aplicativo é gratuito e está disponível
no Google Play e na Apple Store.
http://www.sboc.org.br/sboc-lanca-aplicativo/
http://www.mocbrasil.com
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Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
63
campanhas
Fique por dentro das ações sobre câncer que ganharam destaque na mídia e nas redes sociais
Divulgação
Dezembro Laranja
Seja doador voluntário de medula óssea
O Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea (REDOME), vinculado ao Instituto
Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva (Inca), promove a campanha de doação para quem
precisa de transplante. A doação de medula óssea pode ajudar pacientes que veem no transplante a
única chance de cura. Aumentando o número de cadastros, maior é a possibilidade de doadores compatíveis serem encontrados.
Para se tornar doador, o candidato precisa ter entre 18 e 55 anos, estar em bom estado geral de
saúde e não ter doença infecciosa transmissível pelo sangue.
Como é feito o cadastro?
No local de cadastro o candidato irá informar os dados pessoais para preenchimento de um formulário, levando documento de identidade com foto. Após o cadastro serão colhidos 5 ml de sangue,
que será tipado por exame de histocompatibilidade (HLA), um teste de laboratório para identificar suas
características genéticas.
Como é feita a doação?
Existem duas formas de doar, a serem indicadas pelo médico. Em ambos os casos, a medula óssea
do doador se recompõe em apenas 15 dias. No primeiro caso, o doador é anestesiado em centro cirúrgico e a medula é retirada do
interior dos ossos da bacia, por meio de punções com agulhas. O retorno às atividades habituais acontece uma semana após a doação.
O segundo procedimento chama-se aférese. O doador toma um medicamento que faz com que as células da medula óssea circulem na corrente sanguínea. Essas células são retiradas pelas veias do braço do doador, com uso da máquina de aférese. Para fazer
doações ao Instituto, procure a Área de Ações Voluntárias do Inca ou a Fundação do Câncer.
64
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
Divulgação
Com a chegada da estação mais quente do ano – o verão–, época em que a exposição
aos raios solares se evidencia, a Sociedade Brasileira de Dermatologia (SBD) promoveu
a Campanha Dezembro Laranja, com o principal objetivo de alertar a população para
os riscos do câncer de pele causado, sobretudo, pela exposição às ações nocivas do sol,
e conscientizar para o uso diário de uma proteção solar.
A incidência do câncer de pele no Brasil tem aumentado e, segundo estimativas do
Inca, em 2016 cerca de 175 mil novos casos serão detectados, sendo 80.850 em homens
e 94.910 em mulheres. Mas a maioria desses diagnósticos poderá ser evitada com medidas simples, como uso de filtro solar, chapéu, óculos, além do cuidado com os horários de exposição ao sol (das 10h às 16h). Além da exposição excessiva ao sol, outros fatores estão
associados ao surgimento desse tipo de câncer, como pele clara, história familiar de melanoma, nevo
congênito (pinta escura), maturidade (após os 15 anos de idade a propensão para esse tipo de câncer
aumenta), xeroderma pigmentoso (doença congênita que se caracteriza pela intolerância total da
pele ao sol, com queimaduras externas, lesões crônicas e tumores múltiplos) e nevo displásico (lesões
escuras da pele com alterações celulares pré-cancerosas).
Assim como as Campanhas Outubro Rosa e Novembro Azul, vários monumentos espalhados
pelo Brasil foram iluminados com a cor laranja no mês de dezembro.
acontece
Acompanhe congressos, simpósios e
encontros de atualização do mundo da
oncologia. Confira aqui os principais
eventos dos próximos meses
NEOTÓRAX realiza primeiro evento e traz
convidados internacionais
O I Simpósio de Diagnóstico em Câncer de Pulmão
NEOTÓRAX Oncologia D’Or será realizado nos dias um e
dois de abril, no Rio de Janeiro. O evento, coordenado pelo
oncologista Carlos Gil Ferreira, terá como principais temas
rastreamento, imagem em oncologia torácica, diagnóstico
histopatológico, diagnóstico molecular e estadiamento mediastinal. Entre os convidados internacionais estão Natasha
Leigh e Paula Ugalde, do Canadá, e Cecília Schott, dos Estados Unidos. “Em poucas áreas da oncologia nós
avançamos tanto nos últimos 10 anos como em câncer de
pulmão, com uma revolução no diagnóstico e no tratamento dessa doença altamente letal. Contudo, a tecnologia
em saúde agrega custo e custo limita acesso, sobretudo em
sistemas de saúde amplos, heterogêneos e complexos como
o brasileiro”, comenta Carlos Gil, ao contextualizar o ambiente em que nasce o grupo NEOTÓRAX – Núcleo de Excelência em Oncologia Torácica, da Oncologia D’Or, que
prove seu I Simpósio voltado ao tema. “O NEOTÓRAX tem
por objetivo central melhorar o acesso à tecnologia para os
pacientes com câncer de pulmão no país.”
SNOLA 2016 – Update on Neuro-Oncology
Gastrointestinal Cancer Symposium 2016
O SNOLA 2016 – Update on Neuro-Oncology acontece
de 24 a 26 de março de 2016, no Windsor Barra Hotel, Rio
de Janeiro, sendo o maior e mais completo evento da Sociedade Latino-Americana de Neuro-Oncologia. O evento tem
por fina-lidade promover um amplo foco nas principais patologias oncológicas do sistema nervoso central, envolvendo
todas as disciplinas que assistem pacientes neuro-oncológicos,
como neuro-imagem, neuropatologia, neurologistas, neurocirurgiões, oncologistas, radioterapeutas, fisiatras e equipe de
assistência. Além de um fórum político e econômico – com o
intuito de discutir problemas e soluções cabíveis à neuro-oncologia, o Congresso contará com mais de 15 palestrantes internacionais de destaque na área. Saiba mais sobre o SNOLA
2016 pelo site: http://www.snola2016.com/index.php.
O Gastrointestinal Cancer Symposium 2016 – Insight on
Novel Mechanisms and Presicion Care acontece de 21 a 23 de
janeiro de 2016, no Moscone West Building, em São Francisco,
Califórnia. É um evento de oncologia especializado, projetado
para fornecer conteúdo científico e educativo para membros do
cuidado do câncer gastrointestinal e comunidade de pesquisa.
Esta reunião de três dias abrange a ciência mais recente em
câncer do esôfago, estômago, pâncreas, intestino delgado e do
trato hepatobiliar; e do cólon, reto e ânus. O Simpósio deste
ano vai oferecer novas sessões de ponta que cobrem temas controversos, um almoço de networking para os oncologistas em
início de carreira, bem como a oportunidade para ver e discutir
pôsteres selecionados com respeitados membros do corpo docente. Informações: http://gicasym.org/?cmpid=db_gi_rh_ascoweb_mur_all_10-01-15_gisym.
Onco& dezembro/janeiro/fevereiro 2016
65
calendário 2016
Evento
Data
Local
Informações
III Simpósio Internacional de Uro-Oncologia
19 e 20 de fevereiro
São Paulo–SP
http://www.einstein.br/Ensino/eventos
VII Congresso Internacional de Uro-Oncologia
3 a 5 de março
São Paulo–SP
http://rvmais.com.br/calendario_eventos.php
4 a 5 de março
São Paulo–SP
http://rvmais.com.br/calendario_eventos.php
XXIV Simpósio Internacional de Hemoterapia
e Terapia Celular
17 a 19 de março
São Paulo–SP
http://www.einstein.br/Ensino/eventos
I Simpósio de Diagnóstico em Câncer de Pulmão
Oncologia D'Or Neotorax
1 e 2 de abril
Rio de Janeiro–RJ
www.oncologiador.com.br
VI Congresso Internacional de Ginecologia
Oncológica
1 e 2 de abril
São Paulo–SP
http://rvmais.com.br/calendario_eventos.php
III Congresso Paulista de Coloproctologia
1 e 2 de abril
São Paulo–SP
http://www.ccmew.com/colosp2016
7º Brazilian Lymphoma Conference
8 de abril
São Paulo–SP
http://www.abhh.org.br
III Simpósio Internacional de Tumores
Gastrointestinais
66
IV Simpósio Internacional de Câncer de Pulmão
8 e 9 de abril
São Paulo–SP
http://rvmais.com.br/calendario_eventos.php
EASL - The International Liver Congress
13 a 17 de abril
Barcelona–ESP
http://ilc-congress.eu/
XXVIII Congresso de Cirurgia Dermatológica
20 a 23 de abril
Rio de Janeiro–RJ
www.sbcdrio2016.com.br
GAP 2016
24 a 28 a abril
São Paulo–SP
http://www.sbmastologia.com.br/index
/index.php/component/content
/article/9-destaque-/856-oncoplastia-2016
I Oncoplastia 2016
29 de abril
São Paulo–SP
http://www.sbmastologia.com.br/index/
index.php/component/content/article/
9-destaque-/856-oncoplastia-2016
dezembro/janeiro/fevereiro 2016 Onco&
Calendário de eventos de 2016 completo e atualizado.
Datas e locais sujeitos a alteração.
Download