o vírus que está acometendo o continente africano

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ENTREVISTA
“A febre hemorrágica do Ébola, que é o espectro mais grave da doença pelo
vírus Ébola foi descrita inicialmente a partir de um surto no antigo Zaire, atual
República Democrática do Congo em 1976 na região de Bumba, na missão de
Yambuku. Quase simultaneamente aconteceu uma outra epidemia, no sul do
Sudão. Sabe-se pelas investigações científicas feitas na época que eram dois focos independentes e cada um foi causado por uma espécie distinta, o vírus Ébola-Zaire e o Vírus Ébola-Sudão respectivamente. Depois dessas primeiras epidemias houve um grande “silêncio” que não é totalmente compreendido, mas
no inicio da década de 90 novas epidemias aconteceram, algumas com poucos
casos e outras de grande magnitude, sempre restritas a África Central, exceto
pelo caso na Floresta Taï, na Costa do Marfim. Entre 1976-2013, 13 focos foram
identificados, somando cerca de 1800 casos”, declara a Profa. Dra. Otilia Lupi.
Qual a causa do Ebola e seu índice de
mortalidade?
A febre pelo vírus Ébola é provocada por
quatro das cinco espécies de vírus classificados no género Ebolavirus da família Filoviridae. Estas quatro espécies são:
- Ébola-Zaire tem letalidade 60- 90%, a
cepa isolada no surto atual na África Ocidental pertece a essa grupo;
- Ébola –Sudão tem letalidade de 40-60%;
- Ébola –Bundibugyo tem letalidade de até
25%;
- Ébola-Costa do Marfim, o único caso
conhecido foi isolado na Floresta Taï e não
foi fatal.
A quinta espécie, o Ébola-Reston até o
momento foi isolado causando exclusivamente doença em primatas não-humanos. Existem
evidências de que ele não é capaz de causar
doenças em humanos expostos.
Como está o surto do Ebola atualmente?
O surto atual, que iniciou em dezembro de
2013, é o de maior magnitude já registrada.
Sabe-se que o número de casos e óbitos conhecidos é apenas uma fração do total, o número exato provavelmente jamais será conhecido. Esse surto é único também, porque pela
primeira vez alcançou transmissão sustentada
em áreas urbanas e porque está se disseminando por mais de um país. A busca do Caso-Zero, atualmente nos leva a um menino de
dois anos infectado no início de dezembro de
2013, na localidade de Guéckédou, no sudeste da Guiné. A infecção a partir dessa família,
a um profissional de saúde, e o grande afluxo
ao funeral da avó desse menino parecem ter
sido cruciais na velocidade de disseminação
nos primeiros meses da epidemia. Depois
uma série de infelizes eventos e rumores foi
capaz de amplificar a velocidade de expansão
da epidemia. Além disso, o fato da doença ser
desconhecida nessa região da África Ocidental dificultou que as medidas de contenção
do surto fossem rapidamente implementadas
e absorvidas pelas populações locais. Ain-
da hoje existem focos de resistência entre a
população urbana e rural que questionam a
veracidade das informações sobre o surto, e
que não permitem a ação das equipes técnicas. Certamente o ambiente político é muito
desfavorável, principalmente na Libéria e em
Serra Leoa, onde é esperado maior dificuldade para implementar as medidas de contenção
de surto.
Como diagnosticar? Quais os sintomas
do Ebola?
Utilizam-se dois níveis de classificação de
caso: caso-suspeito e caso-confirmado. Toda
doença febril aguda em indivíduos que habitam ou estiveram nos últimos 21 dias nas
áreas onde está havendo casos será considerado como caso suspeito. Os casos confirmados
precisam ter uma evidência laboratorial demonstrando a presença do vírus ou parte dele
em amostras clínicas (sangue, líquor, fragmento de tecido, etc.) e/ou a detecção de anticorpos do tipo IgM específicos para o vírus
Ébola. Os indivíduos com evolução fulminante e desfavorável não chegam a produzir
IgM detectável, dessa forma a confirmação
por PCR é a mais confiável e viável para o
manejo dos casos.
A doença têm início súbito, no estágio inicial pode ser semelhante a uma “gripe forte”
com cansaço, febre, dor de cabeça, dor nas articulações e músculos, dor abdominal, dor de
garganta, náuseas, vômitos, diarreia, irritação
da mucosa ocular, falta de apetite, dificuldade
e dor para engolir. Uma parte dos pacientes
apresenta um exantema maculopapular- semelhante ao observado na Dengue. Alguns
podem também apresentar dispneia. A evolução para a febre hemorrágica do Ebola ocorre
numa parte dos pacientes que não conseguem
desenvolver imunidade efetiva para eliminar
o vírus, esse pacientes evoluem com distúrbio
da coagulação, e manifestam desde petéquias
e equimoses até sangramento ativo no trato
digestivo, trato respiratório, sangramento visceral importante, sangramento nos pontos de
venopunção. Nos pacientes que desenvolvem
a forma hemorrágica grave, o óbito incide
principalmente entre o 5º e o 9º dia de doença,
mas essa tendência sofre importante influência do tipo de suporte clínico disponível.
Qual o tempo de incubação do vírus no
corpo humano?
O período de incubação varia entre 2 e 21
dias, mas concentra-se entre 8-10 dias, este
é o intervalo entre o contato infectante e o
início da doença. Por essa razão uma região
onde há transmissão sustentada só será considerada controlada quando se passarem 42
dias sem nenhum caso novo, isto é duas vezes
o período máximo de incubação.
Qual tratamento adequado após detectar a doença?
Não existe tratamento específico, o tratamento é basicamente suporte hidroeletrolítico, nutricional, profilaxias da úlcera de estresse e o tratamento empírico de outras doenças
concomitantes e concorrentes como malária
e infecções bacterianas. O tratamento inicialmente é empírico e a possibilidade de análises clínicas simples fica limitada pelo risco
biológico imposto pelo manuseio de amostras
clínicas e a circulação dos pacientes. Uma
parte importante da patogênese deriva de estudos experimentais em primatas e da análise
de tecidos de necropsias, logo a patogenia nas
formas mais brandas ainda permanece pouco
conhecida.
A utilização de drogas experimentais que
ainda não foram submetidas às etapas dos ensaios clínicos foi discutida em um painel de
especialistas da OMS em agosto. Em virtude
da magnitude do surto, da elevada letalidade e da dificuldade que existe para o desenvolvimento de novas drogas para doenças
negligenciadas optou-se por autorizar o uso
de tratamentos experimentais que ainda não
haviam alcançado as fases clínicas de desenvolvimento. Espera-se que essa decisão tenha
impacto positivo no controle da morbiletalidade do atual surto, e no controle a longo
prazo da doença, onde ela se comporta como
Setembro 2014 - APM - Regional Piracicaba
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