Módulo 17 ­ O Desenvolvimento Econômico Em primeiro lugar, é preciso destacar mais uma vez a diferença entre crescimento econômico e desenvolvimento econômico. O crescimento econômico diz respeito à elevação do produto real da economia durante um certo período de tempo, sem que haja necessariamente mudanças estruturais ou na distribuição de renda, nem muito menos preocupações com a sustentabilidade deste crescimento. A idéia de crescimento econômico é recente; antes do surgimento do capitalismo, as sociedades estavam em estágios comparativamente estagnados, eram basicamente agrícolas e variavam pouco ao longo dos anos, com exceção de boas ou más colheitas, guerras e epidemias. O capitalismo e as mudanças tecnológicas trazendo a acumulação de capital, alterou de forma radical as estruturas dessas sociedades. Foi graças ao crescimento econômico que os países desenvolvidos alcançaram elevado nível de vida após 1850. Isto lhes permitiu realizar investimentos para, simultaneamente, criar capacidade produtiva e expandir o consumo e conforto da população. No século XX a produção industrial cresceu entre 30 e 40 vezes e como a população mundial dobrou, a produção per capita cresceu entre 15 e 20 vezes. Maiores níveis de bem­estar foram alcançados ao longo deste século, com a utilização da energia elétrica, água encanada, rede de esgotos, o que contribuiu para aumentar a expectativa de vida da população. O crescimento econômico seria então definido como o aumento contínuo do produto interno bruto em termos globais e per capita, ao longo do tempo; esse critério também implica uma melhor eficiência do sistema produtivo. Alguns defendem que o crescimento é um aumento na produção acompanhada de modificações nas disposições técnicas e institucionais, isto é, mudanças nas estruturas produtivas e na alocação dos insumos pelos diferentes setores da produção. Algumas economias crescem a taxas mais elevadas do que outras. Embora seja bastante complexa a definição das causas do crescimento econômico, visto que isto depende das peculiaridades de cada país e de seus processos históricos, existem algumas razões básicas que determinam o crescimento da sociedade: 1) Acumulação de capital – por meio de aumento de máquinas, indústrias, obras de infra­estrutura, estradas, energia e melhor preparação de mão de obra; 2) A disponibilidade de recursos produtivos (ampliação da mão­de­obra e outros insumos); 3) Aumento de produtividade (melhoria na qualidade da mão­de­obra, melhoria tecnológica e eficiência organizacional na combinação de insumos); 4) A atitude da sociedade em relação à poupança; 5) Crescimento da população – um aumento da população implica um aumento da força de trabalho e da demanda interna. Na verdade, o crescimento econômico é um elemento fundamental para a geração de uma série de benefícios para a sociedade. Ele caracteriza­se como sendo um processo sustentado ao longo do tempo, no qual os níveis de atividade econômica aumentam continuamente. Crescimento econômico, portanto, não deve ser confundido com desenvolvimento econômico, porque os frutos da expansão do produto nem sempre beneficiam a economia como um todo e o conjunto da população. O crescimento econômico, neste sentido, nada mais é do que um elemento de um processo mais geral e abrangente: o desenvolvimento econômico, que provoca ao longo do tempo, mudanças fundamentais em sua organização e em suas instituições. Assim, o desenvolvimento econômico engloba não apenas a expansão do produto real da economia, mas implica também mudanças significativas na estrutura produtiva e da própria sociedade, com melhoria nos indicadores sociais e na distribuição de renda. Desta forma, o desenvolvimento econômico constitui um conceito mais qualitativo, que diz respeito às alterações da composição do produto e a alocação dos recursos pelos diferentes setores da economia, de forma a melhorar indicadores relativos à pobreza, desemprego, desigualdade, condições de saúde, alimentação, educação e moradia. O processo de desenvolvimento econômico engloba, além das mudanças de caráter quantitativo dos níveis do produto nacional, as modificações que alteram a composição do produto e a alocação dos recursos pelos diferentes setores da economia. O fundamental é que o desenvolvimento econômico não pode ser analisado somente por meio de indicadores que medem o crescimento do produto. Sua análise deve ser complementada pela avaliação de índices que representem, mesmo que de forma incompleta, a qualidade de vida dos indivíduos. Desse modo, devemos ter um conjunto de medidas que reflitam alterações econômicas, sociais, políticas e institucionais. O crescimento econômico é condição necessária, mas não suficiente para gerar desenvolvimento. 17.1. Origens da Questão do Desenvolvimento Econômico As preocupações com o crescimento e desenvolvimento econômico têm raízes tanto teóricas como empíricas, razões estas, originadas das crises econômicas. O crescimento econômico moderno surgiu com a Revolução Industrial Inglesa entre 1760 e 1850, coincidindo com a supremacia do capitalismo como sistema econômico predominante. As inovações tecnológicas permitiram produção agrícola crescente, apesar do êxodo rural em direção às cidades. Esse fenômeno moldou a característica moderna do crescimento econômico, que é a intensa urbanização. Embora o desenvolvimento econômico tenha obtido destaque enquanto questão de Estado somente no século XX, a preocupação com o crescimento econômico nos principais países da Europa é bem antiga. No entanto, até o surgimento das flutuações econômicas do século XIX e a concentração exacerbada de renda e riqueza, o objetivo principal dos que se ocupavam com as finanças públicas era aumentar o poder econômico e militar dos homens do poder. Dificilmente havia preocupação com a melhoria das condições de vida da população. Já no século XVIII surgiram algumas escolas de pensamento econômico preocupadas com as questões do crescimento econômico e distribuição da riqueza. Com A riqueza das nações, em 1776, Adam Smith procura identificar as razões que determinam o crescimento da riqueza nacional de um país, tentando explicar como opera o mercado e qual a importância do aumento do tamanho dos mercados, para reduzir os custos médios de produção e permitir uma produção lucrativa. O aumento dos mercados amplia a renda e o emprego, segundo a análise de Smith. O aumento da proporção dos trabalhadores produtivos, em relação aos trabalhadores improdutivos, a redução do desemprego e a elevação da renda média da população constituiria um processo de desenvolvimento econômico para Smith. Haveria, portanto, uma redistribuição de renda entre capitalistas, trabalhadores e arrendatários. O contexto histórico da concepção teórica smithiana é a consolidação da expansão capitalista moderna, quando se desenrolava a revolução industrial, os avanços nas máquinas de fiação e tecelagem, invenção da máquina a vapor, entre outras inovações. Embora o crescimento econômico tenha se acelerado com a revolução industrial inglesa, a questão do desenvolvimento econômico somente emergiu no século XX. A consolidação da industrialização, e com ela a acentuação das diferenças entre as nações ricas e pobres, trouxe consigo também o aprofundamento das diferenças no interior dos próprios países desenvolvidos, tornando saliente o desnível do desenvolvimento entre regiões e classes sociais. Surge então a necessidade de dar maior ênfase à questão do desenvolvimento econômico. Em 1911, Joseph Schumpeter publica a sua Teoria do Desenvolvimento Econômico, estabelecendo pela primeira vez a diferença entre crescimento e desenvolvimento econômico. Quando há desenvolvimento, diz Schumpeter, existem inovações tecnológicas, e o processo produtivo deixa de ser rotineiro e os empresários passam a auferir lucros extraordinários. Com a crise econômica generalizada, que surge a partir do crack da Bolsa de Nova York em 1929, o drama social do desemprego tornou­se evidente. No entanto, a intensidade das crises era diferente entre setores, regiões e classes sociais. Em períodos de crescimento do produto, toda a sociedade se beneficia; contudo, nas crises, este produto se retrai, e os mais prejudicados são os assalariados e as pequenas empresas. A nível global, os mais prejudicados são os países mais pobres. Fica evidente, portanto, que uma das condições básicas para o desenvolvimento econômico é a estabilidade e que o ritmo do crescimento econômico deve ser tal sorte a atender às reivindicações das diferentes classes sociais, regiões e países. Com o surgimento da Contabilidade Social[1], os países passaram a medir suas rendas e seus desempenhos, além do surgimento de outros indicadores econômicos e sociais, tornando­se factível a comparação da renda per capita dos diversos países e a conseqüente classificação destes como ricos ou pobres. Torna­se, portanto, mais urgente o debate sobre o desenvolvimento econômico e o papel do Estado na sua promoção. Com a publicação destes indicadores econômicos, os países pobres passaram a ser identificados como países subdesenvolvidos. Em geral, estes países apresentavam crescimento econômico instável e insuficiente, elevado nível de analfabetismo, elevadas taxas de natalidade e mortalidade infantil, predominância da agricultura como atividade principal, insuficiência de capital e de certos recursos naturais, mercado interno restrito, baixa produtividade, instabilidade política, entre outras coisas que os caracterizavam como países subdesenvolvidos. Até então, inexistiam estatísticas em nível nacional e regional, e a visão prevalecente era a de que o setor público deveria abster­se de intervir na economia. O surgimento das Nações Unidas (ONU) e do Banco Mundial, bem como dos outros organismos internacionais por ocasião da conferência de Bretton Woods, acentuou a preocupação com a melhoria dos indicadores de desenvolvimento econômico. A publicação de alguns diagnósticos pela ONU e pelo Banco Mundial evidenciou a necessidade do estudo das causas da pobreza das nações e combater esse problema passou a ser uma questão econômica, humanitária e política. A partir disto, os países pobres passassem a reivindicar maior volume de recursos dos países ricos nos fóruns internacionais. Com a aplicação da História Econômica para analisar as questões relativas ao desenvolvimento econômico, constatou­se que o subdesenvolvimento é um produto da própria expansão do capitalismo mundial em sua fase oligopolista. Verificou­se que os países pobres eram colocados numa posição de dependência e subserviência com relação aos países ricos no contexto da divisão internacional do trabalho. Os países desenvolvidos tornavam­se cada vez mais fortes com o aumento dos fluxos internacionais de capitais e com as trocas desiguais entre países. Isto porque, enquanto estes países produziam bens industrializados de alto valor agregado, os países pobres eram impelidos a continuar produzindo matérias­primas estratégicas a baixo custo e produtos alimentícios de baixo preço para alimentar os trabalhadores dos países centrais e não pressionar sua taxa de lucro. No entanto, alguns economistas mais tradicionais questionaram significativamente esta análise da história econômica e construíram teorias que procuram explicar o subdesenvolvimento a partir da existência de escassez de capital. 17.2. Desenvolvimento e Subdesenvolvimento A primeira condição para o desenvolvimento econômico é a de que a taxa de crescimento do produto seja continuamente superior à taxa de crescimento da população, o que significa que a renda per capita está crescendo. Uma melhora nas condições de vida e na distribuição de renda em favor das classes mais pobres também é algo imprescindível para evidenciar o desenvolvimento. Para caracterizar um processo de desenvolvimento econômico devemos observar, além disso, ao longo do tempo, a existência de: a) Crescimento do bem­estar econômico; b) Ampliação da economia de mercado; c) Diminuição dos níveis de pobreza, desemprego e desigualdade; d) Melhoria nas condições de saúde, nutrição, educação, moradia e transporte; e) Aperfeiçoamentos institucionais. É preciso destacar que embora estejamos dando ênfase aos fatores econômicos estratégicos para o desenvolvimento, este se constitui num fenômeno mais global da sociedade, que atinge toda a estrutura social, política e econômica. Assim, o desenvolvimento econômico deriva da expansão contínua do produto real de uma economia, implicando mudanças estruturais e melhorias no bem­estar da população, medido por indicadores econômicos e sociais. Os indicadores econômicos mais usados são renda per capita, percentual de residências com telefones, consumo de energia e fertilizantes, produção de alimentos e produção total por empregado. Os indicadores sociais podem ser expectativa de vida, taxa de mortalidade infantil, analfabetismo, consumo diário de calorias per capita, número de pessoas recebendo um salário mínimo ou menos e índice de informalidade do mercado de trabalho. A existência de um conjunto de insuficiências em relação às economias desenvolvidas. Os elementos que condicionam o subdesenvolvimento são, segundo a teoria econômica tradicional, a escassez de capital físico, a insuficiência de capital humano e a relação de dependência com os outros países. O subdesenvolvimento caracteriza­se por baixa renda por habitante, reduzido nível de poupança e insuficiente dotação tecnológica, todos elementos que limitam o crescimento econômico. Em geral, as economias subdesenvolvidas apresentam um crescimento econômico sistematicamente inferior ao crescimento demográfico, empobrecimento da população, instabilidade e dependência dos países ricos. Outras características que normalmente aparecem em economias subdesenvolvidas são: ∙ Baixo consumo de calorias per capita; ∙ Baixa produção de alimentos per capita; ∙ Baixa esperança de vida ao nascer; ∙ Elevada taxa de analfabetismo; ∙ Elevada mortalidade infantil; ∙ Elevadas taxas de desemprego; ∙ Criminalidade elevada; ∙ Economia informal significativa; ∙ Insuficiência de gastos públicos na área social; ∙ Baixa produtividade; ∙ Crescimento econômico concentrado; ∙ Concentração da propriedade e da riqueza; ∙ Expansão das favelas; ∙ Empresas nacionais com baixos níveis de competitividade nos mercados internacionais. 17.3. Caminhos para o desenvolvimento Embora esteja claro que a industrialização é um elemento fundamental para o desenvolvimento econômico, o processo de desenvolvimento dos países industrializados sempre esteve associado ao aumento da produtividade do setor agrícola, liberando recursos e mão­de­obra para incrementar significativamente o processo de ampliação das indústrias nas cidades. Em meados do século XX, acreditava­se que a industrialização dos países subdesenvolvidos seria assegurada se os mercados internos destes países fossem protegidos da concorrência internacional enquanto fortaleciam seu parque industrial. O modelo de substituição de importações foi a estratégia de desenvolvimento utilizada pela maior parte dos países em vias de desenvolvimento a partir da década de 1950. Este modelo consistia em proteger os produtores internos da competição estrangeira através de quotas de importações e tarifas alfandegárias, de modo que eles pudessem expandir a sua produção para substituir bens que eram anteriormente importados. Este modelo de desenvolvimento esgota­se nos anos 1980 na maior parte dos países em desenvolvimento. As estratégias protecionistas fizeram com que os produtores domésticos produzissem bens com um custo alto, de baixa qualidade e em um volume insuficiente para atender o mercado. A solução adotada amplamente pelos países subdesenvolvidos nos anos 1980 foi a abertura comercial, com a redução das barreiras às importações e o incentivo às exportações através de uma série de políticas cambiais, fiscais e comerciais. Embora alguns países tenham alcançado amplo sucesso, ao adotarem estas estratégias de crescimento baseadas na abertura econômica, países como o Brasil não se beneficiaram significativamente deste modelo, apresentando elevados níveis de desindustrialização, desnacionalização das empresas nacionais, destruição de postos de trabalho, estagnação do crescimento econômico. Os principais obstáculos a serem superados para sair do subdesenvolvimento são a debilidade do setor público, os desequilíbrios sociais e políticos, as diferenças regionais e culturais e a dificuldade de financiamento para investimentos na promoção do desenvolvimento. Um país em desenvolvimento que queira investir na melhoria da sua estrutura econômica e social deverá utilizar a sua poupança interna, ou recorrer à poupança estrangeira através de empréstimos ou ajuda financeira. Sendo assim, é preciso em primeiro lugar incentivar a formação da poupança interna, com o desenvolvimento de um mercado financeiro e de capitais e com o incentivo às pessoas a se absterem de parte do seu consumo presente. Os recursos destes indivíduos poderão ser canalizados para a formação de capital e para o investimento das empresas. Para atrair poupança estrangeira, um país subdesenvolvido deverá atrair empresas para investir diretamente no país, ou então tomar emprestado recursos nos mercados mundiais de capitais ou do Banco Mundial. ­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­­ [1] Contabilidade Social: registro contábil da atividade econômica de um país num dado período. É uma técnica que se preocupa com a definição e métodos de quantificação dos principais agregados macroeconômicos, como produto nacional, consumo global, investimentos, exportações, etc.