origem, emprego e mau uso do gerúndio

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ANDRÉ VALVERDE COSTA
ORIGEM, EMPREGO E MAU USO DO GERÚNDIO
FACULDADE DE EDUCAÇÃO SÃO LUÍS
NÚCLEO DE APOIO DE MOEMA
JABOTICABAL – SP
2008
1
ANDRÉ VALVERDE COSTA
ORIGEM, EMPREGO E MAU USO DO GERÚNDIO
Trabalho de Conclusão de Curso
apresentado
à
Faculdade
de
Educação São Luís Núcleo de Apoio
de Moema, como exigência parcial
para a conclusão do Curso de PósGraduação Lato Sensu em Língua
Portuguesa,
Compreensão
e
Produção de Textos.
Orientadora: Profª Janaína Lopes
FACULDADE DE EDUCAÇÃO SÃO LUÍS
NÚCLEO DE APOIO DE MOEMA
JABOTICABAL – SP
2008
2
Dedicamos
À Célia Morgana, esposa companheira,
À Lorena, combustível da minha vida,
Aos meus pais Alcides e Julia, sem eles nada
disso seria possível.
3
AGRADECIMENTOS
À Deus, pelo sentido da vida.
À Faculdade de Educação São Luis, pelo aprendizado.
Aos professores e tutores, pela atenção, paciência, dedicação e
disponibilidade nas orientações e dúvidas.
Aos colegas de pós-graduação, Jimmy Ferreira de Andrade Junior, José
Paulo Cury, José Toshio Ozawa, e Liliana Prado Pontes, pelos obstáculos
superados.
4
RESUMO
Neste trabalho abordamos o mais recente vicio de linguagem – gerundismo –
o qual tem trazido transtornos à língua portuguesa do Brasil. O gerundismo, que é o
emprego abusivo do gerúndio, tem sido utilizado sem critério por pessoas de quase
todos os níveis sócio-culturais, principalmente pelos operadores de telemarketing.
Considerado estrangeirismo, esse fenômeno lingüístico advém de traduções literais
de frases em inglês, nas quais o gerúndio é utilizado. Os “perfect tenses” gerundiais
e o futuro cuja formação possui “going to”, por exemplo, são adequados para a
língua inglesa, todavia se forem traduzidas literalmente para o português gerarão a
ocorrência do gerundismo. Assim sendo, apresentamos sugestões para evitar e
solucionar esse problema, tais como: maior preocupação com o ensino de prática e
técnica de tradução nos cursos de inglês, que dão maior importância à conversação;
ênfase no ensino das formas nominais e suas funções morfossintáticas e seu
emprego em textos, desde o início do aprendizado de verbos; orientação aos
atendentes de telemarketing sobre o emprego adequado dos modos, tempos e
formais verbais no atendimento aos clientes. A composição deste trabalho foi
baseada em leitura e pesquisa de obras de conceituados lingüistas e professores de
português e inglês, bem como em consultas a sites especializados na Internet. Mais
do que enfatizar o gerundismo, apontamos o emprego correto e próprio do gerúndio,
evitando, assim, que a utilização deste, que é correto, confunda-se com aquele, uma
construção viciosa.
5
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.............................................................................................................6
1. CONCEITO E EMPREGO DO GERÚNDIO E SUAS FUNÇÕES............................7
2. CONCEITO LINGÜÍSTICO DO GERÚNDIO, PRINCIPAIS VÍCIOS DE
LINGUAGEM LIGADOS A ELE, CAUSAS DO GERUNDISMO E EQUÍVOCOS
ENTRE GERÚNDIO E GERUNDISMO......................................................................16
3. UTILIZAÇÃO DO GERÚNDIO EM INGLÊS, CONSEQÜÊNCIAS DE SUA
TRADUÇÃO LITERAL E SUGESTÕES PARA SOLUCIONAR OS PROBLEMAS
MAIS COMUNS..........................................................................................................25
CONSIDERAÇÕES FINAIS.......................................................................................34
REFERÊNCIAS..........................................................................................................35
6
INTRODUÇÃO
A língua é um instrumento de comunicação vivo e dinâmico que se apresenta
sempre em constante evolução. Assim sendo, sofre influências de toda espécie:
social, regional, política, virtual, da mídia em geral e, principalmente, interferências
de outros idiomas. Com o advento da globalização, dificilmente existirá, daqui para
frente, um idioma puro, original, sem estrangeirismos.
A composição deste trabalho estará concentrada na língua portuguesa, objeto
de estudo do Curso de Pós-Graduação da Faculdade de Educação São Luís de
Jaboticabal. Mostrará tanto uma das formas nominais do verbo – gerúndio-, quanto a
influência negativa que o mais recente vício de linguagem vem trazendo ao
português – o mau uso do gerúndio, ou gerundismo, principalmente nos meios de
comunicação. Trata-se, na verdade, de um estrangeirismo – mais um – a interferir no
idioma oficial do Brasil, o que será melhor detalhado no decorrer do desenvolvimento
deste trabalho.
7
1. CONCEITO E EMPREGO DO GERÚNDIO E SUAS FUNÇÕES
Antes de iniciar a exposição do tema proposto, mister se faz uma breve
conceituação sobre verbo, seus modos, tempos e formas. Isso pode melhorar a
compreensão do gerúndio e, principalmente, do gerúndismo.
Primeiramente, um conceito simples do que significa verbo.
Verbo é uma palavra ou uma locução, que indica ação, estado, mudança de
estado, fenômenos meteorológicos e naturais.
Exemplos:
Estudei três horas seguidas.
└ação
Zeca é persistente.
└estado permanente
Devido à forte chuva, aquela rua transformou-se num mar de lama.
└mudança de estado
Realmente, choveu demais ontem.
└fenômeno meteorológico
Anoitecerá mais tarde durante o horário de verão.
└fenômeno natural
8
A locução verbal ocorre quando dois ou mais verbos se juntam com valor de
um só. Exemplo:
Essa matéria o professor já havia explicado.
└locução verbal
A oração acima equivale a:
Essa matéria o professor já explicara.
O verbo passa por um conjunto de flexões, cujo nome é conjugação.
As quatro flexões do verbo são:
- Flexão de número: indica quantos seres fazem parte do processo verbal.
Esses números são o singular (eu, tu, ele) e plural (nós, vós, eles).
- Flexão de pessoa: mostra as primeiras, segundas e terceiras pessoas do
discurso. As primeiras (eu e nós) são os emissores ou falantes; as segundas (tu e
vós) são os receptores ou ouvintes; as terceiras (ele, ela, eles, elas) são as pessoas
de quem se fala.
- Flexão de tempo: aponta o momento, período ou época de um determinado
acontecimento.
- Flexão de modo: revela como e de que modo acontece determinado fato.
Esses modos são:
•
Indicativo: como o próprio nome diz, indica algo verdadeiro, certo, real.
•
Subjuntivo: expressa algo provável, incerto, com possibilidade de vir a
acontecer.
•
Imperativo: tem a finalidade de dar ordem, pedir, aconselhar, persuadir ou
convidar a praticar ação expressa no verbo. Isso ocorre com o imperativo afirmativo
(sente-se, entregue, estuda, entrai). O imperativo negativo indica proibição,
impedimento (não vás, não espere, não entre).
9
Os exemplos dos modos indicativo e subjuntivo serão dados quando se falar
das flexões dos tempos desses respectivos modos. Antes, um pequeno texto para
ilustrar esse item.
“A Dança dos Tempos Verbais”
“Na linguagem oral e coloquial, não há rigor no emprego dos tempos
verbais. Com freqüência, um tempo é trocado por outro, sem
prejuízo para a comunicação. Um dos casos mais freqüentes é a
troca do futuro do pretérito do indicativo pelo pretérito imperfeito do
indicativo. Observe:
Se eu pudesse, em ficava com vocês até o fim do mês.
Se eu pudesse, eu ficaria com vocês até o fim do mês.
Tal troca decorre do fato de, no português brasileiro, o futuro do
pretérito ter uma conotação culta e formal e, por essa razão, ser
evitado em situações informais, mesmo por falantes que dominam a
língua culta.
Quando, entretanto, o contexto situcional exige o padrão culto e
formal, recomenda-se maior rigor no emprego dos tempos verbais.”
(William Roberto Cereja, Thereza Cochar Magalhães. Gramática
Reflexiva: Texto, semântica e interação. p. 152)
Inicialmente, as flexões de tempo no modo indicativo.
- Presente: indica uma ação repetitiva, rotineira ou perdurável, ou que ocorre
no momento da fala: Exemplos:
O cachorro entra e sai a toda hora.
└------┘
ações repetitivas
Saio de casa todos os dias às sete horas.
└ação rotineira
Você já mora aqui há vinte anos?
└ação perdurável
- Pretérito (ou passado): exprime ação passada ou estado anterior e, ao
contrário do presente, subdivide-se em três tempos:
•
Pretérito perfeito: mostra uma ação completamente concluída.
Exemplo: Terminei ontem meu último ano de faculdade.
10
•
Pretérito imperfeito: transmite uma ação habitual ou contínua no
passado, ou algo que vinha ocorrendo e se interrompeu em virtude de uma
outra ação.
Exemplos:
Eu sempre ia à igreja aos domingos.
└ação habitual
João, constantemente, discutia com os filhos.
└ação contínua
Eles voltavam para casa quando o carro enguiçou.
└ação ocorrendo e depois interrompida
•
Pretérito mais-que-perfeito: indica uma ação ocorrida no passado, mas
anterior a outra ação, também passada.
Exemplo: Quando ele pensou, ela já adivinhara seu pensamento.
└2ª ação
└ação anterior a primeira
- Futuro: subdivide-se em dois tempos:
•
Futuro do Presente: trata-se de uma ação que acontecerá num futuro
relativo ao tempo presente.
Exemplo: Amanhã, resolveremos tudo.
•
Futuro do Pretérito: é uma ação que ocorreria se houvesse uma
determinada condição.
Exemplo: Se ela ouvisse mais os pais, não teria tantos problemas.
Agora, as flexões de tempo no modo subjuntivo.
- Presente: reflete incerteza, dúvida, probabilidade, desejo. É usado
normalmente depois das expressões talvez, provavelmente, é possível que, tomara
que. Exemplos:
11
Não é certeza que nós cheguemos hoje.
└incerteza
Talvez tu resolvas estudar no exterior, não é?
└dúvida
Provavelmente, o diretor retorne ainda hoje.
└probabilidade
Tomara que chegue logo o verão.
└desejo
- Pretérito imperfeito: indica um fato incerto ou improvável, ou com
possibilidade de ser realizado mediante certa condição. Exemplos:
Se ele falasse inglês, não teria voltado da Inglaterra tão logo.
└fato incerto ou improvável
Se o pai lhe desse uma chance, ele mostraria sua capacidade.
└se houvesse condição
- Futuro: indica um acontecimento possível no futuro, geralmente simultâneo a
outra ação. Exemplo:
Quando você der o sinal, cantaremos o “Parabéns a você”.
Conforme já mencionado, as formas nominais do verbo são o infinitivo, o
particípio e o gerúndio. São derivadas do tema, ou seja, radical mais vogal temática,
ao qual acrescentam-se as desinências: R para o infinitivo (calar, saber, desistir); DO
para o particípio (calado, sabido, desistido) e NDO para o gerúndio (calando,
sabendo, desistindo).
Diferentemente dos modos indicativo e subjuntivo e seus respectivos tempos,
as formas nominais não apresentam por si nem tempo e nem modo, pois este e
aquele dependem do contexto em que elas estão. As formas nominais são assim
12
chamadas porque podem ter a função de um nome que pode ser um substantivo,
um adjetivo ou um advérbio.
Falando um pouco de cada forma nominal, têm-se:
- Infinitivo: subdivide-se em:
•
Impessoal: numa oração, pode ter a função de um substantivo. Exemplo:
Rir faz bem à alma e ao corpo.
O verbo rir equivale ao substantivo riso na oração.
O riso faz bem à alma e ao corpo.
•
Pessoal: é o infinitivo que tem flexão número-pessoal. Exemplos:
A professora pediu para eu fazer o exercício.
Esse problema é para tu resolveres.
- Particípio: indica uma ação já concluída. Exemplo:
Essa questão foi resolvida ontem.
Pode também exercer a função de adjetivo, concordando em gênero e
número com o substantivo a que se refere. Exemplos:
Marta foi escolhida para dançar.
└adjetivo e predicativo do sujeito
No exemplo acima, escolhida é também um predicativo do sujeito, pois mostra
um estado do sujeito Marta está ligado a este por um verbos de ligação (foi).
A garota foi escolhida por Marta.
Nesse exemplo, escolhida também é um adjetivo, porém com função de
adjunto adnominal, pois é um termo que acompanha o substantivo Marta.
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- Gerúndio: representa uma ação em andamento, ou seja, que ainda não se
concluiu. Nesse caso, o gerúndio pode ter função de adjetivo ou advérbio.
Exemplos:
As árvores estão repletas de pássaros piando.
└adjetivo e adjunto adnominal
Esse exemplo mostra o gerúndio piando com função morfológica de adjetivo e
função sintática de adjunto adnominal, pois acompanha o substantivo pássaros.
Os componentes da escola de samba adentraram à quadra sambando.
└adjunto
adverbial
de modo
Aqui, vê-se o gerúndio sambando indicando o modo como os sambistas
adentraram à quadra e é um termo ligado ao verbo adentraram.
O gerúndio também indica uma ação ocorrendo no exato momento da fala.
Exemplo: Eu estou jantando.
O gerúndio pode também introduzir orações subordinadas reduzidas que
nesse caso não necessitam de conectivos. As orações subordinadas reduzidas de
gerúndio podem ser:
- Subordinada adjetiva: Exemplo:
“Eu vi a mulher preparando outra pessoa” (Força Estranha. Caetano Veloso)
Essa oração desenvolvida fica da seguinte maneira:
Eu vi a mulher preparava outra pessoa.
- Subordinada adverbial: Subdivide-se em:
•
Causal. Exemplo:
Viajando, não pude comparecer à reunião.
14
A mesma oração desenvolvida fica da seguinte maneira:
Não pude comparecer à reunião porque viajei.
•
Condicional. Exemplo:
Estudando com afinco, você se sairá bem nas provas.
A mesma oração desenvolvida fica da seguinte maneira:
Se estudar com afinco, você se sairá bem nas provas.
•
Temporal. Exemplo:
Entrando todos os alunos, as provas começarão.
A mesma oração desenvolvida fica da seguinte maneira:
Assim que todos os alunos entrarem, as provas começarão.
Há também os tempos compostos nos modos indicativo e subjuntivo e nas
formas nominais, que são:
- Infinitivo impessoal composto: formado pelo infinitivo impessoal dos verbos
TER ou HAVER mais o particípio do verbo principal. Exemplos:
Sentiu-se ter causado tanto constrangimento.
Afirmaram haver impedido o acidente.
- Infinitivo pessoal composto: formado pelo infinitivo pessoal dos verbos TER
ou HAVER mais o particípio do verbo principal. Exemplos:
Tu mentiste ao teres afirmado tal coisa.
Foi uma honra havermos participado do seu evento.
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- Gerúndio composto: formado pelo gerúndio dos verbos auxiliares TER ou
HAVER mais o particípio do verbo principal. Exemplos:
Tendo perdido a hora mais de duas vezes, você será demitido.
Havendo comprado mercadoria em excesso, a loja fará uma grande
promoção.
16
2- CONCEITO LINGUÍSTICO DO GERÚNDIO, PRINCIPAIS VÍCIOS DE
LINGUAGEM LIGADOS A ELE, CAUSAS DO GERUNDISMO E EQUÍVOCOS
ENTRE GERÚNDIO E GERUNDISMO.
Antes de começar a discorrer sobre gerundismo, apresentar-se-ão as
definições de gerúndio e gerundivo sob a ótica de Joaquim Mattoso Câmara Jr.
“GERÚNDIO” – Uma das formas verbo-nominais na língua
portuguesa. Em latim era um substantivo verbal, que entrava na
conjugação do verbo, ao lado do infinitivo e do supino, com três
formas flexionais, pelo modelo da 2ª declinação dos substantivos
correspondendo aos casos no singular-genitivo (amandi), acusativo
(amandum), dativo-ablativo (amando). A forma portuguesa, com
sufixo ndo / (n) du / precedida de vogal temática (-ando para
amando; -endo para temendo; -indo para partindo), provém do
ablativo latino, que figurava em orações reduzidas circunstanciais
com sujeito próprio, distinto do da oração principal na construção a
que a gramática latina chamava “ablativo absoluto” (cf. em português
– ROMPENDO O SOL, LAVANTAMO-NOS). Desde o latim imperial,
porém invadiu a área do particípio presente numa oração reduzida
referente ao sujeito da oração principal (cf. “ASSURGENS ET
POPULANDO”, brandgent, 1928, 89; donde em português –
ACORRIAM CRIANÇAS SACUDINDO OS BRAÇOS NO AR). Daí,
como os particípios (v.), ser empregado como adjunto de um
substantivo antecedente, para expressar, em contraste com o nome
adjetivo, uma qualificação dinâmica do substantivo, isto é, ligada a
uma atividade e pois, de caráter verbal (exs.: VI CRIANÇAS
BRINCANDO – TRAGA UMA CHALEIRA DE ÁGUA FERVENDO).
Como é lábil a distinção entre qualificação dinâmica (verbal) e
estética (nominal) e depende não raro de um impressionismo (v.)
ocorrente, há a tendência a estender esse uso do gerúndio como
adjunto (exs: DICIONÁRIO COMPREENDENDO MUITOS TERMOS
NOVOS – UMA CAIXA CONTENDO VÁRIOS OBJETOS).”
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“GERUNDIVO” – Modalidade do gerúndio em latim (v.), quando em
função de adjetivo, concordando com o substantivo a que se refere:
é um particípio de valor futuro e passivo para indicar o que vai ou
deve ser feito.
Do gerundivo provieram em português: a) adjetivos (ex:
VENERANDO); b) substantivos, em regra sob a forma do neutro (v.)
plural feito singular (ex.: LENDA, DE LEGENDA, cf. LEGERE “ler”).
Modernamente, pelo modelo dos adjetivos antigos, mas eruditos (v.),
apareceram na língua culta derivador de verbos portugueses como:
a) adjetivos, aplicados àquele que vai capacitar-se para determinada
profissão
(exs.:
BACHARELANDO,
DOUTORANDO,
ENGENHEIRANDO); b) substantivos, de caráter coletivo para um
conjunto do que deve ser feito (exs.: AGENDA, de “agir”, lat.
AGERE; CORRIGENDA, de “corrigir”, lat. CORRIGERE).”
(Joaquim Mattoso Câmara Jr. DICIONÁRIO DE LINGUÍSTICA e
GRAMÁTICA: p. 156-7)
Posto isso, pode-se conceituar, ou tentar conceituar gerundismo, já que é um
fenômeno lingüístico recente na língua portuguesa. Fenômeno esse que já passou a
ser um vício.
Segundo o professor Pasquale Cipro Neto, “O uso do verbo “estar” seguidos
de outro verbo no gerúndio, conhecido também como “gerundismo”, tem se tornado
cada vez mais comum, principalmente entre atendentes de telemarketing e
jogadores de futebol. Afinal, quem nunca ouviu as frases “eu vou estar enviando” ou
“eu vou estar fazendo”? Entretanto, esse tipo de frase se trata de um vício de
linguagem.”1
Um outro conceito de gerundismo diz: “Gerundismo é uma locução verbal com
uso sistemático de verbos no gerúndio, cujo emprego é relativamente recente no
português, particularmente o brasileiro.
A concordância da construção com a sintaxe do português não é ponto
pacífico, sendo, por vezes, considerada um vício de linguagem. O gerundismo foi
1
Extraído de http://www1.folha.uol.com.br/folha/publifolha/ult10037u362760.shtml, consultado em 11/09/2008
18
estigmatizado graças ao seu emprego constantemente impreciso semanticamente e
ao preconceito lingüístico.”2
Como se pode observar, o primeiro autor afirma ser o gerundismo um vício de
linguagem. Já, a segunda fonte de consulta não afirma e sim, diz que gerundismo é
considerado um vício de linguagem e ainda ressalta o estigma a ele imposto e o
preconceito lingüístico por ele sofrido.
Toda novidade, em qualquer campo, gera controvérsia, seja essa novidade
positiva ou negativa. Os estudiosos da língua portuguesa, principalmente os
puristas, ferrenhos amantes do idioma pátrio, demoram a assimilar e admitir
mudanças e adaptações lingüísticas. O que dizer, então, da posição dos mesmos
frente aos vícios de linguagem, tão freqüentes no português, principalmente na
forma coloquial? Evidentemente, com o gerundismo, esse comportamento não é
diferente.
Quando se abordaram anteriormente as formas nominais, observou-se que o
gerúndio expressa tanto uma ação em andamento ou sincrônica, quanto um
seguimento indefinido, bem como uma ação ocorrendo no exato momento em que
se fala. Exemplos:
“O dia vem chegando, vou rezar minha oração.”
└ação em andamento
(O sol nasceu para todos – samba de Sinhô)
“São Paulo que amanhece trabalhando.”
└ações sincrônicas
(Sinfonia Paulistana – autor: Billi Blanco)
Os policiais vieram e permaneceram atirando, atirando, atirando...
└ação mostra seguimento indefinido
2
Extraído de http://pt.wikipedia.org/wiki/Gerundismo, consultado em 11/09/2008
19
Estamos estudando.
└ação ocorrendo no exato momento da fala
Além da ação durativa ocorrendo no exato momento da fala, o gerúndio forma
também uma ação durativa, porém que ocorre progressivamente. Exemplo:
A chuva foi diminuindo.
No intuito de demonstrar que algo futuro deva ocorrer imediatamente, as
pessoas acabam construindo essa “nova forma nominal composta” – o gerundismo –
formada por uma locução verbal com os auxiliares “ir” e “estar” mais o verbo
principal no gerúndio. Isso resulta em enunciados como:
Vou estar ligando para a senhora amanhã.
Quando bastaria dizer:
Vou ligar para a senhora amanhã.
Ou ainda:
Ligarei para a senhora amanhã.
Ora, se essa ação é futura, descaracteriza o gerúndio como ação durativa. O
gerundismo mostrado no exemplo não indica futuro, tampouco pode substitui-lo, pois
há somente dois futuros: o simples (ligarei) e o composto (vou ligar). Diante disso,
pode-se indagar se é incorreto usar o gerúndio para expressar futuro. Não, não é
incorreto desde que seja uma ação durativa em andamento ou que ocorrerá
simultaneamente a outra ação. Exemplos:
O doutor Jorge estará realizando uma palestra amanhã à noite, das vinte às
vinte e uma horas.
Explicação: A palestra estará em andamento e terá uma duração.
20
Amanhã, enquanto vocês se divertem, eu estarei trabalhando.
Explicação: Trata-se de duas ações ocorrendo ao mesmo tempo.
O gerúndio tampouco pode substituir o infinitivo numa construção de um
gerundismo com três verbos: Exemplo:
Eles vão estar providenciando o pagamento.
Nessa oração, providenciando substitui providenciar. Assim, o correto é:
Eles vão providenciar o pagamento.
Pior que o uso incorreto e inadequado do gerúndio, é a mania em que o
gerundismo se transformou, primeiramente na área de telemarketing e nos meios de
comunicação e agora vem atingindo o português do dia-a-dia. Parece uma reação
em cadeia: de tanto ouvir falar assim, acabam todos falando igual, às vezes, sem
perceber. Entra-se numa loja de roupas. Logo vem um vendedor perguntar o que o
cliente deseja. Este pede um determinado modelo e informa o tamanho. O
atendente, educado e verborrágico, diz: “Um momento que eu vou estar verificando
se tem seu número. Enquanto isso, o senhor pode estar tomando um café ou uma
água.”
O abuso do gerúndio tem irritado e até confundido quem o ouve
sistematicamente, tanto que tem gerado dúvida entre o certo e o errado. Um bom
exemplo é a notícia que abaixo segue:
01/10/2007 - 23h14
Governador do DF demite o "gerúndio" por decreto
da Folha Online
O governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda (DEM), tomou uma
decisão que chamou a atenção de quem leu a edição de hoje do "Diário
Oficial" do distrito: demitiu o "gerúndio" de todos os órgãos do governo. O
decreto com a nova medida também proíbe o uso do gerúndio por desculpa
de "ineficiência".
21
O governador está fora de Brasília e não pôde comentar a nova medida.
O gerúndio é uma das formas nominais do verbo, formada pelo sufixo "ndo"
que indica continuidade de uma ação.
Leia a íntegra do decreto:
"Decreto nº 28.314, de 28 de setembro de 2007.
Demite o gerúndio do Distrito Federal, e dá outras providências.
O governador do Distrito Federal, no uso das atribuições que lhe confere o
artigo 100, incisos VII e XXVI, da Lei Orgânica do Distrito Federal, DECRETA:
Art. 1° - Fica demitido o Gerúndio de todos os órgãos do Governo do Distrito
Federal.
Art. 2° - Fica proibido a partir desta data o uso do gerúndio para desculpa de
INEFICIÊNCIA.
Art. 3° - Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 4º - Revogam-se as disposições em contrário.
Brasília, 28 de setembro de 2007.
119º da República e 48º de Brasília
JOSÉ ROBERTO ARRUDA"3
Mesmo sendo o chefe do Poder Executivo, o governador do Distrito Federal
equivocou-se ao tomar essa medida precipitada e tão drástica. Mostrando sua
própria “ineficiência” lingüística, a autoridade proibiu o correto gerúndio ao invés de
afastar o gerundismo.
Esse mesmo exemplo leva a uma reflexão de como o despreparo leva
pessoas de todas as camadas sociais, culturais e econômicas a cometerem enganos
por não conhecerem o mínimo a respeito de regras lingüísticas. Para que esse tipo
de confusão tenha um fim, ou pelo menos diminua, há que se fazer uma
reformulação na maneira de se transmitir conteúdos gramaticais e lingüísticos em
sala de aula desde o início do ensino fundamental.
É nessa época que se criam os bons hábitos de leitura e escrita e,
consequentemente, o bom hábito do falar bem. O ensino de língua portuguesa tem
pecado por ficar mais restrito ao excesso de regras. Estas, sem dúvida, são
importantes e essenciais, mas devem caminhar junto ao aprendizado de uma correta
e adequada aplicação de maneira prática. Embora existam muitos livros didáticos
3
Extraído de http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u333074.shtml, consultado em 11/09/2008
22
com gramática aplicada a textos, não é suficiente, pois a maneira de passar esse
conteúdo acaba por esvaziar o propósito desses livros.
Antigamente, o ensino de verbos restringia-se à obrigação de fazer com que o
aluno decorasse todos os tempos de todos os modos verbais. Como se diz
popularmente, tinha que saber “na ponta da língua”. Decorar tabuada e verbos era
uma verdadeira tortura, mas há uma modalidade do assunto verbos, que todos
adoravam e adoram: as formas nominais. Isso se explica pelo descaso praticado
pelos professores e alguns livros didáticos nos quais consta apenas que o infinitivo
com –R, o particípio com –DO e gerúndio com –NDO. Muito fácil! São só os três
para decorar! Mas, e o emprego, a função de cada uma dessas formas, a aplicação
em textos? Simplesmente, passa-se por esse assunto com tal superficialidade que,
em geral, nos livros, só se vê meia página (quando muito) sobre formas nominais.
Atitudes pedagógicas como essa é que levam o aprendiz de língua
portuguesa ao desinteresse. Parecem esquecer-se de que um aprendizado
deficiente do português não prejudica apenas a própria língua, mas também as
outras matérias. Nas provas dissertativas, são bem poucos os alunos que
conseguem escrever respostas objetivas e coesas empregando um português
correto. Por isso, há os que preferem provas em formato de testes de múltipla
escolha.
Quando o ensino de uma língua se desorganiza, torna-se fácil a influência de
outros idiomas. Desde o surgimento do latim, via-se que algumas línguas surgiam e
outras desapareciam. Algumas tinham mais influência e outras menos, umas sobre
as outras. Do galego-português veio a língua portuguesa, idioma oficial de Portugal
e também do Brasil. Mas ao longo da história, observa-se a infiltração de diversos
23
vícios
de
linguagem
na
língua
portuguesa
do
Brasil,
principalmente
estrangeirismos.
Segundo Joaquim Mattoso Câmara Jr., estrangeirismos são:
“empréstimos vocabulares (v.) não integrados na língua nacional,
revelando-se estrangeiros nos fonemas, na flexão e até na grafia, ou
os vocábulos nacionais empregados com a significação dos
vocábulos estrangeiros de forma semelhante. Na língua portuguesa,
os estrangeirismos mais freqüentes são hoje galicismos (v.) e
anglicismos (v.). O vocábulo estrangeiro, quando é sentido como
necessário, ou pelo menos útil, tende a adaptar-se à fonologia e à
morfologia da língua nacional, o que para nossa língua vem a ser o
aportuguesamento (v.).
Em referência às construções sintáticas, a diferença entre
estrangeirismos e empréstimos é imprecisa e está, apenas, em
maior ou menor sensação de naturalidade.”
Ainda, conforme o mesmo autor:
“Aportuguesamento – fenômeno que consiste em adaptar, fonológica
e morfologicamente, os estrangeirismos lexicais (v.) ao português.
Ex.: bife (ingl. beef, com /iy/ e /f/ implosivo), confete (it! confetti, com
/t/ geminado e morfologicamente plural de confetto). O
aportuguesamento integral atinge também a grafia, como em bife
etc., mas mesmo com a grafia estrangeira, pode dar-se o
aportuguesamento fonológico pela mudança de leitura – a)
francamente; b) sub-repticiamente. Assim: a) esquimau / iskimaw /,
ao lado de – esquimó; b) toilette, em que o grupo – oi – não é o
ditongo crescente francês /wá/, mas um grupo vocálico à portuguesa
/ua/.”
E também define anglicismo.
“Anglicismos – qualquer fato da língua inglesa que aparece no
português falado ou escrito. Os anglicismos são principalmente de
ordem – a) sintática, b) lexical. Como anglicismos sintáticos temos:
1) a antecipação de um adjunto adjetivo ao seu substantivo, sem o
intuito que essa colocação (v.) tem em português, mas com valor
descritivo (quando em português é normal a posposição do adjetivo)
como nos nomes de hotel (ex.: Majestoso Hotel); 2) o emprego de
um substantivo com função de adjetivo porque anteposto assim (ex.:
Rio Hotel); 3) o emprego de uma preposição, como com, isolada do
nome a que rege (ex: capas com e sem forro) ou até como contra,
em fim de frase (ex.: eu sou pelo povo e tu és contra). Os
anglicismos lexicais, ou anglicismos strictu sensu, são – a) formais
(ex.: sport, tank, week-end), b) semânticos (ex.: realizar
os
24
“compreender”,
assumir
“supor”).
V.
estrangeirismos;
aportuguesamento.
(Joaquim Mattoso Câmara Jr. DICIONÁRIO DE LINGUÍSTICA e
GRAMÁTICA. p. 60-67-136)
25
3- UTILIZAÇÃO DO GERÚNDIO EM INGLÊS, CONSEQUENCIAS DE SUA
TRADUÇÃO LITERAL E SUGESTÕES PARA SOLUCIONAR OS PROBLEMAS
MAIS COMUNS
Devido à presença de pessoas de diversas nacionalidades no Brasil, a língua
portuguesa
acrescenta
periodicamente
novos
vocábulos
às
suas
normas,
principalmente à popular. Além disso, o português recebe muitas influências
lingüísticas através dos meios de comunicação: internet, televisão, rádio, jornal,
revista, etc. Muitas dessas influências não passam de modismos, porém, algumas se
perpetuam como vícios de linguagem, como é o caso do gerundismo, que está
ganhando espaço na língua portuguesa. Como primeiro aprende-se a falar, tudo
começa auditivamente, passando em seguida à oralidade, até chegar à escrita.
Segundo Joaquim Mattoso Câmara Jr., algumas palavras incorporadas ao
português são aportuguesadas. Isso aconteceu, e acontece, na área gastronômica,
principalmente quando proliferaram-se as redes de alimentação, que trouxeram para
o Brasil o modelo norte-americano das refeições rápidas (fast-food), cujos cardápios
traziam os nomes dos lanches em inglês. Diante dessa avalanche de nomes norteamericanos, o brasileiro não demorou a adaptá-los à sua língua. Daí, cheese-salad
tornou-se x-salada; cheese-egg virou x-egue; cheese-hamburger passou a ser xburger; hamburger, em português, já se escreve hambúrguer. Há também
26
adaptações do tipo: guaraná light ou diet, cream-cheese (queijo cremoso), hot-dog
(cachorro-quente), etc. Tanto os aportuguesamentos quando os empréstimos
lingüísticos aqui apresentados serviram, ou servem, apenas para descaracterizar a
língua portuguesa, sem contribuir para o seu enriquencimento. Muito pelo contrário,
empobrecem-na, visto que há uma submissão lingüística da língua oficial dentro da
própria pátria quando se aportuguesam termos estrangeiros pelo modo como são
ouvidos e como os mesmos são pronunciados. Trata-se de uma atitude onde não é
feito o mínimo esforço em procurar vocábulos equivalentes na própria língua, o que
manteria sua identidade.
O inglês, notadamente o norte-americano, influencia quase todos os idiomas
e o português não fica livre disso. Os exemplos acima são somente alguns dentre
tantos em muitas áreas. O gerundismo, por sua vez, advém de traduções literais de
tempos verbais da língua inglesa, principalmente os “perfect tenses” e futuro
formado por “going to”. Exemplificando essa afirmação, segue um resumo dos
tempos verbais citados com exemplos e traduções.
O gerúndio em inglês tem a terminação –ING. Os verbos terminados com a
letra “E”, perdem essa letra e são acrescidos da terminação –ING. Exemplos:
study - studying
eat – eating
drive - driving
Os verbos citados que usam o gerúndio são:
- Present perfect contínuos / progressive (presente perfeito contínuo ou
progressivo).
É formado pelo verbo have/has + verbo to be no particípio + verbo principal no
gerúndio.
27
É usado para:
•
indicar uma ação iniciada no passado, mas que continua no presente,
destacando a duração ou intensidade da mesma. Exemplo:
Peter and Bob have been studying since six o’clock.
A tradução literal dessa oração é:
Peter e Bob têm estado estudando desde seis horas.
Essa oração traduzida tem uma locução verbal com três verbos e apresenta
um gerundismo. Traduzindo adequadamente para o português, essa oração ficará
assim:
Peter e Bob estão estudando desde às seis horas.
Percebe-se, assim, que a mesma oração traz um enunciado claro e objetivo,
com o emprego correto do gerúndio.
•
indicar uma ação passada e já concluída, com efeitos e conseqüências no
presente. Exemplo:
I have a strong headache. I have been reading for hours.
Essa oração traduzida literalmente traz também um gerundismo:
Eu estou com dor de cabeça. Eu tenho estado estudando por horas.
A tradução adequada é a seguinte:
Estou com dor de cabeça. Eu fiquei estudando por horas.
Ou ainda:
Estou com dor de cabeça. Estou estudando há horas.
Nota-se que, em alguns casos, existe a possibilidade de traduzir o mesmo
enunciado de várias maneiras, desde que de forma adequada.
28
- Past perfect contínuos / progressive (passado perfeito contínuo ou
progressivo)
É formado pelo passado simples do verbo have (had) + verbo to be no
particípio + verbo principal no gerúndio.
Usado para enfatizar a repetição ou duração de uma ação anterior a outra
ação. Equivale ao pretérito-mais-que-perfeito no português. Exemplo:
She had been arriving two hours ago when her father saw her at the station.
└1a ação
└2a ação
A tradução literal dessa oração, que também apresenta gerundismo:
Ela tinha estado chegando duas horas atrás quando seu pai a viu na
estação.
Veja a tradução adequada:
Ela tinha chegado há duas horas, quando seu pai a viu na estação.
Percebe-se por esses exemplos, que os tempos verbais apresentados levam
sempre ao passado, embora algumas orações tragam conseqüências no presente.
Portanto, não se viram referências ao futuro.
- Futuro expresso por “going to”
É formado pelo verbo to be + going + verbo no infinitivo e expressa:
•
Intenção. Exemplo:
He is going to learn English to work in United States.
Veja a tradução literal da frase:
Ele está indo aprender inglês para trabalhar nos Estados Unidos.
A oração traduzida desse modo apresenta um gerundismo desnecessário
para a formação do futuro. Este é o adequado:
Ele vai aprender inglês para trabalhar nos Estados Unidos.
29
•
Planos futuros. Exemplo:
I am going to buy a new car next year.
A tradução literal é a seguinte:
Eu estou indo comprar um carro novo no próximo ano.
A tradução adequada:
Eu vou comprar um carro novo no próximo ano.
•
Prevê fatos futuros a partir de evidências no presente ou com grande
certeza. Exemplo:
The sky is dark. It is going to rain a lot.
A tradução literal é a seguinte:
O céu está escuro. Está indo chover muito.
A tradução adequada:
O céu está escuro. Vai chover muito.
Além do futuro formado com “going to”, há o futuro continuous / progressive
(futuro contínuo ou progressivo), formado pelo futuro simples do verbo to be (will be)
+ verbo principal no gerúndio.
•
Fala de ações que estarão em andamento no futuro, num momento
determinado. Exemplo:
At this time next year you will be majoring in law.
Traduzindo,
A essa hora, no próximo ano, você estará se formando em Direito.
30
•
Fala de atividades programadas para o futuro. Exemplo:
She will be going in for examination at the university in 2009.
Traduzindo,
Ela estará prestando exame na universidade em 2009.
Adaptado de:
(Longman, Gramática escolar da língua inglesa: com exercícios e respostas /
consultor pedagógico José Olavo de Amorim; revisora pedagógica Anna
Szabo. São Paulo: Longman, 2004. p. 120-134-142-152-154-164).
Observando os exemplos dos tempos verbais acima citados, conclui-se que
nem sempre é possível e nem mesmo correto fazer uma tradução literal. O tradutor
não tem o mero papel de traduzir palavra por palavra. Ele tem de ter um bom
conhecimento de ambas as línguas com as quais está trabalhando para fazer uma
tradução adequada ao idioma para o qual o texto será traduzido. Para isso, o
tradutor tem de aprender a “pensar” na língua para a qual sua tradução será feita: se
a tradução for do inglês para o português, o tradutor terá de “pensar em português”,
se o texto for traduzido do português para o inglês, o tradutor terá de “pensar em
inglês”. Repetindo, o tradutor não apenas traduz palavra por palavra e, sim, recria o
texto traduzido por meio de uma versão adequada.
Para que esses requisitos sejam cumpridos, foram criados os cursos de
tradução e interpretação, por volta dos anos 70. Nesses cursos, são ensinadas
técnicas de tradução e interpretação onde o futuro tradutor aprende a traduzir com
objetividade, coesão, correção e coerência, encontrando expressões e termos
equivalentes na língua para a qual o texto será vertido. Assim procedendo, no caso
31
da língua portuguesa, evita-se que mais ocorrências viciosas atinjam-na, conforme
vem ocorrendo com o gerundismo.
Como mencionado anteriormente, o gerundismo tem sua origem de traduções
literais, principalmente das construções verbais exemplificadas acima. Isso tornou-se
o mais recente vício de linguagem a prejudicar a identidade da língua portuguesa. O
gerundismo, além de ser uma má adaptação de construções gerundiais da língua
inglesa, disseminou-se principalmente pelo emprego abusivo que os operadores de
telemarketing praticam no atendimento ao cliente. Alguns desses atendentes
afirmam que, na fase de treinamento, receberam orientação para que usem essas
construções gerundiais por elas demonstrarem mais polidez e delicadeza no trato
com os clientes. Esses orientadores se esqueceram de que há outras maneiras de
tratar polida e delicadamente um cliente, sem ter de recorrer ao gerundismo. O tom
de voz, a entonação ao proferir um discurso, a colocação das palavras adequadas
ao contexto da mensagem ser transmitida, o emprego de modos e tempos verbais
próprios, a utilização de concordância nominal e verbal corretas, bem como de
regência nominal e verbal, tudo isso é capaz de fazer com que um cliente sinta-se
bem atendido e, com certeza, não o deixará tão irritado como quando ouve uma
enxurrada de gerundismos. Para isso, seria de grande propriedade que o
treinamento dado a esses atendentes não servisse apenas para orientá-los a
alcançarem metas de atendimento ao cliente. Ao lado disso, seria conveniente a
contratação de professores de língua portuguesa capazes de elaborar um curso
básico com noções de como empregar adequadamente os recursos lingüísticos
disponíveis para uma boa veiculação das orientações a serem recebidas pelo
cliente. Isso geraria funcionários mais eficientes no atendimento que é um dos
cartões de visita de uma empresa. E essa empresa, por conseguinte, não seria tão
32
prejudicada com funcionários que, por falta de orientação adequada, acabam
cansando os ouvidos dos clientes.
Não é demais repetir que, além dessa solução apontada, a principal
orientação deve acontecer nos bancos escolares, para que não haja necessidade de
remediar mais tarde um mal instalado. Professores com visão mais ampla do ensino
de língua portuguesa, ou seja, muito mais voltados à aplicação prática das regras do
bom emprego dos verbos do que simplesmente com a “decoreba” das conjugações,
contribuirão grandemente para que novos vícios de linguagem, como o gerundismo,
não tomem proporções tão absurdas.
Outra solução residiria na forma de correção adotada pelos professores de
português. Seria válido que, ao invés de somente apontarem os erros de uma
redação ou de respostas dissertativas de uma prova, os professores se
preocupassem mais em chamar atenção do aluno para o correto – por isso essa
atitude chama-se correção. Às vezes, o aluno depara-se com sua prova cheia de
anotações em vermelho, com comentários em tom de crítica, nem sempre
construtiva. Seria mais construtivo que o professor trocasse o tom crítico pelo tom de
orientação: ao lado do erro apontado, a diretriz de como proceder com correção na
próxima vez.
Celso Pedro Luft, em seu livro “Língua e Liberdade”, expressa-se com
propriedade sobre o papel do professor de português no seguinte trecho:
“O aluno precisa ser estimulado a apoiar-se na sua intuição da língua para
opinar sobre a qualidade de frases propostas – bem formadas / mal formadas, claras
/ obscuras, concisas / palavrosas, etc. Afinal, saber a língua não é só saber construir
e interpretar frases, mas também julgá-las, ver se observam regras implícitas
33
(gramaticalmente),
se
são
boas
para
a
comunicação
ou
“performance”
(aceitabilidade).
Exercícios de variabilidade expressional, paráfrases, transformações: Varie a
frase. Diga a mesma coisa de outra forma. Transforme essas frases numa só, ou
vice-versa.
Identificação e resolução de ambigüidade, variações de registro da linguagem
(formal / informal, mais ou menos formal) e outras práticas similares incutirão no
aluno a confiança no seu saber lingüístico, na sua criatividade. Em vez de inibir,
esse tipo de tratamento em sala de aula há de liberar os poderes de linguagem.
(Celso Pedro Luft. Língua e Liberdade. p. 65-66)
O mesmo ocorre na oralidade. Quando alguém fala errado, quem o corrige
não deve repetir o erro do emissor e sim falar enfatizando a forma correta. Exemplo
de um caso de gerundismo: se um individuo atendido por um operador de
telemarketing ouvir deste “vamos estar enviando um comunicado”, deve sutilmente,
corrigi-lo “ah, vocês vão me enviar um comunicado? Obrigado.” Assim mesmo,
dando ênfase à construção gerundial correta. Com certeza, surtirá mais efeito do
que uma correção contundente em tom de crítica.
Por fim, a responsabilidade das escolas de inglês; que elas não se
preocupem apenas com a conversação, já que a maioria delas tem como filosofia
não traduzir nada para o português. A orientação é para que se procurem
equivalências na própria língua inglesa, bastando saber o significado em português
apenas mentalmente. Porém, diante da necessidade de fazer uma tradução para a
língua portuguesa, a falta de prática e técnica pode levar a traduções literais
desastrosas, gerando, assim, fenômenos lingüísticos como o gerundismo.
34
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O objetivo dessa pesquisa é mostrar que não é necessário ditar normas, nem
criar novas regras para o emprego do gerúndio, mesmo porque elas já existem.
Muito mais do que estigmatizar o gerundismo como um fenômeno lingüístico nocivo
à língua portuguesa, este trabalho propõe-se a auxiliar a viabilização de um ensino
mais enfático e abrangente do emprego de gerúndio, forma nominal perfeitamente
adequada da língua portuguesa.
No ultimo capítulo, foi muito utilizado o tempo verbal futuro do pretérito do
modo indicativo, e não por acaso. Acontece que esse tempo indica condição. Por
isso, preferiu-se “residiria” a “reside” / “seria” a “é” / “geraria” a “gera” etc. Isso se
explica porque nesse capítulo foram sugeridos meios de solução para o emprego ou
não do gerundismo, bem como para outros problemas lingüísticos gerados por
outros vícios de linguagem, Assim sendo, as orações desse capítulo foram
construídas no futuro do pretérito do indicativo porque as sugestões nelas contidas
só serão viáveis SE houver boa vontade por parte de todas as pessoas e entidades
envolvidas no ensino de língua portuguesa. Essa é a principal condição, pois a
língua é construída por quem a utiliza. Seja essa utilização para falar, escrever,
ouvir, ensinar ou aprender. Não que seja obrigatória apenas a utilização do padrão
culto, mas que haja interesse de quem não o emprega em aprendê-lo para utilizá-lo
quando assim lhe convier.
Falar bem, escrever bem, ouvir bem, ensinar bem e aprender bem. Assim se
dá a construção e manutenção de uma língua que é o símbolo nacional mais
significativo de um país. É ela o instrumento vivo da comunicação.
Assim, pode-se concluir que o gerundismo afeta a língua portuguesa do
Brasil, e quanto a isso, uma reflexão: a identidade preservada de uma língua oficial é
que personaliza quem dela se utiliza.
35
REFERÊNCIAS
CEREJA, William Roberto / MAGALHÃES, Thereza Cochar., Gramática Reflexiva:
texto, semântica e interação. São Paulo: Atual Editora, 1999.
SACCONI, Luiz Antônio., Gramática essencial da língua portuguesa. 3ª ed., revista.
São Paulo: Atual Editora, 1988.
CAMARA Jr., Joaquim Mattoso., Dicionário de Lingüística e Gramática: referente à
língua portuguesa. 26ª ed., Petrópolis, RJ: Vozes, 2007.
LUFT, Celso Pedro., Língua e Liberdade. 8ª ed., São Paulo: Ática, 2006.
PELLEGRINI, Tânia / FERREIRA, Marina., Português palavra e arte: literatura,
gramática e redação, vol. 3, São Paulo: Atual Editora, 1996.
NETO, Pasquale Cipro. Inculta e Bela, vol. 3. São Paulo: Publifolha, 2001.
MEIO ELETRÔNICO
http://www1.folha.uol.com.br/folha/publifolha/ult10037u362760.shtml, consultado em
11/09/2008.
http://pt.wikipedia.org/wiki/Gerundismo, consultado em 11/09/2008.
http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u333074.shtml,
11/09/2008.
consultado
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