PESQUISAS / RESEARCH / INVESTIGACIÓN A expectativa do paciente no pré e pós-operatório de prostatectomia Expectation of a patient in pre and postoperative of prostatectomy Expectativa de un paciente en pre y postoperatorio de la prostatectomía Maria Zélia de Araújo Madeira Enfermeira. Mestre em educação pela Universidade Federal do Piauí (UFPI). Docente do curso de Enfermagem da UFPI. Rogério da Cunha Alves Acadêmico da Graduação em Enfermagem da UFPI. Rodolfo Luiz Marques Reis Acadêmico da Graduação em Enfermagem da UFPI. RESUMO O estudo tem como objetivo descrever e analisar as expectativas do paciente no pré-operatório de prostatectomia quanto ao seu pós-operatório. Trata-se de abordagem qualitativa, realizada na clínica urológica de um hospital de ensino em Teresina-PI. Os sujeitos são 12 pacientes no pré-operatório de prostatectomia. A partir da análise de conteúdo por meio de entrevista semi-estruturada, emergiram três categorias: orientação quanto à prostatectomia; êxito com o resultado da cirurgia e as alterações no cotidiano após a cirurgia de próstata. Os resultados indicam que os pacientes, em sua maioria, não estão orientados quanto ao procedimento anestésico cirúrgico. E, em relação a possíveis alterações em sua vida no que diz respeito à condição sexual após a cirurgia, os pacientes relataram não estar preocupados quanto à possível disfunção sexual, enquanto que outros se mostraram preocupados. Verificou-se que a visita pré-operatória ao paciente é singular visando ao esclarecimento de duvidas, não só quanto ao procedimento cirúrgico, mas também quanto às informações populares que muitos sujeitos traziam em suas mentes, diminuindo o estresse pré-operatório e o nível de ansiedade. Descritores: Assistência perioperatória. Enfermagem. Prostatectomia. Saúde do homem. Fernando José Guedes da Silva Júnior Acadêmico em Enfermagem pela Faculdade de Saúde, Ciências Humanas e Tecnológicas do Piauí (NOVAFAPI). Ana Maria Ribeiro dos Santos Doutoranda em Enfermagem pela USP-Ribeirão Preto. Mestre em Enfermagem, Docente do curso de Enfermagem da UFPI e Faculdade NOVAFAPI. ABSTRACT The study aims to describe and analyze the expectations of the patient preoperatively about their prostatectomy after surgery. This is a qualitative approach, held in urology of a teaching hospital in Teresina-PI. The subjects are 12 patients preoperatively prostatectomy. From the content analysis by means of semi-structured interview revealed three categories: guidance on prostatectomy, with the successful outcome of surgery and changes in daily life after prostate surgery. The results indicate that patients, most of them do not focus on the surgical anesthetic procedure. And in relation to possible changes in your life with regard to the sexual condition after surgery, patients reported not being worried about the possible sexual dysfunction, while others were concerned. It was found that the preoperative visit the patient’s natural order to clarify doubts not only about the surgical procedure, but also popular on the information that many subjects brought in their minds, reducing preoperative stress and anxiety. Descriptors: Perioperative care. Nursing. Prostatectomy. Men’s health. RESUMEN Submissão: 13/08/2009 Aprovação: 30/11/2009 El estudio tiene como objetivo describir y analizar las expectativas del paciente antes de la intervención sobre sus prostatectomía después de la cirugía. Se trata de un enfoque cualitativo, realizado en urología de un hospital universitario en Teresina-PI.Los temas son 12 pacientes antes de la operación de prostatectomía. Desde el análisis de contenido por medio de entrevista semi-estructurada reveló tres categorías: orientación sobre la prostatectomía, el éxito con el resultado de la cirugía y los cambios en la vida cotidiana después de la cirugía de próstata. Los resultados obtenidos indican que los pacientes, la mayoría de ellos no se centran en el procedimiento anestésico quirúrgico. Y en relación con posibles cambios en su vida con respecto a la condición sexual después de la cirugía, Revista Interdisciplinar NOVAFAPI, Teresina. v.3, n.1, p.13-18, Jan-Fev-Mar. 2010. 13 Madeira, M. Z. A. et al. los pacientes no reportaron estar preocupados por la posible disfunción sexual, mientras que otros estaban preocupados. Se encontró que la visita preoperatoria orden natural del paciente para aclarar dudas no sólo sobre el procedimiento quirúrgico, pero también muy popular en la información que trajo muchos temas en sus mentes, reduciendo el estrés y el nivel de ansiedad preoperatoria . Descriptores: Cuidados perioperatorios. Enfermería. Prostatectomía. La salud del hombre. 1 INTRODUÇÃO A próstata é um órgão exclusivo do sistema reprodutor masculino, formada por músculo liso e tecido fibroso que contêm glândulas cuja secreção é responsável pelo odor característico do sêmen. Pode ser sede de um grande número de doenças que atingem o homem, principalmente a partir da quinta década de vida, a hiperplasia prostática (SMELTZER; BARE, 2006). A prostatectomia, possivelmente, ainda seja o tratamento mais eficaz da hiperplasia prostática benigna e do câncer de próstata localizado. Porém, entre as complicações dessa cirurgia, temos a incontinência urinária, a qual é tida como a mais aflitiva ao paciente e à disfunção erétil. Antonio, Munari e Costa (2002) descrevem que a cirurgia para o paciente é um marco de momentos críticos no processo terapêutico, esse marco é caracterizado por medo do desconhecido, sua anestesia e também do próprio risco inerente a qualquer procedimento desta natureza. Por outro lado, a desinformação do ato cirúrgico e complicações ligadas à doença são outros fatores geradores de sentimentos desagradáveis do paciente, fatores estes que podem causar significativas alterações no organismo, como pico hipertensivo e alterações na taxa de glicose. Desse modo, a equipe de enfermagem tem a possibilidade de diminuir os vários problemas emocionais relatados pelo cliente, ajudando-o no enfrentamento da doença. Porém, a ausência desta assistência ou mesmo uma comunicação ineficaz da enfermagem sobre as dúvidas do paciente poderá tornar-se maléfica para as necessidades do cliente. Na perspectiva de Antonio, Munari e Costa (2002), o ato cirúrgico para o paciente é visto como uma possibilidade de voltar a ter uma vida “normal”, a visão do pós-operatório é, muitas vezes, tida como uma cessação de todos os desconfortos advindos da doença. No estudo, adotou-se a palavra expectativa por significar esperança baseada em supostas promessas e direitos. Alem do mais, no latim expectatu se traduz por esperado. E isso significa estar à espera de, aguardar, confiar em, contar com a realização de algo desejado ou prometido. Assim, acredita-se que considerando todo o contexto acima, significa ter esperança baseada em supostos direitos e esperar a realização de algo desejado (SILVEIRA, 2003). Nesta perspectiva, apresenta-se como objetivo deste estudo descrever e analisar as expectativas do paciente no pré-operatório de prostatectomia quanto ao seu pós-operatório. 2METODOLOGIA Consiste em investigação de abordagem qualitativa em que explorou-se a experiência das pessoas na sua vida cotidiana, buscando compreender questões da realidade que, a rigor, não podem ser quantificadas, tais como: explorar, conhecer, entender e interpretar um fenômeno, situações e eventos, quer sejam passados ou presentes (POLIT; HUNGLER, 2005). 14 O estudo foi realizado na clínica urológica e especializada, de um hospital de ensino, em Teresina-PI. Os sujeitos em estudo, que aceitaram participar da pesquisa, foram os pacientes admitidos no pré-operatório de prostatectomia no período de abril a maio de 2009. A produção de dados foi realizada por meio de entrevistas semi-estruturadas, gravadas em um aparelho mp4 e, em seguida, precisa e literalmente, transcritas; preservando as falas dos entrevistados. Integraram o quadro de sujeitos investigados 12 homens, e a maioria encontrava-se na faixa etária de 65 a 79 anos. Para garantir o anonimato dos sujeitos, fizemos uso de uma nomenclatura ficcional ao identificar cada um dos nossos interlocutores, tendo como fonte de inspiração nomes de pássaros. Por exemplo: Pipira, Bem-te-vi, Arara Azul, Beija-flor, Vim-vim, Tucano, Canário, Curió, Perdiz, Sabiá, Avoante, Bico-de-prata. Tal escolha se deve ao fato dos pássaros, mesmo estando presos numa gaiola e solitários, cantam cheios de esperança, similarmente ao paciente que se encontra no pré-operatório que se mostra esperançoso diante da doença e das adversidades ocorridas nesse período cirúrgico, tais como: a informação deficiente realizada pela equipe multiprofissional e, geralmente, a distância em que muitos se encontram do seu lar. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal do Piauí (UFPI), sob o número do CAAE 0223.0.045.000-08, obedecendo aos critérios da Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde que regulamenta a pesquisa envolvendo seres humanos. A solicitação de participação no estudo se deu verbalmente seguido da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. 3 ANÁLISE DOS DADOS Neste trabalho, objetivamos descrever e analisar as expectativas do paciente no pré-operatório de prostatectomia. Assim, partindo-se das falas dos depoentes, nomearam-se três categorias que serão apresentadas e discutidas a seguir. 3.1 Orientação quanto à prostatectomia Nesta categoria, mostra-se a visão do paciente sobre sua cirurgia, relacionado ao que ele espera saber sobre o procedimento cirúrgico ao qual será submetido. Para o paciente, as informações sobre a cirurgia prestadas pelo médico ou pelo enfermeiro lhes deixam mais tranqüilos para realizar a cirurgia. Observou-se que a maioria dos pacientes entrevistados relatou não ter sido informada quanto ao procedimento cirúrgico em si, nem quanto ao preparo pré-operatório ou protocolo da instituição em relação à rotina das cirurgias. Essa constatação foi direcionada quando perguntamos aos sujeitos sobre orientações e dúvidas em relação a sua cirurgia de prostatectomia. Os depoimentos abaixo elucidam: [...] Não foi me falado nada não. Mas, como não fiz nenhuma cirurgia, a gente tem medo, fica preocupado [...] (Bem-te-vi). [...] Não recebi orientação. Na realidade, eu estou desorientado nesse problema da cirurgia. Eu não tenho essa orientação [...] (Bico-de-prata). Pode-se perceber a nítida preocupação e desinformação no primeiro relato, o paciente mostrou-se nervoso e ansioso quanto à cirurgia; enquanto, na segunda fala, o sujeito revelou seu total desconhecimento sobre qualquer procedimento ou cuidado cirúrgicos. Christóforo e Carvalho (2009) defendem que o principal objetiRevista Interdisciplinar NOVAFAPI, Teresina. v.3, n.1, p.13-18, Jan-Fev-Mar. 2010. A expectativa do paciente no pré e pós-operatório de prostatectomia vo dos profissionais de saúde, que acompanham um paciente cirúrgico no seu período pré-operatório, é propiciar o bem-estar porque é, nesse momento, que os pacientes apresentam altos níveis de estresse e podem desenvolver sentimentos que atuariam de maneira negativa no processo cirúrgico. Observaram também que o estado emocional, muitas vezes, independe da complexidade cirúrgica, e a excitação está intimamente ligada à falta de informação sobre o procedimento cirúrgico, a anestesia e os cuidados que devem ser realizados. As autoras mencionam também a existência de deficiências no preparo físico, psicológico e espiritual do paciente e enfatizam a importância do enfermeiro no planejamento de uma assistência que vise sanar tais problemas, além de orientar quanto à cirurgia e ao preparo necessário para o paciente. Todos esses cuidados devem ser realizados de tal forma a se adequar a cada individuo, respeitando suas individualidades, suas reais necessidades e estimulando o paciente a participar da decisão no cuidado prestado. Há muito tempo que o valor da orientação pré-operatória é reconhecido pela enfermagem, o paciente é ensinado como um indivíduo, considerando-se quaisquer preocupações ou necessidades próprias. O ensinamento deve transcender os procedimentos, incluindo também as sensações que o paciente pode experimentar. Saber o que o espera ajuda o paciente a antecipar reações e diminuir a tensão (SMELTZER; BARE, 2006). Os depoimentos a seguir trazem as principais dúvidas dos pacientes quanto à prostatectomia, mostrando claramente a desinformação e falta de uma comunicação eficaz entre eles e a equipe de enfermagem. [...] Eu vou realizar a cirurgia amanhã, mas não sei, como por exemplo, quantos meses eu vou ter que ficar sem fazer nada, sem trabalhar, sem andar de bicicleta, até eu ficar bom [...]. (Arara Azul). [...] A duvida que eu tenho é sobre o dia da minha cirurgia [...] era para ser hoje de manhã [...] (Beija-flor). Eu tenho dúvida em relação à dieta, porque dizem que é de 3 meses de dieta sem trabalhar. Eu creio que vai dar tudo certo. Eu estou meio ansioso. Como é? A anestesia é geral? Depois da meia noite não pode mais tomar água [...] (Vim-vim). [...] Eu queria saber sobre a cirurgia e o risco de retornar para o hospital, porque tem paciente que volta (Curió). Com a cirurgia não tenho medo, mas tenho com a sonda, porque ficar com ela, dois, três meses... é difícil [...] (Avoante). Nos relatos, os sujeitos sabem minimamente sobre os cuidados a serem prestados e o procedimento cirúrgico. Percebe-se uma falha de comunicação entre os profissionais de saúde, no caso, os de enfermagem, que são responsáveis pela orientação perioperatória ao paciente. Isso se evidencia claramente na fala do Beija-flor que desconhecia o motivo do adiamento de sua cirurgia e sua remarcação. Pode-se perceber também que o mínimo conhecimento apresentado pelos depoentes, mesmo que na forma de questionamentos, baseia-se ou em experiências cirúrgicas anteriores ou na observação da vivência de terceiros, como a fala do depoente Avoante. O vocábulo “dieta”, mencionado pelo depoente Vim-vim, não se refere apenas à alimentação após a cirurgia, mas a todas as orientações voltadas para a plena recuperação pós-cirúrgica. As principais dúvidas dos pacientes estão nos cuidados pós-operatórios, como se esses cuidados fossem de inteira responsabilidade do paciente e seus cuidadores. Quanto aos cuidados pré-operatórios, os pacientes acabam por deixar esses cuidados a cargo da equipe de enfermagem, esta por fim, na maioria das Revista Interdisciplinar NOVAFAPI, Teresina. v.3, n.1, p.13-18, Jan-Fev-Mar. 2010. vezes, não os instrui de maneira correta. O principal motivo que provoca o aumento do estresse nos pacientes cirúrgicos é proveniente da obscuridade das informações que envolvem as características da cirurgia ao qual será submetido (PAULA; CARVALHO, 1997). Segundo Paula e Carvalho (1997), dentre os principais objetivos da visita pré-operatória, estão: diminuir os níveis de ansiedade do paciente, ajudar em sua recuperação prestando uma assistência planejada e qualificada; além de prestar informações que detalhem as ações de enfermagem realizadas no período perioperatório. Tais orientações devem ser repassadas de forma individual ou em grupo, de forma clara e objetiva, e que estejam em nível de compreensão do paciente. De acordo com o processo de enfermagem utilizado para um paciente que se submete à prostatectomia, um dos diagnósticos encontrados é o conhecimento diminuído sobre o tratamento e os cuidados pré e pós-operatórios. A orientação do paciente se dá tanto para a cirurgia como para os exames diagnósticos. A informação emitida baseia-se nas necessidades e perguntas do paciente. As orientações tanto no pré-operatório quanto no pós-operatório devem ser claras e de fácil entendimento para o paciente a fim de otimizar sua reabilitação e evitar complicações potenciais (SMELTZER; BARE, 2006). Para Floriani (2008), a falta de conhecimento do paciente sobre seu diagnóstico é um dos principais fatores que inviabiliza a tomada de decisão por parte dele com relação à escolha de seu tratamento. Este se torna “fútil”, pois sua escolha muitas vezes parte de uma decisão unilateral médica, ou senão, sofre intervenção da família ou cuidador, que desconsidera os desejos e as preferências do paciente nos processos decisórios. Os relatos, abaixo, explicitam a importância de uma visita pré-operatória que transfira de forma clara e objetiva as informações sobre os cuidados de enfermagem e o procedimento cirúrgico. Eu gosto de ser informado, porque a gente já vai sabendo de tudo. A coisa mais importante é a pessoa ser orientada, fica mais tranqüilo (Tucano). Eu gosto de ser orientado pelas pessoas que sabem e que queiram me orientar, e eu acho bom. Eu ouvi dizer que tem outra operação com raio laser (Canário). Constata-se a importância contida em cada frase, nota-se que os sujeitos mostram uma satisfação com a promessa de receber orientação sobre o procedimento cirúrgico. De acordo com o relato do Canário, ele possui um pequeno conhecimento com relação a outras opções de tratamento, conhecimento este adquirido de terceiros. Em virtude disso, confirmamos com a literatura de que a falta de informação interfere e, muito, na autonomia do paciente em relação a seu poder decisório no tratamento. Christóforo e Carvalho (2009) também mencionam que o período que antecede a internação é bastante complicado para o paciente, ele sabe muito pouco sobre sua situação e o que ocorrerá com ele. Grande parte dos pacientes que se submeterá a um procedimento cirúrgico busca – em leigos, amigos e familiares que vivenciaram uma situação semelhante – as informações que lhes são favoráveis. Contudo, freqüentemente essas informações são repassadas de maneira equivocada, o que pode aumentar, muitas vezes, a ansiedade e os receios dos pacientes frente ao procedimento cirúrgico ao qual será submetido. O enfermeiro é um profissional preparado para fazer essa orientação de forma a esclarecer as dúvidas do paciente, além disso, ele é obrigado legal e moralmente a fazê-la. 15 Madeira, M. Z. A. et al. 3.2 Êxito com o resultado da cirurgia Nesta categoria, o paciente relata sua esperança quanto ao resultado da cirurgia. Essa esperança é acompanhada de seu sucesso ou não, podendo apresentar dúvidas de sua expectativa quanto à prostatectomia. Através dos depoimentos, percebe-se que os sujeitos estão principalmente preocupados com o sucesso do procedimento cirúrgico e conseqüentemente com o retorno a sua qualidade de vida com a cessação de todos os sintomas provocados pela patologia. Ao serem questionados sobre suas expectativas em relação ao tratamento cirúrgico e o período pós-operatório, os sujeitos emitiram os seguintes discursos: O que eu penso é de ficar bom e continuar minha vida. Então, depois da cirurgia eu não vou trabalhar, mas eu quero ter uma vida assim... Para eu passear, para andar na casa de meus filhos [...] (Arara Azul). Eu quero mesmo é ser cortado de um jeito adequado e não ter problema. Pra mim, tá tudo bem, estou tranqüilo. O que eu espero é ficar bom e poder voltar para minha casa, cuidar da roça (Beija-flor). Eu estou esperando que ocorra tudo normal, que ocorra na normalidade (Vim-vim). Nos discursos, percebe-se na fala do depoente Vim-vim que ele atribui aos termos “normalidade” e “normal” um significado de sucesso cirúrgico, a resolução de seu problema com o mínimo de complicações possíveis é basicamente o que ele espera. De certa forma, é difícil predizer o que o paciente considera normal, já que conforme analisado na primeira categoria, o baixo nível de orientação dos pacientes não dá parâmetros para que se possa afirmar até que ponto as alterações fisiológicas, após a cirurgia, serão entendidas como normais. Os relatos de Arara Azul e Vim-vim afirmam que a maior expectativa pra eles é de alcançar a cura e poder voltar as suas rotinas e afazeres interrompidos pela patologia. Para eles, terem de novo suas qualidades de vida com autonomia e fazer o que faziam antes sem a ajuda de terceiros é o mais importante. Vale salientar que o conceito de qualidade de vida não deve ser confundido com padrão de vida. Devem-se distinguir as idéias de qualidade de vida e padrão de vida. Este refere aos indicadores globais das formas relevantes do modo de convivência em sociedade; em termos sociais, econômicos, demográficos e de cuidados básicos de saúde. O primeiro fundamenta-se em fatores que se referem a uma visão subjetiva dos aspectos importantes da vida dos indivíduos, podendo coincidir com os indicadores de padrões de vida ou não. A cultura em que a pessoa vive influencia nessas percepções, ou seja, é de fundamental importância na concepção de um povo em relação à qualidade de vida. Portanto, diferentes culturas podem priorizar diferentes aspectos na definição de qualidade de vida, podendo esta aproximar-se do conceito de padrão de vida (PANZINI et al., 2007). Nos depoimentos que seguem, percebeu-se a religiosidade de alguns pacientes e a confiança que eles têm em seu “Deus” (ser supremo e divindade que as religiões consideram criador do Universo) para interceder e ajudar no êxito do tratamento. A preocupação que eu tenho é de ficar bom, mas essa fé eu tenho em Deus, que eu fico bom (Canário). Eu tenho fé em Deus que eu vou ficar é bom, estou nas mãos de Deus. Quando eu fizer a operação, eu quero ficar é bom (Bico-de-prata). 16 [..] Eu creio que vai dar tudo certo. Eu estou confiante em Deus, primeiro a gente tem que colocar Deus, porque é ele que determina. Eu sei que o médico faz, mas é Deus que usa ele pra fazer a coisa bem feita. (Vim-vim) Na fala dos sujeitos, a profunda importância da religiosidade em suas vidas, ao ponto de atribuir o sucesso do procedimento cirúrgico primeiramente nas “mãos de Deus” do que na figura do médico, como se observa no discurso do Vim-vim. Avaliando a caracterização dos sujeitos em estudo, constatamos que compreendem majoritariamente de idosos. Para grande parte dos idosos, a religiosidade é fator essencial de suas vidas, relacionado-a ao surgimento, à manutenção e às possibilidades de atenuação de agravos à saúde física e mental. O avanço da idade e o aumento da espiritualidade são fontes importantes no suporte emocional, contribuindo de forma decisiva para o bem-estar na velhice (FLORIANO; DALGALARRONDO, 2007). Para Salgado, Rocha e Conti (2007), alguns enfermeiros sentem-se inseguros para tratar com o tema da religião com os pacientes por este ser um assunto polêmico, principalmente no âmbito da ciência. A negligência de não discutir o tema no ambiente hospitalar torna o processo de cuidar fragmentado, além de faltar com o dever profissional e desrespeitar o direito do cliente. Os relatos contidos, nessa categoria, ratificam que a expectativa dos sujeitos entrevistados é o bem-estar, cura e saúde após o procedimento cirúrgico. As falas a seguir ilustram o que foi dito. O que eu penso é de fazer essa cirurgia e ficar bom e não fazer por onde eu voltar, porque eu conheço muitos que já foram operados três vezes e não estão bom (Arara Azul). Vai ser melhor pra mim, porque do jeito que eu estou não posso fazer nada, não posso trabalhar e eu quero é ficar bom. Vai dar tudo certo (Perdiz). Nos depoimentos de Arara Azul e Perdiz, a confiança que eles têm em sua melhora, para eles, está com uma saúde ótima após a cirurgia é essencial. Mas falar em saúde sempre se remete ao conceito adotado pela OMS (Organização Mundial de Saúde) de que “saúde é um estado de completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doença.” Isso nos intriga e nos leva a refletir sobre qual idéia de saúde a população possui ou acredita. Scliar (2007) considera que a amplitude do conceito de saúde emitida pela OMS em 1948 seria algo inatingível e utópico não podendo ser usada como objetivo para os órgãos de saúde apenas como uma meta para manter o grau de qualidade e eficiência dos serviços. Para ele, o conceito de saúde remete a uma conjuntura social, econômica, política e cultural, ou seja, a saúde nunca será a mesma coisa para as pessoas, o mesmo vale para o conceito de doença. 3.3 Alterações no cotidiano após a cirurgia de próstata Nesta categoria, os sujeitos em estudo relatam a problemática da doença hiperplasia prostática e a preocupação com relação à sua condição sexual após a cirurgia. Esta é entendida como uma alteração do desejo sexual e/ou das respostas psicológicas e fisiológicas do corpo frente aos estímulos sexuais, sendo que, culturalmente, pode causar sofrimento e insatisfação não só na pessoa afetada, como, possivelmente, também no seu par. Assim, durante a entrevista, os sujeitos relataram estar preocupados com sua condição sexual, mas atingir a cura é fundamental, é mais Revista Interdisciplinar NOVAFAPI, Teresina. v.3, n.1, p.13-18, Jan-Fev-Mar. 2010. A expectativa do paciente no pré e pós-operatório de prostatectomia importante, apresentados nos seguintes trechos: Se disserem que eu não presto mais pra mulher [...] eu já disse foi pra muita gente, eu quero ficar é bom, sem sentir dor, caminhando. [...] esse negócio de mulher é bom, mas se o cara não pode, não tem nada, não é por causa disso que eu vou meter uma corda em meu pescoço e morrer (Arara Azul). Não tenho preocupação quanto à função sexual, porque de qualquer jeito eu quero é ficar bom, o importante é a saúde da gente (Perdiz). É importante lembrar que os entrevistados estavam no período do pré-operatório, daí devemos ter em mente que seus níveis de estresse estavam, de certa forma, alterados, ou seja, eles apresentavam-se num período de angústia e de ansiedade. Para Peniche e Chaves (2000), a cirurgia e a anestesia desencadeiam sentimentos no homem que, influenciados pelas diferenças individuais, resultarão em comportamentos peculiares de ajustes, cuja finalidade é enfrentar o stress e a ansiedade provocada por esse evento. Dessa forma, podemos pressupor, embora que não seja verdadeiro afirmar, que tais indivíduos negaram sua vida sexual por estar em período de estresse e ansiedade. Para Fighera e Viero (2005), o paciente pré-cirúrgico lança mão de algumas estratégias para tentar obter controle sobre a ansiedade e o medo, tais como: desqualificação dos sentimentos e controlar o pensamento. Este controle pode ser evidenciado pelo relato do Vim-vim, abaixo: [...] alguns dizem que quem faz cirurgia de próstata fica incapaz pra mulher, não sei se é assim. [...] de qualquer maneira tem que tratar da saúde (Vim-vim). Alguns pacientes podem ter negado sua verdadeira angústia por se mostrarem em situação de conflitos devido à internação hospitalar. Ferreira et al. (2000) menciona que o paciente cirúrgico se mostra em situação de conflito devido à expectativa em relação ao sucesso da intervenção. Este paciente espera amparo e soluções para os seus problemas. Assim, por conta disso, podem demonstrar maior preocupação com a cirurgia sem ter um foco na disfunção sexual. Observe os relatos transcritos abaixo. Rapaz, [...] se eu tivesse bem como eu era mesmo tava bom, mas eu tô sabendo que eu tô com essa coisa, aí (em relação à vida sexual) não me preocupa não (Canário). [...] no fundo bate uma preocupação, porque o cara não é mais homem, não presta mais. [...] Mas tem problema não, eu quero é ficar vivo para tratar de meus negócios (Arara Azul). Porém, pode-se dizer que, para estes pacientes, o que realmente está importando é a melhora total dos incômodos que a hiperplasia prostática lhes traz. Segundo Smeltzer e Bare (2006), tais incômodos são: aumento da freqüência de micção, nocturia, hesitação no inicio da micção, esforço abdominal à micção, diminuição no volume e força do jato urinário, interrupção do sistema urinário, gotejamento (gotas de urina depois da micção), uma sensação de que a bexiga não se esvaziou por completo, retenção urinária aguda e infecções recorrentes no trato urinário. Verificou-se, ainda, que alguns sujeitos não se mostram preocupados com sua vida sexual, devido ao fato de que já não se consideravam aptos ao sexo. O homem, depois dos 70 anos, lembra do que foi um dia, e eu que passei dos 74 [...]. A gente cuida da vida da gente, da saúde é o que importa. A gente já foi novo, gozou bem, quando se está nesta idade só quer gozar a saúde e a vida (Tucano) Isso é assim, [...] o velho já morreu faz é tempo [risos]. Em casa, era a maior luta, e agora que eu estou com essa sonda aqui aí pronto acabou-se (Pipira). sexual, sem que viessem a mencionar outros fatores que pudessem afetar sua saúde. Tem deles que diz que se cortar de trevessa, fica capado. Não sei. Eu espero que não me deixe capado. (Sabiá) Eu tenho medo que a cirurgia venha afetar a função sexual, porque a vida da gente é essa, o camarada perdeu isso aí já era. (Avoante) Os pacientes se mostraram preocupados em manter uma vida sexual ativa presente. Para Grassi e Pereira (2001), a condição de disfunção sexual é tida como uma não identificação da masculinidade, ou seja, há uma deformação da imagem do corpo do homem como um todo, a qual era antes sustentada ou imaginada por meio do órgão ereto. Naccarato e Perchon (2004) dizem que a dor psicológica causada pela disfunção erétil pode ser mais incapacitante que os problemas físicos. Isso pode ser evidenciado pela fala do Bem-te-vi abaixo. Mas rapaz, ave Maria, se uma pessoa tiver uma coisa dessa [disfunção sexual], ele não quer a vida (Bem-te-vi). Porque na idade que eu tô, se ficar capado nem tem mais gosto na vida (Sabiá). Os depoimentos de Bem-te-vi e Sabiá colocam que seu prazer pela vida está relacionado ao sexo. Para Vitiello (2000), a ereção se constitui o ponto central da atividade sexual, sendo seus relacionamentos altamente genitalizados. Essa situação abre uma ferida na identidade masculina, pois o pênis ereto exerce um significado de poder para o homem. Por isso, a incapacidade de manter-se funcionante dói para o sujeito impotente. A imagem de um homem sexualmente inativo se mostra para os depoentes como uma pessoa não apta ao papel da masculinidade. Ao analisar as falas dos depoentes, notamos que vários pacientes já haviam ouvido falar da possível disfunção sexual ocorrida devido à prostatectomia. Eu já disse foi pra muita gente, eu quero ficar é bom, sem sentir dor, caminhando (Arara Azul). [...] alguns dizem que quem faz cirurgia de próstata fica incapaz pra mulher, não sei se é assim (Vim-vim). Porque o povo fica dizendo que não vai ser mais ninguém, aí a gente fica preocupado (Curió). Normalmente, essas informações, que de certa forma foram erroneamente transmitida ao paciente, trazem uma série de preocupação e angústia ao mesmo. Ferreira et al. (2000) diz que o corpo de enfermagem deve compreender a ansiedade do paciente, que pode ter como causas os conhecimentos estereotipados por experiências contadas por amigos ou outros pacientes. Nesse caso, a equipe multiprofissional deve estar atenta a prestar as informações ao paciente. Nesse sentido, o seguinte bloco de narrativas ilustra o fenômeno em apreço: [...] no fundo bate uma preocupação, porque o cara não é mais homem, não presta mais (Arara Azul). Porque a vida da gente é essa, o camarada perdeu isso aí, já era (Avoante). Os depoimentos nos afirmam que o homem é aquele que se sente obrigado a estar à altura da possibilidade que lhe é oferecida de fazer crescer sua honra buscando a glória e a distinção na esfera pública (BOURDIEU, 1999). Outros pacientes deixaram explícita sua preocupação com a vida Revista Interdisciplinar NOVAFAPI, Teresina. v.3, n.1, p.13-18, Jan-Fev-Mar. 2010. 17 Madeira, M. Z. A. et al. 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS O indivíduo afetado por qualquer tipo de doença encontra-se muito vulnerável tanto em seus aspectos físicos quanto psíquicos e ainda mais quando o tratamento escolhido para sua patologia é tão invasivo e traumático quanto à cirurgia. Dentre os vários tipos de cirurgias, a prostatectomia hoje em dia é uma das mais realizadas, em sua maioria por homens de maior idade e em decorrência de câncer de próstata ou hiperplasia prostática benigna. A princípio, foi evidenciada a falta de informações pelos pacientes como sendo um dos principais componentes no aumento da ansiedade e angústia. O medo do desconhecido, da anestesia e da dor são fatores presentes na mente dos pacientes cirúrgicos. Portanto, o preparo e a orientação no pré-operatório são de responsabilidades da equipe de enfermagem e um direito do paciente. Apesar de todas as expectativas, a que mais se destacou foi a relacionada ao procedimento cirúrgico em si e ao seu êxito. Os entrevistados, apesar de todas as dúvidas e medos, pronunciaram-se de maneira enfática ao relatar que almejavam obter uma boa saúde e qualidade de vida com a cirurgia, isso dentro de suas concepções culturais, sócio-econômicas, políticas e demográficas. O presente estudo nos trouxe uma enorme contribuição ao desvendar o que se passa na mente dos homens em um momento tão delicado de suas vidas, como nas horas que antecedem uma prostatectomia. Com isso, a enfermagem tem uma ferramenta muito importante para o planejamento da assistência e implementação de cuidados de forma efetiva e humanizada aos pacientes em pré-operatório de prostatectomia. REFERÊNCIAS ANTONIO, P. S.; MUNARI, D. B.; COSTA, H. K. Fatores geradores de sentimentos do paciente internado frente ao cancelamento de cirurgias. Revista Eletrônica de Enfermagem, Goiânia, v. 4, n. 1, p. 33-9, jan.-mar.2002. PAULA, A. A. D.; CARVALHO, E. C. Ensino sobre perioperatório a pacientes: estudo comparativo de recursos audiovisual (vídeo) e oral.Rev. Latino-am. Enferm. Ribeirão Preto, v. 5, n. 3, p. 35-42, jun.1997. BOURDIEU, P. A dominação masculina. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1999. PENICHE, A. C. G.; CHAVES, E. C. Algumas considerações sobre o paciente cirúrgico e a ansiedade. 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