Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho Instituto de Geociências e Ciências Exatas Campus de Rio Claro Números Primos e Divisibilidade: Estudo de Propriedades Cristina Helena Bovo Batista Dias Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação Mestrado Prossional em Matemática em Rede Nacional (PROFMAT) como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre Orientadora Profa. Dra. Eliris Cristina Rizziolli 2013 512.7 D541n Dias, Cristina Helena Bovo Batista Números Primos e Divisibilidade: Estudo de Propriedades/ Cristina Helena Bovo Batista Dias. - Rio Claro: [s.n.], 2013. 49 f.: tab. Dissertação (mestrado) - Universidade Estadual Paulista, Instituto de Geociências e Ciências Exatas. Orientadora: Eliris Cristina Rizziolli 1. Teoria dos Números. 2. Conjetura de Goldbach. 3. Números Inteiros. 4. Fatoriais. I. Título Ficha Catalográca elaborada pela STATI - Biblioteca da UNESP Campus de Rio Claro/SP TERMO DE APROVAÇÃO Cristina Helena Bovo Batista Dias Números Primos e Divisibilidade: Estudo de Propriedades Dissertação aprovada como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre no Curso de Pós-Graduação Mestrado Prossional em Matemática em Rede Nacional (PROFMAT), pela seguinte banca examinadora: Profa. Dra. Eliris Cristina Rizziolli Orientadora Prof. Dr. Aldicio José Miranda Dpto. Matemática UNIFAL-Alfenas/MG Prof. Dr. Thiago de Melo Dpto. Matemática UNESP-Rio Claro/SP Rio Claro, 28 de janeiro de 2013 Ao meu Deus, Jeová, aos meus pais, ao meu querido esposo e aos meus lhos, à minha mãe e irmãos Agradecimentos Primeiramente, agradeço a Deus pela vida. A seguir, à minha orientadora, Eliris, aos membros da banca e, de modo geral, a todos os docentes e funcionários do Departamento de Matemática do IGCE, Rio Claro, por sua valiosa colaboração e apoio, sem os quais este trabalho não teria sido realizado. Em especial, agradeço ao Prof. Dr. Henrique Lazari e ao Prof. Dr. Rômulo Campos Lins, por sua ajuda na elaboração do Capítulo 5 desta dissertação. Agradeço, ainda, aos funcionários da UNESP, em especial, os que trabalham na Biblioteca, no Restaurante Universitário e na Cantina que, dos bastidores, dão suporte para que trabalhos como este sejam produzidos. Finalmente, agradeço a meus pais, ao meu esposo e aos meus lhos, e a todos meus familiares, amigos e irmãos. Resumo O objetivo deste trabalho é apresentar os fundamentos da divisibilidade, estudar as propriedades dos números primos, sua associação com fatoriais e com progressões aritméticas, além de apresentar alguns resultados equivalentes à Conjetura de Goldbach. Palavras-chave: Fatoriais. Teoria dos Números, Conjetura de Goldbach, Números Inteiros, Abstract The objective of this paper is to present the fundamentals of divisibility, study the properties of prime numbers, their association with factorials and arithmetic progressions, and present some results equivalent to Goldbach's Conjecture. Keywords: Number Theory, Goldbach's Conjecture, Integer Numbers, Factorial. Lista de Tabelas 5.1 Tabela de Diferenças de Quadrados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45 Sumário 1 Introdução 9 2 Números Inteiros e Divisibilidade 11 3 Sobre Números Primos 26 4 Números Primos: Resultados e Aplicações 33 4.1 Números Primos e Fatoriais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 33 4.2 Números Primos e Progressões Aritméticas . . . . . . . . . . . . . . . . 38 5 A Conjetura de Goldbach 40 6 Aplicação do Tema Divisibilidade em Sala de Aula 46 Referências 49 1 Introdução Este trabalho tem por objetivo analisar algumas das propriedades dos chamados números primos. Um número primo é aquele que somente é divisível por um ou por si mesmo. Um número inteiro inteiro q tal que n é divisível por um número inteiro m quando existe um n = qm. Desde da Grécia Antiga os matemáticos se interessam pelos números primos: Quantos são? Como se distribuem? Como encontrá-los? Existe uma maneira simples de saber se um número é primo ou não? No decorrer dos séculos algumas destas perguntas foram respondidas, outras ainda permanecem sem resposta até os dias atuais. Algumas armações sobre os números primos foram comprovadas há muitos séculos. O famoso matemático Euclides demonstrou que existem innitos números primos. O matemático Eratóstenes inventou um método, conhecido como Crivo de Eratóstenes, para montar uma lista de primos até um determinado número. No entanto, ao passo que o número de elementos da lista aumenta, seu método se torna cada vez mais trabalhoso. Por outro lado, outras armações envolvendo os números primos ainda não foram demonstradas. Por exemplo, até hoje não se sabe como os números primos se distribuem entre os números compostos (os que não são primos), nem como descobrir, de maneira simples, se um número é primo ou não. Por causa da diculdade na iden- ticação de um número primo, sistemas de segurança online têm utilizado, durante décadas, números primos para proteger senhas e outras informações pessoais daqueles que navegam pela internet. Outra questão curiosa é sobre com que frequência um número primo aparece. Quando se observa uma lista de primos se nota, num breve olhar, que existem diversos pares de números primos que diferem por apenas duas unidades, tais como 5, 5 e 7, 11 e 13, 17 e 19, 3 e entre outros. Tais primos são chamados primos gêmeos e, até hoje, não se sabe se existem innitos pares de primos gêmeos ou não. Ainda sobre este tópico, por volta de 1900, J. Hadamard e Ch. de la Valleè-Poussin, provaram, trabalhando independentemente, um resultado sobre a frequência dos primos conhecido como Teorema dos Números Primos. A demonstração de tal Teorema foi simplicada em 1949 por A. Selberg. No entanto, a distribuição dos números primos ainda é bastante misteriosa e existem inúmeros problemas associados a ela aguardando 9 10 uma demonstração. Apresenta-se abaixo alguns dos mais famosos: 1. Existem innitos primos gêmeos, ou seja, existem innitos pares de números primos que diferem por apenas duas unidades? 2. Sempre existe um primo entre 3. A sequência de Ficonacci n2 e constituídas por k para todo natural (1, 1, 2, 3, 5, 8, 13, ...) 4. Existem innitos primos da forma 5. É verdade que, para todo (n + 1)2 n > 0? contém innitos números primos? n2 − n + 41? k ≥ 4, existe uma innidade de progressões aritméticas números primos? Os dois problemas mais famosos relacionados aos números primos e ainda em abertos são a Conjetura de Goldbach e a Hipótese de Riemman. A Conjetura de Goldbach relaciona-se a uma carta que o matemático Christian Goldbach escreveu a Leonhard Euler, em 1742, armando que todo número natural par, maior ou igual a quatro, pode ser escrito como a soma de dois números primos. Ivan Vinogradov, em 1937, demonstrou uma variante mais fraca desta conjetura, a saber, que todo número ímpar sucientemente grande pode ser escrito como a soma de três primos. A Conjetura de Goldbach, no entanto, permanece sem demonstração até hoje. O melhor resultado relacionado à conjetura de Goldbach foi obtido por Chen que demonstrou que todo número par, sucientemente grande, pode ser escrito como a soma de um primo com um 2-quase-primo. Um número 2-quase-primo é um número da forma p e q p2 = p.q , onde são primos. Esse resultado é conhecido como Teorema de Chen. Por sua vez, a Hipótese de Riemman é o maior problema matemático de todos os tempos e, resumidamente, consiste em demonstrar que todos os zeros não triviais da função zeta de Riemann encontram-se sobre uma determinada reta. Tal hipótese ainda permanece sem demonstração. Tão cedo quanto em 1900 foi oferecido um prêmio em dinheiro para quem a demonstrasse e muitos resultados importantes da Matemática dependem de sua veracidade. Trabalhar com estas importantes questões foi a motivação principal deste estudo. Este trabalho está dividido em seis capítulos: • Capítulo 1: Motivação histórica e resumo. • Capítulo 2: Fundamentos da divisibilidade e conceitos ligados a ela. • Capítulo 3: Números primos e suas propriedades básicas. • Capítulo 4: Aplicações dos números primos em outros ramos da Matemática, • Capítulo 5: Resultados relacionados à Conjetura de Goldbach e, • Capítulo 6: Sugestão para Aplicação em Sala de Aula. 2 Números Inteiros e Divisibilidade A linha da Matemática que estuda os números naturais é conhecida como aritmética. Os números naturais são os que aparecem naturalmente no dia a dia das pessoas e são 0, 1, 2, 3, 4, 5, .... Estes números foram reunidos em um conjunto a que os matemáticos chamam de N. Estão denidas sobre este conjunto as operações adição (+) e multiplicação (.), que possuem às seguintes propriedades: conhecidos como 1. São bem denidas, ou seja, para todos 0 a+b=a +b 0 e 0 a, b , a0 e b0 ∈ N, se a=b e a0 = b 0 então 0 a·b=a ·b, 2. São comutativas, ou seja, para todos a, b ∈ N tem-se que a+b = b+a e a·b = b·a, 3. São associativas, ou seja, para todos a, b ∈ N e tem-se que a + (b + c) = (a + b) + c a.(b.c) = (a.b).c, 4. Possuem elementos neutros, ou seja, para todo a ∈ N, a + 0 = a e a · 1 = a, 5. A multiplicação é distributiva com relação à adição, ou seja, para todos tem-se a, b, c ∈ N a · (b + c) = (a + b) · (a + c). Considera-se ainda que os números naturais possuem as seguintes propriedades: 6. Integridade, ou seja, dados a, b ∈ N, com a, b diferentes de zero, tem-se que a·b é diferente de zero. De maneira equivalente pode-se dizer que se 7. Tricotomia: Dados (a) a, b ∈ N a·b=0 então a=0 ou b=0 se verica apenas uma das seguintes possibilidades: a=b (b) existe c ∈ N, com c 6= 0, b = a + c, (c) existe c ∈ N, com c 6= 0, a = b + c Diz-se que a é menor do que propriedade (b). Diz-se que b, ou e simboliza-se por a < b, sempre que se verica a a é maior do que b, e simboliza-se por a > b, sempre que se 11 12 verica a propriedade (c). Adicionalmente, conclui-se, das denições acima, que a ≥ 1, 0 < a. Note ainda que, para a e b, números naturais, se a + b = 0 então, a = b = 0. Realmente, se a 6= 0 tem-se que b < 0, o que é absurdo. Portanto, a = 0. De maneira similar mostra-se que b = 0. Logo, se a > 0 ou b > 0 então a + b > 0. para todo pois tem-se que Proposição 2.1. Para todo 0 + a = a, 0 < a, a∈N o que implica que tem-se que a · 0 = 0. a · 0 = a · (0 + 0) = a · 0 + a · 0. Se a · 0 > 0 então, da armação a · 0 > a · 0, o que é absurdo. Logo a · 0 = 0. Demonstração. De fato, anterior, segue que Proposição 2.2. No que se refere à relação menor do que vale a lei do cancelamento para a adição, ou seja, para todo Demonstração. Suponha Somando c a < b. a, b, c ∈ N, a < b se, e somente se, Isso signica que existe d > 0, a + c < b + c. tal que b = a + d. a ambos os lados desta igualdade tem-se, pelas propriedades da adição: b + c = c + b = c + (a + d) = (c + a) + d = (a + c) + d, o que mostra que a + c < b + c. Proposição 2.3. No que se refere à relação menor do que vale a lei do cancelamento para a multiplicação, ou seja, para todo somente se, c com c 6= 0, tem-se que a<b se, e a · c < b · c. Demonstração. Suponha Somando a, b, c ∈ N, a < b. Isso signica que existe d > 0, tal que b = a + d. a ambos os lados desta igualdade tem-se, pelas propriedades da adição e da multiplicação: b · c = c · b = c · (a + d) = (c · a) + (c · d) = (a · c) + (c · d), o que mostra que Proposição 2.4. a · c < b · c. No que se refere à igualdade vale a lei do cancelamento para a adição, ou seja, para todo a, b, c ∈ N, a = b se, e somente se, a + c = b + c. Demonstração. Pelo fato da adição ser bem denida vale que, se b + c. Reciprocamente, supondo que (i) a < b. Pela Proposição 2.2, (ii) b < a. Pela mesma proposição, (iii) Logo, a = b. a+c=b+c a + c < b + c, a=b então existem três possibilidades: o que é absurdo. b + c < a + c, o que também é absurdo. a+c = 13 Proposição 2.5. No que se refere à igualdade vale a lei do cancelamento para a multiplicação, ou seja, para todo se, a, b, c ∈ N, c 6= 0, com tem-se que a=b se, e somente a · c = b · c. Demonstração. Pelo fato da multiplicação ser bem denida vale que, se a · c = b · c. Reciprocamente, supondo que a · c < b · c, (i) a < b. Pela Proposição 2.3, (ii) b < a. Pela mesma proposição, (iii) Logo, a·c=b·c a=b então existem três possibilidades: o que é absurdo. b · c < a · c, o que também é absurdo. a = b. Observando-se em mais detalhes a relação menor do que percebe-se que não é reexiva, pois não vale a < a. No entanto a relação menor ou igual a, descrita abaixo, o é. a Diz-se que a = b. Diz-se ou a = b. é menor ou igual a que a b, a ≤ b, sempre que a < b ou por a ≥ b, sempre que a > b e simboliza-se por é maior ou igual a b, e simboliza-se A relação menor ou igual a é, de fato, uma relação de ordem, pois, 1. É reexiva: para todo a, a ≤ a. 2. É antissimétrica: para todos 3. É transitiva: para todos a, b, a, b, se a≤b e b≤a então a = b. c, se a≤b e b ≤ c, então a ≤ c. e Antes de iniciar a discussão sobre divisibilidade é interessante considerar o princípio de indução nita, visto que é muito utilizado na demonstração de resultados importantes na teoria dos números. A indução nita se baseia nos dois seguintes princípios: Princípio 2.1. (Boa Ordem) Todo conjunto não-vazio de números naturais possui um menor elemento. Princípio 2.2. (Indução Finita) Seja A ⊂ N, com as seguintes propriedades: i) 1 ∈ A; ii) Se k∈A Então então A = N. k + 1 ∈ A. 14 Observação 2.1. Observe que, de acordo com este princípio, para provar uma arma- 1 e, a seguir, supondo que a armação provar que vale para n + 1. ção para todo número natural basta provar para vale para um número natual Corolário 2.1. n qualquer, Não existe nenhum número natural n tal que 0 < n < 1. p(n) : n > 0 então n ≥ 1 que p(0) é verdadeira, já que a Além disso, p(n + 1) é sempre Demonstração. A frase acima é equivalente à proposição n. Uma vez que 0 > 0 é falso segue-se implicação 0 > 0 então 0 ≥ 1 sempre é verdadeira. verdadeira pois, se n + 1 > 0, então n + 1 ≥ 1 pela lei do cancelamento. Portanto, p(n) implica p(n + 1) para todo n e o resultado segue. vale para todo Corolário 2.2. Dado n∈N não existe nenhum número natural m tal que n<m< n + 1. Demonstração. Se tal número existisse, existiria um natural Então, pelo cancelamento, tem-se que 0 < k < 1 k tal que n+k = m < n+1. o que, pelo corolário anterior, é absurdo. Portanto, não existe nenhum natural m entre n e n + 1. Sequências são funções cujo domínio é o conjunto dos números naturais contradomínio é o conjunto dos números reais (R). (N) e cujo Para tratar do relacionamento en- tre os números primos e as progressões aritméticas apresenta-se a seguir o conceito de progressão. Progressões são sequências que seguem uma lei de formação determinada pelo seu primeiro elemento e por um número conhecido como razão. Essa lei de formação, em muitos casos, pode ser demonstrada através do princípio de indução nita. Para os ns deste trabalho serão utilizadas apenas progressões cujo contradomínio seja o conjunto dos números naturais. Como exemplo, apresenta-se abaixo as denições de alguns tipos especiais de progressões: Denição 2.1. (an ) tal que a1 Uma progressão aritmética (PA) é uma sequência de números reais é dado e, para todo n ∈ N, tem-se que an+1 = an + r, onde r é um número real xado chamado razão. Exemplo 2.1. e A sequência 3, 7, 11, · · · é uma progressão aritmética na qual a1 = 3 r = 4. Note que a razão de uma PA pode ser encontrada por se subtrair qualquer natural a2 − a1 = 4 = r . i. Assim, a2 − a1 = a3 − a2 = ai+1 − ai = r. ai de ai+1 para No exemplo dado 15 Denição 2.2. (an ) tal que a1 Uma progressão geométrica (PG) é uma sequência de números reais n ∈ N, é dado e, para todo tem-se que an+1 = an · q, onde q é um número real xado, Exemplo 2.2. e A sequência q 6= 0 3, 6, 12, · · · e q 6= 1, chamado razão. é uma progressão geométrica na qual a1 = 3 q = 2. Note que a razão de uma PG pode ser encontrada por se dividir i. qualquer natural Assim, a2 ÷ a1 = a3 ÷ a2 = ai+1 ÷ ai = q . ai+1 por ai para No exemplo dado a2 ÷ a1 = 2 = q . Denição 2.3. meros reais Uma progressão aritmético-geométrica (PAG) é uma sequência de nú- (an ) tal que a1 é dado e, para todo n ∈ N, tem-se que an+1 = an · q + r, onde r e q Exemplo 2.3. qual q 6= 1. são números reais xados e A sequência a1 = 4, r = 5 e q = 2. 4, 13, 31, · · · é uma progressão aritmético-geométrica na De fato, a1 = 4, a2 = 4 · 2 + 5 = 13, a3 = 13 · 2 + 5 = 31, · · · . Note que as razões de uma PAG não são encontradas apenas por uma operação simples. Para que seja possível encontrá-las é necessário resolver um sistema de equações de duas incógnitas. No exemplo: ( 13 = 4 · q + r , 31 = 13 · q + r Multiplicando a primeira equação por ( −1 obtem-se: −13 = −4 · q − r , 31 = 13 · q + r 9 · q = 18, r = 5. Somando estas duas equações tem-se que este valor na primeira equação tem-se que de onde q = 2. Substituindo Usando-se o princípio da indução nita é possível demonstrar as seguintes propriedades relacionadas a progressões: Proposição 2.6. 1. Numa progressão aritmética tem-se que: an = a1 + (n − 1)r; 16 2. Se Sn = a1 + a2 + · · · + an então Sn = (a1 + an )n . 2 Demonstração. 1. Para n=1 tem-se que a1 = a1 . Suponha que a propriedade vale para n. Então, pela denição de PA e pela hipótese de indução, an+1 = an + r = a1 + (n − 1)r + r = a1 + nr. 2. Para vale (a1 + a1 ) · 1 n = 1 tem-se que S1 = a1 = . Suponha, agora, que o resultado 2 para Sn . Então, pela denição de Sn , pelo item anterior e pela hipótese de indução tem-se que, (a1 + an )n + an+1 = 2 a1 n + an n a1 n + an n 2an+1 a1 n + an n + 2an+1 = + an+1 = + = = 2 2 2 2 a1 n + an n + a1 + nr + an+1 a1 n + a1 + an n + nr + an+1 = = = 2 2 a1 (n + 1) + an+1 n + an+1 a1 (n + 1) + (an + r)n + an+1 = = = 2 2 a1 (n + 1) + an+1 (n + 1) = . 2 Sn+1 = a1 + a2 + · · · + an + an+1 = Proposição 2.7. 1. Numa progressão geométrica tem-se que: an = a1 · q n−1 ; 2. Se Sn = a1 + a2 + · · · + an e q 6= 1 então Sn = a1 qn − 1 . q−1 Demonstração. 1. Para n=1 tem-se que a1 = a1 . Suponha que a propriedade vale para n. Então, pela denição de PG e pela hipótese de indução, an+1 = an q = a1 q n−1 · q = a1 q n . 2. Para n = 1 vale para tem-se que Sn . q1 − 1 . Suponha, agora, que q−1 de Sn , pelo item anterior e pela S1 = a1 = a1 Então, pela denição indução tem-se que, Sn+1 = a1 + a2 + · · · + an + an+1 = a1 qn − 1 + an+1 = q−1 o resultado hipótese de 17 = a1 q n − a1 an+1 (q − 1) a1 q n − a1 + an+1 q − an+1 a1 q n − a1 + an+1 = + = = q−1 q−1 q−1 q−1 = an+1 − a1 + a1 q n q − an+1 an+1 − a1 + a1 q n+1 − an+1 = = q−1 q−1 = a1 q n+1 − a1 q n+1 − 1 = a1 . q−1 q−1 Para terminar o tópico sobre indução nita apresenta-se abaixo alguns exemplos de fórmulas de indução. Exemplo 2.4. Até onde se tem registro, o primeiro exemplo de utilização do Princípio de Indução Finita remonta ao ano de 1575, quando Francesco Maurolycus calculou a soma dos n primeiros números ímpares. Ele demonstrou que,para todo n natural tem-se que 1 + 3 + · · · + (2n − 1) = n2 Primeiramente, observe que vale que 1 + 3 + · · · + (2n − 1) = n 2 p(1), pois, 1 = 12 . p(n), ou seja, n. Então, vale p(n + 1, Suponha que vale para um determinado natural pois 1 + 3 + · · · + (2n − 1) + (2n + 1) = n2 + 2n + 1 = (n + 1)1 e, portanto, a fórmula vale para todo n. 1 1 1 n 1 + + +·+ = . 1·2 2·3 3·4 n · (n + 1) n+1 1 1 1 Em primeiro lugar note que, = = . 1·2 1+1 2 1 1 1 1 n Suponha que vale p(n), ou seja, que + + +·+ = , 1·2 2·3 3·4 n · (n + 1) n+1 para um determinado n. Então, pela hipótese de indução, Exemplo 2.5. Mostre que 1 1 1 1 1 n 1 + + +·+ + = + = 1·2 2·3 3·4 n · (n + 1) (n + 1) · (n + 2) n + 1 (n + 1) · (n + 2) = n(n + 2) + 1 n2 + 2n + 1 (n + 1)2 n+1 = = = . (n + 1) · (n + 2) (n + 1) · (n + 2) (n + 1) · (n + 2) n+2 Exemplo 2.6. Encontre uma fórmula para a soma 2 + 4 + · · · + 2n. Neste tipo de problema primeiro deve-se calcular alguns elementos a m de conseguir encontrar a fórmula geral. Neste exemplo tem-se que: S1 = 2, S2 = 6, S3 = 12, S4 = 20, S5 = 10, etc Organizando estas informações obtem-se: 18 S1 S2 S3 S4 =2 = S1 + 2 · 2 = S2 + 2 · 3 = S3 + 2 · 4 . . . . . = .. + .. Sn = Sn−1 + 2 · n Somando membro a membro estas equações chega-se a: S1 + S2 + · · · + Sn = 2 · S1 + S2 + · · · + Sn−1 + 2(2 + · · · + n) (2 + n)(n − 1) = 2 + (n − 1)(n + 2) 2 Sn = 2 + (n − 1)(n + 2). Sn = S1 + 2 Logo, Observe que, neste caso, a maneira pela qual a fórmula foi encontrada constitui uma demonstração matemática de que esta soma é válida para um determinado n. Para garantir sua validade para todos os naturais é necessário aplicar o Princípio de p(1) é verdadeira, pois S1 = 2 + (1 − 1)(1 + 2) = 2. Suponha que Sn = 2 + (n − 1)(n + 2), para um determinado n, ou seja, que vale p(n). Então, pela Indução. Tem-se que denição da soma, pela construção da sequência e pela hipótese de indução, tem-se que Sn+1 = Sn + an+1 = 2 + (n − 1)(n + 2) + 2(n + 1) = 2 + n2 + 2n − n − 2 + 2n + 2 = = 2 + n2 + 3n = 2 + n(n + 3) = 2 + ((n + 1) − 1)((n + 1) + 2), como queríamos demonstrar. Observação 2.2. meros naturais N, Chama-se de conjunto Z dos números inteiros ao conjunto dos nú- acrescido dos números negativos. Como em divisibilidade a maioria das propriedades vale quando restrita aos números naturais, neste trabalho, sempre que for interessante esta restrição será utilizada. Denição 2.4. existir um inteiro Exemplo 2.7. 47, a Se c e b tal que Tem-se que b = ac. 5 Sejam a, b e c a não 65, pois Se divide pois não existe nenhum inteiro Proposição 2.8. k tal que inteiros. Se a|b inteiro k2 , Demonstração. De fato, uma vez que logamente, como signica que b|c a divide b, e denota-se divide b denota-se a - b. por 65 = 13 · 5. 47 = 5k . não divide são inteiros, diz-se que existe um a|b e b|c Por outro lado, então existe um inteiro tal que c = k 2 b. 5 Sejam a, b, c, m e n inteiros. Se c|a e c|b se a|c. k1 , b = k1 a. c = k2 k1 a, tal que Portanto, a|c. Proposição 2.9. a|b, então c|(ma ± nb). Anao que 19 Demonstração. Pela denição de divisibilidade se então a = k1 c, para algum k1 , b = k2 c. Multiplicando-se estas duas equações, respectivamente, por m e n obtém-se ma = mk1 c e nb = nk2 c. Somando-se membro a membro chega-se a ma ± nb = mk1 c ± nk2 c = (mk1 ± nk2 )c. Portanto c|(ma + nb). inteiro. c|b c|a Analogamente, se Proposição 2.10. Sejam então a, b, n ∈ N, a + b 6= 0. com n. Demonstração. Demonstra-se por indução sobre deira, pois 1 1 a + b = a + b. Suponha que a + b|a Então Para 2n+1 +b a+b n=0 2n+1 divide a2n+1 + b2n+1 . a armação é verda- . Então: a2(n+1)+1 + b2(n+1)+1 = a2 a2n+1 − b2 a2n+1 + b2 a2n+1 + b2 b2n+1 = = (a2 − b2 )a2n+1 + b2 (a2n+1 + b2n+1 ). Uma vez que a + b|a2 − b2 a + b|(a2n+1 + b2n+1 ) e que, por hipótese, o resultado segue, do acima e da Proposição 2.9. Teorema 2.1. 0 < a < b. (Divisão Euclidiana). Sejam a b e dois números naturais tais que Existem dois números naturais, unicamente determinados, tais que b = a · q + r, com r < a. Demonstração. Considere o conjunto enquanto Q dos números da forma b, b−a, b−2a, · · · , b−n·a, b − n · a > 0. r = b − q · a, o menor elemento do conjunto segue. Caso contrário, se a - b então r 6= 0. Pela Propriedade da Boa Ordem, existe Q. Se a|b, então r = 0 e o resultado r<a existe c < r Portanto, mostrando que chega-se ao resultado desejado. Então, suponha que r > a. tal que Neste caso, r = c + a. Logo, como r = c+a = b−q·a tem-se que: c = b − (q + 1) · a ∈ Q. c ∈ Q e é menor do que r, o que é absurdo, pois r elemento de Q. Portanto, r < a e a existência de q e r está Portanto, menor foi tomado como o demonstrada. Quanto à unicidade, suponha que existam dois elementos distintos, 0 0 r = b−q·a 0 r = b − q · a, com r < r < a. A diferença entre estes dois elementos é divisível 0 0 0 e, portanto, r − r ≥ a. Então, r ≥ r + a > a, o que é absurdo. Logo, r = r . Corolário 2.1. (Propriedade Arquimediana). com 1 < a < b, existe um número natural n Dados dois números naturais tal que na < b < (n + 1)a. e por a a b e 20 Demonstração. Pela Divisão Euclidiana tem-se que existem q · a + r, r < a. com Tome n = q. q, r ∈ N, tais que b = Então, na = q · a < q · a + r = b. Por outro lado, b = q · a + r < (q + 1)a + r = (n + 1)a + r. Logo, na < b < (n + 1)a. Denição 2.5. a e b Seja m um número natural diferente de zero. Dois números naturais m quando a ≡ b mod m. são congruentes módulo iguais. Notação: os restos de sua divisão euclidiana por m são Exemplo 2.8. • 18 5; e 43 deixam resto 3 ao serem divididos por 5, então são congruentes módulo • 71 7; e 85 deixam resto 1 ao serem divididos por 7, então são congruentes módulo • 43 deixa resto Portanto, 43 e Observação 2.3. 1 ao ser dividido por 6 e 46 deixa 46 não são congruentes módulo 6. resto 4 ao ser dividido por 6. a ≡ b mod m é o mesmo que dizer que m|b − a. De fato, suponha que a e b deixem resto r ao serem divididos por m. Então, pela divisão euclidiana tem-se que a = mq1 + r e b = mq2 + r . Então b − a = mq2 + r − mq1 − r = mq2 − mq1 = m(q2 − q1 ) e, portanto, m|b − a. Observe que dizer que Proposição 2.11. Sejam a, b ∈ N e n um número natural maior do que zero. mod m, então Se a≡b an ≡ bn mod m. Demonstração. Inicialmente note que, para quaisquer números naturais tem-se que, se a ≡ b mod m e c ≡ d mod m então ac ≡ bd mod m. De fato, bd − ac = d(b − a) + a(d − c). Como m|b − a e m|d − c, então m|bd − ac e ac ≡ b mod m. Observado isto, a demonstração do resultado é feita por induçao sobre n. A armação é verdadeira para n = 1. Suponha, agora, que o resultado vale para n, então, pela hipótese de indução e pela Observação 2.3 tem-se que an+1 = an a ≡ bn b mod m. Mas bn b = bn+1 . Denição 2.6. inteiro d Logo an+1 = an a ≡ bn+1 mod m. a e b, d|a e d|b. Dados dois números inteiros é um divisor comum de a e b se distintos, diz-se que o número 21 Exemplo 2.9. 96 = 16 · 6, mas 7 Denição 2.7. Exemplo 2.10. e k tal que 84 e 96 84 a e b. 96, e 96 = 7k . a pois 84 = 12 · 7 inteiro positivo que seja maior do Proposição 2.12. Seja 96 = 12 · 8, que 12 e divisor d = (a, b), e b é o maior inteiro (a, b). Notação: Usando os mesmos números do Exemplo 2.10, 96, 84 = 14 · 6 e 84 = 12 · 7 não pois pois, embora O máximo divisor comum de dois inteiros positivo que divide 84 é um divisor comum de não é um divisor comum de existe nenhum inteiro comum de 6 Por exemplo, e 12 é o máximo divisor e não existe nenhum outro número comum de então existem inteiros m e 84 n e 96. tais que d = ma + nb. c = m0 a + n0 b o menor inteiro positivo que pode ser escrito nesta forma, então c|a e c|b. De fato, se c - a existiriam, pela Divisão Euclidiana q1 e r1 tais que a = cq1 + r1 , com 0 < r1 < c, de onde r1 = a − cq1 = a − (m0 a + n0 b)q1 = (1 − q1 m0 )a + (−qn0 )b. Ou seja, r1 é da forma m1 a + n1 b e menor do que c, o que é absurdo por construção. Logo c|a. Da mesma maneira demonstra-se que c|b. Como d é um divisor comum de a e b tem-se que existem inteiros m1 e m2 tais que a = m1 d e b = m2 d. Logo, c = m0 a + n0 b = m0 m1 d + n0 m2 d = d(m0 m1 + n0 m2 ), ou seja, d|c e, portanto, d ≤ c. Como d é o máximo divisor comum de a e b, d < c é impossível. Logo c = d e, portanto, existem m, n tais que d = ma + nb. Demonstração. Seja Lema 2.1. então (a, b) (De Euclides.) Sejam a, b, n ∈ N, com a < na < b. Se existe (a, b − na) existe e (a, b) = (a, b − na). d = (a, b − na). Pela denição de máximo divisor comum, d|a e d|b − na. Uma vez que d|a tem-se que d|na. Além disso, d|b, pois b = b − na + na> então, d é um divisor comum de a e b. Finalmente, suponha que c seja um divisor comum de a e de b. Então c|a e c|b − na. Portanto, pela denição de máximo divisor comum c|d. Logo, d = (a, b). Demonstração. Seja Denição 2.8. Dois números naturais a e b são ditos primos entre si quando (a, b) = 1. Proposição 2.13. a e b são primos ma − nb = 1. Dois números naturais existem números naturais m e n tais que entre si se, e somente se, a > b. Seja c ∈ N tal que c|a e c|b. Logo, pela Proposição 2.9, c|(ma − nb). Então, c = d(ma − nb). Como c = (a, b) = 1 tem-se que 1 = d(ma − nb), de onde, d = 1 e ma − nb = 1, uma vez que tanto d, como ma − nb foram tomados como números naturais. Portanto, existem m e n tais que ma − nb = 1. Por outro lado, suponha que existam m e n tais que ma − nb = 1. Seja d = (a, b). Então, pela Proposição 2.9, d|(ma − nb) = 1. Mas, então, d|1 e, portanto, d = 1. Demonstração. Suponha, sem perda de generalidade, que 22 Teorema 2.2. Sejam a, b e c a|b · c, números naturais. Se a|b · c e (a, b) = 1, então a|c. e tal que bc = ae. Como (a, b) = 1, pela Proposição 2.13, existem números naturais m, n tais que na − mb = 1. Daí, segue que c = nac − mbc = nac − mae = a(nc − me). Isto é, a|c. Demonstração. Como Proposição 2.14. Sejam a, b existe um número natural e n números naturais. Então d = (na, nb) = n(a, b). u, v ∈ N tais que d = una + vnb, é o menor valor possível para os números da forma u0 na + v0 nb. Seja e = (a, b). Então, pela Proposição 2.12, e é igual ao menor valor dos números da forma u0 a+v0 b. Portanto, d = una + vnb = n(ua + vb) = nc e (na, nb) = n(a, b). b a , = 1. Corolário 2.3. Sejam a, b e n números naturais. Então (a, b) (a, b) Demonstração. Pela Proposição 2.12 existem Demonstração. Usando a Proposição 2.14 tem-se que: Portanto, a b a b , , (a, b) (a, b) = (a, b) = (a, b). (a, b) (a, b) (a, b) (a, b) a b , = 1. (a, b) (a, b) Proposição 2.15. Dados a, b e c ∈ N, se Proposição 2.16. Dados a, b e c∈N então, (a, b) = 1 então, (a · c, b) = 1 (a · c, b) = (c, b). se, e somente se, (a, b) = (c, b) = 1. (a, b) = (c, b) = 1 tem-se, pela Proposição 2.15, que (a · c, b) = (c, b) = 1. Por outro lado, se (a · c, b) = 1 então, pela Proposição 2.13 existem m, n ∈ N tais que mac − nb = 1. Logo, existem m1 = mc e n1 = n naturais, tais que m1 a − n1 b = 1. Daí segue, pela Proposição 2.13 que (a, b) = 1. Similarmente, concluíse que (c, b) = 1. Demonstração. Se Proposição 2.17. Dados a, b ∈ N então a = (a, b) se, e somente se, a|b. a = (a, b) então, pela denição de máximo divisor comum a|b, então b = na, de onde, usando a Proposição 2.14, (a, b) = Demonstração. De fato, se a|b. Por outro lado, se (a, na) = a(1, n) = a. Proposição 2.18. onde r Dada uma sequência é o resto da divisão de Demonstração. Escrevendo onde dade rs+1 = 0, tem-se, pela de (an )n tem-se que: m por n, (an )n , ∀m ≥ n, (am , an ) = (an , ar ), que (am , an ) = am,n . tal que então tem-se m = qn + r, r = q1 n1 + r1 , r1 = q2 n2 + r2 , ·, rs = qs+1 ns+1 , Divisão Euclidiana, que rs = (m, n). Aplicando a proprie- (am , an ) = (an , ar1 ) = (ar1 , ar2 ) = · = (ars , ars+1 ) = (as , 0) = a(m,n) . 23 Denição 2.9. O menor inteiro positivo que é, simultaneamente, múltiplo de chamado mínimo múltiplo de a e b. Notação: a e b é [a, b]. Exemplo 2.11. 30 é o mínimo múltiplo comum de 6 e 5, pois é o menor inteiro positivo que é múltiplo de Note que 30 5 (pois 30 = 6 · 5) também é positivo que é múltiplo de Proposição 2.19. 30 = 5 · 6). o mínimo múltiplo comum de 6 e 10, pois é o 10 (pois 30 = 3 · 10) e de 6 (pois 30 = 5 · 6). e de 6 (pois Dados dois números inteiros a e b, existe [a, b] menor inteiro e [a, b](a, b) = ab. m = Demonstração. Seja múltiplo comum de a e b ab . (a, b) Então tem-se que a|m n2 e, b|m. a b e são primos entre (a, b) (a, b) a b divide n2 b = c. portanto, m = (a, b) Por outro lado, tomando c um b a = n2 . (a, b) (a, b) Mas, si. Segue do Teorema 2.2 que a (a, b) c = n1 a = n2 b, pelo Corolário 2.3, divide e de onde, n1 Uma das aplicações interessantes do máximo divisor comum relaciona-se com a famosa sequência de Fibonacci. Nesta sequência um termo é a soma dos dois termos anteriores, sendo que os dois primeiros termos são sequência de Fibonacci por fi , onde i 1. Representando os elementos da é a posição do termo na sequência é possível escrever: f1 = 1 f2 = 1 fi = fi−1 + fi−2 , ou seja, a sequência é dada por para i > 2, 1, 1, 2, 3, 5, 8, 13, 21, 33, . . . . Apresenta-se, a seguir, algumas propriedades interessantes desta sequência relacionadas ao máximo divisor comum e à divisibilidade. Proposição 2.20. Dois termos consecutivos da sequência de Fibonacci são primos entre si. Demonstração. Demonstra-se o resultado por indução. Para (1, 1) = 1. Suponha que (fn , fn+1 ) = 1 n = 1 tem-se que (f1 , f2 ) = Então, pelo Lema de Euclides: (fn+1 , fn+2 ) = (fn+1 , fn+2 − fn+1 ) = (fn+1 , fn ) = 1. 24 Proposição 2.21. Sejam m, n ∈ N∗ e m ≥ 2. Então fm+n = fm−1 fn + fm fn+1 . Demonstração. Demonstra-se o resultado primeiro por se xar sobre m. Depois, xa-se m m o resultado vale para todo Tomando n=1 e usa-se indução sobre e para todo n. n=1 e usar indução Desta maneira demonstra-se que n. a igualdade escreve-se como: fm+1 = fm−1 f1 + fm f1+1 = fm−1 + fm , que é verdadeira para todo Suponha, agora que, m pela denição da sequência de Fibonacci. fm+n = fm−1 fn + fm fn+1 . Então, fm+(n+1) = fm+n + fm+(n−1) = fm−1 fn + fm fn+1 + fm+(n−1) = = fm−1 (fn+1 − fn−1 ) + fm (fn+2 − fn ) + fm+(n−1) = = fm−1 fn+1 − fm−1 fn−1 + fm fn+2 − fm fn + fm+(n−1) = = fm−1 fn+1 + fm fn+2 − fm−1 fn−1 − fm fn + fm+(n−1) = (∗) Mas, usando a hipótese de indução uma segunda vez, tem-se que fm−1 fn−1 + fm fn . Substituindo em (∗) fm+(n−1) = obtem-se (∗) = fm−1 fn+1 + fm fn+2 − fm−1 fn−1 − fm fn + fm−1 fn−1 + fm fn = = fm−1 fn+1 + fm fn+2 . Proposição 2.22. Sejam m, n ∈ N∗ . m|n então fm |fn . n = km para algum inteiro k . Demonstra-se que o resultado vale para todo múltiplo de m pelo uso de indução sobre k . Para k = 1, tem-se que m|m então fm |fm verdadeiro. Suponha que o resultado vale para n = km, ou seja, que fm |fmk . Então, pela Proposição 2.21 tem-se que Demonstração. Como m|n Se tem-se que fn(k+1) = fnk+n = fnk−1 fn + fnk fn+1 . Mas, fn |fnk−1 fn Teorema 2.3. fn |fm e, pela hipótese de indução, fn |fnk fn+1 , segue que fn Na sequência de Fibonacci sempre vale se, e somente se, n|m. divide (fm , fn ) = f(m,n) . fn(k+1) . Além disso, 25 Demonstração. Suponha que m ≥ n. Então, pela Divisao Euclidiana, m = nq + r. Usando a Proposição 2.21 tem-se que fm = fnq+r = fnq−1 fr + fnq fr+1 . Mas, pela Proposição 2.22, fn |fnq . Então, pelo Lema de Euclides: (fn , fm ) = (fnq−1 fr + fnq fr+1 , fn ) = (fnq−1 fr , fn ). (∗∗) (fnq−1 , fnq ) = 1, então, da Proposição 2.16 tem-se que (fnq−1 , fn ) = 1. Portanto, de (∗∗) e da Proposição 2.15 segue que (fm , fn ) = (fn , fr ). Então, pela Proposição 2.18, (fm , fn ) = f(m,n) . A segunda armação segue diretamente da primeira, pois, se n|m então, pela Proposição 2.17, (n, m) = n, de onde, fn = f(n,m) = (fn , fm ), ou seja, fn = (fn , fm ). Logo, fn |fm . Mostra-se a recíproca usando o mesmo argumento. Pela Proposição 2.20, Uma das perguntas interessantes relacionadas à sequência de Fibonacci é se ela possui em seus termos, innitos números primos (um número primo é o que é divisível apenas por um e por ele mesmo. Mais sobre os números primos será visto no capítulo 3). Esta pergunta não tinha sido respondida até à conclusão deste trabalho e encontra-se entre as armações não demonstradas sobre os números primos. 3 Sobre Números Primos Neste capítulo, será apresentado o principal elemento matemático de estudo deste trabalho, os números primos. No próximo, serão apresentados algumas aplicações. Denição 3.1. Um número natural maior do que 1 e que só é divisível por 1 e por si próprio é chamado de número primo. Exemplo 3.1. divisíveis por Os números k Sejam, Exemplo 3.2. e a e para o qual representado por mod 5 e 29 são primos, mas 85, 115 e 140 não são, pois são 5. Denição 3.2. teiro positivo 7, 13 m números naturais tais que (a, m) = 1. O menor inak ≡ 1 mod m é chamado de ordem de a módulo m e ordm a. 34 = 81 ≡ 1 mod 5, 33 = 27 ≡ 2 mod 5, 32 = 9 ≡ 4 31 = 3 ≡ 3 mod 5. Portanto, ord5 3 = 4. Por exemplo, Denição 3.3. Seja n um número natural. ϕ de Euler à que associa m menores do que n, tais que Chama-se função a cada número natural, o número de inteiros positivos (m, n) = 1. Exemplo 3.3. ϕ para os números 24, 32 e 37. Para 24 tem-se que 1, 5, 7, 9, 10, 11, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22 e 23 são primos com 24. Logo ϕ(24) = 17. Para 32 tem-se que 1, 3, 5, 6, 7, 9, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28 ,29, 30 e 31 são primos com 32. Logo ϕ(32) = 27. Finalmente, para 31, uma vez que ele é um número primo tem-se que ϕ(31) = 30, pois todos os números anteriores a 31 são primos com ele. Calcule o valor da função Denição 3.4. Sejam, a e m chamado raiz primitiva módulo Exemplo 3.4. números naturais tais que m quando (a, m) = 1. O número a é ordm a = ϕ(m). 3 é uma raiz primitiva de 7, pois 729 = 36 ≡ 1 mod 7. Por 5 4 3 2 outro lado, 3 = 243 ≡ 5 mod 7, 3 = 81 ≡ 4 mod 7, 3 = 27 ≡ 6 mod 7, 3 = 9 ≡ 2 mod 7 e 31 = 3 ≡ 3 mod 7. Portanto, ord7 3 = 6. Além disso, como 7 é um número primo tem-se que ϕ(7) = 6, o que prova que 3 é uma raiz primitiva de 7. Tem-se que 26 27 Denição 3.5. Um sistema completo de resíduos módulo m é um conjunto de números naturais cujos restos pela divisão por m são os números 0, 1, 2, · · · , m − 1, em qualquer ordem e sem repetições. Exemplo 3.5. dulo 5 pois, dividindo Denição 3.6. naturais {31, 43, 82, 95, 14} é um sistema completo de resíduos móestes números por 5 obtem-se, respectivamente, 1, 3, 2, 0 e 4. O conjunto Um sistema reduzido de resíduos módulo r1 , · · · , rs 1. (ri , m) = 1, 2. ri Exemplo 3.6. é um conjunto de números tais que para todo não é congruente a 3. Para cada m n∈N i = 1, · · · , s, rj módulo m i 6= j , para que seja primo com m, existe i tal que n ≡ ri mod m. Usando o mesmo conjunto do Exemplo 3.5 tem-se que é um sistema reduzido de resíduos módulo 5, {31, 43, 82, 14} pois todos os seus elementos são primos 5, nenhum deles é congruente ao outro módulo 5 e todo natural que seja primo com 5 é congruente a um dos elementos deste conjunto módulo 5, já que todos os restos maiores do que zero, possíveis numa divisão por 5 podem ser obtidos dos elementos com deste conjunto. Observação 3.1. Das denições anteriores percebe-se que ϕ(m) ≤ m − 1 pois, os valores que tal função pode assumir são os valores que correspondem ao resto da divisão m. Note ainda que, quando ϕ(m) = m − 1, m é primo, pois todos os números 1, 2, 3, · · · , m − 1 são primos com m. Isso ajuda a concluir que, se um número a é raiz primitiva módulo p, com p primo, então ordp a = ϕ(p) = p − 1. Além disso, é possível demonstrar que todo número primo p possui pelo menos uma raiz primitiva a, tal que p | a. euclidiana de um número natural por Nos artigos 73 e 74 das Disquisitiones Arithmeticae, Gauss descreveu um processo para o cálculo de raízes primitivas. Observação 3.2. Durante os séculos os matemáticos têm observado classes de números com o objetivo de aprender sobre os números primos. Muitos dos problemas abertos da matemática relacionam-se a estas classes e, por isso, apresenta-se agora uma lista das mais conhecidas. 1. Números de Fermat : n Fn = 22 + 1; 2. Números de Mersenne: Mn = 2n − 1; 3. Pseudoprimos: Números compostos que possuem propriedades que se espera encontrar apenas em números primos; 28 4. Números de Carmichael: Números compostos todo a, 1 < a < n com n tais que an−1 ≡ 1 mod n, para (a, n) = 1; 5. Números de Cullen: Números da forma Cn = n × 2n + 1 6. Números de Woodall: Números da forma Cn = n × 2n − 1 Além disso, diversas classes de números primos foram estudadas. Abaixo apresentase alguns exemplos. 1. Primos de Sophie-German: Números primos p tais que 2p + 1 também sejam primos. 2. Primos de Wieferich: Um primo p que satisfaz a congruência 3. Primos de Wilson: Um primo que satisfaz a congruência 2p−1 ≡ 1 mod p2 . (p − 1)! ≡ −1 mod p2 . Existem muitas conjeturas, ou seja, armações não demonstradas, sobre os números primos e relacionadas a eles. Abaixo apresenta-se algumas delas: 1. Existe uma innidade de números de Mersenne compostos. a é um número inteiro diferente de zero e que não é quadrado, então existe uma innidade de números primos p tais que a é raiz primitiva módulo p. (Conjetura 2. Se de Artin) 3. Para todo natural par consecutivos pn , Pn+1 , 2k , existe uma innidade de pares de números primos tais que 4. Todo inteiro par maior do que dn = pn+1 − pn = 2k . 4 (Conjetura de Polignac) é a soma de dois números primos. (Conjetura de Goldbach) Mp o p-ésimo número de Mersenne. Mp é primo, se é somente se, as sen2p + 1 k k tenças e p é um primo da forma 2 ± 1 ou 4 ± 3 (para algum k ≥ 1) 3 5. Seja forem simultaneamente verdadeiras ou falsas. (Conjetura de Batman, Selfridge e Wagsta ) Utilizando-se cálculos em computadores demonstra-se que várias conjeturas são válidas para milhares de números. No entanto, uma demonstração para todos os naturais ainda não foi encontrada para nenhuma delas. No capítulo 5 serão analisados alguns resultados relacionados com a Conjetura de Goldbach. Observação 3.3. Da denição de número primos, dados um número natural 1. Se p|q , então a qualquer, tem-se que: p = q. p e q dois números primos e 29 2. Se p - a, então (p, a) = 1. 1. Com efeito, por hipótese, é primo e p|q , então pela denição de número primo, p = q . Como p é primo tem-se, por denição, que p > 1. Logo p = q . 2. Seja (p, a) = d. Pela denição de máximo divisor comum tem-se que d|p e d|a. Portanto, d = p ou d = 1. Mas e se d = p então se seguiria que p|a, o que é contrário à hipótese. Logo d = 1 ou p=1 q ou Proposição 3.1. então p|a ou Sejam a, b p, números naturais com p - a. Logo, por denição, um número primo. Se p|a · b (p, a) = 1. Portanto, pelo p|b. Corolário 3.1. Sejam p, p1 , p2 , · · · , pn números primos. para algum p p|b. Demonstração. Suponha que Teorema 2.2, e Se p|p1 ·p2 · · · pn , então p = pi i = 1, 2, · · · , n. Demonstração. Demonstra-se o resultado por indução sobre n. Se n = 2, o resultado vale pela Proposição 3.1. Como hipótese de indução suponha que o resultado vale para n − 1. p|p1 · p2 · · · pn tem-se que p|p1 · p2 · · · pn−1 ou p|pn . Se p|pn o resultado segue. Se p - pn então p|p1 · p2 · · · pn−1 e, pela hipótese de indução p = pi para algum i = 1, 2, · · · , n − 1. Agora se, Teorema 3.1. (Teorema Fundamental da Aritmética) Todo número natural maior do que 1 ou é primo ou se escreve de modo único (a menos da ordem dos fatores) como um produto de números primos, distintos ou não. Demonstração. Usando o princípio de indução nita, tem-se que, para n = 2 o resuln é primo, ou k < n. Mas então, ou pode escrito como n = n1 n2 com 0 < n1 < n e 0 < n2 < n. Então, pela hipótese de indução, existem primos p1 , p2 , · · · , pr e q1 , q2 , · · · , qs , tais que n1 = p1 · p2 · · · pr e n2 = q1 · q2 · · · qs e, então n = n1 n2 = p1 · p2 · · · pr · q1 · q2 · · · qs , onde os pi não são todos necessariamente distintos dos qj . Falta, ainda, mostrar que esta decomposição é única. Suponha, agora que n = p1 · p2 · · · pt = q1 · q2 · · · qu , com os pi e qj , números primos. Evidentemente, se n = 2, tem-se p1 = q1 = 2. Suponha, que o resultado vale para todo natural menor do que n, ou seja, que caso se tenha n > m = p1 · p2 · · · pt = q1 · q2 · · · qu , com os pi e qj então, t = u e cada um dos pi é igual a um dos qj para algum j . Tem-se que p1 |n = q1 · q2 · · · qu e, portanto, p1 q1 · q2 · · · qu . Pelo Corolário 3.1 p1 = qj para algum j . Reordenando os qj pode-se supor que tem-se q1 = p1. Então, tado vale. Suponha que o resultado vale para p2 · · · pt = q2 · · · qu . p2 · · · pt < n tem-se que, pela hipótese de indução, t = u um dos qj para algum j . Portanto, o resultado segue. Mas, como pi é igual a e cada um dos 30 Teorema 3.2. √ Se n não é primo, então n possui um fator primo menor ou igual a n. n não é primo ele é, por denição, composto. Então, pode ser escrito como n = n1 · n2 . Suponha, sem perda de generalidade, que n1 < n2 . Pode-se concluir, √ √ √ n. De fato, se não for assim tem-se que n = n1 · n2 > n · n = n, então, que n1 ≤ √ o que é absurdo. Logo n1 ≤ n. Pelo Teorema Fundamental da Aritmética, n1 possui pelo menos um fator primo p. √ n. Como esse fator é menor ou igual a n1 ele é menor ou igual a Demonstração. Se O famoso matemático grego Euclides, autor de Os Elementos, demonstrou o seguinte teorema: Teorema 3.3. Existem innitos números primos. Demonstração. Suponha, por absurdo, que a sucessão de números primos seja nita e dada por p1 , p2 , · · · , pn . P . Esse primo não p1 · p2 · · · pn . Logo, P = p1 · p2 · · · pn + 1. Seja p um número primo que divide pode ser igual a nenhum dos pi pois, senão, dividiria P e dividiria dividiria, P − p1 · p2 · · · pn = 1, o que é absurdo. Portanto, p é um Seja número primo que não pertence à sucessão e, portanto, existe um primo diferente de p1 , p2 , · · · , pn . Esse raciocínio pode ser repetido quantas vezes for necessário. Portanto, existem innitos números primos. Após a comprovação de que existiam innitos primos diversos matemáticos começaram a procurar uma fórmula geral para a sequência dos primos. Esta procura levou à criação de vários testes de primalidade que, embora não sejam ecientes, pois exigem um grande número de operações, podem ajudar a determinar se um número possivelmente é primo. Os testes de primalidade podem ser classicados em seis categorias distintas: 1. Testes para números de forma particular (a) Teste APR (b) Testes com curvas elípticas 2. Testes para números genéricos 3. Testes baseados em teoremas 4. Testes baseados em conjecturas (a) Teste de Miller - baseado na hipótese de Riemann 5. Testes determinísticos 31 6. Testes de Monte Carlos Proposição 3.2. primo p tal que Se um número natural p2 ≤ n, n então n > 1 não é divisível por nenhum número é primo. p primo, tal que p|n com p2 ≤ n e que n seja composto. Então pelo Teorema Fundamental da Aritmética, existe q ,tal que q é o menor número primo que divide n. Então n = qn1 e q ≤ n1 . De onde, q2 ≤ qn1 = n. Portanto, q|n e q2 ≤ n, contrário à hipótese. Demonstração. Suponha, por absurdo, que não exista Teorema 3.4. que p (Pequeno Teorema de Fermat) divide o número p a − a, para todo Dado um número primo p|0. tem-se a ∈ N. Demonstração. Demonstra-se o resultado por indução sobre vale, pois p, Suponha, que o resultado vale para a. a. Para a=1 o resultado Então tem-se que: p p−1 p p−2 p (a + 1) − (a + 1) = a + a + a + ··· + a−a= 1 2 p−1 p p−1 p p−2 p p =a −a+ a + a + ··· + a, 1 2 p−1 p p que é, pela hipótese de indução e pelo Lema 4.1, divisível por Corolário 3.2. p, então p Se divide p é um número primo e se a p. é um número natural não divisível por ap−1 − 1. Demonstração. Pelo Pequeno Teorema de Fermat tem-se que Por outro lado, por hipótese, p - a, ou seja (a, p) = 1. p|ap − a = a(ap−1 − 1). Então, pelo Teorema 2.2, p|ap−1 − 1. Proposição 3.3. Sejam a, b, c, m ∈ N, ac ≡ bc mod m se, com c 6= 0 e somente se e m > 1. a ≡ b mod Demonstração. Supondo, sem perda de generalidade, que Corolário 2.3, c (c, m) e m (c, m) Então m . (c, m) bc ≥ ac e uma vez que, pelo são primos entre si, tem-se que m c |(b − a) ⇔ (c, m) (c, m) m m ⇔ |(b − a) ⇔ a ≡ b mod . (c, m) (c, m) ac ≡ bc mod m ⇔ m|(b − a)c ⇔ Corolário 3.3. Sejam a, b, c, m ∈ N, com ac ≡ bc mod m se, c 6= 0, m > 1 e somente se e (c, m) = 1. a ≡ b mod m. Então 32 Demonstração. Decorre, imediatamente da Proposição anterior, uma vez que (c, m) = 1. Proposição 3.4. a ∈ N, tal que módulo m. r1 , · · · , rϕ(m) um sistema reduzido de resíduos módulo m e seja (a, m) = 1. Então, ar1 , · · · , arϕ(m) é um sistema reduzido de resíduos Seja m, r1 , · · · , rϕ(m) tenha sido obtido a partir de um sistema completo de resíduos módulo m dado por a1 , · · · , am . Então, para todo ai com um ri correspondente tem-se que (ai , m) = 1. Então, pela Proposição 2.16 tem-se que (aai , m) = 1, o que demonstra o resultado. Demonstração. Suponha que o sistema reduzido de resíduos módulo Teorema 3.5. (De Euler) Sejam m, a ∈ N, aϕ(m) ≡ 1 com m>1 e (a, m) = 1. mod m. Demonstração. Seja um sistema reduzido de resíduos módulo Pela Proposicao 3.4, m. ar1 , · · · , arϕ(m) m dado por r1 , · · · , rϕ(m) . também formam um sistema de resíduos módulo Então aϕ(m) · r1 · r2 · · · rϕ(m) = ar1 · ar2 · · · arϕ(m) ≡ r1 · r2 · · · rϕ(m) Aplicando a Proposição 2.15 um número nito de vezes tem-se que 1. Então: Então, pelo Corolário 3.3 tem-se que mod m. (r1 ·r2 · · · rϕ(m) , m) = aϕ(m) ≡ 1 mod m. Pode-se formular o Pequeno Teorema de Fermat utilizando a denição de congruência (Denição 2.5) da seguinte maneira: Teorema 3.6. p divide mod p. que (Pequeno Teorema de Fermat) o número p a ≡ a mod p, para todo Dado um número primo a ∈ N. Se, p - a, então Demonstração. Consequência direta do Teorema de Euler já que, como ϕp = p − 1. Então aϕ(p) = ap−1 ≡ 1 mod p. p, tem-se ap−1 ≡ 1 p é primo 4 Números Primos: Resultados e Aplicações Denição 4.1. Dado x ∈ N denota-se por π(x) ao número de primos p tais que p ≤ x. A função π(x) é chamada função de contagem dos números primos. Em 1792, aos 15 anos de idade, Gauss conjeturou que π(x) era assintoticamente igual à função logarítmica: x Z Li(x) = 2 dt . log t Com o tempo tal conjetura provou-se verdadeira e é hoje conhecida como: Teorema 4.1. (Teorema dos Números Primos). Nas condições da denição anterior, π(x) ∼ 4.1 x . log x Números Primos e Fatoriais Proposição 4.1. Para todo natural n ≥ 2, a sequência (n+1)!+2, (n+1)!+3, · · · , (n+ 1)! + n + 1 de números naturais é formada por n números consecutivos compostos. (n + 1)! possui todos forma (n + 1)! + i, com Demonstração. De fato, pela denição de fatorial, o número 2 até n + 1. Logo, dado qualquer número da i = 2, ..., n + 1, existirá o fator i no número (n + 1)!, ou seja, os fatores de (n + 1)! + i = (2 · 3 · . . . · (i − 1) · i · (i + 1) · . . . · (n + 1)) + i = = i(2 · 3 · . . . · (i − 1) · (i + 1) · . . . · (n + 1)) + i = = i(2 · 3 · . . . · (i − 1) · (i + 1) · . . . · (n + 1) + 1) que é divisível por Lema 4.1. Seja divisíveis por p i e, portanto, um número composto. um número primo. Os números p. 33 p , onde i 0 < i < p, são todos Números Primos e Fatoriais 34 Demonstração. Por denição, p p(p − 1)(p − 2) · · · (p − i + 1) = . i i! Evidentemente, se i = 1 o resultado segue. Assim, supondo 1 < i < p tem-se i!|p(p − 1) · · · (p − i + 1). Uma vez que i < p resulta que (i!, p) = 1, então i!|(p − 1) · · · (p − i + 1). Escrevendo p (p − 1)(p − 2) · · · (p − i + 1) =p i i! facilmente observa-se que o resultado vale. Nesse tópico será utilizado o símbolo a por b hai na divisão euclidiana. Proposição 4.2. Seja quociente da divisão de a ∈ N a por b para designar o quociente da divisão de b b, c ∈ N∗ . e Então,o quociente da divisão por é igual ao quociente da divisão de a por b vezes c c, do ou seja, hai h i b = a . c bc Demonstração. Considere hai q1 = hai b e q2 = b . c h a i a = bq1 +r1 , com r1 ≤ b−1. Por outro lado, também pela divisão euclidiana, q1 = = cq2 + r2 , com r2 ≤ c − 1. b Portanto, a = bq1 + r1 = b(cq2 + r2 ) + r1 = bcq2 + br2 + r1 . Observando ainda que, br2 + r1 ≤ b(c − 1) + b − 1 = bc − 1, concluí-se que q2 é o quociente da divisão de a por bc, ou seja, Então, pela divisão euclidiana, q2 = Observação 4.1. Dados p primo e expoente da maior potência de decomposição de Teorema 4.2. m p m hai bc . um número natural, denota-se por que divide m, Ep (m) ao ou seja, ao expoente que aparece na em fatores primos. (Legendre) Sejam n um número natural e p n n n Ep (n!) = + 2 + 3 + ... p p p um número primo. Então Números Primos e Fatoriais 35 Demonstração. Observe que, pelo Princípio da Boa Ordem, existe um número natural r tal que pi > n para todo i ≥ r. Então, n pi = 0, se i ≥ r. Para demonstrar o n. Para n = 0 tem-se Ep (0!) = 0. Suponha, m < n. Os múltiplos de p entre 1 e n são resultado usa-se indução sobre o resultado vale para todo agora que n p. p, 2p, . . . , p Pode-se, então, escrever, n n + Ep ! . Ep (n!) = p p Mas, por hipótese de indução, n n p p n Ep ! = p + p2 + . . . p Pela Proposição 4.2, n n n n p p = 2 , 2 = 3 , p p p p etc... Portanto, n n n + 2 + 3 + ... Ep (n!) = p p p Exemplo 4.1. Encontrar a decomposição de 20! em fatores primos e descobrir com quantos zeros termina a representação decimal deste número. Para resolver o problema é necessário encontrar o valor de p ≤ 20. Ep (20!) para todo primo Tem-se que: 20 20 20 20 E2 (20!) = + + + = 10 + 5 + 2 + 1 = 18 2 4 8 16 20 20 + =6+2=8 E3 (20!) = 3 9 20 E5 (20!) = =4 5 20 E7 (20!) = =2 7 20 E11 (20!) = =1 11 Números Primos e Fatoriais 36 20 E13 (20!) = =1 13 20 =1 E17 (20!) = 17 20 =1 E19 (20!) = 19 Logo 20! = 218 · 38 · 54 · 72 · 11 · 13 · 17 · 19. Como existem 4 fatores 5 neste número, ele termina com quatro zeros. Denição 4.2. Seja um número natural n-ádica de um número natural Exemplo 4.2. n-ádica para n m 2 a com n > 0. Chama-se representação à sua representação na base Seja o número natural de n, 295. n. Apresenta-se abaixo sua representação 9: • 100100111(2) = 1 · 256 + 0 · 128 + 0 · 64 + 1 · 32 + 0 · 16 + 0 · 8 + 1 · 4 + 1 · 2 + 1 = 256 + 0 + 0 + 32 + 0 + 0 + 4 + 2 + 1 = 295 • 101221(3) = 1 · 243 + 0 · 81 + 1 · 27 + 2 · 9 + 2 · 3 + 1 = 243 + 0 + 27 + 18 + 6 + 1 = 295 • 10213(4) = 1 · 256 + 0 · 64 + 2 · 16 + 1 · 4 + 3 = 256 + 0 + 32 + 4 + 3 = 295 • 2140(5) = 2 · 125 + 1 · 25 + 4 · 5 + 0 = 250 + 25 + 20 + 0 = 295 • 1211(6) = 1 · 216 + 2 · 36 + 1 · 6 + 1 = 216 + 72 + 6 + 1 = 295 • 601(7) = 6 · 49 + 0 · 7 + 1 = 294 + 0 + 1 = 295 • 447(8) = 4 · 64 + 4 · 8 + 7 = 256 + 32 + 7 = 295 • 357(9) = 3 · 81 + 5 · 9 + 7 = 243 + 45 + 7 = 295 Teorema 4.3. Sejam p, n ∈ N∗ com p primo. Suponha que n = nr pr + nr−1 pr−1 + ... + n1 p + n0 . seja a representação p-ádica de n. Ep (n!) = Demonstração. Por denição, Então, n − (n0 + n1 + ... + nr ) . p−1 0 ≤ ni < p. Então: n = nr pr−1 + nr−1 pr−2 + ... + n2 p + n1 p Números Primos e Fatoriais 37 n = nr pr−2 + nr−1 pr−3 + ... + n2 p2 ··· n = nr . pr Daí, usando a fórmula do Teorema de Legendre e somando e subtraindo n0 na expressão resultante tem-se que: n n pr − 1 pr−1 − 1 n + 2 + ... + r = nr + nr−1 + · · · + n1 = Ep (n!) = p p p p−1 p−1 = nr pr + nr−1 pr−1 + · · · + n1 p + n0 − (nr + nr−1 + · · · + n1 + n0 ) = p−1 = Exemplo 4.3. n − (n0 + n1 + · · · + nr ) . p−1 Encontre a decomposição de 20! utilizando a fórmula do Teorema 4.3 e compare com o resultado do Exemplo 4.1. Para resolver este exercício é necessário encontrar a representação de 2, 3, 5, 7, 11, 13, 17 e 19. Tem-se que • 10100(2) = 1 · 16 + 0 · 8 + 1 · 4 + 0 · 2 + 0 • 202(3) = 2 · 9 + 0 · 3 + 2 • 40(5) = 4 · 5 + 0 = 20 + 0 • 26(7) = 2 · 7 + 6 = 14 + 6 • 19(11) = 1 · 11 + 9 • 17(13) = 1 · 13 + 7 • 13(17) = 1 · 17 + 3 • 11(19) = 1 · 19 + 1 A partir daí tem-se que: E2 (20!) = 20 − (0 + 0 + 1 + 0 + 1) = 18 2−1 20 nas bases Números Primos e Progressões Aritméticas E3 (20!) = 4.2 38 20 − (2 + 0 + 2) =8 3−1 E5 (20!) = 20 − (0 + 4) =4 5−1 E7 (20!) = 20 − (6 + 2) =2 7−1 E11 (20!) = 20 − (9 + 1) =1 11 − 1 E13 (20!) = 20 − (7 + 1) =1 13 − 1 E17 (20!) = 20 − (3 + 1) =1 17 − 1 E19 (20!) = 20 − (1 + 1) =1 19 − 1 Números Primos e Progressões Aritméticas Teorema 4.4. d ≥ 2 e a 6= 0 são inteiros primos entre si então a progressão aritmética a, a+d, a+2d, ..., a+(n−1)d, contém uma innidade de números (Dirichlet) Se primos. A demonstração foge do escopo deste trabalho, mas pode ser encontrada em HASSE, 1980. O resultado abaixo está relacionado à conjetura de que existem innitos números de Mersenne compostos. Proposição 4.3. (Powell-Israel) Sejam m, n números inteiros tais que, m > 1 e mn > 2 e p um mp − n. número primo. Então existe uma innidade de números compostos da forma Demonstração. Pelo Teorema Fundamental da Aritmética mn − 1 possui pelo menos q | m. Pelo Teorema de Dirichlet (4.4) existem innitos primos p, tais que p ≡ q − 2 mod q − 1. Portanto, existe uma innidade de números p inteiros compostos m − n com p primo. um fator primo q. Observação 4.2. Então, Em 2 de março de 1998, M. Topic, encontrou uma progressão arit- mética que possui dez termos consecutivos primos. A razão da progressão aritmética é 210. O primeiro destes termos é o número Números Primos e Progressões Aritméticas p = 10009969724697142476377866555879698403295093246891900418036034177 58904341703348882159067229719. 39 5 A Conjetura de Goldbach Em 1742, em uma carta a Euler, Goldbach disse acreditar que todo inteiro maior do que 5, ou seja, todo inteiro maior ou igual a 6, podia ser escrito como a soma de três primos. Euler respondeu que era fácil ver que essa armação era equivalente à: Todo inteiro par maior ou igual a 4 é a soma de dois números primos. n ≥ 3, Portanto, 2n = 2+p1 +p2 e 2n+1 = 3+p1 +p2 , De fato, se a segunda armação for suposta verdadeira tem-se que, para todo 2n−2 = p1 +p2 , onde p1 e p2 são primos. o que demonstra a primeira armação. Reciprocamente, suposta verdadeira a primeira armação tem-se que, para 2n + 2 = p1 + p2 + p3 , onde p1 , p2 e p3 2n ≥ 4, 2n + 2 é par, um destes primos p2 = 2 tem-se 2n = p1 + p2 . são primos. Como é necessariamente par, ou seja, é igual a 2. Supondo, No entanto, a validade da segunda armação, agora conhecida como Conjetura de Goldbach, permanece sem demonstração até a conclusão deste trabalho. Pelo fato de existirem innitos primos, facilmente nota-se que vale a seguinte variação da Conjetura de Goldbach: Proposição 5.1. Existe uma quantidade enumerável de naturais tais que a Conjetura de Goldbach é válida. Demonstração. Tome b ≥ 3, um número natural. Como existem innitos números b percorre o conjunto dos naturais, obtém-se a sequência p1 + 3, p2 + 3, p2 + 3, ..., pi + 3, ..., com os pi 's primos distintos e ímpares. Sendo assim, as somas pi + 3 são números pares, ou seja, 2ni = pi + 3, para uma quantidade enumerável de ni . Portanto, a Conjetura de Goldbach vale para uma quantidade enumerável de primos, quando naturais. Generalizando este resultado, tem-se que escolhendo 2 < p < q ≤ pi , primos, a sequência, p1 + p, p2 + p, p3 + p, ..., pi + p, ..., p0i s primos distintos, também tem por elementos apenas números pares, valendo Conjetura de Goldbach para os ni da forma 2ni = pi + p. com os a 40 41 Apesar disso, as diculdades para demonstrar a Conjetura permanecem. Durante o ano de 2011 cursava o Mestrado Prossional em Matemática em Rede Nacional (PROFMAT), quando, na disciplina de Fundamentos da Aritmética me deparei com o seguinte exercício (Hefez, pg 95, ex 7.S.6) Existe uma correspondência biunívoca entre pares de primos gêmeos e números tais que 2 n −1 n possui quatro divisores. O problema imediatamente me interessou, pois relacionava-se diretamente a um outro problema em aberto da matemática, a saber: Existem innitos primos gêmeos ? Então decidi resolver o exercício, pois demonstrar que existem innitos valores de n 2 n − 1 tem quatro divisores equivale a responder armativamente a ques- para os quais tão acima. A resolução do exercício é: p e q , tome n = p + 1. Então, p = n − 1. Por outro 2 lado, n = q − 1 e, portanto, q = n + 1. Tem-se então que p · q = (n − 1)(n + 1) = n − 1. 2 2 Os divisores de n − 1 são 1, p, q e n − 1, ou seja, quatro divisores. 2 2 Reciprocamente, se n − 1 possui quatro divisores ele é da forma p · q = n − 1, com p e q primos. Então, Dado um par de primos gêmeos p · q = n2 − 1 = (n + 1)(n − 1). Como p = n−1 p q são primos tem-se, q = n + 1. Logo, p e q e e supondo, sem perda de generalidade, p < q, que são primos gêmeos. A unicidade é garantida pelo Teorema Fundamental da Aritmética. Resolver o exercício foi simples, no entanto, demonstrar a existência de innitos n para os quais tal propriedade vale mostrou-se tão inatingível quanto a demonstração da armação original sobre se existem innitos pares de primos gêmeos. No entanto, analisando o exercício, imaginei o que aconteceria se em vez de considerar as diferenças de quadrado n2 − 1 fossem estudadas as diferenças n 2 − a2 para um número natural a qualquer. Uma primeira ideia foi de que o resultado do exercício pudesse ser estendido para o caso geral, ou seja, que existisse uma correspondência biunívoca entre primos equidistantes de um determinado n e as diferenças de quadrados quatro divisores. Observe que tal diferença pode ser fatorada n2 − a2 que possuíssem como (n + a)(n − a). No entanto, ao estudar tal diferença para diversos valores percebi, com a ajuda do Prof. Dr. Rômulo Campos Lins e Prof Dr. Henrique Lazari, que em alguns determinados casos o resultado não era válido. Por exemplo, se for escolhido (6 + 3)(6 − 3) = 9 · 3, n=6 e a=3 n2 − a2 = 62 − 32 = 27 = 1, 3, 9 e 27, mas 9 e 3 não tem-se que que possui quatro divisores, a saber 42 são primos equidistantes de 6. n−a sejam primos entre si. Observe que esta condição é satisfeita no caso em que a = 1. Adicionalmente, perceba que se a = n − 1 obtem-se que n + a = 2n − 1 e n − a = 1 e, uma vez que 1 não é primo, estes casos também precisam ser excluídos. Portanto, para o caso geral, é necessário colocar, como hipótese, que n+a e Levando em conta estas restrições formulei o seguinte resultado geral: Proposição 5.2. n > 3, suponha que exista um número natural a, 0 < a < n − 1, tal que (n − a, n + a) = 1. Nestas condições, para cada par n e a, existe uma correspondência biunívoca entre pares de primos equidistantes de n 2 2 e os números da forma n − a que possuem quatro divisores. Para cada número natural p e q equidistantes de n, suponha, sem perda de generalidade, que p < n e tome a = n − p. Então, n = p + a e p = n − a. Como p e q são equidistantes de n, n = q − a e tem-se que q = n + a. Então p · q = (n − a)(n + a) = n2 − a2 . Como, por hipótese, (n − a, n + a) = 1, os divisores 2 2 2 2 de n − a são 1, p, q e n − a , ou seja, quatro divisores. 2 2 2 2 Reciprocamente, se n −a possui quatro divisores e (n−a, n+a) = 1, então n −a 2 2 é da forma p · q = n − a . Além disso, Demonstração. De fato, dado um par de primos p · q = n2 − a2 = (n + a)(n − a). Como (n − a, n + a) = 1 e n−a > 1 (pois, 0 < a < n − 1), tem-se que primos. De fato, suponha, por absurdo, que um deles, por exemplo p, p e q são seja composto. p = p1 p2 . 1|n − a e n2 − a2 Então, pelo Teorema Fundamental da Aritmética, ele seria escrito como Logo, 2 p1 |n − a 2 , 2 p2 |n − a 2 , 2 p|n − a 2 , 2 q|n − a 2 , 2 p1 p2 q|n − a 2 e 2 2 teria seis divisores, o que é contrário à hipótese. p < q , tem-se que p = n − a e q = n + a. n. A unicidade de a para p e q é garantida Supondo, sem perda de generalidade, Logo, p e q são primos equidistantes de pelo Teorema Fundamental da Aritmética. Após demonstrar essa proposição percebi que havia uma ligação entre ela e a Con- p e q da proposição acima tem-se que p = n−a e q = n+a, de onde p+q = n−a+n+a = 2n. Ou seja, p+q = 2n. Desta maneira, demonstrar que para todo n existe um número a nas condições da Proposição jetura de Goldbach, pois, considerando-se os primos 5.2 é equivalente a demonstrar a Conjetura de Goldbach. assunto percebi, então, que falar sobre sobre n p+q = n, n ≥ 2. 2 p + q = 2n n≥2 2n ≥ 4 era equivalente a falar Essa conclusão equivale à armar que para todo é primo, ou existem primos equidistantes de número para Estudando ainda mais o pode-se armar que n n. n≥2 ou Em resumo signica que, para todo é a média aritmética de 2 primos. Chegando a esta conclusão, por volta de agosto de 2012, resolvi entrar em contato com alguns pesquisadores do Departamento de Matemática da UNESP/RC. Conversei com a Profa. 43 Dra. Eliris Cristina Rizziolli e com o Prof. Dr. Henrique Lazari sobre meus estudos e enviei para eles, via e-mail, parte de minhas conclusões. A partir do incentivo deles prossegui as pesquisas. Encontrei, num artigo da Wikipedia, em inglês [7] uma armação similar à de que para todo número n ≥ 2, n é a média aritmética de I como Conjetura de Lawson, dizia Para todo equidistantes de I. 2 primos. Tal armação, citada maior do que 2 existe um par de primos No entanto, a Conjetura de Lawson falha para I então complementar esta armação por dar a I = 3. É necessário, a possibilidade de ser primo. Quando se faz isto a ampliação da Conjetura de Lawson, expressa abaixo é equivalente à Conjetura de Goldbach. Formalizando: Proposição 5.3. A Conjetura de Golbach é equivalente a armação de que todo natural n≥2 é a média aritmética de dois números primos, distintos ou não. Demonstração. De fato, suponha válida a Conjetura de Goldbach. Então, para todo n≥2 2n ≥ 4 p+q . n= 2 tem-se que Portanto, e, por Goldbach, existem primos n ≥ 2, n Reciprocamente, se vale que, para todo máximo, dois números primos, existem p+q . 2 Ou seja, 2n = p + q , com 2n ≥ 4 p e q, p e q, tais que 2n = p + q . é a média aritmética de, no primos, distintos ou não, tais que n= e vale a Conjetura de Goldbach. Uma vez provado este resultado, demonstra-se agora que essa armação é equivalente à Proposição 5.2 e, portanto, as duas armações são equivalentes à Conjetura de Goldbach. Apenas, neste caso, os primos satisfazer a hipótese de que Proposição 5.4. e n 2 − a2 a > 0. Se para todo p e q devem ser distintos para se conseguir Formalizando: n ≥ 2, existir tenha 4 divisores, então existem p e 0<a<n−1 q (n + a, n − a) = 1 p+q n= . 2 tal que primos, tais que, a < n − 1 tal que n2 − a2 tem quatro divisores então, pela 2 2 Proposição 5.2, existem p e q primos tais que pq = n − a , com p = n − a e q = n + a. p+q . Logo p + q = n − a + n + a = 2n e n = 2 p+q q−p Reciprocamente, se n = com p e q primos, tome a = . Então 2 2 Demonstração. Se existe n 2 − a2 = e, portanto, n2 − a2 (p + q)2 (q − p)2 4pq − = = pq, 4 4 4 tem quatro divisores. Continuando os estudos, percebi que existe um relacionamento entre as diferenças de quadrados, nas condições da Proposição 5.2, e as equações quadráticas da forma x2 − (p + q)x + pq = 0, com p e q primos distintos. Observe que, p e q são as raízes da equação e, portanto, existe uma correspondência biunívoca entre estas diferenças 44 de quadrados e as equações quadráticas nas quais o coeciente do termo e cujas raízes são primos p e q, x2 é igual a 1 distintos. Proposição 5.5. Para cada número natural n > 3, seja um número natural a, 0 < a < n−1, tal que (n−a, n+a) = 1. Nestas condições, existe uma correspondência biunívoca entre diferenças de quadrados que possuem quatro divisores e equações quadráticas da forma x2 − (p + q)x + pq = 0, com p e q primos distintos. n2 − a2 com quatro divisores tem-se, pela Proposição 2 2 2 5.2, que n − a = pq . Toma-se então x − (p + q)x + pq = 0 para a equação. 2 Reciprocamente, dada a equação x − (p + q)x + pq = 0, com p e q primos distintos, q−p p+q e a = . Então, como demonstrado na Proposição 5.4, tem-se que tome n = 2 2 2 2 n − a = pq . Demonstração. De fato, dado Observação 5.1. drática da forma Um ponto interessante a se observar é que, dada uma função qua- f (x) = x2 −(p+q)x+pq = 0, com p e q primos, tomando-se n = p+q 2 n2 − a2 = pq tem-se que o vértice da parábola que representa esta função tem coor2 denadas (n − a ). Ou seja, demonstrar que para todo n > 2 encontra-se um a, tal que 0 < a < n − 1, com (n + a, n − a) = 1,n2 − a2 tenha quatro divisores e (n, −a2 ) seja o 2 2 2 vértice da parábola que representa a função f (x) = x − 2nx + (n − a ), também se e relaciona com demonstrar a Conjetura de Goldbach. Simplicando, se para todo n − 1, n > 2, a, tal que 0 < a < f (x) = x − 2n + (n − a2 ) tenha por raízes existir um número natural de maneira que a função quadrática 2 2 dois números primos distintos, então a Conjetura de Goldbach é verdadeira. A Tabela 5.1 mostra que para muitos valores de (o número da coluna) é possível p e q que satisfazem a igualdade acima. 2 2 2 2 Por exemplo, quando se escolhe n = 13 e a = 6 tem-se que n − a = 13 − 6 = 169 − 36 = 133 = 7 · 19. Então, 7 e 19 são os primos de Goldbach para n = 13. Estes encontrar um a n (o número da linha) e primos primos podem ser localizados na tabela por se seguir as diagonais a partir do número que se encontra no cruzamento da linha 13 com a coluna 6. estão sublinhados. As diagonais percorridas para encontrar primos p e q Na tabela p e q n, a e n2 − a2 estão em itálico e os estão em negrito. Utilizando o mesmo processo para outros valores de n e de a para os quais n2 − a2 possuam quatro divisores o leitor perceberá que pode encontrar diversos primos de Goldbach. No entanto, a demonstração de que existe um a para todo n > 2, nas condições da Proposição 5.4 , equivalente à vericação da Conjetura de Goldbach, ainda não foi possível. Pelos estudos que z concluí que tal demonstração é tão complexa quanto a própria Conjetura de Goldbach, mas deixo aos interessados o incentivo para procurar respostas e caminhos adicionais. 45 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 1 0 -3 -8 -15 -24 -35 -48 -63 -80 -99 -120 -143 2 3 0 -5 -12 -21 -32 -45 -60 -77 -96 -117 -140 3 8 5 0 -7 -16 -27 -40 -55 -72 -91 -112 - 135 4 15 12 7 0 -9 -20 -33 -48 -65 -84 -105 -128 5 24 21 16 9 0 -11 -24 -39 -56 -75 -96 -119 6 35 32 27 20 11 0 -13 -28 -45 -64 -85 -108 7 48 45 40 33 24 13 0 -15 -32 -51 -72 -95 8 63 60 55 48 39 28 15 0 -17 -36 -57 -80 9 80 77 72 65 56 45 32 17 0 -19 -40 -63 10 99 96 91 84 75 64 51 36 19 0 -21 -44 11 120 117 112 105 96 85 72 57 40 21 0 -23 12 143 140 135 128 119 108 95 80 63 44 23 0 13 168 165 160 153 144 133 120 105 88 69 48 25 14 195 192 187 180 171 160 147 132 115 96 75 52 15 224 221 216 209 200 189 176 161 144 125 104 81 16 255 252 247 240 231 220 207 192 175 156 135 112 17 288 285 280 273 264 253 240 225 208 189 168 145 18 323 320 315 308 299 288 275 260 243 224 203 180 19 360 357 352 345 336 325 312 297 280 261 240 217 20 399 396 391 384 375 364 351 336 319 300 279 256 21 440 437 432 425 416 405 392 377 360 341 320 296 22 483 480 475 468 459 448 435 420 403 384 363 340 23 528 525 520 513 504 493 480 465 448 429 408 385 24 575 572 567 560 551 540 527 512 495 476 455 432 25 624 621 616 609 600 589 576 561 544 525 504 481 26 675 672 667 660 651 640 627 612 595 576 555 532 27 728 725 720 713 704 693 680 665 648 629 608 585 28 783 780 775 768 759 748 735 720 703 684 663 640 29 840 837 832 825 816 805 792 777 760 741 720 697 30 899 896 891 894 885 874 861 846 829 800 869 756 31 960 957 952 945 936 925 912 897 880 861 840 907 32 1023 1020 1015 1008 999 988 975 960 943 924 903 880 33 1088 1085 1080 1073 1064 1053 1040 1025 1008 989 968 945 34 1155 1152 1147 1140 1131 1120 1107 1092 1075 1056 1035 1012 35 1224 1221 1216 1209 1200 1189 1176 1161 1144 1125 1104 1081 36 1295 1292 1287 1280 1271 1260 1247 1232 1215 1196 1175 1152 37 1368 1365 1360 1353 1344 1333 1320 1305 1288 1269 1248 1225 38 1443 1440 1435 1428 1419 1408 1395 1380 1363 1344 1323 1300 39 1520 1517 1512 1505 1496 1485 1472 1457 1440 1421 1400 1377 40 1599 1596 1591 1584 1575 1564 1551 1536 1519 1500 1479 1456 Tabela 5.1: Tabela de Diferenças de Quadrados 6 Aplicação do Tema Divisibilidade em Sala de Aula Apresenta-se agora uma sugestão para a utilização do tema divisibilidade na Escola Básica. O objetivo é mostrar aos alunos como diferentes áreas da Matemática estão interligadas e como entender esta ligação é de ajuda para uma melhor compreensão e aplicação dos conteúdos estudados em sala de aula. No Capítulo 4 deste trabalho foram analisadas algumas ligações entre fatoriais e divisibilidade. Em especial o Exemplo 4.1, que mostra como encontrar a decomposição de 20! utilizando a função Ep (m), na qual p é um número primo e m é um número na- tural, fornece um tema bastante interessante para utilização em uma classe do segundo ano do Ensino Médio, associado ao ensino de Análise Combinatória. Essa função, denida na Observação 4.1, e que retorna o expoente da maior potência de p que divide m, ou seja, o expoente que aparece na decomposição de m em fatores primos, é simples o suciente para ser trabalhada com os alunos do Ensino Médio. Uma sequência didática para trabalhar o tema é: 1. Recordar a ideia da decomposição de um número em fatores primos; 2. Como motivação, explicar o relacionamento entre a decomposição de números muito grandes e a segurança na internet; 3. Revisar o conceito de fatorial, trabalhado anteriormente no estudo da Análise Combinatória e do Binômio de Newton; 4. Denir a função Ep (m) e trabalhar exemplos para uma melhor compreensão do conceito; 5. Tornar claro como a função está associada à decomposição de fatoriais em fatores primos, conforme explicado no Teorema 4.2 (De Legendre); 6. Apresentar a fórmula do Teorema e exemplos com números pequenos; 20 usando 2 · 3 · 5 · 7 · 11 · 13 · 17 · 19. 7. Calcular a decomposição do fatorial de posição é dada por 18 8 4 2 46 o Exemplo 4.1. Essa decom- 47 8. Comentar o trabalho envolvido no cálculo desta decomposição utilizando o algoritmo tradicional, destacando que, antes deste ser aplicado, é necessário calcular o valor de 20!; 9. Escolhendo um fatorial menor, por exemplo, 10! (veja Exemplo 6.1), mostrar como encontrar a decomposição utilizando o teorema de Legendre e utilizando o algoritmo tradicional da decomposição em fatores primos; 10. Aplicar alguns exercícios para xação os conceitos. Se o professor tiver tempo e achar interessante poderá ainda mostrar aos alunos como descobrir com quantos zeros termina 20! ou outro fatorial qualquer, conforme explicado no Exemplo 4.1. Concluindo, apresenta-se abaixo uma comparação entre os dois processos e alguns exercícios para aplicação em sala de aula. Exemplo 6.1. Decomponha 10! pelo método tradicional e usando o Teorema de Le- gendre. Resolução: Para utilizar o algoritmo tradicional inicialmente calcula-se o valor de 10 · 9 · 8 · 7 · 6 · 5 · 4 · 3 · 2 = 3628800. 1. 3628800 1814400 907200 453600 226800 113400 56700 28350 14175 4725 1575 525 175 35 7 1 2 2 2 2 2 2 2 2 3 3 3 3 5 5 7 10! = 28 · 34 · 52 · 7. Usando o Teorema de Legendre é necessário encontrar o valor de primo ou seja, Depois divide-se este número pelos números primos em ordem crescente até que o resultado seja Então 10!, p ≤ 10. Tem-se que: Ep (10!) para todo 48 10 10 10 E2 (10!) = + + =5+2+1=8 2 4 8 10 10 + =3+1=4 E3 (10!) = 3 9 10 =2 E5 (10!) = 5 10 E7 (10!) = =1 7 Logo 10! = 28 · 34 · 52 · 7. Observe que, calculando pelo Teorema não é necessário encontrar o valor do fatorial, o que facilita, em muito, encontrar a decomposição do fatorial para números grandes. Exercício 6.1. Resolva os exercícios abaixo utilizando a função Ep (m) e o Teorema de Legendre (Teorema 4.2). 1. Quais as maiores potências de 3 e 7 que dividem 10000!? 2. Com quantos zeros termina a representação decimal de 3. Ache a maior potência de 4. Ache o menor valor de n 108 que divide 10000!? 10000!. tal que a maior potência de 7 que divide n! seja 734 . Referências [1] GAUSS, C. F., Disquisitiones arithmeticae. Tradução para o inglês de Clarke, A. A.; Waterhouse, W. C. Londres: Springer-verlag, 1966. [2] HEFEZ, A., Elementos de aritmética. Rio de Janeiro: SBM, 2011. 176 p. (Coleção do Professor de Matemática; 2). [3] MAYER, R., Teoria dos Números, 2005. Disponível em: < http : //www.mat.unb.br/ maierr/tnotas.pdf >. Acesso em: 18 jan. 2013. [4] OLIVEIRA, K.; CORCHO, A. J., Iniciação à Matemática. 1. ed. Maceió: SBM, 2010. [5] RIBENBOIM, P., Números Primos: Mistérios e Recordes. Rio de Janeiro: IMPA, 2001. [6] SANTOS, J. P. O., Introdução à Teoria dos Números. 1. ed. Rio de Janeiro: IMPA, 2007. [7] TALK:GOLDBACH'S conjecture. , 2003. Disponível em: < http : //en.wikipedia.org/wiki/T alk : Goldbach%27s_conjecture >. 18 jan. 2013. 49 Acesso em: