Brasil faxina a corrupção, o México, não

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21/08/2015 - 05:00
Brasil faxina a corrupção, o México, não
Por John Paul Rathbone
Ninguém aqui sabe fazer contas!, exclamou Alberto Youssef numa conversa telefônica repleta de
palavrões grampeada por promotores brasileiros, três anos atrás. Youssef, depois condenado por ajudar
a transferir US$ 444 milhões para contas bancárias no exterior em milhares de transações, é um lavador
de dinheiro que virou delator no petrolão - vasto escândalo de corrupção que atingiu os mais altos níveis
do governo.
O escândalo, em que bilhões de dólares foram desviados de contratos de construção civil firmados pela
Petrobras, estatal petroleira, para serem usados como propina destinada a políticos, encheu as ruas do
Brasil de manifestantes e resultou em pedidos de impeachment de Dilma Rousseff, a presidente mais
impopular na história brasileira. Isso é que é matemática.
O papel de Youssef era, basicamente, achacar executivos empresariais visando levantar dinheiro para
subornar políticos, a maioria deles do Partido dos Trabalhadores. A ganância dos políticos era notável mas em sintonia com os tempos. Eram dias do boom brasileiro, quando os preços das commodities
estavam altos e muitos brasileiros acreditavam que o horizonte otimista de seu "país do futuro"
realmente tinha chegado. A vida, para alguns, era doce: mais de US$ 2 bilhões foram roubados para
pagamentos de propina.
Seria tolo acreditar que a investigação na Petrobras vai mudar a vida política e
empresarial brasileira. Mas, a queda de figuras antes intocáveis mostra a possibilidade
de um novo rumo. No México, nenhum figurão foi preso, e a corrupção continua
galopante
Mas otimismo, e os brasileiros são notoriamente otimistas, é apenas pessimismo sem a informação extra
- e grande parte dessa informação a partir de então foi revelada. Dezenas de altos executivos foram
mandados para a prisão por seu papel no petrolão e mais de 30 políticos estão sendo investigados por
corrupção.
O boom econômico também chegou ao fim e grande parte do ganho inesperado com as commodities
acabou sendo mal gasto em novos shopping centers em vez de investidos em serviços sociais. A raiva que
os brasileiros sentem decorre da sensação de que seu futuro lhes foi roubado. A economia mergulhou em
sua pior recessão desde a Grande Depressão. O "momento" do Brasil passou.
Aos olhos de alguns, o "momento" agora é do México, em muitos aspectos o oposto do Brasil. Enquanto
a economia brasileira é impactada por corrupção, protecionismo e pela inclinação de Rousseff para o
intervencionismo, a economia já liberal do México está sendo ainda mais liberalizada, e seu setor
http://www.valor.com.br/imprimir/noticia/4189276/opiniao/4189276/brasil-faxina-cor... 24/08/2015
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petrolífero aberto ao investimento estrangeiro. A economia brasileira, movida a commodities, está
atrelada a uma China em desaceleração; os fabricantes mexicanos que operam a baixo custo estão a
reboque da recuperação americana. O presidente Enrique Peña Nieto proclamou uma nova era.
Diferentemente dos brasileiros, no entanto, a maioria dos mexicanos não assumiu a postura de uma
"nova era". A impunidade legal é galopante. Embora o México esteja muito à frente do Brasil na
classificação do Banco Mundial sobre a facilidade para a atividade empreendedora (na posição 39, à
frente do Chile e Israel, contra 120 no caso do Brasil), o oposto é verdadeiro no que diz respeito ao
Estado de direito. O México, por exemplo, ocupa a 103ª posição no índice de percepção de corrupção da
Transparência Internacional, pior do que a China; ao passo que o Brasil está na 69ªposição, juntamente
com a Itália e a Grécia.
O apodrecimento institucional mexicano parece estender-se de alto a baixo. O presidente enredou-se em
uma série de escândalos de conflito de interesses envolvendo sua esposa e seu ministro das Finanças.
Jornalistas que reportam desaparecimentos e violência alimentada pelas drogas, como o presumido
assassinato de 43 estudantes, no ano passado, são, eles próprios, mortos. Nesta semana, mais de 500
intelectuais posicionaram-se contra a "censura à bala" no México. Enquanto no Brasil os criminosos
estão sendo presos, no México, os barões das drogas podem escapar de prisões de alta segurança através
de túneis construídos sob os chuveiros de suas celas.
A reação do governo aos protestos após cada vergonhoso incidente? Embaraço mudo e uma atitude
"tudo vai bem", privilegiando a reforma econômica aos problemas com a justiça, que são a maior
preocupação do México.
O que o palácio presidencial mexicano parece não perceber
é que a insegurança e a ausência de lei também tem
implicações financeiras. Na virada do século, o Brasil e o
México tinham estoques iguais de investimento estrangeiro
direto, no equivalente a 19% de seus Produtos Internos
Brutos (PIB). A partir de então, esse estoque aumentou
para 32% no Brasil, ao passo que no México, tão "amistoso
à atividade empresarial", cresceu para apenas 26%.
Mesmo hoje, apesar do declínio do boom dos preços das commodities, as entradas anuais de
investimentos estrangeiros no Brasil são da ordem de quase 3% do PIB; no México, elas são de 2%.
Pesquisas consultando investidores também revelam uma preocupação crescente com a impunidade e
insegurança jurídica.
Peña Nieto certa vez respondeu a uma pergunta sobre a corrupção dizendo tratar-se de uma "questão
cultural". Mas os tempos mudaram e a cultura precisa mudar com eles. Escândalos de corrupção estão
agora sendo julgados mais rapidamente na América Latina - em grande parte porque os promotores e os
cidadãos estão fortalecidos pelas investigações sobre abusos contra os direitos humanos na região em
passado recente. Os padrões mudaram.
O Brasil, com suas instituições legais relativamente fortes e uma crença firme em liberdade de
expressão, parece entender isso. O México, com instituições mais fracas e uma democracia mais jovem,
não. Seria tolo acreditar que a investigação sobre corrupção na Petrobras vai mudar fundamentalmente
a vida política e empresarial brasileira. (O movimento "Mãos Limpas", na Itália, eliminou seus
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problemas estruturais?) Mas pelo menos a queda de figuras anteriormente intocáveis representa a
possibilidade de um novo rumo. No México, em contraste, nenhum figurão foi para a cadeia - e a
corrupção continua galopante.
Se o México implementasse o império da lei, os fluxos de investimento estrangeiro direto poderiam
crescer para níveis brasileiros - cerca de US$ 13 bilhões extras, ou mais, por ano. Falando cruamente em
termos matemáticos, basta o México fazer as contas. (Tradução de Sergio Blum)
John Paul Rathbone é editor de América Latina do FT
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