XV SEMANA VI CONGRESSO IBÉRICO Transferência de metais tóxicos no sistema solo-planta e sua complexação no Juncus effusus L. Toxic metals transference in the soil-plant system and its complexation on Juncus effusus L. 1 Durães, N. ; Bobos, I. 1,2 ; Ferreira da Silva, E. 3 1 2 GIMEF - Centro de Geologia, Universidade do Porto, Rua do Campo Alegre 687, 4169-007 Porto e-mail: [email protected] Departamento de Geologia, Faculdade de Ciências, Universidade do Porto, Rua do Campo Alegre 687, 4169-007 Porto 3 ELMAS - Departamento de Geociências, Universidade de Aveiro, Campus de Santiago, 3810-193 Aveiro Abstract The bioaccumulation of metals by plants is important in the remediation (fitoremediation) of contaminated sites. However the transport and accumulation mechanisms of metals in plants are even very few studied. The soil mineralogy where the plant growed was studied by X ray diffraction. Clay minerals, hydrate Fe oxides, gypsum, carbonates, quartz and sulphides minerals were identified. The chemical analyse of this soil showed high toxic -1 -1 -1 -1 metals contents: Cu (146-192 mg.Kg ); Pb (139-173 mg.Kg ); Zn (232-1123 mg.Kg ) e Cd (38-74 mg.Kg ). The chemical analyse of Juncus effusus L. roots and stems showed that metals contents were here too high. The -1 -1 -1 -1 -1 roots had metals levels of Cu (110 mg.Kg ), Pb (34 mg.Kg ), Zn (265 mg.Kg ), Cd (2.5 mg.Kg ), Fe (12771 mg.Kg ) e -1 -1 -1 -1 -1 Mn (183 mg.Kg ). In stems this levels were: Cu (24 mg.Kg ), Pb (4 mg.Kg ), Zn (348 mg.Kg ), Cd (12 mg.Kg ), Fe -1 -1 (224 mg.Kg ) e Mn (784 mg.Kg ). This values proves that this plant have a high capacity of metals sorption. The study by FT-IR spectrometry of plant allowed the identification of organic (C-O; C=O) and inorganic (S-O; Si-O) complexes in roots and stems. In the roots still occurs Me-O type complexes, while in the stems occurs Al-OH and Ca2SO4 type complexes. The type of complexes presents indicated the precipitation of a group of inorganic complexes associated with mineral structures (clay minerals, gypsum, etc) with which metals can be complexated in plant. Keywords: FT-IR, metal, bioaccumulation, complexation Resumo A capacidade de bioacumulação de metais pelas plantas é um assunto que tem despertado interesse no que concerne à remediação (fitoremediação) de zonas contaminadas. Contudo, os mecanismos que presidem ao transporte e a acumulação dos metais nas plantas são ainda pouco estudados. Foi realizado o estudo mineralógico, por difractometria de raios X, do solo onde se encontrava a planta, onde foi possível identificar minerais argilosos, óxidos de ferro hidratados, gesso, carbonatos, quartzo e sulfuretos. Na análise -1 -1 química do solo determinaram-se teores elevados em metais tóxicos: Cu (146–192 mg.Kg ); Pb (139–173 mg.Kg ); Zn -1 -1 (232–1123 mg.Kg ) e Cd (38–74 mg.Kg ). A análise química das raízes e dos caules do Juncus effusus L. demonstrou que os teores em metais eram também -1 -1 -1 -1 elevados. As raízes apresentavam teores em Cu (110 mg.Kg ), Pb (34 mg.Kg ), Zn (265 mg.Kg ), Cd (2.5 mg.Kg ), -1 -1 -1 -1 Fe (12771 mg.Kg ) e Mn (183 mg.Kg ). Nos caules os valores registados foram: Cu (24 mg.Kg ), Pb (4 mg.Kg ), Zn -1 -1 -1 -1 (348 mg.Kg ), Cd (12 mg.Kg ), Fe (224 mg.Kg ) e Mn (784 mg.Kg ). Estes teores sugerem que a esta planta apresenta uma grande capacidade de sorção dos metais. O estudo realizado por espectrometria de FT-IR na planta permitiu a identificação de um conjunto de complexos orgânicos (C-O; C=O) e inorgânicos (S-O; Si-O) nas raízes e nos caules. Nas raízes ocorrem ainda complexos do tipo 2Me-O, enquanto que nos caules surgem complexos do tipo Al-OH e Ca-SO4 . Este tipo de complexos são indicativos da precipitação de um conjunto de complexos inorgânicos associados a estruturas minerais (minerais argilosos, sulfatos, etc) com os quais os metais se poderão complexar na planta. Palavras-chave: FT-IR, metal, bioacumulação, complexação 9. Biogeoquímica/ Biogeochemistry || 422 XV Semana – VI Congresso Ibérico de Geoquímica Introdução Os mecanismos de interacção solo-planta são ainda pouco estudados. Contudo, a capacidade de algumas plantas para absorverem, acumularem ou mesmo decomporem contaminantes que se encontram nos solos, tem despertado atenções, no sentido da sua utilização na remediação de zonas contaminadas. Vários factores são determinantes até que o metal se encontre em condições de poder ser assimilado pelas raízes da planta. Estes factores podem estar relacionadas: 1) com o solo (pH, potencial redox, volume de matéria orgânica, tipo de minerais argilosos e óxidos de Fe e Mn e a interacção entre diferentes iões); 2) com a planta (espécie e idade da planta); 3) com a própria interacção planta-metal (Adriano, 2001). A segregação de exsudações pelas raízes ou pelas micorrizas, para a rizosfera, tem um contributo importante no sentido de facilitar a tolerância e o transporte dos metais nas plantas, através da variação do pH ou das condições redox. Em geral, no caso de catiões, a acidificação tende a provocar uma maior solubilidade destes (Pilon-Smits, 2005; Robinson et al., 2006), enquanto que para aniões, a solubilidade aumenta como o aumento do pH (Robinson et al., 2006). Vários autores têm-se dedicado ao estudo da tolerância de espécies de plantas a metais pesados. Deng et al. (2004) estudaram a acumulação de Pb, Zn, Cu e Cd em 12 espécies de plantas. Em Portugal, Freitas et al. (2004) estudaram a capacidade de tolerância de elementos traço em plantas e em solos contaminados da mina de S. Domingos. Por outro lado, Batista et al. (2007) estudaram os mecanismos biogeoquímicos e a transferência de metais para a planta Cistus Ladanifer L. na região mineira de Neves Corvo. No presente trabalho pretende-se fornecer dados químico-mineralógicos relativamente à rizosfera e os tipos de complexos que ocorrem nos Juncus effusus L.. Materiais e Métodos Amostras de solos e plantas foram recolhidas nas zonas contaminadas com metais tóxicos, aferentes à zona de oxidação da mina do Lousal (Faixa Piritosa Ibérica). Os solos da região correspondem, predominantemente, a litossolos (solos esqueléticos), resultantes da alteração de xistos e grauvaques. Os valores de pH e condutividade eléctrica determinaram-se numa suspensão de 1/5 (p/p) de solo/água. A análise mineralógica dos solos efectuou-se por difractrometria de raios X das fracções inferiores a 2mm, com recurso a um aparelho da marca Philips X’Pert MPD, radiação de CuKα. A análise química dos solos realizouse por espectrometria de fluorescência de raios X. Das amostras de plantas procedeu-se à separação das raízes e das partes aéreas. Após lavagem em água destilada, as plantas foram colocadas a secar numa estufa ventilada numa temperatura nunca superior a 45 ºC, durante um período mínimo de 48 horas. Posteriormente, as raízes foram moídas a uma granulometria inferior a 150μm. Deste material, uma parte foi separada para análise química e uma outra parte para Espectrometria de Infravermelho (FTIR). A análise química foi realizada por espectrometria de absorção atómica. Previamente foi feita uma decomposição da amostra seca numa mistura ácida (HCl – HNO3 – HF – HClO4), aquecida numa placa de aquecimento até à total evaporação. Ao resíduo final foi adicionada uma quantidade de HNO3 e H2O. A análise por espectrometria de Infravermelho (FT-IR) foi efectuada com recurso a um espectrómetro de Infravermelho com Transformada Fourier, da marca Bruker Tensor27, numa frequência de 4000-400 cm -1. Resultados Mineralogia do solo As fracções silto-argilosas dos solos contêm minerais argilosos, óxidos de ferro hidratados, gesso, carbonatos, quartzo e sulfuretos. Na amostra superficial do solo (S1) predominam o gesso, as micas, o quartzo e os FeO(OH), enquanto na amostra inferior de solo (S2) identificaram-se clorites, micas, quartzo, sulfuretos e FeO(OH). Esta análise sugere que os sulfuretos, devido à sua elevada densidade, encontram-se preferencialmente sedimentados em profundidade no perfil do solo, enquanto que à superfície ocorrem os minerais resultantes dos processos de oxidação, ou minerais com densidade mais baixa. Geoquímica de solos e plantas Das várias amostras de plantas recolhidas, fez-se uma selecção de uma amostra (Juncus effusus L.) com base nos teores elevados de metais que apresentava. A análise dos resultados dos teores em Cu, Pb, Zn, Fe, Mn e Cd nas amostras de solo e na planta (Tabela1) permite-nos constatar que a acumulação dos metais é bastante elevada. Para o caso dos solos a acumulação é maior na camada inferior do solo que na camada superfícial. Contudo, o aspecto mais relevante a salientar, está relacionado com a acumulação de metais na planta que é muito superior à acumulação no solo onde se encontrava. Quando se comparam os valores dos metais presentes nas raízes e nos caules, verifica-se, que contrariamente ao que seria de esperar, para o caso do Zn, Cd e Mn existe uma maior acumulação no caule do que nas raízes. 9. Biogeoquímica/ Biogeochemistry || 423 XV Semana – VI Congresso Ibérico de Geoquímica 2.5 Caule Transmitância% 2 1.5 Ca-SO42Al-OH 1 Raíz 0.5 Me-O 0 3900 3400 2900 2400 1900 1400 900 Me-O400 -1 Frequência cm Fig. 1 – Espectros de FT-IR das amostras de raízes e caules da planta Juncus effusus L. Os valores de Zn no solo são elevados, nomeadamente, na amostra S2, enquanto que os valores de Cu e Pb são, de um modo geral, mais baixos. No caso do Zn as massas do minério apresentavam teores de 1,4%, maiores que o Cu e Pb, com teores de 0,7% e 0,8%, respectivamente (Matzke, 1971). A bioacumulação do Zn, Cd e do Mn é maior nos caules que nas raízes, o que indica que estes elementos são facilmente translocados na planta. Em contraste, a bioacumulação do Cu, Pb e Fe ocorre preferencialmente nas raízes. Espectroscopia de infravermelho -1 Tabela 1 – Teores de metais (mg.Kg ) das amostras de raízes e caules do Juncus effusus L. (valores referentes a Kg de amostra seca) e do respectivo solo. Amostra S1 S2 Raíz Caule Cu 146 192 110 24 Pb 139 173 34 4 Zn 232 1123 265 348 Cd 38 74 2.5 12 Fe ND ND 12771 224 Mn ND ND 183 784 ND – Não determinado Tabela 2 – Medidas de pH e condutividade do solo Amostra pH Solo 4.70 Condutividade (μS.cm -1) 3800 Os resultados químicos sugerem que o Juncus effusus L. apresenta um potencial de bioacumulação elevado para o Zn, Fe e o Mn. Caso semelhante ocorre para o Cd, que embora apresente teores significativamente mais baixos, do que os elementos considerados anteriormente, estes valores são muito elevados, atendendo a que os teores médios em -1 solos são de 0.01–1mg.Kg . Contudo, embora os níveis de toxicidade deste elemento para as plantas tenda a ser baixo, estas, em regra, têm uma grande permissividade ao Cd (Varennes, 2003). As amostras de raízes e de caules foram estudadas por espectrometria de infravermelho. Os resultados obtidos confirmam a presença de complexos orgânicos (C-O; C=O) e complexos inorgânicos (S-O; Si-O) presentes nas raízes e nos caules (Fig.1). Nas raízes ocorrem ligações do tipo Me-O (bandas de absorção 532 – 435 -1 cm ). Nos caules ocorrem ligações do tipo Al-1 OH (banda de absorção 918 cm ) e ligações do 2 tipo Ca-SO4 (bandas de absorção 669 cm-1, 602 -1 cm ). Discussão e Conclusão Quando os níveis de toxicidade são elevados, as plantas podem adoptar estratégias de precipitação dos metais na rizosfera, tornando-os, deste modo, menos biodisponiveis (Pilon-Smits, 2005). O Juncus effusus L. apresenta tolerância a ambientes contaminados com metais pesados. Os resultados obtidos da análise química do solo e da planta permitem afirmar que o Juncus effusus L. tem a capacidade de extrair os metais do solo, de os bioacumular e, para o caso de alguns desses metais, de os translocar eficientemente para as partes aéreas da planta. A análise dos espectros de infravermelho permitiu detectar a presença de compostos orgânicos que poderão participar na quelatação dos metais. 9. Biogeoquímica/ Biogeochemistry || 424 XV Semana – VI Congresso Ibérico de Geoquímica A quelatação dos elementos contaminantes a compostos de carbono segregados pelas plantas, é importante na sequestração e transporte dos metais da rizosfera para a planta, na translocação destes das raízes para as partes aéreas, assim como, na tolerância a esses mesmos contaminantes (Pilon-Smits, 2005). A presença de compostos de S-O, Si-O, Al2 OH e Ca-SO4 , indicam a precipitação de um conjunto de complexos inorgânicos associados, supostamente, a um conjunto de estruturas minerais (minerais argilosos, sulfatos, etc), com os quais os metais se poderão complexar na própria planta. As bandas Me-O comprovam também a presença de Fe na planta, tal como demonstrado pelas análises químicas. Contudo, estes estudos carecem de mais dados para uma melhor compreensão dos mecanismos de complexação e precipitação dos metais nas plantas. Varennes, A., 2003. Produtividade dos solos e ambiente. Escolar Editora, Lisboa, 409pp. Agradecimentos O primeiro autor agradece à Fundação para a Ciência e a Tecnologia o apoio concedido no âmbito da bolsa de doutoramento (SFRH/BD/22413/2005). Referências Adriano, D.C., 2001. Trace Elements in Terrestrial Environments: Biogeochemistry, Bioavailability and Risks of Metals. 2nd ed.. Springer-Verlag, New York, 866pp. Batista, M.J., Abreu, M.M, Serrano Pinto, M., 2007. Biogeochemistry in Neves Corvo mining region, Iberian Pyrite Belt, Portugal. Journal of Geochemical Exploration 92, 159176. Deng, H., Ye, Z.H., Wong, M.H., 2004. Accumulation of lead, zinc, copper and cadmium by 12 wetland plant species thriving in metal-contaminated sites in China. Environmental Pollution 132, 29-40. Freitas, H., Prasad, M.N.V., Pratas, J., 2004. Plant community tolerant to trace elements growing on the degraded soils of São Domingos mine in the south east of Portugal: environmental implications. Environmental Pollution 30, 65-72. Matzke, K., 1971. Mina do Lousal. Principais jazigos minerais do sul de Portugal. LivroGuia nº4, I Congresso Hispano-LusoAmericano de Geologia Económica, Lisboa, pp.25-32. Pilon-Smits, E., 2005. Phytoremediation. Annu. Rev. Plant Biol 56, 15-39. Robinson, B., Bolan, N., Mahimairaja, S., Clothier, B., 2006. Solubility, Mobility, and Bioaccumulation of Trace Elements: Abiotic Processes in the Rizosphere. In: Prasad, M.N.V., Sajwan, K.S., Naidu, R. (Ed.), Trace Elements in the Environment: Biogeochemistry, Biotechnology, and Bioremediation, CRC Press Taylor and Francis, New York, pp. 97-110. 9. Biogeoquímica/ Biogeochemistry || 425