ASPECTOS MORFOESTRUTURAIS E MORFOTECTÔNICOS DA BACIA DO RIO LAMBARI (SUL DE MINAS GERAIS) NO ESCOPO DA NEOTECTÔNICA E SEUS REFLEXOS NO RELEVO E NA DRENAGEM Roberto Marques Neto [email protected] Prof. Adjunto do Departamento de Geociências e do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Federal de Juiz de Fora Resumo Reconhecidamente, a dinâmica epirogenética intraplaca vigente no território brasileiro responde a esforços deformacionais cenozoicos produtos de uma tectônica ativa de regime predominantemente transcorrente com reflexos contundentes no relevo, na drenagem e nos depósitos sedimentares. Algumas evidências são rastreáveis pela aplicação de procedimentos de análise estrutural, como a mensuração de índices geomórficos e a extração e interpretação de lineamentos estruturais, conforme se pautou o presente artigo, que assume a incumbência de apresentar os resultados provenientes de análise estrutural executada mediante análises morfométricas. Tal conjunto de procedimentos foi empreendido na bacia hidrográfica do Rio Lambari, localizada na porção meridional do estado de Minas Gerais, tendo sido de grande valia para detectar evidências morfológicas e estruturais de atividade neotectônica. Palavras-chave: Neotectônica; bacia do Rio Lambari; análise estrutural; morfotectônica. Abstract Admittedly, the present intraplate epirogenetic dynamics in the Brazilian territory has a response to the Cenozoic deformational strains due to an active tectonic of transcurrent prevailing regime with contundent reflexes on the relief, draining and sedimentary deposits. Some evidences are traceable by administrating structural analysis processes as the measuring of the geomorphological index and the extraction and interpretation of structural lineaments by which the present paper is guided as it assumes the task of presenting the results from the structural analysis executed by morphometric analysis associated to the extraction and cartographic representation of the lineaments. Such set of procedures was undertaken in the Rio Lambari watershed, located in the southern portion of the state of Minas Gerais, having a great value on detecting morphological and structural evidences of neotectonic activity. Key-words: Neotectonic; Rio Lamabri watershed; structural analysis; morphotectonic. Introdução O reconhecimento de um regime neotectônico transcorrente de idade cenozoica em nosso domínio intraplaca, consubstanciado a partir do Mioceno Médio ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 34 (HASUI, 1990; 2006), tem aberto portentosas perspectivas interdisciplinares firmadas entre a geomorfologia, a geotectônica, a sedimentologia e a geocronologia. Os esforços deformacionais neotectônicos, relativamente datados no Neógeno, além de imprimirem mudanças nos campos de tensão que reativam falhas antigas e geram novas falhas em diferentes orientações, apresentam reflexos contundentes no relevo e na drenagem, na dinâmica erosiva e sedimentar, podendo, em certas situações, ser submetidos a procedimentos de datação absoluta em seus depósitos correlativos. Tem sido amplamente difundida na cultura geomorfológica brasileira as análises morfométricas aplicadas aos estudos neotectônicos. Tais procedimentos conformam um rol de técnicas que integradamente fornecem fortes indícios de tectônica ativa, entre as quais os índices geomórficos têm subsidiado de forma recorrente as análises estruturais e geomorfológicas (RUBIN, 1999; HIRUMA & RICCOMINI, 1999; ETCHEBEHERE, 2000; FERREIRA, 2001; CORSI, 2003; MISSURA, 2004; MARQUES NETO, 2012), entre outros. Em andamento aos estudos sistemáticos que vem sendo levados a efeito sobre a neotectônica da parte meridional do estado de Minas Gerais e adjacências (ASMUS & FERRARI, 1978; SAADI et al., 1989; SAADI, 1990, 1991, 1993; RICCOMINI, 1989; MIOTO, 1990; SANTOS, 1999; HIRUMA & RICCOMINI, 1999; GONTIJO, 1999; FERREIRA, 2001; HIRUMA et al. 2001; CORSI, 2003; CHIESSI, 2004; MORALES, 2005; MARQUES NETO, 2012), o presente paper tem por objetivo apresentar e discutir aspectos morfoestruturais e morfotectônicos da bacia do Rio Lambari (figura 1) fundamentado na aplicação de índices geomórficos associada à interpretações cartográficas, de produtos de sensoriamento remoto e controle de campo. A bacia hidrográfica em apreço configura uma importante sub-bacia da bacia do Rio Verde, localizada na parte meridional do estado de Minas Gerais em terrenos da Serra da Mantiqueira e do Planalto do Alto Rio Grande. ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 35 36 Figura 1. Localização da bacia do Rio Lambari no estado de Minas Gerais, a partir da bacia do Rio Verde. Metodologia Aplicou-se para a bacia do Rio Lambari a mensuração dos seguintes índices geomórficos: Sinuosidade da Escarpa Montanhosa (Smf), Fator Assimetria de Bacias de Drenagem (FABD), Fator de Simetria Topográfica Transversal (T) e Relação Declividade x Extensão do canal (RDE) juntamente à extração do perfil longitudinal do tronco coletor principal, para o qual RDE foi mensurado. O índice Sinuosidade da Escarpa Montanhosa (Smf) foi definido por Bull & Wallace (1985), e reflete o balanço entre as forças erosivas e tectônicas, prevendo que as frentes montanhosas submetidas a soerguimento tectônico são relativamente retilíneas, assumindo assim valores baixos; uma vez reduzido ou cessado o soerguimento, os processos erosivos tenderão a tornar a escarpa montanhosa irregular, elevando os valores de Smf (FERREIRA, 2001). Sua obtenção é dada pelo emprego da seguinte fórmula: Smf = Lmf/Ls Onde: ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 Lmf: comprimento da escarpa montanhosa ao longo do sopé do alinhamento serrano, na zona de ruptura de declive; Ls: comprimento da linha retilínea da escarpa montanhosa. As medições realizadas para os cálculos se deram em escala de 1/50.000 sobre as folhas topográficas, e o traçado das frentes escarpadas foi auxiliado por imagens de radar SRTM (Shuttle Radar Topography Mission), nas quais os alinhamentos podem ser adequadamente visualizáveis. O Fator Assimetria de Bacias de Drenagem (FABD) consiste em um índice proposto por Hare & Gardner (1985), e indica a assimetria de bacias hidrográficas com base na migração lateral dos canais, sendo dado pela fórmula: FABD = 100 (Ar/At) Onde: Ar = área da margem direita do curso d’água principal At = área total da bacia Segundo a fórmula apresentada, valores inferiores a 50 correspondem a um basculamento da margem direita da bacia, ao passo que valores superiores a meia centena são indicativos de basculamento da margem esquerda. Em complemento foi calculado o Fator de Simetria Topográfica Transversal (FSTT), técnica desenvolvida por Cox (1994) e que tem por base a assimetria do perfil transversal do canal em face às migrações laterais. A aplicação desta técnica exige o estabelecimento da linha média da bacia e de perfis perpendiculares ao canal principal. Daí tem-se que: FSTT = d/D Onde: d = distância entre a linha média da bacia e o talvegue D = distância entre a linha média da bacia e seu divisor Tal relação foi estabelecida a cada 5 km de extensão superficial do canal. Os valores obtidos podem variar entre 0 (condição simétrica, com a linha média da bacia coincidindo com o talvegue) e 1 (condição assimétrica, com o canal próximo a linha divisória da bacia). ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 37 Os perfis longitudinais foram extraídos das folhas topográficas em escala 1/50.000 pela marcação dos pontos de intersecção entre a linha de drenagem e a curva de nível em intervalos de 20 metros, anotando-se a altitude e a distância da foz. Posteriormente os valores foram plotados em gráficos de coordenadas cartesianas e escala aritmética, considerando como variável dependente a altitude dos diversos pontos da drenagem e a extensão dos mesmos a partir da nascente (em quilômetros), lançadas no eixo das abcissas, da maneira que é organizado por Etchebehere (2000). Acatando o autor citado, foi considerado o comprimento do vale no processo de medição a fim de se anular as interferências exercidas pela sinuosidade do canal. A base geológica foi inserida no intuito de se averiguar possíveis influências de contatos litológicos na definição da forma do perfil, tendo como base os levantamentos da CPRM (2008). No tocante ao RDE, método desenvolvido por Hack (1973) e bastante divulgado por Etchebehere (op cit.), executou-se sua extração também para o Rio Lambari, o que permite comparação com o perfil longitudinal. O índice em questão é obtido pela fórmula: RDE = (ΔH/ ΔL). L Onde: ΔH = diferença altimétrica entre dois pontos extremos de um segmento ao longo do curso d’água; ΔL = projeção horizontal da extensão do referido segmento; L = comprimento total do curso d’água a montante do ponto para o qual o RDE foi mensurado. A relação ΔH/ΔL corresponde ao gradiente da drenagem no ponto em questão. Os valores mensurados para cada trecho foram relacionados com o RDE total, obtido mediante relação direta entre a amplitude altimétrica total e o logaritmo do comprimento total do vale, de acordo com a fórmula: RDE total = ∆H/logL Os valores derivados de tal relação foram qualificados em consonância a proposição de Seeber & Gornitz (1983), segundo a qual os resultados compreendidos entre 0 e 2 não representam anomalia, aqueles entre 2 e 10 são representativos anomalias de segunda ordem e os acima de 10 de anomalias de primeira ordem. ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 38 A rede de drenagem da bacia do Rio Lambari foi digitalizada em software Auto Cad, procedendo-se na investigação de presença de anomalias de drenagem indicativas de controle neotectônico. O procedimento de extração da malha hidrográfica se deu a partir das bases planialtimétricas do IBGE, que foram analisadas em conjunto com imagens de radar SRTM (Shutle Radar Topography Mission) e imageamentos de satélite TM-LANDSAT-5, bandas 3, 4 e 5. Apresentação e discussão dos resultados 39 Sistema hidrográfico de considerável expressão espacial (942,55 km 2), a bacia do Rio Lambari é a segunda maior sub-bacia da bacia do Rio Verde, e o coletor que lhe dá nome é o principal afluente da margem esquerda. Tem suas cabeceiras posicionadas a 1780 metros acima do nível do mar no município de Cristina, estando sua foz no Rio Verde a 850 metros de altitude, nos limites municipais de Cambuquira e Três Corações, perfazendo uma considerável amplitude altimétrica da ordem de 930 metros. O Rio Lambari e seus afluentes dissecam litologias diversas e diferentes sistemas de relevo. O tronco coletor principal tem suas nascentes na Serra da Mantiqueira, onde se encontra tectonicamente controlado e pronunciadamente encaixado em vales eloquentemente retilíneos. Em seu médio/baixo curso, no Planalto do Alto Rio Grande, as planícies aluviais são mais desenvolvidas e o canal assume uma tipicidade meandrante. A despeito dos desvios e migrações laterais internas, observáveis através do Fator T, a simples relação área da margem direita/área total denuncia uma bacia com sensível assimetria da margem esquerda quantificada num valor de FABD = 47,86. No entanto, o Rio Lambari disseca litologias diversas e uma boa diversidade de formas de relevo se consubstancia no espaço interno da bacia, o que reflete diretamente no comportamento da rede de drenagem. O quadro 1, que contém os valores de T calculados para a bacia do Rio Lambari, auxilia na elucidação das causas do comportamento anômalo da drenagem. Quadro 2. Valores de T calculados para a bacia do Rio Lambari. SEÇÃO T SEÇÃO T 1 0,35 9 0,027 2 0,22 10 0,28 3 0,25 11 0,76 ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 4 0,042 12 0,8 5 0,32 13 0,16 6 0,47 14 0,09 7 0,63 15 0,16 8 0,19 As seções 6/7 e 11/12 são aquelas que registram assimetria mais significativa. Deve-se ponderar, no entanto, que a assimetria verificada nesse caso está ligada mais fortemente à conformação do relevo do que a processos de migração lateral apenas por efeito de basculamento. Isso porque a bacia do Rio Lambari está condicionada pelo bloco Cristina, balizado por rochas metamórficas de alto grau de fácies granulítica (HACKSPACHER et al. 1991), (BRAGA, 2002), ao qual o rio principal margeia em seu alto curso, onde o controle estrutural é eloquente pela pronunciada retilinidade do canal principal (figura 2A). A bacia é interceptada por zonas de cisalhamento transcorrentes de orientação NE-SW na sua porção média/baixa, cujos desvios que imprimem nos divisores conferem geometria irregular para esta bacia hidrográfica. Os trechos de maior assimetria assinalados estão vinculados, respectivamente, ao bloco Cristina e à passagem da Serra das Águas, estruturas que determinam desvios em direção aos divisores da margem esquerda, desvios estes que também coincidem com contatos litológicos. Uma vez transposto o compartimento montanhoso, o rio Lambari desenvolve farta planície de inundação (figura 2B). Em todo o seu alto curso o Rio Lambari disseca litologias granitoides do Grupo Paraíba do Sul no já mencionado bloco granulítico de Cristina, compartimento no qual se encontra, conforme frisado, deveras adaptado a falha, bem como revela respostas a efeitos diastróficos posteriores a implantação da rede de drenagem. A maior amplitude altimétrica se verifica destacadamente na região das cabeceiras, com suavização e estabilização do gradiente a menos de 10 km de extensão superficial, quando sofre desvio brusco de sua direção SE-NW para NE-SW, adaptando-se à Zona de Cisalhamento de Maria da Fé. Inflete em cotovelo bem marcado ao passar por zona de capturas fluviais nas cabeceiras formadoras do Rio Lourenço Velho. O ponto em questão é bem marcado em ruptura no perfil longitudinal do rio (figura 3), que prenuncia uma das mais importantes áreas de estocagem sedimentar da bacia do Rio Verde. Em principio desenvolvem-se planícies alúviocoluvionares estreitas que se alargam substancialmente quando o Rio Lambari transpõe o Bloco Cristina (vide novamente a figura 2B) e após romper as fácies quartzíticas da Megassequência Andrelândia, bem como alinhamentos em migmatitos ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 40 bandados e biotita gnaisses. Para oeste das faixas serranas se instala em litologias fundamentalmente granitoides. 41 Figura 2. A) Vale retilíneo do alto curso do rio Lambari, controlado pelo Bloco Cristina (Cristina, MG); B) Planície de inundação desenvolvida após a transposição do Boco Cristina (Cristina, MG). Faltam os depósitos quaternários em estreita faixa inferior a 500 metros de extensão correspondente à transposição das cristas quartzíticas balizadas pelas litologias da Formação São Thomé das Letras (Megassequência Andrelândia), segmento no qual o Rio Lambari perpassa garganta epigênica. Tornam a desaparecer a pouco mais de 60 km de extensão, onde passa a dissecar granada-biotita-gnaisses e quartztitos também agrupados na Megassequência Andrelândia em controle imposto por falhas. Nesse ponto, substitui uma orientação N-S para um padrão NE-SW, correspondente a orientação das faixas quartzíticas e do rifte continental do sudeste brasileiro. Figura 2. Perfil longitudinal do Rio Lambari. O Rio Lambari disseca litologias de diferentes resistências, transpondo estruturas desiguais mantenedoras de morfologias diversas. Entretanto, as principais ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 rupturas no perfil longitudinal não coincidem com os contatos litológicos, ressaltando a importância do controle tectônico na configuração da drenagem superficial. Tal controle, no entanto, não tem como marca rupturas abruptas no perfil. O que se observa é um padrão de adaptação a falhas por reorientação de sua direção em mesma faixa altimétrica, se tratando de falhas de expressão regional que não interferem no gradiente hidráulico como o fazem aquelas responsáveis de imposição de ressaltos topográficos. Pela leitura do índice RDE (tabela 1) pode-se estimar com maior qualidade as 42 anomalias no gradiente longitudinal do Rio Lambari. Tabela 1. Cálculo do Índice Declividade x Extensão do percurso calculado para o Rio Lambari. RDE Relação RDE trecho/RDE ΔH ΔL L (m) trecho total 1780-1760 30 30 19,99 0,107 1760-1740 100 130 26 0,13 1740-1720 100 230 46 0,24 1720-1700 70 300 85,71 0,46 1700-1680 50 350 140 0,75 1680-1660 50 400 160 0,85 1660-1640 80 480 120 0,64 1640-1620 150 630 83,99 0,45 1620-1600 300 930 61,99 0,33 1600-1580 200 1130 113 0,606 1580-1560 250 1380 110,4 0,59 1560-1540 300 1680 111,99 0,601 1540-1520 300 1980 131,99 0,708 1520-1500 50 2030 812 4,35 1500-1480 350 2380 135,99 0,72 1480-1460 200 2580 258 1,38 1460-1440 250 2830 226,4 1,21 1440-1420 400 3230 161,5 0,86 1420-1400 450 3680 163,55 0,87 ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 1400-1380 650 4330 133,23 0,71 1380-1360 200 4530 453 2,43 1360-1340 300 4830 321,99 1,72 1340-1320 50 4880 1952 10,47 1320-1300 200 5080 508 2,72 1300-1280 150 5230 697,33 3,74 1280-1260 550 5780 210,18 1,12 1260-1240 350 6130 350,28 1,88 1240-1220 550 6680 242,9 1,3 1220-1200 800 7480 187 1,003 1200-1180 150 7630 1017,33 5,46 1180-1160 150 7780 1037,33 5,56 1160-1140 100 7880 1576 8,45 1140-1120 150 8030 1070,66 5,74 1120-1100 125 8155 1304,8 7,003 1100-1080 300 8455 563,66 3,02 1080-1060 500 8955 358,2 1,92 1060-1040 2250 11205 99,59 0,53 1040-1020 1250 12455 199,28 1,06 1020-1000 2250 14705 130,7 0,701 1000-980 8700 23405 53,8 0,28 980-960 2125 25530 240,28 1,28 960-940 1900 27430 288,73 1,54 940-920 350 27780 1587,42 8,52 920-900 6750 34530 102,3 0,54 900-880 5050 39580 156,74 0,84 880-860 16235 55815 68,75 0,36 860-foz 42530 98345 46,24 0,24 O Rio Lambari apresentou doze anomalias, entre as quais apenas uma delas é de primeira ordem. A maior parte destas anomalias foi detectada no compartimento da ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 43 Serra da Mantiqueira, onde o controle tectônico é mais exacerbado, favorecendo um fluxo mais turbulento e encachoeirado sobre o relevo acidentado e declivoso, o que determina um aumento na energia da corrente e nos valores de RDE. Sucessivos patamares escalonados intercalam trechos de encaixamento e pequenos espraiados pelo alto curso do Rio Lambari até que este se desvia abruptamente do sentido SE-NW para NE-SW na faixa de 1060 metros, onde tem desenvolvimento um vale de grandiloquente retilinidade margeando o Bloco Cristina em seu limite NW. Planícies aluviais estreitas acompanham o rio nesse compartimento até aproximadamente 920 metros, quando as várzeas se alargam francamente. Os compartimentos agradacionais são mais expressivos no Planalto do Alto Rio Grande, onde o controle morfotectônico se atenua. A figura 4 consiste em representação cartográfica das principais anomalias de drenagem verificadas na bacia do Rio Lambari, categorizadas em capturas fluviais (consumadas ou iminentes), segmentos retilíneos e encaixados de canais fluviais, e deflexões de canais, muitas vezes correspondentes à shutter ridges bem marcadas por falhas transcorrentes. Notoriamente, o maior número de capturas é verificado no alto curso, nas faixas interfluviais divisórias à bacia do Rio Sapucaí, setor correspondente às altas cristas da Mantiqueira onde a erosão é mais agressiva em resposta ao basculamento de blocos correspondentes às zonas de cisalhamento de Cristina e Maria da Fé, que imbricam após a passagem de bloco granulítico na região de Cristina, cujo limite ocidental é dado pela instalação do rio Lambari em eloquente retilinidade. ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 44 45 Figura 4. Anomalias de drenagem na bacia do Rio Lambari (MG). Nos compartimentos posicionados na Serra da Mantiqueira, indubitavelmente, as feições morfotectônicas são mais fartas, verificando-se uma adaptação mais acomodada às estruturas preexistentes no Planalto do Alto Rio Grande. É na Serra da Mantiqueira onde as escarpas montanhosas são mais expressivas e o trapezoidamento dos grandes escarpamentos se faz mais conspícuo. Dispõe-se em zonas de cisalhamento paralelas de orientação geral NE-SW que são interceptadas a norte pela Serra do Bugio, bastante deformada tectonicamente, e que impõe o contato com o Planalto do Alto Rio Grande, setor onde feições desta estirpe só voltam a aparecer com a emergência de cristas monoclinais paralelas de litologia quartzítica a gnáissica. O rio Lambari se superimpõe a estas litologias desiguais, e nesse trecho recebe afluentes ortoclinais adaptados a estas linhas de falha de significativa expressão no relevo, conformando um sistema geomorfológico de forte tipicidade apalachiana. No intuito de empreender uma averiguação mais proficiente de evidências no relevo de atividade neotectônica é que se lançou mão do índice Smf (Sinuosidade da Escarpa Montanhosa). A leitura do quadro 2 retrata a concentração de tais feições na Serra da Mantiqueira, compartimento de gênese fundamentalmente tectônica. Quadro 2. Índice Sinuosidade da Escarpa Montanhosa para as principais zonas de cisalhamento da bacia do rio Lambari. ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 Denominação Orientação Compartimento geomorfológico Lmf (m) Ls (m) Smf Qualificação sinuosidade Serra de Domingos São NE 50°) (40- Planalto do Alto Rio Grande 17400 10035 1,73 Moderada Serra de Domingos São NE 50°) (40- Planalto do Alto Rio Grande 10100 7950 1,27 Baixa Serra das Águas NE 60°) (50- Planalto do Alto Rio Grande 38050 24100 1,578 Moderada Serra da Pedra Branca/ Furnas NE 50°) (40- Serra Mantiqueira da 29500 22150 1,331 Baixa Serra da Boa Vista NE 40°) (30- Serra Mantiqueira da 14750 12950 1,138 Muito baixa Serra de Cristina/ Dom Viçoso NE 30°) (20- Serra Mantiqueira da 17250 13850 1,245 Baixa No Planalto do Alto Rio Grande o procedimento foi aplicado às serras das Águas e do São Domingos, esta em suas duas vertentes em função de sua boa simetria definidora de frentes escarpadas pelos dois lados. Notoriamente, a tendência de sinuosidade baixa a muito baixa se consubstancia na Serra da Mantiqueira, indicando que o controle tectônico sobrepuja os processos supérgenos de dissecação. Uma tendência de moderação, por sua vez, é assumida no Planalto do Alto Rio Grande, assinalando que os processos erosivos concorrem com os fatores geodinâmicos internos, que resultam assim em valores mais elevados quando a relação é estabelecida, visto que a obliteração e o retrabalhamento erosivo das escarpas são itens mais expressivos. De forma geral, toda a bacia do rio Lambari encontra-se afetada por efeitos deformacionais neotectônicos, conforme sinalizam os resultados obtidos e o controle de campo, prática esta que foi capaz de registrar uma série de evidências diretas, como a presença de horizontes orgânicos atualmente drenados em função do soerguimento de planícies aluviais, a ocorrência de alguns terraços rochosos, a deslocamento de depósitos cenozoicos, entre outros. Conclusões Alguns pontos conclusivos abstraídos a partir da aplicação e interpretação das técnicas mencionadas podem ser enumerados. Tais tópicos se referem às principais constatações e servem também como síntese dos resultados que foram obtidos: ISBN: 978-85-99907-05-4 I Simpósio Mineiro de Geografia – Alfenas 26 a 30 de maio de 2014 da 46 - Na área de estudo, um controle proveniente do regime neotectônico intraplaca se sobrepõe às estruturas mais antigas herdadas do rifte continental do sudeste brasileiro; - O controle morfotectônico é mais expressivo na Serra da Mantiqueira, onde sobejam as evidências diretas e indiretas de tectônica ativa; tais evidências diminuem no Planalto do Alto Rio Grande, onde predominam, para a bacia do rio Lambari, as feições estruturais; - É necessário que os índices geomórficos sejam aplicados e discutidos de forma integrada e complementar a outras técnicas voltadas para os estudos morfoestruturais e morfotectônicos; quando associados ao controle de campo, os resultados tendem a serem auspiciosos. Referências ASMUS, H. E.; FERRARI, A. L. 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