PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Psicologia CONFIGURAÇÃO DOS SENTIDOS SUBJETIVOS DE INDIVÍDUOS IDOSOS SUBMETIDOS À CIRURGIA DE REVASCULARIZAÇÃO DO MIOCÁRDIO NO MUNDO PÓS-MODERNO: um estudo de caso na perspectiva de Viktor Emil Frankl Letícia Viecili Pereira Landi Belo Horizonte 2008 Letícia Viecili Pereira Landi CONFIGURAÇÃO DOS SENTIDOS SUBJETIVOS DE INDIVÍDUOS IDOSOS SUBMETIDOS À CIRURGIA DE REVASCULARIZAÇÃO DO MIOCÁRDIO NO MUNDO PÓS-MODERNO: um estudo de caso na perspectiva de Viktor Emil Frankl Dissertação apresentada ao Programa de Pósgraduação Stricto Sensu em Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para a obtenção do título de mestre em Psicologia. Orientadora: Jacqueline Moreira de Oliveira Belo Horizonte 2008 FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais L257c Landi, Letícia Viecili Pereira Configuração dos sentidos subjetivos de indivíduos idosos submetidos à cirurgia de revascularização do miocárdio no mundo pós-moderno: um estudo de caso na perspectiva de Viktor Emil Frankl / Letícia Viecili Pereira Landi. Belo Horizonte, 2008. 199f. : Il. Orientadora: Jacqueline Moreira de Oliveira. Dissertação (Mestrado) - Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Psicologia 1. Significação (Psicologia). 2. Pós-modernismo. 3. Idoso. 4. Cirurgia. 5. Coração – Doenças – Pacientes – Reabilitação. 6. Logoterapia I. Oliveira, Jacqueline. II. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de PósGraduação em Psicologia. III. Título. CDU: 141.32 Letícia Viecili Pereira Landi Configuração dos sentidos subjetivos de indivíduos idosos submetidos à cirurgia de revascularização do miocárdio no mundo pós-moderno: um estudo de caso na perspectiva de Viktor Emil Frankl. Dissertação apresentada ao Programa de Pósgraduação Stricto Sensu em Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, __________________________________________________________ Jacqueline Moreira de Oliveira (Orientadora) – PUC Minas __________________________________________________________ Márcia Braz Rossetti – PUC Minas __________________________________________________________ José Paulo Giovanetti – FEAD – Minas Belo Horizonte, 16 de dezembro de 2008. AGRADECIMENTOS Agradeço primeiramente a Deus, pelo apoio silencioso e infinito. Em especial, aos meus pais, Landi e Marialda, alicerces divinos em todos os sentidos de minha vida. Ao meu irmão Gustavo, pelas conversas animadoras e debates sobre Frankl. A todos os meus colegas de mestrado, principalmente a Suzana de Albuquerque Paiva e a Cristiano Borro, pelo apoio, ensino e incentivo. Aos meus colegas de profissão, em especial a Danielle, Anna Marina, Naiara, Kelly, Fernanda, André, Carolina, Marina, Sílvia, Luciana, Douglas e Luiz Júnior, sempre dispostos a ajudar. Aos meus alunos e alunas, principalmente a Danielle e Marina, pela contribuição, oportunidade de crescimento e aprendizagem. Ao cardiologista Dr. Antônio José da Luz Filho, pelo ensino e exemplo de profissionalismo. À Marília e ao Celso, pela palavra sempre amiga e pelo trabalho em meu auxílio. A todos os professores do Mestrado, pelos ensinamentos. Aos pacientes participantes desse estudo, pela colaboração mesmo diante do acontecimento da cirurgia. A eterna mestra Lílian Pinto da Silva, fonte de inspiração e amizade verdadeira. As minhas amigas Elisa, Gracielle, Valéria, Mary, Juliana, Leila e Ângela, pelo apoio e carinho. Ao meu amor, Francisco, luz da minha vida, pela cumplicidade, amor e carinho incondicionais. E a minha querida orientadora, Jacqueline, pela imensa dedicação, paciência, apoio, entusiasmo e carinho com que sempre me tratou, nunca deixando de acreditar que, mesmo em meio às minhas dificuldades, o nosso trabalho seria possível. Obrigada, Jacque, do fundo do meu coração! “Poema do Coração Eu queria que o Amor estivesse realmente no coração, e também a Bondade, e a Sinceridade, e tudo, e tudo o mais, tudo estivesse realmente no coração Então poderia dizer-vos: ‘Meus amados irmãos, falo-vos do coração’, ou então: ‘com o coração nas mãos’. Mas o meu coração é como o dos compêndios Tem duas válvulas (a tricúspide e a mitral) e os seus compartimentos (duas aurículas e dois ventrículos). O sangue a circular contrai-os e distende-os segundo a obrigação das leis dos movimentos. Por vezes acontece ver-se um homem, sem querer, com os lábios apertados e uma lâmina baça e agreste, que endurece a luz nos olhos em bisel cortados. Parece então que o coração estremece. Mas não. Sabe-se, e muito bem, com fundamento prático, que esse vento que sopra e ateia os incêndios, é coisa do simpático. Vem tudo nos compêndios. Então meninos! Vamos à lição! Em quantas partes se divide o coração?” Antônio Gedeão RESUMO Este estudo procurou elucidar como os processos psicossociais do mundo pós-moderno, vinculados à teoria frankliana, podem contribuir para a dificuldade de ingresso de indivíduos idosos na Fase 3 de um programa de Reabilitação Cardíaca (RC). Seu objetivo foi compreender os sentidos subjetivos que são despertados em pacientes idosos, após uma cirurgia de revascularização do miocárdio (CRVM) na Fase 2 da RC. Foi realizada uma pesquisa teórica de cunho temático e histórico e uma pesquisa de campo. O estudo teórico temático foi destinado às questões do vazio existencial e do sentido da vida na contemporaneidade, ambas fundamentadas na teoria de referência, ou seja, a Logoterapia, de Viktor Emil Frankl. Também foram abordados a Doença Arterial Coronariana, a CRVM, a RC e o Envelhecimento. Paralelamente a este estudo, foi feito um levantamento histórico contextual sobre a Pós-modernidade, a cirurgia cardíaca e a Fisioterapia. Para o trabalho de campo, foi utilizada a pesquisa clínico-qualitativa, cuja metodologia adotada foi o estudo de caso. O estudo de caso empregou como coleta de dados duas entrevistas semi-estruturadas, aplicadas em um indivíduo do sexo masculino, de 64 anos de idade e que fora submetido à CRVM. Em seguida, apontou, através de cinco categorias (o trabalho, o sofrimento, o outro, a religião e o corpo), quais os principais sentidos subjetivos produzidos pelo sujeito da pesquisa, nos pósoperatórios inicial e tardio de CRVM. Os resultados mostram que o sujeito do estudo configurou sentidos subjetivos de revolta e tentativa de manutenção da dignidade frente ao sofrimento produzido pela cirurgia, e que tal configuração não foi capaz de suprir o vazio existencial presente em sua vida. Sendo assim, este estudo lança a hipótese de que os impactos pós-operatórios da CRVM, no contexto pós-moderno, são capazes de produzir sentidos subjetivos que denotam carência de significado para a vida. E que, portanto, fatores psicossociais como a depressão e o isolamento social, aliados aos poucos recursos de enfrentamento que os idosos dispõem no Brasil, podem contribuir para a dificuldade de ingresso desses indivíduos na Fase 3 de um programa de RC. Palavras-chave: Pós-Modernidade. Sentido. Idoso. Cirugia. Coração. Logoterapia. Reabilitação. ABSTRACT This study intended to elucidate how the psychosocial processes of the post-modern world, linked to Frankl’s theory, can contribute to the difficulty elders have on entering Phase 3 of the Cardiac Rehabilitation’s program (CR). Its objective was to understand the subjective senses that are developed in elderly patients after a myocardial revascularization surgery (MRS) on Phase 2 of CR. A theoretical research, of historical and thematic natures, and a field work were done. The theoretical-thematic study was destinated to understand the subjects of the existencial emptiness and the life’s sense in the contemporaneity, both based on the referential theory, the Logotherapy of Viktor Emil Frankl. It was also talked about the Coronary Artery Disease, CAD, the CR, and Aging. In parallel to this study, it was done a historical contextual survey about Postmodernity, the cardiac surgery, and Physiotherapy. To the field work, it was applied qualitative clinical research, with case study methodology. The case study applied as data collecting semi-structured interviews, done with a 64 years old male individual, submitted to a MRS. After that, it pointed out, through five categories (work, suffering, the other, religion, and the body), which the principal subjective senses produced by the individual of the survey were, in the initial and the late post-operatories of the MRS. The results show the individual studied developed subjective senses of revolt and tentative of maintaining dignity in face of the suffering produced by the surgery, and that this configuration was not able to supply the existencial emptiness present in his life. This way, this study launches the hypothesis that the post-operatory impacts of MRS, in post-modern context, are able to produce subjective senses which denote lack of life sense. And that, therefore, psychosocial factors as depression and social isolation, allied to the few coping resources elders have in Brazil, can contribute to the difficulty these individuals have of entering Phase 3 of a CR’s program. Keywords: Post-Modernity. Sense. Elder. Surgery. Heart. Logotherapy. Rehabilitation. LISTA DE FIGURAS FIGURA 1 Construçao de uma ponte miocárdica ....................................................... 76 LISTA DE TABELAS TABELA 1 Índice de Percepção de Esforço (IPE) de Borg ........................................ 92 LISTA DE QUADROS QUADRO 1 Programa de STEPS na Fase 1 ............................................................... 94 QUADRO 2 Principais modificações dos fatores de risco .......................................... 96 QUADRO 3 Necessidades calóricas aproximadas para atividades selecionadas ........ 98 QUADRO 4 Efeitos Cardiovasculares do Treinamento a Longo Prazo ...................... 114 QUADRO 5 Sentidos subjetivos produzidos no pós-operatório inicial e tardio ......... 140 LISTA DE ABREVIATURAS Dr. – Doutor ed. – Edição Ed.– Editor(es) f. – folha(s) Coord. – Coordenador Cols. – Colaboradores n. – número Org. – Organizador(es) p. – página(s) supl. – suplemento Sr. – Senhor v. – volume LISTA DE SIGLAS AO – Aórtica CEC – Circulação extracorpórea CRVM – Cirurgia de Revascularização do Miocárdio CTI – Centro de Tratamento Intensivo DAC – Doença Arterial Coronariana EC – Estudo de Caso EUA – Estados Unidos da América FC – Freqüência Cardíaca FC máx – Freqüência Cardíaca Máxima FCT – Freqüência Cardíaca de Treinamento FCR – Freqüência Cardíaca de Repouso HDL – Lipoproteínas de alta densidade IAM – Infarto Agudo do Miocárdio IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IDL – Lipoproteínas de densidade intermediária IPE – Índice de Percepção do Esforço de Borg LDL – Lipoproteínas de baixa densidade MET – Equivalente Metabólico METS – Equivalentes Metabólicos MG – Minas Gerais MI – Mitral OMS – Organização Mundial da Saúde OPAS – Organização Panamericana da Saúde PA – Pressão Arterial PNAD – Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílios RC – Reabilitação Cardíaca UI – Unidade de Internação VLDL – Lipoproteínas de muito baixa densidade VO2 – Consumo de oxigênio VO2máx – Consumo máximo de oxigênio SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 15 2 METODOLOGIA .................................................................................................... 23 3 A PÓS-MODERNIDADE, O VAZIO EXISTENCIAL E A QUESTÃO CARDÍACA ................................................................................................................. 31 3.1 Modernidade .......................................................................................................... 31 3.2 Transição da Modernidade para a Pós-Modernidade ....................................... 36 3.3 A Pós-modernidade, o Vazio Existencial e a Doença Arterial Coronariana .... 42 4 DOENÇA ARTERIAL CORONARIANA ............................................................. 53 4.1 Definição ................................................................................................................. 53 4.2 Epidemiologia ......................................................................................................... 53 4.3 Fisiopatologia ......................................................................................................... 54 4.4 Fatores de Risco Coronariano .............................................................................. 59 4.4.1 Fatores de Risco Não Modificáveis .................................................................... 60 4.4.2 Fatores de Risco Modificáveis ............................................................................ 61 4.5 Manifestações Clínicas .......................................................................................... 65 4.6 Formas de Tratamento .......................................................................................... 68 4.6.1 A Cirurgia de Revascularização do Miocárdio .................................................. 68 4.6.1.2 A História da Cirurgia Cardíaca ................................................................... 68 4.6.1.3 A Indicacão da CRVM .................................................................................... 74 4.6.1.4 O procedimento cirúrgico ............................................................................... 75 4.6.1.5 A Fisioterapia no Pós-Operatório de CRVM ................................................ 77 4.6.1.5.1 A História da Fisioterapia ............................................................................... 78 4.6.1.5.2 A Fisioterapia Respiratória no Pós-operatório de CRVM .............................. 85 4.6.1.5.3 A Reabilitação Cardíaca no Pós-operatório de CRVM .................................. 87 5 O ENVELHECIMENTO, A CRVM E O IDOSO ............................................... 105 5.1 Definição de Envelhecimento .............................................................................. 105 5.2 Modificações Funcionais Orgânicas Associadas ao Envelhecimento .............. 106 5.3 Modificações Psicológicas Associadas ao Envelhecimento .............................. 111 5.4 Efeitos Benéficos do Exercício Físico para o Idoso ........................................... 114 5.5 O Impacto da CRVM sobre o Idoso ................................................................... 116 6 SOBRE O SENTIDO DA VIDA ............................................................................ 119 6.1 A Questão Geral do Sentido ............................................................................... 119 6.2 A Questão do Sentido em Frankl ....................................................................... 121 6.3 O Coração/Consciência como Órgão de Sentido .............................................. 124 7 ANÁLISE DAS ENTREVISTAS .......................................................................... 126 7.1 A Primeira Entrevista ......................................................................................... 127 7.2 A Segunda Entrevista .......................................................................................... 132 7.3 Análise Final das Entrevistas .............................................................................. 139 8 CONCLUSÃO ......................................................................................................... 142 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 146 ANEXOS ..................................................................................................................... 159 15 1. INTRODUÇÃO O tema deste estudo é o indivíduo idoso e seus sentidos subjetivos, após ter sido submetido a uma cirurgia de revascularização do miocárdio (CRVM)1, no contexto da Pós-modernidade. Foram adotados, como principal referência teórica, os fundamentos da Logoterapia, de Viktor Emil Frankl,sobre o qual Roehe nos fala: Frankl propôs como tema central para a compreensão do ser humano e a conseqüente intervenção terapêutica, a questão do sentido da vida. Em seu pensamento, a vontade de sentido (logos) é a motivação principal do homem. Daí o nome de sua teoria: Logoterapia. (ROEHE, 2005, p.311) De acordo com Frankl (1978), o ser humano vive motivado, fundamentalmente, pela vontade de encontrar um sentido para a vida. Para encontrar tal sentido ele deve se dedicar à realização de valores, que estão vinculados ao amor por alguém ou por alguma causa, à execução de um trabalho, à dor ou ao sofrimento e à fé. Sou Fisioterapeuta e trabalho em um hospital. A idéia de pesquisar os indivíduos idosos pós-operados surgiu através de um fato que observei em minha própria experiência prática. Notei que os idosos pós-operados apresentam dificuldades para ingressar na Fase 3 da Reabilitação Cardíaca (RC). De acordo com Moraes et al, a Organização Mundial de Saúde (OMS) define a RC como sendo: [...] o somatório das atividades necessárias para garantir aos pacientes portadores de cardiopatia as melhores condições física, mental e social, de forma que eles consigam, por seu próprio esforço, reconquistar uma posição normal na comunidade e levar uma vida produtiva e ativa. (MORAES et al, 2005, p.432) Os autores citados, também informam que: [...] os programas de Reabilitação Cardíaca, além de dar ênfase à prática da atividade física, também envolvem outras ações desenvolvidas por profissionais das áreas de enfermagem, nutrição, assistência social e psicologia, visando modificar outros aspectos que contribuem com a diminuição do risco cardíaco de forma global. (MORAES et al, 2005, p.432) Segundo Meneghelo, Ferraz e Ghorayeb (1993); Castro et al, (1995); Buchler, Ferraz e Meneghelo (1996), Regenga, Perondini e Mafra (2000); Silva e Catai (2000); Alves et al (2005); Carvalho et al (2006) e Filho (2008), a RC divide-se, didaticamente, em 4 fases: 1 A cirurgia de revascularização do miocárdio é conhecida popularmente como “ponte de safena”. 16 − Fase 1 (Fase Hospitalar): inicia-se com o evento coronário e vai até a alta hospitalar. Nessa fase, o fisioterapeuta informa a intensidade, duração e freqüência da atividade física que será realizada após a alta. − Fase 2 (Fase de Convalescença Pós-Hospitalar): corresponde às atividades de reabilitação desenvolvidas no período de convalescença. Inicia-se a partir da alta hospitalar, podendo se estender por 2 a 3 meses. Nesta fase, os exercícios físicos podem ser supervisionados ou não. Geralmente o que se observa é que o paciente segue as orientações da Fase 1, realizando as atividades físicas por conta própria. Nessa fase, o paciente também retorna ao médico para uma reavaliação clínica. − Fase 3 (Fase de Ganho Funcional Supervisionado): Nessa fase, o principal objetivo passa a ser o incremento do condicionamento físico do paciente. Pode durar de 3 a 6 meses. − Fase 4 (Fase de Manutenção Não Supervisionada): A duração dessa fase é indefinida, pois a manutenção do grau de condicionamento físico máximo é o que irá assegurar o controle da DAC, prevenindo novos eventos coronarianos. Muitos pacientes, em especial os idosos, quando retornam ao hospital para fazer consultas ou exames de controle, ainda mantêm os mesmos hábitos de vida considerados nocivos para a saúde do coração. Eles parecem não se importar com as advertências e recomendações médicas e fisioterapêuticas, mesmo após terem sofrido um evento considerado traumático como uma cirurgia cardíaca. Eles realizam as atividades da Fase 2 por um tempo e depois abandonam a prática regular de exercícios físicos, bem como o controle dos fatores de risco coronariano. Durante a fase pós-operatória de uma cirurgia cardíaca, o paciente e sua família necessitam fazer ajustes sociais e psicológicos. Problemas psicológicos como ansiedade e depressão são praticamente universais e podem se tornar crônicos, a não ser que sejam previstos e prevenidos com uma correta orientação. Problemas dessa ordem permanecem sendo uma grande dificuldade para a reabilitação em um terço dos pacientes, apesar da melhora física (CASTRO et al, 1995; FEITOSA et al, 2000). Nesse sentido, Pinheiro, Pinheiro e Marinho revelam que: [...] um programa de reabilitação cardíaca deveria abranger muito mais que treinamento físico. Paralelamente, deveria proporcionar aos seus pacientes 17 um programa de educação em saúde, para uma necessária e real mudança nos hábitos de vida, com a presença de uma equipe multidisciplinar composta por médicos, fisioterapeutas, educadores físicos, enfermeiros, nutricionistas e psicólogos. A presença do psicólogo é importante na promoção de saúde após o infarto agudo do miocárdio, visto que muitos estudos mostram que esses pacientes têm sintomas de depressão e ansiedade. (PINHEIRO, Denise; PINHEIRO, Carlos; MARINHO, 2007, p. 218, grifo nosso) Sendo assim, em se tratando de Reabilitação Cardíaca, a abordagem multiprofissional permite um enlace entre a Fisioterapia e a Psicologia. Quaisquer conhecimentos produzidos e intercambiados entre essas ciências podem trazer melhorias que irão refletir diretamente sobre a qualidade de vida dos pacientes: “A melhora psicológica marcante pode ser o aspecto mais notável de um programa de reabilitação e tem capacidade suficiente para integrar o paciente no meio social o mais rápido possível.” (FEITOSA et al, 2000, p.44) Com base nesses fatos, a seguinte pergunta foi levantada: Como os processos psicossociais da pós-modernidade estariam envolvidos no período de convalescença pós-operatório desses indivíduos e por que esses processos poderiam estar influenciando na sua dificuldade em ingressar na Fase 3 de um programa de RC? Dessa forma, o meu interesse pela Psicologia se tornou maior e essa foi a problemática de estudo escolhida para meu Mestrado. Conseqüentemente, a área de concentração para a qual fui encaminhada foi a de Processos Psicossociais. Desde então, viemos trabalhando no tema proposto. A seguir, descreverei, de maneira sucinta, como este trabalho foi elaborado. Para responder à pergunta proposta, escolhemos a teoria frankliana. As obras desse autor pertencem à corrente da Psicologia Existencial. A teoria existencial em Frankl compreende o ser humano de forma holística. O autor expressa nas bibliografias que constituem seus estudos antropológicos uma insatisfação com o que ele define como um reducionismo ontológico e antropológico. Ambos estão presentes nas teorias psicológicas que precedem o sistema teórico da Logoterapia. Em virtude disso, Frankl propõe um sistema psicoterapêutico que abrange a pluridimensionalidade do ser humano, e que, portanto, inclui as dimensões espiritual e transcendente do homem: Espiritual, neste sentido, é usado sem nenhuma conotação religiosa, mas simplesmente para indicar que estamos lidando com um fenômeno especificamente humano (em contraposição aos fenômenos subumanos que compartilhamos com os animais). Em outras palavras, o espiritual é o que há de humano na pessoa. (FRANKL, 1985, p.21, grifos do autor) 18 Portanto, ao optarmos pela palavra sentido, assumimos uma posição interpretativa, que pensa o homem como ser espiritual, e a realização do sentido pressupõe que ele seja livre e responsável. Nas palavras de Frankl: Imaginem um macaco ao qual se aplicam injeções dolorosas necessárias para a preparação de um soro contra a poliomielite. Poderá ele chegar a compreender que seu sofrimento é necessário e qual a sua causa? [..] o mundo dos homens não lhe é acessível [...] não seria mais legítimo supor que, acima do nosso mundo, há um outro que não conseguimos alcançar, cujo sentido, cujo supersentido, poderia dar ao sofrimento do homem na terra um sentido? (FRANKL, 1978, p. 48) Dessa maneira, quando propomos o estudo dos sentidos subjetivos de idosos submetidos à CRVM, estamos pesquisando as manifestações de sensações, sentimentos e reflexões produzidas por esses indivíduos a respeito de suas vidas, quando estas são influenciadas e/ou atingidas por acontecimentos pessoais, sociais e históricos. No caso deste estudo, o acontecimento de destaque é a CRVM. Romano (1994a) nos revela que a cirurgia de revascularização do miocárdio, assim como qualquer outra cirurgia cardíaca, é cercada de expectativas tanto por parte do paciente como de sua família, pois se trata de uma cirurgia de grande porte, que envolve um órgão vital carregado de uma simbologia estritamente ligada às emoções e aos sentimentos. Para a autora, “o coração, do ponto de vista leigo, é um órgão (e somente ele) binário: ou vida ou morte. Um órgão que durante milênios tem sido considerado sede de emoções, fonte do amor e mesmo centro de intelecto” (ROMANO, 1994a, p. 56). Portanto, diante das situações de confronto impostas pela ocasião da cirurgia, como, por exemplo, vida versus morte, sofrimento versus superação, angústia versus euforia, produtividade versus invalidez, não há quem deixe de atribuir uma representação simbólica ao coração, ou seja, à própria vida, revestindo-a, pois, de sentidos subjetivos (CAMPOS, 1992; ROMANO, 1994a). Frankl nos fala que o “Sentido precisa ser encontrado, mas não pode ser produzido. Aquilo que se pode produzir ou é sentido subjetivo, mera sensação de sentido (Sinngefühl), ou é absurdo.” (FRANKL, 1985, p.64, grifo do autor). Na busca pelo sentido da vida, é a consciência que orienta o ser humano. O encontro com o sentido da vida pressupõe a escolha e a realização de valores. Os valores podem ser representados por uma situação individual, única, ou por um conjunto de princípios morais e éticos cristalizados na sociedade humana, aquilo que Frankl chamou de sentidos universais. Quem nos orienta a escolher um valor capaz de desvelar um sentido para a vida é a consciência. Frankl definiu a consciência como o “órgão do sentido” 19 (FRANKL, 1978, p.19, grifo do autor). No entanto, a própria consciência pode enganar a pessoa, conforme nos revela Frankl: [...] na busca do sentido, o homem é orientado pela consciência [...] contudo, convém ter-se em conta que a consciência pode induzir o homem em erro. Mas há mais: até o momento derradeiro, até o último suspiro, não sabe o homem se efetivamente realizou o sentido de sua vida, ou se a respeito dele viveu na ilusão: Ignoramos et ignorabimus (desconhecemos e desconheceremos). (FRANKL, 1990a, p.18-19, grifo do autor, tradução nossa) Portanto, durante os vários acontecimentos da vida nos quais os sentidos subjetivos são produzidos, o sentido da vida pode ou não vir a ser encontrado. Daí a importância de se investigar os sentidos subjetivos nas suas mais diferentes configurações2. A nossa hipótese é de que essas configurações podem revelar processos psicossociais relacionados à dificuldade de ingresso dos indivíduos idosos submetidos à CRVM na Fase 3 da RC. A teoria frankliana nos dá o respaldo necessário para tal empreendimento. Ela abarca o ser humano em todas as suas dimensões (física, psíquica, social e espiritual) e nos permite articular essas dimensões com fatores da atualidade (pós-modernidade). Sendo assim, traçamos o seguinte objetivo geral: Compreender os sentidos subjetivos que seriam despertados em pacientes idosos, após uma cirurgia de revascularização do miocárdio, na Fase 2 da Reabilitação Cardíaca, no contexto pós-moderno. Considerando como marco teórico os princípios da Logoterapia, de Viktor Emil Frankl. Em seguida, definimos os objetivos específicos: − Identificar, a partir de uma leitura frankliana, quais sentidos subjetivos são despertados no idoso nos pós-operatórios inicial3 e tardio da CRVM, no contexto pós-moderno. − Compreender, com base na teoria de Viktor Emil Frankl, por que os sentidos subjetivos são importantes para a dinâmica psíquica do idoso na pós-modernidade. 2 “A configuração é um sistema dinâmico que expressa um sentido psicológico particular e, simultaneamente, aparece como ampliada e articulada com outras configurações que entram em outro sistema de sentido da personalidade. Toda configuração subjetiva responde tanto a determinantes intrapsíquicos, que expressam a integração e desintegração pertinentes de configurações mais amplas, mais relevantes, quanto à atividade do sujeito, interativo e pensante.” (REY apud REY, 1997, p.4). 3 Consideramos como pós-operatório inicial, o período de até 30 dias após a cirurgia e como pósoperatório tardio, o período de 2 a 6 meses após a cirurgia. 20 − Entender, pela ótica frankliana, como os sentidos subjetivos e suas configurações podem contribuir para o posicionamento deste idoso diante da vida, em sua nova condição de pós-operado. A OMS (WHO, 1999) categoriza os idosos da seguinte forma, utilizando como parâmetro a idade cronológica dos indivíduos: aqueles com 65 anos ou mais (países desenvolvidos) ou 60 anos ou mais (países em desenvolvimento) são denominados idosos, e aqueles com 80 anos ou mais são denominados grandes velhos. O crescimento da população idosa é um fenômeno mundial. Dados recentes da Pesquisa Nacional de Amostras por Domicílios do IBGE (BRASIL, 2005) revelam que, no Brasil, houve um aumento significativo da população idosa, de 4%, em 1940, para 9,6%, em 2004, indicando que, em 2020, esse segmento populacional poderá atingir 15% do total de brasileiros. Diante desse fato, existe a necessidade de que as ciências ligadas à saúde desenvolvam pesquisas que possam favorecer a qualidade de vida desses indivíduos (COUTO; KOLLER; NOVO, 2006). A doença arterial coronariana (DAC) é também conhecida por outros termos referidos na literatura, como: doença cardíaca coronariana, doença aterosclerótica coronariana ou coronária, aterosclerose coronariana, cardiopatia aterosclerótica coronariana ou ainda doença coronariana aterosclerótica (RAMOS, José, 1997). A principal causa de DAC é a aterosclerose. A aterosclerose é uma doença inflamatória crônica, de origem multifatorial, que ocorre em resposta a uma agressão ao endotélio, a camada interna (íntima) das artérias. A lesão no endotélio evolui para a formação de uma placa de ateroma, composta principalmente por lipídeos (gorduras) e tecido fibroso. O crescimento da placa de ateroma causa a diminuição progressiva da luz da artéria, podendo chegar à obstrução total da mesma, dificultando ou mesmo impedindo a passagem do sangue. Quando a aterosclerose acomete as artérias do coração (coronárias), ela pode provocar angina, (dor) no peito, infarto agudo do miocárdio (IAM), insuficiência cardíaca e até a morte (ZORNOFF et al, 2005; SPOSITO et al, 2008). A idade é o fator de risco mais importante para a doença arterial coronariana, sendo que, para cada década de vida após os 55 anos de idade, a freqüência do infarto mais do que duplica, tanto em homens como em mulheres (HEGALSON; WOLF, 1997). 21 Dentre as doenças que acometem a população idosa, as cardiovasculares degenerativas são as que mais causam mortes. Nos indivíduos acima de 70 anos, estimase uma incidência de 70% de doença arterial coronariana (LÓLIO et al, 1995; IGLEZIAS et al, 1993; SOUZA et al, 1990). Sendo a idade um determinante da aterosclerose coronariana, admite-se que um número crescente de idosos será submetido à cirurgia de revascularização do miocárdio e/ou outros métodos terapêuticos4 (GARCIA et al, 1995; SILVA, Luiz; NASCIMENTO; VIOTTI Jr.,1997). Já é um consenso, internacionalmente, o fato de que, após uma CRVM, a participação do paciente em um programa de Reabilitação Cardíaca faz parte do tratamento pós-cirúrgico e, logicamente, da DAC (GODOY et al, 1997; MORAES et al, 2005). Porém, infelizmente, essa não é uma realidade no Brasil (CARVALHO, 2008). Sobre esse assunto, Freitas (2008) informa que: Apesar do ainda pequeno número de trabalhos com idosos e reabilitação, é indiscutível a melhora de capacidade funcional desse grupo, justificando maior difusão dos benefícios da atividade física regular e dos programas de reabilitação para essa faixa etária. (FREITAS, Elizabeth,2008) Além disso, Araújo et al revelam que: “a participação efetiva em programas de reabilitação tende a promover benefícios de natureza psicológica e a melhorar os níveis de aderência à terapêutica farmacológica” (ARAÚJO, Cláudio et al, 2004, p. 448). Considerando os argumentos expostos acima, encontramos a justificativa para investigar e compreender os sentidos subjetivos que o idoso apresenta após a CRVM, e, também, para construir o conhecimento acerca das implicações da produção de tais sentidos subjetivos para a vida desse idoso. Tal empreendimento visa elucidar aspectos psicossociais envolvidos na dificuldade de ingresso dos idosos na Fase 3 de um programa de RC. Com esse propósito, poderemos contribuir para reduzir o hiato que existe entre a Fase 2 e a Fase 3 da RC. No Capítulo 2, tratamos da metodologia de pesquisa utilizada e das particularidades de sua implementação. No capítulo seguinte, passamos a lente frankliana sobre a pós-modernidade. Nessa terceira parte, contextualizamos a Pós-modernidade, a partir dos autores Krishan Kumar e David Harvey. Estudamos a Pós-modernidade principalmente pela sua influência na transformação de estruturas essenciais determinantes de sentido para o 4 A aterosclerose coronariana pode ser tratada clinicamente, e/ou por cirurgia cardíaca, e/ou por angioplastia (FEITOSA et al, 2000). 22 indivíduo, como, por exemplo, as tradições. Dessa maneira, relacionamos aspectos do vazio existencial5 descrito em Frankl com a Pós-modernidade. Para isso, nos fundamentamos também no autor Christopher Lasch, que trouxe uma contribuição especial sobre o aspecto psicossocial da velhice em tempos pós-modernos. Por fim, o estudo da relação entre o vazio existencial e a incidência de DAC foi também realizado. Esse último teve por intuito esclarecer a aplicação dos conceitos franklianos ao propósito da pesquisa. No Capítulo 4, tratamos de aspectos específicos da DAC e suas formas de tratamento, especialmente a CRVM. Contamos a história da cirurgia cardíaca desde os seus primórdios até chegar à revascularização do miocárdio. Estudamos também a Fisioterapia, sua história e seu papel desde o pós-operatório imediato de CRVM até a Reabilitação Cardíaca. Sobre a Reabilitação Cardíaca, contamos um pouco de sua história e descrevemos suas diferentes fases e seus respectivos objetivos, detalhando o trabalho do fisioterapeuta e a contribuição do psicólogo nesse processo. No quinto capítulo, abordamos o conceito e as características do envelhecimento, os benefícios da prática de exercício físico para o idoso e os aspectos psicológicos da CRVM em pacientes dessa faixa etária. O sexto capítulo foi dedicado à questão geral do sentido da vida e às formas de encontro desse sentido pela teoria de Viktor Emil Frankl. A relevância desse capítulo está no fato de que essa teoria do sentido foi o viés principal da análise dos resultados deste estudo. O sétimo e o oitavo capítulos se compõem da análise das entrevistas, feita através da metodologia do estudo de caso, e da conclusão do estudo, respectivamente. 5 Vazio existencial: expressão cunhada por Viktor Emil Frankl e que pode ser entendida como “uma condição humana, aparentemente normal, onde as pessoas não conseguem encontrar um sentido para suas vidas” (RODRIGUES, 1991, p.185). 23 2 METODOLOGIA Para a abordagem da problemática deste estudo, foi realizada uma pesquisa teórica e uma pesquisa de campo. A pesquisa teórica permitiu uma aproximação do conhecimento hermenêutico relacionado ao objeto e a pesquisa de campo, um diálogo teórico-empírico. Segundo Demo (2000, p. 20), “a pesquisa teórica tem como fundamento chave a reconstrução de teorias, conceitos, idéias, ideologias e polêmicas, objetivando, em termos imediatos, aprimorar fundamentos teóricos de uma área do conhecimento colocada em questão”. A metodologia de pesquisa teórica não visa o questionamento do referencial teórico eleito para a argumentação e construção do estudo proposto. O que Demo (2002, p. 31) nos esclarece é que “o referencial teórico representa a fiel balança da pesquisa, porque é nele que se encontram soluções para a maioria das dúvidas, tais como: que dados interessam, que dados produzir, o que ler, o que é pertinente para ainda ser visto e trabalhado”. O trabalho de pesquisa teórica é o trabalho de objetivação. Tem por finalidade tornar constante a presença do objeto, isto é, tornar o trabalho objetivo. Dispõe-se a responder a uma problemática levantada, seja para confirmar ou para refutar a sua veracidade. A partir dos dados coletados por levantamento bibliográfico, o trabalho teórico permite um tratamento e uma elaboração condizentes com o objeto a ser pesquisado. Dessa maneira, consente ao pesquisador a liberdade para a elaboração de seu próprio texto, contendo discussões e reflexões pessoais. A análise crítica da informação também se constitui como elemento central de uma pesquisa teórica (DEMO, 2002). Em defesa da utilização da pesquisa teórica em nosso estudo, colocamos a seguinte exposição de Demo: É certamente condição de competência e sobretudo de formação básica propedêutica atualizar-se teoricamente, e sobretudo produzir teoricamente, para compartilhar do conhecimento, nas suas várias codificações vigentes e paradigmas específicos, uma vez que o descaso teórico coincide [...] com a passividade diante das polêmicas, desafios, questionamentos, e sobretudo, falta de visão crítica. (DEMO, 2002, p.36) 24 Nesse sentido, foi realizado um estudo temático sobre o vazio existencial e sobre a questão do sentido, ambos fundamentados na teoria de referência escolhida, ou seja, a teoria frankliana. Concomitantemente a esse estudo, foi realizado um levantamento histórico sobre a pós-modernidade, a cirurgia cardíaca e a Fisioterapia. Outros assuntos pertinentes ao tema da pesquisa também foram abordados teoricamente. Tudo isso pela necessidade de se firmarem conexões lógicas entre a problemática da pesquisa e o objeto do estudo. Tais assuntos incluem a Doença Arterial Coronariana, a Cirurgia de Revascularização do Miocárdio, a Reabilitação Cardíaca e o Envelhecimento. Para a pesquisa de campo, utilizou-se a pesquisa qualitativa. Essa modalidade de pesquisa, quando aplicada à saúde, incorpora a concepção de significado trazida pelas Ciências Humanas, na qual não se busca estudar um fenômeno em si, mas entender o seu significado individual ou coletivo para a vida das pessoas (TURATO, 2000). Turato apresenta uma definição do método clínico-qualitativo voltado especificamente para os cenários das vivências em saúde: [...] aquele que busca interpretar os significados – de natureza psicológica e complementarmente sociocultural – trazidos por indivíduos (pacientes ou outras pessoas preocupadas ou que se ocupam com problemas da saúde, tais como familiares, profissionais de saúde e sujeitos da comunidade), acerca dos múltiplos fenômenos pertinentes ao campo dos problemas da saúde-doença. (TURATO, 2005, p.510) A escolha por uma pesquisa clínico-qualitativa apoiou-se em sua própria definição, na medida em que ela permite interconexões dos saberes psicológico e sociocultural aos saberes ligados às chamadas ciências da saúde. No caso em questão, entre a Psicossociologia e a Fisioterapia. Foi a partir dessa conexão que este estudo pôde ser viabilizado. Dentro da pesquisa qualitativa, a metodologia eleita foi o estudo de caso (EC), dada a sua profundidade em fornecer uma informação, que não se resume a uma simples descrição, sendo, senão antes, uma explicação, uma compreensão a respeito dos dados coletados. Sabemos que a expressão estudo de caso é consagrada no campo da Psicologia. Assim, tradicionalmente, estudo de caso é pensado como o acompanhamento terapêutico de casos clínicos. Entretanto, a expressão é aberta a outras acepções. Segundo Laville e Dione: “A denominação refere-se evidentemente a um caso, talvez o de um grupo, de uma comunidade, de um meio, ou então fará referência a um acontecimento especial, uma mudança política, um conflito [...]” (LAVILLE; DIONE, 1999, p. 155, grifo dos autores). Para os citados autores, o estudo de um caso 25 pode se referir à reflexão sobre um contexto específico vivido por um grupo, ultrapassando, pois, a idéia do acompanhamento terapêutico de um caso clínico. Segundo Yin (2005), o EC é definido como uma metodologia de pesquisa abrangente, diferenciada, porém não hierarquizada segundo sua função meramente exploratória e não reificada como função de observação participante. Caracteriza-se pelo estudo profundo e exaustivo de um caso particular ou de vários. Para Yin, “em outras palavras, o estudo de caso como estratégia de pesquisa compreende um método que abrange tudo – tratando da lógica de planejamento, das técnicas de coleta de dados e das abordagens específicas à análise dos mesmos” (YIN, 2005, p. 33). O EC, do ponto de vista técnico, “investiga um fenômeno contemporâneo dentro de seu contexto da vida real, especialmente quando os limites entre o fenômeno e o contexto não estão claramente definidos” (YIN, 2005, p. 32). Além disso, o EC se caracteriza por apresentar como resultado as múltiplas variáveis de interesse e não ponto de dados. Ele baseia-se em várias fontes de evidência cujo marco teórico escolhido atravesse e explique os diferentes fenômenos e acontecimentos observados em cada caso. Seus resultados são apresentados em aberto, como hipóteses, e não como conclusões (YIN, 2005). O EC é uma estratégia de pesquisa quando “faz-se uma questão do tipo ‘como’ e ‘por que’ sobre um conjunto contemporâneo de acontecimentos, sobre o qual o pesquisador tem pouco ou nenhum controle” (YIN, 2005, p. 28). Nesta pesquisa, o que se propôs foi investigar: “Como os processos psicossociais da pós-modernidade estão envolvidos no período de convalescença pós-operatório de indivíduos idosos submetidos à CRVM e por que esses processos poderiam estar influenciando na sua dificuldade em ingressar na Fase 3 de um programa de RC?” Para isso, usamos a teoria frankliana como marco, a qual permeou e justificou as ocorrências observadas. Diversos autores, como Macnealy, Benbasat et al, Voss et al, Dubé e Paré, citados por Oliveira, Maçada e Goldoni (2006) revelam que: [...] a entrevista é a técnica de coleta de dados mais utilizada em estudo de caso. Em relação à entrevista, os aspectos mais importantes a serem considerados e descritos na pesquisa são: critério para escolha dos entrevistados, utilização ou não de roteiro de entrevista, pré-teste e validação do roteiro de entrevista, número de entrevistados, meio para registro da entrevista (anotações, gravação, etc.). (OLIVEIRA, Miriam; MAÇADA; GOLDONI, 2006, p. 6, grifo nosso) 26 Dessa forma, o instrumento utilizado para a coleta dos dados foi a entrevista individual parcialmente estruturada, que, segundo Laville e Dione, são: [...] entrevistas cujos temas são particularizados e as questões (abertas) preparadas antecipadamente. Mas com plena liberdade quanto à retirada eventual de algumas perguntas, à ordem em que essas perguntas estão colocadas e ao acréscimo de perguntas improvisadas. (LAVILLE; DIONE, 1999, p.188) Tal instrumento oferece flexibilidade em adquirir informações dos entrevistados, fornecendo conteúdo mais rico e profundo e, assim, um retrato mais próximo da complexidade dos acontecimentos, situações e fenômenos vivenciados. De acordo com Triviñós, “A escolha dos sujeitos mais capacitados para prestar ajuda à pesquisa não é fácil [...] Para amenizar estas dificuldades, o pesquisador deve realizar uma série de atividades preliminares tendentes a esclarecer sua visão de cada um de seus possíveis informantes” (TRIVIÑOS, 1987, p.144). Dessa maneira, com o objetivo de facilitar a descrição e a delimitação do perfil dos sujeitos da pesquisa, foi aplicado um questionário com perguntas estruturadas (ANEXO 2) aos indivíduos idosos submetidos à cirurgia cardíaca no Hospital Vera Cruz6. Os dados do questionário foram colhidos em entrevista oral direta com o paciente e a partir do prontuário clínico, após a assinatura do termo de consentimento pelo paciente ou por seu representante legal (ANEXO 1). Foram aplicados vinte e três questionários, no período de março de 2006 a junho de 2007. Observou-se que a maioria dos sujeitos encontrados são homens, com idade entre 60 e 70 anos, residentes no município de Belo Horizonte-MG, submetidos à CRVM. São casados, têm filhos e netos. São também aposentados, com renda mensal entre 5 e 10 salários mínimos, com número de dependentes variando entre um a dois. A orientação religiosa mais freqüentemente encontrada foi a católica, e a escolaridade variou entre nível técnico e superior. Sendo assim, para a pesquisa de campo, seriam escolhidos sujeitos que se enquadrassem nesse perfil. Porém, durante a realização da pesquisa, apenas um paciente pôde ser selecionado. Isso se justifica pelo fato de que nem todos os pacientes idosos que se submeteram à CRVM durante o período de coleta de dados (julho de 2007 a agosto de 2008) residiam em Belo Horizonte. Ademais, o perfil de pacientes que surgiu era composto por diversos fatores prognósticos de morbidade operatória: diabete melito, ICC, angina instável. Entre os pós-operados, ocorreram complicações como: acidente 6 O termo de consentimento dessa Instituição, para a realização desta pesquisa, encontra-se no Anexo 1. 27 vascular cerebral (AVC7), insuficiência renal, infecção e suporte respiratório prolongado. O cerco e o tempo se fecharam, pois a pesquisa iniciada em 2006 ainda não havia sido concluída. Se tais pacientes fossem selecionados, o período que foi proposto para a realização das entrevistas seria postergado e, o mais importante, haveria outros atravessamentos que não fazem parte da proposta deste estudo. O enfoque do estudo é o paciente idoso submetido à CRVM. Se esse paciente, além da CRVM, apresenta um AVC, como em alguns casos observados, outros fatores psicossociais passam a estar envolvidos. Assim, seriam acrescentadas outras variáveis que fogem da proposta deste estudo. Em virtude disso, optou-se pelo estudo de caso único. Esse fato particular não desqualificou a pesquisa, pois, de acordo com Rey, “o objetivo da pesquisa qualitativa está na construção de modelos sobre o problema estudado e não na caracterização de populações” (REY, 2005, p.113). Da mesma forma, Yin nos revelou um posicionamento que orientou nossa opção pelo modelo de EC único: Em algumas áreas, os estudos de caso múltiplos foram considerados uma “metodologia” diferente dos estudos de caso único. Por exemplo, a antropologia e a ciência política desenvolveram um conjunto de fundamentos lógicos para realizar estudos de caso único e um segundo conjunto para realizar o que se está chamando de estudos “comparativos” (ou de casos múltiplos). Este livro, não obstante, considera que os projetos de caso único e de casos múltiplos são variantes dentro da mesma estrutura metodológica – e nenhuma distinção muito ampla é feita entre o assim chamado estudo de caso clássico (isto é, único) e estudos de casos múltiplos. [...] As evidências resultantes de casos múltiplos são consideradas mais convincentes, e o estudo global é visto, por conseguinte, como algo mais robusto (Herriott & Firestone, 1983). Ao mesmo tempo, o fundamento lógico para projetos de caso único, em geral, não pode ser satisfeito por casos múltiplos. [...] Além disso, a condução de um estudo de casos múltiplos pode exigir tempo e amplos recursos além daqueles que um estudante ou pesquisador independente possuem. (YIN, 2005, p. 68) Nesse sentido, o modelo de estudo de caso utilizado foi o projeto de caso único na forma incorporada, pelo fato de a pesquisa estar inserida num contexto com diversas variáveis e por seguir a lógica do planejamento, que Platt citado por Yin compreende por “uma estratégia que deve ser priorizada quando as circunstâncias e os problemas de pesquisa são apropriados, em vez de um comprometimento ideológico que deve ser 7 O acidente vascular cerebral é conhecido popularmente por derrame cerebral. Ocorre quando há uma isquemia em artérias que irrigam o cérebro ou quando uma artéria se rompe, havendo derramamento de sangue no cérebro (POLLOCK; WILMORE;FOX,1993, p. 5). 28 seguido não importando quais sejam as circunstâncias” (PLATT apud YIN, 2005, p. 32). A escolha do caso único baseou-se em dois fundamentos lógicos. O primeiro deles é a representatividade típica, cujo objetivo “é capturar as circunstâncias e condições de uma situação lugar-comum ou do dia-a-dia [...] parte-se do princípio de que as lições que se aprendem desses casos fornecem muito mais informações sobre as experiências da pessoa [...]” (YIN, 2005, p.63). Esta pesquisa iniciou-se a partir de uma observação diária, que apesar de construir alguns conhecimentos, não foi suficiente para esclarecer as dúvidas pertinentes ao exercício da prática fisioterapêutica. O segundo é o caso longitudinal, em que “a teoria de interesse provavelmente especificaria como certas condições mudam com o tempo [...]” (YIN, 2005, p.63-64). O estudo foi feito através de duas entrevistas executadas em dois períodos de tempo distintos. Em princípio, a primeira entrevista seria realizada quando o paciente ainda estivesse na Unidade de Internação do Hospital Vera Cruz. No entanto, em uma entrevista piloto, houve uma seqüência de interrupções na fala do entrevistado por parentes, funcionários do hospital e telefonemas particulares, o que, por sua vez, definiu como melhor opção para o local da entrevista o próprio domicílio do paciente. Para a segunda entrevista, havia sido proposta a presença do paciente na capela do Hospital Vera Cruz, porém, ao longo do tempo, foi observado que esse não era um local apropriado, pois havia uma grande movimentação de pessoas entrando e saindo do recinto e de locais próximos, o que também poderia dificultar o andamento da entrevista. Finalmente, o local selecionado para a segunda entrevista também foi a residência do paciente. Ambas as entrevistas foram gravadas e transcritas de forma literal (ANEXO 3). O paciente assinou um termo de consentimento livre e esclarecido para participar de tais entrevistas (ANEXO 1). Buscamos captar as reflexões sobre o sentido da vida para esse paciente. Para Frankl, não há como responder sobre a questão do sentido da vida de forma generalizada: Isto porque o sentido da vida difere de pessoa para pessoa, de um dia para o outro, de uma hora para outra. O que importa, por conseguinte, não é o sentido da vida de um modo geral, mas antes o sentido específico da vida de uma pessoa em dado momento. (FRANKL, 2005, p. 98) 29 Dessa maneira, os sentidos subjetivos do paciente acerca da cirurgia a qual foi submetido podem se apresentar de formas distintas em diferente espaço de tempo. Então, a escolha por duas entrevistas tornou-se justificável. Assim, a primeira entrevista foi realizada 14 dias após a CRVM. O tema central foi a expectativa do paciente idoso a respeito de sua vida, após ter realizado, há poucos dias, uma cirurgia de risco considerável. Colocamos as seguintes perguntas como guia: − Como o Senhor está se sentindo após ter realizado esta cirurgia cardíaca? − Como o Senhor imagina a sua convivência familiar e social daqui em diante? − Se o Senhor pudesse voltar atrás o que teria feito para tentar evitar esta cirurgia? − Como o Senhor imagina que estará a sua vida nos próximos meses? Após 4 meses da CRVM, a segunda entrevista foi realizada. O tema principal foram as prováveis transformações na vida do paciente idoso após a cirurgia cardíaca e o impacto desse evento sobre sua qualidade de vida. As questões que serviram de roteiro foram: − Já faz algum tempo que o Senhor foi operado, como anda sua vida? − Como está o seu convívio social e com a família? − Como o Senhor imagina a sua vida daqui pra frente e por quê? − O que o senhor gostaria que acontecesse em sua vida para que tivesse uma melhor qualidade de vida? Alguns dados do prontuário clínico do paciente também foram colhidos e em algumas conversas por telefone outras questões foram esclarecidas. O processo como foi feita a análise das entrevistas obedeceu à estratégia de seguimento das proposições teóricas pesquisadas, aplicadas em uma série temporal simples, a qual tornou possível elaborar uma hipótese de dois padrões distintos de eventos (YIN, 2005). De acordo com o autor citado, a proposição teórica: [...] é um exemplo de orientação teórica que serve como guia da análise de estudo de caso. Evidentemente, a proposição ajuda a por em foco certos 30 dados e ignorar outros [...] Ela também ajuda a organizar todo o estudo de caso e a definir explanações alternativas a serem examinadas. (YIN, 2005, p. 140) No próximo capítulo, iniciamos a fundamentação teórica deste estudo. Escolhemos começar pelo tema da pós-modernidade. Procuramos lançar uma pequena luz sobre alguns aspectos históricos, sociais e culturais da atual sociedade em que vivemos. Dessa forma, contextualizamos temas essenciais desta pesquisa, como o vazio existencial, o sentido da vida, o desprezo pela velhice e a doença arterial coronariana. 31 3 A PÓS-MODERNIDADE, O VAZIO EXISTENCIAL E A QUESTÃO CARDÍACA A proposta deste capítulo é entender como a pós-modernidade contribui para a disseminação do vazio existencial e quais as conseqüências desse “vazio” no campo biopscicossocial da atualidade, especificamente no que diz respeito à incidência de doença aterosclerótica coronariana (DAC). Para atingir esse propósito, é necessário, a priori, compreender as características da pós-modernidade. Dentre uma série de autores que trabalharam para a elucidação de tais aspectos, elegeram-se David Harvey e Krishan Kumar como referências. Para Kumar (1997), a pós-modernidade carrega uma definição ambígua. Pode indicar um estado de coisas que vêm após o fim da modernidade, bem como um estado de reflexão sobre o que foi a experiência da modernidade. Ressalta que ambas as definições devem compartilhar sobre alguma idéia da modernidade e que para perscrutar o pós-moderno se faz necessário compreender o moderno. Harvey (1992) também argumenta que a compreensão da pós-modernidade exige uma análise prévia da sua relação com o sentido da modernidade. 3.1 Modernidade Embora os termos modernidade e modernismo possam ser tomados um pelo outro, Kumar segue utilizando seus significados de forma distinta: Entendo por “modernidade” uma designação abrangente de todas as mudanças – intelectuais, sociais e políticas – que criaram o mundo moderno. “Modernismo” é um movimento cultural que surgiu no ocidente em fins do século XIX e, para complicar ainda mais a questão, constitui, em alguns aspectos, uma reação crítica à modernidade. (KUMAR, 1997, p.79, grifo do autor) Kumar (1997, p. 79) inicia o seu estudo sobre a modernidade a partir da etimologia da palavra modernus (“recentemente”, “há pouco”), cuja aplicação inicial se deu no fim do século V d.C., significando o oposto de antiquus. Após o século X, os termos modernitas (“tempos modernos”) e moderni (“homens de nosso tempo”) 32 passaram a ser mais comumente utilizados. Como a alta idade média cristã se inicia no século V d.C., o autor conclui que a modernidade é uma invenção desse período. Uma das principais características da modernidade é a mudança no conceito de tempo e, para entender tal mudança, Kumar enfatiza a necessidade de se compreender o quanto a modernidade está encerrada na filosofia cristã da história. No mundo antigo, o tempo era regular e repetitivo, já que seu cálculo baseava-se nos acontecimentos naturais, como a mudança cíclica das estações e os ciclos reprodutivos. Nesse mundo pagão, não havia novidade, apenas mudanças naturais. A ausência do novo, na antigüidade, foi ainda cultivada por pensadores como Platão, que via o tempo inserido num universo simbolizado por um Ser eterno e imutável (KUMAR, 1997). Segundo Kumar (1997), com a vinda de Jesus Cristo à terra, não só o conceito de tempo, mas toda a história humana foi modificada, pois, apesar de todas as criaturas estarem sujeitas às leis divinas, Deus escolheu justamente os homens para enviar-lhes o seu filho, imputando-os uma significância extremamente maior do que a quaisquer seres não humanos. Foi a partir de um evento excepcional e marcante, o aparecimento de Jesus, que o tempo pôde ser dividido em antes e depois de Cristo. “O cristianismo conta uma história com um começo (a criação e o pecado original), um meio (o advento de Cristo) e um fim (o Segundo Advento)” (KUMAR, 1997, p. 81). Essa seqüência de eventos conferiu uma ligação lógica entre o presente, o passado e o futuro, agora num tempo humanizado, linear e irreversível. O passado passa a ser um simples ensaio para o presente, o qual, por sua vez, se orienta sempre para o futuro, ou seja, a concretização da promessa de redenção final da humanidade através de Cristo. Apesar de o Cristianismo ter introduzido uma concepção linear do tempo, isso não adquiriu um efeito prático, ou seja, toda a oposição ao antiquus que se esperava que o modernus da idade média criasse quase não foi desenvolvida. Apenas alguns cristãos dos primeiros séculos depois de Cristo acreditavam viver em uma época cujo sentido de tempo havia mudado. Para eles, o Segundo Advento estava em vias de acontecer e suas atitudes se baseavam na preparação para a consumação desse evento, o qual inauguraria uma era milenar de Cristo na terra. No século XII, os seguidores do monge Joaquim de Fiore, da Calábria, acreditavam na era do Espírito Santo, a iminente Terceira Era Milenar, onde apenas as virtudes reinariam sobre a terra. Não obstante os milenaristas terem acrescentado ao tempo um significado especial, estes valorizaram sua época não 33 pelo que ela introduziu de diferente ou novo, mas porque esta apontava para o final dos tempos (KUMAR, 1997). A doutrina da Igreja representada por Agostinho8 não poupou nem mesmo essas expectativas milenaristas. Nas pregações de Agostinho, o tempo terreno nada significava em relação ao tempo sagrado. O milênio já havia começado assim que Cristo apareceu e, após o Segundo Advento, os tempos se findariam com o Juízo Final. Não competia ao homem saber quanto tempo duraria sua existência na terra, somente Deus representado pela Igreja, detinha tal autoridade. Cabia à Igreja, guardiã do tempo, determinar a história e cabia aos cristãos viverem sob a custódia dessa história, sem especulações sobre o final dos tempos. Esse aconteceria no momento em que Deus achasse propício. As mudanças na vida terrena de nada significavam comparadas à eternidade, o tempo terreno era apenas uma fagulha em relação ao tempo eterno celestial, pois a fé era considerada imutável (KUMAR, 1997). A valorização da eternidade sobreposta à desvalorização da vida terrena e de tudo de novo e original que esta poderia trazer acabou por reconciliar o pensamento cristão da idade média ao pensamento da idade antiga: Ao contrário do que poderíamos imaginar, os pensadores cristãos da Idade Média não depreciavam – após um rápido entrevero anterior – seus predecessores pagãos como criaturas imersas nas trevas, carentes de luz da revelação de Cristo. Pelo contrário, a veneração aos grandes pensadores da Antigüidade – Platão, Aristóteles, Virgílio, Cícero – [...] foi tão grande na Idade Média quanto na Renascença. (KUMAR, 1997, p. 84). O desprezo pela idéia do moderno permaneceu no período da Renascença, apesar dessa época ter testemunhado o nascimento da civilização européia e suas conquistas pelo Novo Mundo, assim como a divisão da história ocidental em três períodos: a Idade Antiga, a Medieval e a Moderna. A história linear da Cidade Celestial pregada por Agostinho foi aceita por historiadores e teóricos políticos renascentistas como Maquiavel e Bodin. Isso ilustra que o nascer de novo da Renascença não significou uma ruptura total com a Idade Média. No entanto, esses mesmos pensadores, inspirados por escribas clássicos, como Platão, Aristóteles e Políbio, e inspirados na própria história da ascensão e queda da civilização greco-romana, concentraram suas idéias na Cidade Terrena, seus Estados e Impérios. Esses argumentos desvelam como o período da Renascença reaproximou-se da Idade Antiga, resgatando a concepção cíclica 8 Aurélio Agostinho foi um bispo católico, filósofo e teólogo que viveu entre os anos 354 e 430 d.C. Os católicos o consideravam santo e doutor da Igreja (WIKIPÉDIA, 2008b). 34 e alinear do tempo dessa era pagã. Portanto, não é na Renascença que se devem procurar as origens da Modernidade, pois é a sua própria tendência ao pensamento antigo que a afastou de qualquer ligação realmente nova com o futuro (KUMAR,1997). Mesmo não reconhecendo as origens da Modernidade na Renascença, Kumar (1997) fala a favor dessa época, no que tange à força e à firmeza da vida de seus contemporâneos. Essas qualidades serviram para que os renascentistas desenvolvessem uma maior confiança em suas aptidões, no que diz respeito a sua capacidade de disputa ou até mesmo de superação dos antigos: A Renascença, em seu ataque à autoridade dos pensadores medievais e à igreja medieval, formulou novos padrões críticos e racionais que poderiam ser usados contra todas as formas de autoridade intelectual – a dos antigos incluída. E foi isso que aconteceu no final do século XVII. (KUMAR, 1997, p. 87, grifo nosso) Seguindo os argumentos de Kumar, foi através do ataque aos antigos, “na discussão entre os antigos e modernos”, em fins do século XVII, que surgiu a concepção atual sobre a idéia de modernidade (BURY apud KUMAR, 1997, p. 87). Apoiado em autores dessa época, como Montaigne, Francis Bacon e Descartes, Kumar (1997) ilustra o referido ataque. Esse se fundamentou na consideração das idéias antigas apenas como parte da formação da história humana, e não como a detentora desta ou do verdadeiro conhecimento. Parafraseando Bacon, Kumar (1997) lembra que invenções como a pólvora, a imprensa e a bússola exerceram tamanha influência sobre a humanidade, que se tornou insustentável defender a não-concepção do novo como determinante do moderno. Em Descartes, o autor destaca o investimento na razão humana como base da reformulação de todo o conhecimento. Apesar do progresso e desenvolvimento do mundo moderno ser uma evidência, a idéia de que esse tempo, assim como a Antigüidade, também teria sua queda e fim acompanhou o pensamento ocidental durante todo o século XVII e grande parte do século XVIII. Somente com a concepção da idéia de progresso segundo Kant, o qual secularizou o tempo, transformando-o em estágios evolucionários da humanidade, é que foi possível reconhecer o moderno como o estágio mais atual e, conseqüentemente, dar a este sua total auto-suficiência. O antigo, a partir desse ponto, deixou de ser o exemplo e a razão para os novos acontecimentos. Todas as mudanças e novidades eram frutos dos tempos modernos e não uma apologia ao antigo (KUMAR, 1997). Dois grandes acontecimentos contribuíram para desvelar a modernidade: a Revolução Francesa e a Revolução Industrial. Para Kumar, a Revolução Francesa 35 (1789) foi o marco do surgimento da Modernidade, pois “ela anunciou o objetivo do período moderno como a obtenção de liberdade sob a orientação da razão” (KUMAR, 1997, p. 93). Enquanto a Revolução Francesa forneceu o substrato intelectual da Modernidade, a Revolução Industrial forneceu o substrato material. Uma das evidências da forte ligação entre Modernidade e Industrialismo é que este determinou uma evolução tão acentuada da área econômica, que adquiriu um perfil revolucionário, ao ponto de entrar como marco da divisão da história humana entre pré e pós-industrial. Outra evidência dessa ligação é que, com o industrialismo, a sociedade ocidental dominou tecnologicamente o restante das outras civilizações: “Modernizar era industrializar – isto é – tornar-se igual ao Ocidente.” (KUMAR; GELLNER apud KUMAR, 1997, p. 95) O Industrialismo e a Modernidade foram tão intimamente ligados, que no imaginário coletivo atual é impossível conceber a idéia de modernidade sem pensar nas grandes construções, como os arranha-céus, nas metrópoles iluminadas, no transporte aéreo, na pesquisa espacial, dentre outras conquistas. De acordo com Kumar: A estreita relação entre modernidade e industrialismo é uma razão por que há hoje pensadores que proclamam o fim da modernidade. O industrialismo, pelo menos da forma convencionalmente entendida, parece ter-se esgotado, ter chegado a seus limites. (KUMAR, 1997, p. 95) Porém, para o próprio Kumar (1997), essa visão do Industrialismo é um tanto rude, pois este não pode ser identificado apenas por meio de modificações e avanços tecnológicos, econômicos ou científicos. A essência da identificação da Modernidade com o Industrialismo reside no fato de que ambos têm a característica de sistemas em situação de permanente queda e reascenção. As mudanças que ambos trouxeram aconteceram em períodos tão curtos de tempo que, antes mesmo de serem assimiladas, já estavam sendo substituídas por outras mais recentes e melhores. A esse respeito, Kumar pronuncia: A destruição, e mesmo a morte, como Joseph Schumpeter em particular esforçou-se mais tarde para provar, fazem parte tão intrínseca do sistema industrial quanto a criação e o crescimento. [...] Aqueles que, com uma pressa excessiva, anunciam o fim do industrialismo, talvez não estejam vendo mais do que o último período das dores de parto, o mais recente dos ciclos de renovação e decadência, que têm sido característicos do industrialismo ao longo de toda sua história ainda relativamente curta. (KUMAR, 1997, p. 96) Retomando o raciocínio cronológico sobre a Modernidade, Harvey expõe que: 36 Embora o termo “moderno” tenha uma história bem mais antiga, o que Habermas (1983, 9) chama de projeto da modernidade entrou em foco durante o século XVIII. Esse projeto equivalia a um extraordinário esforço intelectual dos pensadores iluministas “para desenvolver a ciência objetiva, a moralidade e a lei universais e a arte autônoma nos termos da própria lógica interna destas”. (HARVEY, 1992, p. 23, grifo do autor) Nesse sentido, Kumar se harmoniza ao argumento de Harvey (1992), quando conclui: Não foi no vigor da Alta Idade Média, nem na explosão criativa da Renascença, tampouco na Revolução Científica do século XVII, mas sim na Idade da Razão, na segunda metade do século XVIII, mais de duzentos anos depois de o monge romano e erudito Cassiodorus traçar a primeira distinção entre os antiqui e os moderni que nasceu a idéia da modernidade. (KUMAR, 1997, p. 96, grifo do autor) 3.2 Transição da Modernidade para a Pós-Modernidade Os princípios dominantes da Modernidade fundaram-se numa ordem disciplinar racional de desenvolvimento da economia capitalista, da ciência tecnológica e da política, o que, por sua vez, exerceu influência sobre os padrões de comportamento da sociedade. O progresso da indústria e, conseqüentemente, as rápidas mudanças alcançadas pelo uso da razão positivista descentralizaram o indivíduo e sua subjetividade como parte do processo criativo. Isso suscitou uma organização social moderna em torno de um modelo burguês de produção de bens necessários a sua existência, que através da exploração e alienação do trabalho acabaram por provocar uma degradação da condição humana (KUMAR, 1997). No âmbito cultural, ainda no final do século XVIII, tais princípios da Modernidade passaram a ser questionados pelo movimento do Romantismo europeu. Para Kumar: “Se a modernidade significava um rompimento brutal com o passado e uma orientação decisiva para o futuro, o Romantismo parecia inclinado a encontrar no passado os recursos com os quais poderia criticar o presente inumano e não-criativo.” (KUMAR, 1997, p. 97) Nas expressões da cultura, principalmente na arte e na literatura, os autores do Romantismo, como Sir Walter Scott, Friedrich Schlegel, Burke, Chateaubriand, Maistre, Blake, Wordsworth, Coleridge, Sheley, Keats e Byron resgataram símbolos e costumes antigos de vida. Através desse resgate, valorizaram a sensibilidade, a imaginação e a intuição humanas. Desenvolveram também uma crítica à civilização moderna, através de uma procura contínua pelo ideal de um indivíduo 37 independente e capaz de se auto-realizar (KUMAR, 1997). Nesse sentido, Kumar revela: “A razão era combatida pela imaginação, o artifício pelo natural, a objetividade pela subjetividade, o cálculo pela espontaneidade, o mundano pelo visionário, a visão mundial da ciência pelo apelo ao fantástico e sobrenatural.” (KUMAR, 1997, p. 97) O que poucos desses autores perceberam foi que, nessa busca por maior liberdade individual, o Romantismo fez alusão a um novo tempo de mudanças sem limites, e, sob esse aspecto, acabou por coincidir com a idéia fundamental da Modernidade (KUMAR, 1997). Segundo Kumar (1997), essa contradição do que veio a ser o Romantismo, ou seja, crítica ou aproximação da Modernidade, levou muitos autores, destacando-se Baudelaire, a serem interpretados como ambivalentes. Esteticamente, Baudelaire considerava que todas as épocas tinham sua modernidade, pois em todas elas era possível se extrair o transitório, o diverso e transformá-lo em moderno. Essa teoria estética acabou por entrar em conflito com as teorias gerais da modernidade, pois, de acordo com estas últimas, a modernidade era um período histórico e, portanto, não poderia pertencer a todos os tempos. Por outro lado, sobre Baudelaire, conforme observa Kumar: Repetidas vezes, trechos de “O pintor da vida moderna” e outros escritos são citados em apoio à opinião de que a sociedade moderna é fragmentada e desorganizada, que fez alguma ruptura radical com o passado, que é teatro do “transitório, do passageiro, do contingente”. Mais recentemente, e com uso de grande parte dos mesmos trechos, Baudelaire foi convocado a serviço das teorias da pós-modernidade. (KUMAR, 1997, p.103) Harvey inicia o seu estudo sobre a modernidade a partir de um desses trechos de Baudelaire: “A modernidade [...] é o transitório, o fugidio, o contingente; é uma metade da arte, sendo a outra o eterno e o imutável.” (BAUDELAIRE apud HARVEY, 1992, p. 21) Através dessa afirmação, Harvey analisa a cultura moderna do efêmero, uma vez que esse é o lado da formulação dual de Baudelaire menos contestado pelos teóricos da modernidade. Pela citação de Berman, Harvey então ilustra: Há uma modalidade de experiência vital – experiência do espaço e do tempo, do eu e dos outros, das possibilidades e perigos da vida – que é partilhada por homens e mulheres em todo o mundo atual. Denominarei esse corpo de experiência de “modernidade”. Ser moderno é encontrar-se num ambiente que promete aventura, poder, alegria, crescimento, transformação de si e do mundo – e, ao mesmo tempo, que ameaça destruir tudo o que temos, tudo o que sabemos, tudo o que somos. Os ambientes e experiências modernos cruzam todas as fronteiras da geografia e da etnicidade, da classe e da 38 nacionalidade, da religião e da ideologia; nesse sentido, pode-se dizer que a modernidade une toda a humanidade. Mas trata-se de uma unidade paradoxal, uma unidade da desunidade; ela nos arroja num redemoinho de perpétua desintegração e renovação, de luta e contradição, de ambigüidade e angústia. Ser moderno é ser parte de um universo em que, como disse Marx, “tudo que é sólido se desmancha no ar”. (BERMAN apud HARVEY, 1992, p. 21) Harvey frisa que a modernidade rompeu com todo o sentido de sucessividade da história, pois o seu caráter de mudança veloz e contingente impediu a preservação de “qualquer ordem social pré-moderna” (HARVEY, 1992, p. 22). Em meio a toda essa transitoriedade das coisas, Harvey (1992) estuda o esforço de diferentes correntes para explicar o “eterno” da mudança. Destaca a filosofia em torno da razão como uma resposta dos pensadores iluministas. Para estes, apesar de tudo parecer instável e fugidio, a racionalidade aplicada como conhecimento objetivo e como forma de organização social dominaria as superstições, crenças mitológicas e religiosas, bem como o uso indiscriminado do poder. Apenas pelo projeto do uso da razão, a natureza humana encontraria seus atributos eternos e imóveis. De um modo geral, o que se destaca no conceito duplo de Romantismo é que, apesar de seus ataques à modernidade (da maneira concebida pelos Iluministas), em sua teoria cultural-estética ainda permaneceu a confiança de que, através da própria revolução pela razão (características modernas), a humanidade encontraria sua remissão e liberdade (KUMAR, 1997). Dando seqüência ao raciocínio de Kumar (1997), por volta da segunda metade do século XIX, a esperança de redenção da humanidade pelo uso da razão (o Projeto do Iluminismo ou Projeto da Modernidade) diminuiu em contrapartida ao aumento da crítica cultural à modernidade. Tratava-se da emergência do Modernismo. Em lugar da esperança, cresceu o desespero, o medo do domínio da sociedade pela classe média comercial: “Na vida pessoal, esses sentimentos muitas vezes assumiam a forma prática do que Rimbaud chamou de ‘desordem dos sentidos’, implicando excessos alcoólicos e experiências com drogas e formas pouco ortodoxas de comportamento sexual.” (KUMAR, 1997, p.105, grifo nosso) O movimento cultural do Modernismo contra as idéias da modernidade assumiu proporções muito maiores do que a oposição vista no Romantismo. Entre os anos de 1890 e 1930, um turbilhão de manifestações culturais anti-modernas, expressadas principalmente pelos franceses, denunciavam a insatisfação, a revolta e o pessimismo diante dos processos sociais e econômicos da Modernidade. Na arte, como na literatura, a subjetividade foi enfatizada em contraposição à objetividade. O indivíduo era 39 especialmente retratado como descontínuo, fragmentado, múltiplo e inserido no meio social, porém, quase imperceptível nesse meio enquanto figura humana (KUMAR, 1997). Na Filosofia, Sociologia, Psicologia e Política também brotaram correntes que sacudiram a Modernidade. Um dos ataques mais ferozes ao pensamento racional da Modernidade ocorreu com a descoberta da energia inconsciente por Sigmund Freud. Conforme observa Kumar: O “destronamento da razão”, a revelação das forças do irracional e do inconsciente, foi talvez o golpe mais devastador infligido pelo modernismo à modernidade. Deixou aberto o caminho para a investigação e, em certa medida, para a relegitimação das forças da religião e da mitologia e de outras formas “pré-modernas”, nos trabalhos de Frazer, Durkheim e Weber. A sociedade moderna não era mais considerada tão diferente assim das sociedades “primitivas”, ou arcaicas. Freud, além disso, colocou um gigantesco ponto de interrogação em seguida à idéia de progresso. A civilização e, a fortiori9, a civilização moderna, foi, sugeriu ele, construída ao custo de enorme sofrimento psíquico e de debilitamento. (KUMAR, 1997, p. 107, grifo nosso) Para Kumar (1997), essa visão do progresso segundo Freud, de uma maneira diferente, também foi a mensagem de Friedrich Nietzsche, cuja obra, em 1880 obteve grande destaque na Europa. Esse destaque ocorreu pelo fato de a obra de Nietzsche apontar alguns dos principais temas da filosofia moral e social do Modernismo, que seriam: a impossibilidade da civilização e de sua história continuarem a evoluir, havendo necessidade de uma análise nova e geral dos valores humanos; o combate ferrenho às doutrinas cristãs; a defesa da aristocracia; a discussão inexorável sobre as idéias herdadas do século XIX e a aversão completa pela moral conservadora. Harvey revela que “era como se Nietzsche mergulhasse por inteiro no outro lado da formulação de Baudelaire para mostrar que o moderno não era senão uma energia vital, a vontade de viver e de poder, nadando num mar de desordem, anarquia, destruição, alienação individual e desespero” (HARVEY, 1992, p. 25). Tais princípios exerceram forte influência sobre o pensamento ocidental, ao ponto de Nietzsche ser considerado o preconizador do Modernismo e, por conseguinte, também o do Pós-modernismo. Isso, por sua vez, instigou um raciocínio de continuidade e até mesmo de identificação entre esses dois movimentos (KUMAR, 1997). Esse raciocínio identificatório entre o Modernismo e o Pós-modernismo também é lembrado por Kumar (1997) pela emergência de correntes derivadas do Modernismo, 9 A fortiori: por conseguinte (WIKIPÉDIA, 2008a). 40 como o Dadaísmo e o Surrealismo. Por meio de tais correntes, a reação contra a modernidade assumiu proporções extraordinárias no imaginário popular. O Dadaísmo foi lançado durante a Primeira Guerra Mundial e atacou a Arte Moderna. Caracterizouse pela negação dos valores tradicionais, pregando o fim da cultura e a reconstrução do mundo. A segunda corrente, o Surrealismo, para a qual passaram quase todos os adeptos do Dadaísmo, surgiu após a Primeira Guerra e assumiu uma forma mais política, combatendo as interferências da razão, da moral e da estética sobre a capacidade real de expressão do livre pensamento (automatismo psíquico). Para a ciência moderna, a realidade da existência era comprovada pelo uso da razão, já os surrealistas procuravam comprovar, através das idéias de Freud, que seria no subconsciente que a mais alta realidade da existência seria revelada, mediante a aplicação do princípio do automatismo psíquico (BRETON, 1969). Harvey põe em evidência o fim da raiz otimista do Projeto do Iluminismo (Projeto da Modernidade), ao lembrar do “século XX – com seus campos de concentração e esquadrões da morte, seu militarismo e duas guerras mundiais, sua ameaça de aniquilação nuclear e sua experiência de Hiroshima e Nagasaki” (HARVEY, 1992, p. 23, grifo nosso). Diante de todos esses acontecimentos, já não era possível à razão iluminista sustentar sua posição como libertadora da humanidade e, portanto, como determinante de seu caráter eterno. Autores como Horkheimer e Adorno, citados por Harvey (1992, p. 23-24) “alegavam que a lógica que se oculta por trás da racionalidade iluminista é uma lógica da dominação e da opressão”. Diante dessas evidências, Harvey (1992) revela que a procura das essências eternas e imutáveis da humanidade ganhou o seu maior desenvolvimento, quando, pelo projeto do Modernismo, a estética fora posicionada acima da racionalidade, da ciência e da política; principalmente no que dizia respeito à expressão da idéia da destruição criativa, advinda da figura mítica de Dionísio. Couberam aos artistas, literários, arquitetos, poetas e filósofos modernistas destruir as verdades eternas, mas deixar suas marcas no efêmero, como uma via de recriar e manter o eterno. O Modernismo do período pré-Primeira Guerra Mundial, aponta Harvey, “ era mais uma reação às novas condições de produção (a máquina, a fábrica, a urbanização), de circulação (os novos sistemas de transportes e comunicações) e de consumo (a ascensão dos mercados de massa, da publicidade, da moda de massas) do que um pioneiro na produção dessas mudanças” (HARVEY, 1992, p. 32). No entanto, o desenvolvimento de um comércio competitivo de produtos culturais acabou por levar à 41 produção em massa da imagem da destruição criativa. Por conseqüência, os artistas passaram a ser impulsionados mais pela intenção de venda dos seus produtos do que pelo empenho na causa política (HARVEY, 1992). Harvey segue comentando que, no período entre-guerras, o esforço para a reconstrução da economia européia, aliado à queda da crença iluminista (quanto à perfeição do homem), tornou decisiva a busca de um mito que se adequasse à modernidade: Mas essa busca mostrou ser tão confusa quanto perigosa. “A razão, chegando a um acordo com suas origens míticas, se torna espantosamente misturada com o mito... o mito já é iluminismo, e o iluminismo volta a ser mitologia” (HUYSSENS apud HARVEY, 1992, p. 38). [...] Uma ala do modernismo apelou para a imagem da racionalidade incorporada na máquina, na fábrica, no poder da tecnologia contemporânea, ou da cidade como ‘máquina viva’. Erza Pound já apresentara a tese de que a linguagem devia conformar-se à eficiência da máquina, e, como Tichi (1987) observou, escritores modernos tão diferentes quanto Dos Passos, Hemingway e Willian Carlos Williams modelaram a sua escritura exatamente nessa proposição. Williams mantinha especificamente, por exemplo, que um poema é mais ou menos como uma “máquina feita de palavras”. E esse foi o tema que Diego Rivera celebrou tão vigorosamente em seus extraordinários murais de Detroit e que se tornou o leitmotif 10 de muitos diretores progressistas de murais dos Estados Unidos durante a depressão. (HARVEY, 1992, p. 38,39) Dessa maneira, o movimento do Modernismo aderiu a um novo estilo de filosofia, baseado no positivismo lógico, graças às influências do Círculo de Viena. A arquitetura era compatível à imposição de uma ordem racional, assim como todas as formas de ciência voltadas para o controle técnico (HARVEY, 1992). Após a Segunda Guerra Mundial, essa forte tendência positivista adotada pelo Modernismo assumiu uma postura fulcral no pensamento da sociedade. A busca pelo mito adequado à modernidade pareceu retroceder, porque, segundo a opinião de Harvey (1992), o sistema internacional de poder, vigiado pela soberania norte-americana, tornou-se aparentemente estável. A arte, a arquitetura, a literatura etc. do alto modernismo tornaram-se artes e práticas do establishment [Instituição] numa sociedade em que uma versão capitalista corporativa do projeto iluminista de desenvolvimento para o progresso e a emancipação humana assumira o papel de dominante políticoeconômica. (HARVEY, 1992, p. 42) A ascensão do Expressionismo abstrato determinou a despolitização do Modernismo: 10 Leitmotif: fio condutor (WIKIPÉDIA, 2008d). 42 A arte era suficientemente plena de alienação e ansiedade, e bastante expressiva da fragmentação violenta e da destruição criativa (temas que por certo eram apropriados a era nuclear) para ser usada como um maravilhoso exemplo de compromisso norte-americano com a liberdade de expressão, com o individualismo exacerbado e com a liberdade de criação. (HARVEY, 1992, p. 43) A absorção da estética modernista pela ideologia liberal americana, e a conseqüente aceitação de valores culturais num plano global, fez com que o Modernismo perdesse seu caráter revolucionário e adquirisse uma posição ideológica reacionária e tradicionalista. A arte e a cultura tornaram-se privilégio de uma elite soberana (HARVEY, 1992). Diante dessa conjuntura, onde a dominação racional-científica e técnicoburocrática se fizeram sentir nas formas de poder institucionalizado, representado pelo Estado, por partidos políticos e sindicatos, é que emergiram os movimentos contraculturais e antimodernistas dos anos 1960. Conforme ressalta Harvey: Centrado nas universidades, institutos de arte e nas margens culturais da vida na cidade grande, o movimento se espraiou para as ruas e culminou numa vasta onda de rebelião que chegou ao auge em Chicago, Paris, Praga, Cidade do México, Madri, Tóquio e Berlim na turbulência global de 1968. Foi quase como se as pretensões universais de modernidade tivessem, quando combinadas com o capitalismo liberal e o imperialismo, tido um sucesso tão grande que fornecessem um fundamento material e político para um movimento de resistência cosmopolita, transnacional e, portanto, global, à hegemonia da alta cultura modernista. Embora fracassado, ao menos a partir de seus próprios termos, o movimento de 1968 tem de ser considerado, no entanto, o arauto cultural e político para a subseqüente virada para o pósmodernismo. (HARVEY, 1992, p. 44) Pode-se concluir, baseando-se nos argumentos de Harvey (1992) e Kumar (1997) aqui expostos, que a transição da Modernidade para a Pós-modernidade foi um processo lento. Teve seu início nas primeiras críticas à Modernidade, pelo Romantismo, seguidas pelo movimento cultural do Modernismo e passando por suas diversas correntes e transformações filosófico-ideológicas, até chegar ao movimento antimoderno dos anos 1960, o qual determinou o despertar do Pós-modernismo, que atingiu a sua maturidade entre os anos de 1968 e 1972. 3.3 A Pós-modernidade, o Vazio Existencial e a Doença Arterial Coronariana A Pós-modernidade carrega uma grande variedade de definições e postulados teóricos. Não há como se chegar a um conceito único sobre a Pós-modernidade, mesmo 43 porque ainda se trata de um período em vigência. Conforme Giovanetti nos fala: “O modo de ser que surge da crise instalada a partir dos anos 1960 vem sendo denominado de vida ‘Pós-moderna’.” (GIOVANETTI, 2002, p.1, grifo do autor) O que propomos aqui é fazer uma leitura sobre os aspectos da Pós-modernidade que estão relacionados ao vazio existencial descrito por Viktor Emil Frankl. Também descreveremos a correlação entre o vazio existencial e a incidência de doença arterial coronariana. Sendo assim, continuaremos nos apoiando nos autores David Harvey e Krishan Kumar, acrescentando também a participação de Christopher Lasch. Segundo Viktor Emil Frankl, o vazio existencial tem se difundido cada vez mais na sociedade, principalmente a partir do século XX. Tal situação se caracteriza por “um profundo sentimento de que a vida não tem sentido” (FRANKL, 1978, p. 14). Para Frankl (2005), esse vazio surge em virtude de uma falta de objetivos a serem traçados e seguidos durante a existência e se manifesta, principalmente, num estado de angústia e tédio. A angústia e o tédio surgem quando o indivíduo permanece numa posição latente entre o que é e o que deveria ser, ou seja, ele não está satisfeito com sua atual situação, porém, não consegue visualizar outra melhor. Frankl (2005) revela que certo grau de tensão entre aquilo que já se conquistou e o que ainda se deve conquistar é uma condição inerente ao ser humano. Sendo própria do ser humano, essa condição é imperativa para a saúde mental. O problema do vazio existencial ocorre quando o indivíduo se nega a dar uma resposta a esse estado de angústia, se nega a responder para si mesmo sobre o sentido de sua vida. De acordo com Frankl (2005), a busca por um sentido é a motivação primária na vida de qualquer indivíduo, porém, sempre que essa vontade de sentido está camuflada por uma vida ilusória, a pessoa passa a sentir uma angústia existencial dentro de si. Nas palavras de Rodrigues, um grande conhecedor da obra frankliana: Segundo Frankl e estatísticas autorizadas, o vazio existencial existe em um grande número de pessoas, talvez mais ainda do que as neuroses, as psicoses e outras psicopatologias. O que acontece é que ele passa desapercebido na maioria das pessoas: há uma insatisfação remota, um sentimento de tristeza, uma esterilidade vivencial e criativa junto com uma perda dos objetivos e metas da existência. Ele não é agudo nem muito intenso, mas insidioso, subclínico, desconfortante e prolongado. (RODRIGUES, 1991, p. 186, grifo nosso) Para Frankl (2005), o vazio existencial é causado pela dupla perda sofrida pelo homem ao se tornar um ser verdadeiramente humano. A primeira perda se deu no início da história, quando o ser humano perdeu gradativamente alguns dos instintos animais 44 básicos reguladores do comportamento animal e asseguradores de sua existência. E, em seu desenvolvimento mais recente, a segunda perda se deu no campo das tradições, as quais, por sua diminuição acelerada, deixaram de servir de apoio ao comportamento do ser humano. A esse respeito, Frankl pronuncia: Nenhum instinto lhe diz o que deve fazer e não há tradição que lhe diga o que ele deveria fazer; às vezes ele não sabe sequer o que deseja fazer. Em vez disso, ele deseja fazer o que os outros fazem (conformismo), ou ele faz o que outras pessoas querem que ele faça (totalitarismo). (FRANKL, 2005, p. 97) Nesse sentido, faz-se necessário comentar sobre esse aspecto da Pósmodernidade, ou seja, a quebra das tradições. Charles Jencks citado por Kumar esclarece: A era pós-moderna é um tempo de opção incessante. É uma era em que nenhuma ortodoxia pode ser adotada sem constrangimento e ironia, porque todas as tradições aparentemente têm alguma validade. Este fato é em parte conseqüência do que se denomina de explosão das informações, o advento do conhecimento organizado, das comunicações mundiais e da cibernética. Não são apenas os ricos que se tornam colecionadores, viajantes ecléticos no tempo, com uma superabundância de opções, mas quase todos os habitantes das cidades. O pluralismo, o “ismo” de nossa época, é, ao mesmo tempo, o grande problema e a grande oportunidade: quando Todo Homem se torna cosmopolita, e, Toda Mulher, um Indivíduo Liberado, a confusão e a ansiedade passam a ser estados dominantes de espírito, e o Ersatz11 uma forma comum de cultura de massa. Este é o preço que pagamos pela era pósmoderna, tão pesada à sua maneira como a monotonia, o dogmatismo e a pobreza da época moderna. [...] Entre combinação inventiva e paródia confusa, o pós-modernista veleja, muitas vezes perdendo o rumo e arrependendo-se, mas ocasionalmente cumprindo a grande promessa de uma cultura pluralista, com suas muitas liberdades. O pós-modernismo é em essência a eclética mistura de qualquer tradição com a do passado imediato: é tanto uma continuação do modernismo quanto sua transcendência. Seus melhores trabalhos são, caracteristicamente, de dupla codificação e irônicos, dando destaque à amplitude de opção, conflito e descontinuidade das tradições, porque tal heterogeneidade capta com a maior clareza possível nosso pluralismo. (JENCKS apud KUMAR, 1997, p. 115-116, grifo nosso) Nota-se, portanto, que, na Pós-modernidade, o indivíduo não encontra uma tradição a lhe dar um direcionamento. Ao invés de uma tradição, ele encontra uma combinação e uma síntese de muitas delas. A pluralidade de opções que lhe são oferecidas torna-o incapaz de saber o que seria melhor para si mesmo. Antes mesmo de experimentar o sentido de sua escolha, novas opções (melhores, ou pelo menos aparentemente melhores) lhe são apresentadas pelo bombardeio informacional da mídia. Isso o encaminha a um ciclo de consumo: consome o que os outros consomem, para que ele consiga fazer o que os outros fazem. Em toda essa consumação, a sua própria 11 Ersatz: substituto ou substituição (WIKPÉDIA, 2008c). 45 existência e o seu respectivo sentido acabam sendo também exauridos. Nesse aspecto, Kumar nos revela: A mídia criou uma nova “realidade eletrônica”, saturada de imagens e símbolos, que obliterou todo e qualquer sentido de realidade objetiva por trás dos símbolos. Na situação que Jean Baudrillard chama de “êxtase da comunicação”, o mundo, nosso mundo, torna-se puramente um mundo de “simulação”, “a geração através de modelos de um real sem origem ou realidade: um hiper-real”. Na hiper-realidade não é mais possível distinguir o imaginário do real, nem o signo de seu referente, e ainda menos o verdadeiro do falso. (KUMAR, 1997, p. 134, grifo do autor) Segundo Kumar (1997), a hiper-realidade não só desconstrói a realidade objetiva como também o indivíduo. A esse respeito, Poster citado por Kumar nos diz: No [novo estágio] do modo de informação, o sujeito não está mais localizado em um ponto no tempo/espaço absoluto, desfrutando de um ponto de observação físico, fixo, do qual possa racionalmente calcular suas opções. Em vez disso, é multiplicado por banco de dados, dispersado por mensagens e conferências em computador, descontextualizado e reidentificado por anúncios de TV, dissolvido e materializado continuamente na transmissão eletrônica de símbolos.... O corpo não é mais um limite eficaz da posição do sujeito. Ou talvez seja melhor dizer que os meios de comunicação estendem o sistema nervoso por toda a Terra, até o ponto em que ele envolve o planeta numa noosfera de linguagem, para usar o termo de Teilhard de Chardin. Se posso falar diretamente ou por correio eletrônico com um amigo em Paris enquanto estou sentado em minha cadeira na Califórnia, se posso presenciar eventos políticos e culturais no momento em que ocorrem no planeta sem deixar minha casa, se um banco de dados de localização remota contém meu perfil e o informa a órgãos do governo, que tomam decisões que afetam minha vida sem que eu tenha conhecimento de meu papel nesses fatos, se posso fazer compras de minha casa usando meu aparelho de TV ou computador, então onde estou e quem sou eu? Nessas circunstâncias, não posso me considerar centrado em uma subjetividade racional, autônoma, ou limitado por um ego definido, mas sou despedaçado, subvertido e dispersado pelo espaço social. (POSTER apud KUMAR, 1997, p. 138-139) O sujeito necessita de um referencial simbólico para se constituir como tal. No entanto, os signos e símbolos já não fazem menção a um real verdadeiro, mas a um real virtual. Essa realidade virtual fragmenta o sujeito, na medida em que é capaz de simular ele próprio as suas opiniões e seus valores. Estando o sujeito fragmentado, a sua opção de reencontro com o self parte de um raciocínio identificatório com as imagens que consome. É nesse sentido que a publicidade ganha status de cultura na sociedade pósmoderna. A propaganda vende felicidade, beleza, saúde, riqueza, por meio dos mais diferentes tipos de produtos, desde um simples creme dental, até cirurgias plásticas milagrosas. O conhecimento transmitido pelas tradições passa a ser ultrajado, diante de tantos novos recursos. A explosão das informações dá acesso a todo tipo de questionamento e assim pressupõe as dúvidas. Antes, o sujeito se constituía com 46 referência a atividades coletivas ou grupais, na sociedade e na família. Com o culto à imagem, o sujeito se constitui quando se torna o simulacro dessa imagem (KUMAR, 1997; HARVEY, 1992). Conforme nos diz Harvey: Dada a capacidade de produzir imagens como mercadorias mais ou menos à vontade, é factível que a acumulação se processe ao menos em parte com base na pura produção e venda da imagem. A efemeridade dessas imagens pode ser interpretada parcialmente como uma luta dos grupos oprimidos de qualquer espécie para estabelecer sua própria identidade (em termos de cultura de rua, estilos musicais, manias e modas criadas para eles mesmos) e como reforço para fazer essas inovações criarem vantagens comerciais [...] O efeito é dar a impressão de que estamos vivendo num mundo de efêmeras imagens criadas [...] Os materiais de produção e reprodução dessas imagens, quando estas não estão disponíveis, tornaram-se eles mesmos o foco da inovação – quanto melhor a réplica da imagem, tanto maior o mercado de massas da construção da imagem pode tornar-se. Isso constituiu por si só uma questão importante, levando-nos de modo mais explícito a considerar o papel do “simulacro” no pós-modernismo. Por “simulacro” designa-se um estado de réplica tão próxima da perfeição que a diferença entre o original e a cópia é quase impossível de ser percebida. Com as técnicas modernas, a produção de imagens como simulacros é relativamente fácil. Na medida em que a identidade depende cada vez mais de imagens, as réplicas seriais e repetitivas de identidade (individuais, corporativas, institucionais e políticas) passam a ser uma possibilidade e um problema bem reais. (HARVEY, 1992, p. 261) A cultura da imagem e do consumo, segundo Lasch (1983), é uma das influências sociais que contribuem para a organização de uma personalidade do tipo narcisista: Vivemos num torvelinho de imagens e ecos que paralisam a experiência e repõem-na em funcionamento em marcha lenta. As câmaras e os aparelhos de registro de sons e imagens não somente transcrevem a experiência, como alteram a sua qualidade, dando a muitos aspectos da vida moderna o caráter de uma enorme câmara de eco, uma sala de espelhos [...] A proliferação das imagens registradas mina nosso senso de realidade. Conforme observa Susan Sontag em seu estudo sobre a fotografia: “A realidade passou a parecer-se cada vez mais com o que as câmaras nos mostram”. Desconfiamos de nossas percepções até que a câmara as ateste. As imagens fotográficas dão-nos a prova de nossa existência, sem a qual acharíamos difícil até mesmo reconstruir uma história pessoal. As famílias burguesas dos séculos dezoito e dezenove, como indica Sontag, posavam para retratos de forma a proclamar o status da família, ao passo que hoje em dia, o álbum de fotografias da família atesta a existência do indivíduo: o registro documental de seu desenvolvimento desde a infância proporciona-lhe a única evidência de sua vida, que ele reconhece como totalmente válida. Entre os “muitos usos narcisistas” que Sontag atribuiu à câmara, a “autovigilância” situa-se entre os mais importantes, não só porque ela proporciona os meios técnicos de incessante auto-escrutínio, mas porque torna o senso de identidade dependente do consumo de imagens do eu, ao mesmo tempo colocando em questão a realidade do mundo exterior. Ao preservar as imagens do eu em vários estágios do desenvolvimento, a câmara ajuda a enfraquecer a antiga idéia de desenvolvimento como educação moral e a promover uma idéia mais passiva, de acordo com a qual o desenvolvimento consiste em atravessar os 47 estágios na vida no tempo certo e na hora certa. (LASCH, 1983, p. 74, grifo do autor) Para Lash, o auto-escrutínio pela reprodução da imagem criou uma resposta narcisista largamente difundida: “a emergência de uma ideologia terapêutica que sustenta um esquema normativo de desenvolvimento psicossocial” (LASCH, 1983, p. 74). Segundo esse ideal, qualquer desvio da norma tem uma gênese patológica. Por exemplo: a medicina passou a cultuar o check up, onde, através de exames por imagens, pode-se varrer o indivíduo por inteiro à procura de doenças. Esse tipo de culto infundiu nos pacientes a noção de que a saúde somente pode estar bem se for constantemente vigiada, e se tal vigilância for confirmada por uma imagem sem máculas. O paciente só se sente física e psicologicamente seguro frente a esse registro limpo (LASCH, 1983). Segundo Lash: A medicina e a psiquiatria – mais geralmente, o ponto de vista e a sensibilidade terapêuticos que invadem a sociedade moderna – reforçam o padrão criado por outras influências culturais, nas quais o indivíduo examinase interminavelmente, à procura de sinais de velhice e doença, de sintomas indicadores de tensão psíquica, por manchas e imperfeições que possam diminuir sua atração, ou por outro lado, para confirmar as indicações de que sua vida está seguindo de acordo com o esquema. (LASCH, 1983, p. 75) Essa resposta narcisista ao culto da imagem traz conseqüências sobre uma antiga questão do ser humano: o medo da morte. Os homens sempre temeram a morte, mas esse medo vem assumindo uma dimensão maior em uma sociedade que se privou da religião e da transmissão dos costumes pelos mais velhos. Conforme nos diz Lasch: A velhice inspira, além do mais, apreensão, não só porque representa o início da morte, mas porque a condição das pessoas idosas tem-se deteriorado objetivamente nos tempos modernos. Nossa sociedade notoriamente encontra pouco uso para os mais velhos. Ela os define como inúteis, força-os a se aposentar antes de ter exaurido sua capacidade para o trabalho e reforça seu senso de superfluidade em todas as oportunidades. Insistindo, ostensivamente, em um espírito de respeito e amizade, que eles não perderam o direito de gozar a vida, a sociedade lembra às pessoas idosas que elas não têm outra coisa melhor para fazer com seu tempo. Ao desvalorizar a experiência e dar muito valor à força física, destreza, adaptabilidade e à capacidade de surgir com novas idéias, a sociedade define a produtividade em modos que automaticamente excluem os “cidadãos mais velhos”. O conhecido culto da juventude enfraquece ainda mais a posição social dos que não são mais jovens. (LASCH, 1983, p. 253) Para Lasch (1983), esse horror à velhice, que se disseminou sobre a sociedade contemporânea, não deve ser somente um reflexo das mudanças na situação social dos mais velhos, como também deve se originar em alguma predisposição interior. As mudanças sociais traduzem percepções, hábitos mentais e conexões inconscientes em 48 constante modificação. As experiências subjetivas decorrentes de tais modificações desenvolveram, em algum ponto, um horror especial à velhice. Lasch denominou esse ponto de “pânico irracional”. Nas suas palavras: O sinal mais óbvio deste pânico é que ele surge na vida das pessoas muito prematuramente. Homens e mulheres começam a temer a velhice antes mesmo de chegar à meia-idade. A chamada crise da meia-idade apresenta-se como uma compreensão de que a velhice assoma à nossa porta. Os americanos experimentam o quadragésimo aniversário como o início do fim. Até mesmo o apogeu da vida, assim, vem a ser obscurecido pelo medo do que virá. Este terror irracional da velhice e da morte está intimamente associado à emergência da personalidade narcisista como o tipo dominante de estrutura da personalidade na sociedade contemporânea. Por ter o narcisista tão poucos recursos interiores, ele olha para os outros para validar seu senso do eu. Precisa ser admirado por sua beleza, encanto, celebridade, ou poder – atributos que geralmente declinam com o tempo (LASCH, 1983, p. 254). De acordo com Lash (1983), uma mudança no sentido de tempo também emerge como conseqüência do surgimento da personalidade narcisista na sociedade pósmoderna. Essa questão pode ser observada pela falta de empenho com que o tema da paternidade tem sido abordado por casais, sociólogos e até por psiquiatras, que recomendam aos pais não viverem através de seus descendentes. Há um profundo sentimento de desassossego sobre se realmente a nossa sociedade deveria reproduzir-se. O que esse sentimento acaba por revelar é a perda do interesse pelo futuro. Em uma sociedade que não pensa em futuro, as idéias de morte e substituição tornam-se insuportáveis, originando as tentativas de suprimir a velhice e estender a vida sem definição de seus limites. Nas palavras do autor: Quando os homens se vêem incapazes de se interessar pela vida terrena após sua própria morte, desejam eles a eterna juventude, pela mesma razão por que não mais cuidam de se reproduzir. Quando a perspectiva de ser substituído torna-se intolerável, a própria paternidade, que garante que isto acontecerá, aparece quase como uma forma de autodestruição. Em Kinflicks, de Lisa Alther, um rapaz explica por que razão não quer ter filhos. “Sempre vi o mundo como um palco. E qualquer filho meu seria um jovem ator ansioso para aparecer, que iria querer tirar-me do palco, observando-me e esperando para enterrar-me, para que ele pudesse assumir o centro do palco.” (LASCH, 1983, p. 255-256) O valor da velhice se vinculava ao acúmulo e transmissão de conhecimento. A sabedoria acumulada era importante justamente porque ela podia ser repassada às gerações futuras. Hoje, as constantes mudanças decorrentes dos avanços técnicocientíficos, aliadas ao desinteresse pela posteridade, tornam o conhecimento rapidamente ultrapassado e, portanto, intransferível. Dessa forma, o que o presente da 49 sociedade pós-moderna acaba por traduzir é uma verdadeira corrida contra o tempo (LASCH, 1983). Lasch revela que: A superfluidade das pessoas de meia-idade e mais velhas se origina no rompimento do sentido de continuidade histórica. Pelo fato de a geração mais velha não mais pensar que sobreviverá à seguinte, que alcançará uma imortalidade vicária na posteridade, ela não cede, dignamente, lugar aos jovens. As pessoas agarram-se à ilusão de juventude, até que esta não possa mais ser mantida, ponto em que são obrigadas ou a aceitar seu status supérfluo ou cair em negro interesse pela vida. (LASCH, 1983, p. 258) Essa superfluidade ou o “negro interesse pela vida” desvelam a cada vez maior descrença nos valores que “faz[em] o mundo e a atividade dos homens parecerem insensatos e estéreis” (PFANDER apud FRANKL, 1978). Sem os valores, o homem cai no vazio existencial, e, quando ele mergulha nesse vazio, tornando-se consciente do mesmo, ele se frustra e sofre. Conforme explica Rodrigues: Quanto à frustração existencial, esta, como enuncia o termo, é uma condição mais séria que o vazio existencial, porque significa que as pessoas, além de vazias ou estéreis, estão frustradas. Seu sofrimento consiste em uma grande mágoa e um sentimento de malogro, falha, imperfeição e incapacitação para definir metas. Aqui as pessoas já se apercebem dessa situação de falência. Sem dúvida, elas não poderiam estar frustradas, se sua consciência de irrealização de valores não as perturbasse. Daí que a frustração existencial se constitua num estado de desconforto, ansiedade e tristeza e insatisfação bastante mais intolerável que o vazio, e sem dúvida [...] leve a estados psicopatológicos de alto risco. [...] Pode aparecer sob a forma de tristezas de longo prazo, pessimismo e negativismo. A pessoa está angustiada e luta muito por vencer “barreiras” das mais variadas que se antepõem às suas metas. (RODRIGUES, 1991, p.186-187, grifo do autor) A frustração existencial, segundo Frankl, também pode evoluir para um quadro de neurose, o qual não surge de conflitos entre instintos e impulsos, mas sim de problemas existenciais: Para esse tipo de neuroses, a logoterapia cunhou o termo “neuroses noogênicas”, a contrastar com as neuroses na significação habitual da palavra, isto é, as neuroses psicogênicas As neuroses noogênicas têm sua origem não na dimensão psicológica, mas antes na dimensão “noológica” (do termo grego noos, que significa “mente”) da existência humana. (FRANKL, 2005, p. 93, grifo do autor) A neurose noogênica ocorre quando o indivíduo se torna incapaz de encontrar o sentido para sua existência através da realização de valores. Essa neurose pode se manifestar nos mais variados sintomas e sua origem está no campo noético, ou seja, no campo espiritual do homem (RODRIGUES, 1991). Quanto aos sintomas da neurose noogênica, Rodrigues nos esclarece: 50 Citaremos alguns dos sintomas mais comuns, os quais não diferem, na essência, daqueles das “neuroses psicógenas”: há um matiz predominantemente ansioso e depressivo; uma grande insatisfação e desconforto interno [...] Muitos outros sintomas podem aparecer, como uma síndrome fóbica, obsessivo-compulsiva, sintomas de despersonalização, de conduta dissocial e imatura, sintomas na área somática, como neurastênias, organo-neuroses, hipocondríases, neurose cardíaca, etc. Enfim, toda uma gama de sintomas neuróticos pode aparecer, os quais tornam a vida da pessoa quase incapacitante para a atividade laborativa, social e familiar [...] Há uma fuga desse sentimento de vazio para os sintomas, estes seriam como que uma válvula de escape do vazio e da frustração. No sofrimento de não poder cumprir as metas particulares de sua vida, a pessoa desloca a motivação de vida perdida para uma “descarga sintomática” nas dimensões psíquica, somática ou social com conseqüências muito danosas para si e para os outros, o que realimenta a neurose como uma bola de neve. E como se sabe, a exacerbação dos sintomas pode levar a situações patológicas de alto risco [...]. (RODRIGUES, 1991, p. 186-187, grifo do autor) Diante da presença do vazio existencial, portanto, várias são as manifestações físicas, psíquicas e sociais que o indivíduo idoso pode apresentar. O presente estudo trata de indivíduos idosos portadores de DAC que foram submetidos à cirurgia de revascularização do miocárdio. Nesse contexto, torna-se relevante expor o vínculo entre os sintomas do vazio existencial e a incidência de DAC. Frankl revela que: H. kleinsorge e G. Klumbies, da Policlínica da Universidade de Jena, conseguiram, finalmente, a comprovação exata de que a formação de estímulos, a contração das aurículas, a propagação da excitação nos ventrículos, o refluxo da excitação, a nova síntese de glicogênio e o calibre das coronárias modificam-se sob o efeito do psiquismo. Os citados autores “causaram vivências psíquicas de toda espécie pela hipnose mantendo um controle eletrocardiográfico e interpretando posteriormente os eletrocardiogramas”. Em tais experimentos, “as preocupações, desgostos e saudades revelaram agir como tóxicos causadores de espasmos nas coronárias. A alegria funcionou como antídoto e remédio: mostrou-se tão dilatadora das coronárias quanto o nitrato”. Contudo, a análise eletrocardiográfica permitiu que os autores concluíssem que “nem todas as formas de alegria exercem tal efeito. A alegria da expectativa não o faz, só a da realização”. Tão engraçada como comovente nos parece a observação dos investigadores de que “essa alegria não depende em nada de uma vida luxuriosa”. No exemplo deles, os fatores determinantes são, pelo contrário, a visão do céu azul, flores de variadas cores ou o brilho do sol, coisas que estão ainda hoje ao alcance de todos, conforme nos garante esse semanário. (FRANKL, 1978, p. 80, grifo do autor) Como vimos, o vazio existencial se traduz em um profundo estado de angústia e de tédio, proveniente de uma tensão excessiva entre o que se é e o que se deveria ser. Ora, angústia, tédio, tensão em excesso correspondem à ansiedade opressiva, desgosto, depressão e estresse. E quão difundido está o conhecimento acerca dos males que tais manifestações podem causar para o coração! Na elucidação de Ilić e Apostolović: 51 A idéia de que emoções, sentimentos e o contexto social podem contribuir para a ocorrência de doença do coração não é nova. Por séculos tem sido popular, senão científica, a associação entre o coração e as emoções. De todas as partes do corpo, o coração ocupa um lugar especial no senso comum de que é o lugar da emoção, empenho e mesmo da própria vida. Toda a nossa linguagem diária torna isso claro. Nós falamos sobre coração machucado e entristecido, sobre toda a força do amor que vem do coração, sobre fazer o nosso trabalho com todo o coração, de indivíduos descolados que são a alma e o coração de suas organizações. Metaforicamente, tanto quanto psicologicamente, o coração é crucial para a identidade do sujeito e sua função social. Por isso, reações emocionais que desenvolvem doença do coração, freqüentemente incluem aspectos de choque, medo, raiva, culpa, tristeza, angústia e desgosto. (ILIĆ; APOSTOLOVIĆ, 2002, p. 138, tradução nossa12) Para as citadas autoras, a ocorrência de alterações psicológicas e doença cardíaca, em muitos pacientes, exemplifica a complexidade dos efeitos psicossomáticos e/ou somatopsíquicos em sua gênese e/ou progressão. No entanto, para Frankl (1978), a distinção entre o que é físico e o que é psíquico, em termos humanos, não existe. De acordo com os fundamentos antropológicos da Logoterapia de Frankl, o homem somente pode ser considerado como um ser verdadeiramente humano a partir do momento em que ele é capaz de se autotranscender, ou seja, a partir do momento em que ele é capaz de projetar um sentido para sua vida, além dos limites nos quais ela se encontra. O vazio existencial pode ser interpretado como uma incapacidade do ser humano para realizar essa projeção, trazendo um sofrimento espiritual que pode ser observado por condutas nocivas à saúde. Dentre elas, podemos citar vícios como o alcoolismo e o uso de drogas ilícitas. Os próprios excessos de trabalho e preocupação podem ser formas de escape do vazio, causando sinais e sintomas de estresse mental ou emocional, como hostilismo, irritabilidade, ansiedade, depressão e afastamento social. Nas palavras de Loures et al: A cultura popular há muito associa o estresse agudo e crônico com o desenvolvimento de doenças, corroborado por inúmeros estudos epidemiológicos e experimentais, que demonstram uma ligação entre o estresse mental e o aparecimento e curso de muitas doenças, desde simples infecções virais, até úlceras gástricas e neoplasias. O sistema cardiovascular possui ampla participação na adaptação ao estresse, sofrendo por isso as conseqüências da sua exacerbação. (LOURES, Débora et al, 2002, p. 525) 12 The idea that emotions, feelings and social contexts may contribute to the cause of heart disease is not a new one. For centuries, there has been popular, if not scientific, association between the heart and emotions. Of all the parts of the body, the heart holds a place of special distinction in common thinking as the seat of emotion, effort and even of life itself. Our everyday language makes this clear. We speak of heartbreak and heavyheartedness, of love coming straight from the heart, of putting our heart into our work, of outstanding individuals who are "heart and soul" of their organizations. Metaphorically, as well as physiologically, the heart is crucial to one's identity and social function. Therefore, normal emotional reactions to the development of heart disease often include aspects of shock, fear, anger, guilt, sadness and grief. 52 Frente a essas constatações, faz-se necessária uma abordagem mais ampla da doença arterial coronariana, seus fatores de risco, formas de tratamento e prevenção, especialmente a CRVM e a Reabilitação Cardíaca. Esses serão, portanto, os temas do capítulo que se segue. 53 4 DOENÇA ARTERIAL CORONARIANA 4.1 Definição Segundo Cassady: A doença cardíaca aterosclerótica (DCA) também conhecida como doença arterial coronariana (DAC) é um processo de doença progressivo caracterizado por depósitos irregulares de lipídeos, distribuídos na camada íntima das artérias coronárias médias e grandes. (CASSADY, 2007, p. 139) 4.2 Epidemiologia Ainda na primeira metade do século XX, a doença cardiovascular já se tornava a principal causa de morte na maior parte do mundo industrializado. No século XXI, ela se mantém como a primeira causa de morte nos países desenvolvidos e, em grande parte, nos países em desenvolvimento, por isso a importância do seu estudo (ROCHA; LIBBY, 2005; CHAGAS; YUGAR; NETO, 2002). De acordo com Chagas, Yugar e Neto: Nos últimos 30 anos, com o melhor conhecimento de mecanismos biológicos da doença cardiovascular, avanços tecnológicos e novas terapias, farmacológica, intervencionista e cirúrgica, ocorreu declínio de aproximadamente 60% na mortalidade por DAC e acidente vascular cerebral (AVC); porém, dados populacionais mostram aumento na prevalência de DAC. [...] De acordo com o 3th National Health and Nutrition Survey (1988), esse aumento relacionou-se com o avanço da idade [...] Segundo o IBGE, no Brasil, na década de 1940, a população idosa compreendia 4% e na década de 1990 esta taxa foi de 7,7%. Com o aumento da longevidade, ocorreu modificação epidêmica, com incremento da prevalência do diabetes meliitus tipo II, que por sua vez, aumenta em 2 a 4 vezes o risco de DAC, e também pelo aumento de insuficiência cardíaca devida a insuficiência coronariana crônica na população idosa. (CHAGAS; YUGAR; NETO, 2002, p. 14) Segundo Passos, Assis e Barreto (2006), as doenças cardiovasculares, no Brasil, são responsáveis por 33% dos óbitos. Entre 1996 e 1999, essas doenças foram a causa primária de hospitalização no setor público: 17% das internações eram de pessoas com idade entre 40 e 59 anos e 29%, com 60 anos ou mais. Lorga et al (2002) revelam que 54 pesquisas envolvendo autópsias em idosos demonstraram uma prevalência de 70% de DAC, indicando que a principal causa de morte no idoso é a insuficiência coronariana. Lotufo (1998) demonstrou que no Brasil existem altas taxas de mortalidade por DAC. Quando comparou algumas das principais capitais brasileiras com outros países, concluiu que, no Brasil, as taxas de mortalidade por DAC equiparam, ou até mesmo superam, valores encontrados na Europa e nos Estados Unidos. Apesar dos avanços tecnológicos para tratamento e prevenção da DAC, ainda não se conseguiu minimizar satisfatoriamente as conseqüências dessa doença, tida como doença do mundo moderno. Segundo Vale e Martinez (2000), as causas para esse fato são o aumento da longevidade dos indivíduos e a falta de um programa efetivo de prevenção primária e secundária. A prevenção primária é um conjunto de medidas aplicadas em um indivíduo ou em uma população que ainda não tem sintomas da DAC. E a prevenção secundária é feita naqueles indivíduos que já tiveram alguma manifestação da DAC. O aumento da longevidade fornece mais tempo para que a doença se manifeste, pois, independente de doenças associadas, o processo de envelhecimento associa-se a importantes alterações cardiovasculares (LORGA et al, 2002; VALE; MARTINEZ, 2000). Para Vale e Martinez (2000), um resultado satisfatório deve vir a partir de uma intervenção concreta nos chamados fatores de risco para DAC, os quais serão abordados mais adiante neste estudo. Em termos preventivos, esta pesquisa pode trazer uma contribuição para o estudo da DAC, pois existem fatores psicossociais já considerados de risco para essa doença (BROOKS, 2007). 4.3 Fisiopatologia A obstrução arterial causada por placa aterosclerótica é o principal mecanismo patogênico da DAC. As outras causas, como malformações congênitas das artérias coronárias e arterite coronária associada a vasculites e pós-radiação, correspondem a aproximadamente 10% dos achados (ZORNOFF et al, 2005). O caso deste estudo está relacionado à aterosclerose, sendo esse, portanto, o nosso maior interesse. Segundo Duque: 55 O termo “aterosclerose” (Gr. atheros-papa) foi criado por Marchand, em 1904, para descrever a esclerose vasal que era acompanhada de depósitos gordurosos. De todas as formas de esclerose arterial, a aterosclerose é a mais importante, posto que as placas fibro-ateromatosas que a caracterizam levam à oclusão do vaso e à instalação de várias síndromes isquêmicas graves (infarto do miocárdio, ictus cerebral13, gangrena de membros, etc). (DUQUE, 1998, grifo do autor) O conhecimento sobre a fisiopatologia da aterosclerose ainda está em construção. Segundo Rocha e Libby (2005), até o início do século XX, duas fortes correntes dominaram esse conhecimento. A mais antiga delas, a teoria de Rokitansky, atribuía a doença aterosclerótica à organização de trombos aderentes à parede vascular. A teoria de Virchow defendia a linha de que a aterosclerose decorria da deterioração da camada íntima das artérias. Entre os anos de 1908 e 1913, outras teorias, como as de Ignatovisk, Stuckey, Chalatov e Anichlov, relacionaram a aterosclerose como resultado da ingestão de dieta rica em colesterol. Uma breve descrição sobre a estrutura e função de uma artéria normal se faz necessária antes de se apresentar os mecanismos envolvidos na gênese do processo aterosclerótico (aterogênese). A estrutura de uma artéria normal, de médio e grande calibres, é composta de três camadas: íntima, média e adventícia. A camada íntima constitui-se de uma única camada de células endoteliais (endotélio), que repousam sobre uma membrana basal contendo colágeno, fibronectina14 e outras moléculas de matriz extracelular. O endotélio é uma superfície de propriedades biológicas únicas. Produz substâncias endógenas capazes de regular o tônus vasomotor, influenciar a adesão e a agregação plaquetárias15 e reger a interação entre endotélio e células inflamatórias. O principal modulador da vasodilatação é o fator de relaxamento derivado do endotélio, conhecido como óxido nítrico, que também suprime a agregação plaquetária, a migração ou adesão leucocitária16 e atenua a proliferação de células musculares lisas. O endotélio também produz a endotelina-1, o mais potente vasoconstritor já conhecido. Em seu equilíbrio 13 Ictus cerebral é o mesmo que Acidente Vascular Cerebral. A fibronectina é uma glicoproteína que ajuda as células a se aderirem à matriz extracelular (GUYTON; HALL, 1997). 15 As plaquetas ou trombócitos são fragmentos de células e encontram-se presentes no sangue. Sua principal função é a formação de coágulos, participando, portanto, do processo de coagulação sangüínea (GUYTON; HALL, 1997). 16 Leucócitos ou glóbulos brancos são células produzidas na medula óssea e presentes no sangue, linfa, órgãos linfóides e vários tecidos conjuntivos. Têm a função de combater antígenos por meio de sua captura ou da produção de anticorpos. Dividem-se em monócitos, macrófagos, neutrófilos, eosinófilos, basófilos e linfócitos, que, por sua vez, possuem funções específicas no processo de defesa (GUYTON; HALL, 1997). 14 56 homeostático17 normal, o endotélio comporta-se como uma superfície anticoagulante. Quando o endotélio é agredido por forças físicas ou químicas, transforma-se em superfície pró-coagulante, propriedade que, apesar de ter função protetora, é base de várias desordens trombolíticas, como a aterosclerose. Com o envelhecimento, as artérias humanas desenvolvem uma camada íntima mais complexa, contendo células musculares lisas e colágeno intersticial (CASSADY, 2007; ROCHA; LIBBY, 2005; SERRANO Jr. et al, 2003; CHAGAS; YUGAR; NETO, 2002). A camada média é constituída por células musculares lisas intercaladas por matriz extracelular rica em elastina. As propriedades contráteis das células musculares lisas são influenciadas por mediadores locais, como o óxido nítrico e a endotelina produzidos pelo endotélio. A artéria adulta normal exibe níveis consideravelmente baixos de renovação de células musculares lisas. Porém, em condições patológicas, fatores locais, como os fatores de crescimento18, citocinas19, células inflamatórias e o colesterol modificado, e fatores sistêmicos, como a pressão arterial, podem alterar substancialmente o equilíbrio entre a replicação e morte dessas células (CASSADY, 2007; ROCHA; LIBBY, 2005; SERRANO Jr. et al, 2003; CHAGAS; YUGAR; NETO, 2002). A camada adventícia consiste de fibras elásticas colágenas e pequenos vasos sangüíneos (vasa vasorum). Foi considerada, por muito tempo, apenas como tecido de suporte destinado a nutrir as células musculares da camada média. Mais recentemente, o seu papel vem sendo revisto. Diversos estudos já demonstraram que o fibroblasto20 e outras células também presentes na adventícia, como os macrófagos21 e mastócitos22, parecem contribuir para o papel ativo dessa túnica na função vascular. A produção de 17 Homeostase ou homeostasia é um termo empregado pelos fisiologistas para designar a manutenção de condições estáticas ou constantes do meio interno. Essencialmente, todos os órgãos e tecidos do corpo humano desempenham funções que ajudam a manter as condições do meio interno em equilíbrio (GUYTON; HALL, 1997). 18 Os fatores de crescimento correspondem a um conjunto de substâncias, grande parte de natureza protéica, que, ao lado dos hormônios e neurotransmissores, cumprem um importante papel na comunicação entre as células (GUYTON; HALL, 1997). 19 Citocinas: grupo de moléculas responsáveis pela emissão de sinais entre as células quando ocorre o desencadeamento de respostas imunológicas (GUYTON; HALL, 1997). 20 O Fibroblasto é uma célula do tecido conjuntivo, cuja função é produzir fibras estruturais (GUYTON; HALL, 1997). 21 Macrófagos são leucócitos presentes no tecido conjuntivo, ricos em lisossomos (organelas citoplasmáticas), que fagocitam (englobam e digerem) elementos estranhos ao corpo. Os macrófagos derivam dos monócitos do sangue e de células conjuntivas ou endoteliais. Intervêm na defesa do organismo contra infecções (GUYTON; HALL, 1997). 22 O mastócito é uma célula do tecido conjuntivo que possui uma grande quantidade de histamina (substância envolvida em reações alérgicas) e heparina (uma substância anticoagulante) (GUYTON; HALL, 1997). 57 angiotensina II23 e citocinas, por essas células, na região perivascular, pode gerar um incremento na produção endógena de radicais livres de oxigênio, capazes de promover disfunção endotelial. Além disso, demonstrou-se que doses subpressóricas de angiotensina II promoviam a formação de placa e de aneurisma em modelos animais de aterosclerose (CASSADY, 2007; ROCHA; LIBBY, 2005; SERRANO Jr. et al, 2003; CHAGAS; YUGAR; NETO, 2002). Para Cassady, “o metabolismo anormal dos lipídeos e/ou a quantidade excessiva de colesterol e de gorduras saturadas, em especial nas predisposições genéticas, iniciam o processo aterosclerótico e o desenvolvimento de placa aterosclerótica.” (CASSADY, 2007, p.140) O mecanismo exato para a aterogênese permanece em estudo, entretanto, há duas explicações mais convincentes envolvidas nesse processo que merecem uma pequena descrição: a Teoria da Infiltração de Lipídeos e a Teoria da Lesão Endotelial Crônica (CASSADY, 2007; BLESSEY, 1994). A Teoria da Infiltração de Lipídeos entende que a elevação do nível de LDL colesterol24 favorece sua penetração na parede da artéria, levando à acumulação de lipídeo nas células musculares lisas e nos macrófagos. Os macrófagos repletos de gordura (LDL) são denominados células espumosas. O LDL aumenta o número das células musculares lisas e a migração destas para a camada íntima, como uma resposta a fatores de crescimento. A proliferação de células musculares lisas também acumula lipídeos, formando a placa fibrosa. Nesse meio, o LDL reage com radicais livres e é oxidado (modificado). Isso eleva o seu potencial aterogênico, pois suas moléculas são atraídas por monócitos25 para a camada íntima e transformadas em células espumosas na camada subíntima, facilitando o surgimento da camada gordurosa. O LDL modificado é tóxico para as células endoteliais e pode ser o causador de suas disfunções ou lesões mais avançadas. Ao mesmo tempo em que a camada gordurosa e a placa fibrosa crescem, formando uma proeminência na luz da artéria, o subendotélio fica exposto (próximo aos locais de retração do endotélio) e plaquetas se agregam formando um trombo. A organização e o agrupamento do trombo na placa aterosclerótica pode 23 A angiotensina II é um peptídeo derivado da angiotensina I. Sua principal função é o controle da pressão arterial, atuando como poderoso agente vasoconstritor (GUYTON; HALL, 1997). 24 O LDL colesterol é uma lipoproteína de baixa densidade, conhecida popularmente como “colesterol ruim”. 25 Os monócitos são leucócitos que, depois de serem produzidos na medula óssea, circulam cerca de 24 horas no sangue. Posteriormente, deslocam-se para os tecidos, onde passam a ser denominados macrófagos (GUYTON; HALL, 1997). 58 contribuir para seu desenvolvimento (CASSADY, 2007; DUQUE, 1998; BLESSEY, 1994). A Teoria da Lesão Endotelial Crônica estabelece que, devido às agressões de diversas origens sobre o endotélio, há uma perda desse tecido. Ocorrem então, no subendotélio, adesão e agregação plaquetária, atração química de monócitos, linfócitos T26 e liberação de fatores de crescimento derivados de plaquetas e monócitos. A conseqüência disso é a migração de células musculares lisas da camada média para o subendotélio, onde elas se multiplicam e sintetizam tecido conjuntivo, formando uma placa fibrosa. A placa fibrosa vai retendo LDL em sua matriz, dando início ao crescimento da placa aterosclerótica (CASSADY, 2007; DUQUE, 1998; BLESSEY, 1994). Cassady (2007) e Blessey (1994) revelam que essas duas teorias foram combinadas em uma hipótese única, pois os mecanismos aterogênicos de ambas estão interligados, o que não permite que uma exclua a outra. Segundo Blessey, “a Hipótese Unificada propõe que há dois componentes principais da aterosclerose, lesão ou dano celular endotelial e infiltração lipídica.” (BLESSEY, 1994, p. 13) De acordo com Rocha e Libby: Em uma visão contemporânea e mais realista da aterosclerose, elementos de cada uma das teorias anteriores podem não apenas coexistir, como também apresentarem-se reunidos por um mesmo elo: a inflamação. Após duas décadas de estudos sobre as complexas interações entre monócitos/macrófagos e linfócitos T, e dessas células com o endotélio e as células musculares lisas em uma lesão aterosclerótica, o envolvimento da inflamação na fisiopatologia da aterosclerose é atualmente consensual. (ROCHA; LIBBY, 2005) Brooks explica como a inflamação do endotélio atua na aterogênese: [...] um processo inflamatório atrai células relacionadas à imunidade, incluindo macrófagos e linfócitos T, que iniciam a destruição do endotélio. Os macrófagos engolfam moléculas de lipídeos acumuladas e se tornam grandes células espumosas adiposas. As células da musculatura lisa, que compreendem as camadas da parede arterial adjacente ao endotélio, migram em direção à lesão em desenvolvimento e aumentam a destruição do endotélio. Somadas às células espumosas e aos linfócitos T, essas células formam o que é chamado de linha adiposa, que é a mais precoce lesão endotelial identificada no processo aterosclerótico. Essas lesões têm sido encontradas em crianças e adolescentes, chamando atenção para a idade precoce na qual esse processo começa. (BROOKS, 2007, p.440) 26 O linfócito T auxiliar é um leucócito que tem o papel de coordenar a função de defesa imunológica, principalmente através da produção e liberação de substâncias chamadas citocinas (GUYTON; HALL, 1997). 59 Em virtude do caráter inflamatório da aterogênese, indicadores inflamatórios como a proteína C reativa estão sendo avaliados para diagnosticar precocemente a aterosclerose (MONTEIRO; FONSECA, 2006). Pesquisas mais recentes também têm demonstrado que agentes infecciosos, como Chlamydia pneumoniae, Mycoplasma pneumoniae, Helicobacter pylori e citamegalovírus, também podem ter um envolvimento tanto na gênese como no agravamento da aterosclerose (CASSADY, 2007; HIGUCHI; FONSECA, 2007). A placa aterosclerótica pode demorar a crescer e, somente após vários anos, resultar em estenose arterial grave ou progredir para obstrução total da artéria. Com o tempo, a placa pode vir a se calcificar. As placas podem ser estáveis ou instáveis. As placas estáveis possuem um componente fibroso predominante e, geralmente, causam obstrução lenta e progressiva da luz arterial coronariana. As placas instáveis apresentam elevadas concentrações de lipídeos e são cobertas por uma fina camada fibrosa. Podem sofrer fissura espontânea ou ruptura, derramando seu conteúdo na corrente sangüínea. A placa rompida estimula a agregação plaquetária, com formação de um trombo. O trombo pode causar embolia ou ocluir a luz da artéria, causando isquemia ou infarto agudo do miocárdio (IAM). O trombo também pode ser incorporado à placa, contribuindo para seu crescimento progressivo (CASSADY, 2007; DUQUE, 1998; BLESSEY, 1994). 4.4 Fatores de Risco Coronariano A expressão “fatores de risco” foi descrita primariamente em 1949, por um estudo realizado na cidade de Framingham. Esse termo foi aplicado para designar características estatisticamente relevantes que contribuíram para o desenvolvimento da DAC numa população de 5.209 homens e mulheres, com idade entre 30 e 62 anos. Na época, os primeiros resultados já demonstraram que o potencial de risco para DAC aumentou na medida em que mais de um fator esteve presente (BLESSEY, 1994; VALE; MARTINEZ, 2000). Vale e Martinez informam que “atualmente, passados já 50 anos do início deste estudo epidemiológico, a importância da avaliação do chamado risco global do paciente confirma a conjunção e a interação dos inúmeros fatores de risco descritos até hoje.” (VALE;MARTINEZ, 2000, p. 99, grifo do autor) 60 Baseado na sua possibilidade de modificação ou não, por intervenções como mudança no hábito ou estilo de vida e/ou medicamentosa, os fatores de risco foram classificados em modificáveis e não modificáveis (BLESSEY, 1994; VALE; MARTINEZ, 2000). A seguir, discorreremos a respeito dos mesmos. 4.4.1 Fatores de Risco Não Modificáveis Os fatores de risco não modificáveis incluem a idade, sexo e história familiar positiva para DAC. A incidência de DAC é cerca de 3 a 4 vezes mais freqüente nos homens do que nas mulheres, até os 55 anos de idade. Em torno dos 75 anos, essa diferença desaparece entre os sexos. O risco de DAC nas mulheres é maior após os 55 anos de idade, devido ao advento da menopausa27. Assim, a idade e o sexo considerados como fatores de risco para DAC são de 45 anos ou mais nos homens e de 55 anos ou mais nas mulheres (VALE; MARTINEZ, 2000). A respeito do fator de risco idade, Armaganijan e Batlouni trazem uma contribuição especial: A simples relação entre idade e aterosclerose é um modelo primário que enfatiza apenas o tempo de vida, sem considerar os fatores genéticos, bioquímicos e biológicos do envelhecimento. Um modelo secundário correlaciona a idade avançada com a perda da integridade do endotélio comprometida por alguns fatores de risco e incapaz de ser reparada devido ao envelhecimento das células endoteliais e substratos subendoteliais. O modelo terciário correlaciona os dois modelos iniciais com as alterações fisiológicas do envelhecimento: modificações no metabolismo glicídico e lipídico, e concentração plasmática dos hormônios sexuais. Um modelo quaternário mostra que a relação idade e aterosclerose pode ser modificada pela correção dos fatores de risco tradicionais e mudanças no estilo de vida. Esse modelo confirma a associação entre envelhecimento, aterosclerose e impacto dos fatores de risco, sugerindo também a importância da intervenção no idoso. (ARMAGANIJAN; BATLOUNI, 2000, p. 687, grifo nosso) Os antecedentes familiares positivos são considerados como fator de risco independente para DAC. Sua magnitude de risco pode ser relacionada ao grau de parentesco e à freqüência de acontecimentos familiares positivos antecedentes. Segundo Vale e Martinez, “a identificação de mais esse fator de risco é feita pelo relato de IAM ou morte súbita em parente de primeiro grau, antes dos 55 anos de idade para homens e antes dos 65 anos para mulheres.” (VALE; MARTINEZ, 2000, p.100) 27 Na menopausa, ocorre a queda dos níveis de estrogênio, um hormônio feminino que exerce importante papel na proteção das artérias (HERSHMAN, 1985). 61 4.4.2 Fatores de Risco Modificáveis Os fatores de risco passíveis de intervenção constituem a hipercolesterolemia, a hipertensão arterial, o diabete melito, a obesidade, o tabagismo, o alcoolismo ou etilismo, o sedentarismo ou inatividade física, o estresse e os fatores psicossociais (VALE; MARTINEZ, 2000; BROOKS, 2007; PEREIRA; KRIEGER, 2000). Hipercolesterolemia Quando o colesterol (um lípídeo) se une a outros tipos de lipídeos e a algumas proteínas, forma-se um complexo chamado lipoproteína. As lipoproteínas são classificadas bioquimicamente de acordo com sua densidade (SPOSITO et al, 2007; BROOKS, 2007). As lipoproteínas de muito baixa densidade (Very Low Density Lipoproteins ou VLDL) são produzidas no fígado e transportam produtos endógenos, como os triglicerídeos, fosfolipídeos e colesterol. Quando caem na corrente sangüínea, entram em contato com uma enzima que remove os triglicerídeos para armazenamento ou produçao de energia. Na medida em que os triglicerídeos vão sendo removidos do VLDL, ele se transforma em uma lipoproteína de densidade intermediária (Intermediate Density Lipoproteins ou IDL). Parte dessa IDL se transforma em LDL (SPOSITO et al, 2007). As lipoproteínas de baixa densidade (Low Density Lipoproteins ou LDL) são conhecidas como “colesterol ruim”, pois são capazes de transportar colesterol do fígado até as células de vários outros tecidos. As lipoproteínas de alta densidade (High Density Lipoproteins ou HDL) são capazes de absorver os cristais de colesterol que começam a se acumular nas paredes das artérias e de tranportá-los de volta ao fígado, para serem metabolizados. Essa ação pode retardar ou ajudar a reverter o processo aterosclerótico. O termo "colesterol bom" é utilizado para se referir ao HDL, devido a suas ações benéficas (SPOSITO et al, 2007). O agravamento da DAC está intimamente relacionado ao aumento do colesterol sérico total, ou seja, a soma de todas as suas formas de apresentação lipoprotéica. Isso foi comprovado por evidências trazidas por estudos clínicos e epidemiológicos, conforme nos revela Vale e Martinez: O “Estudo dos Sete Países” – The seven Country Study –, que envolveu cerca de 12.700 homens de 16 diferentes regiões em sete países, demonstrou relação entre o nível sérico de colesterol e a ingestão de gorduras na 62 alimentação, além da correlação positiva com a mortalidade por DAC. Já o “Estudo de Framingham” (prospectivo) evidenciou, dentre outros, a importância do nível de colesterolemia em indivíduos normais no desenvolvimento futuro de complicações da DAC [....] “O Estudo de Intervenção Sobre Múltiplos Fatores de Risco” [...] que acompanhou mais de 360.000 pacientes nos EUA por cerca de seis anos [...] demonstrou [...] que à medida que o nível de colesterol vai aumentando, sobe também o risco de aparecimento de doença aterosclerótica: o risco de DAC é duplicado quando os níveis de colesterolemia passam de 200 para 250 mg/dL e quadruplicado quando o nível é de 300mg/dL. Em estudos clínicos, a redução de 1% no colesterol total se associou com a diminuição, em média de 2-3%, no risco para DAC. (VALE; MARTINEZ, 2000, p. 100) Hipertensão Arterial A pressão arterial elevada causa danos mecânicos ao endotélio vascular, resultando em áreas desprovidas de células endoteliais normais. Isso facilita o processo aterosclerótico, conforme já foi descrito neste capítulo. Níveis pressóricos maiores de 140/190mmHg estão relacionados, de forma inequívoca, com aumento do risco para DAC. No entanto, mesmo a hipertensão arterial sendo uma causa muito freqüente de DAC, o seu controle repercute mais significativamente para a redução de doença cerebrovascular (40%) do que para a redução da DAC (15%). Provavelmente, isso se deve ao aspecto multifatorial da DAC e aos possíveis efeitos adversos, principalmente metabólicos, dos fármacos anti-hipertensivos empregados (VALE; MARTINEZ, 2000). Diabete Melito O diabete melito é o aumento da glicose sangüínea (hiperglicemia) devido a uma deficiência do pâncreas em produzir insulina (diabete melito tipo 1) ou devido a uma diminuição da capacidade do organismo para utilizar a insulina (diabete melito tipo 2). Um valor glicêmico igual ou maior que 126mg/dl (obtido após jejum prévio) é um critério correto para o diagnóstico do diabete. A hiperglicemia está relacionada a danos estruturais na parede dos vasos e também favorece o acúmulo de lipídeos nas paredes das artérias (BROOKS, 2007). Segundo Vale e Martinez (2000), nos pacientes com diabete, o risco para DAC está aumentado de 2 a 4 vezes. Estudos epidemiológicos prospectivos, como o de Whitehall, Honolulu e o Estudo do Rancho São Bernardo, “reforçam o conceito de uma relação gradativa entre glicemia e eventos cardiovasculares, que começa abaixo dos níveis considerados ‘alterados’” (VALE; MARTINEZ, 2000, p. 101, grifo do autor). Há maior risco de DAC quando o diabete está associado à hipertensão arterial, obesidade, hipercolesterolemia, tabagismo e/ou sedentarismo (BROOKS, 2007). 63 Obesidade A obesidade é definida por um Índice de Massa Corpórea (IMC) acima ou igual a 30kg/m2. Está comumente associada a outros fatores de risco, por isso o seu papel como fator de risco independente para DAC é discutível. A obesidade, o diabete e a hipertensão estão agrupados numa síndrome denominada síndrome metabólica. A obesidade central (concentrada na parede abdominal e vísceras) relaciona-se com as anormalidades vistas na síndrome metabólica e, por isso, está relacionada ao aumento do risco para DAC (VALE; MARTINEZ, 2000; BROOKS, 2007). Tabagismo É o único fator de risco totalmente modificável e também o que oferece o maior risco para DAC. Alguns de seus efeitos adversos incluem: alterações das lipoproteínas (reduçao do HDL), aumento da freqüência cardíaca e da pressão arterial, contribuições para a ativação e agregação das plaquetas, aumento do fibrinogênio28 e alteração da função normal do endotélio. O grau do risco coronariano entre os fumantes é 2 a 4 vezes maior e tem relação com o número de cigarros consumidos. Naqueles pacientes que se encontram em prevençao secundária para DAC, o fumo pode aumentar a mortalidade em aproximadamente 50%. Quando o hábito de fumar é cessado, o risco para DAC decai progressivamente. Acredita-se que isso ocorre, porque os efeitos agudos do tabagismo, como elevaçao da freqüência cardíaca e pressão arterial, deixam de existir (BROOKS, 2007;VALE; MARTINEZ, 2000). Alcoolismo ou etilismo O consumo excessivo e freqüente de bebidas alcoólicas pode comprometer o sistema cardiovascular, pois leva ao aumento da pressão arterial e dos triglicerídeos, além de poder causar alterações do ritmo cardíaco (arritmias) e processo patológico do músculo cardíaco (miocardiopatia) (DETURK; CAHALIN, 2007). Segundo Pereira e Krieger (2000), a ingesta excessiva de álcool é responsável por cerca de 5% dos casos de hipertensão arterial. Alguns estudos29 vêm demonstrando uma correlaçao entre a redução de eventos coronarianos e a baixa ingesta de etanol. St. 28 Fibrinogênio é uma proteína essencial que participa do processo de coagulação do sangue (GUYTON; HALL, 1997). 29 Para maiores detalhes, consultar LUZ; COIMBRA, 2000. 64 Jeor e Aslhey citados por Deturk e Cahalin (2007) revelaram que a mais baixa taxa de mortalidade entre homens e mulheres de meia idade ocorre em indivíduos que consomem um ou dois drinques por dia. No entanto, concluíram que a mortalidade aumenta significativamente quando são ingeridas mais que três doses ao dia. Sedentarismo ou Inatividade Física A simples prática rotineira de atividade física já reduz o risco para DAC em cerca de oito vezes. Por meio de outros fatores de risco, o sedentarismo, assim como a obesidade, pode exercer influência no agravamento da DAC (BROOKS, 2007; VALE; MARTINEZ, 2000). Brooks revela que “apesar de não ser considerada um fator de risco independente, muitas associações médicas e de saúde pública têm identificado a inatividade física como um fator de risco significativo para doenças cardiovasculares e outras doenças.” (BROOKS, 2007, p. 446) De acordo com Moraes et al (2005), o estilo de vida sedentário associa-se a um risco duplamente elevado de doença arterial coronariana, havendo uma redução em torno de 20% a 25% do risco de morte nos pacientes pós-infarto do miocárdio que participam de programa de reabilitação cardiovascular, quando comparados aos que não realizam atividade. Estresse e Fatores Psicossociais O estresse mental pode agir como causador de doenças cardiovasculares de forma crônica e aguda. O sistema cardiovascular participa ativamente das adaptações ao estresse. As respostas desse sistema geram, principalmente, aumento da freqüência cardíaca, da contratilidade miocárdica, do débito cardíaco e da pressão arterial (LOURES, Débora et al, 2003). Nas palavras de Loures et al: Estudos epidemiológicos relacionam o estresse emocional com a morbimortalidade na doença aterosclerótica coronariana. A ampla literatura sobre o assunto inclui os efeitos crônicos e agudos do estresse, como o isolamento social, o estresse ocupacional, o prognóstico pós-infarto agudo do miocárdio em pacientes com depressão e a precipitação de eventos cardíacos agudos (LOURES, Débora et al, 2003, p. 526). Brooks traz sua contribuição sobre o assunto: 65 Pesquisadores têm suspeitado por muito tempo que certos traços de personalidade estão associados à DAC. O termo personalidade tipo A foi usado para descrever indivíduos compulsivos, viciados em trabalho, em geral homens, que são mais propensos a sucumbir a doenças cardíacas devido ao estresse crônico. Agora parece que as respostas ao estresse caracterizadas por hostilidade e impaciência aumentam o risco de DAC. Outros fatores psicossocias têm sido ligados à doença e incluem depressão, isolamento social e estresse crônico, particularmente aquele associado ao trabalho e que o indivíduo se sente incapaz de controlar. Além disso, uma condição sócioeconomica baixa está relacionada à DAC, tanto que indivíduos de poder aquisitivo menor apresentam taxas mais altas da doença. Traços psicossociais têm uma relação complexa com comportamentos como tabagismo e maus hábitos alimentares, que aumentam o riso de DAC [...] Muitos dos traços psicossociais relacionados à DAC estão associados à excitação do sistema nervoso autônomo, como o aumento do estímulo simpático. Isso, por sua vez, resulta em níveis mais altos de FC e PA em repouso e em resposta a eventos estressantes. Essas respostas não só aumentam o trabalho do miocárdio, como também promovem disfunção endotelial e aterosclerose. Além disso, algumas características são capazes de aumentar a coagulação do sangue, aumentando a ativação plaquetária. (BROOKS, 2007, p. 447) Com relação aos fatores psicossociais da Pós-modernidade, Paiva (2008) revela que na sociedade pós-moderna imperam ideologias fundadas na valorização do sucesso, da força e do vigor físico e intelectuais, da beleza e da saúde. Essas ideologias, conforme vimos no capítulo sobre a Pós-modernidade, e também de acordo com Paiva (2008), desconsideram os acontecimentos naturais da vida e do ser humano, como a doença, a velhice, o insucesso e a morte. Para Paiva, Essas ideologias geram cobranças, culpas, sentimentos de inabilidade, ansiedade e, conseqüentemente, uma angústia profunda diante da condição contraditória do ser real e o ser ficção, que se expressa pela sensação de fragmentação do ser, considerada como uma das características marcantes da pós-modernidade (PAIVA, 2008, f. 38). Diante dessas situações de culpa, angústia, ansiedade, depressão, o vazio existencial está presente e, conforme estudamos no Capítulo 3, existe relação entre os seus sintomas e a incidência de DAC. 4.5 Manifestações Clínicas Segundo Cassady (2007), as manifestações clínicas da DAC incluem isquemia do miocárdio (músculo cardíaco), infarto agudo do miocárdio, insuficiência cardíaca congestiva e morte súbita. Iremos nos concentrar na isquemia do miocárdio e no infarto 66 agudo do miocárdio (IAM), pois são essas manifestações que estão relacionadas ao caso em estudo. O suprimento de sangue para o coração e, conseqüentemente, de oxigênio e nutrientes é feito através de duas artérias coronárias de superfície ou epicárdicas denominadas artéria coronária direita e artéria coronária esquerda. Elas se originam diretamente da raiz da artéria aorta. A artéria coronária esquerda possui um tronco comum de aproximadamente 2 a 4 centímetros de comprimento que, posteriormente, se divide em dois ramos epicárdicos: a artéria descendente anterior esquerda e a artéria circunflexa. Resumidamente, essas artérias e suas respectivas ramificaçoes suprem de 60% a 70% da massa muscular do ventrículo esquerdo e a massa muscular atrial esquerda. A artéria coronária direita se origina no seio de valsalva direito ou anterior. Essa artéria e seus ramos suprem a maior parte da massa muscular ventricular direita e a superfície inferior e parte da parede posterior do ventrículo esquerdo, a face pósteroinferior do septo interventricular e a massa muscular do átrio direito. Esses padrões de distribuição de perfusão das artérias coronárias podem variar entre os indivíduos (BLESSEY, 1994). Um desequilíbrio entre a oferta e o consumo de oxigênio pelo músculo cardíaco propicia a isquemia. A aterosclerose e o vasoespasmo coronarianos diminuem a oferta de oxigênio ao miocárdio. A presença de uma placa de ateroma em uma ou mais artérias coronárias constitui uma barreira à passagem do sangue, reduzindo o seu fluxo e, conseqüentemente, o suprimento de oxigênio. Nesses casos, a liberação do óxido nítrico produzido pelo endotélio é prejudicada e um mecanismo vasoconstritor torna-se predominante, prejudicando ainda mais o aporte de oxigênio ao miocárdio (CASSADY, 2007; CHAGAS; YUGAR; NETO, 2002). Em situações como estresse emocional, esforço ou exercício físico, variações da freqüência cardíaca e/ou da pressão arterial, frio ou refeições exageradas há aumento da contratilidade do miocárdio e assim do consumo de oxigênio. Quando a aterosclerose coronária já se encontra em estágio de progressão mais avançado, qualquer uma dessas situações pode agravar o quadro, causando um evento isquêmico (CASSADY, 2007; CHAGAS; YUGAR; NETO, 2002). Cassady revela: Acredita-se que mais de 70% de obstrução arterial coronariana produz isquemia do miocárdio, o que, em conseqüência, provoca os sintomas que levam o paciente ao consultório médico. Nesse estágio de progressão aterosclerótica o paciente se sente confortável em repouso, mas irá reclamar 67 de dor torácica durante exercícios leves a moderados, a qual é aliviada em repouso. Um diagnóstico da doença isquêmica do coração costuma ser feito com base em um teste de exercício de estresse convencional. (CASSADY, 2007, p. 142, grifo do autor) O sintoma clássico da isquemia miocárdica é a angina pectoris ou angina estável, que pode ter várias localizações. Esse sintoma se caracteriza por opressão, amortecimento ou tensão no peito ou acima do coração, na mandíbula ou na garganta, no ombro ou no braço. A dor anginosa é transmitida desde terminais nervosos livres próximos aos pequenos vasos coronários até o córtex cerebral. No córtex, os impulsos nervosos são modulados e podem ser percebidos de formas diferentes entre os indivíduos. A percepção da dor no córtex cerebral pode estar relacionada também a fatores psicossociais e culturais (CASSADY, 2007; CHAGAS; YUGAR; NETO, 2002). A isquemia pode ser também assintomática, nesse caso, é conhecida por isquemia silenciosa. Os indivíduos com esse tipo de isquemia não relatam sintomas ou podem relatá-los de maneira inconsciente (CASSADY, 2007; CHAGAS; YUGAR; NETO, 2002). Quando a isquemia do miocárdio é prolongada, ocorre o Infarto Agudo do Miocárdio. A maioria dos casos de IAM ocorre devido à formação de um coágulo sobre uma área previamente comprometida por aterosclerose. Casos menos freqüentes podem resultar de um prolongado vasoespasmo, de um fluxo sangüíneo inadequado ao miocárdio, como ocorre, por exemplo, na hipotensão, ou de uma excessiva demanda metabólica (CASSADY, 2007). A despeito de sua causa, o IAM é precipitado pelo bloqueio total do fornecimento de sangue a uma determinada região do miocárdio, quase sempre no ventrículo esquerdo. A extensão do IAM irá depender da localizaçao anatômica da(s) obstruçao(ões) coronariana(s) e sua(s) respectiva(s) área(s) de irrigação cardíaca. Naquela ou naquelas regiões do miocárdio onde não houve perfusão, ocorre a morte celular e a respectiva necrose tecidual, originando a chamada “zona de infarto”(CASSADY, 2007, p. 145, grifo do autor). Num período de 10 a 14 dias, essa área tecidual necrosada se transforma em um tecido fraco, de composição fibrótica e muito sensível ao estresse. Após 6 a 8 semanas, ocorre a formação de uma cicatriz fibrótica. Essa cicatriz não é elástica como o tecido muscular cardíaco saudável e, portanto, é incapaz de contrair e relaxar (CASSADY, 2007). 68 4.6 Formas de Tratamento Quando existem obstruções importantes nas artérias coronárias (comprometimento maior ou igual a 50% do lúmen arterial), é necessário a realização de algum tipo de tratamento para aumentar o fluxo sangüíneo miocárdico, aliviando os sintomas e prevenindo quadros agudos e graves, como a isquemia e o infarto agudo do miocárdio. O tratamento da doença obstrutiva coronária pode ser exclusivamente clínico ou invasivo, por meio das técnicas de cateterismo (angioplastia coronária com ou sem stent30) ou de CRVM (MOURA et al, 2003). Para determinar o tipo de tratamento a ser adotado, Braunwald, Zipes e Libby (2003) recomendam que a avaliação dos pacientes seja feita de forma individualizada. Para isso, considera-se a idade, o estado mental e as doenças associadas. O objeto deste estudo é o indivíduo idoso submetido à CRVM, portanto, dedicaremos a secção a seguir para descrevermos essa forma específica de tratamento. 4.6.1 A Cirurgia de Revascularização do Miocárdio Para entendermos a CRVM, é necessário, a priori, expor o caminho percorrido pela Medicina até atingir condições para realizar esse procedimento, o qual é considerado de alta complexidade. Sendo assim, contar a história da cirurgia cardíaca é uma forma de contextualizarmos a CRVM e todo o seu processo como uma das conquistas científicas da Pós-modernidade. 4.6.1.2 A História da Cirurgia Cardíaca A história da medicina no Brasil conta com três fases, sendo que a primeira é a fase da medicina colonial ou ibérica, que se estende de 1500 a 1800 (COSTA, 1998). Nessa fase, apenas cirurgias simples eram realizadas. O “cirurgião-barbeiro”, geralmente leigo, realizava pequenos procedimentos, como sangrias, escarificações, 30 O stent é uma pequena prótese metálica que garante uma maior dilatação e a permanente sustentação da mesma na área da lesão aterosclerótica da artéria coronária (MOURA et al, 2003). 69 retirada de abscessos, dentes, aplicação de ventosas (BRAILE; GODOY, 1996, p. 329330, grifo do autor). Segundo esses mesmos autores, “nessa época, em todo o mundo, a cirurgia era de forma geral incipiente e em termos de abordagem cardíaca, totalmente inexistente.” (BRAILE; GODOY, 1996, p. 330) De acordo com Costa (1998), foi na segunda fase ou fase pré-científica que os médicos e cirurgiões passaram a se formar em Faculdades de Medicina na Bahia e no Rio de Janeiro. Em 1848, os cirurgiões foram considerados médicos livres para atuar em qualquer ramo. O incremento de pesquisas médicas, em instituições e faculdades da Bahia e Rio de Janeiro, marcou o início da fase científica, na qual a Clínica Cirúrgica31 passou a existir. Em agosto de 1905, foi realizada a primeira cirurgia cardíaca no Brasil: a sutura de um ferimento cardíaco pelo cirurgião paulista João Alves de Lima. Infelizmente, o paciente sobreviveu apenas por uma hora (PRATES, 1999). As cirurgias do tórax ainda eram pouco realizadas, devido à complexidade das vísceras locais. Ainda em 1941, com exceção da drenagem de empiema e de abscesso pulmonar, a cirurgia torácica se encontrava muito atrasada em relação a outros órgãos. E, quando se tratava do coração, “seja por dificuldades técnicas, seja pela significação do órgão como estrutura intocável na constituição físico-espiritual do corpo”, esse atraso era ainda maior (BRAILE; GODOY, p. 330, 1996). Vale à pena apontar aqui a descrição metafórica de Harvey William Cushing32 exposta por Costa sobre a filogenia do cirurgião: Ele é um animal peculiar, comparativamente recente, descendente do Homo eoanthropus, através do Homo medicus ordinarius (hoje reduzido a restos fósseis). O Homo medicus ordinarius originou, por sua vez, o Homo medicus internus, a partir do qual diferenciou-se o Homo chirurgicus, pela aquisição de um par de mãos, terminadas em dez dedos mais ou menos altamente especializados (capaz das pegadas radial e cubital...). Com o passar do tempo, o Homo chirurgicus, que, inicialmente, contentava-se em agir sobre as partes externas do corpo sob direção do Homo medicus internus, tornou-se mais interno que o próprio Homo medicus internus. Daí resultaram várias subespécies, como H.c. otologicus, H.c. gynecologicus, H.c. neurochirurgicus etc. O Homo chirurgicus intrathoracicus originou-se justamente no período interglacial após a 2ª Guerra. (COSTA, 1998) O que Costa (1998) ainda ressalta é que no caminho para o domínio da cirurgia cardíaca pelo cirurgião cardiovascular, essa passou pelas mãos do cirurgião geral, em seguida pelo cirurgião torácico, o qual trabalhando no interior do tórax se viu “frente ao último órgão indene à ação operatória: o coração”, o que, por sua vez, causou 31 Ramo da medicina no qual as cirurgias somente são praticadas por profissionais de formação superior. Havey William Cushing (1868-1939) é considerado o maior neurocirurgião do século XX (SABBATINI, 1997). 32 70 inicialmente uma certa disputa entre o Homo chirurgicus intrathoracius e o Homo chirurgicus intracardíacus. Foi somente nas últimas quatro décadas que a cirurgia cardíaca recebeu maior destaque e, desde então, seu progresso vem sendo notável. Com o avanço científico do século XX, o coração passou a ser desmitificado, de sede da alma migrou, paulatinamente, para um patamar não muito distante dos demais órgãos do corpo. Assim se iniciou a História da Cirurgia Cardíaca (BRAILE; GODOY, 1996). As cirurgias cardíacas começaram com o coração fechado, dando seus primeiros passos na Europa e nos Estados Unidos, através da realização de procedimentos paliativos nas cardiopatias congênitas e, especialmente, pela correção de valvopatia mitral do tipo estenosante. Por volta de 1952, os serviços brasileiros de cirurgia cardíaca, principalmente do Hospital das Clínicas de São Paulo, intercambiaram conhecimentos com o exterior e receberam a visita de diversos especialistas, dando início às cirurgias cardíacas fechadas no Brasil (COSTA, 1998). Segundo Braile e Godoy (1996), a persistência do canal arterial, a tetralogia de Fallot, a coarctação da aorta e a estenose valvar pulmonar são exemplos de cardiopatias congênitas que se tornaram passíveis de correção total ou paliativa. A primeira correção da persistência de canal arterial com sucesso data de 26 de agosto de 1938, e foi realizada em Boston, pelo Dr. Robert E. Gross. Braile e Godoy (1996) destacam que essa cirurgia foi feita sem o conhecimento e na ausência do cirurgião-chefe do Brigham and Boston Children´s Hospital, Dr. William Ladd, pois o Dr. Gross acreditava que nunca obteria permissão superior para a realização da cirurgia. A partir daí, a correção cirúrgica do canal arterial passou a ser praticada mundialmente, sendo realizada milhares de vezes e apresentando baixos índices de morbidade e mortalidade (BRAILE; GODOY, 1996). A primeira correção cirúrgica do canal arterial no Brasil data de maio de 1945 e foi realizada no Rio de janeiro, pelo Dr. Joaquim Azarias de Brito, no Hospital Souza Aguiar (PRATES, 1999). A realização da cirurgia paliativa da tetralogia de Fallot, através da criação de uma anastomose entre a artéria subclávia e a artéria pulmonar, deve-se especialmente ao empenho da Dra. Helen Taussig e do Dr. Alfred Blalock, tanto que essa cirurgia passou a se chamar Blalock-Taussing (PRATES, 1999). A primeira cirurgia desse tipo foi realizada em 29 de novembro de 1944, no Hospital Johns Hopkins, em Baltimore. E, segundo Prates: 71 Em fevereiro de 1945, foi realizada a segunda operação em uma menina de 11 anos e, em maio de 1945, Blalock e Taussing publicaram no Journal of the American Medical Association “The surgical treatment of Malformations of the Heart”, levando ao conhecimento do mundo a técnica que até hoje salva a vida de muitas crianças nascidas com cardiopatias. (PRATES, p. 178179, 1999) De acordo com McNamara e Rosenberg citados por Braile e Godoy (1996), a primeira correção da coarctação aórtica ocorreu em 19 de outubro de 1944, em Estocolmo na Suécia, pelos médicos Dr. Clarence Craaford e Nylin. E, em julho de 1945, Gross e Hufnagel, nos Estados Unidos, operaram o segundo caso. No Brasil, a primeira cirurgia de Blalock-Taussing foi realizada na cidade de Santos, em novembro de 1948, pelo Dr. Arthur Domingues Pinto, que também operou o primeiro caso de coarctação da aorta, em junho de 1950 (PRATES, 1999). A correção cirúrgica a céu fechado das estenoses valvar aórtica e mitral também merece destaque, devido ao grande número de pacientes operados e de pesquisas desenvolvidas sobre esse assunto. A esse respeito, Braile e Godoy revelam: A primeira tentativa clínica que se conhece para avaliar a obstrução aórtica foi realizada em 1913, na França, por Tuffier (citado por Margutti e col, 1955), quando dilatou digitalmente a valva através de invaginação da parede da aorta.[...] A primeira dilatação de estenose aórtica no Brasil, com auxílio do dilatador de Bailey, foi realizada no dia 16/07/1953, no Hospital São Paulo, Escola Paulista de Medicina, pelo Dr. Ruy Margutti.[...] A correção cirúrgica da estenose valvar mitral reumática remonta a 20/05/1923, quando Elliot Carr Cutler e Samuel Levine [...] realizaram com sucesso a comissurotomia mitral por via transventricular, em uma paciente de 12 anos de idade, no Peter Bent Brigham Hospital da Escola Médica de Harvard. (BRAILE; GODOY, p. 331, 1996) Em 1951, foi feita no Hospital das Clínicas de São Paulo a primeira comissurotomia mitral digital no Brasil, pelo Dr. Euryclides de Jesus Zerbini (PRATES, 1999). Com relação à cirurgia da insuficiência coronariana, várias técnicas não dependentes da circulação extracorpórea foram estudadas e utilizadas, porém, nem sempre apresentando resultados confiáveis. Até a década de 1960, o conhecimento sobre a fisiopatologia da insuficiência coronariana ainda era muito peculiar, o que justificava o pouco que poderia ser feito em termos de procedimentos cirúrgicos. No início dessa mesma década, com o surgimento da cineangiocoronariografia33, tornou-se 33 Cineangiocoronariografia ou cateterismo cardíaco é um exame considerado padrão ouro para avaliação da função cardíaca e do grau de obstrução das artérias coronárias. Permite a visualização da anatomia cardíaca e das artérias coronarianas, através da injeção de substância contrastante ao raio X por meio de catéteres introduzidos em artérias periféricas dos membros superiores ou da região da virilha (CAHALIN, 2007). 72 possível a visualização de lesões coronanianas, iniciando-se, então, as técnicas de revascularização do miocárdio, com a utilização da circulação extracorpórea (BRAILE; GODOY, 1996). Segundo Rivetti et al, “a circulação extracorpórea utilizada em cirurgia de revascularização direta do miocárdio deu maior segurança ao ato cirúrgico, permitindo a parada cardíaca para auxiliar o manuseio e a confecção das anastomoses.” (RIVETTI et al, 1998) Em maio de 1967, na Cleveland Clinic, o Dr. René Favarolo realizou a primeira cirurgia utilizando a veia safena como ponte para transpor as obstruções coronarianas (PRATES, 1999). No Brasil, as operações cardíacas fechadas exercidas inicialmente em grandes centros, como Rio de Janeiro e São Paulo, também passaram a ser realizadas em outras capitais, como Fortaleza, Salvador, Porto Alegre, Curitiba, Belo Horizonte e Recife. Em 1954, Campos do Jordão foi a sede do Primeiro Simpósio de Cirurgia Cardíaca, onde se congregou tudo o que havia sido feito no Brasil sobre o assunto, até este momento. “O progresso era rápido e a atividade, intensa, mas tornava-se cada vez mais evidente que a cirurgia cardíaca fechada havia atingido seu ponto limite.” (COSTA, 1998) A hipotermia foi uma das primeiras técnicas utilizadas para se interromper a circulação corpórea. Nos anos 1950, em Toronto, Wilfred Bigelow estudou, em laboratório, a aplicação da hipotermia associada à oclusão do retorno venoso, objetivando o fechamento de defeitos interatriais. Em 02 de setembro de 1952, o Dr. John Lewis realizou a primeira cirurgia cardíaca a céu aberto, no Hospital da Universidade de Minnesota (EUA). Ele corrigiu uma comunicação interatrial, sob visão direta, em uma menina de 5 anos, com a interrupção do fluxo nas veias cavas e hipotermia corporal. Isso se tornou um marco na correção das deformidades intracardíacas sob visualização direta do coração (PRATES, 1999). No entanto, mesmo com o sucesso dessas operações, para a correção de defeitos intracardíacos mais complexos, tornava-se imperativo o desenvolvimento de uma máquina que substituísse o coração e o pulmão. As pesquisas com equipamentos para fornecer a circulação extracorpórea remontam às décadas de 1930 e 1940. Dentre os pesquisadores dessa época, destaca-se a figura do Dr. Clearance Dennis, da Universidade de Minnesota. Em 1951, foi realizada a primeira operação no mundo com o uso de uma máquina de circulação extracorpórea desenvolvida por ele. Tratava-se de uma criança de 6 anos de idade, com um defeito no septo interatrial. Apesar de essa cirurgia ter evidenciado a possibilidade do uso da máquina, essa operação não teve 73 sucesso e o paciente faleceu. O primeiro caso de sucesso do uso de uma máquina de circulação extracorpórea em uma cirurgia cardíaca data de maio de 1953, quando o Dr. Jonh Gibbon, na Filadélfia, corrigiu um defeito do septo interatrial, em um paciente de 18 anos (PRATES, 1999). Segundo Braile e Godoy: [...] a Universidade de Minnesota pode ser considerada como sendo o berço da cirurgia cardíaca mundial, pois foi lá realmente que os grandes fatos aconteceram. Foi lá também que os pioneiros da cirurgia cardíaca brasileira se iniciaram, sob a orientação do Dr. W. Lillehei, com destaque para os Drs. Euryclides de Jesus Zerbini, Delmont Bittencourt, André Esteves Lima, Hugo Felipozzi e Domingos Junqueira de Moraes, que aqui difundiram conhecimentos, formaram escolas e fizeram da cirurgia cardíaca um marcador da viabilidade do nosso país. (BRAILE; GODOY, 1996, p. 332) Em 12 de novembro de 1956, foi realizada pelo Dr. Hugo Felipozzi, do Instituto de Cardiologia Sabbado D’Angelo, em São Paulo, a primeira cirurgia cardíaca do Brasil e também da América Latina, com o uso da circulação extracorpórea (GOMES; SABA; BUFFOLO, 2005). O grupo do Hospital das Clínicas de São Paulo, coordenado pelo Dr. Euryclides de Jesus Zerbini, também passou a utilizar o novo método. A circulação extracorpórea foi iniciada no Rio de Janeiro, em 1957, pelos doutores Earl Kay, Cid Nogueira e Domingos Junqueira de Moraes. No Recife, em 1960, o primeiro a utilizá-la foi o Dr. Luis Tavares da Silva (COSTA, 1998). Prates revela que: As operações diretas sobre as artérias coronárias foram introduzidas, em 1965, por Zerbini e Jatene, em São Paulo. Em 1968, iniciaram-se as pontes de safena, principalmente pelos grupos de Adib Jatene e Zerbini, em São Paulo, e Waldir Jasbik e Domingos Moraes, no Rio de Janeiro. (PRATES, p. 183, 1999) Em Minas Gerais, a cirurgia cardíaca teve início em Belo Horizonte, em 1957, com o Dr. João Batista Rezende Alves, cirurgião geral do Hospital da Cruz Vermelha. Sua equipe era composta por jovens médicos, como os doutores Gilberto Lino Vieira, Sérgio Almeida de Oliveira, Homero Geraldo de Oliveira34 e o Dr. Sebastião Correa Rabello35, que deu início à comissurotomia mitral digital. Os estudos com a circulação extracorpórea foram iniciados pelo Dr. Gilberto Lino Vieira. O Hospital Vera Cruz, em 34 35 Atual chefe da equipe de cirurgia cardiovascular do Hospital Vera Cruz S/A. Membro fundador do Hospital Vera Cruz S/A. 74 Belo Horizonte, foi o terceiro hospital do Brasil a realizar regularmente cirurgias cardíacas.36 Enquanto a cirurgia cardíaca no Brasil se expandia, um fato admirável surpreendeu não só toda a comunidade científica do mundo, como também o público em geral: Christian Barnard realizou, em 3 de dezembro de 1967, na cidade do Cabo, África do Sul, o primeiro transplante cardíaco humano. Já em outubro de 1968, após esse sucesso alcançado por Barnard, mais de 101 casos de transplantes cardíacos foram realizados em diferentes serviços espalhados por todo o mundo (COSTA, 1998; PRATES, 1999; BRAILE; GODOY, 1996). O primeiro transplante cardíaco do Brasil e também da América Latina ocorreu no dia 26 de maio de 1968, no Hospital das Clínicas de São Paulo, e foi realizado pelo Dr. Euryclides de Jesus Zerbini. E, segundo Costa (1998), “a repercussão do feito de Zerbini foi muito favorável à cirurgia cardíaca brasileira, pois não era despido de valor ufanístico, e trouxe prestígio social à especialidade, que beneficiou os Serviços em todo o país.” Costa ainda nos revela que: “Após o transplante e a revascularização coronária, a cirurgia cardíaca brasileira atingiu sua maioridade.” Retomaremos, a seguir, aspectos específicos da CRVM, como a sua indicação, o procedimento cirúrgico e as condutas pós-operatórias imediatas e tardias, incluindo o programa de Reabilitação Cardíaca. 4.6.1.3 A Indicacão da CRVM A CRVM é uma das cirurgias mais freqüentes realizadas em todo o mundo e pode estar indicada tanto para pacientes que ainda não sofreram IAM, como nos que já tiveram esse evento. Em ambos os casos, a sua indicação irá depender do número de artérias coronárias comprometidas e da porcentagem de obstrução existente nas mesmas (ZOCRATO; MACHADO, 2008). As mesmas autoras definem a indicação de CRVM para pacientes com 50% ou mais de obstrução ou obstruções em mais de uma artéria coronária. O tratamento cirúrgico da insuficiência coronariana tem por objetivos: o alívio dos sintomas, a proteção do miocárdio isquêmico, a melhora da função ventricular, a 36 Dados obtidos em uma conversa por telefone com o Dr. Homero Geraldo de Oliveira, em 02/09/2008. 75 prevenção ou tratamento do IAM e a recuperação física, psíquica e social do paciente, aumentando o tempo e a qualidade de sua vida. A avaliação pré-operatória é importante e tem como finalidade quantificar e minimizar os riscos cirúrgicos, bem como prevenir as complicações pós-operatórias, reduzindo, assim, os índices de morbi-mortalidade (BRICK et al, 2004). Em virtude do objeto deste estudo ser o indivíduo idoso submetido à CRVM, daremos um maior destaque para a abordagem pós-operatória. 4.6.1.4 O procedimento cirúrgico Para a realização da CRVM, o paciente recebe uma anestesia geral. A anestesia geral promove analgesia, perda reversível da percepção e bloqueio temporário da resposta fisiológica geral aos estímulos. Devido a esse bloqueio, o paciente não pode respirar sozinho e a introdução de uma via aérea artificial se faz necessária. Para isso, o paciente é submetido a uma intubação traqueal e seus pulmões são aerados através de um ventilador mecânico. Preconiza-se um tempo de anestesia rápido, a fim de que, num período entre 1 a 6 horas após o término da cirurgia, o paciente já possa ser extubado, prevenindo possíveis complicações decorrentes da utilização de anestésicos (ZOCRATO; MACHADO, 2008). Os pacientes que apresentam uma condição cardiovascular, pulmonar e de coagulação desejáveis poderão ser extubados no centro cirúrgico, logo após a reversão do bloqueio neuromuscular. Aqueles que evoluem com instabilidade são encaminhados ao Centro de Terapia Intensiva, sob efeito narcótico (ZOCRATO; MACHADO, 2008). A via de acesso ao coração e aos grandes vasos mais comumente utilizada é a esternotomia37 mediana, ou seja, o esterno é dividido longitudinalmente na linha mediana. Com a abertura do esterno e o afastamento dos tecidos moles permite-se o acesso à membrana que envolve o coração, o pericárdio, que recebe uma incisão. Em seguida, é instalado o circuito da circulação extracorpórea (CEC). A CEC constitui um conjunto de máquinas, circuitos, técnicas e aparelhos que substituem, de forma temporária, as funções do coração e dos pulmões. O bombeamento do sangue realizado pelo coração é substituído por uma bomba mecânica. As funções de trocas gasosas com o sangue realizadas pelos pulmões são substituídas por um aparelho denominado 37 O esterno é uma placa óssea longa e estreita localizada na porção anterior e mediana da caixa torácica (DANGELO; FATTINI, 1995). 76 oxigenador. Uma tubulação plástica faz um circuito dos vários componentes desse sistema entre si e entre o paciente, formando a parte extracorpórea da circulação. Portanto, o bombeamento, a oxigenação e a circulação do sangue são feitos através desse sistema externo ao organismo do paciente. Os materiais da CEC que entram em contato com o sangue do paciente são biocompatíveis, porém, todos eles estimulam a coagulação. Sendo assim, é necessário que haja uma inibição da coagulação, feita pela droga heparina, que é mantida durante todo o tempo de utilização da CEC. A CEC causa efeitos prejudiciais ao organismo, por meio de alterações químicas e hemodinâmicas. Má perfusão tecidual, alteração da função plaquetária e resposta inflamatória sistêmica são efeitos freqüentes após uso da CEC. A resposta inflamatória sistêmica é uma das maiores preocupações médicas, pois pode causar dano miocárdico, lesão pulmonar e aumento da permeabilidade dos capilares sangüíneos, com extravasamento de seu conteúdo (ZOCRATO; MACHADO, 2008). Uma solução de proteção miocárdica (cardioplégica) é usada e garante um coração imóvel e vazio, além de protegê-lo contra lesões produzidas pela interrupção do fluxo sangüíneo ao coração. A seguir, uma veia ou artéria de outra parte do corpo (veia safena, e/ou artéria mamária, e/ou artéria radial) é utilizada para criar uma ponte (FIGURA 1), ou seja, um novo caminho para a passagem do sangue no coração, transpondo o bloqueio arterial. Essa veia ou artéria escolhida é anastomosada nas artérias coronárias (ZOCRATO; MACHADO, 2008). Figura 1: Construção de uma ponte miocárdica Fonte: BRASIL. Ministério da Saúde, Instituto Nacional de Cardiologia, 2008. 77 Terminada a construção das pontes, quando o coração se recupera de seu repouso temporário, a CEC pode ser gradualmente retirada. Somente após o coração estar batendo normalmente, o equipamento é removido. O anticoagulante (heparina) é revertido quimicamente pela protamina e o cirurgião inspeciona e controla sangramentos restantes e retira os tubos do coração. Logo depois, realiza a hemostasia38, drenagem e fechamento do tórax (geralmente são instalados dois drenos torácicos e um mediastinal). Em seguida, o paciente é enviado ao CTI, para recuperação pós-operatória (GALANTIER, 2004). Hoje, freqüentemente, na CRVM, já se usa a técnica minimamente invasiva, a qual não utiliza a CEC e/ou a esternotomia mediana. De início, todos os pacientes podem ser operados sem CEC. Há pacientes que podem ser especialmente beneficiados pela sua supressão. São pacientes portadores de doença cerebral, pacientes idosos, pacientes com AVC prévio, pacientes portadores de fração de ejeção do ventrículo esquerdo baixa, reoperados ou com aterosclerose acentuada da artéria aorta e femoral, dentre outros. A expressiva redução de processos inflamatórios sistêmicos é uma das principais vantagens da não utilização da CEC (ZOCRATO; MACHADO, 2008). Iglezias et al (2003) realizou um estudo comparativo entre indivíduos idosos (≥70 anos) revascularizados com e sem circulação extra-corpórea (CEC). O autor demonstrou que naqueles indivíduos em que foi realizada a CRVM com CEC, o tempo maior de cirurgia que ela permitiu favoreceu uma revascularização do miocárdio completa. Além disso, a alta morbidade nos dois grupos estudados não serviu para diferenciar qual método é mais eficaz, sugerindo pesquisas nessa linha. 4.6.1.5 A Fisioterapia no Pós-Operatório de CRVM Descreveremos aqui o papel do fisioterapeuta no pós-operatório de CRVM. Previamente a esta descrição, como uma forma de entendimento da evolução da Fisioterapia e de suas áreas específicas de atuação, contaremos um pouco da sua história. 38 Hemostasia é a permanência do fluxo sangüíneo em estado líquido nos vasos (FILHO, Cyrillo; RACHED; CHAMONE, 2004). 78 4.6.1.5.1 A História da Fisioterapia Segundo Rebellato e Botomé (1999), desde a Antigüidade39, práticas utilizando recursos físicos, como a água, o calor, a luz e a eletricidade, já eram utilizadas no sentido de tratar ou mesmo eliminar doenças. Shestack citado por Rebellato e Botomé revela que: “os médicos da Antiguidade conheciam os agentes físicos e os empregavam em terapia. Já utilizavam a eletroterapia sob a forma de choques com um peixe elétrico no tratamento de certas doenças.” (REBELLATO; BOTOMÉ, p. 31, 1999, grifo dos autores) Os próprios movimentos humanos, incluindo a respiração, foram estudados e aplicados com fins terapêuticos. Lindeman citado por Rebellato e Botomé comenta: No ano de 2698 a.C., o imperador Chinês Hoong-Ti criou um tipo de ginástica curativa que continha exercícios respiratórios e exercícios para evitar a obstrução dos órgãos. [...] Na medicina Trácia e Grega, a terapia pelo movimento constituía uma parte fixa do plano de tratamento. [...] Galeno (130 a 199 d.C.) informa que conseguiu, por meio de uma ginástica planificada do tronco e dos pulmões, corrigir o tórax deformado de um rapaz até lograr condições normais. (REBELLATO; BOTOMÉ, p. 32, 1999) De um modo geral, o que Rebellato e Botomé (1999) ressaltam é que na Antigüidade havia um maior direcionamento para a cura de morbidades já instaladas do que para a prevenção das mesmas. Essa filosofia curativa prevaleceu latente durante a Idade Média (séculos XIV e XV), pois, nessa época, a dominação religiosa justificava os eventos naturais, e até mesmo as doenças, como planos de uma ordem divina e, como tal, deveriam ser apenas aceitos ou exorcizados. Às camadas servis, o mínimo acesso a condições melhores de saúde, educação ou moradia era sinônimo de luxúria e, portanto, condenável aos olhos dos mais privilegiados (clero e nobreza). A valorização da alma colocou o corpo humano em um plano inferior, o corpo adoecia somente por conseqüência da perturbação do espírito. Os hospitais da Idade Média situavam-se junto aos mosteiros, com altares em seus interiores, e havia pouco ou nenhum espaço para qualquer tipo de terapia física, inibindo o interesse pelos estudos e cuidados com o corpo. Na medida em que os exercícios estavam desviados de seu propósito curativo, houve um despertar do clero e da nobreza quanto a sua capacidade de incremento da potência física, enquanto os lavradores e burgueses os utilizavam cada vez mais como sinônimo de diversão. Para o 39 Período compreendido entre 4000 a.C. e 395 d.C.(REBELLATO; BOTOMÉ, 1999). 79 clero e a nobreza, que objetivavam o controle da população, de seus bens e a guerra, era interessante o alcance da força física ideal para isso. Para os trabalhadores, o pouco que lhes restava era o lazer acessível da atividade física praticada como uma forma de compensação para as precárias condições em que viviam (REBELLATO; BOTOMÉ, 1999). No Renascimento (séculos XV e XVI), o crescimento científico, literário, artístico e político introduziu novos valores, como autonomia, independência e beleza, permitindo o retorno aos cuidados com o corpo. O desenvolvimento humanista engatilhou os estudos da saúde corporal, os quais, além de ocorrerem no plano curativo, também passaram a visualizar a manutenção das condições orgânicas normais (REBELLATO; BOTOMÉ, 1999). Nesse sentido, esses autores citam Wheller: Merculiaris apresentou princípios definidos para a ginástica médica que compreendiam: 1) exercícios para conservar um estado saudável já existente; 2) regularidade no exercício; 3) exercícios para indivíduos enfermos cujo estado pode exacerbar-se; 4) exercícios individuais especiais para convalescentes e 5) exercícios para pessoas com ocupações sedentárias. (WHELLER apud REBELLATO; BOTOMÉ, p. 36, 1999, grifo do autor) No contexto da transição entre o Renascimento e a fase industrial, a continuidade dos estudos e trabalhos relacionados ao exercício físico foi delineando certa diferenciação quanto ao alvo de aplicação dos mesmos, ou seja, os exercícios recomendados para o tratamento de pessoas enfermas deveriam ser distintos daqueles propostos para pessoas saudáveis. Isso “parece ter contribuído para que o objeto de trabalho da Fisioterapia (que começava a se delinear como profissão) ficasse restrito ao atendimento de indivíduos já lesados, já acometidos por algum tipo de doença” (REBELLATO; BOTOMÉ, p. 39, 1999). O período industrial (séculos XVIII e XIX) é caracterizado principalmente pela transformação dos bens de produção, através do uso crescente de máquinas, e trouxe algumas conseqüências. A vinda dos camponeses para a cidade, aliada ao desemprego dos mesmos, pela substituição de sua força de produção por máquinas, causou um “inchaço” nas cidades. Estes passaram a viver às margens, em condições alimentares e sanitárias insatisfatórias, o que propiciou o aparecimento de novas doenças e epidemias, como a cólera e a tuberculose. Além disso, as longas jornadas de trabalho, de até 16 horas por dia, às quais os operários e camponeses (inclusive crianças) eram submetidos, visando atender aos interesses meramente lucrativos das classes sociais dominantes, também trouxeram novas situações, como alcoolismo e acidentes de trabalho, que 80 acabaram por contribuir para o aparecimento de outras patologias até então desconhecidas. Apesar da industrialização objetivar uma produção em massa de bens e serviços, a fim de torná-los mais acessíveis a todos, a estratificação social presente desde a sua origem ficava ainda mais bem definida. Os ricos permaneciam donos das propriedades e se tornavam cada vez mais ricos, através do desenvolvimento de novas tecnologias e pela exploração do povo e de seu único bem: a sua força de trabalho (REBELLATO; BOTOMÉ, 1999). Os reais motivos das novas patologias estavam ligados ao regime político e aos sistemas econômico e social, o que, no entanto, não convinha como explicação para as classes dominadas. A essas, bastava saber que os determinantes das doenças estavam no próprio indivíduo. A descoberta das bactérias e vírus era a explicação unilateral utilizada. O esclarecimento de como e de onde essas bactérias e vírus surgiam, ou seja, das péssimas condições de higiene, trabalho e moradia, permanecia sob o véu da apropriação da elite. Para não perder ou esgotar a sua fonte de riqueza e bem estar, convinha a essa mesma elite promover o tratamento das doenças nas classes sociais inferiores (REBELLATO; BOTOMÉ, 1999). De certa forma, a ênfase conveniente no tratamento de doenças já instaladas acabou por desenvolver atividades profissionais e estudos científicos voltados para a descoberta de novas metodologias de caráter curativo. De acordo com Rebellato e Botomé: [...] a clínica, a cirurgia, a farmacologia, a aplicação de recursos elétricos, térmicos e hídricos e a aplicação de exercícios físicos etc. sofreram uma evolução dirigida para o atendimento do indivíduo doente. Surgia a idéia do atendimento hospitalar. Em vez de serem exilados em presídios (ou sistemas equivalentes), juntamente com marginais, os doentes eram mantidos em um local próprio para o tratamento. Nesses locais de tratamento eram treinados os novos profissionais que iram atender aos problemas de “saúde” da população. Eram os locais ideais para os estudos clínicos e anatômicos da época. (REBELLATO; BOTOMÉ, 1999, p. 41, grifo dos autores) Na fase da industrialização houve, portanto, uma estagnação nas idéias de manutenção da saúde e prevenção de doenças. Idéias essas apontadas originalmente no período do Renascimento (REBELLATO; BOTOMÉ, 1999). O direcionamento dos estudos e trabalhos em saúde para fins curativos contribuiu para o surgimento de ramos especializados da Medicina, os quais surgiram no final do século XIX. Circunstancialmente, a Fisioterapia parece ter seguido essa mesma direção, dividindo-se em diferentes especialidades que, contudo, aplicavam-se a 81 somente um objeto de trabalho: o indivíduo doente (REBELLATO; BOTOMÉ, 1999). Conforme observam os autores: As especializações de tratamento foram convenientes ao sistema existente na época. Não parecia importar porque surgia a patologia, ou a relevância da remoção ou do controle de seus determinantes. [...] As especializações de trabalho, nesse sentido, surgiram com maior facilidade, rapidez e quantidade porque não interessava a percepção global dos problemas, incluindo sua rede de determinantes, mas sim apenas as técnicas diretas e mais efetivas de “conserto” ou de “reabilitação” para o indivíduo voltar a uma atividade “social integrada e produtiva”. (REBELLATO; BOTOMÉ, 1999, p. 44, 1999, grifo dos autores) Cheren citado por Petri (2006) ilustra que, no início do século XVIII, Jallabart foi considerado um dos precursores da eletricidade médica, Henry Ling desenvolveu a cinesioterapia e Vicent Prisswirz a hidroterapia. No século XIX, paralelamente ao uso da iluminação pela eletricidade, surgiram várias clínicas especializadas na eletroterapia, tanto na área psíquica quanto na orgânica. No final do século XIX e início do século XX, a Fisioterapia teve seu conhecimento ampliado pela criação dos primeiros cursos de formação profissional na Inglaterra (1895) e Alemanha (1902). Outras escolas surgiram na Europa, nos Estados Unidos, na Austrália e no Canadá. Na América do Sul, um dos primeiros países a criar cursos para formação de fisioterapeutas foi a Argentina (BARROS, 2008). No século XX, a eclosão das guerras mundiais e o enorme contingente de pessoas feridas e mutiladas que necessitavam de reabilitação também impulsionou o rápido desenvolvimento tecnológico e científico da Fisioterapia. As chamadas áreas da saúde a incluíram e o seu propósito terapêutico se evidenciou na denominação terminológica de suas formas de atuação: através do movimento (cinesioterapia), através da eletricidade (eletroterapia), através do calor (termoterapia), do frio (crioterapia), da massagem (massoterapia) (BARROS, 2008). A Segunda Grande Guerra (1939-1945) foi marcada pelo uso de equipamentos bélicos cada vez mais avançados e, conseqüentemente, foi o conflito mundial responsável pela produção do maior número de feridos e lesados corporais. Estes contribuíram para a criação de novas especialidades, por exemplo, a cirurgia plástica, bem como para a implementação de tratamentos multidisciplinares. Na época, tais tratamentos englobavam a Ortopedia, a Fisioterapia, a Terapia Ocupacional, o Serviço Social, dentre outras especialidades que pudessem fornecer ajuda em reabilitação (OLIVEIRA, Valéria, 2005). Nesse aspecto, Fonseca desvela que: 82 A partir da segunda grande guerra o fisioterapeuta toma o pulso e o comando da atividade cinesioterápica. Os médicos estavam mais voltados para as cirurgias, graças às importantes descobertas que possibilitaram os avanços nessa área. Além disso, a demanda de incapacitados. principalmente nos países beligerantes, gerou a necessidade de profissionais que pudessem se dedicar somente aos exercícios reabilitativos. (FONSECA, 2002, f. 34) De acordo com Barros (2008, p. 942, 943), outro fator que influenciou fortemente o desenvolvimento da Fisioterapia em diversas partes do mundo foram as epidemias de poliomielite40: “Diversos artigos internacionais comparam a importância da pólio como equivalente ou superior à das duas grandes guerras mundiais, no que se refere a sua contribuição para o desenvolvimento das técnicas de fisioterapia e da profissão de fisioterapeuta no mundo.” O primeiro grande surto de Poliomielite ocorreu em 1916, nos Estados Unidos, e se estendeu até aproximadamente 1955. Foram infectadas cerca de 38.000 pessoas por ano, e, em 1952, a taxa de infecção chegou a 35 para cada 100.000 habitantes (BARROS, 2008). 4.6.1.5.1.1 A Fisioterapia no Brasil O tratamento dos doentes no Brasil colonial era realizado por jesuítas, feiticeiros africanos, pajés, físicos e cirurgiões portugueses, hispânicos e holandeses. Não era de interesse de Portugal a criação de escolas de ensino superior, devido ao perigo de se alimentarem as idéias de independência. Porém, em 1808, ao invadir Portugal e obrigar a Família Real Portuguesa a fugir para o Brasil, Napoleão Bonaparte contribuiu indiretamente para o surgimento dos primeiros serviços organizados de Fisioterapia no país. Para servir à elite portuguesa, os recursos humanos de várias áreas e, especialmente, os recursos financeiros, também aqui desembarcaram. Dessa maneira, fundaram-se as duas primeiras escolas de Medicina brasileiras, na Bahia e no Rio de Janeiro (BARROS, 2003; NOVAES, 2008). Entre os anos de 1879 e 1883, com a participação dos recursos fisioterápicos na terapêutica médica, são criados o serviço de eletricidade médica e o serviço de hidroterapia, no Rio de Janeiro. Em 1884, o médico Arthur Silva criou o primeiro serviço de Fisioterapia da América do Sul, no Hospital de Misericórdia, no Rio de 40 Poliomielite ou Paralisia Infantil é uma infecção viral contagiosa que acomete a medula espinhal, podendo causar fraqueza muscular permanente, paralisia e, por vezes, a morte. Acomete principalmente crianças de zero a quatro anos (BARROS, 2008). 83 Janeiro (NOVAES, 2008). Em 1919, o Dr. Raphael de Barros fundou o Departamento de Eletricidade Médica da Universidade de São Paulo e, após dez anos, em 1929, o Dr. Waldo Rolim de Moraes criou o serviço de Fisioterapia do Instituto do Radium Arnaldo Vieira de Carvalho, da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo. O mesmo Dr. Rolim criou o serviço de Fisioterapia do Hospital das Clínicas de São Paulo (MARQUES; SANCHES, 1994). Segundo Novaes: Na década de 30, Rio de Janeiro e São Paulo possuíam serviços de Fisioterapia idealizados por médicos que tomavam para si a terapêutica de forma integral, experimentando recursos físicos que outros médicos, à época, não ousavam buscar para minimizar as seqüelas de seus pacientes. [...] Essa visão ampla de compromisso com o paciente, engajando-se num tratamento mais eficaz que promovesse sua reabilitação, uma vez que as incapacidades físicas por vezes excluíam-no socialmente, levou aqueles médicos a serem denominados médicos de reabilitação. (NOVAES, 2008) A participação direta do Brasil na Segunda Guerra Mundial, com o envio de pracinhas para lutarem junto aos Aliados, trouxe reflexos no desenvolvimento da Fisioterapia como tratamento para recuperar seqüelados de guerra. A modernização dos serviços e o aumento da procura e da oferta fizeram com que os médicos de reabilitação se empenhassem em tratamentos mais efetivos e, com esse objetivo, também lutavam pela difusão do ensino da Fisioterapia entre os paramédicos (NOVAES, 2008). Barros (2008) revela que, na década de 1950, a incidência de poliomielite atingia índices alarmantes, principalmente nas capitais de São Paulo e Rio de Janeiro e, como conseqüência, crescia o número de pessoas que necessitavam de reabilitação. Além disso: [...] a quantidade de pessoas lesadas pelos chamados acidentes de trabalho apresentava-se como uma das maiores da América do Sul, o que permitia a inferência de que uma expressiva faixa populacional precisava ser “reabilitada para reintegrar-se ao sistema produtivo”. (REBELLATO; BOTOMÉ, 1999, p. 50, grifo dos autores) Sendo assim, em 1951, foi criado, em São Paulo, o primeiro curso para a formação de técnicos em Fisioterapia. A Associação Brasileira Beneficente de Reabilitação (ABBR), no Rio de Janeiro, é fundada em 1954. Também nesse ano, um grupo de médicos orientados pelo Dr. Waldemar Bianchi funda a Sociedade Brasileira de Reabilitação. Em 1956, a ABBR cria a Escola de Reabilitação para formação de técnicos nessa área (LEITÃO apud FONSECA, 2002). 84 Em Minas Gerais, no ano de 1952, foi criado, em Belo Horizonte, um serviço direcionado ao atendimento da criança com tuberculose e poliomielite, o Hospital da Baleia. Mais tarde, com o reconhecimento do Hospital da Baleia como referência em reabilitação em Minas Gerais, os médicos da área criaram um hospital especializado para o atendimento de pacientes portadores de deficiência física, o Hospital Arapiara, onde também desenvolveram a capacitação de pessoal através da organização do curso de Fisioterapia e de Fisiatria da Faculdade de Ciências Médicas de Minas Gerais (NASCIMENTO et al, 2005). Novaes (1998) informa que, de um modo geral, em todos os centros de reabilitação do Brasil, os médicos prescreviam o tratamento e quem os executava eram os técnicos auxiliares formados nos novos cursos. Estes não detinham os conhecimentos necessários para avaliar o corpo humano, distinguir o normal do patológico e, portanto, não podiam adotar condutas terapêuticas. Segundo o referido autor, “[...] no Brasil, o ensino de Fisioterapia restringia-se a aprender a ligar e desligar aparelhos, reproduzir mecanicamente determinadas técnicas de massagem e exercícios, tudo sob prescrição.” No início da década de 1960, através da lei 5.029, surge o primeiro curso de Fisioterapia com padrão internacional mínimo, a fim de atender aos programas de reabilitação que a Organização Panamericana de Saúde (OPAS) estava interessada em desenvolver na América Latina. O curso tinha duração de dois anos e as aulas eram ministradas pela fisioterapeuta Karen Lemborg (MARQUES; SANCHES, 1994). O decreto-lei 938/69, de 13 de outubro de 1969, reconheceu os cursos de Fisioterapia e Terapia Ocupacional. Em 20 de fevereiro de 1983, a resolução no4 do Conselho Federal de Educação fixou o currículo mínimo para o curso de Fisioterapia. Em 19 de setembro de 2001, o Conselho Nacional de Educação, através do colegiado de educação superior, aprovou as diretrizes curriculares nacionais dos cursos de graduação em Fisioterapia e Terapia Ocupacional. A lei 6.316, de 17 de dezembro de 1975, cria o Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (COFFITO) e os Conselhos Regionais de Fisioterapia e Terapia Ocupacional (CREFITO), que desempenharam importante papel para a definição e o crescimento da profissão (MARQUES; SANCHES, 1994). Pode-se concluir com essa breve revisão história que a Fisioterapia teve seu exercício, seus conhecimentos e aplicações reconhecidos, a partir da segunda metade do século XX e que, portanto, é uma ciência ainda recente, podendo até ser considerada como uma ciência moderna. 85 A Fisioterapia evoluiu muito como profissão regulamentada, diversas pesquisas foram e estão sendo desenvolvidas nas mais diferentes áreas de atuação. Neste estudo, o enfoque será destinado à Fisioterapia respiratória e à cardiológica, por estarem envolvidas diretamente no atendimento de indivíduos submetidos à cirurgia de revascularização do miocárdio. Dessa maneira, seguiremos detalhando as suas aplicações. 4.6.1.5.2 A Fisioterapia Respiratória no Pós-operatório de CRVM O paciente submetido à CRVM, geralmente é transportado do Centro Cirúrgico até ao CTI, ainda sob efeito anestésico e intubado. Seus pulmões são aerados por uma unidade ventilatória manual. Ao chegar ao CTI, o paciente é conectado ao aparelho de ventilação mecânica pelo fisioterapeuta. Este deve conferir se ambos os pulmões estão ventilando adequadamente, realizando a auscultação dos mesmos e observando a expansibilidade torácica. Se os pulmões estiverem ventilando de maneira simétrica, o fisioterapeuta garante uma fixação adequada do tubo. Posteriormente, pela radiografia do tórax, ele verifica se não há risco de intubação seletiva ou de uma extubação acidental (ZOCRATO; MACHADO, 2008). O anestesista e o cirurgião responsáveis pela cirurgia passam informações úteis à equipe multiprofissional do CTI. A presença ou não de intercorrências, as condições hemodinâmicas e respiratórias do paciente são dados importantes para guiar as condutas a serem tomadas pela equipe do CTI (COIMBRA et al, 2004; ZOCRATO; MACHADO, 2008). Após a admissão do paciente, prossegue-se uma avaliação fisioterapêutica do mesmo. Essa avaliação deve constar de um exame físico, onde se checa o nível de consciência e dados vitais (freqüência cardíaca, respiratória, pressão arterial e saturação periférica de oxigênio). Uma inspeção geral também é executada, através da palpação, percussão e ausculta do tórax do paciente. Os exames complementares, como radiografias, tomografias, exames laboratoriais e outros, também são avaliados. O tipo de monitorização utilizada, a presença, o posicionamento e o número de drenos torácicos, sondas e cateteres também são analisados (COIMBRA et al, 2004; ZOCRATO; MACHADO, 2008). 86 Aproximadamente trinta minutos após a admissão do paciente no CTI, amostras sangüíneas (venosa e arterial) são colhidas e analisadas gasometricamente. Seus resultados irão indicar a necessidade de ajustes na ventilação mecânica (COIMBRA et al, 2004; ZOCRATO; MACHADO, 2008). Durante o período em que o paciente permanecer intubado, o fisioterapeuta é responsável pelo manuseio dos parâmetros ventilatórios e execução de procedimentos fisioterapêuticos. Normalmente, o primeiro atendimento é feito duas horas após a admissão e estabilização do paciente. O objetivo da Fisioterapia nesse período é a manutenção das vias aéreas livres de secreções brônquicas, bem como da expansibilidade pulmonar. Para isso, o fisioterapeuta realiza uma série de técnicas41 que também devem ser cuidadosamente avaliadas quanto às suas indicações e contraindicações. Dentre elas, podemos citar a vibração e compressão manuais, a drenagem postural, a aspiração endotraqueal, a hiperinsuflação manual e o recrutamento alveolar (COIMBRA et al, 2004; ZOCRATO; MACHADO, 2008). Passado o efeito anestésico, são observados os critérios para a extubação traqueal. Tais critérios consistem em estabilidade hemodinâmica, temperatura corporal normal, sangramento mínimo, funções neurológicas e pulmonares adequadas, retorno da consciência e adequado controle da dor (ZOCRATO; MACHADO, 2008). Após a extubação, dá-se continuidade ao trabalho fisioterapêutico. Normalmente, os pacientes apresentam um padrão respiratório restritivo devido a fatores como dor, diminuição da complacência da caixa torácica, posicionamento inadequado no leito e alterações do nível de consciência. Esses fatores reduzem o volume de ar que entra e sai dos pulmões, aumentando, por compensação, a freqüência das incursões respiratórias. Diante desse quadro, a retenção de secreções fica favorecida e a tosse, geralmente, é ineficaz. Assim, a Fisioterapia respiratória entra como medida essencial para prevenir e tratar complicações42 como atelectasia, pneumonia, derrame pleural, hipoxemia (baixa oxigenação do sangue), dentre outras. A administração de analgésicos torna o tratamento fisioterapêutico menos desconfortável e, portanto, mais eficaz. O melhor momento para a realização da sessão é cerca de 30 minutos após a administração da droga analgésica (TANIGUCHI; PINHEIRO, 2000; COIMBRA et al, 2004; ZOCRATO; MACHADO, 2008). 41 Para maiores detalhes consultar: COIMBRA et al, 2004, p. 176-180; ZOCRATO;MACHADO, 2008, p. 357-361; TANIGUCHI; PINHEIRO, 2000, p. 131-132; ARAÚJO, Solange; MACHADO, 2008, p. 66-76. 42 Para maiores detalhes consultar ZOCRATO; MACHADO, 2008, p. 352-356. 87 A Fisioterapia motora, no CTI, também desempenha papel importante na prevenção e tratamento de alterações circulatórias e musculoesqueléticas. As atividades executadas devem ser leves, com exercícios passivos e/ou ativo-assistidos leves de membros superiores e inferiores associados à respiração (TANIGUCHI; PINHEIRO, 2000; COIMBRA et al, 2004). Caso os pacientes não apresentarem complicações do quadro clínico, após 24 a 48 horas, recebem alta do CTI para a Unidade de Internação (UI). Conforme vimos no início deste estudo, a Fase 1 da Reabilitação Cardíaca inicia-se com o evento coronário e prossegue até a alta hospitalar. Portanto, podemos considerar que a Fase 1 também engloba as atividades realizadas pelo Fisioterapeuta no CTI. Na próxima secção, o enfoque será dado à Reabilitação Cardíaca no pósoperatório de CRVM. Descreveremos brevemente a sua história. Em seguida, discorreremos sobre as suas fases e seus objetivos. 4.6.1.5.3 A Reabilitação Cardíaca no Pós-operatório de CRVM 4.6.1.5.3.1 Breve Histórico da Reabilitação Cardíaca Em 1772, o famoso médico Willian Heberden publicou um relatório descrevendo um programa de exercícios físicos com 30 minutos diários, com duração de seis meses, para um paciente do sexo masculino, que apresentava desconforto torácico. O provável diagnóstico era doença arterial coronariana e o paciente ou apresentava angina ou estava recuperando-se de um IAM. Os efeitos benéficos da atividade física em pessoas que sofriam de algum tipo de dor torácica foram observados em 1799, pelo médico inglês C. H. Parry. No entanto, essa idéia encontrou muita resistência por parte da comunidade médica e acabou não sendo assimilada na prática (CERTO; DETURK; CAHALIN, 2007). O infarto do miocárdio grave foi descrito primeiramente em 1912, por Herrich. Ele encorajou os médicos da época a reconsiderarem o papel da atividade física no tratamento de pacientes com doença arterial coronariana. Entretanto, a comunidade médica temia que a atividade física aumentasse o risco de aneurisma ventricular, ruptura miocárdica ou aumento da hipoxemia arterial. Sendo assim, no início do século XX, o 88 protocolo mais utilizado era o tratamento conservador, que consistia de 6 a 8 semanas de descanso no leito, para aqueles pacientes com IAM (CERTO; DETURK; CAHALIN, 2007). Ao final da década de 1930, dois médicos, G. K. Mallory e P. D. White, descobriram que a região do miocárdio que se encontrava necrosada tinha a capacidade de se transformar em tecido cicatricial após seis semanas. Essa descoberta trouxe pequenos avanços sobre os benefícios da atividade física em pacientes infartados. Dessa forma, ambos prescreveram, no mínimo, três semanas de repouso para pacientes infartados não-complicados. E, após a alta hospitalar, os pacientes eram estimulados a realizarem atividades físicas limitadas. Em alguns casos, subir escadas foi proibido por cerca de um ano (CERTO; DETURK; CAHALIN, 2007). Esses fatores desvelam que: Começou a ficar claro, entretanto, que durante o período imediato à doença, os pacientes tornavam-se inválidos, devido ao medo ou à falta de esclarecimento sobre sua condição. A continuação do tratamento médico estabelecia pequenas recomendações, de acordo com a tolerância, o gerenciamento do estresse ou o esclarecimento sobre as limitações impostas pela doença. Tipicamente, os pacientes nunca retornavam ao trabalho e eram considerados inválidos, sendo vistos como membros não produtivos na sociedade. (CERTO; DETURK; CAHALIN, 2007, p.17) Levine e Lown, em 1952, após estudos prévios, concluíram que o repouso contínuo e prolongado no leito diminuía a capacidade funcional e a circulação sangüínea, propiciando diversas complicações. Sendo assim, recomendaram a realização de atividade física na posição sentada, com a justificativa de reduzir o retorno venoso, diminuindo, assim, o trabalho cardíaco. Os autores publicaram um artigo demonstrando a importância da mobilização precoce de pacientes cardíacos graves. Tal mobilização foi capaz de reduzir significativamente as complicações e a mortalidade. Em virtude desses achados, esse artigo é considerado um marco em termos de manejo da doença cardiovascular (REGENGA; PERONDINI; MAFRA, 2000; CERTO; DETURK; CAHALIN, 2007). Em 1958, dois cardiologistas, Turell e Hellerstein, recomendaram um modelo para a RC com base nas técnicas de conservação de energia durante a atividade física e com base na tolerância dos pacientes ao exercício. Esse modelo foi exemplar para a RC contemporânea. A nova idéia de se incorporar exercícios físicos no tratamento médico de pacientes com DAC ganhou maior ênfase no final da década de 1950, quando o presidente americano Dwight Eisenhower sofreu um ataque cardíaco. Na época, o seu médico, Dr. Paul Dudley Whitei, recomendou um programa de atividades físicas 89 graduais, incluindo natação, caminhadas e golfe. Os efeitos de tal programa foram tão positivos para o presidente, que, em 1956, ele criou o President’s Youth Fitness Council (Conselho Presidencial para Aptidão Física da Juventude). Na década de 1960, com o objetivo de divulgar e ampliar a atividade física para os indivíduos de todas as idades, o presidente John F. Kennedy renomeou o conselho como President’s Fitness Council (Conselho Presidencial para Aptidão Física) (CERTO; DETURK; CAHALIN, 2007, tradução nossa). O período marcado pelo avanço rápido no cuidado a pacientes com doença arterial coronariana se deu nas décadas de 1960 e 1970. Nesse período, ocorreram melhorias no atendimento pré-hospitalar, como unidades móveis de emergência, e no esclarecimento da população sobre doenças do miocárdio e suporte básico de vida. As unidades de terapia intensiva foram surgindo, se multiplicando e se especializando no atendimento intensivo de pacientes na fase inicial do IAM (CERTO; DETURK; CAHALIN, 2007). Segundo Certo, Deturk e Cahalim (2007), na metade da década de 1960, Saltin e cols. descreveram que pessoas sadias, restritas ao leito por três semanas, tinham 33% da sua capacidade funcional reduzida. Nesse mesmo período, Saltin e cols. revelaram outra importante descoberta: ao aplicarem programas de exercícios rigorosos, durante meses e duas vezes ao dia, constataram que todos os indivíduos apresentaram melhora em relação ao seu estado de controle. Wenger, Zohman, Hellerstein e colaboradores desenvolveram o conceito de exercício progressivo supervisionado em indivíduos estáveis clinicamente devido ao uso de medicamentos. Esse conceito se expandiu e passou a incluir pacientes com IAM complicado, assim como aqueles submetidos à CRVM. Ao final da década de 1970, o programa de RC foi dividido em quatro fases, cada uma com seus objetivos e atividades específicas em relação ao cuidado com os pacientes (CERTO; DETURK; CAHALIN, 2007). Segundo Regenga, Perondini e Mafra: “Em 1987, durante seminário da Organização Mundial de Saúde (OMS), em Breisgan, Alemanha, concluiu-se que a reabilitação cardíaca é parte integrante da terapêutica cardiológica.” (REGENGA; PERONDINI; MAFRA, 2000, p. 247, grifo dos autores) 4.6.1.5.3.2 As Fases da Reabilitação Cardíaca 90 Atualmente, diversos programas de reabilitação cardíaca estão sendo desenvolvidos com o objetivo de proporcionar aos pacientes um retorno mais rápido às atividades diárias e com melhor qualidade de vida, visando à prática regular dos exercícios físicos, com segurança e custos baixos (TITOTO et al, 2005). O papel específico do fisioterapeuta na equipe de reabilitação está relacionado ao componente funcional do paciente. Com base na avaliação da história clínica e na avaliação funcional, o fisioterapeuta analisa as capacidades e limitações do paciente e desenvolve um plano de tratamento direcionado (REGENGA; PERONDINI; MAFRA, 2000; PATRALI; REGENGA, 2008). Descreveremos, a seguir, as fases de um programa de RC em pacientes submetidos à CRVM e seus principais objetivos. Devido à própria temática do nosso estudo, procuramos dar maior ênfase às atuações do fisioterapeuta e do psicólogo em cada fase. Portanto, esclarecemos, desde já, que não é a nossa intenção desmerecer a importância do trabalho de outros profissionais na equipe de RC. Pelo contrário, o que esperamos com essa abordagem é, justamente, estimular uma aproximação dos mesmos nesse processo considerado essencial para a recuperação adequada dos pacientes. Fase 1 ou Fase Hospitalar Inicia-se 12 a 24 horas após a estabilização clínica do paciente. Conforme vimos, a Fisioterapia nessa fase é essencial para prevenir e tratar, principalmente, as complicações respiratórias. Sendo assim, a Fisioterapia respiratória e a cardiológica se complementam nessa etapa (REGENGA; PERONDINI; MAFRA, 2000; PATRALI; REGENGA, 2008). Diversos autores, como Castro et al (1995); Arakaki e Magalhães (1996); Regenga, Perondini e Mafra (2000); Avezum et al (2004); Moraes et al (2005); Carvalho et al (2006) e Patrali e Regenga (2008), consideram os principais objetivos da Fase 1 como sendo: − Inspirar maior confiança ao paciente. O fisioterapeuta deve se comunicar com o paciente, procurando encorajá-lo, informando-o a respeito do seu estado atual de recuperação e dos exercícios que serão realizados (REGENGA; PERONDINI; MAFRA, 2000; PATRALI; REGENGA, 2008). 91 − Diminuir a tensão e o medo. O papel do psicólogo nessa etapa é de fundamental auxílio. Ele deve estabelecer, primeiramente, um canal de comunicação com os familiares, visando o bem-estar psíquico do paciente. Ele pode tranqüilizar o paciente e sua família, esclarecendo de forma honesta e compreensível as dúvidas que surgirem. Normalmente, tais dúvidas giram em torno das condições atuais do paciente, prognóstico das ações médicas, tempo de permanência no hospital, plano de cuidados e reabilitação (ROMANO, 1994a). − Reduzir os efeitos deletérios do repouso prolongado no leito. Esses efeitos incluem a redução da capacidade funcional, a redução da volemia (volume sangüíneo), do rendimento cardíaco, alterações dos reflexos cardíacos, predisposição ao tromboembolismo pulmonar, redução da massa muscular e aumento da depressão e ansiedade (CASTRO et al, 1995; REGENGA; PERONDINI; MAFRA, 2000; AVEZUM et al, 2004). − Avaliar as respostas clínicas ao aumento progressivo do esforço. Durante o exercício, o fisioterapeuta deve monitorar os sinais e sintomas que indiquem intolerância à prática da atividade, por exemplo, fadiga, dispnéia, cianose, palidez, náusea e aumento da freqüência cardíaca (FC) acima de 20 batimentos por minuto (bpm) em relação à FC basal. O uso do Índice de Percepção do Esforço (IPE) de Borg (TABELA 1) serve de grande auxílio para a determinação da intensidade dos exercícios e como critério para interrupção dos mesmos. A queda da pressão arterial (PA) sistólica maior que 20mmHg ou reação hipertensiva acima de 220mmHg para sistólica e acima de 110mmHg para diastólica é considerada como critério de exclusão do programa de RC (REGENGA; PERONDINI;MAFRA, 2000; PATRALI; REGENGA, 2008). 92 TABELA 1 Índice de Percepção do Esforço (IPE) de Borg Qualificação Nível de exercício 6 7 muito, muito fácil Percepção 8 9 muito fácil 10 11 fácil 12 13 algo cansativo 14 15 cansativo 16 17 muito cansativo 18 19 muito, muito cansativo 20 exaustivo Fonte: CASTRO et al, 1995 − Estabelecer a intensidade do esforço que será executado em domicílio ou no programa supervisionado da Fase 2. Antes de o paciente receber a alta hospitalar, o ideal é que ele realize um teste de esforço, para que o fisioterapeuta estipule qual a capacidade funcional útil do paciente. O teste de esforço também é importante para detectar manifestações isquêmicas em outras artérias e para a estratificação do risco para a ocorrência de outro evento coronariano43. A determinação da capacidade funcional útil é importante para estabelecer a FC máxima a ser atingida durante a execução dos exercícios. Ela reflete o consumo de oxigênio (VO2)44, ou seu equivalente, em unidades metabólicas (METS)45 (REGENGA; PERONDINI; MAFRA, 2000; ALVES et al, 2005). No caso de não realização do teste, outras formas de determinação da freqüência cardíaca de treinamento podem ser utilizadas, como, por exemplo, a fórmula de Karvonen46. Segundo Silva e Catai: 43 Para maiores detalhes sobre a estratificação do risco, consultar REGENGA; PERONDINI; MAFRA, 2000, p. 251. 44 O VO2 é o reflexo da quantidade de energia mecânica necessária para realizar determinada atividade física aeróbica. Pelo teste ergoespirométrico, pode ser determinado com exatidão qual o consumo máximo de oxigênio em um minuto, ou seja, o VO2 máx. Ele é expresso: ml de oxigênio cosumido/kg/min. Também existem fórmulas para calcular o VO2 máx pelo teste de esforço. Afora os testes, as outras fórmulas apenas dão uma estimativa de seu valor. Sendo assim, quando o VO2 máx é determinado, têm-se uma referência da demanda metabólica necessária para a atividade física aeróbica a ser realizada (FREITAS, Raimundo; COSTA, 1992; REGENGA; PERONDINI; MAFRA, 2000). 45 MET = equivalente metabólico (1 MET = 3,5ml de oxigênio consumido/kg/min). Relaciona-se com a demanda de oxigênio pelo miocárdio. Essa relação varia de acordo com o tipo e a intensidade da atividade executada (REGENGA; PERONDINI; MAFRA, 2000). 46 Obtém-se a FC máxima pela fórmula: FCmáx = 220 – idade. Em seguida, calcula-se o percentual da FC máxima desejada para treinamento (FCT), pela fórmula: FCT = FCR + x% (FC máx - FCR). Onde FCR significa FC de repouso. A diferença entre a FCmáx e a FCR é a FC máxima de reserva (REGENGA; PERONDINI; MAFRA, 2000). 93 O “AMERICAN COLLEGE OF SPORTS MEDICINE” indica a fórmula de Karvonen com intensidade que pode variar de 0,55/0,65 a 0,90 da freqüência cardíaca máxima de reserva, sendo o limite inferior indicado para portadores de alterações, como doença da artéria coronária, obesos, hipertensos, sedentários, etc., numa fase inicial do programa de tratamento e, o limite superior, para desportistas de várias modalidades, com o intuito de melhorar a performance atlética [...] considerando-se um treinamento de alto nível. (SILVA, Ester; CATAI, 2000, p. 293) O fisioterapeuta deve orientar o paciente sobre os exercícios a serem realizados: tipo, intensidade e duração (REGENGA; PERONDINI; MAFRA, 2000). De acordo com Romano (1994a), o psicólogo pode orientar o paciente e a sua família quanto à manutenção do controle emotivo e tratar de assuntos pessoais, como o retorno à atividade sexual47. O acolhimento do paciente em casa e o retorno ao trabalho também são assuntos que podem ser abordados. − Reduzir o tempo de internação hospitalar. A abreviação do tempo de internação contribui para diminuir o risco de infecções hospitalares, para a redução da ansiedade e dos gastos financeiros do paciente e da família e para a liberação do leito hospitalar (REGENGA; PERONDINI; MAFRA, 2000; AVEZUM et al, 2004). A intensidade dos exercícios realizados na Fase 1 deve obedecer a um consumo calórico entre 2 a 4 METS, não deve exceder mais que 20 bpm acima da FC basal e nem ultrapassar o nível 13 do IPE de Borg (percepção do esforço como algo cansativo). O aumento da intensidade dos exercícios é feito diariamente e é baseado na progressão dos STEPS (QUADRO 1). Na alta hospitalar, espera-se que o paciente já seja capaz de realizar atividades com intensidade maior que 4 METS (ARAKAKI; MAGALHÃES, 1996; REGENGA; PERONDINI; MAFRA, 2000; PATRALI; REGENGA, 2008). Assim que o paciente obtenha os critérios de estabilidade clínica e tenha passado pelo teste de esforço submáximo (de baixa intensidade) confirmatório de tal estabilidade, ele pode ser encaminhado para a Fase 2 da RC (FILHO, 2008). 47 Para mais detalhes, consultar: DANTAS; AGUILLAR; BARBEIRA, 2001 e ROMANO, 1994a, p. 6263. 94 STEP 1 = 2 MET Paciente deitado Exercícios respiratórios diafragmáticos Exercícios ativos de extremidades Exercícios ativo-assistidos de cintura, cotovelos e joelhos STEP 2 = 2 MET Paciente sentado Exercícios respiratórios diafragmáticos, associados aos exercícios de MMSS (movimentos diagonais) Exercícios de cintura escapular Exercícios ativos de extremidades Paciente deitado Exercícios ativos de joelhos e coxofemoral Dissociação de tronco/ coxofemoral STEP 3 = 3 a 4 MET Paciente em pé Exercícios ativos de MMSS (movimentos diagonais e circundução) Alongamento ativo de MMII (quadríceps, adutores, tríceps crural) Deambulação: 35m STEP 4 = 3 a 4 MET Paciente em pé Alongamento ativo de MMSS e MMII Exercícios ativos de MMSS (movimentos diagonais e circundução) Exercícios ativos de MMII (flexo-extensão e abdução/adução) Deambulação: 50m – 25m lentos/ 25m rápidos Ensinar contagem de FC (pulso) STEP 5 = 3 a 4 MET Paciente em pé Alongamento ativo de MMSS e MMII Exercícios ativos de MMSS (dissociados) Exercícios ativos de MMII (flexo-extensão e abdução/adução) Rotação de tronco e pescoço Marcar passo com elevação de joelhos Deambulação: 100m (verificar FC inicial e final) STEP 6 = 3 a 4 MET Paciente em pé Alongamento ativo de MMSS e MMII Exercícios ativos de MMSS e MMII (dissociados) associados à caminhada Descer escada lentamente e retornar de elevador (um andar) Deambulação: 165m (verificar FC inicial e final) Instruções para continuidade dos exercícios em casa STEP 7 = 3 a 4 MET Continuação do STEP 6 Descer e subir escada lentamente (um andar) Quadro 1: Programa de STEPS na Fase 1 Fonte: PATRALI; REGENGA, 2008 Fase 2 ou Fase de Convalescença Pós-Hospitalar Essa fase se inicia após a alta hospitalar e, normalmente, dura de 2 a 3 meses (CASTRO et al, 1995; REGENGA; PERONDINI; MAFRA, 2000). Segundo Castro et al (1995), recomenda-se, preferencialmente, que essa fase seja realizada dentro de um programa formal de RC supervisionado. Caso tal supervisão não seja possível, recomenda-se uma caminhada com intensidade compatível à 70-80 % da capacidade 95 funcional útil e com duração gradativamente progressiva. Normalmente, inicia-se a caminhada com 10 a 15 minutos, podendo se estender até 1 hora (desde que o esforço não ultrapasse 70-80 % da capacidade funcional útil). No entanto, os mesmos autores citados nos alertam que os pacientes que realizam atividades não supervisionadas “demandam uma menor periodicidade na reavaliação clínica (consultas) e funcional (testes ergométricos) para ajuste da prescrição e melhor acompanhamento de sua doença do que aqueles que freqüentam programas formais de reabilitação cardíaca” (MORAES et al, 2005, p. 292). Segundo Romano (1994b), em termos psicológicos, o paciente que não participa do programa formal da RC tem grandes chances de desenvolver e perpetuar sintomas como depressão e ansiedade. A autora citada revela que: Deve ser garantida a possibilidade de resolver dúvidas ou outras informações mais específicas ainda durante as primeiras semanas após a alta hospitalar. Na realidade, esta é a melhor oportunidade para reduzir a ansiedade vivenciada e para a família assumir maior responsabilidade pelos cuidados com o doente (ROMANO, 1994a, p. 63). De acordo com os autores Regenga, Perondini e Mafra (2000) e Filho (2008), os principais objetivos da Fase 2 são: − Melhorar a capacidade física. O fisioterapeuta desenvolve determinado nível de condicionamento, de forma que o paciente atinja um aumento da função cardiovascular, com diminuição da demanda de oxigênio miocárdico. O que, por sua vez, irá favorecer o retorno do paciente a níveis seguros de atividade física (REGENGA; PERONDINI; MAFRA, 2000; FILHO, 2008). − Melhorar o bem estar psicossocial. O psicólogo deve considerar as preocupações do paciente diante da possibilidade de que o esforço físico, responsabilidade em seu trabalho, atividade sexual causem prejuízos para sua saúde, já recuperada pela cirurgia. Dessa forma, se faz necessária uma orientação adequada ao paciente, enfatizando o regresso rápido as suas atividades, de acordo com as recomendações médicas e fisioterapêuticas (RUSCHEL, 1994). − Contribuir na transição hospital/residência. Ao retornar para casa, o paciente e seus familiares necessitam fazer reajustes dos seus papéis. Esses reajustes visam restabelecer ou reestruturar um nível de 96 organização desejável, favorecendo a convalescença do paciente. Nesse sentido, Romano revela: A família é um sistema intercomunicante onde o comportamento de um indivíduo só pode ser entendido a partir do contexto de todo o sistema grupal. Seus membros estão constantemente interagindo, isto é, com relação ao grupo e a si mesmos, aos subgrupos dentro da própria família e à sociedade. Desta forma, os papéis são reajustados conforme modificações das pessoas e das condições internas e externas ao grupo [...] Doença, hospitalização, procedimentos diagnósticos, terapêuticos e/ou cirúrgicos tendem a ameaçar o sistema familiar, seus papéis e canais de comunicação. Logo, paciente incapacitado (mesmo temporariamente) é igual à família incapacitada, ainda que disponha de potencial interno para reorganizar-se rapidamente. (ROMANO, 1994a, p. 63) Portanto, as intervenções que o Psicólogo propuser devem reconhecer as necessidades da família, na certeza de que estará contribuindo diretamente para a reabilitação do paciente (ROMANO, 1994a). − Auxiliar no controle dos fatores de risco para a DAC. A regularidade na realização das atividades físicas atua combatendo vários fatores de risco, como, por exemplo, o sedentarismo, a taxa elevada de gorduras no sangue e a ansiedade e depressão, pela liberação de endorfinas (QUADRO 2). Diminuição da pressão arterial sistólica de repouso Aumento do HDL colesterol Diminuição dos triglicerídeos Diminuição da intolerância à glicose (controle do diabete) Aumento da motivação para perda de peso Diminuição da ansiedade e depressão Quadro 2: Principais modificações dos fatores de risco Fonte: REGENGA; PERONDINI; MAFRA, 2000 Acrescenta-se a esse quadro a implementação de estratégias para cessação do hábito de fumar, uma vez que o tabagismo é o maior fator de risco isolado para a DAC (CARVALHO et al, 2006). O controle dos fatores de risco depende muito da colaboração do paciente, sendo assim, o psicólogo pode determinar a necessidade de psicoterapia, com o objetivo de trabalhar sentimentos, fantasias e resistências despertadas em todo o processo de adoecimento. O trabalho psicoterapêutico facilita a adaptação do paciente a um novo estilo de vida e, conseqüentemente, melhora a sua qualidade (RUSCHEL, 1994; ROMANO, 1994a). 97 − Reduzir a morbimortalidade cardiovascular. O acompanhamento das respostas clínicas ao esforço pelo fisioterapeuta e pelo médico serve como parâmetro para avaliar a eficácia do programa de RC, seja ele supervisionado ou não. Além disso, a equipe multiprofissional deve estar atenta à identificação de possíveis complicações pós-operatórias tardias48 como, por exemplo, mediastinites (inflamação profunda da ferida operatória), Síndrome pós-pericardiotomia (pericardite tratada com recidivas de derrame pleural), fechamento de ponte(s), estados depressivos, dentre outras. O controle desses fatores, portanto, contribuirá para a redução da morbidade e mortalidade pós-operatórias (FILHO, 2008; AULER Jr.; OLIVEIRA, 2004). Prescrição dos Exercícios Conforme vimos acima, a intensidade dos exercícios prescritos para a Fase 2 deve estar entre 70% e 80% da capacidade funcional útil do paciente. Também não deve exceder o consumo calórico de 3 a 5 METS (QUADRO 3). A percepção subjetiva de cansaço moderado (nível 15 do IPE de Borg) deve ser respeitada (ARAKAKI; MAGALHÃES, 1996; REGENGA; PERONDINI; MAFRA, 2000; FILHO, 2008; PATRALI; REGENGA, 2008). 48 Para mais detalhes, consultar AULER Jr.; OLIVEIRA, 2004. 98 Categoria (Energia) Cuidados pessoais ou tarefas de casa Ocupacionais Recreativas Condicionamento Físico Muito leves 3 METS 4 kcal Banhar-se, barbear-se, escrever, lavar louças, dirigir carro. Orador (sentado), vendedor, garçom (de pé), porteiro Jogar cartas Ferrar cavalo Cevar Jogar bilhar Costurar, fazer tricô Golfe (carreta) Caminhar (3 km/h) Bicicleta estacionária (resistência muito baixa) Calistênicos muito leves Leves 3-5 METS 4-5 kcal Limpar vidraças Varrer folhas Capinar Cortar grama com máquina Encerar soalho (lentamente) Pintar parede Carregar objetos (7-14 kg) Colocar objetos leves em prateleira Soldar Carpintaria leve Montagem de máquinas leves Reparo de automóvel Colocar papel de parede Dançar Golfe (caminhar) Velejar Passeio a cavalo “volleyball” (6 homens) Tênis (duplas) Caminhar (5-6 km/h) Andar de bicicleta (1013 Km/h) Calistênicos leves Moderados 5-7 METS 6-8 kcal Cavar terra em jardim Cortar grama manualmente Subir escadas lentamente Carregar objetos (1427 kg) Rachar lenha Carpintaria (construção civil) Remover lixo Trabalho com pneus Carregar pacotes leves Tênis (simples) Patinagem em gelo ou com rodas Andar a cavalo (galope) Caminhar (7-8 km/h) Andar de bicicleta (1416 Km/h) Nadar (peito) Pesados 7-9 METS 8-10 kcal Serrar madeira Remover lixo pesado Subir escadas (velocidade moderada) Carregar objetos (2740 kg) Trabalhar com alto forno Cavar valeta Abrir buracos e retirar a terra com a pá Canoagem Escalar montanhas “Football” “Paddleball” “Jogging” Nadar (crawl) Remar Andar de bicicleta (19 km/h) Calistênicos Muito pesados 9 METS 10 kcal Carregar pesos subindo escadas Carregar objetos (40 kg) Subir escadas rapidamente Remover neve pesada Cortar lenha Trabalho braçal “Handball” “Squash” Alpinismo Correr (10 km/h) Andar de bicicleta (20 km/h) ou subir ladeira Pular Corda Quadro 3: Necessidades calóricas aproximadas para atividades selecionadas Fonte: FREITAS, Raimundo; COSTA, 1992 A Sessão de Reabilitação Cardíaca A sessão de reabilitação deve incluir três etapas distintas: aquecimento, fase aeróbica ou de condicionamento e desaquecimento. O período de aquecimento consiste de 5 min de caminhadas, exercícios de flexibilidade e exercícios localizados de baixa intensidade e utilizando pequenos grupos musculares. Tem por objetivos: redistribuir gradativamente a circulação sangüínea, direcionando-a para os músculos em atividade; prevenir lesões osteomusculoarticulares; aumentar a temperatura corporal e aumentar progressivamente a FC e a PA. O período aeróbico tem duração de 20 a 30 min de atividade física, utilizando grandes grupos musculares (caminhadas, corridas lentas ou ciclismo). Seu objetivo principal é estimular a função cardiorrespiratória, no que se 99 refere à capacidade de absorção, transporte, entrega e consumo de oxigênio. Para isso, o exercício deve atingir um nível de esforço capaz de sustentar a FC de treinamento durante 20 a 30 min. Por fim, o período de desaquecimento tem por objetivo o retorno gradual às condições de repouso. Esse retorno gradativo previne a queda brusca da PA por seqüestro sangüíneo periférico. A manutenção da estabilidade pressórica impede a brusca redução do volume de sangue bombeado pelo coração, prevenindo a lipotimia ou desmaio. São realizados exercícios de alongamento e caminhadas leves, durando cerca de 5 a 10 min. Podem ser ainda associados períodos de relaxamento e/ou de socialização dos pacientes. A freqüência mínima preconizada para as sessões é de 3 vezes por semana. Maior freqüência de exercícios com menor intensidade aumenta os benefícios e reduz os riscos de complicações (AVEZUM et al, 2004; FILHO, 2008). O paciente poderá ingressar na Fase 3, quando preencher os seguintes critérios: um nível de tolerância ao exercício sem que apresente isquemia ou arritmias; estabilidade dos sintomas de angina ou dispnéia durante o esforço máximo; limites normais da FC e PA de repouso e ausência de isquemia miocárdica no teste de esforço (FILHO, 2008). Fase 3 ou Fase de Ganho Funcional Supervisionado A intervenção da Fisioterapia na Fase 3 se dá de forma preventiva e curativa, através da aplicação de programas de condicionamento físico supervisionados, ambulatoriais ou comunitários. A ação preventiva tem por objetivo o controle dos fatores de risco agravantes ou precipitantes de doenças cardiovasculares. E a ação curativa visa à recuperação das funções dos sistemas cardiovascular, respiratório, metabólico, muscular e humoral (SILVA, Ester; CATAI, 2000). De acordo com Silva e Catai (2000) e Carvalho et al (2006), os principais objetivos da Fase 3 são: − O aprimoramento da condição física. Ao término da Fase 2, o fisioterapeuta deve refazer o cálculo da FC de treinamento, a partir de um novo teste de esforço realizado pelo paciente (SILVA, Ester; CATAI, 2000). − Manutenção, melhora ou aquisição do bem estar psicossocial. Nesse ponto, cabe mencionar que o local onde se realiza o programa de RC deve proporcionar um ambiente adequado, a fim de incentivar o paciente 100 a aderir a um estilo de vida mais saudável, o que pode auxiliar no controle da ansiedade e depressão (FEITOSA et al, 2000). − Manutenção ou aprimoramento no controle dos fatores de risco para DAC. A continuidade da prática regular de exercícios físicos é determinante na obtenção dos benefícios dessa atividade sobre os fatores de risco49. Segundo Ramos citado por Mattos, Brandi e Kitajima: [...] a ansiedade pré-operatória e a instabilidade pós-operatória, com múltiplas manipulações das quais o paciente é vítima passiva na cirurgia cardíaca e convalescença, as dificuldades de reinserção familiar e profissional perturbam o estado psicológico profundamente e de modo constante, durante cerca de seis meses após a cirurgia. (RAMOS apud MATTOS; BRANDI; KITAGIMA, 2003, p. 425) Comportamentos depressivos, ansiedade, deterioração das relações com o ambiente podem se manifestar somente quando da saída do paciente do hospital, e tendem a persistir, em alguns casos, durante um ano (CARR; POWERS, 1986; KING, 1985). De acordo com Romano (1994a), o estado psicológico do paciente submetido à cirurgia cardíaca só se torna definitivamente estável a partir de um ano após o evento. Romano também revela que: As mudanças na aparência do corpo, suas funções, que ocorrem durante o processo de revascularização, necessitam mudanças no comportamento para adaptar-se a nova situação. E o paciente pode reagir: negando, prolongando o estado de dependência ou tendo uma integração positiva com essas mudanças. Entender como negativas as interferências na autopercepção, no autoconceito, podem contribuir para que o doente tenha sentimentos de “redução ao nada”. O modo como ele reage a este desequilíbrio tem impacto sobre sua atuação psicossocial o resto de sua vida (ROMANO, 1994a, p. 58). Diante desses fatores, a atuação do psicólogo na Fase 3 da RC também pode ser considerada como preventiva e curativa. A ação preventiva surge da sua contribuição no controle dos fatores de risco, principalmente aqueles ligados às questões psicossociais. O pavor da morte, novo infarto ou a incapacidade de reassumir os padrões de vida anterior são comuns e isso deve ser abordado também na reabilitação (CASTRO et al, 1995). A ação curativa está ligada à recuperação da saúde mental do paciente nos casos, por exemplo, de depressão. Nas palavras de Romano: 49 Para maiores detalhes, consultar: SILVA, Ester; CATAI, 2000, p. 267-269. 101 Numa situação de crise, como é a doença (principalmente se for crônica, incapacitante ou incurável), várias reações depressivas podem eclodir a partir de fatores pessoais, como, por exemplo, sentimento de culpa, negação, reestruturação da escala de valores [...] É importante, entretanto, indentificarse os pacientes com essa disfunção significativa ou persistente, porque, além de comprometer a participação ativa nos cuidados médicos (morbidade), há trabalhos na literatura que apontam para um aumento da mortalidade em pacientes deprimidos em geral [...] e, em particular, durante ou após a cirurgia cardíaca. (ROMANO, 1994b, p.70) Prescrição dos Exercícios A via de obtenção de energia para os exercícios deve ser modulada em nível aeróbico. Sendo assim, a intensidade dos exercícios físicos a serem praticados na Fase 3 deve estar em níveis submáximos de trabalho, ou seja, 50 a 78% do VO2 máx alcançado no teste de esforço (submáximo e com o uso da medicação) ou 60 a 85% da FC máxima atingida nesse mesmo teste (SILVA, Ester; CATAI, 2000). A prescrição do exercício pelo MET é feita determinando-se valores percentuais da capacidade funcional. A intensidade média padrão de treinamento, segundo Yazbec e cols. citados por Silva e Catai (2000), corresponde a 60% somado ao número de METS alcançado no teste de esforço. Dessa maneira, obtém-se um valor percentual que, multiplicado novamente pelo número de MET máximo no teste, revelará o número de METS de treinamento50. O IPE de Borg também pode contribuir para o estabelecimento da intensidade do esforço aplicado. Ele deve respeitar a percepção subjetiva do exercício como cansativo (nível 15). Mesmo que o paciente não encontre dificuldades em continuar a atividade acima desse nível, é aconselhável que o IPE de Borg se situe sempre entre 13 e 15, pois essa faixa de treinamento está correlacionada ao predomínio do metabolismo aeróbico (SILVA, Ester; CATAI, 2000). A Sessão de Reabilitação Cardíaca Segundo Silva e Catai (2000), as sessões de RC na Fase 3 têm uma duração total de aproximadamente uma hora e deverão ser realizadas no mínimo três vezes por semana e em dias alternados. Os princípios da sessão na Fase 3 seguem os mesmos da Fase 2, ou seja, a sessão é dividida em fases de aquecimento, aeróbica e desaquecimento. A fase de aquecimento dura de 5 a 10 minutos, sendo realizados exercícios de alongamento, dinâmicos aeróbicos e de coordenação, associados a exercícios respiratórios. Tem por objetivo 49 Exemplo: Capacidade funcional útil obtida = 9 METS → 60 + 9 = 69% → MET de treinamento será: 0,69 x 9 = 6,21. 102 preparar os sistemas cardiorrespiratório e musculoesquelético para a fase aeróbica ou de condicionamento. Ao final do aquecimento, afere-se a FC do paciente. A fase de condicionamento tem duração aproximada de 40 minutos. Poderão ser realizados trotes, caminhadas, ou outros tipos de exercícios que permitam aferir a FC e a PA durante sua realização. Ao final da fase de condicionamento a FC e a PA também devem ser aferidas. A fase de desaquecimento tem duração aproximada de 10 minutos. São realizados exercícios dinâmicos leves e respiratórios, associados a alongamentos específicos. O relaxamento também pode ser aplicado. O objetivo do desaquecimento na Fase 3 é o mesmo da Fase 2 (SILVA, Ester; CATAI, 2000; AVEZUM et al, 2004). Há casos em que o paciente apresenta hipertensão arterial antes de iniciar a sessão de RC. Nessa situação, somente os exercícios de relaxamento deverão ser aplicados e por um período maior de tempo. Se houver persistência do quadro, o paciente deverá ser encaminhado ao médico antes de realizar uma nova sessão (SILVA, Ester; CATAI, 2000). Os pacientes que estão em período de treinamento superior a 3 meses devem ser submetidos a uma reavaliação de suas capacidades funcional e física. Pelo resultado dos testes de esforço, serão feitos novos incrementos na carga de trabalho (SILVA, Ester; CATAI, 2000). De acordo com Meneghelo, Ferraz e Ghorayeb (1993), Alves et al (2004) e Carvalho et al (2006), o paciente poderá passar para a Fase 4 da RC, quando: − Tiver obtido o grau de seu condicionamento físico máximo, confirmado pelos testes de esforço. − Mantiver estabilidade clínica. − Estiver apto para se automonitorar durante a prática dos exercícios. − Desenvolver nível de bem estar psicológico e social satisfatório. Fase 4 ou Fase de Manutenção Não Supervisionada Segundo Carvalho et al (2006), a Fase 4 é um programa com duração longa, podendo se estender pelo resto da vida. As atividades não são supervisionadas e podem ser adaptadas de acordo com as preferências de cada paciente, inclusive para atividades desportivas. Os recursos materiais e disponibilidade de tempo para realização das atividades também devem ser levados em conta, a fim de que o paciente não abandone o programa. Os pacientes nessa fase são reavaliados em períodos que variam de 6 meses a 103 um ano. Após cada reavaliação, principalmente quando são realizados testes de esforço, os pacientes devem ser reorientados na prática, quanto à intensidade, duração e tipo de exercício. Sendo assim, algumas sessões supervisionadas podem ser feitas dentro das possibilidades de cada paciente. Uma alternativa para pacientes já submetidos à CRVM é o programa de prescrição externa, ou seja, uma programação e orientação de treinamento físico feita pela equipe multiprofissional, com reavaliações semestrais para a atualização da prescrição do treino (ALVES et al, 2005; CARVALHO et al, 2006). Avezum et al nos revelam que: O sucesso de qualquer intervenção preventiva secundária está diretamente relacionado à aderência ao tratamento. Os índices de aderência aos programas de reabilitação cardíaca após infarto agudo do miocárdio excedem 80% nos três primeiros meses, caindo para 60 a 71% ao sexto mês, 60% aos 12 meses e 30 a 40% entre o 2º e 4º ano. A insistência do médico assistente e a integração da equipe multidisciplinar ao atendimento aos pacientes através de esclarecimento e controle dos vários fatores de risco têm mostrado maior efetividade na adesão ao tratamento. Freqüentes dosagens do colesterol sangüíneo, levantamento de hábitos alimentares através de entrevistas e questionários, controle dietético e terapêutico da dislipidemia, controle do tabagismo, da pressão arterial e do peso corporal ajudam a adesão ao tratamento. (AVEZUM et al, p. 69) Ainda a esse respeito, Alves et al nos informam que: Segundo a definição da American Heart Association, é fundamental que esses programas, independentemente da fase, sejam multidisciplinares (médicos, educadores físicos, fisioterapeutas, nutricionistas e psicólogos), já que estaremos abordando uma doença ou enfermidade multifatorial [...] Apesar de ser o carro-chefe dos programas de reabilitação, a prática de exercício físico por si só não pode ser considerada reabilitação cardíaca. (ALVES et al, 2005, p. 253) Encontramos aqui, com esses argumentos, mais um reforço para esclarecer o caráter interdisciplinar de nosso estudo e também para justificar a investigação dos processos psicossociais pós-modernos, à luz dos conceitos de Frankl, que poderão estar ligados à dificuldade de ingresso dos pacientes idosos submetidos à CRVM na Fase 3 da RC. Toda essa revisão foi necessária para que entendêssemos o caráter multifatorial da DAC e, como foi visto, quanto mais avançada é a idade, maiores são os riscos e conseqüências dessa doença. Nesse sentido, há que se considerar as modificações funcionais orgânicas e psicológicas associados ao envelhecimento, bem como uma das formas mais eficazes de se intervir sobre essas modificações, ou seja, a atividade física. Uma vez a DAC culminando com uma CRVM, sintomas como depressão, ansiedade e 104 outras manifestações particulares ao indivíduo idoso revascularizado podem surgir. Portanto, esses serão os assuntos abordados no próximo capítulo. 105 5 O ENVELHECIMENTO, A CIRURGIA DE REVASCULARIZAÇÃO DO MIOCÁRDIO E O IDOSO 5.1 Definição de Envelhecimento Segundo Azevedo, Alonso e Okuma (2005): O envelhecimento era considerado, do ponto de vista funcional, a redução da capacidade de adaptação homeostática perante situações de sobrecarga do organismo; entretanto, hoje é considerado um processo fisiológico que deve ser entendido como um continuum, que começa com a concepção e termina com a morte. (AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005, p. 272) De acordo com a Organização Mundial de Saúde (WHO, 1999), é importante diferenciar o envelhecimento primário, mudanças biológicas universais que ocorrem com o avanço da idade, do processo de envelhecimento ou envelhecimento secundário. O envelhecimento primário está presente em todas as pessoas e é determinado geneticamente. O envelhecimento secundário é caracterizado pelo somatório dos efeitos do meio ambiente, do estilo de vida e das doenças. Portanto, o envelhecimento secundário pode atenuar ou intensificar as mudanças trazidas pelo envelhecimento primário (AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005; WHO, 1999). Vargas nos revela um conceito sobre o envelhecimento que parece ser o mais completo: O envelhecimento pode ser entendido como o fenômeno biopsicossocial que atinge o homem e sua existência na sociedade. Manifestando-se em todos os domínios da vida, inicia-se pelas células, passa aos tecidos e órgãos e termina nos processos extremamente complicados do pensamento. (VARGAS, 1994, p.7) Considerando os fenômenos do envelhecimento, observa-se a evolução das necessidades que a pessoa idosa apresenta em adaptar-se física e psicologicamente a uma deterioração do organismo, que pode ser mais notada em sua totalidade ou em partes específicas, os órgãos (GOLDFARB; TURNER, 1953). Nessa direção, estudaremos, a seguir, as modificações funcionais orgânicas e psicológicas associadas ao envelhecimento. 106 5.2 Modificações Funcionais Orgânicas Associadas ao Envelhecimento A função orgânica atinge o seu ápice entre os 20 e 30 anos de idade. A partir da terceira para a quarta década de vida, ela começa a declinar, apresentando modificações estruturais próprias do envelhecimento (SALVIOLI NETO et al, 1996). A seguir, faremos um breve relato a respeito das modificações fisiológicas decorrentes do envelhecimento nos sistemas muscoloesquelético, endócrino, cardiorrespiratório e nervoso. Modificações Musculoesqueléticas Como os demais processos de involução, a atrofia muscular devido à idade tem início no jovem adulto, ou seja, em torno dos trinta anos. O indivíduo não treinado perde cerca de 10% de sua massa muscular até os cinqüenta anos. A partir daí, o processo de atrofia se acelera visivelmente. Com oitenta anos, o indivíduo apresenta apenas 50% da sua massa muscular original (LEITE, 1996; FLECK; KRAEMER, 2006). A causa maior de atrofia muscular na idade avançada é a perda do número de fibras musculares. Acredita-se que a redução no tamanho dessas fibras tenha um papel secundário na atrofia. Tudo indica que o mecanismo responsável é um fenômeno neurogênico, no qual as fibras musculares deixam de ser inervadas e acabam perecendo. São, em parte, substituídas por gordura e tecido conjuntivo. Esse mecanismo explica a acentuada diminuição da porcentagem de tecido contrátil na musculatura do indivíduo idoso. Conseqüentemente, com o envelhecimento, há uma diminuição da força muscular. Observa-se um declínio pelo menos de 16,5% na força muscular após a terceira década de vida. A perda de força na apreensão manual em homens por volta dos 65 anos é de cerca de 20% em comparação aos indivíduos de 20 anos. Para as mulheres, a perda no transcorrer desses mesmos 45 anos varia de 2% a 20%. O menor declínio nas mulheres pode ser atribuído a uma força muscular máxima relativamente menor nos anos mais jovens, em virtude do menor uso profissional das mãos (LEITE, 1996; AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005; FLECK; KRAEMER, 2006). Nos primeiros 20 anos de vida, ocorre incremento progressivo da massa óssea, a qual atinge seu ponto máximo aos 40 anos. A partir daí, a taxa de reabsorção aumenta e passa a ocorrer perda progressiva dessa massa. Essa queda é estimada em 1% ao ano, e 107 após a menopausa pode chegar a até 5%. A acentuada redução da massa óssea (osteopenia) pode provocar a osteoporose. A osteoporose é uma doença que se caracteriza pela deterioração da microarquitetura do tecido ósseo, com conseqüente aumento de sua fragilidade e maior predisposição a fraturas (AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005). Alterações na flexibilidade também ocorrem com o envelhecimento. As estruturas envolvidas no sistema articular (tendões, ligamentos) se tornam menos flexíveis. Acredita-se que essas alterações ocorrem devido à diminuição da água corporal total, aumento da calcificação e substituição das fibras elásticas por colágeno. A mobilidade articular é fundamental para a prevenção de lesões musculares e dores na coluna. Está também envolvida nas atividades de vida diária do idoso, como, por exemplo, vestir-se, calçar-se, alcançar objetos, girar tronco e pescoço para dirigir veículos, etc. (AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005). Modificações hormonais A velhice é um período no qual a adaptação às perturbações metabólicas encontra-se reduzida, principalmente quando se trata do sistema endócrino, que controla quimicamente os outros sistemas biológicos. Assim, com o envelhecimento ocorrem alterações importantes na produção de hormônios, no seu metabolismo e, principalmente, nos seus mecanismos de ação (HERSHMAN, 1985). Algumas dessas alterações terão um papel determinante na fisiopatologia do envelhecimento, como, por exemplo, o equilíbrio glicêmico, o metabolismo do cálcio, as dinâmicas hipofisária, adrenal, tireoideana e a alteração marcante da função reprodutiva (HERSHMAN, 1985). Existe uma teoria neuro-endócrina, que relaciona o funcionamento conjunto dos mecanismos neurais e endócrinos. Ela sugere a presença de um marcapasso central responsável por ativar a falência progressiva do sistema endócrino. Essa teoria se baseia no fato de que indivíduos jovens com problemas endócrinos, como osteoporose, hipogonadismo (diminuição da função das gônadas), dentre outros, apresentam alterações morfológicas, funcionais e bioquímicas (por exemplo, diminuição da massa óssea e muscular e hipertensão), as quais também são encontradas em idosos saudáveis. Ou seja, problemas comuns do envelhecimento também possuem uma influência endócrina (MCDERMONT, 1987). 108 Doenças como osteoporose e doenças coronárias podem ter suas explicações pela alteração na secreção do hormônio de crescimento, de hormônios esteróides sexuais, dentre outros produtos. Uma reposição hormonal possivelmente trará resultados positivos, mas não se deve generalizar. Deve-se ter sempre em mente que a maior parte dos eixos de secreção hormonal sofre influência da idade, de doenças preexistentes, de medicação, de atividade física, da alimentação e do sono. Cada pessoa deve ser avaliada individualmente para se medir a relação risco/benefício decorrente da terapêutica de reposição hormonal (MCDERMONT, 1987). Modificações Respiratórias Em geral, as medidas estáticas e dinâmicas da função pulmonar sofrem uma deterioração com o avanço da idade. Esta decorre da perda das propriedades de retração elástica do pulmão, do enrijecimento da parede torácica e da diminuição da potência motora e muscular pulmonar. Esses fatores causam uma maior participação do diafragma e dos músculos abdominais na respiração (AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005). As mudanças no tecido conjuntivo pulmonar, somadas à redução da massa muscular respiratória e à acentuação da cifose torácica fisiológica, causam alterações na elasticidade, na complacência51 e nos volumes pulmonares. Essas alterações são fatores limitantes da capacidade funcional52 nos idosos (AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005). O envelhecimento ainda causa um aumento do espaço morto (locais que não têm função de troca gasosa) e uma redução do tamanho das vias aéreas. Isso causa uma relação desproporcional entre ventilação e perfusão pulmonar. Essa desproporção acaba culminando com uma redução na difusão pulmonar de monóxido de carbono e uma diminuição da pressão parcial de oxigênio no sangue arterial, tanto em repouso como no exercício (AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005). Modificações Cardiovasculares 51 A complacência, em fisiologia, é uma medida da tendência de um órgão para resistir ao recuo às suas dimensões originais, com a remoção de uma força compressiva ou distensiva (GUYTON; HALL, 1997). 52 A capacidade funcional “é a capacidade de realizar atividades físicas cotidianas, ocupacionais, esportivas e de lazer. Está relacionada à capacidade de suportar uma atividade dinâmica, que envolva grandes grupos musculares, por um longo período. Por isso é também chamada de capacidade aeróbia expressa pelo VO2máx” (SAMORA; VERSIANI, 2008, p. 407). 109 O envelhecimento do sistema cardiovascular ocorre tanto ao nível central, ou seja, no coração, como a nível sistêmico: nos vasos e artérias (AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005). Nas vávulas cardíacas, ocorre um aumento da quantidade de tecido fibroso e calcificação. No sistema arterial, ocorre dilatação da aorta e enrijecimento e espessamento das grandes artérias, devido à perda de tecido elástico, ao acúmulo de tecido conjuntivo e a depósitos de cálcio, havendo, portanto, uma redução da complacência arterial. O aumento na espessura da parede das arteríolas53 também é observado. Todas essas alterações vasculares causam um aumento da pressão arterial sistólica (dentro de limites normais), aumento da resistência aórtica e conseqüentemente a hipertrofia do ventrículo esquerdo (também em limites normais). A hipertrofia do ventrículo esquerdo associa-se à perda progressiva de miócitos (células musculares) e substituição dos mesmos por tecido fibroso (AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005). Ocorre também a diminuição da sensibilidade barorreflexa arterial, (provavelmente pelo resultado de alterações escleróticas no seio carotídeo), podendo, em adição, haver falha das respostas vasoconstritoras centrais, e, talvez, periféricas, à queda da pressão sangüínea. Isso causa uma importante incapacidade da pressão sangüínea em se adaptar à alteração postural, favorecendo desmaios e quedas nos idosos (AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005). O débito cardíaco em repouso cai (em torno de 10% por década a partir dos 40 anos) aproximadamente na mesma proporção que o consumo de oxigênio em repouso cai (também diminui cerca de 10% por década) (SAVIOLI NETO et al, 1996). A capacidade de extração máxima de oxigênio sangüíneo pelos tecidos, ou seja, o consumo máximo de oxigênio, também não escapa ao envelhecimento. Após os 25 anos, o VO2máx declina constantemente em cerca de 1% ao ano, de forma que, por volta dos 55 anos, encontra-se em torno de 27% abaixo dos valores relatados para pessoas de 20 anos. Esse declínio no VO2máx ocorre de maneira mais acentuada em indivíduos sedentários (LEITE, 1996; SAVIOLI NETO et al, 1996; AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005). 53 As arteríolas “são os menores ramos das artérias e oferecem maior resistência ao fluxo sangüíneosangüíneosangüíneo, contribuindo assim para reduzir a tensão do sangue antes de sua passagem pelos capilares” (DANGELO; FATTINI, 1995, p. 98). 110 O declínio no VO2máx deve-se às modificações miocárdicas relacionadas ao débito cardíaco máximo54. Uma redução na sensibilidade miocárdica às catecolaminas55 (ou redução da sensibilidade β adrenérgica) observada nos idosos parece ser a explicação mais provável para o declínio da freqüência cardíaca e do volume sistólico máximos (AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005). A redução da diferença artério-venosa máxima de oxigênio também está relacionada à queda do VO2máx.. A diminuição nessa diferença reflete um prejuízo na eficiência da extração periférica de oxigênio, podendo ser atribuída a um menor fluxo sangüíneo para os músculos ativos e/ou deterioração da capacidade oxidativa muscular (AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005). Modificações no Sistema Nervoso Central As alterações do envelhecimento sobre o sistema nervoso central estão entre as mais importantes, devido ao seu grande significado na psicologia da idade e na produção de distúrbios do movimento. Sua base anatômica é incompleta e ainda imperfeitamente compreendida. Acredita-se que o número de neurônios cai em algumas partes do sistema nervoso, por exemplo, os motoneurônios do cordão espinhal, as células de Purkinje no cerebelo e as células da substância negra e neocórtex. Também estão descritas anormalidades nos neurônios que permanecem, incluindo o acúmulo de lipofuscina56 e perda de dendritos e espinhas dendríticas57 nos neurônios corticais. Portanto, a base anatômica das alterações da função cortical pode incluir a redução do número de neurônios e/ou as alterações nas conexões entre os mesmos. Há também uma redução na velocidade de condução do nervo periférico, tanto motora quanto sensorial. Essas alterações podem explicar, em parte, o decréscimo induzido pela idade no desempenho neuromuscular. O desempenho neuromuscular é avaliado pelos tempos de reação e de movimento, tanto simples quanto complexos. O tempo de reação é dividido 54 Débito cardíaco máximo é o produto do volume sistólico máximo pela freqüência cardíaca máxima (RONDON et al, 2005). 55 As catecolaminas são compostos químicos derivados do aminoácido tirosina. As mais abundantes são a adrenalina, noradrenalina e dopamina. Como hormônios, são liberadas pela glândula supra-renal em situações de estresse, como estresse psicológico ou hipoglicemia (GUYTON; HALL, 1997). 56 A lipofuscina é um pigmento depositado na célula que serve para detectar o tempo de vida celular. Possui coloração castanho-dourado e é constituído por fosfolípides e proteínas que resultam da digestão incompleta dos restos celulares. É mais freqüente nas células envelhecidas, daí o nome de pigmento de desgaste ou de envelhecimento, pelo qual também é conhecido. Serve, portanto, para detectar o tempo de vida celular. Quanto mais velha é a célula, maior a quantidade de lipofuscina presente na mesma (NETTO; CARVALHO FILHO; SALLES, 2006). 57 Dendritos e espinhas dendríticas são prolongamentos de neurônios especializados na recepção de estímulos nervosos (GUITON; HALL, 1997). 111 em tempo de processamento central e tempo de contração muscular, sendo que o primeiro é o mais afetado pelo processo de envelhecimento. Assim sendo, o envelhecimento afeta a capacidade de identificar um estímulo e processar a informação para produzir uma resposta (LEITE, 1996). Segundo Azevedo, Alonso e Okuma: Os movimentos tornam-se mais lentos e menos precisos, com reações menos rápidas aos estímulos do ambiente. Essas mudanças, embora aconteçam de forma individual, são graduais e inexoráveis, aumentando muito com o avançar da idade e tendo implicações no status funcional dos idosos que dependem destas qualidades motoras para viverem satisfatoriamente. (AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005, p. 277) Observa-se ainda, com o envelhecimento, a redução das funções visuais, vestibular e somatossensorial. A integração dessas três funções é responsável pela manutenção da postura ereta e do equilíbrio. Havendo prejuízo nas mesmas, os idosos tornam-se mais propensos às quedas. As quedas são as maiores causas de morte e traumas em pessoas idosas, sendo responsáveis por 90% das fraturas de quadril. Aproximadamente 30% das pessoas com mais de 65 anos caem a cada ano, sendo que 50% dessas quedas necessitam de cuidados médicos (AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005). 5.3 Modificações Psicológicas Associadas ao Envelhecimento As condições psicológicas do idoso estão intimamente relacionadas com a sua história pessoal e com as situações de vida na qual envelhece. Dessa maneira, as modificações psicológicas que ocorrem durante o processo de envelhecimento são sentidas de forma particular por cada um. Se o indivíduo envelhece em um ambiente saudável, terá maiores chances de experimentar sentimentos de satisfação com a vida, prazer, alegria e realização. Porém, para aqueles que são privados dessa oportunidade, as chances de conviverem na velhice com condições psicológicas negativas são maiores (AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005; DUARTE, 2008). Rauchbach corrobora essa última afirmação, ao revelar que: Atrás de uma barreira de isolamento social, pessimismo face à existência, passividade e queixas somáticas, que têm sido erroneamente considerados como parte do processo normal de envelhecimento, mascaram-se a ansiedade, 112 a depressão e a insônia, precursoras comuns de infarte (sic) do miocárdio (RAUCHBACH, 1990, p. 13). Para Duarte, as adaptações psicológicas que os indivíduos desenvolvem ao envelhecer “podem acontecer de forma adequada, saudável ou patológica. Tudo depende da história anterior, da saúde física, do bem estar socioeconômico e da vivência atual das modificações, perdas e medos” (DUARTE, 2008). Nesse sentido, é importante ressaltar que a velhice vem sendo erroneamente associada a estados emocionais negativos. Essa associação é equívoca pelo fato de que não existe envelhecimento psicológico e social, mas “estados psicológicos presentes na velhice, decorrentes da relação entre o processo de envelhecimento e as condições sociais nas quais as pessoas vivem” (AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005, p. 275). Goldstein (1995) desvela que, durante os caminhos da vida, o homem é colocado diante de várias situações de desafio que, em geral, lhes são estressantes. Segundo o autor citado, os fatores causadores de estresse na velhice relacionam-se com grandes perdas, como problemas de saúde, afastamento do mercado de trabalho e exclusão social. Em um estudo sobre o estresse na velhice, feito por Mayeve Araújo, a autora nos revela que: No nosso consultório, observamos que muitos de nossos clientes que estavam vivenciando a velhice apontavam como agentes estressantes fontes extrínsecas (como é o caso da perda ou doença do cônjuge, ou mesmo cuidar da educação dos netos, quando ocorre uma separação/ divórcio dos pais), e/ou intrínsecas à sua pessoa (como é o caso da negação da velhice, da não aceitação da condição de debilidade física, entre outros). O próprio discurso dos mais velhos, bem como a nossa observação e avaliação, seja de cunho objetivo e/ou subjetivo, demonstraram que alguns deles se caracterizavam mais pelas fontes intrínsecas, enquanto outros pelas fontes extrínsecas do stress. Não obstante, alguns sujeitos apresentavam um perfil que caracterizava os dois tipos de fontes, mesmo que com algumas variações na sua freqüência e intensidade (ARAÚJO, Mayeve, 2006, p. 195). Além desses fatores, pequenos aborrecimentos, como a dificuldade de realizar atividades de vida diária (conseqüentes da redução da capacidade física e funcional), a redução dos recursos financeiros, o preconceito e a falta de paciência das pessoas com o idoso, são também, para esses indivíduos, vias causadoras de estresse (GOLDSTEIN, 1995). Contudo, o nível de estresse que cada indivíduo idoso vivencia depende da sua avaliação individual sobre o mesmo e dos recursos de enfrentamento que esse idoso tem disponíveis. Dentre esses recursos de enfrentamento, podemos citar: os recursos físicos, 113 psicológicos, socioeconômicos e os recursos fornecidos pelo ambiente. Os recursos físicos são proporcionados pela preservação da saúde, aptidão e funcionalidade físicas. Idosos sedentários têm suas respostas às exigências de movimento diminuídas, seja por doenças, seja por limitação de sua capacidade funcional. O que, conseqüentemente, os torna dependentes de terceiros, conduzindo-os à sensação de aprisionamento dentro do próprio corpo. Os recursos psicológicos referem-se às crenças que o idoso tem sobre suas capacidades e às suas crenças religiosas. As primeiras dizem respeito à maneira como o idoso enxerga a sua realidade e como se posiciona diante dela. Ou seja, se o idoso se julga competente para resolver uma determinada situação que vivencia, ele consegue avaliar o evento com mais segurança e tranqüilidade e, assim, persiste para resolvê-lo. As segundas dizem respeito à fé religiosa (que parece aumentar na velhice) e às crenças existenciais, que permitem dar sentido à vida e manter a esperança em situações difíceis. Os recursos socioeconômicos relacionam-se com as condições nas quais o idoso vive. A condição socioeconômica permite ao idoso o acesso à moradia, transporte, atividade laborativa, ocupacional e de lazer; acesso à educação, à assistência médica, jurídica, social e financeira. Por fim, os recursos fornecidos pelo ambiente são aqueles que permitem uma adaptação às limitações físicas próprias do indivíduo idoso, de maneira que ele possa manter suas competências comportamentais. O ambiente que não favorece liberdade e segurança para que o indivíduo idoso se mantenha ativo, se torna propício a estados depressivos, além de fornecer riscos à integridade física como, por exemplo, os acidentes domésticos e as quedas. Além desses recursos de enfrentamento, o apoio social, familiar e a rede de amigos é importante para trazer ao idoso sentimentos de segurança, afeto e valorização, contribuindo para seu bem estar subjetivo (AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005). Em um estudo sobre o idoso e suas condições de saúde e de vida no Brasil, Anderson (1998) nos revela que existe uma alta prevalência de morbidades crônicodegenerativas nessa população. A autora também sugere que há uma associação de variáveis psicossociais com esse perfil de morbidade, destacando alguns fatores, como depressão, nervosismo, o fato de morar sozinho e a baixa renda per capita. Esses achados nos sugerem que no Brasil não existem muitos recursos de enfrentamento disponíveis para os idosos. E se não há uma adaptação adequada do idoso às demandas do processo de envelhecimento, alterações psicológicas diversas, como estados depressivos e estresse, podem ser desencadeadas. Tais alterações geram 114 um impacto negativo sobre a qualidade de vida dos idosos, podendo precipitar eventos cardíacos, contribuindo para o aumento da morbimortalidade dessa população. Considerando os recursos físicos como uma estratégia de enfrentamento para a velhice, descreveremos, a seguir, os benefícios da atividade física nessa etapa da vida. 5.4 Efeitos Benéficos do Exercício Físico para o Idoso A população geriátrica seria a maior beneficiária da prática regular de atividades físicas. Contudo, é nessa população que se encontra o maior número de indivíduos sedentários. Um grande número de idosos possui capacidade funcional tão comprometida, que fica impedido até mesmo de realizar suas tarefas habituais com bom desempenho (SALVIOLI NETO et al, 1996). Entretanto, apesar de possuírem níveis baixos de condicionamento físico e necessitarem de maior tempo de adaptação ao exercício, os idosos conseguem obter, através do condicionamento físico, benefícios similares àqueles obtidos por indivíduos mais jovens (SALVIOLI NETO et al, 1996). Faremos, a seguir, uma exposição sobre tais benefícios. Benefícios Cardiovasculares Os efeitos benéficos do condicionamento físico sobre o sistema cardiovascular dependem da regularidade, da intensidade e do tempo de treinamento (QUADRO 4). Tais efeitos iniciam-se entre 12 a 14 semanas de treinos regulares, com aumento de cerca de 40% no VO2máx e na capacidade máxima de trabalho, em idosos de ambos os sexos. Esses benefícios dependem dos níveis prévios de condicionamento e do protocolo de treinamento adotado (SALVIOLI NETO et al, 1996). Redução da freqüência cardíaca Redução dos níveis pressóricos Redução do lactato sangüíneo Elevação do limiar anaeróbio Aumento do consumo de oxigênio Melhora da recuperação cardiovascular Maior duração no esforço submáximo Quadro 4: Efeitos cardiovasculares do treinamento a longo prazo Fonte: SALVIOLI NETO et al, 1996 Em nível periférico, ocorre um incremento significativo dos capilares sangüíneos e das enzimas aeróbicas na musculatura esquelética, com preservação do 115 tamanho e do número das mitocôndrias, aumentando a capacidade oxidativa do tecido muscular (SALVIOLI NETO et al, 1996). Benefícios Respiratórios O treinamento físico de baixa intensidade está associado a valores de capacidade vital, capacidade pulmonar total, ventilação voluntária máxima, dentre outras medidas de função pulmonar, maiores que o previsto para a idade e altura e também maiores do que valores de indivíduos sedentários saudáveis. Esses achados indicam que o exercício físico regular retarda o declínio da função pulmonar associado ao envelhecimento, interferindo de maneira positiva na redução da capacidade física (AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005). Benefícios Musculoesqueléticos O treinamento físico causa um aumento da densidade óssea, da flexibilidade e amplitude de movimentos (simples e aprimorados), do tônus e da força musculares e melhora da coordenação motora e do equilíbrio. Dessa maneira, atua prevenindo a osteoporose e a sarcopenia (atrofia e fraqueza musculares) e, conseqüentemente, reduz os riscos de fraturas, lesões articulares e quedas (LEITE, 1996; AZEVEDO, Luciene; ALONSO; OKUMA, 2005; FLECK; KRAEMER, 2006). Benefícios sobre o metabolismo O exercício atua sobre o metabolismo lipídico, resultando na redução das taxas de colesterol total e da fração LDL, assim como na elevação da fração HDL. Também contribui para redução da resistência à utilização da insulina, colaborando no controle do diabete melito (SALVIOLI NETO et al, 1996). Benefícios Psicológicos Os efeitos do exercício sobre a dinâmica psíquica do idoso incluem principalmente: melhora do humor, redução da ansiedade e aumento da motivação. A atividade física de baixa a moderada intensidade desempenha importante papel para a saúde mental, como a prevenção ou mesmo tratamento de quadros depressivos. Em indivíduos adultos jovens, o aumento da produção de endorfinas está relacionado a 116 esses efeitos. No entanto, o mecanismo pelo qual eles ocorrem nos idosos ainda não está bem esclarecido, sugerindo pesquisas nesse campo (SALVIOLI NETO et al, 1996). Até aqui, entendemos que o envelhecimento é um processo complexo e que, por isso, determina modificações profundas na estrutura biopsicossocial do indivíduo. Certamente o avanço da idade também traz consigo uma reformulação da escala de valores do indivíduo e das suas atitudes frente à vida. Somados a esses fatores “normais” do envelhecimento, qual seria o impacto de uma CRVM sobre o idoso? As especulações sobre essa pergunta foram responsáveis pelo nosso próximo assunto. 5.5 O Impacto da CRVM sobre o Idoso A velhice é um termo impreciso, e sua realidade, difícil de perceber. Quando uma pessoa se torna velha? Aos 60, 70 ou 80 anos? Nada flutua mais do que os limites da velhice, em termos de complexidade fisiológica, psicológica e social. Uma pessoa é tão velha quanto suas artérias, seu cérebro, seu coração? Sua estética, seus valores morais, sua situação civil, sexual ou econômica? Ou é a maneira pela qual a pessoa passa a encarar essas características que a classifica como velha? Como vimos, algumas características inerentes ao processo de envelhecimento de fato existem e, portanto, podem determinar sentidos subjetivos mais comumente identificáveis nessa etapa da vida do indivíduo. Segundo Jorge (1995) e Rozestraten (1998), o indivíduo idoso tende a ser portador de uma bagagem emocional que possui relação íntima com a história da sua saúde, pois, nessa fase da vida, os ganhos passam despercebidos e as perdas são mais visíveis, não se estabelece mais um alvo de realização e o idoso tem consciência de que está mais próximo da morte. De acordo com as teorias explicativas para o envelhecimento, as mudanças físicas levam o indivíduo a confrontar-se com uma nova imagem corporal. Ademais, existem determinadas circunstâncias na vida que podem focar atenção nas alterações físicas, potencializando uma situação de doença e/ou um declínio psicológico (BRONLEY apud AGOSTINHO, 2004). Considerando essas observações, o adoecimento do coração passa a ser algo que exerce forte influência sobre o dinamismo psíquico do idoso. O coração doente pode significar ameaça física e ameaça de morte. Nesse sentido, relaciona-se a perdas, que 117 podem se sobrepor às outras restrições do processo de envelhecimento, causando ao idoso maior propensão a quadros depressivos e/ou ansiógenos (RUSCHEL, 1994; CARVALHO, Maria, 2001). A CRVM nem sempre se constitui na primeira opção de tratamento ao doente coronariano, porém, na maioria das vezes, ela surge como o único recurso no decorrer da doença, tornando-se, portanto, inevitável (CÔRTE, 1998). Uma vez a CRVM sendo indicada, o contexto que a envolve é atravessado por fantasias, expectativas, medos e questionamento de valores. De acordo com Côrte: A cirurgia cardíaca gera, inevitavelmente, insegurança e ansiedade. As fantasias em relação à operação, os procedimentos invasivos, como abrir o peito, a circulação extra-corpórea, o medo da anestesia, do CTI e o medo da morte são algumas das ansiedades que atormentam o paciente. Tudo isto deixa o indivíduo vulnerável diante da limitação e da morte. O paciente sente-se atingido em seu corpo e em sua estima. A identidade fica abalada diante da perda do controle sobre si mesmo. O sentimento de perda e de fracasso existencial gera reações psicológicas comuns no aparecimento da doença, como ansiedade, depressão, regressão e negação. Quanto mais vulnerável o paciente se sentir, mais ansioso e deprimido ficará e uma série de mecanismos de defesa serão acionados, como reação à ruptura do equilíbrio físico e psíquico (CÔRTE, 1998, p. 34, grifo nosso). Romano revela que a cirurgia também pode significar um processo de cura e recuperação, simbolizando a ressurreição: Por mais que os procedimentos técnicos tenham avançado, as fantasias a respeito desse órgão único e centralizador não se amenizam e o ato cirúrgico assume a dimensão de renascimento, ressuscitação. E renascer tem um sentido mais amplo do que voltar da morte – é começar uma vida nova, livre dos defeitos anteriores, uma outra chance, com novos valores e propósitos de vida (ROMANO, 1998, p. 257). Constatada a sobrevivência após a cirurgia, as diferentes reações que os pacientes desenvolvem também dependem do ritmo de vida ao qual estiveram habituados. Existem indivíduos que não conseguem ficar parados, por já estarem acostumados a uma vida mais ativa. Geralmente essas pessoas negam a fragilidade do seu estado, mostrando-se fortes e preparados para retomar a vida cotidiana. Outros mais passivos e retraídos revelam-se muito dependentes, utilizando a doença como um artifício para atrair especial atenção dos familiares ou amigos. Há aqueles que experimentam uma situação de revolta, por já terem trabalhado arduamente durante a vida toda e, no momento de atingirem a sua “recompensa”, ou seja, o “descanso dos justos”, acabam sucumbindo à doença. Um outro tipo de comportamento também relatado é uma atitude de indiferença, ou seja, alguns pacientes encaram a cirurgia como 118 uma mera banalidade, assumindo uma posição de descaso com o próprio tratamento. Há ainda aqueles pacientes que se vêem diante da oportunidade de repensarem suas vidas e são capazes de propor e empreender mudanças nas mesmas (CÔRTE, 1998; ROMANO, 1998). Portanto, as atitudes assumidas pelos idosos diante da CRVM irão depender também do sistema de valores no qual estão inseridos. Conforme já mencionamos, é a partir desse sistema de valores que o indivíduo faz suas reflexões subjetivas e consegue ou não identificar as possibilidades para encontrar sentido para a vida. Com o intuito de contornarmos o horizonte do nosso estudo junto à teoria referencial frankliana, dedicaremos o próximo capítulo à questão do sentido da vida. Faremos, inicialmente, um breve apanhado geral sobre o sentido e, em seguida, uma revisão dos seus conceitos, em Viktor Emil Frankl. 119 6 SOBRE O SENTIDO DA VIDA 6.1 A Questão Geral do Sentido Desde épocas mais remotas até a mais atual, a humanidade vem percorrendo um longo caminho à procura de uma revelação para o sentido da vida. Uma das tentativas do ser humano para tal revelação ocorre através da criação do mito58. Pelo mito, o homem tenta descobrir a origem dos seres, planetas, fenômenos naturais, sentimentos, emoções e da sua própria gênese (BRANDÃO, 1992). O mito de Asclépio fornece uma ilustração da busca incessante do homem por um sentido para sua existência. Asclépio é uma palavra de etimologia desconhecida, porém, foi designada para o filho gerado pelo Deus Apolo e a mortal Corônis. Temendo ser abandonada na velhice por Apolo e ainda estando grávida de um filho dele, Corônis uniu-se a Ísquis. Sentindo-se ultrajado pela traição, Apolo matou Ísquis e pediu a seu irmão Ártemis que liquidasse Corônis, a qual foi morta a flechadas (BRANDÃO, 1992). Asclépio era um herói e um Deus que, provavelmente, viveu no século XIII a.C., em Epidauro, uma cidade onde a Medicina era mágica. O desenvolvimento dessa Medicina serviu como berço para outra bem mais científica, nas mãos dos descendentes de Asclépio, um deles, Hipócrates59 (BRANDÃO, 1992). Asclépio, um herói que virou Deus, participa da natureza humana e divina. Simboliza a união coesa e a intersecção entre ambas. Enquanto Deus, Asclépio era cultuado no Templo e recebia oferendas. Enquanto herói, o seu culto era secreto e ocorria em um edifício de Epidauro chamado Thólos60, onde Brandão nos revela que: [...] provavelmente era “guardada” a serpente, réptil detentor para os antigos do dom da adivinhação, por ser ctônica, e que simbolizava a vida que renasce e se renova ininterruptamente, pois, como é sabido, a serpente enrolada num 58 Mito: “Narrativa de eventos ocorridos em um passado fabuloso e primordial, relacionada a seres dotados de poderes mágicos, superiores aos dos homens, como os deuses, os heróis ou os antepassados, a qual recria simbolicamente a realidade vivida pelos homens e intervém como mediadora normativa e explicativa desta mesma realidade [...].” (NASCENTES, 1976, v. 4, p. 1100) 59 Hipócrates: “Famoso médico grego nascido na ilha de Cós. Segundo a tradição estudou Medicina no Asclepieion de Cós e ainda em Cnido, Tessália, Egito e Cítia. [...] Aristóteles chamou-o de ‘Hipócrates, O Grande’. Para Galeno foi o ‘legislador da Medicina, o médico ideal, que com pureza e santidade viveu sua vida e praticou sua arte’.” (BENTON, v. 7, p. 312, 1972, grifo do autor) 60 Thólos: “edifício abobadado, rotunda” (BRANDÃO, p. 92, 1992). 120 bastão era o atributo do deus da medicina. (BRANDÃO, 1992, p. 91, grifo do autor) Asclépio era o Deus da nooterapia, ou seja, da cura pela mente. À entrada de seu majestoso Templo, havia uma mensagem gravada que sintetizava suas incríveis curas: “Puro deve ser aquele que entra no Templo perfumado. E pureza significa ter pensamentos sadios” (BRANDÃO, p. 91, 1992, grifo do autor). Em Epidauro, a cura pela mente precedia a cura total do corpo. Para que houvesse cura, deveria haver a metanóia, ou seja, a transformação dos sentimentos, segundo Brandão: Dado que as causas das doenças eram principalmente mentais, o método terapêutico era essencialmente espiritual, daí a importância atribuída à nooterapia, que purifica e reforma psíquica e fisicamente o homem inteiro. Procurava-se, a todo custo, através do gnôthi s’autón (conhece-te a ti mesmo) que o homem “acordasse” para sua identidade real. (BRANDÃO, 1992, p. 92, grifos do autor) O homem, em sua busca desesperada pelo sentido da vida, atordoava seus pensamentos, seus sentidos, seu espírito e adoecia. Ao Deus-herói Asclépio e a sua medicina mágica cabiam a reforma da mente e do espírito e, assim, o restabelecimento do corpo. A cura não era efetuada por medicamentos, mas pela intervenção divina e pela metanóia. Tais técnicas foram aprimoradas pelos sacerdotes de Asclépio, os quais fizeram grandes progressos nos campos da psicossomática e da nooterapia (BRANDÃO, 1992). Nesse sentido, Brandão nos revela: Ao que parece, partiam eles do princípio de que a Harmonia e a Ordem divina exercem influência decisiva sobre a saúde psíquica e corporal. Recomendavam sempre aos doentes que “pensassem santamente”, por isso estavam convencidos de que, quando nossa consciência se mantém em estado de pureza e harmonia, o físico torna-se, necessariamente, são e equilibrado. Não é outra coisa senão o que prega Platão em seu banquete (186 d.) pelos lábios do médico-filósofo Erixímaco. Era, portanto, o equilíbrio biopsíquico o fator básico, o medicamento de uma cura irreversível! (BRANDÃO, 1992, p. 92) Por isso os sonhos eram importantes. Estes eram manifestações do divino, onde Asclépio visitava os doentes que adormeciam no Santuário de Epidauro e tocava suas partes enfermas. Os sonhos eram então interpretados pelos sacerdotes, os quais decifravam a receita para a cura (BRANDÃO, 1992). Outras formas de cura surgiram com o tempo e fizeram seus milagres, dentre elas a cura por meio de ervas e cirurgias. No entanto, a cura total somente acontecia por meio da transformação dos sentimentos (BRANDÃO, 1992). 121 Uma das formas de se alcançar a transformação dos sentimentos é através do seu estudo, do estudo das idéias e de seus determinantes, ou seja, do estudo do espírito humano, e foi a isso que a Psicoterapia frankliana mais se dedicou, conforme veremos a seguir. 6.2 A Questão do Sentido em Frankl Viktor Emil Frankl (1905-1997) foi um psiquiatra e psicoterapeuta austríaco, que desenvolveu uma técnica terapêutica centrada no sentido, a Logoterapia, também chamada de Terceira Escola Vienense de Psicoterapia (a primeira é a Psicanálise de Freud e a segunda é a Psicologia Individual de Adler) (ALLPORT, 1984; RODRIGUES, 1991). Desde o tempo de sua mocidade, Frankl tentou achar e tirar sentido de todos os eventos da vida. Não importava a ele a vida apenas no seu sentido mais comum. Para ele, há um significado em cada momento. Significado esse que não pode ser adquirido por meios simples, racionais, mas sim, através de meios existenciais. Frankl apresentanos que há um sentido supremo no mundo, em lugar de um supremo sem sentido. Um sentido tão rico, que não pode ser completamente apreendido pela finita capacidade intelectual (MOREIRA et al, 2004). A Logoterapia originou-se na cidade de Viena, nas décadas de 1920 e 1930. Frankl descobriu que as pessoas, especialmente os jovens, que atuaram na Primeira Guerra Mundial na Europa estavam terrivelmente traumatizados pela destruição causada. Observou que tais indivíduos só poderiam recuperar-se psicologicamente dos danos quando se empenhassem na busca de um sentido para a vida. Então, Frankl se desligou das escolas freudiana e adleriana e procurou recursos no chamado Movimento Existencial de Psiquiatria ou Escola Existencial que, já na época, estava em grande progresso na Europa. Ali Frankl aprendeu a “orientação filosófica” que estuda a “dimensão espiritual ou noética” do homem e observou que a pessoa pode “ek-sistir”, ou seja, sair de si e refletir sobre o seu próprio “ser” (MOREIRA et al, 2004). Frankl visualizou que o homem não é somente dirigido ou impulsionado por uma dimensão biopsicológica, mas também existe uma dimensão espiritual, que o leva a buscar o sentido e a realizar seus valores. Valores que já estão no mundo e se distribuem nas áreas do trabalho ou da criatividade, do amor ou das vivências, dos sofrimentos ou 122 de uma atitude face aos condicionamentos do mundo. Assim, para Frankl, a dimensão espiritual ou noética é a mais autêntica qualidade do homem, é o verdadeiro conteúdo do “ser” e a verdadeira qualidade que o diferencia dos outros seres vivos (MOREIRA et al, 2004). No final dos anos 1920, Frankl fundou a escola do sentido da vida, que, no início, (devido às suas origens na Escola Existencial de Psiquiatria) passou a chamar-se de Análise Existencial. Na década de 1930, com sua ampla, casuística clínica, Frankl desenvolveu a sua Análise Existencial, fundando, então, a Logoterapia. Até o ano de 1941, Frankl já tinha completado, praticamente, todos os postulados de sua Escola de Análise Existencial/Logoterapia. No entanto, foi após essa época, ao ser prisioneiro por cerca de três anos consecutivos, em vários campos de concentração nazistas (inclusive Auschwitz) espalhados pela Europa (durante a Segunda Guerra Mundial), que Frankl complementou e enriqueceu a sua obra. Foi após a sua libertação que Frankl escreveu a maioria dos seus inúmeros livros e artigos sobre Logoterapia. Sua Escola introduziu na Psiquiatria e na Psicoterapia uma nova atitude terapêutica, onde também a dimensão espiritual do homem é considerada e não somente as dimensões psíquicas, biológicas e sociais (MOREIRA et al, 2004). Nos campos de concentração, Frankl observou que os prisioneiros mais aptos a sobreviver eram os que estavam voltados para o futuro, para uma tarefa, um objetivo a ser realizado ou para uma pessoa que os esperava. Foi também a partir de sua própria experimentação pessoal enquanto prisioneiro que Frankl pôde defrontar-se com o sofrimento humano e, conseqüentemente, com o homem que emerge a partir de (que transcende) tal sofrimento. Assim, Frankl, no intuito de poder ajudar as pessoas a alcançar essa capacidade de transcendência exclusiva dos humanos, desenvolveu a Logoterapia, que tem como tema básico o sentido da vida (ALLPORT, 1984). A esse respeito, Frankl nos diz: Tão logo a existência humana deixa de se transcender, o permanecer em vida se torna sem sentido e impossível. Foi pelo menos a lição que me coube aprender em três anos passados em Auschwitz e Dachau, e os psiquiatras militares em todo mundo puderam verificar que os prisioneiros mais aptos a suportar o cativeiro eram os que tinham algo por que esperar, um objetivo no futuro, um sentido a realizar. Isso não deve também ser válido para a humanidade e sua sobrevivência? (FRANKL, 1978, p. 52) Frankl (1978) diz que o homem é na verdade voltado para a realização do sentido, essa é a motivação primária de sua vida, sendo que a busca de prazer ou o 123 anseio pelo poder são modalidades secundárias e deficientes dessa inclinação primária do homem: Quando o homem se concentra exclusivamente no produto secundário: “prazer” e quando se limita ao meio para conquistar um fim denominado “poder”? Bem, a reposta é que isso acontece quando a vontade de sentido é frustrada; em outras palavras, o princípio de prazer, bem como a ambição de mando representam uma motivação neurótica. Daí Freud e Adler, que elaboraram suas teorias inspirados nos neuróticos, terem errado na descrição das tendências do ser humano. (FRANKL, 1978, p. 14) Para Frankl, o sentido da vida é algo que deve ser encontrado, ele não pode ser dado ou criado. E, basicamente, existem três formas onde se pode encontrar o sentido: no trabalho, no amor e na dor: “De acordo com a Logoterapia, podemos descobrir este sentido da vida de três diferentes formas: 1. criando um trabalho ou praticando um ato; 2. experimentando algo ou encontrando alguém; 3. pela atitude que tomamos em relação ao sofrimento inevitável.” (FRANKL, 2005, p. 100) A auto-realização ou a satisfação de si mesmo acontece somente na medida em que o homem realizar o sentido e efetivar o valor, que é uma maneira de se realizar e de se afirmar como ser humano. Nas palavras de Frankl: Sempre que realizamos valores, estamos cumprindo o sentido da existência, estamos impregnando-a de sentido. Os valores podem ser realizados de três modos distintos: criando algo, o mundo, por exemplo; experimentando algo, como seja, abrindo-nos para o mundo, para a beleza e a verdade da vida; finalmente, sofrendo, sofrendo a existência, o destino. (FRANKL, 1978, p. 235) Frankl (1989), portanto, denomina três categorias de valores que podem conferir significado à existência. A primeira são os valores criadores, ou seja, aqueles que se realizam mediante um ato criador, pela ação do homem sobre o mundo, sobre a realidade. A segunda categoria se refere àqueles valores chamados por ele de vivenciais, que se realizam mediante a acolhida do mundo, na entrega à beleza da natureza ou da arte ou na entrega ao outro. E a terceira categoria de valores são os de atitude, ou seja, a postura que se toma diante de um destino imutável, a posição assumida diante do sofrimento. Atitude essa que se refere à manutenção da dignidade frente à ruína e o malogro. Quem nos orienta na busca pelo sentido, ou seja, na realização de valores é a consciência. A consciência é definida por Frankl como a capacidade de despertar o sentido único que se origina de cada situação vivenciada, “Em síntese, a consciência é um órgão de sentido” (FRANKL, 1990a, p. 18-19). É a consciência que nos revela o 124 sentido, que, para a Logoterapia, é a peça-chave da existência. O exercício da consciência requer que sejamos livres, porém, responsáveis pelas nossas atitudes e escolhas no mundo. Dessa maneira, Frankl nos orienta: Vivemos numa época em que predomina um sentido difuso de que a vida carece de sentido. Cumpre, portanto, que a educação não se limite a transmitir conhecimentos, mas contribua para o aprimoramento da consciência, de forma que o homem alcance uma sensibilidade suficientemente apurada para captar as exigências inerentes a cada situação. Numa época em que os Dez Mandamentos parecem ter perdido o valor para muita gente, o homem deve estar apto a aprender os Dez Mil mandamentos que estão inscritos em código nas dez mil situações que enfrenta [...] Ouso prever que cedo ou tarde se apossará do homem contemporâneo um novo senso de responsabilidade, do qual a onda de contestação que varre o mundo já é um prenúncio. Cumpre não esquecer, todavia, que muitos dos protestos, como as demonstrações hostis às experiências atômicas, são meramente “contra” e não oferecem uma alternativa construtiva. A liberdade que se exerce arbitrariamente provoca degenerescência e destruição; deve, portanto, ser complementada pelo senso de responsabilidade (FRANKL, 1978, p. 2021). Vale relembrar o que Frankl (1978) ainda nos alerta sobre a consciência, ou seja, que a mesma pode nos induzir a tomar caminhos errados, e que, portanto, devemos considerar a consciência do outro. No entanto, respeitar a consciência do outro não é identificar-se como ela (conformismo) e nem obedecer a ela (totalitarismo). Se isso ocorre, o vazio existencial se instala. O remédio é desenvolver uma sensibilidade mais atenta às diferentes situações da vida, procurando os sentidos singulares que cada uma dessas situações desvela. A fim de aproximarmos a teoria de Frankl ao tema do nosso estudo, faremos uma pequena analogia entre consciência e coração. 6.3 O Coração/Consciência como Órgão de Sentido Segundo Ramos, a etimologia da palavra "coração", como símbolo, traduz a sua universalidade: A raiz indo-européia krd ou kered deriva de kardia, em grego; que se desenvolve para cardíaco, cardiograma, endocárdio, pericárdio e outros termos médicos. Cor, em latim, desenvolve-se para cordial, acordar, discordar, recordar, recurso, coragem e misericórdia. Sua terminação pelo sufixo aumentativo traz a idéia de reforço. Muitas autoridades associam "credo" com esta raiz latina cor, que deriva também para credencial, acreditar, crédito, credulidade, recrear etc. E, finalmente, heorte, em anglosaxão, que se desenvolve para heart, hearten, hearty, heartless etc.[...] Podemos concluir, do acima exposto, que a raiz krd expressa principalmente 125 a idéia de centro, reforçada, em português, pelo sufixo ção. A expressão desse centro aparece claramente em caroço/coroço. Seus derivados também indicam formas de conhecimento, como nas palavras: credo, acreditar e crédito; ou de comportamento, como em cordialidade e misericórdia. Lembrar com o coração é decorar ou recordar. Brigar com ousadia e intrepidez é brigar junto com ele, isto é, com coragem. Ficar sem ele é ficar descorçoado, sem centro e sem direção. Chegar a soluções conjuntas é unir os corações, como em concordar, chegar a um acordo. Ser prudente ou sensato é ser cordato, assim como resolver ou recobrar os sentidos é acordar. (RAMOS, Denise, 1990, p. 53-55) Nesse sentido, por vezes, o coração é tomado como o lugar da consciência. Há referências que ilustram esse fato desde os Egípcios até a Sagrada Escritura Bíblica. Ramos expõe que “o coração é um símbolo fundamental na cultura e na religião egípcias. Está presente nas orações, nos mitos de criação e nos rituais funerários como centro da vida, lugar da inteligência, da vontade e da consciência moral” (RAMOS Denise, 1990, p. 65). Segundo o Bispo Dom Alexander Mileant (1998), a consciência na Sagrada Escritura é chamada de coração. O Arcebispo Dom Walmor Oliveira de Azevedo, também nos revela: Entre as diversas acepções para definir o termo consciência se inclui, então, o sentido de coração. Por isso, esta polivalência do sentido de consciência hospeda tudo o que diz respeito ao sentido dado ao coração, incluindo o sentido de mente e alma também. (AZEVEDO, Dom Walmor, 2006, grifo nosso) Aprofundando-se nessa analogia, Gaiarsa citado por Ramos observa que “a primeira marca da individualidade que pode de algum modo ser sentida pelo feto é o início da função cardíaca” (RAMOS, 1990, p. 107). Ramos complementa dizendo que “a vida é pulsação, movimento, sentidos primeiramente no coração e depois na respiração. O coração, assim, desde o início da vida tem uma posição única no desenvolvimento da consciência” (RAMOS, 1990, p. 108). Portanto, simbolicamente, o locus da consciência também pode ser o coração. Dessa maneira, o coração cumpre um papel como órgão de sentido, na medida em que, através das sensações que produz, ele possibilita encontros com a existência. O coração é assim um órgão vital, centro gerador da vida e sede simbólica da consciência. Ao “mexer no coração”, a CRVM toca também todo o construto psíquico do sujeito e o faz produzir sentidos subjetivos ligados a sua existência no mundo. Nesse momento, concluímos a pesquisa teórica deste estudo. Os fundamentos estudados servirão como guia para a análise das entrevistas que se segue. 126 7 ANÁLISE DAS ENTREVISTAS Para designar o paciente e as outras pessoas envolvidas nos discursos das duas entrevistas foram utilizados nomes fictícios. Assim, para o paciente em questão usamos o nome Geraldo. Para seu filho mais velho o nome Bernardo. Para sua esposa usamos Leda e para sua filha o nome Júlia. Por fim, para os médicos aos quais o paciente se refere usamos as letras X e Y. O Senhor Geraldo tem 64 anos e é casado. Tem dois filhos, uma filha e uma neta. Reside no município de Sete Lagoas-MG, mas, nos finais de semana, vem para Belo Horizonte, onde também possui uma casa. Tem uma renda mensal que varia de 8 a 10 salários mínimos. Foi analista químico da USIMINAS, representante comercial e, há 16 anos, trabalha como empresário, ou seja, é dono de uma loja de calçados na cidade de Sete Lagoas. Está aposentado pelo INSS há 10 anos. Possui a esposa como dependente e a filha, que ele define como parcialmente dependente. Aponta sua orientação religiosa como Católica e, quanto à escolaridade, informa ter segundo grau completo e curso técnico de torneiro mecânico. A filha do Sr. Geraldo, por coincidência, também é fisioterapeuta, no entanto, não exerce a profissão. Ela trabalha na loja de calçados com o pai. Ele conta que a história da sua doença cardíaca começou há 8 anos, quando teve um infarto do miocárdio. Na época, o Senhor Geraldo fez uma angioplastia com colocação de um stent, no Hospital Luxemburgo. No dia 26 de fevereiro deste ano de 2008, na cidade de Sete Lagoas-MG, ele sentiu uma forte dor no braço e foi para o Hospital Belo Horizonte. Nesse hospital, que fica em Belo Horizonte-MG, o Sr. Geraldo permaneceu 4 dias no CTI, com a suspeita de ter tido um novo infarto agudo do miocárdio. Após a alta do CTI do Hospital Belo Horizonte, já no segundo dia em que estava no leito de internação, o Senhor Geraldo foi submetido a um cateterismo, que confirmou o infarto e revelou importantes obstruções coronarianas. No dia 06 de março de 2008, o Senhor Geraldo foi transferido para o Hospital Vera Cruz, seu caso foi estudado e foi indicada a cirurgia de revascularização do miocárdio. No dia 10 de março de 2008, o Senhor Geraldo foi submetido a uma CRVM. Foram feitas quatro pontes de veia safena e uma ponte de artéria mamária. Ele permaneceu no CTI por 2 dias e na Unidade de Internação por mais 8 dias. Não teve complicações pós-operatórias. 127 Recebeu alta hospitalar em 20 de março de 2008 e preferiu ficar em Belo Horizonte por mais 40 dias. Sendo assim, no dia 24 de março de 2008, 14 dias após a cirurgia, foi realizada, em Belo Horizonte, a primeira entrevista com o Senhor Geraldo. A segunda entrevista foi realizada também em Belo Horizonte, no dia 12 de julho de 2008, ou seja, 3 meses e 18 dias após a primeira entrevista e cerca de 4 meses após a cirurgia. Foram necessárias ainda mais duas conversas por telefone com o paciente, para o esclarecimento de alguns dados da entrevista. Numa dessas conversas, a Júlia atendeu ao telefone. Quando me identifiquei, ela mencionou que já havia orientado o pai quanto à importância de ingressar num programa de Reabilitação Cardíaca. No entanto, disse que o Sr. Geraldo não havia dado importância para a recomendação. Analisamos as entrevistas conforme as categorias formadoras de sentido da teoria frankliana, ou seja, o trabalho, o outro (amor/religião), o sofrimento. A categoria corpo, em Frankl (1978), surge como uma dimensão psicofísica aliada ao espírito. Cabe ressaltar que o corpo não é um foco de estudo na teoria de Frankl, mas abre-nos espaços para construções. Procuramos vincular essas categorias aos aspectos da Pós-modernidade circunscritos em Frankl e que foram descritos no Capítulo 3. Deixamos claro que a divisão por categorias é apenas uma forma didática facilitadora da análise, pois o ser humano em Frankl é uma síntese de todas as suas dimensões: física/biológica, psíquica, social e espiritual. 7.1 A Primeira Entrevista O Trabalho Ao perguntar para o Sr. Geraldo qual o motivo que ele atribui ao seu adoecimento, ele responde: Agora eu a... acredito que pode ser a situa... a situação, né? De, de, de, de... excesso de trabalho, excesso de preocupação porque o comércio é muito estressante, né? E veja bem, eu fiquei 23 anos como representante... é estressante.... e 16 anos dentro de uma loja é estressante e meio, então eu acredito que isso tudo foi acumulando, né? Até formar um poblema sério lá na frente. 128 Para Frankl (1978/1989), o trabalho pode representar uma forma de busca de sentido, na medida em que oferece a possibilidade de concretização da escolha responsável, a qual realiza a existência, ou seja, efetiva o caráter de algo único para cada existência humana. Frankl (1989, p. 159) revela: “a consciência da responsabilidade se desenvolve sobretudo ao basear-se na consciência de uma tarefa concreta e pessoal, isto é, de uma missão.” A realização da missão pode ter sua consumação concreta no trabalho. No entanto, o autor adverte que o trabalho também pode ser usado de forma abusiva, especialmente nos dias atuais de capitalismo sem limites. O homem passa a ser apenas o “homem do trabalho”. Ele perde a possibilidade de realizar a sua existência, apenas executa tarefas mecanicamente em busca de dinheiro para o consumo desenfreado. O trabalho em excesso pode levar a uma sobrecarga física e emocional causadora de estresse. Quando perguntamos ao Sr. Geraldo se ele acha que o estresse estaria envolvido com sua doença ele diz: ANSIEDADE! ... porque se eu for falar muito aqui eu acho que essa fita vai ser pouca. Nós... Nós vamos partir pra política. Que segurança que eu tenho no país? Depois de trabalhar, trabalho desde 8 anos de idade, eu tenho 64, trabalho há 57 anos e não vejo a possibilidade de ficar dentro de casa vendo uma televisão... e nem agora! Tô só esperando melhorar é LÓGICO meu pique de trabalho vai ter que diferen...ser diferenciado, mas falar PAROU eu não vejo essa possibilidade... tenho que continuar de uma forma ou de outra... administrando meus negócio. O Sr. Geraldo parece revoltado e não mostra satisfação ou realização em executar seu trabalho. Para ele, o excesso de trabalho parece ser devido às condições precárias de suporte ao idoso que o Brasil apresenta. De fato, Anderson (1998) revela que, no Brasil, o trabalho em idades mais avançadas serve para manter a subsistência. Entretanto, o Sr. Geraldo manifesta também a intenção de reduzir “o pique de trabalho”: “Eu imagino que ela (a vida) vai ser um pouco mais regrada, né? Com relação a trabalho.” Tal intenção pode indicar que não existe a real necessidade de se trabalhar tanto e que, na verdade, o trabalho pode estar sendo utilizado como uma válvula de escape para a falta de sentido (o vazio existencial) em sua vida. Diante do impacto da CRVM, a qual atesta e comprova a sua doença, a redução do ritmo de trabalho surge como uma imposição e não como uma alternativa. Foi preciso passar pelo trauma da cirurgia, para que o Sr. Geraldo viesse a refletir que o excesso de trabalho pode ter sido um dos fatores de seu adoecimento. Porém, a carência 129 de sentido não chega a ser percebida pelo Sr. Geraldo como um dos fatores envolvidos com o trabalho em excesso. O Sofrimento Quando questionado sobre como está se sentido após a CRVM e se tinha algum temor, o Sr. Geraldo diz: Fisicamente muito bem. Agora a parte emocional funciona muito, né?A gente fica na...naquela expectativa, né? Será que vai dar certo? Até quando? Porque como eu disse há pouco, eu ainda não tenho condição de... de esperar a banda passar, eu tenho que tá no meio da banda... infelizmente... Não, medo eu sempre tive.... de ficar.... preso numa cama, né? Sem poder... ajudar nada, precisando de ajuda de outro. Enquanto tem gente que fala: Ah! eu tenho medo de morrer! Jamais passou isso pela minha cabeça! Então eu acho que a morte é o fim de alguma coisa aqui na terra, né? Agora quanto a.... a outra questão... a gente tem esperança que...essa operação vai... ela parece que foi bem sucedida....que ela ainda vai me dar um pedaço de tempo para poder concluir uma parte do sonho, né? Porque 64 anos você ainda tá sonhando. Frankl nos revela que também podemos encontrar sentido na vida quando nos deparamos com uma fatalidade que não pode ser mudada ou evitada. Segundo o autor, diante do sofrimento, o que importa é: [...] dar testemunho do potencial especificamente humano no que ele tem de mais elevado, e que consiste em transformar uma tragédia pessoal num triunfo, em converter nosso sofrimento numa conquista humana. Quando já não somos capazes de mudar uma situação – podemos pensar numa doença incurável, como um câncer que não se pode mais operar – somos desafiados a mudar a nós próprios. (FRANKL, 2005. p. 101) Frente ao acontecimento da cirurgia, o Sr. Geraldo revela que não teme a morte, mas teme a invalidez (impossibilidade de ser útil e a dependência de terceiros). Seu sofrimento encontra-se na dúvida do tempo de vida que ainda lhe resta, de que maneira vai viver esse tempo (inválido ou não) e se o tempo que ainda lhe resta é suficiente para concretizar os sonhos que ainda possui. Também pela sua fala: “a gente tem esperança que...essa operação vai... ela parece que foi bem sucedida....que ela ainda vai me dar um pedaço de tempo para poder concluir uma parte do sonho, né?”, ele pode estar atribuindo à CRVM o sentido de renovação, de prolongamento da vida, aliviando em parte o seu sofrimento. Esse achado nos remete para a assertiva de Romano já exposta neste estudo. Relembrando: Por mais que os procedimentos técnicos tenham avançado, as fantasias a respeito desse órgão único e centralizador não se amenizam e o ato cirúrgico assume a dimensão de renascimento, ressuscitação. E renascer tem um sentido mais amplo do que voltar da morte – é começar uma vida nova, livre 130 dos defeitos anteriores, uma outra chance, com novos valores e propósitos de vida. (ROMANO, 1998, p. 257) O Outro De acordo com Frankl (2005, p. 100), uma outra forma de “encontrar um sentido na vida é experimentando algo – como a bondade; a verdade e a beleza – experimentando a natureza e a cultura, e ainda, experimentando outro ser humano em sua originalidade única – amando-o”. Ao se dirigir ao outro, o ser humano realiza uma experiência de autotranscendência, de saída de si mesmo para a busca de um significado de alteridade, que pode lhe conferir um sentido. Na conversa com o Sr. Geraldo, ao perguntar sobre suas expectativas póscirúrgicas em relação ao convívio familiar e social, ele fala: A.... a gente passa a dar mais valor a muita coisa que passava despercebida, né?. O telefonema de um amigo, o cumprimento de um amigo... fica diferenciado... de um vizinho... uma ajuda ao próximo... né? Porque infelizmente... a mídia tem ensinado todo mundo: dá não que esse aí é vagabundo! Ajuda não porque não faz nada! Então a gente tem que usar um pouco daquilo: ‘dar e não olhar a quem’. O Sr. Geraldo demonstra se importar com outros valores, deixando claro que um deles é a presença do outro. Ele critica o posicionamento negativo que a mídia pósmoderna difunde sobre esse outro. E, ainda, sai de sua condição de quem necessita de ajuda, ou seja, de pós-operado do coração, indo ao encontro do outro, quando revela o desejo de ajudar ao próximo. Parece que o fato de ele estar experimentando o sentimento de finitude da vida, o comove e o faz produzir sentidos subjetivos, os quais revelam um interesse pelo futuro, o cuidado com o outro, a vontade de se ver realizado. Tais sentidos podem ser capturados na fala do paciente, quando a respeito dos seus sonhos ele pronuncia: “Ver mais netos, ver meus filhos bem encaminhados na vida, ver minha esposa bem encaminhada...” Nesse sentido, podemos sugerir que, ao contrário da desvalorização do futuro como uma forma de negar a velhice (aspectos narcísicos pós-modernos), o Sr. Geraldo ainda deseja ver seus descendentes. Ele não teme o avanço da idade como uma ferida narcisista, mas como uma ameaça de incapacidade física. Esses sentidos podem ter sido produzidos por ocasião da cirurgia, mas também podem estar associados ao fato de o paciente já ter vivido mais. De acordo com Lima e Seibt (2002), é provável que os mais velhos tenham mais sabedoria acumulada. A 131 sabedoria pode ajudar a visualizar elementos essenciais, formadores de sentido para a existência. Pode ajudar na escolha de elementos menos exteriores, efêmeros e aparentes. Quem já viveu muitos anos pode olhar através da cultura atual, ultrapassando as urgências. Pode produzir elementos de reflexão que transcendem perspectivas imediatas. A Religião A concepção frankliana apresenta uma compreensão da existência num espectro que ultrapassa as dimensões das experiências psíquica e física do homem, e abrange, portanto, a dimensão espiritual da experiência humana. Tal amplitude de compreensão da existência humana possibilita que Frankl postule a religiosidade como uma especificidade essencialmente humana. Assim, para Frankl, a religiosidade constitui uma demonstração do preenchimento do significado da vida, uma vez que possibilita o encontro e o vínculo do homem com o Outro absoluto, que na ótica frankliana constituise o norteador de toda existência humana (FRANKL, 1985). Quando perguntamos ao Sr. Geraldo sobre sua condição espiritual após a cirurgia, ele nos disse: “Eu sou mais Espírita do que Católico... Então eu aceito as coisas com muito boa vontade, com naturalidade... Eu tenho certeza que não tem nada por acaso.” A partir de sua religião, o Sr. Geraldo consegue aceitar a doença, consegue se conformar com a cirurgia. No entanto, não parece que a religião seja para ele uma oportunidade de encontro com o sentido da vida. Os sentidos subjetivos que a religião traz para o Sr. Geraldo frente à cirurgia são de conformação e aceitação. O Corpo Perguntamos ao Sr. Geraldo o que ele faria para evitar a CRVM, se pudesse voltar no tempo. Ele respondeu: NADA! Fazia a merma coisa. Sempre fui atleta, joguei bola até 54 anos de idade, disputei campeonato pelo Cruzeiro de natação durante 6 anos, nunca fui sedentário, de bebida... durmi tarde, sempre tive uma vida mais ou menos regrada... Tive um período sim! Que eu fumava... eu fumei mais ou menos até trinta... e dois anos de idade... Dos 16 até os 32 anos de idade, então tem 31 anos que eu não fumo. Foi a única coisa que eu poderia falar assim que... se eu voltasse o tempo que eu não faria novamente. O resto eu acho que a minha vida seria a mesma. Quanto à questão assim de comportamento... relacionamento... é 132 muito difícil, né? Você falar eu... seria diferente, né?Acho que cada um tem um modo de pensar, modo de viver, senão, não havia evolução... se todo mundo fosse igual a gente morava numa caverna saía de manhã cedo ia lá e caçava, voltava, comia e dormia. Eu acho que tudo é necessário na vida... até os trancos.... Considerando que a definição do corpo é, na teoria frankliana, uma possibilidade aberta ao psiquismo, e, esse último, ao espírito, podemos revelar que Frankl pensa na idéia do corpo como uma forma de o ser humano conseguir superar suas fraquezas e se firmar. Nesse sentido, o homem se apresenta como algo maior do que pensa que é. Ele é um ente empenhado na busca de um sentido de vida, sentido esse possibilitador da autotranscendência (OLIVEIRA et al, 2004). O Sr. Geraldo demonstra que sempre teve uma preocupação em cuidar do corpo, da saúde. Não atribui a sua doença à falta de cuidados com o corpo e transcende suas fraquezas ao suportar os “trancos” da vida. Aqui podemos identificar um sentido subjetivo de valorização e superação de si, através da auto-afirmação de um corpo sem máculas, apesar das cicatrizes da vida. Tais sentidos também sugerem uma postura de negação da doença. 7.2 A Segunda Entrevista O Trabalho Aproximadamente 3 meses e meio após a primeira entrevista, o Sr. Geraldo nos fala sobre o seu ritmo de trabalho: “É... mais lento, né? Com menos intensidade... matando um pouco de horário de trabalho, né? Eu ia até às seis, sete horas da noite, eu vou até às quatro.” Apesar de estar trabalhando menos, o Sr. Geraldo revela que se acha mais nervoso, impaciente: Menas paciência pra muita coisa, sabe? Principalmente pra atendimento a viajante... tem uns que é meio aborrecido... Então antes eu tinha mais jogo de cintura pra... é... digamos assim pra... tole, a tole, tole... tolerar, a... aquela insistência de querer vender a mercadoria, de querer contar caso, então não é todo caso, não é todas pessoas que eu... eu aceito assim com facilidade mais não, sabe? Ao mesmo tempo em que nega, o Sr. Geraldo confirma o estresse, bem como a preocupação e a auto-cobrança constantes: 133 É, pessoal fala muito de estresse, estresse... eu...eu não sei bem o quê que é estresse não, sabe? Estressado quem não é estressado? Pois é, mas eles falam que... a pessoa... tem receio das coisas... afasta das pessoas, acha que nada vai dar certo... eu pelo menos eu mudei de profissão mais de cinco vezes e todas que eu mudei foi com sucesso! Encarei e deu certo! Eu acho que se eu tivesse aquele estresse que eles falam que existe por aí, da forma que falam não teria sucesso em nada, né? Nem teria mudado, né? Não. Preocupando menos com as coisas eu não preocupo não, preocupo cada vez mais! Sempre preocupei muito, né? Cada vez mais! Sempre preocupei muito! Com tudo que eu faço, com tudo que eu tenho. Igual eu te falei, eu nunca fui linha de frente, mas sempre procurei não ser aquele que tá lá atrás, né? Não, não, conheço uma pessoa que não se cobre não! E a satisfação que cê tem que dá de tudo, né? A você mesmo, né? Eu fiz isso certo, não! Eu fiz errado, não posso fazer mais assim... eu tenho que fazer isso, tenho que fazer aquilo, sempre cobrando, né? Acho que cê paga um alto preço, né? Por ser RESPONSÁVEL pelas coisas, né? Que o irresponsável... ele é totalmente feliz! É.... cê falou cobrança aí. Acho que quem é honesto e procura adquirir seu espaço é o maior cobrador de si próprio.... Confirma que sempre trabalhou muito: “Sempre lutei pra ser o primeiro! Nunca consegui ser o primeiro! Mas graças a Deus eu nunca fiquei do meio pá trás não.” O trabalho continua parecendo uma forma de escape para o vazio, e, como está trabalhando menos, o Sr. Geraldo dá sinais que de algo o incomoda: nervosismo, impaciência, hostilidade, intolerância, auto-cobrança, preocupação. Segundo Frankl, o “homem do trabalho” apresenta uma neurose dominical: [...] aquela espécie de depressão que acomete as pessoas que se dão conta da falta de conteúdo de suas vidas quando passa o corre-corre da semana atarefada e o vazio dentro delas se torna manifesto [...] fenômenos tão difundidos como depressão, agressão e vício não podem ser entendidos se não reconhecemos o vazio existencial subjacente a eles. O mesmo é válido também para a crise de aposentados e idosos. Existem ainda diversas máscaras e disfarces sob os quais transparece o vazio existencial. (FRANKL, 2005, p. 97, grifo nosso) Esses sinais de incômodo não estariam, então, mascarando uma suposta falta de sentido em sua vida, antes preenchida pelo trabalho em excesso? O Sofrimento Nesse segundo encontro, o Sr. Geraldo não atribui nenhuma modificação em sua vida decorrente da cirurgia, nem perdas, nem ganhos: “Não sinto diferença de nada... de nada. Mesma coisa.” 134 Ele nega até mesmo a dor sentida quando teve o infarto: “Não. Nem no dia eu posso falar que eu senti dor. Eu sinto que o peito ainda tá anestesiado, né? Ó! Pra mim tá normal... como é... antes... Na mesma forma de antes da, da operação...” E parece se orgulhar ao dizer que já voltou ao trabalho: “Eu peguei o mesmo ritmo novamente, né?” O paciente pode estar negando seu estado delicado, mesmo sabendo dele (“peito anestesiado” “Com as artérias do jeito que elas tão, né?”), como uma forma de não encarar o seu sofrimento, o qual identificamos como uma dúvida diante do tempo de vida que ainda lhe resta. Ele continua a negar o medo da morte: “Mas emocionalmente cê não ficou com medo de morrer, não? NÃO! MOMENTO NENHUM! Isso aí comigo não aconteceu não!” Mas confirma o medo da invalidez, da dependência de terceiros: Isso aí sim! Isso falo mesmo! Falo mesmo! Ah, a gente tá vendo hoje ninguém tem condição de, de.... há pouco tempo um filho podia parar pra cuidar de um pai, até mesmo a esposa cuidar do marido... o tempo hoje...obriga todo mundo a não ter tempo, né? O sofrimento do Sr. Geraldo em não saber quanto tempo a vida ainda lhe reserva, em pensar que pode ficar dependente, parece ser tão grande, que ele adota uma posição de negação. Nega prováveis mudanças físicas, nega o medo da morte, nega até mesmo os sonhos que afirmou ainda possuir na primeira entrevista: O meu sonho ERA: Em primeiro lugar: ter uma casa. Eu consegui mais do que isso. Segundo, a partir do momento que eu tive filhos é... colocar eles numa faculdade e eu consegui... todos três, formar...então eu me sinto um camarada realizado, feliz... então o resto pra mim é troco. O Sr. Geraldo ainda procura uma explicação para sua cirurgia, pede confirmação sobre o respaldo do cirurgião, como um pedido de súplica de quem deseja prolongar a vida: Afinal de contas, essa safena colocada aqui... eu entendo o seguinte: digamos que isso aqui é uma artéria, aqui deu um entupimento, a safena ela vai ser colocada daqui-aqui, como uma ponte.... como que ela é colocada aqui? É cola? Costurinha? Mas era pra sair ao menos uma gotinha de sangue gente! Uai! No meu caso houve dez cortes! Puxa vida! Dr. Y é cobra no negócio, né? 135 O sofrimento não consegue mais produzir no Sr. Geraldo um investimento no outro como no início. Agora o sofrimento o faz sentir-se retraído. E a maneira que ele parece encontrar para se manter digno diante de tal sofrimento é negando a doença e suas conseqüências em sua vida. Há um outro momento na entrevista, em que o Sr. Geraldo desvela que procura recursos para lidar com seu sofrimento interno. Isso pode ser um indício de que se encontra deprimido, mas que necessita de manter sua dignidade: Eu comecei a ler um livro agora que... eu já fui e voltei na décima quinta página é... É. Eu considero ele o pai da Psicologia, né? É meio complexo o livro isso aí falando EXATAMENTE o que cê ta falando aí! Que cê acabou de falar aí! Que tudo é... são efeitos e causas, né? Você mesmo provoca... seus deslizes, suas doenças, seus pobrema... Reflexão pra dentro de si próprio. O Outro Nesse quarto mês após a cirurgia, o Sr. Geraldo comenta que está mais nervoso, impaciente e às vezes agressivo com amigos e família: É eu já era nervoso, né? Digamos nervoso e meio. Agora eu interei pra duas... dois nervoso, né? Era uma vez e meio agora é duas. Não sei se é a idade que a gente vai ficando chato, né? Então parece que sem querer por dentro ocê começa a... a... Escolher tipo de assunto, tipo de convívio com pessoas que mais te agradam, né? Que eu acho que todo mundo, nem todo mundo consegue agradar todo mundo, né? É mesmo uma pessoa estranha... que você convive naquele momento com ela ali cê tem um pouco mais de paciência... e conforme a pessoa, hoje eu já... já demonstro que já... tiver uma roda de amigos assim eu já, tô dando até logo e tô saindo e vô embora por que já não tem... é a falta de paciência, de tolerância. Não, não é grito... [com a família] é... ser mal educado mesmo, né? A verdade é essa aí é mal educado. As má resposta, né? Mas o pessoal passa por cima e.... Parece que nesse momento do pós-operatório, o paciente encontra-se irritado, deprimido e não consegue tolerar a presença do outro. O outro lhe traz a oportunidade de sentido, mas ele rejeita tal oportunidade, pois ela lhe faz refletir sobre sua atual condição de pós-operado, de ser limitado, de ser finito: Ah! Ninguém tem nada com minha vida! Que bobagem! Tem sim! Pode fazer besteira não! Tem um vizinho do lado esquerdo, lado direito... tem seu parente. Todo mundo tá te olhando... e ai de você, cê convive cinqüenta anos na LINHA RETA, o dia que ocê fizer uma bobagem todo mundo esquece os 136 cinqüenta anos que cê foi um camarada CORRETO! Só vão lembrar do dia que ocê errou! É duro, né? O Sr. Geraldo valoriza a família como suporte emocional e afetivo no processo de seu adoecimento, mas faz questão de dizer que fez a sua vida sozinho, sem depender de ninguém: Eu acho que o apoio da família foi muito essen... foi essencial, né? Pra minha recuperação. E psicologicamente... também! Então o apoio que eu acho nessa parte aí é essencial, sabe? Olha eu acho que eu sei onde cê quer chegar...talvez eu saiba....a...a....aquela emoção que você NÃO poderia tá aqui hoje conversando com seus filhos ou com sua esposa, né? Que que o cê sente que... é de ter dado certo essa operação e você tá aqui convivendo com eles, né? É engraçado eu não sei se a vida vai ensinando tanto, sabe? Porque eu praticamente convivi sozinho... eu tenho facilidade de... VIVER SOZINHO! Meus filhos, já não tem essa estrutura. EU TENHO! Porque eu sempre vivi mais só. Ao mesmo tempo em que nega o outro, ele necessita de demonstrar que se preocupa com seus entes, não deixando de assumir o papel de pivô da família, de transmissor de conhecimento e experiência: Porque eu acho que a vida e a faculdade não deu pra eles o que me deu. É... de güentar a guerra, a batalha que existe fora da...depois que cê abre aquela porta da, da sua sala e sai pra rua... exige uma experiência... um aprendizado tão grande! Que faculdade não te dá aquilo não! Então eu preocupo, eu tenho um filho no Rio de Janeiro, tem um outro que tá aqui, tem essa moça que tá... hoje ela tá comigo lá na loja, né? É... foi minha sorte que... por mais um dia ela já teria... talvez empregada, né? Mas ela teve que ir pra loja e tá lá comigo até hoje, sabe? Embora eu quero que ela vá pra área dela. Eu tenho certeza que ela vai conseguir a área dela. Mas, a, a preocupação ela é constante. Isso aí... como que ocê vai deixar de preocupar com um filho que tá morando lá no Rio de Janeiro? A parte financeira eu preocupo mais com a minha esposa. Eu fico preocupado com a experiência, né? Como eu disse, né? Isso aí conta muito! Conta muito! Tá, mas se tiver minha turma... pudesse eu morar numa fazenda, igual era antigamente e construir uma casa pra cada um, eu faria isso! Seria uma galinha com os pintinho tudo do lado. Não seria essa uma tentativa de se manter digno mesmo sendo um ser falível? Diante do sentimento de finitude e falência que a cirurgia lhe trouxe e por não estar munido de apoio especializado, o paciente pode estar deprimido. A depressão pode estar levando o Sr. Geraldo a se isolar socialmente e não lhe permite reflexões sobre a presença do outro. Ele acaba negando também o outro. A Religião 137 O Sr. Geraldo mantém a religião como um meio de aceitação do seu estado: “Como o Católico diz: se Deus fecha uma janela ele abre uma porta, né? E a vida é assim mesmo...” No entanto, também expõe momentos em sua fala que parecem condizer com uma transcendência de si através da fé, por exemplo: você tem uma força tão grande por dentro que não existe situação NENHUMA! Que você não consegue resolver não... ou ultrapassar! Da crença de você acreditar em você: EU POSSO, EU QUERO! EU VOU FAZER, EU VOU SER! Eu acredito que... você pode não acredi... não, não obter aquilo de imediato, mas a, aquela, aquela coisa vai materializando até você adquirir. acho que a vida é lá... a vida é muito relativa viu? E no fundo eu acho que nós temos uma força, um poder... que a natureza nos concede que eu acredito que Deus é isso aí. É o todo. O Sr. Geraldo configura um sentido de fé, na medida em que sai de si e busca em Deus uma força interna para superar suas dificuldades. Ele não faz da religião um motivo de sentido para a vida, mas consegue fazer da fé um alicerce para ela se desenrolar. Em outra passagem da entrevista, o Sr. Geraldo, falando sobre espiritualidade acaba revelando também uma posição de revolta: Agora espiritual eu acredito que tem um por que... é o caso aonde... eu poderia ficar nervoso a hora que eu vejo: dei tanto azar, falei gente! Por quê? Se eu me preparei pra não acontecer isso aqui. E tô dessa forma aqui! Eu acho que o porquê não é agora. Isso é uma dívida! Que eu tenho. E eu peço a Deus é força pra poder passar... por esse momento, né? Que tão acontecendo, né? E até onde vai eu não sei, né? Então na hora do meu desencarne é... eu... jamais resmunguei, jamais é... joguei praga, jamais reclamei... porque... eu acho que não existe, não existe dívida.... PAGAMENTO NENHUM SEM DÍVIDA! Sendo assim, a religião para o Sr. Geraldo, além de configurar sentido de aceitação/conformidade, configura também sentidos de apoio/superação e revolta: É... eu, eu... tá na Bíblia, né? Não cai uma folha sem que Deus não queira, né? Então eu tô aqui não é por acaso não!... Agora eu tô aqui por quê? Isso aí eu não sei te responder! Procuro fazer a minha parte aqui. Fazer tudo aquilo que não, não, não me traga pobrema de consciência... e... as minhas responsabilidades... eu procuro arcá-las o melhor possível... e vamo passando o tempo, né? Vamo tocando a vida, né? Bola pra frente! O Corpo 138 Apesar da falta de paciência, o Sr. Geraldo disponibilizou um tempo para cuidar de si: “Aí vou em casa, troco de roupa, vou fazer minha caminhada.” Sobre a caminhada, revela que a está praticando diariamente e que iniciou o exercício cerca de 45 dias após a cirurgia, quando o médico o liberou para dirigir. Está caminhando sem nenhuma orientação profissional, porém percebe algum ganho de rendimento. Mas refere não gostar de fazê-lo, apesar de já ter se acostumado: “Eu gastava.... QUASE QUARENTA MINUTOS pra dá uma volta! Agora eu gasto vinte minutos pra dá uma volta. Embora eu detesto caminhar, né? Nunca gostei! Agora já tô acostumando.... já sinto falta, sabe?” O Sr. Geraldo também expõe dúvidas quanto ao seu limite de esforço físico: É que o próprio médico falou ó: “não força muito não!” Então eu faço duas voltas eu tô gastando... na segunda é mais lenta que a primeira. Se a primeira eu faço ela em vinte minutos, na segunda eu faço em... vinte e cinco a vinte sete, vinte oito minutos mais ou menos... Pra não forçar muito, né? Com relação ao corpo, o Sr. Geraldo também assume uma postura de revolta, ao dizer: Igual quando eu chego no espelho, né? Não sei se já aconteceu alguém falar alguma coisa dessa forma... aí cê vê assim... cê ta todo remendado, né? Se sente alguma coisa? Mágoa? Ou um, ou um ressentimento? AAAH!!! Eu não aceito cem por cento isso não, sabe? Porque eu tive uma qualidade de vida, eu FIZ uma qualidade de vida, que se dependesse de mim... eu ia viver mais de 90 anos de idade! Nesse caso, o paciente não consegue se desvincular do corpo e transcender para o espiritual, conforme vimos na primeira entrevista, em que ele usa a religiosidade como uma aceitação: “Agora aconteceu, porque Deus quis, né?” O Sr. Geraldo não inscreve a sua doença em seu corpo, apesar de mencionar hábitos de vida considerados nocivos ao coração: “Ah! Só tem uma coisa que isso aí é difícil a gente não tomar... tiver um churrasquinho...é lógico eu, hoje eu não! Eu só comia carne com gordura em churrasco... a carne...churrasco sem gordura é chupar bala sem, sem tirar o papel.... e uma guia? [aguardente]. Ah! Guia boa não tem comparação! Mostra outros motivos que não as suas falhas para justificar sua doença. Motivos que estão inseridos no contexto pós-moderno como, por exemplo, a crítica médica: Engraçado! Esse médico meu... eu não sei... às vezes tem hora que eu fico pensando... ele é muito bom pra receitar remédio... e só. 139 Achei estranho... nós... nós não fizemos nem o... como é que fala aquele exame cheio de de... Eletro. Ei falei: Ô Doutor ocê não vai fazer nem um eletro pra ver a diferença que deu? Porque todo eletro meu sempre acusou uma coisa antiga, porque eu já tinha tido um infarto, né? Ele falou: “Ah! Da próxima vez que o Sr. vier aqui a gente vai fazer”. “Ah! Eu não vou escutar esse paciente!” Percebemos também aqui uma identificação com o que Lasch (1983) revelou como uma resposta narcisista da sociedade pós-moderna ao culto da imagem. Como vimos, essa resposta sustenta uma ideologia terapêutica ligada à norma, e qualquer desvio da norma é tido como patológico. O paciente só se sente seguro diante de uma imagem limpa de sua saúde. Notamos isso, quando o Sr. Geraldo sente a necessidade de confirmar seu estado de saúde (a eficácia da cirurgia), ao solicitar ao médico pelo menos um registro eletrocardiográfico. Não satisfeito com a falta da imagem, ele procura soluções em outras fontes: Eu tô esperando um viajante passar na loja lá, porque ele vai trazer pra mim, não sei se ele vai lembrar... o pai dele fez essa operação anos atrás, tinha facilidade também de acumular gordura nas artérias... diz ele que o pai dele toma um remédio específico pra inibir a gordura... não é que ele retira a gordura não! Uma das fontes, ele encontra na sabedoria dos antigos: “Eu... chá de alecrim! Eu to até esperando meu pé lá em Sete Lagoas ele crescer um pouco mais! Os antigos sempre tomaram, né?” O Sr. Geraldo também revela uma consciência de sua incapacidade física, ao dizer: Não... eu tô satisfeito com a qualidade de vida que eu tenho, sabe? Eu só não quero que ela... diminua... mas não tenho ambição que seja mais do que isso também não. Agora se pudesse voltar o tempo, LÖGICO que eu gostaria de ter uma coisa que me FAZ FALTA! Eu tenho inveja de quem consegue ainda correr atrás duma bola e jogar um futebol... Muito bom, muito bom! Ah! Mas pra mim não dá mais não, né? 7.3 Análise Final das Entrevistas Por meio de uma leitura frankliana, identificamos vários sentidos subjetivos produzidos pelo paciente em diferentes categorias, a saber: 140 Categorias Trabalho Sofrimento Outro Primeira Entrevista Sobrecarga Preocupação Ansiedade Revolta Segunda Entrevista Sobrecarga Preocupação Auto-cobrança Intolerância Hostilidade Impaciência Nervosismo Medo Angústia Dúvida Finitude Medo Angústia Dúvida Finitude Negação Dignidade Valorização Comoção Aproximação Indiferença Rejeição Negação Falibilidade Dignidade Aceitação Conformação Aceitação Conformação Apoio Superação Revolta Valorização Superação Negação Cuidado Limitação Negação Incapacidade Revolta Religião Corpo Quadro 5: Sentidos subjetivos produzidos no pós-operatório inicial e tardio61 Fonte: Dados da pesquisa Pela identificação de tais sentidos, podemos compreender que, nas duas primeiras semanas (14 dias), o paciente estava mais sensibilizado com o fato de ter feito uma cirurgia no coração. Atribuiu a demanda excessiva de trabalho como a maior causadora de sua doença, manifestando a intenção de diminuir tal excesso. Expressou seu sofrimento como um medo da invalidez e como uma angústia acerca do tempo de vida que ainda lhe resta. Tal sofrimento o comoveu, trazendo-o para mais próximo de seus amigos e familiares, para os quais passou a dar mais valor. Procurou amenizar seu sofrimento, agarrando-se à esperança de uma cirurgia bem feita. Negou quaisquer condutas ou hábitos errados de vida que justificassem seu adoecimento (a não ser pelo hábito de fumar, já abandonado há 31 anos). Por fim, encontrou na religião a aceitação para a doença. 61 Pós-operatório inicial: 14 dias após a CRVM. Pós-operatório tardio: quatro meses e dois dias após a CRVM. 141 Em torno de quatro meses após a cirurgia, o paciente demonstrou uma atitude mais agressiva. Apesar de ter reduzido sua carga de trabalho para menos 2 a 3 horas ao dia, mostrou estar se sentindo mais irritado que antes. O sofrimento pelo medo da invalidez e certeza de fim aumentou, levando-o a negar a doença como um meio de defesa contra sua falibilidade. A presença do outro, ao comprovar no paciente a sua existência, também passou a atestar sua finitude. Dessa maneira, o paciente pôs-se a rejeitar e negar o outro. O paciente mostrou sinais de depressão, como hostilidade e isolamento social. Mesmo continuando a negar qualquer relação entre a sua doença e seus hábitos de vida, o paciente começou a se exercitar diariamente, através de caminhadas. Manteve a necessidade de comprovação da eficácia da cirurgia. Demonstrou revolta ao contemplar seu corpo “remendado” no espelho, bem como ao criticar os médicos. Não obstante todo seu sofrimento, o paciente desvelou a necessidade de se manter digno, através da preocupação com a família e da auto-ajuda por meio de livros. A religião, para ele, permaneceu como instrumento de aceitação, mas também de superação e apoio. A revolta por ter sido operado foi também descarregada em forma de religiosidade. Pela pesquisa teórica e análise das entrevistas nos foi possível apresentar uma hipótese como conclusão deste estudo. A apresentação dessa hipótese está descrita na conclusão que se segue. 142 8 CONCLUSÃO A autotranscendência, como um atributo ontológico do sistema teórico da Logoterapia, situa o homem como um ser que anseia por um sentido na vida. Entretanto, Frankl (1992) nos ensina que o sentido da vida não se encontra dentro de limites biológicos (físicos) e psíquicos, mas que o ser humano somente encontra o sentido de sua existência, quando é capaz de transcender a si mesmo e direcionar-se para a exterioridade. Tal concepção orienta o sentido da vida para além de seus limites psicofísicos e anuncia que o homem só o descobre, quando é capaz de esquecer a si mesmo e se sobrepujar pela vontade intencional de um encontro com o outro. No encontro com o outro, o ser é direcionado para o mundo “lá fora”. Segundo Frankl (2005), neste mundo, o homem que vive à busca de um sentido, pode encontrá-lo na execução de tarefa (trabalho), no amor por uma pessoa, na fé em Deus e no significado que se dá ao sofrimento inevitável. Essas possibilidades de encontro verdadeiro com o outro pela autotranscendência humana se encontram minimizadas no mundo pós-moderno. O caráter narcísico da personalidade contemporênea, que Lasch (1983) descreveu como uma das conseqüências da difusão do culto à imagem, contribui para que o amor adquira um sentido de superfluidade. O amor como forma real de sentido pressupõe relacionamentos com vínculos profundos, onde envelhecer ao lado do outro e viver através de seus descendentes era, para muitos, um grande motivo de realização. Porém, a desvalorização das tradições e o horror à velhide que a sociedade narcísica pósmoderna vivencia, oferecem ao indivíduo apenas formas instantâneas de “amor”. A pessoa deve estar sempre à disposição para novas experiências amorosas. Hoje, apenas “ficamos” com alguém, “amamos virtualmente”. Namorar e casar não são mais instâncias valorativas formadoras de sentido. Isso pode ser observado pela rapidez com que casamentos são feitos e desfeitos. Outro exemplo é a questão do trabalho. O alto consumismo introduzido pela cultura capitalista faz do trabalho apenas uma maneira de se adquirir dinheiro. O exercício de uma tarefa não vale mais como forma de contato com o outro. Podemos perceber isso na competitividade excessiva entre empresas e entre os próprios indivíduos. Nesse caso, a presença do outro constitui apenas um entrave para se ganhar 143 mais dinheiro. O outro é negado, rejeitado e em alguns casos chega a ser vítima de violência moral e física. Na Pós-modernidade, tanto o sofrimento físico como o psíquico são tidos por inaceitáveis. Tais sofrimentos desmascaram a ideologia do sucesso, da força e do vigor físicos e intelectuais, da beleza, da saúde e revelam o avanço da idade e a proximidade com a morte. Dentre os milagres que a cultura pós-moderna nos oferece, estão as fórmulas de vida eterna prometidas pela indústria farmacêutica. O ditado “há remédio para tudo, menos para a morte” soa como uma ofensa nos dias de hoje, como se fosse possível ao ser humano evitar a prova da morte. Sendo assim, Deus não aparece mais como uma forma de sentido para os enlouquecidos com o corpo. As respostas para o sofrimento somente são aceitas quando são possíveis de serem comprovadas cientificamente. Para o idoso, o contato familiar e social, a autonomia e a capacidade para executar um trabalho proporcionam sentimento de valor pessoal, auto-estima e bemestar. Na velhice, há um processo de busca interior e de investimento na espiritualidade e no autoconhecimento, resultando em desenvolvimento pessoal. Provavelmente, porque a pessoa idosa já possui uma sabedoria acumulada, que a ajuda a vislumbrar elementos essenciais formadores de sentido para a existência. Assim, aqueles que já viveram mais, podem encontrar sentido no amor, por exemplo, através dos netos, para os quais desejam passar suas vivências. Ou através dos amigos, companheiros de toda uma vida, pelos quais se sentem valorizados, ao prestarem ajuda. O trabalho também pode ser forma de encontro com o sentido na velhice, principalmente porque a maioria dos idosos é aposentada e vive sem uma ocupação para preencher o tempo que lhe sobrou. Assim, muitos idosos se dedicam à prática da caridade, onde, além de encontrarem uma ocupação, têm a oportunidade de se aproximarem do outro e se sentirem úteis. O idoso pode encontrar sentido no sofrimento pela perda de um ente querido (o cônjuge, por exemplo). Ao lembrar que ele é quem poderia ter morrido e que o seu parceiro (ou parceira) poderia estar sofrendo em seu lugar, o idoso poupa a dor alheia e consegue reconhecer uma posição de dignidade formadora de sentido. Outro exemplo é o sofrimento trazido por uma doença. A doença, além de consumir a saúde física, traz a sensação de proximidade com a morte, causando também um sofrimento psíquico. Muitos idosos encontram na religiosidade as respostas para as inquietudes geradas por tal sofrimento, conseguindo dessa forma atribuir sentido à existência, mesmo nessa condição. 144 Teoricamente, o sofrimento pode abrir a visão do ser humano na direção de encontrar novas formas de ingressar na vida. Como vimos, a CRVM pode ser um sofrimento gerador de sentido. O sofrimento que o paciente do caso em estudo apresenta nos parece, inicialmente (na primeira entrevista), que irá conduzi-lo ao outro. Percebemos isso pelos sentidos subjetivos de valorização, aproximação e comoção que ele demonstra quando se refere à família e aos amigos. No entanto, com relação ao trabalho, a sua posição já é de revolta. Ele produz sentidos subjetivos como ansiedade, preocupação e sobrecarga (estresse). Na religião e no corpo, o paciente assume uma posição intermediária. Ele aceita o adoecimento do corpo apenas porque Deus assim o quis. Produz sentidos subjetivos de valorização e superação do corpo. Nega a fragilidade do mesmo, através da aceitação e conformação desveladas pela religiosidade. Na segunda entrevista, aquela postura inicial de intenção de proximidade com o outro, não nos parece mais se configurar diante do sofrimento. Tanto no trabalho como na relação com o outro (amigos, família, Deus) e com o próprio corpo, a maioria dos sentidos subjetivos que o paciente produz está ligada a uma atitude hostil. Assim, no trabalho, ele menciona sentidos como impaciência, nervosismo, intolerância. Na relação com o outro, demonstra indiferença, rejeição e negação. Há momentos em que ele deixa clara uma preocupação constante com os filhos e a necessidade de passar a sua experiência para eles. Nesse momento, identificamos um sentido de tentativa de manutenção da dignidade perante o sofrimento. Na religião, o paciente mantém os mesmos sentidos de aceitação e conformidade. Nessa segunda conversa, ele busca algum apoio na religião e chega a sugerir que com Deus irá conseguir superar seu sofrimento. Porém, ele acaba deixando transparecer que também se encontra revoltado com Deus por ter feito a cirurgia. Por fim, no corpo ele não inscreve a sua doença, apenas reconhece sua limitação e inicia uma atividade física, a qual não encara como algo prazeroso. O que constatamos, portanto, é que o paciente idoso deste estudo configurou sentidos subjetivos de revolta e de tentativa de manutenção da dignidade diante do sofrimento causado pela CRVM. Entretanto, nenhum desses sentidos parece ter sido capaz de preencher o vazio da vida que o paciente demonstrou sentir através das atitudes hostis em relação ao outro (trabalho, Deus, família). Assim, o único posicionamento positivo que notamos foi o início de uma atividade física. Porém, não acreditamos que essa atitude seja devido a uma reflexão sobre o sentido da vida, porque 145 o paciente deixa claro que não gosta da atividade e sugere estar praticando apenas por obrigação ou recomendação médica. Isso acaba por nos deixar duvidosos quanto ao tempo de permanência em tal empreendimento. Sendo assim, o que apresentamos por conclusão deste estudo é a hipótese de que os impactos pós-operatórios da CRVM no contexto pós-moderno são capazes de produzir sentidos subjetivos que denotam carência de significado para a vida, mesmo entre os indivíduos idosos. A importância de se identificar tais sentidos para a dinâmica psíquica desses indivíduos reside no fato de que suas manifestações, como a depressão, a hostilidade e o isolamento social, aliadas aos poucos recursos de enfrentamento que o idoso no Brasil dispõe, podem ser os fatores psicossociais que estão dificultando o ingresso dos idosos na Fase 3 de um programa de Reabilitação Cardíaca. Sugerimos como estratégia para amenizar esse problema, a elaboração de um modelo explicativo em forma de cartilha, destacando a importância da participação do idoso num programa completo de Reabilitação Cardíaca. Essa cartilha deve possuir linguagem de fácil acessibilidade a todos, ou seja, profissionais da área e leigos envolvidos. A necessidade de atenção psicológica ao idoso revascularizado deve ser destacada em todas as fases da RC, podendo incluir os princípios da Logoterapia como uma forma de proporcionar uma participação mais efetiva desses indivíduos nos cuidados pós-operatórios. Dessa maneira, poderemos contribuir para uma melhora na qualidade de vida, bem como para a redução da morbimortalidade dessa população. 146 REFERÊNCIAS AGOSTINHO, Paula. Perspectiva psicossomática do envelhecimento. Revista Portuguesa de Psicossomática. Porto, v. 6, n. 1, p.31-36, jan./jun. 2004. ALFIERI, Roberto Guimarães; DUARTE, Gilberto Marcondes. Marcondes, exercício e o coração. 2. ed. 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Sec. 6, cap. 3, p.565-570. 159 ANEXO 1 – TERMOS DE CONSENTIMENTO TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO Prezado Senhor Diretor Técnico do Hospital Vera Cruz S/A, Este Termo de Consentimento se refere ao Projeto de Pesquisa “Configuração dos Sentidos Subjetivos de Indivíduos Idosos Submetidos à Cirurgia Cardíaca” que se encontra em anexo 1 do presente documento. Peça ao pesquisador que explique as palavras ou informações não compreendidas completamente. O presente Termo de Consentimento tem por finalidade a permissão do Doutor Fábio Botelho, Diretor Técnico da Instituição Hospital Vera Cruz S/A, para a implantação do Projeto de Pesquisa supracitado como proposta de estudo para o Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. O objetivo do Projeto é a construção do conhecimento em diferente espaço de tempo sobre quais sentidos subjetivos que seriam despertados em um paciente idoso após uma cirurgia cardíaca e como estes sentidos estariam influenciando sua posição frente à vida em sua nova condição de pós-operado. O sentido subjetivo representa uma unidade integradora na qual circulam tipos diferentes de emoções associadas, de múltiplas formas, a diversos elementos simbólicos que se constituem a partir de impressões do sujeito sobre ele mesmo e sobre o social. Primeiramente têm-se como proposta para elaboração de um perfil mais semelhante acerca dos pacientes que participarão da pesquisa, a montagem de um questionário (anexo 3 do Projeto de Pesquisa) objetivando a adequação de tal perfil, com informações colhidas em prontuário clínico e em entrevista oral direta com o paciente. O mesmo será argüido, após ter sido submetido à cirurgia cardíaca e ter assinado um termo de consentimento (anexo 4 do Projeto de Pesquisa), bem como recebido uma cópia idêntica deste, concordando em responder ao questionário. Uma cópia deste consentimento também ficará com a Instituição e outra com o Pesquisador. Tal questionário será feito com pacientes que não participarão diretamente da pesquisa, portanto, num período que anteceda o início da mesma, de maneira que possa contribuir para a montagem de uma amostra qualitativa dos pacientes idosos submetidos à cirurgia cardíaca, mais característica da Instituição onde a pesquisa será realizada. Uma vez que tal perfil for definido, os pacientes que participarão direta e voluntariamente da pesquisa assinarão um termo de consentimento formal livre e esclarecido (anexo 2 do Projeto de Pesquisa). Tais pacientes, bem como a Instituição e o Pesquisador receberão uma cópia idêntica de tal consentimento. Estes pacientes serão entrevistados em dois momentos da pesquisa. O primeiro momento será em seu leito na Unidade de Internação e o segundo após 3 a 6 meses da alta hospitalar na Capela do Hospital Vera Cruz S/A. As entrevistas serão gravadas com um gravador portátil da marca Panasonic modelo RN-305 e, posteriormente serão transcritas para facilitar seu estudo. Os possíveis riscos que podem ocorrer durante a primeira fase do estudo não diferem daqueles riscos aos que estão expostos os pacientes pós-operados de cirurgia cardíaca, visto que os mesmos, ainda estarão internados. Portanto, todo o suporte necessário em caso de intercorrências médicas durante a primeira entrevista será dado pelo Hospital Vera Cruz S/A. Na segunda fase do estudo, quando os pacientes serão convidados a comparecer à Instituição 3 a 6 meses após a alta hospitalar, estes poderão 160 por uma eventualidade necessitar de atendimento médico, ficando a cargo de a Instituição prestar atendimento ao paciente se o mesmo estiver munido de documentos que comprovem sua identificação, bem como o plano de saúde quitado até o último vencimento. Os pacientes serão previamente instruídos para comparecer à Instituição portando os documentos que comprovem sua identificação, bem como aqueles que comprovem o plano de saúde quitado até o seu último vencimento. Durante e após o desenvolvimento da pesquisa poderá ser demonstrada a Missão da Instituição enquanto busca da excelência no desenvolvimento de serviços em saúde tendo como base, o aprimoramento do conhecimento científico e assim ilustrar-se-á um caminho que está sendo percorrido para o aprimoramento desse conhecimento, buscando incentivar a educação continuada dos profissionais da Instituição. O gasto que a Instituição terá com o estudo se concentra apenas em ceder o espaço físico da Capela onde será realizado o segundo momento da pesquisa. Ficando os horários para realização das entrevistas, a serem combinados entre o pesquisador e o responsável pelo referido local. A Instituição não receberá pagamento para a realização deste estudo. Efeitos indesejáveis são possíveis de ocorrer em qualquer estudo de pesquisa, apesar de todos os cuidados possíveis, e podem acontecer sem que a culpa seja da Instituição ou do pesquisador. Se a Instituição sofrer efeitos jurídicos indesejáveis, como resultado direto da sua participação neste estudo, a necessária assistência profissional privada será providenciada pelo Doutor Henrique de Abreu Costa OAB/MG 87.047, cel. (31) 9903 7445. Rua Teixeira de Freitas, 478/202. Bairro: Santo Antônio. Belo Horizonte MG. O pesquisador responsável pelo estudo poderá fornecer qualquer esclarecimento, assim como tirar dúvidas, no seguinte contato: Nome da pesquisador: Letícia Viecili Pereira Landi Endereço: Rua São João Evangelista, n0 226/ apt. 05. Bairro São Pedro. Cep. 30330-140 Telefone: (31) 88760508. E-mail: [email protected] 161 Declaração de Consentimento Li ou alguém leu para mim as informações contidas neste documento, antes de assinar este termo. Declaro que toda a linguagem técnica utilizada na descrição deste estudo de pesquisa foi satisfatoriamente explicada e que recebi respostas para todas as minhas dúvidas. Confirmo também, que recebi uma cópia deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Compreendo que a Instituição é livre para se retirar do estudo em qualquer momento, sem perda de benefícios ou qualquer outra penalidade. Dou meu consentimento de livre e espontânea vontade para fornecer as condições para realização deste estudo com a participação da Instituição Hospital Vera Cruz S/A. ______________________________________________________________________ Nome da Instituição (em letra de forma) ______________________________________________________ Assinatura do representante legal da Instituição ____________ Data Obrigada pela sua colaboração e por merecer sua confiança. ________________________________________________________ Nome (em letra de forma) e Assinatura do pesquisador ___________ Data 162 Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Pró-Reitoria de Pesquisa e de Pós-Graduação Comitê de Ética em Pesquisa TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO N.º Registro CEP: CAAE 0001.0.257.213-06 Título do Projeto: “CONFIGURAÇÃO DOS SENTIDOS SUBJETIVOS DE INDIVÍDUOS IDOSOS SUBMETIDOS À CIRURGIA CARDÍACA: uma análise na perspectiva de Viktor Emil Frankl” Prezado Senhor (a), Este Termo de Consentimento pode conter palavras que você não entenda. Peça ao pesquisador que explique as palavras ou informações não compreendidas completamente. Você está sendo convidado (a) para participar de um estudo, que consiste em responder a um questionário, cujo objetivo é a montagem de um perfil mais semelhante acerca dos pacientes internados no Hospital Vera Cruz S/A. Tal questionário facilitará a composição de um grupo mais característico dos pacientes idosos submetidos à cirurgia cardíaca nesta Instituição, onde o referido Projeto de Pesquisa pretende ser implantado. A sua participação neste estudo é muito importante, pois você estará colaborando para a realização de uma pesquisa que estudará os sentidos subjetivos que podem ser despertados em um paciente idoso, após uma cirurgia cardíaca com base nos pressupostos teóricos de Viktor Emil Frankl, o fundador da Logoterapia. A Logoterapia é também chamada de terapia do sentido da vida, pois, basicamente preconiza a idéia de que o ser humano vive motivado pela vontade de realizar sentido na vida e, para isso deve centrar-se na realização de valores através de suas vivências, atitudes e criações. Os sentidos subjetivos podem ser entendidos como as manifestações de sensações, sentimentos e reflexões produzidas por indivíduos a respeito de suas vidas, quando estas são influenciadas e/ou atingidas por acontecimentos pessoais, sociais e históricos. Estes sentidos podem ser identificados, por exemplo, na fala destes indivíduos. Esta pesquisa faz parte do Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Você foi selecionado por que possui idade entre 60 e 79 e foi submetido a uma cirurgia cardíaca. Tal seleção baseou-se nos seguintes argumentos: 1. A Organização Mundial de Saúde, nos países em desenvolvimento como o Brasil, utiliza a seguinte categoria como parâmetro para a idade cronológica do idoso: aqueles com 60 anos ou mais são denominados idosos e aqueles com 80 anos ou mais são denominados grande velhos. 2. Estudos recentes vêm demonstrando que com o atual crescimento da população idosa haverá tanto um aumento da incidência de doença das artérias do coração, bem como do número de pacientes idosos que se apresentarão aos serviços de cirurgia cardiovascular. Você não é obrigado a responder ao questionário, ou seja, a sua participação é voluntária. Você tem o direito de não querer participar ou de sair deste estudo a 163 qualquer momento, sem penalidades ou perda de qualquer benefício ou cuidados a que tenha direito nesta Instituição. O questionário consta de vinte e quatro perguntas simples e diretas que serão feitas pelo pesquisador e anotadas em formulário próprio. Tal formulário ficará armazenado em um arquivo pertencente ao pesquisador, cujo acesso é restrito somente a este. A identificação do material coletado se dará apenas pelas iniciais do seu nome completo. A sua identidade será mantida em sigilo. Os resultados do estudo serão sempre apresentados como o retrato de um grupo e não de uma pessoa. Dessa forma, você não será identificado quando o material de seu registro for utilizado, seja para propósitos de publicação científica ou educativa. Algumas perguntas do questionário poderão ser mais bem esclarecidas consultando o seu prontuário clínico. Para isso é necessário que você autorize o pesquisador a consultá-lo. Ao assinar a declaração deste presente termo de consentimento, você estará automaticamente autorizando o pesquisador para consultar e coletar dados de seu prontuário clínico. Você não terá nenhum gasto com sua participação neste estudo bem como não receberá nenhum pagamento pela mesma. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais coordenado pelo Prof. Heloísio de Resende Leite, que poderá ser contatado em caso de questões éticas, pelo telefone: (31) 33194517 ou email: [email protected]. O pesquisador responsável poderá fornecer qualquer esclarecimento sobre o estudo, assim como tirar dúvidas, bastando o seguinte contato: Nome do pesquisador: Letícia Viecili Pereira Landi Endereço: Rua São João Evangelista, n0 226/ apt. 05. Bairro São Pedro. Cep. 30330-140 Telefone: (31) 88760508. E-mail: [email protected] 164 Declaração de Consentimento Li ou alguém leu para mim as informações contidas neste documento, antes de assinar este termo. Declaro que toda a linguagem técnica utilizada na descrição deste estudo de pesquisa foi satisfatoriamente explicada e que recebi respostas para todas as minhas dúvidas. Confirmo também, que recebi uma cópia deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Compreendo que sou livre para me retirar do estudo em qualquer momento, sem perda de benefícios ou qualquer outra penalidade. Dou meu consentimento de livre e espontânea vontade para participar deste estudo. ______________________________________________________________________ Nome do participante (em letra de forma) ______________________________________________________ Assinatura do participante ou do seu representante legal ____________ Data Obrigada pela sua colaboração e por merecer sua confiança. ______________________________________________________ Nome (em letra de forma) e Assinatura do pesquisador _____________ Data 165 Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Pró-Reitoria de Pesquisa e de Pós-Graduação Comitê de Ética em Pesquisa TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO N.º Registro CEP: CAAE 0001.0.257.213-06 Título do Projeto: “CONFIGURAÇÃO DOS SENTIDOS SUBJETIVOS DE INDIVÍDUOS IDOSOS SUBMETIDOS À CIRURGIA CARDÍACA: uma análise na perspectiva de Viktor Emil Frankl” Prezado Senhor, Este Termo de Consentimento pode conter palavras que você não entenda. Peça ao pesquisador que explique as palavras ou informações não compreendidas completamente. Você está sendo convidado (a) a participar de uma pesquisa que estudará os sentidos subjetivos, que podem ser despertados em um paciente idoso, após uma cirurgia cardíaca. Os sentidos subjetivos podem ser entendidos como as manifestações de sensações, sentimentos e reflexões produzidas por indivíduos a respeito de suas vidas, quando estas são influenciadas e/ou atingidas por acontecimentos pessoais, sociais e históricos. Estes sentidos podem ser identificados, por exemplo, na fala destes indivíduos. Esta pesquisa faz parte do Programa de Pós-graduação Stricto Sensu em Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Você foi selecionado por que possui idade entre 60 e 75 anos é do sexo masculino e foi submetido a uma cirurgia cardíaca. Tal seleção baseou-se nos seguintes argumentos: 1. A Organização Mundial de Saúde, nos países em desenvolvimento como o Brasil, utiliza a seguinte categoria como parâmetro para a idade cronológica do idoso: aqueles com 60 anos ou mais são denominados idosos e aqueles com 80 anos ou mais são denominados grande velhos. 2. Segundo um estudo publicado na IV Conferência da Associação Americana do Coração sobre Prevenção e Reabilitação do Infarto, a freqüência da incidência de infarto nos homens é 1,25 vezes maior que nas mulheres e, após os 55 anos, a incidência de infarto mais que duplica a cada década de vida que se segue. 3. Estudos recentes vêm demonstrando que com o atual crescimento da população idosa haverá tanto um aumento da incidência de doença das artérias do coração, bem como do número de pacientes idosos que se apresentarão aos serviços de cirurgia cardiovascular. O objetivo do Projeto é compreender os sentidos subjetivos que seriam despertados em um paciente idoso, após uma cirurgia cardíaca, tendo como pressuposto teórico principal, os fundamentos da Logoterapia de Viktor Emil Frankl. A Logoterapia é também chamada de terapia do sentido da vida, pois, basicamente preconiza a idéia de 166 que o ser humano vive motivado pela vontade de realizar sentido na vida e, para isso deve centrar-se na realização de valores através de suas vivências, atitudes e criações. A sua participação não é obrigatória. Para participar deste estudo solicito a sua especial colaboração para responder a duas entrevistas. A primeira entrevista será feita logo após a sua alta hospitalar. A segunda será feita entre três a seis meses seguintes, contados a partir da data da primeira entrevista. Ambas as entrevistas serão realizadas em seu domicílio e serão gravadas com um gravador portátil, a fim de facilitar sua posterior transcrição e estudo. Espera-se que, como resultado deste estudo, não somente você, mas pessoas em situação semelhante à sua possam atuar de forma mais efetiva no processo de Reabilitação Cardíaca. A Reabilitação Cardíaca consiste no desenvolvimento e manutenção de um nível adequado de atividade física, psicológica e social. E para que o processo de reabilitação cardíaca seja mais bem aproveitado, além da atuação de uma equipe multiprofissional, a sua participação efetiva é de fundamental importância. Uma vez que a sua participação no processo de Reabilitação Cardíaca se dê de forma mais efetiva, você estará prevenindo a ocorrência de novos problemas no coração, bem como adquirindo uma melhoria na sua qualidade de vida. Você não terá nenhum gasto com a sua participação no estudo e também não receberá pagamento pelo mesmo. Efeitos indesejáveis são possíveis de ocorrer em qualquer estudo de pesquisa, apesar de todos os cuidados possíveis, e podem acontecer sem que a culpa seja sua ou dos pesquisadores. Se você sofrer efeitos jurídicos indesejáveis como resultado direto da sua participação neste estudo, a necessária assistência profissional privada será providenciada pelo Doutor Henrique de Abreu Costa OAB/MG 87.047, cel. (31) 9903 7445. Avenida Brasil, 1053, 9º andar. Bairro: Funcionários. Belo Horizonte MG. Caso sofrer efeitos indesejáveis com relação a sua saúde, como resultado direto da sua participação neste estudo, a necessária assistência profissional privada será providenciada pelo Hospital Vera Cruz S/A, nas seguintes condições: 1. Apresentação do documento que comprove sua identificação 2. Apresentação do documento ou documentos, que comprovem seu plano de saúde quitado até o último vencimento. A sua identidade será mantida em sigilo. Os resultados do estudo serão sempre apresentados como o retrato de um grupo e não de uma pessoa. Dessa forma, você não será identificado, quando o material de seu registro for utilizado, seja para propósitos de publicação científica ou educativa. A identificação do material coletado nas duas entrevistas gravadas será feito apenas com as iniciais do seu nome completo e todo esse material será armazenado em arquivos pertencentes ao pesquisador, cujo acesso é restrito somente ao mesmo. Sua participação neste estudo é muito importante e voluntária. Você tem o direito de não querer participar ou de sair deste estudo a qualquer momento, sem penalidades ou perda de qualquer benefício ou cuidados a que tenha direito nesta Instituição. Você também pode ser desligado do estudo, a qualquer momento, sem o seu consentimento, nas seguintes situações: (a) você sofra efeitos indesejáveis não esperados. 167 (b) o estudo termine. Em caso de você decidir retirar-se do estudo, favor notificar o pesquisador. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, coordenado pelo Prof. Heloísio de Resende Leite, que poderá ser contatado em caso de questões éticas, pelo telefone: (31) 33194517 ou e-mail: [email protected]. O pesquisador responsável pelo estudo poderá fornecer qualquer esclarecimento sobre o estudo, assim como tirar dúvidas, bastando contato o seguinte contato: Nome do pesquisador: Letícia Viecili Pereira Landi Endereço: Rua São João Evangelista, n0 226/ apt. 05. Bairro São Pedro. Cep. 30330-140 Telefone: (31) 88760508. E-mail: [email protected] Declaração de Consentimento Li ou alguém leu para mim as informações contidas neste documento antes de assinar este termo. Declaro que toda a linguagem técnica utilizada na descrição deste estudo de pesquisa foi satisfatoriamente explicada e que recebi respostas para todas as minhas dúvidas. Confirmo também, que recebi uma cópia deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Compreendo que sou livre para me retirar do estudo em qualquer momento, sem perda de benefícios ou qualquer outra penalidade. Dou meu consentimento de livre e espontânea vontade para participar deste estudo. ______________________________________________________________________ Nome do participante (em letra de forma) __________________________________________________________ Assinatura do participante ou do seu representante legal ________ Data Obrigada pela sua colaboração e por merecer sua confiança. __________________________________________________________ Nome (em letra de forma) e Assinatura do pesquisador _________ Data 168 ANEXO 2 – QUESTIONÁRIO PERFIL QUALITATIVO DO PACIENTE IDOSO SUBMETIDO À CIRURGIA CARDÍACA NO HOSPITAL VERA CRUZ S/A 1. Data: ____/____/____ 2. Iniciais do nome: ______________________________________________________ 3. Convênio: ____________________________________________________________ 4. Reside em: ___________________________________________________________ 5. Tem facilidade para vir ao Hospital Vera Cruz S/A? (1) sim (2) não 6. Possui telefone para contato? (1) sim (2) não 7. Outra forma de contato: (1) e-mail (2) correspondência simples (3) telegrama (4) fax (5) outro: ______________ 8. Idade: (1) 60 a 65 (2) 65 a 70 (3) 70 a 75 (4) 75 a 79 9. Sexo: (1) Masculino (2) Feminino 10. Tipo de cirurgia: (1) CRVM (2) Troca Ao (3) Troca Mi (4) Dupla troca (5) Outra:_______________ 11. É a primeira cirurgia que faz? (1) Sim (2) Não 12. Ano da primeira cirurgia: (1)1980 a 1985 (2)1985 a 1990 (3)1990 a 1995 (4)2000 a 2005 13. Tipo da primeira cirurgia: (1) CRVM (2) Troca Ao (3) Troca Mi (4) Dupla troca (5) Outra:______________ 14. Estado civil: (1) solteiro (2) casado (3) divorciado (4) viúvo 15. Possui filhos? (1) Sim (2) Não 16. Possui netos? (1) Sim (2) Não 17. Profissão: ___________________________________________________________ 18. Em exercício profissional? (1) Sim (2) Não 19. Aposentado? (1) Sim (2) Não 20. Exerce outro trabalho? (1) Sim (2) Não 21. Renda Mensal: (1) 1 à 5 salários (2) 5 à 10 salários (3) 10 à 15 salários (4) 15 à 20 salários (5) Mais de 20 salários 22. Possui dependentes? (1) 1 à 2 (2) 2 à 4 (3) 4 à 6 (4) Mais de 6 23. Orientação religiosa: __________________________________________________ 24. Escolaridade: ________________________________________________________ 169 ANEXO 3 – ENTREVISTAS Primeira entrevista Data da entrevista: 24/03/2008 Tema: Expectativa do Paciente idoso diante da cirurgia cardíaca recente _ Nós vamos conversar a respeito daqueles fatores, né? Que o Senhor acredita, né? Qual que seria o caminho que o Senhor percorreu que levou o Senhor a percorrer até chegar a... a questão de ter sofrido o infarto, de precisar fazer uma cirurgia? O Senhor falou que teve... _ (Interrupção da fala de Letícia por Geraldo): É... segundo médicos... _ Hum... _ A única resposta que eles me dão pode ser hereditário... _ Hum hum... _ Agora sendo que a minha saúde de um modo geral há mais de 30 anos eu faço exames geral, nunca tive pobrema nenhum! _ Hum, hum... _ Colesterol, glicose e etc, etc, etc, sempre foi excelente! _ Hum, hum... _ Agora eu a... acredito que pode ser a situa... a situação, né ? De, de, de, de... excesso de trabalho, excesso de preocupação porque o comércio é muito estressante, né? E veja bem eu fiquei 23 anos como representante... é estressante.... e 16 anos dentro de uma loja é estressante e meio, então eu acredito que isso tudo foi acumulando, né? Até formar um poblema sério lá na frente. _ Então o Senhor acredita que isso tem a ver com estresse...? _ (Interrupção de Geraldo falando ao mesmo tempo em que Letícia disse a palavra estresse e em tom mais alto): ANSIEDADE! _ (Letícia continuando repete com calma): Ansiedade... _ (Geraldo interrompe novamente): É... porque se eu for falar muito aqui eu acho que essa fita vai ser pouca. _ (Letícia interrompe e fala): Não! Pode falar a vontade! _ (Geraldo continua falando ao mesmo tempo em que Letícia e diz com certa tensão): Nós... Nós vamos partir pra política. 170 _ (Letícia solta uma risada procurando descontrair a tensão, mas Geraldo continua): Que segurança que eu tenho no país? _ (Letícia concorda): É... _ Depois de trabalhar, trabalho desde 8 anos de idade, eu tenho 64 trabalho há 57 anos (Geraldo diz 57 anos com um tom de sobrecarga) e não vejo a possibilidade de ficar dentro de casa vendo uma televisão... e nem agora! Tô só esperando melhorar é LÓGICO (Geraldo diz lógico em tom alto) meu pique de trabalho vai ter que diferen...ser diferenciado, mas falar PAROU (Geraldo diz parou em tom alto) eu não vejo essa possibilidade... tenho que continuar de uma forma ou de outra... administrando meus negócio. _ E... em termos dess... da sua expectativa com relação a essa cirurgia cardíaca recente, como é que o Senhor está se sentindo após ter realizado essa cirurgia? Sentindo que eu digo assim é... _ (Geraldo interrompe Letícia afirmando): Fisicamente muito bem. _Hum, hum... _ Agora a parte emocional funciona muito, né?A gente fica na...naquela expectativa, né? Será que vai dar certo? Até quando? Porque como eu disse há pouco, eu ainda não tenho condição de... de esperar a banda passar, eu tenho que tá no meio da banda... infelizmente... ( Geraldo diz infelizmente com certo pesar). _ E...com relação a essa questão emocional...é... o quê que o Senhor? Assim... o que quê o Senhor? O Senhor tem algum temor, o Senhor tem alguma restrição, algum medo? Fala um pouquinho mais pra mim sobre isso... _ (Geraldo inicia a resposta negando): Não, medo eu sempre tive.... de ficar.... preso numa cama, né? Sem poder... ajudar nada precisando de ajuda de outro. Enquanto tem gente que fala: Ah! eu tenho medo de morrer! (Geraldo diz essa frase imitando uma terceira pessoa e conclui afirmando com conviccão): Jamais passou isso pela minha cabeça! Então eu acho que a morte é o fim de alguma coisa aqui na terra, né?Agora quanto a.... a outra questão... a gente tem esperança que...essa operação vai... ela parece que foi bem sucedida....que ela ainda vai me dar um pedaço de tempo para poder concluir uma parte do sonho, né? Porque 64 anos você ainda tá sonhando. _ Com o que quê o Senhor sonha ainda? _ Ah... é objetivos, né? _ (Letícia pergunta): Quais? 171 _ (E, Geraldo parece nem ouvir a pergunta e fala ao mesmo tempo em que Letícia e continua): Ver mais netos, ver meus filhos bem encaminhados na vida, ver minha esposa bem encaminhada... _ Então a morte não é uma coisa que o Senhor teme, o Senhor teme é morrer e não ver? _ Não, Não! _ Não ter a realização daquilo que o Senhor sempre quis... ? _ Não, não! _ Seria isso? _ Morreu mesmo se não realizou infelizmente vai ficar pra quem, quem estiver aí é que vai ter que se virar, né? _ Hum, hum... _ Não vai ter mais ajuda, né? Agora eu tenho medo sim... de ficar numa cama, né? _ Ficar depe... _ Ficar plégico ou tetraplégico não sei como é que seria, né? _ Hum, hum... _ Isso aí eu receio, eu tenho receio. _ Hum, hum... _ E... como é que o senhor imagina agora, depois que o Senhor operou que vai ficar a sua convivência familiar, sua convivência com os amigos... o Senhor acredita que vai ficar como está ou o Senhor quer....? _ (Geraldo interrompe Letícia e responde): A.... a gente passa a dar mais valor a muita coisa que passava despercebida, né? _ Hum... _O telefonema de um amigo, o cumprimento de um amigo... fica diferenciado... de um vizinho... uma ajuda ao próximo... né? Porque infelizmente... a mídia tem ensinado todo mundo: dá não que esse aí e vagabundo! Ajuda não porque não faz nada! Então a gente tem que usar um pouco daquilo: “dar e não olhar a quem”. _ E.... se o Senhor pudesse voltar há um tempo atrás, o quê que o Senhor faria, poderia ter feito, o quê que o Senhor gostaria de ter feito que o Senhor acredita que pudesse ter evitado o Senhor ter dois infartos, ter feito uma cirurgia cardíaca... tem alguma coisa assim? _ NADA! Fazia a merma coisa. Sempre fui atleta, joguei bola até 54 anos de idade, disputei campeonato pelo Cruzeiro de natação durante 6 anos, nunca fui sedentário, de bebida... 172 _ Hum, hum... _... durmi tarde, sempre tive uma vida mais ou menos regrada... _ Hum,hum... _ Tive um período sim! Que eu fumava... eu fumei mais ou menos até trinta... e dois anos de idade... _ Hum, hum... _ Dos 16 até os 32 anos de idade, então tem 31 anos que eu não fumo. Foi a única coisa que eu poderia falar assim que... se eu voltasse o tempo que eu não faria novamente. O resto eu acho que a minha vida seria a mesma. Quanto à questão assim de comportamento... relacionamento... é muito difícil, né? Você falar eu... seria diferente,né?Acho que cada um tem um modo de pensar, modo de viver, senão, não havia evolução... se todo mundo fosse igual a gente morava numa caverna ( Letícia dá uma risada curta e baixa) saía de manhã cedo ia lá e caçava, voltava, comia e dormia. Eu acho que tudo é necessário na vida... até os trancos.... _ Pra gente ir aprendendo, né? _ Com certeza... _ E, como é que o Senhor acredita, imagina aliás, que vai ser sua vida daqui, nos próximos dias? Que eu sei que pode... _ (Geraldo interrompe Letícia e segue dizendo): Eu imagino que ela vai ser um pouco mais regrada, né? Com relação a trabalho. _ A trabalho, né?... _ Com relação a preparo físico.... tem que tomar mais cuidado, né? Com determinadas coisa. _ O Senhor fala a respeito de alguma atividade física mais regular essas coisas? _ Aah.... com certeza...viagens longas de automóvel... não acredito que, não sei só o tempo vai dizer, né? Eu adoro pegar uma estrada...e ... saí, né? Agora não sei... não seria idiota de fazer força física pra poder provar que eu estou dirigindo, né? Se tiver condição eu vou, se não tiver, que hoje tem muita facilidade pra você passear de ônibus né? _ É isso é verdade, hoje a facilidade é muito grande, mas existem certos... _ (Geraldo interrompe Letícia e diz): O meu roteiro eu quero colocar! _ (Letícia continua sua fala): Existem certos prazeres na vida da gente que... a gente não precisa se privar tanto deles não, porque dependendo da sua situação, né? Da avaliação médica que você vai receber daqui uns dias eu não acredito que viajar.... viagens 173 longas... não seja permitido não, sabe? Acho vai depender muito da sua resistência e da sua capacidade realmente, né? Mas... não vamos perder as esperanças né, Senhor Geraldo? _ Com certeza... _ Já é pouca coisa que o Senhor gosta de fazer, né? (Risos descontraídos de ambos). Não pode deixar! Papai também gosta muito de viajar. Ele, viaja bastante e, depois que ele operou ele continuou viajando bastante também, viajando muito! _ Ah! É muito bom... _ Ele gosta de pegar o carro e viajar mesmo.... _Conhecer pessoas... _ É.... _ (Nesse momento a esposa Leda entra na sala e pergunta para Letícia): Ele também teve isso Letícia? _ (Letícia responde): Ele já operou. _ (Leda pergunta): Foi cedo? _ (Letícia responde): Ah... já tem uns dez anos... _ (Leda se impressiona): Dez anos! Nossa! _ (Letícia diz): Ainda era novo... ele tinha cinquenta e poucos anos. _ (Leda diz): É mesmo? Aí tá vendo! Bom, né? _ (O diálogo agora volta para Geraldo e Letícia pergunta): Mas... com relação a sua parte espiritual Senhor Geraldo, o senhor acha que te tocou de alguma forma essa cirurgia? O Senhor acha que o senhor teve alguma.... _ (Geraldo interrompe Letícia e diz): Olha é, no início aí você colocou no questionário o termo religião, tem alguma? E eu falei Católica. _ Hum hum... _ Então ra,ra... (Geraldo ri discretamente e diz): O brasileiro é muito cheio de mistura, né? _ É, a gente é... _Eu sou mais Espírita do que Católico... _ Hum, hum... _ Então eu aceito as coisas com muito boa vontade, com naturalidade... _Hum, hum... _ Eu tenho certeza que não tem nada por acaso. _ Hum, hum... 174 _ Então partindo desse princípio... ainda tenho aquele receio igual eu te falei... de... de cair numa cama e ficar sem poder ter atividade nenhuma, né? Mas fora disso, eu não tenho receio de mais nada. E a minha parte principal na minha casa aqui, eu acho que eu já cumpri... é lógico... tenho outros sonhos, mais desejos, TENHO! (Geraldo diz tenho com convicção, mas conclui): A prioridade passou. _ Prioridade era? _ Formar meus filhos. _ Formar seus filhos.... _ E aí cê pergunta: mas será que eles vão ficar bem ou não? Pobrema deles. É... eu quero aprender a estender minha mão e ajudar alguém até onde meu braço vai. A hora que não der pra ir mais, eu não faço força não que eu vou cair junto. 175 Segunda entrevista Data da entrevista: 12/07/2008 Tema: Prováveis transformações na vida do paciente idoso após a cirurgia cardíaca e seu impacto sobre sua qualidade de vida _ Senhor Geraldo o Senhor fez a cirurgia foi quando mesmo? _ Dez de... março. _ MARÇO! Dez de março, né? E como é que tá a vida Senhor Geraldo? _ Ó! Pra mim tá normal... como é... antes... Na mesma forma de antes da, da operação... _ Hum, hum... _ Eu peguei o mesmo ritmo novamente, né? _ Tá fazendo tudo do mesmo jeito? _ É... mais lento, né? Com menos intensidade... matando um pouco de horário de trabalho, né? Eu ia até as seis, sete horas da noite, eu vou até às quatro. Aí vou em casa, troco de roupa, vou fazer minha caminhada. _ O Senhor (Sr.) está caminhando diariamente? _ Tô diariamente. _ Coisa boa né, Sr. Geraldo? _ Só quando eu venho pra cá que... eu não animo! _ Aqui é muito morro, né? _ É. Muito acidentado as ruas aqui, né? Os locais de, de caminhar... em Sete Lagoas tem facilidade, né? Plaino, né? _ Lá é mais plano, né? Aqui te muito morro. _ Super plaino! _ É... deve ser gostoso morar lá né, Sr. Geraldo? _Muito bom! _ E, e...e o Sr. começou a caminhar com quanto tempo depois? Foi um mês ou dois? _ Não. Pouco mais de um mês. Foi com.... quarenta e cinco dias mais ou menos, quando ele me liberou, que ele falou que eu poderia dirigir com quarenta e cinco dias, né? Eu dirigi com quarenta e dois! Falei: Ah! Acho Três dias não vai fazer diferença de nada não... 176 _ Muito pouco, né? _ Aí em comecei a caminhar... dando uma volta na, na, na.... beirada duma lagoa, que ela tem mil e oitocentos metros quadrados, é... de extensão! Eu gastava.... QUASE QUARENTA MINUTOS pra dá uma volta! (Geraldo fala quase quarenta minutos em tom de voz alto e prossegue): Agora eu gasto vinte minutos pra dá uma volta. _ No começo o Sr. gastava quase quarenta, agora o Sr. já está gastando menos? _ É com vinte minutos eu faço a volta na, na, na... no trajeto lá... _ Então o Sr. condicionou rápido, ué? Com um mês mais ou menos o Sr. fazendo em quarenta minutos,depois.... _ (Geraldo interrompe Letícia): Não! _ Nem um mês, né? _ UMA SEMANA! _ É mesmo? _ Uma semana. Aí eu senti que tava pouco. A caminhada tava sendo muito rápida e eu... senti que precisava caminhar mais. Embora eu detesto caminhar, né? Nunca gostei! _ É o Sr, me falou da outra vez.... _ (Geraldo interrompe Letícia): Eu gostava de praticar esporte... mas, exercício.... _ (Letícia interrompe Geraldo): E caminhar por caminhar é ruim, né? Tem que ter uma disciplina danada.... _ Agora já tô acostumando.... já sinto falta, sabe? _ É... é...que nem.... começou, né? Exercício é assim a gente começa e depois não quer parar.... _ É... faz falta.... _ E o Sr. tá caminhando quanto tempo agora? _ Eu dou duas volta. _ É aí dá quarenta minutos, né? _ É que o próprio médico falou ó: “não força muito não!” _ É...é bom....tá bom... _ Então eu faço duas voltas eu tô gastando... na segunda é mais lenta que a primeira. Se a primeira eu faço ela em vinte minutos, na segunda eu faço em... vinte e cinco a vinte sete, vinte oito minutos mais ou menos... _ Hum, hum.... _ Pra não forçar muito, né? 177 _ O Sr. achou que depois da cirurgia o Sr sentiu melhor? Ou a mesma coisa? O Sr. não tinha sintoma? _ Não sinto diferença de nada... de nada. _ Mesma coisa. _ Mesma coisa. _ Dor, nada? _ Não. Nem no dia eu posso falar que eu senti dor. Eu sinto que o peito ainda tá anestesiado, né? E umas bobagem que andei fazendo, uns pesozinho a mais aí. Eu senti que pode prejudicar alguma coisa, né? _ O Sr. carregou peso? _ Ah... carreguei... _ É que não...assim ... _ (Geraldo interrompe Letícia): Apertar parafuso, por exemplo... cê faz muita força com o antebraço, né? _ É.... _ E parece que... _ (Letícia fala ao mesmo tempo que Geraldo): Força, né? _ Força o peito, né? As costas, né? Não... não me senti bem não, mas logo no dia seguinte já... já tinha voltado ao normal. Fiquei indisposto no primeiro dia de ter feito um esforço a mais. No segundo dia... eu... tava normal... _ É porque na verdade, o esterno, né? Depois que ele é cerrado ele só é preso com, com clipe né, com grampo, ele não consolida mais não. Ele é um osso que depois que cê corta ele não volta mais. _ (Geraldo interrompe Letícia com tom de brindadeira): É perigoso... _ (Letícia continua): MAS.....a própria.... _ (Geraldo interrompe rindo): Cê mexe com energia elétrica.... _ (Letícia entra na conversa descontraída de Geraldo): Tomar choque por dentro né, Sr Geraldo? _ Com certeza.... _ ( E Letícia continua): Não é a mesma coisa, a musculatura também mexeu muito, né? Porque abre aqui o peito... (Nesse momento, Letícia retoma o assunto da entrevista): E como é que tá o convívio com a família... convívio com os amigos? _ Eu acho que eu fiquei um pouco mais nervoso. _ É mesmo? 178 _ É eu já era nervoso, né? Digamos nervoso e meio. Agora eu interei pra duas... dois nervoso, né? Era uma vez e meio agora é duas. _ Nervoso o Sr. fala impaciente, como é que é este nervoso? _ Menas paciência pra muita coisa, sabe? Principalmente pra atendimento a viajante... tem uns que é meio aborrecido... _ Hum, hum.... _ Então antes eu tinha mais jogo de cintura pra... é... digamos assim pra... tole, a tole, tole... tolerar, a... aquela insistência de querer vender a mercadoria, de querer contar caso, então não é todo caso, não é todas pessoas que eu... eu aceito assim com facilidade mais não, sabe? Não sei se é a idade que a gente vai ficando chato, né? Então parece que sem querer por dentro ocê começa a... a...(Geraldo faz uma pausa longa e reflete): Escolher tipo de assunto, tipo de convívio com pessoas que mais te agradam, né? Que eu acho que todo mundo, nem todo mundo consegue agradar todo mundo, né? _ Às vezes algum amigo que já é mais íntimo, né? A gente tem um pouco mais de paciência.... _ É mesmo uma pessoa estranha... que você convive naquele momento com ela ali cê tem um pouco mais de paciência... e conforme a pessoa hoje eu já... já demonstro que já... tiver uma roda de amigos assim eu já, tô dando até logo e tô saindo e vô embora por que já não tem... é a falta de paciência, de tolerância. _ E quanto a família assim, sua esposa, seus filhos, o Sr. acha que mudou alguma coisa? _ Não! Eu acho que o apoio da família foi muito essen... foi essencial, né? Pra minha recuperação. E psicologicamente... também! Embora... de vez em quando eu dou uns tranco, sabe? _ (Letícia então pergunta em tom de brincadeira): Dá uns gritos Sr. Geraldo? _ Não, não é grito... é... ser mal educado mesmo, né? A verdade é essa aí é mal educado. As má resposta, né? Mas o pessoal passa por cima e.... _ Família é assim mesmo... (nesse momento, Letícia ri para descontrair a conversa). _ (Geraldo continua): E vai levando... _ Todo mundo é assim né, Sr. Geraldo? _ Então o apoio que eu acho nessa parte aí é essencial, sabe? _ E assim, quando o Sr. olha assim pros seus, seus filhos, pra sua esposa hoje em dia, o Sr.sente alguma, algum sentimento diferente? O Sr. sente asssim... não vou especificar qual sentimento não... mas alguma emoção....? 179 _ Olha eu acho que eu sei onde cê quer chegar...talvez eu saiba....a...a....aquela emoção que você NÃO (Geraldo fala não com ênfase) poderia tá aqui hoje conversando com seus filhos ou com sua esposa, né?Que que o cê sente que... é de ter dado certo essa operação e você tá aqui convivendo com eles, né? É engraçado eu não sei se a vida vai ensinando tanto, sabe? Porque eu praticamente convivi sozinho... eu tenho facilidade de... VIVER SOZINHO! (Geraldo fala viver sozinho convicto). Meus filhos, já não tem essa estrutura. EU TENHO! (Geraldo fala eu tenho convicto). Porque eu sempre vivi mais só. Embora eu joguei bola em muitos time de futebol, pratiquei esporte muito no clube do Cruzeiro... é... é... grupo de maçonaria... foi mais de quinze anos que eu freqüentei... então, era pra ter assim uma convivência bem maior, reláptica, né? Um conhecimento de pessoas maior, né? Mas eu nunca curti assim aquela coisa muito tempo não! Acho que tudo é passageiro. É como uma escada: cê vai subindo, mas não olha pra baixo, não! Então quando olho a minha... me pergunta você... igual você me perguntou agora ( Nesse momento Geraldo fala como se ele fosse o entrevistador): “Cê sente alguma diferença cê vendo sua... conversando com sua esposa, vendo seus filhos?” ( Então Geraldo responde para si mesmo): O meu sonho ERA (Geraldo fala ERA com convicção): Em primeiro lugar: ter uma casa. Eu consegui mais do que isso. Segundo, a partir do momento que eu tive filhos é... colocar eles numa faculdade e eu consegui... todos três, formar...então eu me sinto um camarada realizado, feliz... então o resto pra mim é troco. _ (Letícia pergunta em tom de brincadeira): O Sr. acha que o Sr. está no lucro já Sr. Geraldo? _ TÔ. (Geraldo reponde tô com ênfase e continua): É... dentro do hospital, na, na no leito me perguntaram ( Aqui, Geraldo refaz as perguntas de terceiros e segue respondendo as mesmas): “ Ocê tá bem?” Toda hora me perguntava: “O Sr. tá bem?” Aquele apoio, né? Psicológico. “Cê tá sentindo alguma coisa?” Cê precisa de alguma coisa?”É... mesmo depois que eu saí do hospital muita gente: “Vem cá, cê viu alguma coisa?” “Cê foi pro outro lado?” (Geraldo responde com tom de estranheza): Que outro lado rapaz! Eu falei! Não tem outro lado não! Outro lado que eu vi foi enfermeiro, médico... sinceramente NADA! Diferente não! (Geraldo fala nada enfaticamente). “Mas, emocionalmente cê não ficou com medo de morrer, não?”NÃO! MOMENTO NENHUM! (Geraldo diz não, momento nenhum com convicção e segue reafirmando): Isso aí comigo não aconteceu não! 180 _ É o Sr. me relatou na outra entrevista que o medo maior do Sr. era ficar dependente, né? _ (Geraldo responde alto): AAAAAAH! _ Ficar numa cama.... Ficar dependente de terceiros... _ Isso aí sim! Isso falo mesmo! Falo mesmo! _ Isso a gente fica meio ressabiado mesmo, né? _ Ah, a gente tá vendo hoje ninguém tem condição de, de.... há pouco tempo um filho podia para cuidar de um pai, até mesmo a esposa cuidar do marido... o tempo hoje...obriga todo mundo a não ter tempo, né? _ É isso é verdade, o tempo hoje é muito corrido, né? _ Demais! _ Tudo adquiriu um... internet... é comunicação da televisão hoje por satélite, né? Tudo muito rápido, né? Isso faz, reflete na vida da gente, né? _ Com certeza! _ E aí acaba que... hoje se resolve tudo por celular, você acha a pessoa no celular, né? Não tem nem telefone em casa mais você já consegue falar com a pessoa em qualquer lugar.... _ É... _ Às vezes uma coisa que antes você dependia de um telefonema que cê ia receber, e o telefonema às vezes cê não tava em casa, recebia depois, dava pra resolver mais tarde, agora tem que resolver na hora.... _ É, eu ainda sou do tempo da carta, né? Ter o telefone era pra poucos, né? _ Telefone em casa era privilégio, né? _ Namorava... meu namoro foi por carta... trabalhava lá na USIMINAS em Ipatinga, né? Minha mulher em Sete Lagoas... às vezes era uma semana pra uma carta chegar na mão da gente... (Geraldo faz uma pausa longa e conclui): A minha vida é uma epopéia, sabe? _ (Letícia solta risos descontraídos). _ (Geraldo conclui em tom de orgulho): Eu acho que ela foi excelente! _ (Letícia comenta): Que bom... _ Eu gostaria de passar... tentar... (Geraldo dirige perguntas para si mesmo e responde logo em seguida): “Passaria tudo novamente assim na?” “Cê gostaria?” Eu Gostaria... gostaria sim... (Geraldo faz uma pausa e diz): Fui criado numa situação muito difícil, eu perdi meu pai com... PERDI NÃO! Meu pai deu TCHAU, ADEUS! Eu fui com ele até 181 no ponto do lotação. NUNCA mais eu vi! Eu tinha sete anos de idade! (Quando faz esse relato, Geraldo pronuncia as palavras que estão em maiúsculo, num tom alto manifestando certa revolta. E, em seguida reflete e conclui): Não se se isso aí poderia refletir futuramente é... psicologicamente, né? Porque eu não tenho condição de fazer uma análise da minha pessoa, né? O quê que seria COM ELE AQUI ou... e... o que É sem ele aqui, né? (Geraldo faz outra pausa e fala): Eu me considero normal. Acho que pra mim foi uma dádiva porque, acho que nada acontece por acaso... isso aí a gente tem um.... o ser humano ele tem um poder de força tão grande que ele nos momentos mais difíceis, né? Como o Católico diz: se Deus fecha uma janela ele abre uma porta, né? E a vida é assim mesmo... você tem uma força tão grande por dentro que não existe situação NENHUMA! (Geraldo diz nenhuma com bastante ênfase) Que você não consegue resolver não... ou ultrapassar! _ Você acha que.... _ (Geraldo interrompe Letícia e diz alto e com convicção): A MINHA VIDA TODA FOI ASSIM! _ A, a, força que o Sr. acha que o Sr. tem por dentro...que a gente tem por dentro... _ (Geraldo interrompe Letícia novamente corrigindo-a): Eu não! NÓS TEMOS! _ (Letícia acata a correção e continua): Nós temos, né? _ (Geraldo concorda e acata): Nós temos... _ O Sr. acha que ela vem daonde Sr. Geraldo? _ Da força de vontade. _ Da pessoa MESMO? (Letícia pergunta dando destaque a palavra: mesmo). _ Da crença de você acreditar em você: EU POSSO, EU QUERO! EU VOU FAZER, EU VOU SER! Eu acredito que... você pode não acredi... não, não obter aquilo de imediato, mas a, aquela, aquela coisa vai materializando até você adquirir. _ (Letícia reflete): É mais a força do pensamento mesmo, né? _ Com certeza! _ Se você parar pra pensar é assim mesmo, né? _ Eu acho. _ A gente pára na vida e começa a pensar muito e num... num...põe pra frente e não vai, parece que a vida não anda também.... _ Com certeza! _ Você começa a pensar demais.... 182 _ Porque a vida de muita gente que tem facilidade nas coisas... cê vê puxa vida! O camarada aí é inteligente poderia ser um grande médico ou um grande engenheiro... e no entanto não é, né? Porque teve facilidade em tudo, não precisou de desenvolver nada, né? Como também tem o rico também que consegue superar o pai, né? Na parte financeira é... na parte social... superar no bom sentido, né? Se o pai chegou a subir uma escada de oito degraus, ele subiu dez! O neto dele pode subri doze! O Bisneto pode não subir nenhum... acho que a vida é lá... a vida é muito relativa viu?E no fundo eu acho que nós temos uma força, um poder... que a natureza nos concede que eu acredito que Deus é isso aí. É o todo. _ E...e... hoje em dia na sua vida tema algum aspecto, algum detalhe que o Sr. gostaria que acontecesse pra que a sua qualidade de vida fosse melhor? Ou então pra que a sua qualidade de vida mudasse pra outra coisa? _ (Geraldo faz uma pausa antes de responder e diz): Não... eu tô satisfeito com a qualidade de vida que eu tenho, sabe? Eu só não quero que ela... diminua... mas, não tenho ambição que seja mais do que isso também não. Agora se pudesse voltar o tempo, LÖGICO (Geraldo diz lógico com ênfase) que eu gostaria de ter uma coisa que me FAZ FALTA! (Geraldo diz faz falta convicto). Eu tenho inveja de quem consegue ainda correr atrás duma bola e jogar um futebol... _ Jogar futebol, né? _ É.... joguei até os cinqüenta e quatro anos de idade... ou pelo menos achei que joguei, né? _ (Letícia dá uma risada de descontração e diz): Mas é bom, né? É bom praticar um esporte que a gente gosta, né? _ Muito bom! Muito bom! _ Eu nadei muito tempo também! Dei uma parada agora, mas ano que vem vou voltar de novo... natação é bom, mas não é igual assim a um esporte coletivo, né? Esporte coletivo acho que gente fica assim mais animado, né? _ AH!!! Com certeza! _ Um vôlei, alguma coisa assim, igual futebol também que é um time, né? _ Equipe, né? _ É... _ Equipe... Aí cê tem aquela turma pra trocar idéia depois.... _ Tem que arrumar um grupo de veteranos lá em Sete Lagoas pro Sr. bater uma bolinha de vez em quando... 183 _ Ah! Mas pra mim não dá mais não, né? _ O Sr. acha que não dá não? _ Dá não. _ É pesado, né? _ É demais! _ Porque corre muito né, Sr. Geraldo? _ Corre bão, né? _ Ainda tem os, as, os chute dos outros que o Sr. ganha ainda, né? _ Não, não, eu fui assim muito passivo em tudo que eu fiz na vida, sabe? _ Hum, hum... _ Sempre lutei pra ser o primeiro! Nunca consegui ser o primeiro! Mas graças a Deus eu nunca fiquei do meio pá trás não. Em tudo! Então, a,a, força de vontade que eu falo, aquilo que você deseja, que cê vai imaginando, pensando, imaginando, sonhando... até aquilo acontecer... depende muito da pessoa, né? Tem que fazer seu lado. Força de vontade! Sentar e ficar pensando: Ah! Eu vou ter isso, eu vou ter aquilo. Vai ficar sentado o resto da vida, né? _ (Letícia solta um riso descontraído e diz): Só pesando, né? _ Aquilo vai só passar na sua frente! _ Só vai ficar nos desejos... _ Só nos desejos. _ E...o Sr. falou que trabalha, trabalhou muitos anos como representante e agora tá muito tempo no comércio, né? Já tem um tempo que o Sr, tá....então essa questão do Sr. já ter me relatado que tá mais impaciente, ficou mais nervoso... o Sr. acha que isso pode ser uma forma de defesa contra um estresse que o seu serviço gera para o Sr.? Vou dizer assim... aquele cliente que começa a te instigar e te cobrar e o Sr. já ta cansado disso... então assim, o Sr. acha que é uma forma do Sr. ta falando: Não, pera aí ta na hora de parar de ouvir isso que eu já escutei isso demais! Já me cansou! Como é que taria, por exemplo... vou ter refazer essa pergunta... o seu nível de estresse no seu trabalho hoje em dia? O Sr. acha que o Sr. tá lidando melhor com isso depois da cirurgia? O Sr. tá, vamos dizer assim, se preocupando um pouco menos com certas coisas que te deixariam mais nervoso? _ Não. Preocupando menos com as coisas eu não preocupo não, preocupo cada vez mais! Sempre preocupei muito, né? Cada vez mais! Sempre preocupei muito! Com tudo 184 que eu faço, com tudo que eu tenho. Igual eu te falei, eu nunca fui linha de frente, mas sempre procurei não ser aquele que tá lá atrás, né? _ Mas, se o Sr. se preocupa tanto... o Sr. já falou comigo assim na outra entrevista: que a sua prioridade era formar seus filhos, né? _ Isso! _ Ver seus filhos bem encaminhados, ver sua esposa bem encaminhada... pra que tanta preocupação Sr. Geraldo? (Letícia faz essa pergunta procurando descontrair Geraldo). _ Porque eu acho que a vida e a faculdade não deu pra eles o que me deu. É... de guentar a guerra, a batalha que existe fora da...depois que cê abre aquela porta da, da sua sala e sai pra rua... exige uma experiência... um aprendizado tão grande! (Geraldo fala tão grande com tom de sobrecarga e conclui): Que faculdade não te dá aquilo não! Então eu preocupo, eu tenho um filho no Rio de Janeiro, tem um outro que tá aqui, tem essa moça que tá... hoje ela tá comigo lá na loja, né? É... foi minha sorte que... por mais um dia ela já teria... talvez empregada, né? Mas ela teve que ir pra loja e tá lá comigo até hoje, sabe? Embora eu quero que ela vá pra área dela. Eu tenho certeza que ela vai conseguir a área dela. Mas, a, a preocupação ela é constante. Isso aí... como que ocê vai deixar de preocupar com um filho que tá morando lá no Rio de Janeiro? _ A preocupação sua é muito com os filhos, né? _ (Geraldo interrompe Letícia e continua perguntando e respondendo pra si mesmo): “Ah, mas o Rio de Janeiro é perigoso?” É. Belo Horizonte também é. “Contagem?” A estatística diz que é pior que Rio de Janeiro. Tá, mas se tiver minha turma... pudesse eu morar numa fazenda, igual era antigamente e construir uma casa pra cada um, eu faria isso! Seria uma galinha com os pintinho tudo do lado. _ Então também existe o fato preocupação de cuidado, né? Porque o Sr. é pai, a gente preocupa com as pessoas que a gente gosta, com as pessoas que a gente ama, e tem também o lado da preocupação financeira? _ Ah sim! Claro! _ O Sr. acha que é por isso que o Sr. às vezes se estressa muito no seu trabalho porque de repente o Sr.quer deixar alguma coisa a mais pra eles, ou então quer dar uma condição pra eles melhor? _ A parte financeira eu preocupo mais com a minha esposa. Com meus filhos não, porque eu acho que o caminho tá aberto pra eles... se não forem... é... independe de 185 mim... aí... acho que já é pobrema deles. Tem determinadas coisas que eu acho que a pessoa tem que separar, não é? Isso eu consigo separar. _ Hum, hum... _ Se eu puder dar, puder ajudar, eu vou dar e vou ajudar. Se eu não puder, eu não vou ter re... ressentimento por isso também não. Vou preocupar com isso não. (Geraldo faz uma pausa e reflete): Eu espero que dentro na minha casa sempre haja uma cama e um prato de comida pra comer! Se eles querem mais do que isso? Vão ter que sair à luta! _ Aí o Sr. já deu a... _ (Geraldo interrompe Letícia): Já tô preparado pra isso! _ Formou, né? Aquela sua preocupação maior de deixar tudo encaminhado... ter uma profissão, né? _ Eu fico preocupado com a experiência, né? Como eu disse, né? Isso aí conta muito! Conta muito! _ Mas experiência eles tem que pegar com a vida né, Sr. Geraldo? Ir trabalhando na, naquilo, né? _ É, mas a faculdade toma muito tempo da pessoa, né? Então... às vezes você sai dali com aquela cabeça de... com a teoria toda... e na esquina cê cai num conto do vigário, um troço bobo! Depois cê vai ver... (Geraldo em seguida fala como se fosse uma terceira pessoa): Gente, mas eu sou formado, um cara idiota daquele me passou pra trás! (Então conclui): É falta de experiência, falta de maldade... eu acho que tem tudo isso aí viu? _ É, sua preocupação, eu acho é uma preocupação normal de pai que tem que orientar, né? _ É. _ Os filhos e... _ É. _ E... assim como eu acho que os filhos também tem que buscar essa orientação, porque a experiência dos pais conta muito e o privilégio de quem ainda tem pais é muito grande né, Sr. Geraldo? Pra poder tá orientando a gente.... _ Igual quando eu chego no espelho, né? Não sei se já aconteceu alguém falar alguma coisa dessa forma... aí cê vê assim... cê ta todo remendado, né? (Geraldo volta a se perguntar): “Se sente alguma coisa? Mágoa? Ou um, ou um ressentimento?” (Geraldo faz uma longa pausa e diz EU com uma voz espremida e entonada): Eu! (Depois Geraldo solta um AH tipo de alívio): AAAH!!! Eu não aceito cem por cento isso não, 186 sabe? Porque eu tive uma qualidade de vida, eu FIZ (Geraldo fala fiz com orgulho) uma qualidade de vida, que se dependesse de mim... eu ia viver mais de 90 anos de idade! (Novamente, Geraldo volta perguntas e respostas para si próprio): “Já bebi?” Já. Moderadamente. “Esporte?” Sempre pratiquei. “Dormir?” Eu sempre gostei de dormir no mínimo de oito horas por noite. Trabalhava muito, mas dormia bem! E comer também, sempre procurei comer comidas mais sadias. Agora aconteceu, porque Deus quis, né? _ Tem o fator também hereditário, né? Que o Sr. mencionou, que os médicos também falaram.... _ Hereditário eu acredito que... não sei se eu expliquei bem na época...são poucos casos na família... de pobrema de coração. Até meu último exame eu tava preocupado com... que o médico pediu que eu fizesse um exame três meses após a cirurgia, né? Os meus resultados foram os MESMOS que eu fiz um mês antes da cirurgia. Tudo cem por cento! (Geraldo fala mesmos com ênfase). _ Normal, né? _ Normal. _ Agora como ele fala, né? Meu organismo tem facilidade de, de... absorver a gordura nas artérias, né? _ O Sr. tem uma certa tendência, né? _ Uma tendência. _ Varia muito de pessoa para pessoa também... _ É com certeza, talvez se eu tivesse pobrema de colesterol alta ou uma glicose alta... não tivesse chance de nem ser operado, né? Com as artérias do jeito que elas tão, né? _ E o Sr. fez seis pontes, né Sr. Geraldo? _ Foi.... acho que foi quatro safena e uma mamária, né? _ Então foram cinco, né? Cinco pontes.... É... mas, o Sr. tá bem....tô gostando de ver.... corado.... _ É... eu sinto normal, tanto quanto antes, sabe? _ Dormindo bem....? _ Tem dia que não! Tem dia que eu acordo três horas da manhã assim, eu.... vejo o dia até amanhecer. Mas, no outro dia eu já posso deitar onze horas da noite que eu vou direto até sete horas da manhã. _ O Sr. acha que o Sr. é um pouco ansioso Sr. Geraldo? _ Ah sou! 187 _ Às vezes é... pode ser isso, né? Que o Sr. não dorme.... _ Até um encontro que eu marco com uma pessoa sempre foi assim (Geraldo então fala na terceira pessoa): “Ah! Nós vamos encontrar em tal lugar tal” (e responde) Cê diz: tudo bem. Eu nunca precisei de despertador pra sair! Nem período de viajar... às vezes eu ia pra ver o estado do Rio virava pra mulher falava: amanhã QUATRO horas eu vou levantar! Tanto pra trabalhar, quanto quando a gente ia passear, quando a turma era menor, né? Viajava pro Espírito Santo, pra praia. Nunca precisei de despertador! Eu acordo na hora certa! Eu acho que isso preocupação, né? _ (Geraldo fala eu acho que isso é preocupação, né ao mesmo tempo em que Letícia fala): Tem um reloginho biológico, né? _ (Geraldo então completa a frase eu acho que isso é preocupação, né?) :Que se transforma num do relógio biológico, né? _ Preocupação que virou um relógio biológico? _ Eu acho que sim! _ Tem a ver com ansiedade, né? A gente já fica preocupado com a hora a ansiedade vai gerando, então já fica com aquilo na cabeça já acorda na hora. Às vezes nem dorme direito! _ É, pessoal fala muito de estresse, estresse... eu...eu não sei bem o quê que é estresse não, sabe? (Geraldo faz uma pausa longa pensa e diz): Estressado quem não é estressado? _ Estresse é uma sobrecarga de estímulo. _ Pois é, mas eles falam que... a pessoa... tem receio das coisas... afasta das pessoas, acha que nada vai dar certo... eu pelo menos eu mudei de profissão mais de cinco vezes e todas que eu mudei foi com sucesso! (Geraldo faz uma pausa e diz com orgulho): Encarei e deu certo! Eu acho que se eu tivesse aquele estresse que eles falam que existe por aí, da forma que falam não teria sucesso em nada, né? Nem teria mudado, né? _ É porque o estresse ele é... o que que ele é? Ele é um excesso de estímulo, a pessoa ela vai sendo estimulada de todas as formas, em todos os campos, né? Normalmente tem muito a ver com a questão do trabalho... ele começou com essa questão do trabalho da pessoa trabalhar muitas horas, descansar poucas horas e ser muito cobrada, então é sempre um estímulo que deixa a pessoa sob pressão.Então ela começa a adotar certas, certos escapes: um,um estressa e vai beber demais, outro fuma demais, o outro se isola, né? Do convívio social. O outro não, ele tem um comportamento mais eufórico. Mas, normalmente essas pessoas elas não tem é... geralmente elas são mal 188 humoradas....é...tão sempre com aquele semblante pesado, sabe? Ou tem algum outro sintoma físico mesmo, começa a ter dor... então são manifestações que depende de cada pessoa como que ela vai reagir ao excesso de estímulo. Então, tem pessoas que não tem manifestação externa nenhuma e interiorizam o estresse e acabam desenvolvendo algum tipo de doença, né? Ou desenvolvem uma, eles falam muito da LER, uma lesão por esforço repetitivo tem muito a ver com estresse... as próprias doenças cardiovasculares tem a ver com o excesso de estímulo... porque o organismo começa a reagir de uma outra forma, então aí acaba desenvolvendo certos mecanismos de adaptação que não são normais e levam a certas doenças, né? Então hoje em dia está sendo muito estudado por isso, por que... existem doenças que não tem causa aparente e quando eles vão investigar a fundo, tem um certo, um certo fundo emocional muito ligado a causa da doença. Muitas doenças que pacientes já fizeram “ene” tratamentos com “ene” medicações não melhoraram, quando foram pra fazer análise com psicólogo, ou mesmo terapia de grupo: SOLTAR AQUILO PRA FORA! (Letícia diz essa frase com ênfase e continua): Começaram a ter melhora... da doença... então, tem muito a ver... por isso todo mundo fala muito em estresse, né? Também virou um certo modismo, né? Todo mundo fala que tudo é estresse! Né? _ É.... cê falou cobrança aí. Acho que quem é honesto e procura adquirir seu espaço é o maior cobrador de si próprio.... _ A auto-cobrança... _ Auto-cobrança... Eu... (Geraldo pára, pensa e faz uma auto-reflexão): não, não, conheço uma pessoa que não se cobre não! E a satisfação que cê tem que dá de tudo, né? A você mesmo, né? Eu fiz isso certo, não! Eu fiz errado, não posso fazer mais assim...eu tenho que fazer isso, tenho que fazer aquilo, sempre cobrando, né? Acho que cê paga um alto preço, né? Por ser RESPONSÁVEL pelas coisas, né? (Geraldo diz responsável com ênfase e conclui:) Que o irresponsável....ele é totalmente feliz! _ É porque a gente não é uma ilha né, Sr. Geraldo? Se a gente fosse uma ilha talvez a gente não se cobrasse tanto, mas existe a sociedade também, né? Que a gente convive com, com uma sociedade... _ Infelizmente! (Geraldo diz infelizmente com pesar e segue refletindo): Ah! Ninguém tem nada com minha vida! Que bobagem! Tem sim! Pode fazer besteira não! Tem um vizinho do lado esquerdo, lado direito... tem seu parente. Todo mundo tá te olhando... e ai de você, cê convive cinqüenta anos na LINHA RETA, o dia que ocê fizer uma 189 bobagem todo mundo esquece os cinqüenta anos que cê foi um camarada CORRETO! (Geraldo diz correto com ênfase). Só vão lembrar do dia que ocê errou! É duro, né? _ (Letícia concorda tentando amenizar o clima de tensão): É a vida cobra muito da gente, né? _ Eu comecei a ler um livro agora que... eu já fui e voltei na décima quinta página é... JUNG! (Geraldo fala JUNGUE). _ Carlos Jung, Yung, né? Que eles falam? _ É... Carlos é...Jorge...Jungue, né? _ É... JUNG: Jota, u, ene, gê. Né? ( Letícia soletra e pede confirmação). _ É. Eu considero ele o pai da Psicologia, né? É meio complexo o livro isso aí falando EXATAMENTE o que cê ta falando aí! (Geraldo fala exatamente convicto) Que cê acabou de falar aí! Que tudo é... são efeitos e causas, né? Você mesmo provoca... (Geraldo faz uma longa pausa e completa): seus deslizes, suas doenças, seus pobrema... _ Mas ele...a...ele volta uma reflexão pra dentro... _ (Geraldo não espera Letícia completar e diz): Reflexão pra dentro de si próprio. _ De si mesmo... a partir de sua auto-reflexão ele estaria analisando a sua vida? A vida que eu falo assim a própria vida, aquilo que você tem... simboliza... aquilo que você cria pra você mesmo? _ Exatamente. Com certeza... tô entendendo mais ou menos o livro por aí também! _ Como é que chama o livro o Sr. sabe? _ Não sei... ta lá em Sete Lagoas! Esse livro eu tenho que ler ele uma série de vezes! _ É difícil, né? _ EU ACHO! (Geraldo diz eu acho com convicção). _ Mas é bom que... _ (Geraldo interrompe Letícia e diz): Porque não adianta ocê passar página por página sem... _ (Letícia tenta completar pra Geraldo): Sem parar pra refletir. _ (Mas, Geraldo completa de outra forma): Sem entender na íntegra, né? (Após uma breve pausa de silêncio, Geraldo começa a pensar em voz alta tentando lembrar o nome do livro): A.. .O pensamento de JUNG... é... não lembro o nome do livro não.... _ Ele fala basicamente sobre a essência do ser? _ É, ele começa a contar uma história que ele... conheceu....que ele conheceu.... em mil quatrocentos....quer dizer é recente....em mil quatrocentos e sessenta? Vai dar pouco mais de cem anos, né? 190 _ (Letícia tenta ajudar): Mil novecentos e sessenta? _ Não, mil quatrocentos... (Geraldo faz uma longa pausa tentando lembrar e diz em tom de reflexão): JUNGUE.... será que eu tô confundindo com outro livro que eu tava lendo? Agora eu não sei se é mil quatrocentos e sessenta ou mil novecentos e sessenta? _ Deve ser mil novecentos e sessenta, porque ele não é.... _ (E Geraldo interrompe Letícia buscando mostrar conhecimento): Não! A Psicologia ela, ela já existia... _ (Letícia discorda): Não! _ (Geraldo insiste): Em mil quatrocentos Ela já existia! _ (Letícia então afirma): Mas esse autor não é dessa época não. _ Então, em mil novecentos e sessenta ele tava com oitenta e quatro anos já de idade então. Mil novecentos e sessenta... mil oitocentos e... oitenta e... setenta mais ou menos ele era estudante. É por aí... Até me parece que... ele na França ele conheceu o pai da, da, da... que a gente considera o... primeiro impulso do Espiritismo, né? Allan Kardec. (Geraldo reflete e diz): Engraçado e Allan Kardec era meio... bagunceiro, né? _ (Letícia ri descontraída). _ Mulherengo. _ (Letícia diz ainda em tom de descontração): E sobrou essa missão pra ele, né? _ Eu tô umas três vezes um... começo a ler um, vou lá, volto pro outro. _ (Letícia ri desconstraída novamente). _ Mas esse te chamou a atenção porque você citou ele, do Jung? Yung? _ É ele... eu acho que ele me impressionou, sabe? _ É? Te impressionou por causa desse conteúdo que o Sr. falou da reflexão sobre si mesmo? _ Ah! Reflexões é... sobre si mesmo...aquilo que eu já pensava, mas não sabia como explicar... a força interna que a gente tem, né? Que temos uma força que a gente não sabe o tamanho dela... _ Ele fala sobre isso no livro? _ Fala... fala... _ Ele dá algum nome pra essa força? Ele chama de alguma coisa? _ Não! Força interior mesmo. _ Força interior... _ Força interior... E me parece que daí pra frente ele quer... é... ele estuda... no hospício ele vê pessoas que conseguiram... ele entra no hospício, camarada babando 191 aquela coisa toda, mas ele foi separando por grupo a habilidade que alguns tinham pra... digamos assim, pra pintura, pra escrever... então, tá,tá, meio confuso ainda não tá... _ (Letícia interrompe Geraldo e completa): Ainda não, não chegou no... _ (Geraldo continua): Eu vou ter que voltar pra ler ele novamente senão... _ É, pra poder refletir, né? É mas esses livros são bons por que... põe a gente pra pensar, né Sr. Geraldo? _ Com certeza. _ Essa, essa força que... o Sr. fala que o Sr. teve, né? Que o Sr. sempre menciona que foi o...vamos dizer assim... que te impulsionou pra conseguir ter o que hoje em dia o Sr. tem, né? Essa força que a gente pode até dizer que... existe no ser humano, né? Que o Sr. até falou mais cedo... é....faz a gente buscar, né? Algum sentido pra nossa vida, né? _ É faz a gente buscar FORÇA, né? Aquela força que nós temos e não sabemos que temos... _ Porque... _ Acreditar, né? _ Eu não sei se o Sr. já se fez essa pergunta, mas... o Sr. já se perguntou assim: por que e pra que que eu existo? O Sr. já se fez essa pergunta? _ Olha, aí eu poderia responder na parte espiritual. Material eu não conseguiria responder não. Por que... material eu acredito que eu seria apenas um esterco, né? Um adubo a mais! Agora espiritual eu acredito que tem um por que... é o caso aonde... eu poderia ficar nervoso a hora que eu vejo: dei tanto azar, falei gente! Por quê? Se eu me preparei pra não acontecer isso aqui. E tô dessa forma aqui! Eu acho que o porquê não é agora. Isso é uma dívida! Que eu tenho. E eu peço a Deus é força pra poder passar... por esse momento, né? Que tão acontecendo, né? E até onde vai eu não sei, né? Então na hora do meu desencarne é... eu... jamais resmunguei, jamais é... joguei praga, jamais reclamei... porque... eu acho que não existe, não existe dívida.... PAGAMENTO NENHUM SEM DÍVIDA! (Geraldo diz pagamento nenhum sem dívida em tom de voz bem alto). (Após uma pausa Geraldo reflete e diz): Então aí é muito complexo, né? Porque às vezes eu tô falando uma coisa que eu creio e, e... você é totalmente descrente, né? _ Não, mas aí.... por exemplo... _ Não é religião não! Porque eu não gosto de discutir religião não! 192 _ Não! É... é muito simples! Né? A gente, por exemplo, pergunta... essa pergunta que a gente se faz,né? Porque que eu existo? Que eu estou aqui na Terra? Tem algum sentido? A religião surgiu pra responder isso, né? Se a gente for pensar bem... porque se você for analisar...igual o Sr. falou em termos materiais.... a gente é um pedaço de carne...né? _ Com certeza... _ Cê existe...Existir por existir...não,não sei se moveria uma pessoa a realizar uma vida inteira... né? Existir por existir... Ah! Eu existo porque eu existo. Eu sou feito porque igual um animal é feito eu sou feito. Eu não sei se a pessoa daria conta de ter uma vida inteira só com esse pensamento, né? Sem, sem um.... _ Ah! Seria um animal irracional, né? _ Cê acha que alguém tem condição de viver assim? _ Uma pessoa normal, não! Acho que não. _ É... pergunta, né? Perguntas que a gente faz, então, cada um segue... por exemplo: tem gente que acredita que foram os alienígenas que trouxeram a gente pra cá... (quando Letícia fala sobre os alienígenas, Geraldo solta uma risada discreta): Mas tem uma crença, né? _ (Então, Geraldo concorda mais sério): É, é não deixa de ser... _ No fundo... a resposta pra isso é o quê? Eu existo porque eu tenho uma crença. Independe qual! Mas é uma crença. Assim como... eu não sei... o Sr. não chegou a me responder a pergunta em si “porque que eu êxito?”, mas só de o Sr. falar dessa dívida, a gente sabe que o Sr. tem uma crença...né? Seja o Catolicismo, seja o Espiritismo, seja o Budismo, mas, é uma crença... é uma coisa que te MOVE (Letícia fala move devagar e com ênfase).Né? _ É... eu, eu... tá na Bíblia, né? Não cai uma folha sem que Deus não queira, né? Então eu tô aqui não é por acaso não!... Agora eu tô aqui por quê? Isso aí eu não sei te responder! Procuro fazer a minha parte aqui. Fazer tudo aquilo que não, não, não, me traga pobrema de consciência... e... as minhas responsabilidades... eu procuro arcá-las o melhor possível... e vamo passando o tempo, né? Vamo tocando a vida, né? Bola pra frente! _ Daqui... agora que o Sr... já tem um tempo que o Sr. fez a cirurgia... daqui pra frente como é que o Sr.imagina como a sua vida vai ficar? Daqui um tempo... _ Olha! Deus é muito bom pra mim... eu tô bem preparado agora pra...se... bem mais malandrinho, sabe? Na parte de trabalho: diminuir mais ainda! E, passear mais! _ Viajar? 193 _ Exatamente. _ Curtir um pouco né, Sr. Geraldo? _ É. _ Vamos dizer assim... tentar aproveitar um pouco da vida, né? _ É. Pelo menos uma parte, né? Tem muito lugar aí que eu gosto de... eu gosto muito de Minas Gerais, sabe? Sul do Brasil eu não tenho vontade nenhuma de conhecer! Quer dizer, tenho vontade nenhuma não! Eu prefiro ir aqui pra Poços de Caldas, São Lourenço é... um Ouro Preto... pra quê que eu vou lá do outro lado? Eu não vejo sentido! Então tem muito lugar gostoso aí que eu conheço aí que dá pra gente passear. E graças a Deus eu posso dirigir também... eu gosto muito de dirigir na estrada! _ (Letícia então, fala em tom de contentamento): Falei com o Sr.? Que o Sr.ia poder dirigir! O Sr. tava todo preocupado, né Sr. Geraldo? _ Adoro dirigir! _ O Sr. falou mesmo que gosta muito. É bom porque... é uma coisa que o Sr. gosta de fazer e que não te limitou, né? _ Ah! Você que acerta os lugares... cê pára aonde cê quer...vai na cidade que ocê quer...embora a gente tem viajado também de excursão, né? Esse ano me parece que é três que a mulher programou aí... até o final do ano...de ônibus... e duas de carro... _ É foi bom que não te poupou né? O Sr. poder viajar... pelo menos de vez em quando, né Sr.Geraldo? _ Ah! Não fosse esse pobrema que aconteceu em março, final de fevereiro, né? Já teria viajado mais.... _ E... Sr. Geraldo, quando é que o Sr. começou a fazer um acompanhamento com o cardiologista? _ Ah! Eu.... comecei a me sentir mal... quer dizer, jogando bola eu vi que eu não tava dando conta mais de correr do mesmo jeito... meu plano é Golden Cross, né? Então atende lá no Hospital Belo Horizonte... aí eu liguei lá querendo marcar com Dr. X da Cardiologia...e não tinha consulta... só pra bem depois... daí tinha um rapaz conhecido meu que falou: Eu tenho uma consulta marcada pra ele pra semana que vem, quem sabe ela transfere pra você? Aí a moça transferiu, né? “Não, não tem pobrema não então eu transfiro”. O rapaz desistiu da consulta dele e passou pra mim. Eu tive no consultório dele e ele marcou... no consultório particular dele. Do consultório do Hospital Belo Horizonte, ele me mandou pra consultar no consultório particular dele... tudo pelo meu plano de saúde. Lá no exame ergométrico eu fui MAL! (Geraldo fala mal 194 convicto e enfaticamente. Faz uma pausa e reforça): MUITO MAL! Ele olhou assim e falou: “ a... aparentemente tá... pela sua idade, tá normal”. Eu falei: Doutor não tá! Eu jogo bola desde criança eu sei que meu preparo físico tá péssimo, eu tô ficando amarelo, isso é fal... o sangue não ta circulando! Ele falou: “Mas cê é médico?” Doutor, a gente questiona coisas que a gente lê, que a gente vê na televisão, mas o Sr. tá falando que tá tudo bem, então tá tudo bem ué! Só isso? Só isso. Aí eu...teve um dia que...a hora que eu levan... meu quarto é lá em cima...acordei de manhã cedo meus olhos tava cheio de...parecendo... (Geraldo faz um gesto com as mãos simulando brilhos). _ Formigando? _ É... aí eu perguntei a mulher e falei: Ô bem, o Bernardo taí? (Geraldo esclarece): Meu filho mais velho. Tá. Vamo pro Hospital AGORA! (Geraldo fala um agora imperativo e segue): Tenho certeza que eu tô com pobrema de pressão. E a nuca tá doendo também. Cheguei lá tava dezesseis por dez! _ Nossa... _ Ainda falei com o homem dezesseis por dez dá pra fazer isso? Ele falou: “Dá graças a Deus que tem gente que vai a vinte e não tem nada!”. Foi aonde começou o acompanhamen, acompanhamento MÉDICO! (Geraldo fala médico com ênfase). _ Do seu problema. _ Né? Do meu pobrema... ainda fui nesse Doutor X, não deveria ter ido mais nele. Pegou e receitou um comprimido para pressão e mais nada! Se fosse o médico que eu estou com ele hoje, que por MUITO MENAS COISA (Geraldo fala muito menas coisa alto e com tom de revolta) ele mandou minha mulher fazer um catéter. Teria acusado na época! Eu poderia NÃO TER TIDO pobrema nenhum pra frente! (Geraldo diz não ter tido convicto) Agora, tem também aquele outro lado: eu teria, tenho que passar, tinha que passar por isso, né? Eu prefiro pensar por aí... _ É porque se for pensar que é fatalidade por erro, né? É ruim né, Sr. Geraldo? _ Não, acho que isso não... _ Fica remoendo aquilo, né? _ Remoendo aquilo e... não é bom não, sabe? _ Sabe o que que eu acho bom? O Sr. fazer um novo teste agora, mesmo se o Sr. operou não tem problema não! _ Fazer o quê? 195 _ Um outro teste ergométrico. É bom o Sr. fazer! Sabe por quê? Essa dúvida que o Sr. tem de estar se expondo a um esforço demais, de estar expondo a um esforço menor, com o teste ergométrico em mãos, o Sr. já sabe qual que é o seu limite. O seu limite assim... por exemplo: se o Sr. quiser aumentar... _ (Geraldo interrompe Letícia e pergunta): Será que... eu já poderia fazer um teste? _ PODE! O teste ergométrico ele já é indicado, antes do paciente ter alta do hospital, quando ele faz a cirurgia. _ Engraçado! Esse médico meu... eu não sei... às vezes tem hora que eu fico pensando...ele é muito bom pra receitar remédio... e só. _ É só o Sr. falar com ele que quer fazer um teste ergométrico, entendeu? É importante fazer! _ Achei estranho... nós... nós não fizemos nem o...como é que fala aquele exame cheio de de... (Geraldo coloca a mão no peito e faz uma mímica dos eletrodos do exame). _ Eletro? _ Eletro. Ei falei: Ô Doutor ocê não vai fazer nem um eletro pra ver a diferença que deu? Porque todo eletro meu sempre acusou uma coisa antiga, porque eu já tinha tido um infarto, né? Ele falou: “Ah! Da próxima vez que o Sr. vier aqui a gente vai fazer”.(Geraldo então imagina o pensamento do médico e diz): “Ah! Eu não vou escutar esse paciente!”(então diz como tom de desânimo): Aí a gente vai ficando assim... meio...sabe? _ É bom o Sr. olhar direito, porque olha só: pelo menos uma vez por ano é bom o Sr. tá refazendo o teste ergométrico, porque é ao esforço que acusa alguma provável isquemia. Vamos supor que o Sr. tenha alguma oclusão de alguma ponte, no seu esforço habitual, submáximo, na sua caminhadinha, o Sr. pode não sentir nada. Mas, na hora que o Sr. fizer um esforço maior, lá na hora do exame acusa. Mesmo que o Sr. não esteja sentindo nada, só cansaço. E, se for o caso de ter que colocar algum stent na ponte, então já tem um parâmetro para estar olhando... _ (Geraldo diz assustado): Mas, eu acho que agora aqui não tem mais jeito mais não! _ Não! Agora não! Mas, pode ser, por exemplo, daqui há alguns anos...igual meu pai ele fez a cirurgia já tem uns dez anos, ele começou a sentir um incomodozinho, sabe? Uma coisa assim... percebeu que a pressão tava mais alta. Aí eu falei: Ó! Pode ser que alguma ponte esteja querendo fechar, aliás, pode ocorrer a oclusão da ponte. Então aí ele fez um ECO de esforço, fez um outro teste... graças a Deus não deu nada! Era só a pressão mesmo que tinha subido um pouco mais, que ele andava mais nervoso uns 196 dias... mas, é bom olhar, porque no caso poderia colocar aquela molinha, igual o Sr. colocou o stent pode colocar dentro da ponte também. Aí vive mais um bom tempo ainda! Sem dor, né? Sem aquele medo. Por isso que eu acho importante essa revisão, esse check up, logo agora que o Sr. fez a cirurgia....é importante porque? O Sr. vai ver como é que o Sr. está de capacidade funcional agora, né? Como é que o seu coração está. Aí no ano que vem, o Sr. tendo esse teste de agora, lá pela mesma época o Sr. refaz, pra ver se houve melhora, se tá mantendo a mesma coisa, o quê que tá acontecendo....esse tipo de acompanhamento, além do medicamentoso e o exame de laboratório, ele é importante, porque se o Sr. quer, por exemplo, fazer uma corrida breve de uns cinco, seis minutos, o Sr. pode fazer, não é contra-indicado não! Só que tem que ter o teste de esforço pra saber até quanto a sua freqüência cardíaca pode chegar sem o senhor ter algum comprometimento. É isso mais ou menos o que o Fisioterapeuta faz com o paciente de Reabilitação Cardíaca. Ele dá um acompanhamento desde o início, até a pessoa melhorar seu condicionamento conhecendo seus limites, depois que a pessoa aprende, ele já deixa a pessoa mais a vontade... Na verdade... é bom ter um profissional do lado? É ótimo! Mas nem todo mundo tem esse privilégio, por exemplo: meu pai não teve, que ele morava na roça na época que ele infartou, mas pelo ergométrico eu orientei. Eu falei: olha papai quando o Sr. perceber que o seu coração tá acelerando demais, né? Que o Sr. tá cansando muito, o Sr. conta a sua freqüência cardíaca e vê se não tá ultrapassando seu limite. Se não tiver, às vezes é só mesmo uma sensação subjetiva... por tudo isso que eu acho interessante o Sr. fazer o teste ergométrico, sabe? _ É... na próxima vez que eu tiver lá eu vou... é... trocar uma idéia com ele a respeito disso... _ Vê porque eu acho que não vai te fazer mal nenhum. Eu não sei se convênio do Sr. paga o ergométrico? Mas eu acho que paga! _ Ah! Cobre tudo! _ Cobre, então o Sr. não vai ter despesa nenhuma pra fazer o teste, sabe? É um teste tranqüilo que o Sr. separa aí umas duas, três horas numa manhã e faz... _ Quando eu fiquei internado lá... eu acredito que eles cobriram lá, pelo menos quase uns oitenta por cento. _ É... pra quem tem... um plano e opera vê...o quanto que é importante, né? Hoje em dia, porque no Brasil depender da saúde pública hoje, tá muito complicado... _ Lá no Vera Cruz cê trabalha lá, não? 197 _ Trabalho. _ Dr. Y é cobra no negócio, né? _ É, ele é um ótimo profissional. _ Conversando com ele eu disse: Ah! Só tem uma coisa que isso aí é difícil a gente não tomar... tiver um churrasquinho...é lógico eu, hoje eu não! Eu só comia carne com gordura em churrasco... a carne...churrasco sem gordura é chupar bala sem, sem tirar o papel.... e uma guia? (Guia para o Sr. Geraldo significa aguardente). Ele falou: “Guia boa, né?” Eu falei: Ah! Guia boa não tem comparação! Daí ele disse: “Ah! Então arruma uma aí pra gente!”. Eu sei que ele é fera! (Geraldo segue mudando de assunto curioso pela cirurgia): Afinal de contas, essa safena colocada aqui... eu entendo o seguinte: digamos que isso aqui é uma artéria, aqui deu um entupimento, a safena ela vai ser colocada daqui-aqui, como uma ponte.... como que ela é colocada aqui? (Geraldo faz gestos com as mãos para descrever a ponte safena). _ Eles fazem... _ É cola? _ Costurinhas. _ Costurinha? _ Ponto. Com ponto. _ Mas era pra sair ao menos uma gotinha de sangue gente! - Mas é muito bem suturado, o ponto é muito bem feito. Um pouco sangra, por isso que depois que o Sr. opera ficam aqueles drenos, sabe? _ Ah tá! _ Porque ainda “baba” um pouquinho ainda, sabe? Alguma coisa ainda que ficou ali, aí vai saindo conforme o tempo vai passando. Mas, aí o quê que acontece: suturou tá suturado! Não vai arrebentar mais nada! Então assim, na hora ainda sangra porque na verdade houve um corte, né? _ Uai! No meu caso houve dez cortes! Puxa vida! _ É uma coisa tão pequenininha Sr. Geraldo que eu não sei como é que eles enxergam! Uma vez eu assisti uma cirurgia cardíaca. Eles têm um óculos, né? Que eles enxergam melhor... _ É, pois é, uma lente. _ É... uma lente, tipo uma lente, mas tem que ter uma mão, uma precisão pra aquilo ali....tem que ter muita precisão, porque se você erra um pouquinho, se você passa o corte, o bisturi um pouquinho a mais você perde a...a artéria. Você perde a veia. É muito 198 delicado, é muito delicado! Por isso que tem que ser um senhor cirurgião mesmo pra fazer.... _ Agora eu entendo que depois disso aqui a facilidade de, de, de... acumular gordura é maior,né? _ Depende. _ Porque um tubo reto... a água corre mais rápido, agora ele cheio de emenda... a facilidade da gordura acumular é maior... _ Não. A questão não é só essa de gordura, não. Porque o quê que acontece é que eles estudam o fluxo de sangue, a velocidade que o sangue passa pela ponte, que me parece que se a velocidade for mais baixa aí há a propensão da ponte ocluir por espasmo... _ Eu tô esperando um viajante passar na loja lá, porque ele vai trazer pra mim, não sei se ele vai lembrar... o pai dele fez essa operação anos atrás, tinha facilidade também de acumular gordura nas artérias... diz ele que o pai dele toma um remédio específico pra inibir a gordura... não é que ele retira a gordura não! _ O Sr. acha que é pra reduzir a taxa de gordura no sangue? _ É reduzir a taxa de gordura. _ É. Tem, tem as estatinas, elas combatem o mal colesterol. Agora tem que ter indicação médica, né? Porque tem contra-indicação. Toda medicação... _ (Geraldo interrompe Letícia): Nem gosto de ler bula! _ Pois é, mas vamos supor. Qualquer medicação que falem pro Sr. tomar, NÃO TOMA SEM ORIENTAÇAO SR. GERALDO (Letícia fala não toma sem orientação advertindo Geraldo e continua): Porque às vezes vai fazer bem pra uma coisa, mas vai piorar outra, sabe? _ Com certeza. _ Então, não é bom a gente tomar não! Mesmo porque determinados medicamentos.... _ (Geraldo interrompe Letícia e diz): Indicado já... já dá pobrema! _ Determinados medicamentos podem causar reações em uma pessoa que não causam em outra, então esse que é o problema da auto-medicação, né? Teve um rapaz que tomou novalgina pra dor outro dia que teve uma reação horrível! Às vezes o próprio médico prescrevendo não pode prever uma reação. Então já é complicado cê tomar remédio, ainda mais tomando por conta própria! É mais complicado ainda! Tem que tomar muito cuidado... Se você, por exemplo, já tem alguma alergia, ou então, não é nem alérgico nem nada, mas, se você for ao médico ele vai olhar pra você e falar: “Ó, você é uma pessoa que não podia estar tomando isso!” Porque ele conhece, né? 199 _ Eu... chá de alecrim! Eu to até esperando meu pé lá em Sete Lagoas ele crecer um pouco mais! Os antigos sempre tomaram, né? _ Tomaram... mas, chá é natural. Normalmente o princípio ativo, ele está em concentração muito baixa, então, geralmente, não chega a fazer mal, não chega a ser tóxico não. A não ser que a pessoa tenha uma sensibilidade muito aumentada pra determinada substância. Porque é muito difícil você escutar dizer que uma pessoa morreu de chá, né Sr. Geraldo? (Letícia faz essa pergunta em tom de descontração). _ É. Agora, eu tenho um pé lá em Sete Lagoas que é de insulina.... _ Insulina natural, né? _ É. Aí uma pessoa lá ficou sabendo e me pediu. Eu falei: Olha eu posso até te dar... umas folhas aí pra fazer o chá. NÃO SEI COMO FAZ E COMO TOMA, NUNCA USEI! Ganhei essa muda, plantei, ela cresceu nessa árvore aí e aí está. Ele levou. A mulher dele tava com... glicose... de trezentos mais ou menos... ela tomou um chá mais forte, ela baixou pra menos de cem! E a pressão dela também quase parou... acho que ela ficou com nove por seis! _ Abaixou demais, né? Aí ta vendo o perigo! _ Se abaixasse e ficasse pro resto da vida baixa! _ Pois é aí sobe de uma vez, abaixa de uma vez, esse que é o problema! _ E olha que não é medicamento, hein? _ É por isso que tem tomar cuidado! _ (Letícia então vai finalizando a conversa): Então é isso aí Sr. Geraldo, gostei de ver o senhor... o senhor está bem, mais corado, fazendo suas caminhadas... _ Tô. Meio na marra, mas tenho que ir... _ É, mas é bom...depois a gente acostuma e vira uma rotina até boa.... _ É a gente vai acostumando, faz falta... já sinto falta... _ O dia que não vai, né? _ É... quando eu venho pra cá....aqui é muito morro...