Enviado por jjragronomia

Macroeconomia Uniasselvi

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Macroeconomia I
Profª. Margarida Berns Schafaschek
2018
Copyright © UNIASSELVI 2018
Elaboração:
Profª. Margarida Berns Schafaschek
Revisão, Diagramação e Produção:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI
Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri
UNIASSELVI – Indaial.
SCH296m
Schafaschek, Margarida Berns
Macroeconomia I. / Margarida Berns Schafaschek – Indaial:
UNIASSELVI, 2018.
246 p.; il.
ISBN 978-85-515-0209-9
1.Macroeconomia – Brasil. II. Centro Universitário Leonardo Da Vinci.
CDD 339
Impresso por:
Apresentação
Caro acadêmico! Neste livro você estudará a disciplina de
Macroeconomia I. A Ciência Econômica é tanto complexa quanto
fascinante. Complexa porque muitas variáveis precisam ser analisadas para
compreender seus fundamentos, teorias, importância e aplicabilidade, por se
tratar de uma Ciência Social e, como tal, depende da interação existente entre
os agentes econômicos. Em muitas situações é preciso abstrair da realidade e
utilizar-se de modelos de análise para então compreender o contexto em que
se insere, escolhendo a melhor política econômica a ser adotada para cada
situação específica. E é fascinante porque nos leva a conhecer o mundo de
outra maneira, diferente daquele que conhecemos no Ensino Fundamental
ou no Ensino Médio, cheio de nuances, reviravoltas, disputas, conflitos,
mas também repleto de sonhos e utopias. Corretamente interpretada e
aplicada, esta ciência pode trazer justiça social, prosperidade, solidariedade,
desenvolvimento sustentável e uma vida digna para todos.
Na Unidade 1 você conhecerá conceitos introdutórios da
macroeconomia, tais como seu objeto, evolução e importância, os métodos e
a estrutura da análise macroeconômica, aspectos relacionados à Constituição
Econômica (que legitima a intervenção do Estado na economia) e os principais
objetivos de política macroeconômica.
A Unidade 2 abrangerá os instrumentos de política macroeconômica,
as políticas monetária, fiscal, cambial-comercial e de rendas, versará sobre
o fluxo circular da atividade econômica, bem como sobre a mensuração
dos principais agregados macroeconômicos e abordará, ainda, a teoria da
determinação da renda sob os aspectos real e monetário, nas visões clássica
e keynesiana.
A Unidade 3 tratará do modelo IS-LM e dos dilemas das políticas
macroeconômicas, em que abordaremos a inter-relação entre as políticas
macroeconômicas e os conflitos delas decorrentes.
Bons estudos!
Profª. Margarida Berns Schafaschek
III
NOTA
Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para
você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há
novidades em nosso material.
Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é
o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um
formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.
O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova
diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também
contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.
Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente,
apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade
de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador.
Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para
apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto
em questão.
Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas
institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa
continuar seus estudos com um material de qualidade.
Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de
Desempenho de Estudantes – ENADE.
Bons estudos!
IV
V
VI
Sumário
UNIDADE 1 – INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA................................................................. 1
TÓPICO 1 – A MACROECONOMIA................................................................................................... 3
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 3
2 DEFINIÇÃO E CAMPO DE ESTUDO.............................................................................................. 6
3 A EVOLUÇÃO DA TEORIA MACROECONÔMICA .................................................................. 7
RESUMO DO TÓPICO 1........................................................................................................................ 14
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 15
TÓPICO 2 – METODOLOGIA DA ANÁLISE MACROECONÔMICA........................................ 17
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 17
2 DADOS ECONÔMICOS..................................................................................................................... 17
3 TEORIAS ECONÔMICAS................................................................................................................... 20
4 POLÍTICA MACROECONÔMICA................................................................................................... 20
RESUMO DO TÓPICO 2........................................................................................................................ 22
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 23
TÓPICO 3 - ESTRUTURA DA ANÁLISE MACROECONÔMICA................................................ 25
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 25
2 O MERCADO DE BENS E SERVIÇOS............................................................................................. 27
3 O MERCADO DE TRABALHO.......................................................................................................... 30
4 O MERCADO FINANCEIRO.............................................................................................................. 32
5 O MERCADO DE DIVISAS................................................................................................................ 39
RESUMO DO TÓPICO 3........................................................................................................................ 41
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 42
TÓPICO 4 – POLÍTICA MACROECONÔMICA: LEGISLAÇÃO E FINALIDADES................. 43
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 43
2 A CONSTITUIÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL .......................................................................... 43
3 OBJETIVOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA..................................................................... 46
3.1 ALTO NÍVEL DE EMPREGO.......................................................................................................... 46
3.2 ESTABILIDADE DE PREÇOS......................................................................................................... 49
3.3 CRESCIMENTO ECONÔMICO..................................................................................................... 55
3.4 DISTRIBUIÇÃO EQUITATIVA DA RENDA................................................................................ 56
3.5 EQUILÍBRIO NAS CONTAS EXTERNAS.................................................................................... 59
LEITURA COMPLEMENTAR................................................................................................................ 63
RESUMO DO TÓPICO 4........................................................................................................................ 66
AUTOATIVIDADE.................................................................................................................................. 67
UNIDADE 2 – O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA
DETERMINAÇÃO DA RENDA................................................................................. 69
TÓPICO 1 – O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA.......................................... 71
1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................................... 71
VII
2 O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA: PRODUTO E RENDA................. 72
2.1 O FLUXO BÁSICO DA ECONOMIA......................................................................................... 73
2.2 O FLUXO BÁSICO DA ECONOMIA COM GOVERNO E SETOR EXTERNO................... 75
2.2.1 Modelo de Economia Simples............................................................................................. 86
2.2.2 Modelo de Economia Fechada (com governo e sem setor externo).............................. 88
2.2.3 Modelo de Economia Aberta (com governo e com setor externo)................................ 89
3 AGREGADOS ECONÔMICOS....................................................................................................... 90
3.1 O PRODUTO NACIONAL E A DESPESA NACIONAL......................................................... 90
3.2 A RENDA NACIONAL................................................................................................................ 95
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 96
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 98
TÓPICO 2 – A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O MODELO CLÁSSICO.... 99
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 99
2 O MODELO CLÁSSICO................................................................................................................... 100
2.1 OFERTA AGREGADA ................................................................................................................. 101
2.2 FUNÇÃO DE PRODUÇÃO AGREGADA................................................................................. 102
2.3 DEMANDA, OFERTA E EQUILÍBRIO NO MERCADO DE TRABALHO........................... 105
2.4 OFERTA E DEMANDA AGREGADA E O PAPEL DA MOEDA........................................... 108
2.5 O PAPEL DA MOEDA NO MODELO CLÁSSICO.................................................................. 111
2.6 POUPANÇA, INVESTIMENTO E O PAPEL DA TAXA DE JUROS...................................... 112
2.7 EQUILÍBRIO ENTRE OFERTA E DEMANDA......................................................................... 114
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 115
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 116
TÓPICO 3 – A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA
RENDA – O LADO REAL............................................................................................. 117
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 117
2 HIPÓTESES DO MODELO BÁSICO............................................................................................. 119
3 CONDIÇÃO DE EQUILÍBRIO MACROECONÔMICO............................................................ 123
4 CONSUMO, POUPANÇA E INVESTIMENTO AGREGADO.................................................. 124
4.1 CONSUMO AGREGADO............................................................................................................ 125
4.2 POUPANÇA AGREGADA........................................................................................................... 127
4.3 INVESTIMENTO AGREGADO................................................................................................... 129
5 O MULTIPLICADOR DO INVESTIMENTO DE KEYNES....................................................... 132
5.1 CÁLCULO DO MULTIPLICADOR KEYNESIANO (k)........................................................... 135
5.2 CÁLCULO DA VARIAÇÃO DA RENDA NACIONAL.......................................................... 136
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 138
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 140
TÓPICO 4 – A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA
RENDA – O LADO MONETÁRIO............................................................................. 141
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 141
2 SOBRE A MOEDA.............................................................................................................................. 142
2.1 ORIGEM E EVOLUÇÃO.............................................................................................................. 142
2.2 FUNÇÕES, CARACTERÍSTICAS E FORMAS DA MOEDA................................................... 146
3 OFERTA E DEMANDA DA MOEDA............................................................................................ 146
3.1 A OFERTA MONETÁRIA............................................................................................................ 147
3.1.1 A Criação da Moeda............................................................................................................. 148
3.2 A DEMANDA DE MOEDA......................................................................................................... 149
3.3 EQUILÍBRIO NO MERCADO MONETÁRIO........................................................................... 152
3.4 OFERTA MONETÁRIA E ATIVIDADE ECONÔMICA NA VERSÃO KEYNESIANA...... 154
VIII
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 156
RESUMO DO TÓPICO 4..................................................................................................................... 159
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 161
UNIDADE 3 – A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E
SEUS DILEMAS.......................................................................................................... 163
TÓPICO 1 – INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA.................................. 165
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 165
2 POLÍTICA MONETÁRIA................................................................................................................. 167
2.1 CONTROLE DIRETO DA QUANTIDADE DE DINHEIRO EM CIRCULAÇÃO............... 169
2.2 OPERAÇÕES NO MERCADO ABERTO................................................................................... 169
2.3 FIXAÇÃO DA TAXA DE RESERVA........................................................................................... 170
2.4 FIXAÇÃO DA TAXA DE REDESCONTO................................................................................. 171
2.5 CONTROLES SELETIVOS DE CRÉDITO.................................................................................. 172
3 POLÍTICA FISCAL............................................................................................................................. 173
3.1 FUNÇÕES DO GOVERNO.......................................................................................................... 176
3.2 POLÍTICA TRIBUTÁRIA E DE GASTOS................................................................................... 180
4 POLÍTICAS COMERCIAL E CAMBIAL....................................................................................... 190
5 POLÍTICA DE RENDAS................................................................................................................... 195
LEITURA COMPLEMENTAR............................................................................................................. 200
RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 204
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 206
TÓPICO 2 – A CURVA IS-LM E AS POLÍTICAS MONETÁRIA E FISCAL............................. 209
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 209
2 A CURVA IS E A CONDIÇÃO DE EQUILÍBRIO........................................................................ 210
2.1 FATORES QUE AFETAM A INCLINAÇÃO E DESLOCAMENTO DA CURVA IS............ 212
3 A CURVA LM E A CONDIÇÃO DE EQUILÍBRIO...................................................................... 213
3.1 FATORES QUE AFETAM A INCLINAÇÃO E O DESLOCAMENTO DA CURVA LM..... 215
4 A CURVA IS-LM: INTERLIGANDO O LADO REAL E MONETÁRIO.................................. 216
5 CURVA IS-LM E EFICÁCIA DA POLÍTICA MONETÁRIA..................................................... 221
6 CURVA IS-LM E EFICÁCIA DA POLÍTICA FISCAL................................................................. 222
RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 225
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 227
TÓPICO 3 – O MODELO IS-LM E DILEMAS DE POLÍTICAS MACROECONÔMICAS.... 229
1 INTRODUÇÃO................................................................................................................................... 229
2 O SUCESSO DO MODELO IS-LM E AS ADEQUAÇÕES AO MODELO.............................. 229
3 A POLÍTICA MACROECONÔMICA RECENTE NO BRASIL................................................. 233
RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 236
AUTOATIVIDADE............................................................................................................................... 238
REFERÊNCIAS....................................................................................................................................... 239
IX
X
UNIDADE 1
INTRODUÇÃO À
MACROECONOMIA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir desta unidade, você será capaz de:
• compreender os fundamentos da análise macroeconômica, sua estrutura
de análise, evolução e objetivos;
• conhecer os principais agregados macroeconômicos e sua mensuração;
• diferenciar os modelos clássico e keynesiano de determinação da renda;
• conhecer os instrumentos de política macroeconômica e analisar seus dilemas, conflitos e eficácia.
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer da unidade você
encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.
TÓPICO 1 – A MACROECONOMIA
TÓPICO 2 – METODOLOGIA DA ANÁLISE MACROECONÔMICA
TÓPICO 3 – ESTRUTURA DA ANÁLISE MACROECONÔMICA
TÓPICO 4 – POLÍTICA MACROECONÔMICA: LEGISLAÇÃO E
FINALIDADES
1
2
TÓPICO 1
UNIDADE 1
A MACROECONOMIA
1 INTRODUÇÃO
Uma economia só presta, só faz sentido, só vale, se ela existir para
alimentar, educar e empregar as pessoas. Todas as empresas públicas
ou privadas, grandes ou pequenas, nacionais ou multinacionais, só
prestam, só valem a pena, se elas contribuírem para construir um
país onde todos possam ter o atendimento de suas necessidades
fundamentais (Herbert de Souza – Betinho apud MELLO, 2017, s.p.).
Iniciamos este livro de estudos compartilhando com você esta frase
do sociólogo e ativista de direitos humanos brasileiro, Herbert José de Souza,
conhecido como Betinho, que ficou imortalizada após seu falecimento em 9 de
agosto de 1997. Betinho desenvolveu, ao longo de sua caminhada, o combate à
fome e à miséria, ações pela cidadania e pela vida.
Compartilhamos do mesmo pensamento, por entender que se a sociedade
como um todo não puder ser beneficiada com o resultado da atividade humana
de produção da riqueza material, atividade esta que, no nosso entender, só é
sustentável se puder garantir às nossas gerações, e às gerações futuras, o pleno
convívio com os demais seres vivos, não haverá justiça social, paz, cidadania, e
nem sequer vida neste planeta.
Acreditamos que você também pensa da mesma forma! Vamos, então,
avançar em nossos estudos sobre este fascinante e multifacetado mundo da oikonomos.
Agora que você está iniciando uma nova disciplina, é preciso estar atento
ao objeto da economia. Esta é, de acordo com a maioria dos economistas, a ciência
social que estuda como as pessoas e a sociedade decidem empregar recursos
escassos, que poderiam ter utilização alternativa na produção de bens e serviços,
de modo a distribuí-los entre as várias pessoas e grupos da sociedade, a fim de
satisfazer às necessidades (e também desejos) humanas (NOGAMI; PASSOS, 2003).
3
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
Quando afirmamos serem também desejos humanos, é porque partimos
do pressuposto de que o modo de produção capitalista, movido pela acumulação
de capital visando ao lucro, precisa constantemente manter e criar novos produtos
que tenham valor de troca (invenções que se tornam produtos comercializáveis),
ou seja, que passem a ser desejados pelos consumidores, somando-se ao já
incontável número de necessidades “criadas” pelo sistema.
Outra distinção se faz necessária: quando afirmamos ser a economia uma
ciência social (embora muitos a confundam com uma ciência exata como a Física,
Química, Matemática), o que isso significa? Significa que:
O ser humano, como consumidor ou produtor (ou, em outras palavras,
como agente econômico), não age sempre da mesma maneira diante
das situações e dilemas que a luta pela sobrevivência lhe impõe.
Apesar disso, é possível traçar um perfil típico dos seres humanos em
seu comportamento econômico (PIRES; GUEDES, 2012, p. 5-6).
Assim como a sociologia, que também estuda o homem em sociedade,
analisando como se dá o comportamento humano e suas várias formas de
organização, a economia tem o ser humano em sociedade como “um ser que
pensa e cria, não sendo, portanto, passível de observação laboratorial como as
reações químicas ou os fenômenos físicos” (PIRES; GUEDES, 2012, p. 6).
Embora sejam ambas ciências sociais, ao contrário da sociologia, o que
pretende a economia é pesquisar como se estabelece as relações econômicas entre
os seres humanos, estes divididos em classes sociais que, no modo de produção
capitalista, de acordo com Marx (1988), dividem-se entre capital e trabalho, na
produção da vida material (sobrevivência), por meio da oferta e demanda de bens
e serviços, estes mensuráveis e monetariamente precificados.
Entender a diferenciação entre ciência exata e social é fundamental. De
acordo com Pires e Guedes (2012), a ciência econômica é a ciência não exata com
maiores possibilidades de utilização de técnicas quantitativas para explicar os
fenômenos a ela atinentes.
Uma ciência exata não sofre variações ou falhas. Lembre-se, por exemplo,
da Lei da Gravidade, que afirma: “todo objeto lançado para cima retorna ao solo”,
enquanto que, para as sociais (como no caso da Lei Econômica da oferta e da
demanda), podem – e de fato ocorrem –acontecer falhas em muitas circunstâncias,
devido à subjetividade do ser humano, que pode agir de maneiras diferentes
quando da ocorrência de um mesmo fenômeno (PIRES; GUEDES, 2012). Por isso,
nem sempre o que seria o ideal em termos econômicos é de fato verificado no
mundo real.
Voltando ao objeto da economia, podemos refletir: Como é possível
colocá-lo em prática diante de um país de dimensões continentais como o Brasil?
4
TÓPICO 1 | A MACROECONOMIA
E
IMPORTANT
Por que dimensões continentais? Somos o quinto país em extensão territorial
(8.515.767 km²), sendo suplantados apenas pela Rússia, Canadá, China e Estados Unidos.
Quando diminuímos nosso campo de análise ao nos deparar com
as administrações públicas estaduais ou municipais, vemos que os desafios
econômicos nelas encontrados já são imensos, tais como desemprego, pobreza,
degradação ambiental, escassez de água, má utilização dos recursos, que refletem
na impossibilidade de realizar investimentos públicos essenciais à comunidade,
dentre outros. Além disso, frequentemente soma-se a essa realidade o avanço da
corrupção, que faz com que os já poucos recursos disponíveis para investimento
em áreas tão necessitadas como saúde, educação, segurança pública, moradia,
passem para a mão de corruptos e corruptores. Soma-se a este quadro a desigual
distribuição dos recursos públicos (na forma de tributos) arrecadados nas esferas
municipal, estadual e federal.
E
IMPORTANT
Você sabia que, de todos os tributos arrecadados no Brasil, cerca de 70% são
destinados ao Governo Federal, em torno de 25% vão para os estados e, o restante, apenas
5%, retornam aos municípios?
Para que seja possível compreender a ciência econômica de forma abrangente,
além da microeconomia, que você já deve ter estudado, vamos agora introduzir
nossos estudos sobre a macroeconomia, um ramo da economia que costuma ser
tão controverso e polêmico (muita divergência entre teorias) quanto instável (nem
sempre a mesma “medida” adotada para resolver o problema surte o mesmo efeito),
mas igualmente envolvente aos apaixonados por esta tão nobre ciência.
Embora sejam áreas da economia, muitas vezes complementares,
macro e microeconomia, de acordo com diversos autores, atuam em ambientes
diferentes. Vejamos:
O reconhecimento de que a microeconomia e a macroeconomia são
constituídas por metodologias e campos teóricos separados, mas com
importantes inter-relações, foi apontado por autores como Bresser
Pereira e Lima (1996), para quem a macroeconomia não pode ser
reduzida à microeconomia (LIMA; AMADO; MOLLO, 2016, p. 606).
5
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
Isso se deve ao fato do ambiente macroeconômico ser maior do que a
soma de suas partes constituintes, que são atinentes à microeconomia. Desta
forma, neste tópico serão abordados conceitos introdutórios da macroeconomia,
sua evolução e campo de estudo.
2 DEFINIÇÃO E CAMPO DE ESTUDO
De acordo com Vasconcellos e Garcia (2005, p. 86, grifo do original), “a
macroeconomia estuda a economia como um todo, analisando a determinação e
o comportamento de grandes agregados, tais como: renda e produto nacionais,
nível geral de preços, emprego e desemprego, estoque de moeda e taxas de juros,
balanço de pagamentos e taxa de câmbio”.
Desta forma, enquanto a microeconomia se preocupa com o nível de
preços de uma unidade produtiva, por exemplo, a macroeconomia trata do nível
geral de preços de toda uma sociedade, ou seja, de um país como o Brasil.
Na etimologia (que estuda a origem e a evolução das palavras), a
macroeconomia provém do elemento grego macro, ou seja, em grande escala,
extenso + economia (SIGNIFICADOS, 2018).
Rüdiger Doirnbush e Stanley Fischer (1982 apud NOGAMI; PASSOS,
2003, p. 362) afirmam que:
A macroeconomia trata do comportamento da economia como um
todo – com períodos de rápida prosperidade e recessão, a produção
total de bens e serviços da economia e o crescimento do produto, as
taxas de inflação e emprego, a balança de pagamentos e o câmbio. A
fim de estudar o desempenho geral da economia, a macroeconomia
focaliza as políticas econômicas e as variáveis de política que afetam
aquele desempenho – as políticas monetária e fiscal, o estoque de
moeda e taxa de juros, a dívida pública e o orçamento do Governo
Federal. Em resumo, a macroeconomia trata das questões econômicas
mais importantes da atualidade. A macroeconomia é interessante
porque trata de tópicos relevantes, mas também é fascinante e ao
mesmo tempo um desafio, porque traduz os detalhes complicados da
economia e sua essência manipulável.
Com certeza, após ler esses conceitos, você deve estar pensando na
situação econômica do Brasil, que vem passando, desde o início da segunda
década deste milênio, por um processo de recessão, desemprego, endividamento
público, queda da massa salarial, aumento da pobreza, da marginalização e da
exclusão social.
6
TÓPICO 1 | A MACROECONOMIA
DICAS
O abismo entre os maiores bilionários do planeta e a fatia mais pobre da
população continua aumentando, segundo o relatório da ONG Oxfam Brasil, que tem
o propósito de combater a desigualdade e a pobreza. Veja mais em: <https://economia.
uol.com.br/noticias/redacao/2018/01/22/estudo-desigualdade-oxfam-bilionarios.
htm?cmpid=copiaecola>.
Acadêmico, você consegue perceber como estas variáveis estão interligadas
e a importância de dimensionar estes indicadores para saber onde estamos e
quais as possibilidades de superação desta ou de outras tantas crises que haverão
de vir? Acreditamos que sim! Pois então, é aí que a macroeconomia se destaca.
É por isso que conhecer os seus princípios norteadores, sua importância e a sua
evolução na história econômica se reveste da mais alta importância, o que faremos
nas seções seguintes.
3 A EVOLUÇÃO DA TEORIA MACROECONÔMICA
O termo macroeconomia nem é tão antigo assim. Surgiu em 1933, na obra
do economista norueguês Ragnarf Frisch (NOGAMI; PASSOS, 2003).
Você saberia dizer quem colocou a macroeconomia no centro do debate?
Se nos reportarmos à Grande Depressão de 1930, provavelmente você lembrará
de um dos maiores economistas do século XX, John Maynard Keynes, que
publicou o famoso livro A teoria geral do emprego, do juro e da moeda, no ano de
1936, que reformulou as noções de produção e emprego e foi responsável pelas
políticas econômicas implantadas principalmente por Franklin Roosevelt nos
Estados Unidos e, posteriormente, seguido por demais países, que possibilitaram
a retomada do crescimento e a superação desta que foi a maior crise do século XX
(NOGAMI; PASSOS, 2003).
NOTA
Para ter uma ideia da dimensão da Grande Depressão de 1930, veja alguns
números assustadores: “entre os anos de 1929 e 1932, a produção industrial contraiu-se,
caindo cerca de 50% nos Estados Unidos, quase 10% na Inglaterra, aproximadamente 30%
na França e cerca de 40% na Alemanha” (NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 363).
7
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
Ainda de acordo com Nogami e Passos (2003, p. 3), “a situação das principais
economias capitalistas existentes na época era crítica. As nações industrializadas
assistiram a uma deflação nunca vista antes, com preços despencando mais de
30% na Alemanha e nos Estados Unidos, mais de 40% na França e quase 25% no
Reino Unido”.
Assim, queda na produção industrial, desemprego aumentando em
níveis nunca vistos, fechamento de milhares de fábricas, desespero e suicídios
de centenas de empresários, fome e miséria foram verificados especialmente nos
Estados Unidos, bem como ao redor do mundo nesse período, inclusive no Brasil,
que nessa época tinha sua economia basicamente dependente das exportações de
produtos primários, as chamadas commodities, e vivia o ciclo do café.
NOTA
Commodities (mercadoria, em inglês) podem ser definidas como mercadorias,
principalmente minérios e gêneros agrícolas, que são produzidas em larga escala e
comercializadas em nível mundial. As commodities são negociadas em bolsas de mercadorias,
portanto seus preços são definidos em nível global, pelo mercado internacional. As commodities
são produzidas por diferentes produtores e possuem características uniformes. Geralmente
são produtos que podem ser estocados por um determinado período de tempo sem que
haja perda de qualidade. As commodities também se caracterizam por não ter passado por
processo industrial, ou seja, são geralmente matérias-primas (SUA PESQUISA, 2018).
Para forçar a retomada dos preços do café, que caíam vertiginosamente
devido à diminuição da demanda, num primeiro momento, o governo brasileiro
estocou milhares de toneladas do grão e, como não obteve resultado, obrigou-se
a ordenar aos produtores que queimassem grande parte da safra, levando o país
a sofrer os efeitos deletérios da depressão iniciada na América do Norte e Europa.
Entretanto, como diz o ditado, que de toda crise surge algo novo, ou
uma oportunidade, foi a partir da Grande Depressão que o governo brasileiro,
então comandado por Getúlio Vargas, decidiu mudar a sua matriz econômica,
implantando no país o Processo de Substituição de Importações (PSI), que deu
origem à industrialização do Brasil e que foi desenvolvido também nos governos
seguintes. Esse processo caracterizava-se pela determinação de produzir
internamente tudo o que antes era importado, começando pelos bens de consumo
leve, implantando posteriormente a indústria de bens de consumo duráveis, bens
intermediários e, finalmente, bens de capital.
8
TÓPICO 1 | A MACROECONOMIA
E
IMPORTANT
Você sabia que gigantes brasileiras como a Petrobras, a Vale do Rio Doce e a
Companhia Siderúrgica Nacional foram estatais brasileiras criadas por Getúlio Vargas para
dar sustentação à industrialização a partir de 1930?
Quais foram, então, as principais medidas adotadas pela chamada
“Revolução Keynesiana”?
Imagine uma situação de crise extrema, pela qual passava o mundo na
década de 1930. Como reverter esta que foi a maior crise do século, marcada pela
recessão, desemprego, falência de empresas, queda da demanda e do consumo,
empobrecimento e miséria?
Keynes propôs uma série de medidas chamadas macroeconômicas, que
se opunham ao pensamento econômico hegemônico até 1930 dos economistas
clássicos. Estes acreditavam que os problemas econômicos eram conjunturais,
ou seja, momentâneos, que seriam logo superados pelas regras do mercado. Até
a Primeira Guerra Mundial, em que a economia mundial crescia ano após ano,
havia pleno emprego e avanço da demanda, a teoria clássica conseguia explicar
as crises como sendo flutuações de mercado, que logo seriam superadas, já que,
conforme acreditavam, o mercado se autorregulava.
Isso significa que, sem a necessidade de interferência
governamental, as economias de mercado conseguiam utilizar
eficientemente os recursos disponíveis, de forma a promover
automaticamente o nível de pleno emprego. Esses economistas
sustentavam suas ideias baseados na hipótese de que havia
plena flexibilidade de preços e salários, de tal forma que os
preços e salários sempre se ajustariam no mercado, garantindo
o equilíbrio no mercado de trabalho e o pleno emprego
(NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 363).
NOTA
A expressão “conjuntura” se refere ao conjunto de acontecimentos em um
determinado momento. São circunstâncias e ocasiões que influenciam coletivamente
em determinados aspectos, sejam econômicos, históricos, sociais, políticos, entre outros
(SIGNIFICADOS, 2018, s.p., grifo do original).
9
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
Já a expressão “pleno emprego” acontece quando não há mão de obra
voluntariamente desempregada, já que, em tese, a economia de mercado por si se
encarregava de utilizar de forma eficiente todos os recursos disponíveis (LOPES;
VASCONCELLOS, 2008).
Situações de desequilíbrio no mercado seriam exceções à regra, oriundas
de fatores como “restrições monopolistas, sindicatos de trabalhadores, intervenção
governamental na economia etc., mas sempre a economia voltaria a operar no
pleno emprego” (NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 364).
A Grande Depressão colocou em xeque a teoria clássica de autorregulação
do mercado, já que nada do que se acreditava e era praticado até o momento
deu conta de superar a crise. Keynes (1983) acreditava que, ao contrário de
economistas clássicos como Jean-Baptiste Say, a oferta não cria a sua própria
procura, é preciso dar importância à demanda agregada (que é a soma de todas as
demandas individuais), estimulando-a para que o nível de produção e consumo
volte a crescer.
NOTA
Você já deve ter estudado a Lei de Say (um dos principais economistas clássicos),
mas vale aqui recordar: “Os clássicos sustentavam que a produção que cria a oferta gera
renda, criando, então, uma demanda equivalente. E desde que toda a renda é gasta, a oferta
e a demanda são sempre iguais” (NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 364).
Numa crise sem precedentes, como estimular a demanda agregada?
Keynes defendeu a teoria de que são os investimentos produtivos que estimulam
o crescimento econômico, ao gerar emprego e renda, fortalecendo, assim, o
consumo e consequentemente a produção. Isso porque, para Keynes, “o nível
de produto e de emprego é determinado pela demanda agregada da economia
[...] por bens e serviços. O valor do produto total e, por decorrência, o valor
total da renda e o nível de emprego são determinados pela demanda agregada”
(NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 364-365).
Como os empresários, falidos, não tinham condições de investir, nem
demanda das famílias pela forte queda na renda, Keynes propôs ao Estado
que este atuasse como propulsor do crescimento econômico, investindo em
grandes obras públicas que demandariam fatores produtivos (terra, trabalho,
capital, capacidade empresarial). Os agentes econômicos (empresas e famílias)
responsáveis pela obra, por sua vez, gastariam a renda proveniente do pagamento
pela utilização dos fatores produtivos na compra de bens e serviços, o que
estimularia outros setores econômicos antes deprimidos, gerando o que chamou
de “efeito multiplicador” na economia.
10
TÓPICO 1 | A MACROECONOMIA
Essa concepção se devia à ideia, defendida por Keynes, de que era
possível que uma economia viesse a crescer mesmo apresentando desemprego
de trabalhadores (um dos motivos seria a implementação de novas tecnologias,
que aumentam a produtividade e dispensam mão de obra), bem como de outros
fatores produtivos como matérias-primas e insumos (pela melhoria que a própria
tecnologia poderia trazer na utilização desses recursos no processo produtivo,
diminuindo perdas).
Para Keynes, se a crise é de insuficiência de demanda, e se não
existem forças que promovam automaticamente o pleno emprego,
torna-se necessária a intervenção do Estado por meio das políticas
de gastos públicos, fiscal e monetária, o que significa o fim do não
intervencionismo na economia da era clássica. O argumento de que
o governo pode implementar políticas de estabilização para prevenir
ou atacar recessões econômicas foi tão aceito que o conjunto de suas
ideias foi [...] batizado de ‘revolução keynesiana’ (NOGAMI; PASSOS,
2003, p. 365).
TUROS
ESTUDOS FU
Este conceito de revolução keynesiana será tratado com mais profundidade na
Unidade 2, e você verá o quão importante se tornou para a economia a partir do século XX.
Além desse conceito, você conhecerá cada um dos instrumentos de política macroeconômica
e poderá entender melhor a proposta keynesiana que, em termos gerais, delegava ao Estado
a responsabilidade de manter a economia em equilíbrio por meio de uma política de gastos
públicos que poderia ser na forma de investimento público (o governo financiando obras,
que foi uma das ações mais desenvolvidas), bem como a política monetária (que consiste
na administração da quantidade da moeda em poder do público, que interfere no preço da
moeda, tornando-a mais barata em situações de crise e faz estimular a produção, a renda e
o emprego) e fiscal (que consiste na concessão, por parte do governo, de incentivos fiscais,
como isenções de impostos ou diminuição de alíquotas, dentre outras).
De fato, com a adoção das medidas propostas por Keynes, os países
conseguiram finalmente superar a Grande Depressão, inaugurando um período
caracterizado por amplo intervencionismo estatal na maioria dos países, com uma
economia relativamente estabilizada, que durou até as décadas de 1970/1980.
Precisamos lembrar também que a teoria keynesiana considerava
saudável uma taxa de inflação baixa, que em tese significaria que a economia
estava crescendo, já que teoricamente estaria utilizando maior quantidade de
recursos produtivos e, assim, tornando-os mais escassos e, consequentemente,
mais caros (inclusive a mão de obra).
11
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
O termo “intervencionismo estatal” lhe parece familiar? Você já deve
ter ouvido calorosos debates entre os defensores de um Estado interventor e os
que acreditam no que chamam de leis do mercado, por sua vez, defensores do
Estado mínimo. Com certeza esta é uma das questões mais discutidas nas últimas
décadas. Dependendo da ideologia adotada, as políticas econômicas implantadas
também irão divergir, adotando posições que reforçam a participação do Estado
na economia ou defendendo o seu afastamento.
Como a economia é dinâmica e sofre mutações na medida em que a
sociedade também se modifica, passando por momentos de ascensão e momentos
de queda, a partir dos anos de 1970 surgiu um fenômeno absolutamente novo,
conhecido como estagflação (em grande parte devido aos aumentos do preço
do barril de petróleo), que combinava estagnação econômica, decréscimo da
produção e aumento do desemprego com consideráveis altas na inflação, o
que exigiu uma forte intervenção do Estado no sentido de reverter este quadro.
Infelizmente, na década seguinte, em vez de retroceder, a crise só fez piorar.
Se você nasceu depois da década de 1980, com certeza não vivenciou
esta crise, mas seus pais e/ou avós conheceram e sentiram muito fortemente
os efeitos nefastos deste período. Eles devem ter relatado como a economia era
instável, a moeda perdia poder de compra diuturnamente, a inflação corroía os
rendimentos, chegando a situações em que se perdia a noção de valor, já que
preços eram reajustados praticamente todos os dias. Costumava-se dizer que
os remarcadores de preços nos supermercados eram os que mais trabalhavam,
chegando a tal nível de estresse que nem sequer eram retiradas as etiquetas de
preços anteriores, apenas sobrepunham-se umas às outras. Não é à toa que lojas
de automóveis ou de eletrodomésticos chegaram a cotar os preços dos produtos
em dólar, caso contrário teriam que trocar faixas e cartazes com os preços dos
produtos todos os dias. E o assalariado, então? Assim que recebia seu salário,
corria para os supermercados para efetuar as compras do mês, pois se deixasse
para outro dia já não teria o mesmo poder de compra e sairia do supermercado
com menos produtos no carrinho.
No Brasil, este fenômeno foi tão grave que outro conceito surgiu: o da
inflação inercial.
A inflação inercial ocorre quando os preços de uma economia
oferecem resistência às políticas de estabilização para atacar
as causas primárias da inflação, é a chamada memória
inflacionária. Essa inflação inercial é decorrente de mecanismos
de indexação, que reajustam o valor das parcelas de contratos
pela inflação do período passado, ou seja, mesmo que não tenha
uma razão do preço aumentar, ele aumenta baseado nessa
memória inflacionária. Os mecanismos de indexação podem
ser formais, quando se baseiam em regras legais de aumento,
como aluguéis e mensalidades escolares, ou informais, quando
os agentes são seguidores do preço, ou seja, aumenta o preço,
pois os outros também o fizeram (CULTURAMIX, 2018, s.p.).
12
TÓPICO 1 | A MACROECONOMIA
TUROS
ESTUDOS FU
No Tópico 4 você aprenderá que nas décadas de 1980/90 diversos planos de
combate à inflação foram implementados, desde o Plano Cruzado (1986) até o Plano Real
(1994), sendo que somente este último foi bem-sucedido no combate à inflação, mesmo
tendo gerado imensos custos sociais, com graves consequências posteriores para o Brasil.
Paralelo à ocorrência desta nova crise, que se estendia desde a década de
1970, surge uma teoria “contrarrevolucionária” à keynesiana, cujo maior pensador
foi Milton Friedman e demais economistas da Universidade de Chicago, que
desenvolveram a doutrina monetarista, dominando o pensamento econômico a
partir de então.
De acordo com Sandroni (1989, p. 207), o monetarismo é uma “escola
econômica que sustenta a possibilidade de se manter a estabilidade de uma
economia capitalista recorrendo-se apenas a medidas monetárias, baseadas nas
forças espontâneas do mercado e destinadas a controlar o volume de moedas e
outros meios de pagamento no mercado financeiro”.
Assim, sendo a moeda a variável mais importante na determinação
da demanda agregada e sendo a inflação um fenômeno monetário, políticas
monetárias de controle da oferta da moeda seriam a receita para debelar a inflação
e retomar a estabilidade econômica. Por exemplo, quando se verifica uma taxa
de inflação que está acima do esperado, o governo entraria com uma política
monetária de aumento do preço da moeda (o que se faz aumentando a taxa de
juros), que inibiria o consumo e faria com que o nível de preços voltasse aos
níveis desejados. Ou seja, manipulando a oferta monetária, haveria novamente
uma autorregulação do mercado, sem necessidade de intervenção do governo
por meio de investimentos para estimular a demanda agregada.
“O monetarismo é defendido pelos economistas que defendem a necessidade
de aplicação de uma política fiscal austera, através da tributação e do controle das
despesas públicas e dos consumidores, para evitar a inflação e o desequilíbrio do
balanço de pagamentos” (SANDRONI, 1989, p. 207, grifo do original).
Como a economia não é estática, conforme a sociedade evolui, também
a macroeconomia precisa ser atualizada e novas teorias e políticas econômicas
são propostas, pois novos desafios surgem a cada momento. Por exemplo, com
a crise financeira de 2008, uma das grandes discussões foi o questionamento
sobre a efetividade da continuidade do dólar americano como padrão monetário
internacional, chegando-se a discutir a necessidade de pensar em um novo
padrão, que estivesse descolado da identidade com um país. Com o surgimento
do bitcoin (moeda digital), há inclusive propostas no sentido de tornar esse sistema
monetário como padrão monetário internacional.
13
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:
• “A macroeconomia estuda a economia como um todo, analisando a determinação
e o comportamento de grandes agregados, tais como: renda e produto nacionais,
nível geral de preços, emprego e desemprego, estoque de moeda e taxas de
juros, balanço de pagamentos e taxa de câmbio” (VASCONCELLOS; GARCIA,
2005, p. 86).
• A macroeconomia tem a finalidade de estudar o comportamento geral da
economia, a fim de intervir na realidade, reverter crises, propiciar crescimento
e desenvolvimento econômico por meio de políticas macroeconômicas.
• Tendo sua importância ressaltada por ocasião da Grande Depressão de
1929 (com a teoria proposta por Keynes), a macroeconomia vem ganhando
cada vez mais destaque na economia mundial, haja vista a necessidade de
entender, diagnosticar a conjuntura e prognosticar cenários e possibilidades
de intervenção visando ao bem-estar público e o atendimento das necessidades
econômicas.
14
AUTOATIVIDADE
1 Com base no que foi abordado até o momento sobre a macroeconomia,
analise as sentenças a seguir:
I- É um ramo da economia que se preocupa com questões gerais da atividade
econômica, tais como o produto nacional, a renda nacional, nível de preços,
taxas de desemprego, dentre outros, e tem como objetivo a compreensão,
a diagnose dos fenômenos econômicos para a proposição de políticas
macroeconômicas.
II- Não se relaciona com a microeconomia, pois são ramos antagônicos da
economia e teve seu desenvolvimento a partir da Revolução Industrial, com
o surgimento do liberalismo econômico.
Assinale a alternativa CORRETA:
a) (
b) (
c) (
d) (
)
)
)
)
I é verdadeira e II é falsa.
I é falsa e II é verdadeira.
I e II são falsas.
I e II são verdadeiras.
2 Discorra sobre a contribuição de Keynes para o desenvolvimento da
macroeconomia.
3 A remuneração pela utilização dos recursos produtivos terra, trabalho,
capital, capacidade empresarial e tecnologia é, respectivamente:
a) (
b) (
c) (
d) (
e) (
)
)
)
)
)
Aluguel, juros, lucros, rendas e salários.
Aluguel, salário, juros, lucros e royalties.
Salários, aluguéis, lucros e juros.
Juros, lucros, aluguéis e rendas.
Nenhuma das alternativas anteriores.
15
16
TÓPICO 2
UNIDADE 1
METODOLOGIA DA ANÁLISE MACROECONÔMICA
1 INTRODUÇÃO
Devido à complexidade da ciência econômica, como você já deve ter percebido
ao longo de sua caminhada de estudos neste curso, para poder entender os fenômenos
econômicos, interpretá-los e adotar medidas de intervenção, a macroeconomia
adota uma metodologia própria de análise. Isso porque, para compreender a
macroeconomia é preciso levar em consideração uma série de variáveis interligadas,
como o próprio conceito já sinaliza (recordar também é aprender).
“A macroeconomia estuda a economia como um todo, analisando a
determinação e o comportamento de grandes agregados, tais como: renda e
produto nacionais, nível geral de preços, emprego e desemprego, estoque de moeda
e taxas de juros, balanço de pagamentos e taxa de câmbio” (VASCONCELLOS;
GARCIA, 2005, p. 86).
Desta forma, neste tópico você verá que a macroeconomia se utiliza de
dados (que também podemos chamar de indicadores) para conhecer a situação de
determinado país, região, estado, município, interpretar estes dados (indicadores),
criando novas ou reafirmando teorias já existentes, para então pôr em prática
medidas de política macroeconômica que visam intervir nessa realidade com
o objetivo de modificá-la, sanando ou diminuindo a intensidade de problemas
econômicos existentes na sociedade.
2 DADOS ECONÔMICOS
Para que as intervenções efetuadas no sistema econômico sejam eficientes é
necessário observar os fatos que partem de uma dada realidade. Para isso, diversas
variáveis são utilizadas, como o nível de preços, o nível de produção e consumo,
a renda nacional, taxas de desemprego, taxas de juros, dentre outras. Esses dados
não são apresentados de forma isolada, mas acompanhados sistematicamente,
formando um todo estatístico que visa à identificação da tendência e do ciclo.
Por exemplo, quando analisamos a evolução da taxa de desemprego no Brasil,
podemos constatar tendências de queda e de alta quando analisamos um período
de tempo relativamente longo. Observe a figura a seguir:
17
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
FIGURA 1 – TAXA DE DESOCUPAÇÃO NAS SEIS MAIORES REGIÕES METROPOLITANAS DO
BRASIL (MARÇO DE 2002 A FEVEREIRO DE 2016)
Taxa de desocupação (Pessoas de 10 ou mais anos de idade), março 2002 - fevereiro 2016
15
12.5
10
7.5
5
m
a
no jurço
ve lh 20
m o 02
m bro 200
2
a
no ju rço 200
ve lh 20 2
m o 0
m bro 2003
no j arço 20 3
ve ulh 2 03
m o 00
m bro 20 4
0
no juarço 2004
ve lh 20 4
m o 0
m bro 2005
no j arç 20 5
ve ulho 2 05
m o 0
m bro 2006
no j arço 2006
ve ulh 2 06
m o 00
m bro 20 7
no j arço 2007
ve ulh 2 07
m o 00
m br 20 8
no j arço 2008
ve ulho 2 08
m o 0
m bro 2009
no j arç 2009
ve ulho 2 09
m o 0
m br 2010
no j arçoo 2010
ve ulh 2 10
m o 0
m br 2011
no j arço 2011
ve ulho 2 11
m o 0
m bro 2012
no j arç 2012
ve ulho 2 12
m o 0
m br 2013
no j arço 2013
ve ulho 2 13
m o 0
m bro 2014
no j arço 2014
ve ulh 2 14
m o 01
br 20 5
o 1
20 5
15
2.5
FONTE: IBGE (2018, s.p.)
Assim, como podemos ver na figura, a partir de 2004 se observa uma
tendência de baixa na taxa de desemprego, que perdura até o ano de 2014, quando
inicia uma forte tendência de alta. Isoladamente este indicador é importante, mas
não consegue explicar o comportamento da economia como um todo; entretanto,
quando confrontado com outros indicadores, como nível de produção, renda
agregada, dentre outros, fornece um conjunto de informações que permite traçar
com maior precisão um diagnóstico da realidade para, a partir deste diagnóstico,
propor alguma intervenção.
Vamos, então, comparar a evolução da taxa de desemprego com a evolução
do PIB brasileiro no período de 2002 a 2015:
FIGURA 2 – EVOLUÇÃO DO PIB E DA TAXA DE DESEMPREGO NO BRASIL DE 2002 A 2015 (%)
14
12
10
8
6
4
0
mar/02
ago/02
jan/03
jun/03
nov/03
abr/04
set/04
fev/05
jul/05
dez/05
mai/06
out/06
mar/07
ago/07
jan/08
jun/08
nov/08
abr/09
set/09
fev/10
jul/10
dez/10
mai/11
out/11
mar/12
ago/12
jan/13
jun/13
nov/13
abr/14
set/14
fev/15
jul/15
dez/15
2
desemprego
PIB
FONTE: <https://empreendedorismoedesemprego.wordpress.com/
2016/03/22/o-pib-e-o-desemprego/>. Acesso em: 10 ago. 2018.
18
TÓPICO 2 | METODOLOGIA DA ANÁLISE MACROECONÔMICA
FIGURA 3 – EVOLUÇÃO DO PIB NO BRASIL DE 2010 A 2016 (%)
Evolução do PIB
Ano a ano, em%
7,5
4,0
3,0
1,9
0,5
0
2010
2011
2012
2013
2014
-3,8
-3,6
2015
2016
FONTE: <http://g1.globo.com/mundo/blog/helio-gurovitz/post/como-o-pib-pode-voltarcrescer.html>. Acesso em: 10 ago. 2018.
Conforme indica a figura anterior, as taxas de desemprego e do PIB são
inversamente proporcionais e conjuntamente indicam a tendência de evolução
da economia num dado período. Assim, no período em que o PIB crescia, mesmo
que de forma modesta, a taxa de desemprego apresentava uma queda anual (2002
a 2014). Com a queda do PIB, a partir de 2013, a taxa anual de desemprego ficou
em 11,75% em 2016 e em 10,85% em 2017.
Outros indicadores poderiam ser trazidos para análise, como as taxas de
inflação, ocupação industrial, taxa SELIC (que é a taxa básica de juros utilizada
para remuneração das aplicações em títulos públicos), dentre outros.
DICAS
Para aprofundar o estudo sobre conjuntura econômica, há vários sites que
fornecem importantes análises e que poderiam complementar seus conhecimentos:
• Carta Conjuntura do IPEA: <http://www.ipea.gov.br/cartadeconjuntura/>.
• Revista de Conjuntura Econômica do Instituto Brasileiro de Economia
(IBRE) da Fundação Getúlio Vargas (FGV): <http://portalibre.fgv.br/main.
jsp?lumChannelId=402880811D8E34B9011D92CC23104342>.
• Centro de Estudos de Conjuntura e Política Econômica (CECON) da Unicamp: <http://
www.eco.unicamp.br/cecon/>.
19
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
3 TEORIAS ECONÔMICAS
Ao longo da evolução da ciência econômica, diversas teorias foram
construídas para explicar os fenômenos econômicos, analisar tendências e efetuar
prognósticos. Para exemplificar, abordaremos a teoria dos ciclos econômicos.
Para Nikolai D. Kondratiev (1992), o modo de produção capitalista é
caracterizado pela ocorrência de ciclos econômicos ou movimentos cíclicos de
ondas longas, de 40 a 60 anos, de variação de toda atividade econômica (industrial,
agrícola e comercial) de um país ou de um conjunto de países. Vivemos períodos
de prosperidade quando ocorre uma expansão econômica, seguidos de períodos
de crise econômica, marcada pela recessão e depressão, e, finalmente, um novo
intervalo de crescimento ou de recuperação econômica.
“O estudo dos ciclos econômicos está intimamente ligado ao das crises,
que podem ser caracterizadas como um momento descontínuo desastroso de
uma evolução cíclica contínua” (SANDRONI, 1989, p. 47).
As crises são inerentes ao modo de produção capitalista. De certa
forma, podemos compreender essa teoria quando analisamos as grandes crises
do capitalismo, citando a de 1929 e a de 2008, consideradas as mais graves e
abrangentes. Ao contrário do que muitos economistas imaginavam, essas crises
não provocaram a queda do capitalismo ou sua substituição por outro sistema,
apenas exigiram mudanças na forma como a economia se desenvolveria.
Aprimorando a teoria de Kondratiev, Joseph Schumpeter (1883-1950), Ignácio
Rangel (1914-1994) e Ernest Mandel (1923-1995) também se debruçaram sobre a
teoria dos ciclos econômicos.
Assim, com base na realidade econômica, diversas teorias foram
elaboradas pelas escolas de pensamento econômico e podem ser aplicadas para
explicar determinados fenômenos e sua evolução.
TUROS
ESTUDOS FU
As teorias econômicas serão abordadas em disciplinas como História
Econômica Geral e História do Pensamento Econômico.
4 POLÍTICA MACROECONÔMICA
A política macroeconômica nada mais é do que um conjunto de ações
governamentais desenvolvidas para o alcance de diferentes finalidades que estão
intrinsecamente relacionadas com a situação econômica de um país e mesmo de
uma respectiva região, conjunto de países ou de blocos econômicos.
20
TÓPICO 2 | METODOLOGIA DA ANÁLISE MACROECONÔMICA
Tais ações são executadas por diferentes agentes de política econômica,
como o Governo Federal, no caso de um país, bem como organismos internacionais
como o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial, a Comissão
Jurídica Interamericana da Organização dos Estados Econômicos (CJI-OEA),
Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), Comissão Econômica das
Nações Unidas para a América Latina e o Caribe (CEPAL), Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), blocos econômicos regionais como a
União Europeia, Mercado Comum do Sul (MERCOSUL), dentre outros.
De posse dos dados fornecidos pelas estatísticas econômicas e baseados
nas teorias que mais se adéquam à ideologia adotada pelo governo é que se
aplicam as políticas macroeconômicas de intervenção na sociedade, visando
corrigir distorções, solucionar problemas, superar crises. Quando afirmamos que
a política macroeconômica adotada tem um componente ideológico é porque
partimos do pressuposto de que não existe neutralidade na ciência econômica,
pois cada teórico tem maior afinidade com dada teoria ou então cria a sua própria,
refutando assim as demais.
Em nível de Governo Federal, este pode intervir na esfera econômica por
meio das políticas monetária, fiscal, cambial e comercial e de rendas. Exemplificando,
imaginemos que o governo queira estimular o crescimento de determinado setor
de atividade econômica, tornando-o mais forte no país para competir em condições
de igualdade com seus concorrentes no exterior. O que ele pode fazer? Lançar mão
tanto de política fiscal (concedendo um plano de acesso a financiamentos com taxas
de juros mais baixas ou diminuindo alíquotas de impostos, este é denominado de
renúncia fiscal), quanto da política comercial (impondo barreiras tarifárias ou não
tarifárias ao produto proveniente do exterior).
NOTA
Você pode ir se aprimorando deste conteúdo lendo notícias sobre concessão
de incentivo fiscal/renúncia fiscal a diversos setores no Brasil, como o destinado ao setor
automotivo em decorrência da crise de 2008 (isenção de IPI), concessão de estímulos
fiscais ao setor de informática, dentre outros.
E
IMPORTANT
Vamos pensar um pouco! Você deve saber, a esta altura do curso, que uma
das principais ideologias adotadas desde o surgimento do capitalismo é a do liberalismo
econômico, criada por Adam Smith (1723-1790) e que tem um sem-número de seguidores
e aprimoradores das chamadas escolas clássica ou neoclássica. Pois bem, a política
macroeconômica implantada pelos seguidores da teoria liberal vai divergir substancialmente
daquela que seria adotada pelos seguidores da teoria marxista ou keynesiana, por exemplo.
21
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:
• A macroeconomia se utiliza de dados, teorias e políticas para explicar tanto os
fenômenos que são considerados macro, quanto para diagnosticar suas causas
e propor soluções por meio dos instrumentos de política macroeconômica.
• Os dados (indicadores) fornecem informações importantes para um
diagnóstico mais preciso da realidade, sendo que diversos indicadores devem
ser utilizados neste levantamento, como os níveis de produção e de renda,
produção industrial, desemprego, inflação, dentre outros.
• As teorias visam explicar os fenômenos ocorridos, como as crises e as fases de
ascensão da economia, e podem variar substancialmente de uma para outra, de
acordo com a ideologia utilizada pelo pensador e a corrente de pensamento a
que o economista pertença ou seja o criador.
• De posse dos dados e das teorias, a política macroeconômica é a aplicação de um
conjunto de medidas que visa intervir na realidade diagnosticada, utilizando
determinada teoria econômica que seja considerada a ideal pelo seu agente (no
caso do Governo Federal, seria o ministro da Fazenda).
22
AUTOATIVIDADE
1 Há diversos dados (indicadores) que servem de referência para que os
agentes econômicos conheçam a conjuntura econômica. Diante dessa
informação, faça um apanhado geral dos principais indicadores, como
taxa de desemprego, taxa de crescimento/decréscimo do PIB, taxa de
crescimento/decréscimo da produção industrial, taxa de inflação, taxa
de crescimento demográfico (dentre outros) nos últimos cinco anos, e
tente construir uma pequena análise desta conjuntura (ou seja, entender
como uma variável afeta a outra), unindo ainda informações sociais como
violência, criminalidade, assassinatos, desigualdade social, dentre outros.
Na sequência, desenvolva um texto de até 20 linhas sobre o assunto.
2 Você já deve ter estudado algumas das principais teorias econômicas.
Escreva, em até 20 linhas, quais são as principais características da teoria
liberal, uma das teorias econômicas mais utilizadas pelo capitalismo para
explicar a economia e impor sua ideologia à sociedade.
3 As políticas macroeconômicas têm o objetivo de intervir na economia das
nações com a finalidade de resolver ou minimizar os problemas econômicos
nelas verificados. Com base nessa informação e no seu conhecimento sobre
o assunto, assinale F para as sentenças falsas e V para as verdadeiras:
a) ( ) Todos os economistas têm a mesma ideologia quando se trata de
aplicar as teorias econômicas, que são efetuadas por meio das políticas
macroeconômicas.
b) ( ) Um exemplo de política macroeconômica é o bolsa-família, que nada
mais é do que uma política assistencial.
c) ( ) Um exemplo de política macroeconômica foi adotado no Governo Lula
quando ocorreu a crise financeira de 2008, com a isenção do Imposto
sobre Produtos Industrializados (IPI) de automóveis.
d) ( ) O governo pode estimular a economia a crescer quando faz uma
política macroeconômica de aumento da taxa de juros, o que vai tornar
o real mais barato e, consequentemente, facilitar o acesso dos agentes
econômicos ao crédito.
23
24
TÓPICO 3
UNIDADE 1
ESTRUTURA DA ANÁLISE MACROECONÔMICA
1 INTRODUÇÃO
Como você já deve ter estudado nos conceitos introdutórios de economia,
esta é analisada a partir de dois mercados distintos: o mercado real e o mercado
monetário, formando o que chamamos de fluxo básico da economia: o fluxo real
e o fluxo monetário.
Assim, para adquirir os bens e serviços necessários para atender às suas
necessidades, você (caso seja trabalhador) oferece ao mercado a sua força de
trabalho e recebe uma remuneração na forma de salário. Por exemplo, o dono da
terra a aluga e recebe por ela uma renda na forma de aluguel; o proprietário de
moeda a empresta e recebe por ela uma renda chamada de juro. A empresa na
qual você trabalha vende os bens ou serviços e recebe uma renda denominada de
lucro, ou seja, terra, trabalho, capital e capacidade empresarial são denominados
fatores de produção e representam o fluxo real da economia. Já o pagamento pela
utilização desses fatores (também chamados de recursos), que são o aluguel, o
salário, o juro e o lucro representam o fluxo monetário.
NOTA
Alguns autores incluem a tecnologia como um quinto fator de produção, sendo
que a remuneração pela utilização deste fator é denominada de royalty.
Royalties é uma palavra em inglês que significa regalia ou privilégio. Consiste em uma
quantia que é paga por alguém ao proprietário pelo direito de usar, explorar ou comercializar
um produto, obra, terreno etc. Esta palavra é o plural de royalty, que significa realeza. Isso
explica a origem dessa forma de pagamento pelo direito de usufruir de algo, que começou
quando as pessoas tinham que pagar ao rei para usar os minerais nas suas propriedades.
Mais tarde, a palavra continuou sendo usada para descrever essa compensação dada ao
proprietário de alguma coisa, sendo atualmente muito usada no âmbito da exploração
petrolífera. No mundo da música, os royalties são um valor pago ao autor ou compositor
de uma determinada música, para ter o direito de usar ou reproduzir a música em questão.
Os royalties são muito comuns no sistema de franquia, uma taxa que é paga de forma
periódica pelo franqueado ao franqueador. Esse valor é uma porcentagem do faturamento
bruto obtido pela franquia.
25
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
No contexto empresarial, muitas vezes uma pessoa investe dinheiro em uma empresa,
cobrando depois royalties, uma porcentagem do faturamento obtido na venda do produto
ou serviço. Também pode ser um valor fixo por cada unidade do produto. Além disso,
os royalties também podem ser uma forma de remuneração pela utilização de processos
tecnológicos patenteados (ou que estão protegidos por licença) para a produção de algum
produto. No caso da indústria petrolífera, os royalties são a compensação financeira dada
pelas empresas que fazem a exploração por eventuais danos ambientais que podem ser
causados durante o processo de extração (SIGNIFICADOS, 2018, s.p., grifo do original).
O esquema a seguir demonstra o funcionamento dos fluxos real e
monetário na economia, envolvendo quatro setores: famílias, empresas, governo
e setor externo.
FIGURA 4 – FLUXOS REAL E MONETÁRIO
Fatores e gastos
Renda
Exportação
Setor
externo
Importação
Consumo ($)
Produto
Bens e serviços
Indivíduos
Empresas
Fatores de produção
(Capital, mão de obra, terra, capacidade empresarial)
Renda($)
(Juro, salário, aluguel, lucro)
Impostos
transferências
Governo
Impostos
gastos do governo
FONTE: Nogami (2012, p. 40)
TUROS
ESTUDOS FU
Na Unidade 2 você aprofundará os estudos sobre este assunto quando
tratarmos do fluxo circular da renda.
26
TÓPICO 3 | ESTRUTURA DA ANÁLISE MACROECONÔMICA
O exemplo formulado anteriormente, no campo da microeconomia, pode
ser utilizado na macroeconomia se computarmos o fluxo real e monetário não de
uma empresa e de um trabalhador, mas de toda a economia, que pode ser de um
município, estado ou país.
Dessa forma, podemos dizer que o mercado de trabalho e o mercado de
bens e serviços constituem o fluxo real da macroeconomia, e o seu respectivo
pagamento constitui o fluxo monetário. Estes, por sua vez, determinam diversas
variáveis, conforme exposto no quadro a seguir:
QUADRO 1 – ESTRUTURA DA ANÁLISE MACROECONÔMICA
Classificação
Parte real da economia
Parte monetária da
economia
Mercados
Variáveis determinadas
Mercado de bens e serviços
Produto nacional
Nível geral de preços
Mercado de trabalho
Nível de emprego
Salários nominais
Mercado financeiro (monetário e
títulos)
Taxa de juros
Estoque de moeda
Mercado de divisas
Taxa de câmbio
FONTE: Vasconcellos (2014, p. 201)
Teoricamente, para o funcionamento da economia, esses mercados devem
estar em equilíbrio.
Neste tópico, você conhecerá o funcionamento dos mercados real e
monetário, compreenderá quais são suas subdivisões e as variáveis que estão
relacionadas a cada mercado. Então, vamos ver como isso tudo funciona?
2 O MERCADO DE BENS E SERVIÇOS
Vamos analisar o mercado de bens e serviços num contexto
macroeconômico, assim temos a oferta e a demanda de bens e serviços. O nível
geral de preços e o nível agregado de produção são determinados por outras duas
variáveis: a evolução do nível de demanda e oferta agregada de bens e serviços.
Você saberia dizer como se forma a demanda agregada? Esta depende
somente dos consumidores ou há outros setores econômicos envolvidos?
Para responder a estas perguntas, vamos a um exemplo: afirmamos
anteriormente que o fluxo real da economia é constituído pelo mercado de bens
e serviços e pelo mercado de trabalho. Temos aqui dois agentes importantes: os
consumidores, que demandam bens e serviços, e as empresas, que demandam
força de trabalho e demais fatores produtivos. Mas a demanda agregada depende
ainda de dois outros setores importantes: o primeiro é o governo, que demanda
27
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
bens e serviços e força de traballho para executar as ações governamentais. O
segundo é o setor externo, já que, como sabemos, há uma interdependência
entre os países, pois o que não produzimos internamente ou produzimos de
forma ineficiente pode ser suprido pelas importações, e o que excede a demanda
nacional pode ser exportado (apesar de ser mais comum encontrar na literatura
apenas três agentes: famílias/consumidores, empresas e governo).
Por outro lado, a oferta ou produção agregada depende da evolução do
nível do emprego e da capacidade instalada da economia.
Por isso, como verificamos nas situações de crise, que podem ser ocasionadas
por um fenômeno inflacionário, por exemplo, a diminuição da demanda agregada
interfere no nível de emprego, pressionando-o para baixo, o que impacta também
no nível de preços e a utilização da capacidade instalada de produção.
E qual é a condição de equilíbrio do mercado de bens e serviços?
Numa condição de equilíbrio: oferta agregada de bens e serviços = demanda
agregada de bens e serviços
Se pode deduzir, a partir do exposto, que flutuações nesse equilíbrio
implicam em alterações nas variáveis determinadas ao mercado de bens e serviços
elencadas no quadro acima.
Para entender essas relações, vamos analisar na figura a seguir dois
indicadores: o da evolução do Produto Interno Bruto (PIB) e da evolução do nível
de preços medido pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA):
FIGURA 5 – VARIAÇÃO DO IPCA EM 12 MESES EM ABRIL DE 2010 A 2017 (EM %)
Inflação oficial
Variação do IPCA em 12 meses em abril, em %
9,28
8,17
6,51
5,26
6,49
6,28
5,10
4,08
2010
2011
2012
2013
2014
2015
FONTE: IBGE (2018, s.p.)
28
2016
2017
TÓPICO 3 | ESTRUTURA DA ANÁLISE MACROECONÔMICA
Você deve estar acompanhando a situação econômica do Brasil e já ouviu
que o PIB do Brasil tem caído desde 2013, como mostra a Figura 6. Uma das
causas de decréscimo do PIB é a diminuição da demanda agregada, que constitui
uma das variáveis para equilíbrio do mercado de bens e serviços. Assim, vejamos:
FIGURA 6 – VARIAÇÃO DO PIB DO BRASIL DE 2010 A 2016 (EM %)
Variação do PIB do Brasil
(2010-2016)
10,00%
7,50%
8,00%
6,00%
4,00%
3,00%
4,00%
1,90%
2,00%
0,50%
0,00%
-2,00%
-4,00%
-6,00%
2010
2011
2012
2013
2014
- 3,80%
- 3,60%
2015
2016
FONTE: IBGE (2018, s.p.)
Percebe-se que a diminuição da demanda, e, por conseguinte, da produção,
é um dos fatores que contribuíram para a queda da inflação no período.
Assim, você percebe a importância de manter este equilíbrio na economia?
Para entender o funcionamento dos demais mercados, vamos analisá-los
um a um e depois fazer um apanhado geral, em que você irá perceber o quanto
variáveis como desemprego, demanda, oferta, nível de preços, nível salarial, taxa
de câmbio, dentre outras, estão interligadas.
29
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
3 O MERCADO DE TRABALHO
Existe também um ponto de equilíbrio desejável neste mercado? Claro, o
equilíbrio no mercado de trabalho acontece quando:
Oferta de mão de obra = demanda de mão de obra
O crescimento da oferta de mão de obra depende, principalmente, da taxa
de crescimento da população.
A taxa média de crescimento anual da população brasileira, segundo o
IBGE (2018), diminuiu 43,3% em 50 anos, caindo de 2,89% (entre 1950 e 1960) para
1,64% (1991 a 2000). Segundo projeções do IBGE, até 2030 esta taxa passará a ser
de menos de 0,5% ao ano.
Então você poderia se perguntar: Mas se a oferta de mão de obra tem
diminuído, o que explica o aumento do desemprego a partir de 2014?
Você tem razão em relação à taxa de desemprego. Veja na figura a seguir
a evolução da taxa anual de desemprego no período de 2001 a 2016:
FIGURA 7 – TAXA ANUAL DE DESEMPREGO NO PERÍODO DE 2002 A 2016 (EM %)
Taxa Anual de Desemprego
(em % - Pesquisa Mensal de Emprego)
14
12
10
08
06
04
02
00
2002
2003
2004
2005
2006
2007 2008
2009
2010
2011
FONTE: IBGE (2018, s.p.)
30
2012
2013
2014
2015
2016
TÓPICO 3 | ESTRUTURA DA ANÁLISE MACROECONÔMICA
Como podemos observar, a taxa anual de desemprego, que era de 12,4%
em 2002, teve seu ponto de mínima no ano de 2014, quando ficou em 4,8%. Desde
então a taxa vem aumentando, ficando em 11,75% em 2016 e em 10,85% em 2017,
o que representa uma leve queda.
A demanda de mão de obra vem diminuindo consideravelmente nos
últimos anos, em virtude da crise (imobiliária/financeira) iniciada em 2008. Com a
crise, as empresas tiveram que fazer ajustes na sua produção, diminuindo custos
e muitas vezes reduzindo o número de funcionários (ou ainda, muitas empresas
faliram), apresentando como consequência queda na demanda, ocorrida em
virtude da queda da renda, o que repercute também na queda da produção, se
convertendo no que os economistas chamam de círculo vicioso que perpetua a
crise econômica.
Além desses fatores, como já previa Keynes, a tecnologia também é
responsável pela diminuição da demanda de mão de obra, já que cada vez mais
as máquinas substituem o trabalho humano.
No caso do Brasil, que até 1930 era eminentemente um país agrícola, a
distribuição da população economicamente ativa vem se alterando de forma
significativa entre os setores econômicos ao longo dos anos.
FIGURA 8 – BRASIL: DISTRIBUIÇÃO DA POPULAÇÃO ECONOMICAMENTE ATIVA POR
SETORES DE PRODUÇÃO (EM %) – 1940 A 2001
Brasil: Distribuição da população economicamente ativa
poe setores de produção (em %) - 1940 a 2001
80,0
70,0
70,2
60,7
60,0
54,0
44,3
50,0
40,0
30,0
20,0
10,0
26,2
33,0
0,0
1940
13,1
12,7
1950
1960
56,5
Setor Terciário
22,8
22,9
22,8
20,6
1990
2001
45,0
30,0
38,0
19,8
10,0
54,4
25,0
17,8
1970
1980
FONTE: Ministério do Trabalho (2018, s.p.)
31
Setor Secundário
Setor Primário
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
Se fizermos uma análise da distribuição da população economicamente
ativa (PEA) no Brasil entre os setores primário (agricultura e exploração mineral
e vegetal), secundário (indústrias) e terciário (comércio e serviços) na economia,
conforme demonstrado na Figura 8, veremos que de 1940 até a década de 1970 era
o setor primário que mais empregava, quando foi superado pelo setor terciário.
Com o avanço do processo de substituição de importações implantado no governo
de Getúlio Vargas, o setor secundário passa de 10% da PEA em 1940 para 25% em
1980 e passa a caminhar ao lado do setor secundário a partir de então.
Essa mudança no perfil do mercado de trabalho reflete também nessa
relação de emprego, pois com as revoluções tecnológicas aplicadas tanto ao
setor primário quanto ao secundário e terciário, cada vez mais se exige mão de
obra qualificada, gerando o que os economistas chamam de lacuna do emprego,
ou seja, uma situação em que há vagas nesses setores de alta tecnologia, mas
não há oferta de mão de obra que possa se habilitar para a vaga, o que gera os
desempregados funcionais.
Como que num jogo de cartas marcadas, o aumento do desemprego
pressiona os salários para baixo, fazendo com que o valor dos salários nominais
caia. Citando Marx (1988), pode-se afirmar que quando há um aumento do que
ele chamou de exército industrial (hoje nem tanto industrial) de reserva, que
representa um aumento muito maior da oferta de mão de obra em relação à
demanda de mão de obra, a tendência é de queda do poder de negociação dos
trabalhadores e, consequentemente, diminuição dos salários.
4 O MERCADO FINANCEIRO
Estando inserido numa sociedade complexa na qual estamos vivendo,
onde a cada dia as relações sociais e econômicas se tornam mais virtuais, você
deve ter percebido que o mercado financeiro também tem se tornado de difícil
operacionalização e até de entendimento por parte dos leigos no assunto.
A moeda, que é um ativo financeiro, portanto, pertencente ao Sistema
Financeiro Nacional, é também uma mercadoria (e por isso tem seu preço
definido pelo mercado) que serve de equivalente geral para todas as demais, pois
os preços dos demais bens e serviços são expressos em moeda corrente.
Você sabe o que é e para que serve o mercado financeiro?
• O que é: conjunto de instituições e instrumentos de intermediação de recursos
financeiros.
• Função: transferência de recursos dos agentes econômicos superavitários para
os deficitários.
• É semelhante à ideia de mercado de bens e serviços, o que muda é a mercadoria
que, no caso, são ativos financeiros (moeda nacional e estrangeira, ações, títulos
públicos e privados, commodities, mercado de opções: uma espécie de apólice
de seguro).
32
TÓPICO 3 | ESTRUTURA DA ANÁLISE MACROECONÔMICA
• Os intermediários financeiros não trabalham com recursos próprios, repassando
recursos dos ofertadores para os receptores.
• São responsáveis pela criação de condições para que os títulos e valores
mobiliários tenham liquidez no mercado.
NOTA
“Liquidez é um conceito econômico que considera a facilidade com que um ativo
pode ser convertido no meio de troca da economia, ou seja, é a facilidade com que ele pode
ser convertido em dinheiro. O grau de agilidade de conversão de um investimento sem perda
significativa de seu valor mede sua liquidez” (QUERO FICAR RICO, 2018, s.p., grifo do original).
Afinal, como o sistema financeiro funciona? A operacionalização do
sistema é feita pelo conjunto de instituições financeiras, que são classificadas
como pertencentes ao subsistema normativo ou de intermediação (operativo).
O subsistema normativo, como o nome já prenuncia, é responsável pelo
funcionamento do mercado financeiro e de suas instituições e é composto pelo
Conselho Monetário Nacional (CMN), órgão ao qual está vinculado o Banco
Central (BC) e a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), Conselho Nacional
de Seguros Privados (CNSP), que comporta a Superintendência de Seguros
Privados (SUSEP) e o Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), Conselho de Gestão
da Previdência Complementar (CGPC), que comporta o Serviço de Proteção ao
Crédito (SPC) e, ainda, instituições “especiais” como o Banco do Brasil (BB), o
Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e a Caixa
Econômica Federal (CEF).
NOTA
Por que instituições como o BB, BNDES e CEF são “especiais”? Elas são
responsáveis pela execução da política monetária do governo por meio de mercados
integrantes do SFN (de crédito, de capitais, monetário e cambial) e, ao mesmo tempo,
integram o subsistema operacional.
Já o subsistema de “intermediação financeira” é composto pelas
instituições bancárias e não bancárias. Sua função é operacionalizar o sistema, ou
seja, intermediar o fornecimento de ativos financeiros entre agentes deficitários e
superavitários, e é composto por instituições das mais diversas, como os bancos
comerciais (BB, BRADESCO, CEF etc.), bancos múltiplos, dentre outras.
33
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
TUROS
ESTUDOS FU
O estudo mais aprofundado sobre o SFN você terá na disciplina de Economia
Monetária.
O equilíbrio neste mercado ocorre quando:
Oferta de moedas e títulos = demanda de moedas e títulos
Quanto maior a quantidade de moeda circulando numa economia, menor
tende a ser o seu preço, já que a moeda também é uma mercadoria. Quando há
uma diminuição da quantidade de moeda disponível, a tendência é que ocorra
uma elevação em seu preço, que é determinado pela taxa de juros.
A taxa básica de juros da economia brasileira já deve ser conhecida por
você, já que o noticiário divulga de tempos em tempos mudanças na taxa, que são
determinadas pelo Conselho de Política Monetária (COPOM), órgão vinculado
ao CMN, órgão do qual integra, dentre outros, o Ministro da Fazenda, certo? Essa
mesmo, a SELIC, sigla de Sistema Especial de Liquidação e Custódia.
Historicamente, em comparação com outros países, a SELIC tem destaque
por ser uma das mais altas do mundo (em termos reais). De fato, ainda no início
de 2017 (com 12,90% a.a.) era a maior no ranking que leva em conta 40 países,
finalizando o ano com a taxa de 6,90% a.a. No início de 2018, caiu de quarto para
quinto lugar, passando para 6,75% a.a. (BANCO CENTRAL, 2018).
“Essa é a menor taxa nominal da série histórica, que tem início em 1986.
Com a Selic em 6,75% ao ano, os juros reais, ou seja, descontada a inflação,
atingiram 2,89% ao ano. Atrás do Brasil estão: Argentina: 6,05%; Turquia: 5,31%;
Rússia: 3,68%; México: 3,66%” (MARTELLO, 2018).
A SELIC é considerada a taxa básica da economia porque serve de
referência para as demais taxas de juros cobradas pelas instituições financeiras.
Assim, quanto mais alta é a SELIC, mais “cara” a moeda se torna e, assim, mais
difícil o acesso ao crédito, o que interfere de forma direta sobre a economia,
podendo gerar depressão econômica.
34
TÓPICO 3 | ESTRUTURA DA ANÁLISE MACROECONÔMICA
DICAS
Quer ler mais sobre o assunto? Acesse o link <http://www.valor.com.br/
cultura/4879800/taxa-real-de-juro-evolucao-e-perspectivas> e confira uma matéria de Barbosa
(2017), que aborda o tema: Taxa real de juro: evolução e perspectivas.
No Brasil, se não bastassem todos os problemas pelos quais estamos
passando, o sistema financeiro exerce uma influência enorme sobre a economia,
podendo-se inclusive afirmar que é este mercado que domina os demais, o que
gera um desequilíbrio enorme em todo o sistema econômico.
Vamos exemplificar: Você sabe qual foi a taxa anual de remuneração da
caderneta de poupança no ano de 2017? Segundo dados do Banco Central (2018),
o rendimento da caderneta de poupança em 2017 foi de 6,57%. E a taxa de juros
do cheque especial e do rotativo do cartão de crédito no mesmo ano? Em média,
estes valores chegaram a 471% e 791%, respectivamente, no ano de 2017 (QUERO
FINANCIAR, 2018).
Quer mais um exemplo? Veja no quadro a seguir quais foram as taxas
médias cobradas por algumas instituições financeiras para empréstimos em 2017:
QUADRO 2 – JUROS DE EMPRÉSTIMO: INSTITUIÇÕES BANCÁRIAS NO MÊS DE
DEZEMBRO DE 2017
Instituição
% a.m.
% a.a.
Banco do Brasil S.A.
4,41%
67,87%
Itaú Unibanco S.A.
4,44%
68,47%
Banco Santander
4,45%
68,62%
Caixa Econômica Federal
4,83%
76,14%
Bradesco
5,75%
95,64%
FONTE: Quero financiar (2018, s.p.)
Como você deve ter percebido no quadro, a diferença entre o que você
ganha quando deposita um valor na caderneta de poupança (ou qualquer outra
aplicação financeira) e o valor que você paga quando precisa de um empréstimo
bancário, especialmente nas modalidades cheque especial e rotativo do cartão de
crédito, é enorme. Não é por acaso que as instituições financeiras estão entre as
empresas com os maiores lucros ano após ano no Brasil.
35
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
A diferença entre o que os bancos pagam aos poupadores e o que cobram
dos credores é o que chamamos de spread bancário.
NOTA
“Spread é uma palavra em inglês que significa espalhar alguma coisa, e pode
ser usada como substantivo, significando propagação ou extensão. Também é uma palavra
bastante comum na área da economia, mais concretamente o spread bancário. [...] Na área da
economia, o spread bancário é a diferença entre o valor pago ao produtor por um determinado
produto e o valor que o consumidor paga por esse mesmo produto. O spread bancário também
está intimamente relacionado com taxas de juros, sendo que significa a diferença entre a taxa
de juros que um banco paga e a taxa de juros que é imposta por esse mesmo banco às pessoas
que requerem um empréstimo” (SIGNIFICADOS, 2018, s.p., grifo do original).
O Brasil está entre os países onde este spread é o mais elevado.
Mesmo em relação à taxa SELIC há grande diferença nos spreads bancários,
podendo-se afirmar que há uma verdadeira espoliação efetuada pelos bancos em
relação às taxas cobradas pelos empréstimos bancários, abrangendo tanto pessoas
físicas como jurídicas.
Assim, a moeda e os títulos, que deveriam estar disponíveis para quem
precisa investir na produção, como no caso dos empresários, ficam circulando
no mercado financeiro e tornam cada vez mais difícil o acesso ao crédito. Para
perpetuar essa ciranda financeira, os bancos criam novos títulos, estimulando os
investidores a deixarem suas economias no sistema financeiro ao invés de investir
no setor produtivo da economia.
Claro que essa situação não é exclusivamente verificada no Brasil. A
globalização financeira fez com que essa dependência do mercado financeiro
ocorra na maioria dos países, o que alguns economistas estão chamando de
financeirização da economia.
O que significa financeirização da economia? Para aprofundar esse
assunto, segue um texto de José Álvaro de Lima Cardoso (2017, s.p.):
O grande parasita da nação impõe sua política de guerra
O país atravessa a mais grave recessão da história, com dois anos
e meio de queda da produção industrial, diminuição da renda e elevação do
desemprego. Assim mesmo, o lucro líquido dos quatro maiores bancos do Brasil
cresceu 10,4% no 3º trimestre deste ano em relação ao mesmo período de 2016. A
soma dos lucros do Itaú, Bradesco, Banco do Brasil e Santander no período entre
36
TÓPICO 3 | ESTRUTURA DA ANÁLISE MACROECONÔMICA
julho e setembro alcançou R$ 13,6 bilhões ante R$ 12,3 bilhões no mesmo período
do ano passado. O maior lucro foi o do Itaú Unibanco, que chegou a R$ 6,077
bilhões. Dos três bancos, dois são privados, um inclusive, estrangeiro.
O setor financeiro no Brasil se apropria de cerca de R$ 600 bilhões por
ano, em juros da dívida pública e de quase 50% do orçamento púbico federal.
Além disso, não cumpre a função que deveria ser a razão de sua existência, que
é a disponibilização e intermediação do crédito, e fatura lucros exorbitantes,
totalmente descolados da realidade econômica geral do país. O setor financeiro
privado é como um grande parasita, uma “solitária” gigante, que vive de juros
e absorve 6% ou 7% do PIB nacional sem apertar um parafuso. O que o Brasil
que trabalha, ganha sustentando esse sistema parasitário? Empobrecimento e
penúria para a população, e impossibilidade do país se desenvolver.
O Congresso acabou de aprovar a contrarreforma trabalhista, que
coloca os direitos trabalhistas de volta ao século XIX. Somente com a queda
de renda decorrente dessa medida, assistiremos, nos próximos anos, à maior
transferência de renda dos trabalhadores para a burguesia de toda a história
do Brasil. Como as novas regras desfavorecem completamente o trabalho,
a renda irá cair dramaticamente e os salários dos trabalhadores irão perder
poder aquisitivo. A contrarreforma veio para isso mesmo: reduzir o custo da
força de trabalho, para compensar a crise mundial do capitalismo, que afeta
os lucros dos grandes grupos econômicos. Somente os empresários que não
dependem do mercado interno, ou que estão muito equivocados na análise da
conjuntura, é que podem estar contentes com a destruição de direitos. Mesmo
para os empresários que exportam todo o seu produto, é muito temerário
apostar numa saída que tornará a vida em sociedade no Brasil, insuportável
nas próximas décadas.
A dilapidação de direitos trabalhistas compõe uma estratégia mundial
do capital. Os princípios da contrarreforma trabalhista, com adaptações em
cada país, foram implantados em mais de 110 países. Porém, no contexto
brasileiro, cuja população vinha num processo de melhoria das suas condições
de vida na última década antes do golpe, a contrarreforma trabalhista jamais
poderia ter sido aprovada num processo democrático. Ela só poderia ser
implantada mesmo em um processo de golpe radical contra a democracia. O
conjunto de ações do golpe vai contra os interesses da maioria e do mercado
consumidor interno, a começar pelo seu núcleo central: a) destruição da
regulação trabalhista; b) congelamento de gastos por 20 anos (Emenda da
Morte); c)destruição da seguridade social; e assim por diante.
Está também no centro do golpe a destruição da indústria e a
transformação do Brasil num fornecedor de matérias-primas baratas para os
centros industriais dos países ricos. Por isso estão desmontando rapidamente
a Petrobras e vendendo poços do pré-sal a menos de dois dólares o barril,
verdadeiro crime de lesa-pátria. Estão destruindo os mecanismos de que o
Estado dispõe para promover a recuperação da economia.
37
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
Aprovaram o fim da TJLP, criando a TLP, que trabalhará com taxas
próximas às do mercado, que pratica as maiores taxas do planeta. O BNDES,
que foi fundamental no enfrentamento da crise a partir de 2008, voltou a ter
níveis de empréstimos de 2003.
Estão liquidando o BNDES como instrumento de política industrial.
A fórmula de política econômica que está sendo implementada no
Brasil, um ultraneoliberalismo anacrônico, representa um assalto à renda e às
condições de vida do povo brasileiro. Tal política fracassou em todo o mundo.
Claro, um fracasso do ponto de vista da nação, porque as minorias enriquecem
com as privatizações e o torra-torra de patrimônio público. Se preparam agora
para destruir a seguridade social, um sistema fundamental para 100 milhões
de compatriotas. Na verdade, pretendem implodir o sistema público de
seguridade social, uma encomenda do sistema financeiro privado.
Se implementarem até o fim essa agenda de guerra, tendo ou não eleições
em 2018, deverá haver, mais cedo ou mais tarde, reação social. O conjunto de
maldades que está sendo encaminhado contra o povo e contra o país se tornará
cada vez mais evidente, até para os mais crédulos. Ficará cada vez mais claro
que foi aplicado um golpe dos poderosos, menos de 1% da população, contra
mais de 99% dos brasileiros. É uma questão de tempo. Neste contexto, qual
o sentido de o empresariado não especulativo e ligado ao mercado interno
apoiar a destruição do mercado consumidor e não cerrar fileiras contra todas
essas políticas? Será em função do processo de alienação política, dos ganhos
com o rentismo, ou é um pouco de cada coisa?
FONTE: <http://desacato.info/o-grande-parasita-da-nacao-impoe-sua-politica-de-guerra/>.
Acesso em: 8 ago. 2018.
DICAS
Indicação de leitura:
O dinheiro e a financeirização da economia mundial, de Paulo Nakatani. Disponível em:
<https://www.cartamaior.com.br/?/Editoria/Politica/O-dinheiro-e-a-financeirizacao-daeconomia-mundial/4/31520>.
38
TÓPICO 3 | ESTRUTURA DA ANÁLISE MACROECONÔMICA
5 O MERCADO DE DIVISAS
Utilizando a mesma dedução utilizada para analisar os demais mercados,
no mercado de divisas existe equilíbrio quando:
Oferta de divisas = demanda de divisas
Mas o que são divisas? Divisas é o nome dado às moedas estrangeiras, que
são utilizadas para as transações entre os países, hoje cada vez mais globalizados.
E como as divisas são precificadas? Como sabemos, as moedas também
são mercadorias e as divisas têm seu preço determinado pela taxa de câmbio. A
taxa de câmbio, por sua vez, é o valor que se paga, em moeda nacional, por uma
unidade de moeda estrangeira, que pode ser o dólar, euro, ou qualquer moeda
aceita no mercado de câmbio.
A moeda oficial utilizada nas transações internacionais é o dólar
americano. Com a crise financeira internacional de 2008, iniciada nos Estados
Unidos, tendo como ponto de partida a crise imobiliária, chegou-se até mesmo a
discutir a substituição do dólar como meio de pagamento oficial, mas ainda não
se chegou a um consenso sobre como seria possível utilizar um novo instrumento,
já que todas as moedas estão vinculadas ao seu país de origem e, por isso, sofrem
influência dos fenômenos econômicos internos.
Mas como é que se determina a taxa de câmbio, então? A taxa de câmbio é
determinada pela relação entre a demanda e a oferta de moeda estrangeira.
Quem são os demandantes e ofertantes nesse mercado? Vejamos: quando
um agente importador brasileiro fecha um contrato de importação, por exemplo,
com os Estados Unidos, pelo valor estipulado de U$ 2.000,00, este valor não pode
ser pago em reais. Logo, convertendo pela taxa de câmbio vigente na transação,
que era de, suponhamos, U$ 3,00, o importador pagará R$ 6.000,00 ao agente
de câmbio e terá os dólares necessários para efetuar a transação. Assim, além
do importador e do exportador, qualquer pessoa física (mesmo você ou alguém
da sua família quando viaja para o exterior ou faz uma compra internacional),
empresário ou agente público que precise efetuar uma transação com o
exterior, necessita comprar ou vender moeda estrangeira e a relação entre estes
demandantes e ofertantes é que vai determinar a taxa de câmbio daquele dia.
Quando você estudar economia internacional irá aprofundar esses
conceitos. Por ora é importante que você entenda que quando há um desequilíbrio
entre oferta e demanda de moeda estrangeira, sempre um dos agentes econômicos
fica prejudicado. Quando a taxa de câmbio está valorizada (dólar mais caro, por
exemplo), significa que o Brasil tem que desembolsar mais reais na transação,
o que prejudica especialmente os importadores, e quando a taxa de câmbio
está desvalorizada (dólar mais barato), os exportadores se sentem prejudicados
porque recebem menos reais para cada unidade de moeda estrangeira paga pelos
produtos exportados.
39
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
Na contabilidade social (ou nacional), quando estudamos uma das suas
contas, que é o balanço de pagamentos, você verá que quando exportarmos menos
(produtos e serviços, capitais, mão de obra etc.) do que importamos, teremos
um déficit em nosso balanço de pagamentos (ou seja, ficamos devendo para o
exterior) e quando ocorrer o contrário, seremos superavitários nas nossas contas
com o exterior, então buscar esse equilíbrio e, na medida do possível, o superávit
com o setor externo é uma das metas de política econômica dos países.
Por fim, agora que já tratamos dos mercados que compõem o lado real e
monetário da economia, você deve ter percebido o quanto todos esses mercados
estão inter-relacionados. Assim, um desequilíbrio havido em um desses mercados
poderá levar a um desequilíbrio em todo o sistema econômico.
Se ocorre uma diminuição da renda nacional (composta pela remuneração
na forma de salários, juros, lucros e aluguéis), poderá ocorrer uma diminuição
das despesas com consumo, desencadeando uma diminuição da produção e do
nível de emprego, que por sua vez poderá levar a uma queda no investimento
produtivo, interferindo nas relações com o setor externo, que consequentemente
afetam tanto o lado real como monetário da economia. Por isso, conforme serão
abordadas na Unidade 2, as políticas macroeconômicas visam restabelecer esse
equilíbrio, minimizando os efeitos deletérios que esses desequilíbrios causam no
mundo real.
40
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:
• Os lados reais e monetários da economia estão inter-relacionados, constituindo
os fluxos básicos da economia.
• O fluxo real é constituído pelo mercado de trabalho e o mercado de bens e
serviços.
• O fluxo monetário é constituído pelo pagamento, em unidades monetárias,
pelos fatores produtivos e bens e serviços, gerando o mercado financeiro e o
mercado de divisas.
• O mercado de bens e serviços determina o produto nacional e o nível geral de
preços.
• O mercado de trabalho determina o nível de emprego e o valor dos salários
nominais.
• O mercado financeiro, por sua vez, determina a taxa de juros e o estoque de
moeda.
• O mercado de divisas determina a taxa de câmbio.
• Ocorrendo equilíbrio em cada um desses mercados, ocorrerá equilíbrio em
todo o sistema econômico, e o contrário ocorrerá quando os mesmos estiverem
em desequilíbrio.
41
AUTOATIVIDADE
1 Por fluxo real entende-se o movimento dos recursos produtivos e de bens
e serviços entre os diversos agentes econômicos. Desta forma, assinale a
alternativa CORRETA:
a) ( ) O fluxo real representa o pagamento pela utilização dos recursos
produtivos.
b) ( ) As empresas vendem bens e serviços e compram recursos produtivos e
as famílias vendem recursos produtivos e compram bens e serviços, o
que representa o fluxo monetário da economia.
c) ( ) As empresas representam o lado monetário da economia e os
trabalhadores o lado real.
d) ( ) Os recursos produtivos são fornecidos somente pelo governo.
e) ( ) Nenhuma das alternativas anteriores.
2 Assinale a alternativa que completa a frase:
Como contrapartida monetária dos fluxos ________ temos os
fluxos monetários. Toda vez que um bem ou serviço é transferido de um
agente para outro, são efetuados pagamentos em troca deles. O fluxo _____
consequentemente gira em direção contrária ao fluxo real.
a) (
b) (
c) (
d) (
e) (
)
)
)
)
)
cambiais, real.
reais, monetário.
econômicos, cambial.
cambiais, monetários.
monetários, cambial.
3 Sobre o fluxo circular da atividade econômica, podemos afirmar que:
a) ( ) O fluxo circular da atividade econômica mostra de forma simplificada
a maneira pela qual indivíduos e empresas interagem na economia,
cada qual buscando atingir diferentes objetivos. As firmas procurando
maximizar a satisfação de seus desejos e necessidades e os indivíduos
visando maximizar seus lucros.
b) ( ) Qualquer que seja a empresa, agrícola, industrial ou de serviços,
necessita de recursos produtivos para operar.
c) ( ) O consumo representa a oferta total de bens e serviços dos indivíduos
em uma economia e que dependem da renda disponível desses
indivíduos.
d) ( ) Os indivíduos, utilizando os fatores de produção disponíveis,
produzirão bens e serviços que serão oferecidos às empresas.
e) ( ) Nenhuma das alternativas anteriores.
4 Por que uma taxa de juros mais baixa resulta em um aumento do
investimento produtivo na economia? Nesses casos, o que acontece com o
nível de consumo, renda e emprego?
42
TÓPICO 4
UNIDADE 1
POLÍTICA MACROECONÔMICA: LEGISLAÇÃO E
FINALIDADES
1 INTRODUÇÃO
Vimos anteriormente que a política macroeconômica é um conjunto de
ações governamentais desenvolvidas para o alcance de diferentes finalidades,
que estão intrinsecamente relacionadas com a situação econômica de um país e
mesmo de uma respectiva região, conjunto de países ou de blocos econômicos.
Entretanto, para que o governo possa de fato interferir na economia de
um país é necessária uma legislação que legitime e ampare esta intervenção.
Neste tópico, você verá o que trata a Constituição da República Federativa
do Brasil (CRFB) de 1988 a respeito dos casos em que o Estado pode intervir na
economia, bem como verificará que são cinco os principais objetivos (finalidades,
metas) de política macroeconômica listados pela literatura econômica:
•
•
•
•
•
Alto nível de emprego.
Estabilidade de preços.
Crescimento econômico.
Distribuição equitativa da renda.
Equilíbrio nas contas externas.
2 A CONSTITUIÇÃO ECONÔMICA DO BRASIL
No caso do Governo Federal é a Constituição da República Federativa
do Brasil (CRFB) de 1988 que estabelece a forma pela qual irá acontecer esta
intervenção. No seio da CRFB está estabelecida a Constituição Econômica, ou
seja, as normas e princípios que regem a intervenção do Estado na economia.
43
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
O Título VII da CRFB, que trata da Ordem Econômica e Financeira, reza,
no Capítulo 1 (dos princípios gerais da atividade econômica), em seu art. 170 que:
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho
humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência
digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes
princípios: I- soberania nacional; II- propriedade privada; III- função
social da propriedade; IV- livre concorrência; V- defesa do consumidor;
VI- defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento
diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços
e de seus processos de elaboração e prestação; VII- redução das
desigualdades regionais e sociais; VIII- busca do pleno emprego; IXtratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas
sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no
País. Parágrafo único. É assegurado a todos o livre exercício de
qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de
órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei (BRASIL, 1988, s.p.).
É atribuição do Estado assegurar a todos existência digna, conforme os
ditames da justiça social.
Afinal, o que isso significa, na prática? É isso mesmo o que você deve
estar pensando: o que nós abordamos no início deste material didático, sobre o
objeto da economia, podemos nos referir novamente, acrescentando o que hoje
é também papel do Estado: atender às necessidades de toda a sociedade e não
apenas de alguns grupos econômicos.
Ao longo da história do capitalismo, podemos observar que este é um
modo de produção que cria e reproduz desigualdades, já que se trata de uma
sociedade dividida em duas classes sociais: o capital e o trabalho, sendo este
último o lado mais fraco nesta relação.
Assim, garantir uma existência digna implica em executar ações que façam
com que todos tenham acesso à moradia, educação, saúde, segurança, inclusão
social, um meio ambiente preservado, direitos de consumidor assegurados,
redução das desigualdades regionais e assim por diante.
E, ainda, garantindo a soberania nacional. Mas o que isso significa?
Na etimologia da palavra, “soberania é a qualidade de algo ou alguém
que é soberano, isto é, uma autoridade superior (com mais poder e domínio) em
comparação aos demais” (SIGNIFICADOS, 2018, s.p., grifo do original).
Desse modo, podemos citar que nas monarquias o rei era o soberano,
aquele que fazia as leis e as impunha aos seus súditos, independentemente da
vontade destes.
Já em um Estado Republicano, como é hoje a maioria dos países, a
soberania deveria pertencer ao povo. Assim, de acordo com Rousseau (1973),
a soberania não é outra coisa, senão o exercício da vontade geral, sendo esta a
vontade do povo e tendendo sempre ao bem comum.
44
TÓPICO 4 | POLÍTICA MACROECONÔMICA: LEGISLAÇÃO E FINALIDADES
Com relação à soberania nacional econômica, que em nosso caso é a que
mais nos interessa, frente aos demais países, de acordo com Noble (2014, s.p.):
São elementos centrais da soberania econômica de um país,
fundamentalmente em tempos de globalização: a defesa da produção
nacional, a conquista de novos mercados no exterior, com o consequente
crescimento da participação do país no mercado internacional, o
equilíbrio das contas externas, e a geração de uma tecnologia nacional
altamente competitiva.
Infelizmente, no caso do Brasil, a soberania nacional, tão intensamente
defendida na Constituição de 1988, vem sofrendo consecutivos ataques nos
últimos anos desta década.
Assim, no que se refere à defesa da produção nacional, especialmente
em tempos de globalização, o Estado deveria proteger as empresas nacionais
em detrimento das estrangeiras. Quando uma empresa brasileira fecha, em
decorrência de uma falência pela concorrência com outra externa, empregos,
renda e riqueza do país também são afetados diretamente.
Vemos que as multinacionais avançam sobre o Brasil de forma assustadora
nas últimas décadas para explorar nossas riquezas naturais, nossa diversidade
biológica e até nossos empregos, além do fato de que a riqueza gerada por essa
exploração é levada para fora do país, na forma de lucros e dividendos para a
multinacional.
Para que o Brasil possa ter destaque no comércio mundial, o governo deve
adotar estratégias de inserção que aumentem sua soberania nacional, ou seja, não
deve ser dominado por outro país ou por um conjunto de outros países, como
acontece no caso do domínio americano sobre muitas nações.
No que se refere à geração de uma tecnologia nacional altamente
competitiva, as privatizações que se intensificaram no Brasil a partir de 1990, além
de contribuírem para a desnacionalização da economia brasileira, aceleraram o
processo de “desindustrialização” (diminuição do número de indústrias) no país.
Com certeza você sabe o que significa privatização. Em todo caso, de acordo
com Pena (2018, s.p.), “entende-se por privatização o processo de transferência
de órgãos ou empresas estatais (pertencentes ao Estado, portanto, públicos)
para a iniciativa privada por meio da realização de vendas, que costumam ser
instrumentalizadas a partir de leilões públicos” (grifo do original).
Isso quer dizer que um patrimônio que antes era público (em outras
palavras, do povo), passa para as mãos da iniciativa privada, a exemplo do que
ocorreu com a Companhia Vale do Rio Doce, em 1997, quando foi vendida por R$
3,3 bilhões, o que, de acordo com Sthephanowitz (2018), equivalia a apenas 3,3%
do valor estimado de suas reservas de minério de ferro, que era de R$ 100 bilhões
na época.
45
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
Assim, mais de uma centena de empresas públicas já foram privatizadas
nas últimas décadas, deixando o Brasil ainda mais subserviente aos interesses do
capital internacional, de acordo com as recomendações que foram ditadas pelo
Consenso de Washington, realizado em 1989.
[Este] apresentava uma série de recomendações econômicas que
funcionaram como instrumento de pressão internacional para a adoção
do neoliberalismo, principalmente pelos países subdesenvolvidos.
Dessa forma, muito instrumentalizadas pelo FMI, as recomendações
desse consenso foram amplamente difundidas no Brasil, das quais as
privatizações são destaque (PENA, 2018, s.p.).
Quanto mais empresas públicas forem privatizadas, menor será o
tamanho do Estado e menor será a capacidade deste em realizar ações e investir
na economia do país, visando justamente atender ao que está propugnado na
própria Constituição Econômica.
3 OBJETIVOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
Como já afirmamos, a política macroeconômica visa ao atendimento de
diversos objetivos. A literatura enumera pelo menos cinco: alto nível de emprego;
estabilidade de preços; crescimento econômico; distribuição equitativa da renda;
e, equilíbrio nas contas externas.
Vamos tratar de cada um deles especificamente.
3.1 ALTO NÍVEL DE EMPREGO
Acompanhando as notícias econômicas divulgadas, é muito comum ouvir
indicadores do nível de desemprego do país. É claro que você sabe da importância
que a geração de emprego tem para a economia de qualquer país, já que o salário,
que nada mais é do que a remuneração pelo fator de produção trabalho, é um
dos componentes da renda nacional agregada. Assim, se o nível de desemprego
aumenta, diminui a massa salarial, que faz pressionar para baixo o consumo,
afetando igualmente a produção e a renda e assim sucessivamente.
Entretanto, é preciso que se faça aqui uma distinção entre o pensamento
liberal e marxista/keynesiano sobre o desemprego.
Para a teoria liberal, o nível de emprego é um problema conjuntural, ou
seja, de curto prazo. O pensamento liberal acredita que:
Os mercados, sem interferência do Estado, conduziriam a economia ao
pleno emprego de seus recursos, ou ao seu produto potencial: milhões
de consumidores e milhares de empresas, como que guiados por uma
‘mão invisível’, determinariam os preços e a produção de equilíbrio,
e, desse modo, nenhum problema surgiria no mercado de trabalho
(VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 88).
46
TÓPICO 4 | POLÍTICA MACROECONÔMICA: LEGISLAÇÃO E FINALIDADES
Ao analisar a evolução do capitalismo desde a Revolução Industrial,
no período entre o final do século XVIII até o início do século XX, quando o
desenvolvimento tecnológico e a produção foram crescentes e demandando
muita mão de obra, pode-se afirmar que, de certa forma, neste interregno, não
havia flutuações tão grandes no emprego.
A história revela que, com a implantação e o desenvolvimento do
capitalismo, vieram a consciência da luta de classes, já que os trabalhadores se
mobilizavam para garantir direitos fundamentais, que não existiam; a jornada
de trabalho era de 16 a 18 horas semanais, a condição de trabalho na maioria
das situações era desumana, os salários aviltantes, o que fez surgir e solidificar
os sindicatos de trabalhadores que, organizados, exigiam melhores salários
e condições de trabalho. Além disso, o comércio internacional e o mercado de
capitais também se intensificaram, trazendo incerteza e insegurança para os
agentes econômicos sobre o real funcionamento da economia.
A Grande Depressão Econômica de 1930, iniciada com a quebra da Bolsa
de Valores de Nova York em 1929, atingindo a maioria dos países do mundo
ocidental, pôs em xeque este entendimento, já que milhares de trabalhadores
ao redor do mundo perderam seus empregos, centenas de empresas faliram,
ocorreram suicídios de muitos empresários que tiveram suas empresas falidas,
o que levou à constatação de John Maynard Keynes (afirmação esta já atribuída
a Marx [1890]), de que o desemprego não é um problema conjuntural, mas
estrutural, ou seja, é inerente ao modo de produção capitalista.
Marx trata dessa questão quando aborda o exército industrial de reserva,
peça-chave para que o capitalista possa extrair mais-valia do trabalhador que,
com medo de perder o emprego (já que há muitos desempregados esperando por
uma vaga), aceita trabalhar por um salário cada vez menor.
Marx (apud DANTAS, 2016, s.p.) afirma que:
Há no capitalismo uma “lei de salários”, isto é, uma norma que é a
seguinte: o sistema capitalista necessita de que haja constantemente
um exército de desempregados, de forma que a patronal possa usar
os trabalhadores sem emprego para pressionar pelo rebaixamento
dos salários de quem está empregado. ‘Aceite o salário que te pago
caso contrário alguém lá fora pega seu lugar e ainda aceita salário
menor’. Esse ‘alguém lá fora’ vem a ser justamente aquela multidão de
trabalhadores desempregados, nas periferias das cidades, no campo
ou as próprias mulheres dos trabalhadores, todos em uma posição
mais frágil, mais carente ou mais defensiva ao ponto de aceitarem
substituir o trabalhador demitido inclusive por um salário menor
do que ele ganhava. O chamado terceirizado, o precarizado, vem a
ser justamente isso: a massa de trabalhadores que o sistema lança no
desemprego absoluto e na carência profunda.
47
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
A partir dessa constatação, de ser o desemprego um componente
estrutural do capitalismo, Keynes, no célebre livro Teoria Geral do Emprego, do Juro
e da Moeda, de 1936, “forneceu aos governantes os instrumentos necessários para
que a economia recuperasse seu nível de emprego potencial ao longo do tempo”
(VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 88).
A principal contribuição de Keynes, implantada por governantes de
diversos países, foi no sentido de comprovar que para debelar a recessão que
assolava os países, os Estados Nacionais deveriam intervir na economia que, até
aquele momento, não sofria uma intervenção direta por parte do Estado.
Mas que tipo de intervenção seria essa? O Estado, utilizando recursos
públicos, investiria na construção de estradas, rodovias, ferrovias, hospitais e
demais bens públicos, demandando, além de matérias-primas e insumos por
parte das empresas, mão de obra assalariada para execução das obras, o que
geraria um aumento da renda nacional, que induziria a um aumento na demanda
nacional e, consequentemente, no nível de produção das empresas, elevando a
riqueza do país e resgatando o país da recessão econômica.
Keynes (1983) também asseverou que o investimento produtivo e a
inovação tecnológica são importantes para gerar competitividade ao país, mas
podem gerar novo ciclo de desemprego (o que ele chamou de paradoxo do
investimento), haja vista que em geral novas tecnologias demandam menos mão
de obra, o que se verifica na prática se formos analisar a evolução do emprego
formal por setor econômico, como já abordamos anteriormente.
Além desse fator, temos um outro agravante: novas tecnologias, que
mudam cada vez mais rapidamente, exigem um grau de conhecimento e
especialização cada vez maior por parte da classe trabalhadora, o que cria o
chamado ‘trabalhador marginal’, que fica à margem da sociedade porque não
consegue acompanhar essa evolução e perde a possibilidade de encontrar
emprego no mercado formal. Por isso que, no Brasil, cresce assustadoramente o
mercado informal de trabalho.
DICAS
Para saber mais a respeito do que ocorre com o mercado de trabalho no
Brasil, acompanhe as discussões sobre a Reforma Trabalhista, que precarizou as relações de
trabalho no Brasil e contribui ainda mais para o aumento do mercado informal de trabalho.
Uma boa indicação de leitura é a Nota Técnica nº 1278, de maio de 2017, do
Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), cujo
download pode ser efetuado no link: <https://www.dieese.org.br/notatecnica/2017/
notaTec178reformaTrabalhista.html>.
48
TÓPICO 4 | POLÍTICA MACROECONÔMICA: LEGISLAÇÃO E FINALIDADES
3.2 ESTABILIDADE DE PREÇOS
Você já deve ter ouvido diversas vezes os economistas falarem da
importância da estabilidade de preços. Mas você sabe qual é o real significado de
estabilidade?
Na etimologia da palavra, estabilidade é a qualidade de estável (que
mantém o equilíbrio, não varia e permanece no mesmo lugar durante muito
tempo). O termo deriva do latim stabilitate” (CONCEITO.DE, 2018).
A estabilidade é uma palavra que designa diversas concepções, como
podemos observar em alguns exemplos: a) no serviço público indica que o servidor
terá a garantia de permanência no trabalho, não podendo ser demitido; b) na
política indica que há convergência de ideologias, competência para resolver e/ou
prevenir crises; c) na saúde indica que o paciente está estável, ou seja, responde
bem ao tratamento; d) na construção civil indica que a obra está em equilíbrio,
não corre risco de sofrer algum colapso.
E para os preços? Indica que os preços dos mais diferentes tipos de bens
estão estáveis, ou seja, constantes, o que significa dizer que não há inflação.
Define-se inflação “como o aumento contínuo e generalizado no nível
geral de preços” (VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 88).
Sendo contínuo, significa dizer que não se pode confundir com elevações
“sazonais” de preços, aquelas oriundas de efeitos adversos, por exemplo, uma
queda de granizo, que afeta a oferta de alimentos de ciclo curto de produção,
como as verduras e legumes, ou então aquelas havidas pela diminuição da oferta
conforme a estação do ano, como a produção leiteira. E generalizado, pois afeta
todas as cadeias de produção, atingindo todos os setores da economia.
A inflação é um dos maiores problemas econômicos, pois como a
história econômica já constatou, gera inúmeras distorções, afetando diretamente
a distribuição de renda de um país, bem como as expectativas dos agentes
econômicos e o balanço de pagamentos (VASCONCELLOS; GARCIA, 2005).
A distribuição de renda é afetada, pois quando os preços dos bens
aumentam, diminui o poder de compra de certos indivíduos (que dependem de
rendimentos fixos), afetando mais fortemente os assalariados, pois com o mesmo
salário recebido no início do mês não é possível adquirir a mesma quantidade de
produtos ao longo do mês, pois os mesmos são reajustados mais frequentemente em
relação ao reajuste salarial. Esta realidade ainda é agravada porque o trabalhador
geralmente utiliza todo seu salário na aquisição de bens de consumo, não podendo,
portanto, aplicar sua renda no sistema financeiro com o intuito de manter o poder
de compra da moeda por meio dos juros. Os donos do capital, entretanto, como
têm um fluxo de rendimentos mais flexível, pois recebem suas rendas provenientes
de lucros, juros e aluguéis em dias alternados, conseguem manter seu poder de
compra, aumentando assim a desigualdade entre pobres e ricos.
49
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
No que se refere às expectativas dos agentes econômicos (consumidor,
empresas e governo), os mesmos são afetados porque criam-se incertezas com
relação a investimentos produtivos (se é apropriado investir na implantação de
uma nova fábrica, na construção de uma casa, no financiamento de um automóvel
ou mesmo em um imóvel, na realização de uma obra pública, por exemplo), pois
o retorno esperado desse investimento pode não compensar economicamente,
ou no caso de empréstimos, pode não haver possibilidade de quitar as dívidas
pelo aumento do valor das prestações. Os agentes econômicos preferem deixar
suas economias em aplicações financeiras (mais seguras) do que utilizar estes
recursos em projetos de longo prazo, pois o risco de prejuízo é tanto maior quanto
mais incerto é o investimento. Assim, pode resultar numa paralisia do sistema
econômico, gerando decréscimo no consumo, desemprego, dentre outros fatores.
A própria fixação de novos preços pelos agentes econômicos também fica
afetada, pois há incertezas no sentido de prever se a inflação persistirá nos meses
seguintes, o que levaria, em tese, os agentes a aumentarem os preços de seus
produtos e serviços. No Brasil, como já afirmamos, houve um período chamado
de inflação inercial (nas décadas de 1980-1990), quando os preços dos produtos
e serviços eram aumentados sistematicamente pelos agentes econômicos de um
período para outro, sem a verificação da real ocorrência de tal subida dos preços,
o que retroalimentava a inflação.
A inflação inercial ocorre quando os preços de uma economia oferecem
resistência às políticas de estabilização para atacar as causas primárias
da inflação, é a chamada memória inflacionária. Essa inflação inercial
é decorrente de mecanismos de indexação, que reajustam o valor
das parcelas de contratos pela inflação do período passado, ou seja,
mesmo que não tenha uma razão do preço aumentar, ele aumenta
baseado nessa memória inflacionária (CULTURAMIX, 2012, s.p., grifo
da autora).
Finalmente, em relação ao balanço de pagamentos, um país com altas
taxas de inflação pode facilmente perder a competitividade no comércio mundial,
já que os preços dos seus bens e serviços se tornam mais “caros” em comparação
com os demais países com os quais mantêm relações comerciais, levando a
diminuições da demanda e, consequentemente, exportando menos. Assim,
se o valor das exportações passa a ser inferior ao valor das importações, gera
um déficit no balanço de transações correntes (uma das contas do balanço de
pagamentos), o que pode acarretar inclusive, dependendo do comportamento
das demais contas (de capital e financeira e de erros e omissões), em déficit no
citado balanço de pagamentos.
Além da inflação inercial, já mencionada anteriormente, temos a inflação
de demanda e a inflação de custos.
A inflação de demanda “diz respeito ao excesso de demanda agregada em
relação à produção disponível de bens e serviços (oferta agregada)” (NOGAMI;
PASSOS, 2003, p. 500).
50
TÓPICO 4 | POLÍTICA MACROECONÔMICA: LEGISLAÇÃO E FINALIDADES
Para você não deve ser difícil entender: há mais pessoas procurando bens
e serviços do que bens e serviços disponíveis para venda. Ou, por analogia, há
muita moeda disponível à procura de poucos bens. Esse fenômeno costuma
ocorrer quando se verifica um crescimento na renda dos agentes econômicos, que
pode ser por meio do crescimento econômico do país.
Entretanto, há “estudos que admitem que o governo, ao financiar seus
déficits através da emissão de moeda, origina o processo inflacionário. Essa é a
visão monetarista da inflação” (NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 500).
Já a inflação de custos
[...] pode ser associada a uma inflação tipicamente de oferta. O nível de
demanda permanece o mesmo, mas os custos de certos fatores importantes
aumentam. Com isso ocorre uma retração da produção, deslocando
a curva de oferta do produto para trás, provocando um aumento dos
preços de mercado (VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 184).
Caro acadêmico, você tem alguma ideia das principais causas do aumento
dos custos de produção? Pois bem, os mais comuns são o aumento do custo das
matérias-primas (lembre-se sempre do petróleo, um dos insumos ainda mais
utilizados nas cadeias produtivas); reajustes salariais, pressões nos preços dos
produtos oferecidos por setores monopolizados (em que uma empresa domina
a oferta do produto, como a Microsoft) ou oligopolizado (em que apenas
poucas empresas dominam a oferta do produto, como os setores farmacêutico,
automotivo, dentre outros) (VASCONCELLOS; GARCIA, 2005).
TUROS
ESTUDOS FU
Especificamente sobre a inflação, você terá acesso ao conteúdo na disciplina
de Macroeconomia II.
Para complementar este estudo inicial, segue um texto que vai ajudá-lo a entender alguns
pontos importantes sobre a história da inflação no Brasil.
HISTÓRIA DA INFLAÇÃO NO BRASIL
O Brasil e a Hiperinflação
A hiperinflação ocorre quando a inflação fica elevadíssima e fora de controle. Além de corroer
o poder de compra do consumidor, a alta generalizada e contínua dos preços costuma
provocar recessão e desvalorização acentuada da moeda. No Brasil, a hiperinflação ocorreu
entre as décadas de 1980 e 1990, quando a inflação galopante chegou a superar os 80% ao
mês, ou seja, o mesmo produto chegava a quase dobrar de preço de um mês para o outro.
Dados da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (FIPE) mostram que entre 1980 e
1989, a inflação média no país foi de 233,5% ao ano. Na década seguinte, entre os anos de
1990 e 1999, a variação anual subiu para 499,2%.
51
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
As causas da hiperinflação brasileira
As causas da hiperinflação no país costumam ser relacionadas ao aumento dos gastos
públicos durante o governo militar e pela elevação do endividamento externo, agravado
pela crise mundial derivada do aumento dos preços do petróleo e pela retração na taxa
de expansão da economia. A política de substituição das importações – que vinha desde
o governo Juscelino Kubitschek – fez crescer os gastos públicos, e o "milagre econômico"
entre o final dos anos 1960 e o início da década de 1970 (quando a economia brasileira
cresceu à média de 10% ao ano) foi financiado por empréstimos internacionais. A partir
de 1973, quando a crise internacional do petróleo fez o custo do barril subir 400% em três
meses, de US$ 2,90 para US$ 11,65, a economia brasileira passou a apresentar taxas de
inflação crescentes. O PIB já não crescia tanto, e o Brasil entrou na década de 1980 com o
pé esquerdo: inflação, dívida externa elevada e indústria defasada.
Na hiperinflação crônica, as causas se sucedem e se realimentam. O choque do petróleo
pode ter dado início à crise hiperinflacionária, mas ela foi intensificada por desvalorizações
da moeda, para manter o Brasil competitivo (com uma maxidesvalorização em 1979); e pelo
aumento do dinheiro em circulação para financiar a dívida externa.
Foram cerca de 15 anos de inflação acima de dois dígitos e de correção monetária.
Comerciantes remarcavam diariamente os preços dos produtos, que sumiam rapidamente
das prateleiras, já que a população estocava alimentos por temer as sucessivas altas. Preços
e salários eram reajustados automaticamente assim que era divulgada a inflação do mês
anterior, criando o efeito bola de neve, em que a inflação de um mês era imediatamente
repassada para o mês seguinte.
Quem mais perdia com a hiperinflação eram os mais pobres, que não podiam se defender das
perdas colocando o dinheiro em aplicações que rendessem juros diários e acompanhassem
a desvalorização da moeda.
O Plano Cruzado
O Plano Cruzado foi um conjunto de medidas econômicas, lançado pelo governo brasileiro
em 28 de fevereiro de 1986, com base no Decreto-Lei nº 2.283, de 27 de fevereiro de 1986.
Na época, o presidente da República era José Sarney e o ministro da Fazenda era Dilson
Funaro.
O Plano Cruzado foi o primeiro plano econômico nacional em larga escala desde o término
da ditadura militar.
Em 1986, o Plano Cruzado congelou preços, e a carne sumiu dos supermercados.
Principais medidas do Plano Cruzado
As principais medidas contidas no plano foram:
• congelamento de preços de bens e serviços; congelamento da taxa de câmbio;
• reforma monetária, com alteração da unidade do sistema monetário, que passou a
denominar-se cruzado (Cz$), cujo valor correspondia a mil unidades de cruzeiro;
• substituição da Obrigação Reajustável do Tesouro Nacional (ORTN – (título da dívida
pública instituído em 1964), pela Obrigação do Tesouro Nacional (OTN), cujo valor foi
congelado por um ano;
• congelamento dos salários pela média de seu valor dos últimos seis meses e do salário
mínimo em Cz$ 804,00, que era igual a aproximadamente a US$ 67,00 de salário mínimo;
52
TÓPICO 4 | POLÍTICA MACROECONÔMICA: LEGISLAÇÃO E FINALIDADES
• como a economia fora desindexada, instituiu-se uma tabela de conversão para transformar
as dívidas contraídas numa economia com inflação muito alta em dívidas contraídas em
uma economia de inflação praticamente nula;
• criação de uma espécie de seguro-desemprego para aqueles que fossem dispensados
sem justa causa ou em virtude do fechamento de empresas;
• os reajustes salariais passaram a ser realizados por um dispositivo chamado gatilho
salarial ou seguro-inflação, que estabelecia o reajuste automático dos salários sempre que
a inflação alcançasse 20%.
Plano Verão
O Plano Verão, instituído em 16 de janeiro de 1989, foi um plano econômico lançado pelo
governo do presidente brasileiro José Sarney, realizado pelo ministro Maílson Ferreira da
Nóbrega, que havia assumido o lugar de Bresser Pereira.
Devido à crise inflacionária da década de 1980, foi editada uma lei que modificava o índice de
rendimento da caderneta de poupança, promovendo ainda o congelamento dos preços e
salários, a criação de uma nova moeda, o Cruzado Novo, inicialmente atrelada em paridade
com o dólar e a extinção da OTN, importante fator de correção monetária.
Assim como ocorreu no Plano Bresser, o Plano Verão também gerou grandes desajustes às
cadernetas de poupança, em que as perdas chegaram a 20,37%. Nenhuma regra foi definida
em relação a ajustes salariais. Atualmente, até dezembro de 2008, estas perdas podem ser
reclamadas na justiça.
Cruzado Novo
Em 1989, o governo lançou o Cruzado Novo: o dinheiro perdeu zeros, a taxa de juros subiu
e o crédito desapareceu.
Plano Real
Após quase uma dezena de planos econômicos fracassados, o Plano Real marcou o final do
período de instabilidade monetária e altas taxas de inflação, que chegaram a atingir 5.000%
ao ano, de julho de 1993 a junho de 1994. Junto com o plano, veio a nova moeda, o real – a
quinta à qual os brasileiros tiveram que se acostumar em uma década.
Lançado no início de 1994, durante o governo Itamar Franco, o plano baseou-se, num
primeiro momento, no equilíbrio das contas do governo, iniciado ainda no ano anterior, com
redução de gastos, aumento de impostos e privatizações. O governo também promoveu a
desindexação da economia – isto é, a inflação passada deixou de corrigir automaticamente
preços e salários.
Para os brasileiros, a medida mais visível foi a nova troca de moeda. Antes do real, a moeda
que circulava no país era o cruzeiro real (CR$), vigente de 1º de agosto de 1993 até 30 de
junho de 1994. Em fevereiro de 1994, foi criada a Unidade Real de Valor (URV), uma moeda
fictícia, cujo valor, em cruzeiros reais, era estabelecido diariamente. Assim, a hiperinflação
seguia em cruzeiros reais, mas não em URVs. Em 1º de julho de 1994, uma URV passou a ser
igual a R$ 1, o novo dinheiro entrou em circulação no país.
Distribuir as notas e moedas do real pelo país foi uma das maiores operações de logística já
vistas. Para a equivalência, o valor da nova moeda foi fixado com a cotação da URV do dia
anterior, que era de 2.750 cruzeiros reais. Dessa forma, CR$ 5.000 equivaliam a cerca de R$
2 – o suficiente para comprar, na época, meio quilo de carne, três litros de leite ou duas latas
de refrigerante, por exemplo. Entre as medidas para controlar os preços, o governo também
53
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
promoveu uma abertura maior às importações, e adotou as chamadas âncoras cambial e
monetária.
A âncora cambial instituiu o regime de bandas cambiais que, na prática, fixava o valor da
moeda e barateava o custo dos importados. Já a âncora monetária buscava controlar o
volume de dinheiro em circulação, evitando a pressão sobre os preços. Para isso, foram
elevadas a taxa de juros e as reservas compulsórias dos bancos (recursos que eles são
obrigados a deixar guardado no Banco Central).
Essas âncoras foram substituídas, em 1999, pelo regime de metas de inflação, em que as
autoridades monetárias se comprometeram a cumprir metas estabelecidas para o ano
corrente e próximo – o que ancora as expectativas do mercado. Uma das formas de buscar
atingir essa meta é por meio da taxa Selic. Ao elevar os juros, o governo encarece o custo
do dinheiro, e faz cair a procura por produtos e serviços à venda.
O controle da inflação pela taxa de juros
Para manter o nível de inflação esperado, o governo faz uso da política monetária, por
meio da taxa básica de juros, a Selic. Assim, caso o BC observe que a inflação corre o
risco de superar a meta, a tendência é elevar os juros. A taxa de juros foi o instrumento
escolhido pelo governo, pois ela determina o nível de consumo do país, já que a taxa Selic é
utilizada nas transações bancárias e, portanto, influencia os juros de todas as operações na
economia. A Selic é utilizada pelos bancos como um parâmetro. A partir dela, as instituições
financeiras definem quanto vão cobrar por empréstimos às pessoas e às empresas. Caso os
juros do país estejam altos, o consumidor tende a comprar menos, porque a prestação de
seu financiamento vai ser mais alta. Isso reflete na queda da inflação. Segundo a lei da oferta
e da procura, quanto maior a demanda por um determinado produto, mais elevado é o
seu preço. Do contrário, se uma mercadoria ou serviço não forem tão procurados, o preço
tende a cair para atrair mais compradores.
Principais indicadores de inflação do Brasil
No Brasil há diversos índices de inflação. Os diferentes índices utilizam em seus cálculos
faixas de renda diferentes, regiões diferentes, itens diferentes e até períodos diferentes. Isso
contribui para tornar mais segura a medição da inflação no país. Confira abaixo os mais
conhecidos:
Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA)
Índice Geral de Preços – Mercado (IGP-M)
Índice Geral de Preços – Disponibilidade Interna (IGP-DI)
Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC)
Índice de Preços ao Consumidor Semanal (IPC-S)
Índice de Preços ao Consumidor – Fipe (IPC-FIPE)
Índice Nacional da Construção Civil (INCC)
FONTE: <https://br.advfn.com/economia/inflacao/brasil/historia>.
Acesso em: 10 ago. 2018.
54
TÓPICO 4 | POLÍTICA MACROECONÔMICA: LEGISLAÇÃO E FINALIDADES
3.3 CRESCIMENTO ECONÔMICO
Não se pode negar a importância do crescimento econômico para as
nações, não é mesmo? Você, com certeza, sabe que o crescimento econômico é
aquele que diz respeito à economia, ou seja, aquele que aumenta a riqueza de um
país, sendo esta medida por meio do Produto Nacional Bruto (PNB).
Exemplificando, um país cresce economicamente quando aumenta sua
riqueza de um ano para outro, que pode se dar por meio de um incremento na
produção agrícola, industrial, dentre outros, de forma isolada ou envolvendo
diversos setores econômicos.
Além do PNB é comum utilizar a renda per capita para medir o crescimento
econômico, que nada mais é do que o PNB dividido pela população. Assim,
teremos o valor que cada cidadão, em tese, deveria possuir em relação à riqueza
produzida. Por que grifamos? Certamente você já sabe o motivo: a riqueza não
é bem distribuída para todos os cidadãos, pois esse crescimento pode beneficiar
apenas determinados grupos, como é comum acontecer no Brasil. Então a renda
per capita é apenas uma média, necessitando de outros indicadores para medir a
qualidade de vida e a distribuição de renda, como veremos adiante.
Desde a Grande Depressão, os Estados Nacionais têm utilizado políticas
macroeconômicas para estimular o crescimento econômico, pois em diversos
períodos de crise do capitalismo, como as que ocorreram na década de 1970
(com as altas do preço do petróleo) e aquela iniciada em 2008 (crise imobiliária/
financeira), que ainda perdura, foi necessária a presença do Estado para ajudar a
economia a se reerguer.
Uma distinção se faz necessária: há controvérsias entre os economistas no
que se refere a afirmar que crescimento e desenvolvimento são sinônimos (têm
o mesmo significado). “Via de regra, os manuais têm consagrado crescimento
como ‘taxas positivas de crescimento do PIB’, enquanto desenvolvimento, além
de supor crescimento, exige melhoria dos indicadores sociais e de bem-estar”
(FONSECA, 2004, p. 270).
Percebe-se que essa discussão passa por questões bastante subjetivas, por
estarem carregadas de apelo ideológico. Mas, o que é ideologia?
Em um sentido amplo, significa aquilo que seria ou é ideal.
Este termo possui diferentes significados, sendo que no senso
comum é tido como algo ideal, que contém um conjunto
de ideias, pensamentos, doutrinas ou visões de mundo de um
indivíduo ou de determinado grupo, orientado para suas ações sociais
e políticas (SIGNIFICADOS, 2018, s.p., grifo do original).
55
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
Assim, muitos afirmam que somente o desenvolvimento econômico
garante melhoria dos indicadores sociais (distribuição de renda, melhoria dos
serviços públicos, dentre outros), trazendo justiça social. Já o crescimento seria
apenas o aumento da riqueza material.
Há, entretanto, os que afirmam serem os mesmos sinônimos, pois:
Ambos se opõem à estagnação, ou seja, desenvolvimento/crescimento
ocorrem quando a economia cresce, expande-se a produção e a
acumulação de capital; a sociedade, assim, se reproduz, criando mais
bens e serviços para pôr à disposição de seus habitantes, segundo
determinadas regras de distribuição (FONSECA, 2004, p. 270).
Qual é a sua opinião? Fica aqui um ponto de reflexão.
3.4 DISTRIBUIÇÃO EQUITATIVA DA RENDA
Temos aqui outro conceito importante para a economia. Distribuir significa
repartir, certo? Renda é pagamento pela utilização dos fatores produtivos terra,
trabalho, capital e capacidade empresarial. E equitativa?
“Equitativo é um adjetivo da língua portuguesa e refere-se ao que é justo,
equivalente, imparcial e igual. De acordo com a definição, ser equitativo está
relacionado com o "ser justo", em um sentido moral e/ou ético. Ser honesto e
imparcial” (SIGNIFICADOS, 2018, s.p., grifo do original).
Agora você já deve ter decifrado a charada: há equidade de renda quando
a distribuição das riquezas de um país é igual para todos. Claro que chegar a essa
total igualdade é quase que impossível, mas como é um desejo e direito de todos,
é o que se busca. Porém, no que se refere a este quesito, o Brasil está classificado
em um triste ranking, justamente o que mede a disparidade de renda.
E
IMPORTANT
Dados constantes no Relatório do Desenvolvimento Humano (RDH), divulgados
em 2017 pelas Nações Unidas, utilizando o Índice de Gini, que é uma forma de calcular a
disparidade de renda (o indicador varia de 0 a 1, e quanto menor, menos desigualdade)
indicam que:
O Brasil ficou com 0,515 em 2015, mesmo número registrado
pela Suazilândia, e maior que vizinhos da América Latina, como
Chile (0,505) e México (0,482). O ranking é liderado pela África
do Sul, a nação mais desigual, com Gini de 0,634. Namíbia,
com 0,610, e Haiti, com 0,608, completam o top 3. Todos esses
três países têm Índices de Desenvolvimento Humano (IDH)
considerados baixos ou médios. O Brasil, que ficou estagnado
56
TÓPICO 4 | POLÍTICA MACROECONÔMICA: LEGISLAÇÃO E FINALIDADES
em 2015, tem IDH de 0,754, considerado alto. Já na parte
de baixo da tabela, a Ucrânia se destaca como país menos
desigual, com Gini de 0,241. Eslovênia (0,256) e Noruega (0,259)
completam a lista das economias com menores disparidades
de renda (O GLOBO, 2018, s.p.).
Isso significa que a desigualdade social no Brasil é muito grande, ou seja, que há poucas
pessoas muito ricas e muitas pessoas muito pobres ou empobrecendo.
Mas você pode estar se perguntando: Na chamada “década do milagre
econômico” (1969 a 1963) o Brasil não cresceu a taxas invejáveis entre 7% e 13%
ao ano?
Nisso você está certo. O problema é que, neste caso específico, o termo
crescer significou somente aumentar riqueza mesmo, já que foi igualmente
o período em que a concentração de renda só fez aumentar. Os resultados do
aumento da riqueza ficaram somente com determinados grupos, aqueles ligados
à ditadura militar.
Foi nesse período que o então ministro da Fazenda, Delfim Neto, criou
a famigerada “teoria do bolo”, que fez o povo acreditar que, em relação a este
crescimento verificado no período, era preciso que primeiro o bolo (o crescimento)
fosse aumentando ano a ano, para que futuramente a renda fosse distribuída. E,
adivinha? Estamos esperando por uma migalha deste bolo até hoje.
Mesmo com a redemocratização, iniciada com o movimento “Diretas Já”
(1984) e efetivada com a promulgação da CRFB de 1988, esta importante meta
de política macroeconômica não foi colocada no centro do debate, não sendo
prioridade dos governos subsequentes.
Como é possível, então, distribuir renda? Por meio da política das rendas
(que trataremos mais especificamente na Unidade 2) e por meio de políticas
sociais (programas assistenciais), cujos principais instrumentos abordamos aqui:
Entende-se por programas assistenciais de distribuição de renda
as transferências de renda em que o beneficiário recebe um valor
monetário sem ter contribuído diretamente para financiá-lo ou sem
alguma forma de contrapartida. No Brasil, os maiores programas
assistenciais de transferência de renda são o Benefício de Prestação
Continuada da Lei Orgânica da Assistência Social (BPC-LOAS),
o benefício da aposentadoria rural e o Bolsa Família (BF). O BPC é
uma transferência de renda sem condicionalidades, dirigida aos
indivíduos inválidos ou idosos de 65 anos de idade ou mais cuja renda
per capita familiar seja inferior a ¼ do salário-mínimo nacional. O
benefício corresponde ao pagamento mensal de um salário mínimo. A
aposentadoria rural é uma transferência de renda para trabalhadores
rurais idosos instituída dentro da legislação da seguridade social
brasileira. Antes da Constituição de 1988, a legislação garantia o
pagamento de meio salário-mínimo ao trabalhador rural idoso que
fosse chefe de família. A Constituição de 1988 e a Lei Ordinária
8.212/8.213 de 1991 estenderam o benefício para outros membros da
família, reduziram a idade mínima requerida de 65 para 60 anos para
homens e de 60 para 55 anos para as mulheres e aumentaram o valor
do benefício para um salário-mínimo mensal (SOUZA, 2012, p. 1).
57
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
Além destas, mais recentemente foi instituído o Bolsa Família:
O programa Bolsa Família (BF) foi criado em 2003 pelo Governo
Federal como resultado da fusão de quatro programas até então
existentes: Auxílio Gás, Bolsa Escola, Bolsa Alimentação e Cartão
Alimentação. Diferentemente dos dois anteriores, ele é um programa
de transferência direta de renda com condicionalidades. Programas
com transferências condicionais de renda nos moldes do Bolsa Família
surgiram em meados dos anos 1990 com o duplo objetivo de combater
a pobreza no curto prazo via transferências de renda e reduzir a
pobreza no longo prazo via incentivo à acumulação do capital humano
das futuras gerações via condicionalidades (Fiszbein; Schady, 2009).
O programa beneficia famílias em situação de pobreza (com renda
mensal por pessoa de R$ 70 a R$ 140) e extrema pobreza (com renda
mensal por pessoa de até R$ 70) (SOUZA, 2012, p. 1).
Apenas para que você tenha uma primeira aproximação com a política
de rendas (que trataremos adiante), falaremos daquela que trata do reajuste
do salário mínimo nacional. Para que o poder de compra do salário mínimo
aumente, ele precisa ser reajustado acima da inflação do período, ou seja, precisa
ter um aumento real.
O que isso significa? Que quando o salário mínimo sofre um aumento
real (que é um percentual de aumento acima da inflação do período, neste caso
utilizando como indicador o Índice Nacional de Preços ao Consumidor [INPC]),
aumenta o poder de compra do trabalhador, que passa a adquirir mais produtos
e, assim, também dinamiza a economia, a exemplo do que ocorreu no período de
2003 a 2013 no Brasil, segundo levantamento do Departamento Intersindical de
Estatísticas e Estudos Sócio-Econômicos (DIEESE):
FIGURA 9 – EVOLUÇÃO DO SALÁRIO MÍNIMO DO BRASIL DE 2002 A 2013
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
Total
Valor (R$)
200
240
260
300
350
380
415
465
510
545
622
678
–
Evolução do salário mínimo
Reajuste (%)
Variação do INPC (%)
–
20,0
18,54
8,33
7,06
15,38
6,61
16,67
3,21
8,57
3,30
9,21
4,98
12,05
5,92
9,68
3,45
6,86
6,47
14,13
6,08
9,0
5,96*
239
98,6%
* Percentual acumulado em 12 meses até novembro
**Percentuais aproximados
FONTE: DIEESE (2015, p. 3)
58
Aumento real (%)
1,23
1,19
8,23
13,04
5,10
4,03
5,79
6,02
0,37
7,59
2,9**
70,7%
TÓPICO 4 | POLÍTICA MACROECONÔMICA: LEGISLAÇÃO E FINALIDADES
Como se observa na figura apresentada, no período compreendido entre
os anos de 2003 a 2013 houve um aumento real de 70,7% do salário mínimo
nacional, já o reajuste concedido no respectivo período foi de 239%, enquanto
que a inflação (neste caso medida pelo INPC) subiu 98,6%.
Assim, com o aumento do salário mínimo, os trabalhadores das empresas
que recebem um salário “normativo” que é determinado na negociação coletiva
entre o sindicato patronal e dos trabalhadores de acordo com a categoria
econômica a que pertencem (comerciário, mecânico, etc.), também conseguem
maior poder na referida negociação para que seus salários sejam aumentados
pelo menos no mesmo percentual, o que beneficia toda a classe trabalhadora.
Finalmente, para que ocorra uma distribuição de renda mais equitativa
no Brasil, é necessário fortalecer as organizações da sociedade civil, instituições
que, organizadas e mobilizadas, exijam que o poder público esteja imbuído dos
mesmos objetivos, porque não se pode distribuir renda sem que haja vontade
política e institucional para promover estas políticas.
Além disso, é preciso que o mercado conquiste maior produtividade, mas
para que isso ocorra é necessária a realização de reformas urgentes nas atuais
políticas tributária e industrial, dentre outras.
De acordo com Fonseca (2004, p. 291), “aumentos crescentes de
produtividade e construção de um quadro institucional adequado, ao que
tudo sugere, ainda constituem o caminho a ser trilhado para que se alcance um
desenvolvimento socialmente mais justo e equilibrado”.
3.5 EQUILÍBRIO NAS CONTAS EXTERNAS
Você se lembra de que na seção 3.4 tratamos do mercado de divisas?
Definimos que as divisas são as moedas estrangeiras, utilizadas para as transações
entre os países e que a moeda oficial utilizada nas transações internacionais é o
dólar americano.
Abordamos também que as divisas, sendo mercadorias, têm seu preço
determinado pela taxa de câmbio. A taxa de câmbio, por sua vez, é o valor que
se paga, em moeda nacional, por uma unidade de moeda estrangeira, que pode
ser o dólar, euro, ou qualquer moeda aceita no mercado de câmbio.
Informamos que a taxa de câmbio é determinada pela relação entre
a demanda e a oferta de moeda estrangeira, e que qualquer pessoa física ou
jurídica, e mesmo o governo, são demandantes e ofertantes de divisas.
59
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
Finalmente, tratamos do balanço de pagamentos, que é uma das contas
nacionais e definida como a conta onde são registradas todas as movimentações
legais entre o Brasil e os demais países, registrados em dólar e que, quando
exportamos menos (produtos e serviços, capitais, mão de obra etc.) do que
importamos, teremos um déficit em nosso balanço de pagamentos (ou seja, ficamos
devendo para o exterior), e quando ocorrer o contrário, seremos superavitários
nas nossas contas com o exterior. Assim, buscar esse equilíbrio e, na medida do
possível, o superávit com o setor externo, é uma das metas de política econômica
dos países.
A vitória de Donald Trump em 2016, nas eleições para presidente dos
Estados Unidos, tem provocado alterações nas relações comerciais entre os países
e nas expectativas dos agentes econômicos. Em sua plataforma de governo está
sendo colocado como prioridade o protecionismo (nacionalismo econômico),
que, em termos gerais, implica na imposição de barreiras tarifárias e não tarifárias
aos produtos estrangeiros, protegendo assim os empregos e a indústria americana
da concorrência internacional, além de tentar reverter os déficits comerciais
estadunidenses (a balança comercial é uma das contas do balanço de pagamentos,
que registra a importação e exportação de mercadorias).
Como assim? Por ser um grande importador mundial, os EUA têm
um histórico de consecutivos déficits comerciais, como podemos constatar na
imagem a seguir:
FIGURA 10 – BALANÇA COMERCIAL DOS ESTADOS UNIDOS DE 1950 A 2015
US BALANCE OF TRADE
20000
0
-20000
-40000
-60000
1950
1963
1976
1989
2002
FONTE: <https://www.bourbonfm.com/blog/us-balance-trade>.
Acesso em: 10 ago. 2018.
60
2015
-80000
TÓPICO 4 | POLÍTICA MACROECONÔMICA: LEGISLAÇÃO E FINALIDADES
O que isso significa? Que os EUA compram, em valor, mais mercadorias
do exterior do que vendem. Então, se as medidas protetivas (como taxação dos
produtos importados pelos EUA) forem mesmo adotadas, afetarão toda a nação
e, consequentemente, o Brasil.
Além desse fator, novas batalhas judiciais entre os países podem vir a
ser travadas, porque aqueles que mantêm relações comerciais com os EUA serão
prejudicados pelas medidas, gerando insegurança e afetando todo o sistema
econômico global. Portanto:
A análise das relações econômicas internacionais constitui condição
necessária para um adequado entendimento da estrutura econômica
de uma determinada nação. Isto por que os países não são estruturas
isoladas, e mesmo os mais ‘fechados’ acabam por manter uma série
de relações econômicas com outros países, envolvendo troca de
mercadorias, fatores de produção e ativos financeiros. Tais relações
acabam tendo importantes implicações no cômputo de determinados
agregados macroeconômicos (CASTOLDI, 2006, p. 109).
Manter um balanço de pagamentos em equilíbrio (e melhor ainda quando
superavitário) tem sido uma meta bem antiga. Se formos analisar como se
dava na prática a chamada era do capitalismo mercantil (que os historiadores
e economistas também chamam de mercantilista ou de etapa de acumulação
primitiva de capital), ocorrido na Europa da Idade Moderna, entre o século XV e
final do século XVIII, iremos constatar uma quase total intervenção do Estado na
economia, caracterizado ainda por um protecionismo extremo, visando alcançar
este superávit.
O que embasava esta prática? A crença de que o que gerava riqueza para
uma nação era a acumulação de grande volume de metais preciosos (especialmente
ouro e prata que, por sua escassez, são considerados metais nobres).
Como você sabe, esses minerais são objeto de extração mineral e, dada
esta característica, o estoque existente no planeta é fixo (não pode ser produzido
pelo homem). Assim, pela lógica chegamos à conclusão de que, obviamente, para
que um país enriqueça, necessariamente outro tem que empobrecer.
Caro acadêmico! Se você se liga em história, sabe da existência do chamado
período absolutista (ou da era das navegações) quando, principalmente países
europeus como Inglaterra, França, Portugal e Espanha, por deterem grande
conhecimento sobre navegação marítima, ao “descobrirem” outros países (como o
Brasil), impuseram sua força e poder para conquistar estas nações. Sabe, também,
que estas terras eram habitadas por indígenas ou negros, e que, para colonizá-las,
os impérios, na maioria dos casos, realizaram verdadeiras carnificinas, dizimando
povos inteiros e os obrigando a se submeterem as suas regras. Os continentes
americano e africano foram os principais alvos dessa política imperialista.
61
UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
TUROS
ESTUDOS FU
A disciplina de História do Pensamento Econômico irá aprofundar seus estudos
sobre o mercantilismo, que se tornou a primeira escola do pensamento econômico.
Leia, a seguir, uma notícia da Revista Carta Capital (2018), que trata do
crescimento do mercado informal de trabalho no Brasil na última década:
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TÓPICO 4 | POLÍTICA MACROECONÔMICA: LEGISLAÇÃO E FINALIDADES
LEITURA COMPLEMENTAR
NO BRASIL, TRABALHO INFORMAL É A NOVA REGRA
Dimalice Nunes
Emprego sem carteira assinada superou o formal pela primeira vez em 2017. No
ano passado foi a informalidade que ditou a recuperação do mercado de trabalho
O ano de 2017 apresentou uma contínua redução da taxa de desemprego.
Trimestre a trimestre, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua
Mensal, a PNAD Contínua, do IBGE, mostrou que o número de trabalhadores
em busca de uma ocupação foi decrescente: a taxa, que marcou 13,7% de janeiro
a março, caiu para 11,8% de outubro a dezembro. A qualidade dos postos de
trabalho gerados é, no entanto, questionável. A informalidade deu o tom, o
comportamento do desemprego ao longo de 2017.
Em dezembro do ano passado, a população ocupada era de 92,1 milhões de
brasileiros e os trabalhadores informais (sem carteira ou por conta própria) eram
37,1% do total, ou 34,2 milhões, superando o contingente formal, que somava
33,3 milhões. Segundo o IBGE, foi a primeira vez na história que o número de
trabalhadores sem carteira assinada superou o conjunto de empregados formais. Enquanto o número de empregados com carteira de trabalho assinada ao
fim de 2017, 33 milhões, foi 2% menor que um ano antes, o total de trabalhadores
sem registro em carteira cresceu 5,7% no mesmo período. A categoria
dos trabalhadores por conta própria somava 23,2 milhões de pessoas ao fim de
2017, crescimento de 4,8% em relação ao fim de 2016.
A fragilidade do mercado formal já havia aparecido nos últimos dados
do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged).
De acordo com os dados divulgados pelo Ministério do Trabalho na
semana passada, o mercado de trabalho formal encolheu em 2017 pelo terceiro
ano seguido, com o fechamento de 20.832 postos de trabalho com carteira
assinada. Desde 2015, quando as demissões passaram a superar as contratações,
a economia brasileira perdeu 2,87 milhões de empregos formais.
Segundo o informativo do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento
Industrial (Iedi), "o quadro de reativação do dinamismo econômico em 2017,
embora ainda muito insuficiente, amenizou a crise do emprego no país".
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UNIDADE 1 | INTRODUÇÃO À MACROECONOMIA
O instituto ressalta, no entanto, que dentre os aspectos adversos da
evolução do emprego se destaca a queda continuada do trabalho com carteira
assinada, "aquele de maior qualidade por apresentar rendimentos regulares e
mais elevados, possibilitando, inclusive, melhores condições de acesso ao crédito".
Sabe-se que o consumo das famílias é um importante indutor de crescimento
econômico sustentável e de qualidade.
O Iedi acrescenta, porém, que a demora do emprego formal em voltar
ao positivo não chega a ser anormal, já que os empresários geralmente esperam
algum tempo para ver consolidada a melhora do quadro econômico, antes de
iniciar as recontratações.
Enquanto isso, optam por aumento de jornada de trabalho, por meio de
horas extras ou turnos adicionais, por exemplo. É razoável, então, que os postos
com carteira assinada voltem a crescer em 2018 caso a recuperação da economia
se mantenha.
No ano, o pior resultado desde 2012
Apesar da queda na taxa de desocupação ter caído ao longo de 2017, o
ano passado foi o pior para o mercado de trabalho brasileiro desde 2012, e não
só pela informalidade. Com uma taxa média de 12,7%, o desemprego atingiu o
maior nível da série histórica apurada pelo IBGE. Em relação a 2014, quando a
taxa média de desocupação atingiu seu menor patamar, 6,8%, a diferença foi de
5,9 pontos porcentuais.
PNAD-C l Média anual da taxa de desocupação das pessoas
de 14 anos ou mais de idade - Brasil
14
12
10
8
6
4
2
0
12,7%
7,4%
2012
6,8%
2013
2014
2015
2016
2017
Fonte: IBGE - Diretoria de Pesquisas, DPE
Só de 2016 para 2017, o número de trabalhadores sem carteira de trabalho
no setor privado cresceu 5,5%, o que representa 560 mil trabalhadores. Em
relação a 2014, o aumento médio foi de 3,2%, ou 330 mil pessoas. Já o número de
trabalhadores por conta própria cresceu 6,5% nos últimos três anos, ou 1,3 milhão
de trabalhadores nesta categoria.
64
TÓPICO 4 | POLÍTICA MACROECONÔMICA: LEGISLAÇÃO E FINALIDADES
Grupamentos de atividades expressivos, como agricultura, indústria e
construção, foram os que mais perderam trabalhadores. Nesses três anos, a queda
na agricultura foi de 10,4%, na indústria, 11,5%, e na construção, 12,3%.
"Parte desses postos foi compensada em grupamentos que têm um
processo de inserção mais voltado para a informalidade, como comércio, outros
serviços e alojamento e alimentação”, explicou o coordenador de Trabalho e
Rendimento do IBGE, Cimar Azeredo. Os resultados confirmam que, em relação
a 2014, o comércio apresentou aumento de 0,5% no número de trabalhadores,
outros serviços, de 7,0% e alojamento e alimentação, de 21,4%.
Isso ocorre porque, durante períodos de crise, os serviços de alimentação,
principalmente, funcionam como uma espécie de válvula de escape. “Você pode
ficar sem comprar, sem viajar, sem reformar a casa, mas sempre terá que se
alimentar. Por isso, quando as pessoas ficam sem emprego, migram para esse
setor, pois é nele que se abrem oportunidades”, explicou Azeredo.
O rendimento médio dos trabalhadores foi estimado em 2.141 mil reais ao
fim de 2017, alta de 2,4% em relação a 2016. O crescimento, no entanto, não foi sequer
suficiente para compensar a baixa inflação apurada no ano passado, de 2,95%.
“Além da inflação baixa registrada em 2017, a saída de pessoas com
rendimentos mais baixos deveria elevar a média do rendimento, mas como
também houve queda entre as populações que ganham mais, o rendimento em
2017 ficou no mesmo patamar do de 2014”, conclui Azeredo.
Na comparação com 2012, foi registrado aumento de 4,4%. Entretanto, em
relação a 2014, ano em que se observou o maior rendimento da série, o quadro foi
de estabilidade.
A massa de rendimento médio, que é a soma do que foi recebido por
todos os trabalhadores, atingiu 189.155 bilhões de reais, com alta semelhante ao
rendimento médio, 2,6%. Na comparação com 2012, foi registrado avanço de 6,8%.
FONTE: <https://www.cartacapital.com.br/economia/No-Brasil-trabalho-informal-e-a-nova-regra>.
Acesso em: 9 ago. 2018.
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RESUMO DO TÓPICO 4
Neste tópico, você aprendeu que:
• Sobre alguns aspectos relacionados à Constituição Econômica do Brasil,
informamos que, para intervir na economia, o Estado precisa estar amparado
na Carta Magna, que é a Constituição.
• No título que trata da “Ordem Econômica e Financeira”, em seu art. 170, a
Constituição assevera que “a ordem econômica, fundada na valorização do
trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência
digna, conforme os ditames da justiça social”.
• O parágrafo único do art. 170 da CRFB assevera que “É assegurado a todos
o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de
autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei”.
• No que se refere às metas de política macroeconômica, abordamos as que a
literatura enumera como as principais: alto nível de emprego; estabilidade de
preços; crescimento econômico; distribuição equitativa da renda; equilíbrio nas
contas externas.
• A participação do Estado é importante para assegurar o que prevê a Constituição
Econômica no atendimento dessas metas de política macroeconômica, visto
que o mercado, sozinho (ao contrário do que pensam diversos economistas),
não consegue suprir.
• O quão difícil é conquistar e manter essas variáveis em equilíbrio, em especial
para países subdesenvolvidos e os em desenvolvimento (ou emergentes)
devido à monstruosa desigualdade social existente no modo de produção
capitalista, fazendo com que cada vez menos ricos se tornem ainda mais ricos
e cada vez mais pobres, miseravelmente mais pobres.
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AUTOATIVIDADE
1 Ao longo do curso de Ciências Econômicas você já deve ter se questionado
diversas vezes sobre a desigualdade. Então, se você fosse o economista
responsável pela resolução desses problemas econômicos, principalmente
o da desigualdade, que políticas macroeconômicas você proporia? Escreva
uma dissertação sobre esse tema.
2 Discutimos sobre um importante princípio, que é a soberania. Pesquise
artigos que discutam essa temática e traga informações a respeito da
participação do Brasil na pesquisa científica e tecnológica, fazendo uma
abordagem crítica e apresentando possíveis políticas tecnológicas que
possam vir a modificar esse quadro.
3 Um dos grandes problemas para equilibrar as contas externas está
relacionado à variação do preço do dólar no comércio internacional. Você
já sabe que muitas mercadorias (as chamadas commodities) são cotadas
em dólar (petróleo, cereais, açúcar, boi gordo, minério de ferro). Assim,
quando a economia do governo americano está crescendo, a tendência é
de valorização do preço do dólar (pagamos mais reais para cada unidade
de dólar). Isso pode trazer consequências graves para a competitividade
das mercadorias brasileiras no exterior, o que interfere no balanço de
pagamentos. Pesquise artigos que tratem do padrão monetário internacional
(que atualmente é o dólar americano) e procure opiniões a respeito de como
seria possível alterar este padrão (substituir por outra moeda internacional,
por exemplo) e faça uma redação sobre essa temática.
4 Um estudo do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea), órgão
ligado ao Ministério do Planejamento, mostra que a distribuição de renda
melhorou no Brasil entre 2001 e 2005. Os 10% mais pobres da população
tiveram um aumento de 36% na renda neste período, enquanto a renda dos
10% mais ricos caiu 1,2%. Ainda assim, em um ranking mundial que inclui
126 nações, o Brasil aparecia neste período com a 10ª pior distribuição de
renda, atrás de países como Haiti (o país mais pobre da América Latina) e a
Índia. Diante dessas informações, o que falta para o Brasil melhorar o índice
de distribuição de renda?
67
68
UNIDADE 2
O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE
ECONÔMICA E A TEORIA DA
DETERMINAÇÃO DA RENDA
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir desta unidade você será capaz de:
• estudar o funcionamento do fluxo circular da atividade econômica;
• conhecer os agregados macroeconômicos e compreender como eles são
mensurados;
• estudar a teoria da determinação da renda nas versões clássica e keynesiana.
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer da unidade você
encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.
TÓPICO 1 – O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA
TÓPICO 2 – A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O MODELO
CLÁSSICO
TÓPICO 3 – A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA
RENDA – O LADO REAL
TÓPICO 4 – A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA
RENDA – O LADO MONETÁRIO
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70
TÓPICO 1
UNIDADE 2
O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA
1 INTRODUÇÃO
Na Unidade 1, você teve acesso aos principais objetivos (metas) de política
macroeconômica e observou-se também que a presença do Estado na economia se
torna fundamental para sanar ou minimizar situações de depressão econômica,
que geram desemprego, aumentam as desigualdades de renda, a violência, a
criminalidade, a fome e a miséria.
Mas para que o Estado possa intervir na economia, como é possível saber
ao certo quanto é produzido no país, qual é a quantidade de moeda existente, qual
é a taxa de desemprego, como está o nível de preços, qual é a renda gerada pelos
agentes econômicos, dentre outros dados importantes da conjuntura econômica?
Bem, antes de prosseguir é preciso que você saiba que existe nos países
um sistema de contabilidade parecido com o que é utilizado pelas empresas para
contabilizar a sua produção, faturamento, lucro, dívidas, bens, direitos e obrigações.
A contabilidade social, antes conhecida como contabilidade nacional,
serve então para medir os grandes agregados econômicos, como renda nacional,
produto nacional, despesa nacional, nível de preços, taxas de desemprego e
produção industrial, contas públicas, dentre outros, que servem de indicadores
para que se possa medir a situação econômica do país.
Para que você possa compreender como esses indicadores são constituídos,
é preciso que você entenda como se dá o fluxo circular da atividade econômica.
71
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
2 O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA:
PRODUTO E RENDA
Quando tratamos da estrutura da análise macroeconômica, vimos que na
economia existem dois fluxos: o real e o monetário.
De acordo com Nogami (2012, p. 34), por fluxo real entende-se como sendo
“o movimento dos recursos produtivos e de bens e serviços entre os diversos
agentes econômicos”.
A economia se torna a cada dia mais complexa. Assim, esse fluxo real
torna-se mais dinâmico na medida em que as relações de compra e venda de
recursos produtivos (terra, trabalho, capital e capacidade empresarial) e de bens
e serviços vão se avolumando.
“Como contrapartida monetária dos fluxos reais temos os fluxos
monetários. Toda vez que um bem ou serviço é transferido de um agente
para outro, são efetuados pagamentos em troca deles. O fluxo monetário,
consequentemente, gira em direção contrária ao fluxo real” (NOGAMI, 2012, p.
35, grifo da autora).
Exemplificando, relembramos o exemplo da Unidade 1: Para adquirir
os bens e serviços necessários para atender às suas necessidades, você (caso
seja trabalhador) oferece ao mercado a sua força de trabalho e recebe uma
remuneração na forma de salário. O dono da terra a aluga e recebe por ela uma
renda na forma de aluguel, o proprietário de moeda a empresta e recebe por ela
uma renda chamada de juro. A empresa na qual você trabalha vende os bens ou
serviços e recebe uma renda denominada de lucro. Ou seja, terra, trabalho, capital
e capacidade empresarial são denominados fatores de produção e representam
o fluxo real da economia. Já o pagamento pela utilização desses fatores (também
chamados de recursos), que são o aluguel, o salário, o juro e o lucro, representa o
fluxo monetário.
Assim, quando falamos em “Fluxo Circular da Atividade Econômica”
estamos nos referindo a toda movimentação existente entre os agentes econômicos,
na busca pela satisfação de suas necessidades.
Temos assim que o fluxo circular da atividade econômica “mostra de forma
simplificada a maneira pela qual indivíduos e firmas interagem na economia,
cada qual buscando atingir diferentes objetivos: as firmas procurando maximizar
seus lucros e os indivíduos procurando maximizar a satisfação de seus desejos e
necessidades” (NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 371).
72
TÓPICO 1 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA
2.1 O FLUXO BÁSICO DA ECONOMIA
Como você já deve ter percebido, a ciência econômica se utiliza de
abstrações da realidade para explicar os fenômenos econômicos.
Desta forma, para que possamos entender o funcionamento do fluxo
circular da atividade econômica é necessário primeiro entender como se dá
este fluxo numa economia que possua apenas dois agentes econômicos: os
consumidores (unidades familiares) e as firmas.
Como já sabemos, o modo de produção capitalista, que é o sistema no
qual vivemos desde a Revolução Industrial do século XVIII, se caracteriza,
dentre outros fatores, pela existência de duas classes sociais: capital (que dá
origem às firmas) e trabalho (representado pelas unidades familiares). Nesse
sistema, os meios de produção pertencem ao dono do capital, o capitalista,
sendo que o trabalhador dispõe apenas de sua força de trabalho para vender ao
mercado. Utilizamos a expressão “vender ao mercado” porque é justamente o
que ocorre: para que o trabalhador consiga manter a sua própria subsistência (e
da sua família), vende sua força de trabalho ao capitalista e recebe em troca um
pagamento denominado salário. Este salário representa a renda do trabalhador,
que adquire bens e serviços que são produzidos pelo empresário, ou capitalista, e
este recebe pela sua produção um valor que denominamos lucro.
Podemos representar essa relação da seguinte maneira:
FIGURA 1 – FLUXO BÁSICO DA ECONOMIA
Fluxo real de recursos produtivos
Fluxo real de bens e serviços
Famílias
Empresas
Fluxo monetário: pagamento pelos bens e serviços
Fluxo monetário: pagamentos pelos recursos produtivos
FONTE: Nogami (2012, p. 34)
73
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Entretanto, firmas e unidades familiares não são os únicos agentes
econômicos existentes na economia, bem como trabalho, como já afirmamos, não
é o único fator produtivo, até porque qualquer firma precisa de outros fatores
produtivos para operar, pois de que adiantaria o fator trabalho sem máquinas,
equipamentos, recursos financeiros (que provêm do fator capital), matériasprimas oriundas da extração mineral e vegetal (provenientes do fator terra)?
E, finalmente, mesmo tendo todos os demais fatores à disposição, ainda assim
faltaria um fator deveras importante: a capacidade empresarial.
A capacidade empresarial nada mais é do que o “saber fazer”.
Exemplificando: se uma fábrica de móveis possui à sua disposição os fatores
capital (fábrica + equipamentos + recursos financeiros), trabalho (mão de obra),
terra (local onde está instalada a planta industrial + matérias-primas + insumos),
mas o seu proprietário não tiver domínio da atividade, não souber como
administrar esta fábrica, a chance de falência desta empresa em pouco tempo é
muito grande.
E
IMPORTANT
“Pesquisa realizada em julho e agosto de 2016 com uma amostra de 2.006
empresas representativas do universo de empresas constituídas em 2011 e 2012 no Brasil
mostrou que não há apenas um fator determinante do fechamento das empresas. A exemplo
dos acidentes aéreos, a mortalidade de empresas está associada a uma combinação de
“fatores contribuintes”, em especial: a) o tipo de ocupação dos empresários antes da abertura
(se desempregado ou não); b) a experiência / o conhecimento do empresário anterior no
ramo; c) a motivação para a abertura do negócio; d) o planejamento adequado do negócio
antes da abertura; e) a qualidade da gestão do negócio; e f) a capacitação dos donos em
gestão empresarial” (SEBRAE, 2016, p. 83, grifo da autora).
Desta forma, ampliando nosso campo de análise, vamos conhecer o
funcionamento do fluxo da atividade econômica como um todo.
Vemos na Figura 1 dois mercados: o mercado de fatores de produção, que
são todos os recursos necessários para produzir um bem ou prestar um serviço
(terra, trabalho, capital e capacidade empresarial) e o mercado de bens e serviços.
Como já analisamos anteriormente, esses mercados dinamizam dois
fluxos básicos da atividade monetária: o fluxo real e o fluxo monetário.
Verifique que neste modelo simplificado existem apenas dois agentes
econômicos: empresas e famílias.
As empresas oferecem bens e serviços e demandam fatores de produção,
enquanto as famílias demandam bens e serviços e oferecem fatores de produção.
74
TÓPICO 1 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA
Relembrando, assim, o que abordamos anteriormente, essa relação entre
as famílias e as empresas dá origem aos fluxos reais e monetários, sendo que o
fluxo real representa a utilização dos fatores de produção e a produção de bens
e serviços, enquanto o fluxo monetário representa o pagamento pela utilização
desses fatores e pelo consumo de bens e serviços. A renda representa, então, num
primeiro momento, este fluxo monetário entre empresas e famílias.
2.2 O FLUXO BÁSICO DA ECONOMIA COM GOVERNO
E SETOR EXTERNO
Que agente econômico está ausente do nosso modelo básico? Lógico que
é o governo, que desempenha uma função muito importante na economia, em
especial, a partir da Grande Depressão de 1930, como já estudamos na Unidade
1. Este também interage no mercado e, como tal, demanda recursos produtivos e
bens e serviços e aufere renda por meio dos tributos.
De acordo com Nogami (2012, p. 39):
O governo é a instância máxima de administração executiva,
geralmente reconhecida como a liderança de um Estado ou uma nação.
O papel que um governo desempenha é, na sua essência, zelar pelo
bem-estar, da mesma maneira como o chefe de uma unidade familiar,
ou o síndico de um condomínio.
Quando observamos a realidade e fazemos uma análise mais aprofundada
sobre o papel do governo na atualidade, vemos que este tem assumido diferentes
papéis ao longo da história do capitalismo, em especial, neste século XXI.
Para Oliveira (2015, p. 17-18):
A existência de uma atuação estatal que coordene, resolva conflitos
e direcione as decisões para o melhor aproveitamento dos recursos
e para o alcance dos resultados é base para o funcionamento dos
mercados e para o crescimento da economia [...]. O Estado brasileiro
tem a desafiadora tarefa de conciliar a função de Estado indutor com
as demais funções. Somos um Estado de redistribuição de renda, além
de sermos responsáveis por políticas geradoras de crescimento. O
grande desafio é preservar as conquistas sociais e melhorar a eficiência
das políticas públicas, garantindo os investimentos e ampliando a
participação do setor privado. Para o secretário executivo do Ministério
do Planejamento, o papel do Estado no Brasil diz respeito à promoção
dos direitos individuais e sociais, ao provimento da seguridade social e
da infraestrutura, e indução ao desenvolvimento sustentável. O Estado
tem uma especificidade no Brasil: conciliar ação indutora e inovadora
com a distribuição de renda e a ampliação dos serviços públicos (saúde,
educação, previdência social, saneamento, habitação, segurança
pública etc.), afirmou o secretário executivo. Para isso, Dyogo defende
a parceria para o desenvolvimento produtivo na saúde, cooperação
pública/privada para desenvolvimento, transferência e absorção de
tecnologia, produção, e capacitação produtiva e tecnológica do país
em produtos estratégicos, como o Sistema Único de Saúde (SUS).
75
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Como você pode perceber, para que o Estado possa desempenhar essas
funções, precisa auferir renda. E de que forma faz isso?
Caro acadêmico, é o que você está pensando: por meio da cobrança de
tributos.
Mas o que é um tributo? Quando pesquisamos sobre a etimologia da
palavra tributo, temos que:
No início da civilização romana, o povo estava dividido em várias tribos.
Em latim, tribus, vocábulo que produziu vários derivados conhecidos: o
tribuno era o magistrado da tribo, enquanto o tributo era a contribuição
a ser paga pelos membros da tribo. O termo logo generalizou-se para
abranger todo imposto ou taxa cobrado dos cidadãos romanos, passando
a designar também o valor que um povo vencedor obrigava o povo
vencido a pagar como símbolo de submissão e obediência. Naquela
época, como até hoje, os poderosos raramente pagavam tributos, que
eram suportados pelos comerciantes mais humildes, os camponeses
e os pequenos proprietários. Esse infeliz contribuinte era chamado de
tributarius, designação que se aplica, por metáfora, aos rios que vão
desaguar em um rio maior: "o rio Tapajós é um dos mais importantes
tributários do Amazonas" (DICIONÁRIO ETIMOLÓGICO, 2018, s.p.).
Os tributos, por sua vez, são despendidos pelo governo na execução
de todas as suas atividades e são denominados de gastos, “que podem ser de
três naturezas: dispêndios com custeio (manutenção da máquina do Estado),
investimentos (especialmente em infraestrutura como educação, moradia, saúde,
segurança pública e transporte) e transferências (pensões, aposentadorias e
subsídios)” (NOGAMI, 2012, p. 40).
NOTA
Quando falamos em tributos é praticamente impossível não questionar o
peso dos impostos sobre a economia brasileira. Vamos analisar o caso dos combustíveis,
conforme descrito na figura a seguir:
76
TÓPICO 1 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA
FIGURA 2 – O PESO DOS IMPOSTOS SOBRE OS COMBUSTÍVEIS NO BRASIL
Gasolina
Diesel
43%
ICMS (imposto
estadual, varia
conforme o estado)
27%
25% a 34% do valor
de pauta
Etanol
26%
12% a 25% do valor
de pauta
12% a 30% do valor
de pauta
PIS/COFINS
(imposto federal)
R$ 0,7925/litro
R$ 0,4615/litro
R$ 0,1309/litro
para o produtor e
R$ 0,1109 para o
distribuidor
CIDE (imposto
federal)
R$ 0,1000/litro
R$ 0,0500/litro
não incide sobre o
etanol
FONTE: Fecombustíveis (2018, s.p.)
Observando a figura, podemos observar que, a cada R$ 100,00 que
você abastece seu automóvel com gasolina, por exemplo, R$ 43,00 são tributos,
constituídos pelo Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS)
que fica com os estados, e pela PIS/COFINS e CIDE (Contribuição de Intervenção
no Domínio Econômico), que são de competência do Governo Federal. Por
consequência, há uma grande insatisfação da população em relação à carga
tributária praticada no Brasil.
Leia na matéria a seguir, do Instituto Brasileiro de Planejamento e
Tributação (IBPT), baseado em estudos da Guia da Receita Federal de 2017, o
porquê dessa insatisfação mais do que justificada:
77
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
HAJA IMPOSTO (E PACIÊNCIA)!
O sistema tributário brasileiro é composto por mais de 70 tipos de
tributos, entre impostos, taxas e contribuições.
O Brasil tem uma das mais elevadas cargas tributárias do mundo
e serviços públicos que não condizem com o montante de tributos que
pagamos.
De acordo com a Receita Federal, a Carga Tributária do Brasil atingiu a
cifra de 32,66% do PIB em 2015. Isso significa que, a cada R$ 100 que ganhamos, os
governos federal, estadual e municipal ficam com quase R$ 33, e sobram apenas
R$ 67 em nossa carteira. Mesmo com nosso salário mínimo equivalente a US$
280, pagamos mais impostos que cidadãos de países ricos e desenvolvidos, como
Estados Unidos (26%), Suíça (26,6%), Canadá (30,8%), e praticamente o mesmo
que cidadãos do Reino Unido (32,6%), Espanha (33,2%) e Alemanha (36,1%).
Nosso sistema tributário é tão perverso, arcaico e injusto que deveria
ser considerado a principal reforma do país.
Ele é perverso porque prejudica a economia. Existem várias condições
socioeconômicas que determinam o potencial tributário de um país, entre elas
a renda per capita, participação da agricultura no PIB, escolaridade, grau de
abertura econômica, condições de saúde etc. Estudos apontam que o Brasil
arrecada efetivamente mais tributos do que suporta sua economia. A longo
prazo, essa tributação excessiva provoca baixo crescimento econômico e
desemprego. Nos Estados Unidos, por exemplo, o salário mínimo equivale a
US$ 1.160 e, ainda assim, pagam menos tributos que aqui na Terra de Santa
Cruz. Vale dizer que apenas 2,7% da população de lá ganha salário mínimo,
enquanto aqui, essa parcela chega a quase 50% da população ocupada.
A legislação tributária brasileira é extremamente complexa e
ultrapassada. Nosso código tributário é da época em que metade da população
vivia na zona rural e não existiam computadores. Segundo levantamento
do IBPT, desde a Constituição de 1988 já foram criadas 363.779 normas
tributárias, isto é, cerca de 1,88 por hora nos dias úteis. A bagunça tributária
é tão generalizada que até mesmo contadores e advogados tributaristas ficam
perdidos em meio a tantas mudanças que ocorrem diariamente nos níveis
federal, estaduais e municipais.
O sistema tributário é, ainda, injusto, pois metade do dinheiro subtraído
pelo poder público é cobrada nos bens e serviços que adquirimos, desde
medicamentos a veículos. E não importa se você é rico ou pobre, a alíquota
é a mesma. Pense, por exemplo, a compra de uma geladeira no valor de R$
2.000, em que a tributação é de 40%, ou seja, R$ 800. Nesse caso, quem ganha
um salário mínimo precisa gastar 85% da sua renda para pagar o “imposto da
78
TÓPICO 1 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA
geladeira”, enquanto aqueles que ganham R$ 10.000 gastam bem menos do
seu salário: 8%. Para corrigir esse problema que os especialistas chamam de
regressividade tributária, é preciso desonerar o consumo de bens e serviços
e aumentar a parcela da arrecadação sobre a renda, lucro e ganho de capital,
como acontece na maioria dos países.
A paciência do povo brasileiro é que vai determinar se vamos abandonar
ou continuar com o modelo de tributação atual, em que se paga caro para ter
serviços públicos precários.
FONTE: <https://ibpt.com.br/noticia/2606/Haja-imposto-e-paciencia>. Acesso em: 21 ago. 2018.
Continuando nossa análise da atividade econômica a três setores, é
importante ainda informar que os tributos são divididos em impostos, taxas e
contribuições.
Os impostos, como o nome já faz referência, são aqueles que somos obrigados
a pagar, pois caso não o façamos sofreremos as sanções que a lei determina, como
no caso do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), do Imposto sobre Veículos
Automotores (IPVA), Imposto de Renda (IR), dentre outros, independentemente
deste imposto retornar na forma de ações governamentais diretas.
Com relação aos impostos, ainda há outra divisão: há os impostos diretos,
que incidem sobre a renda e a propriedade e é possível identificar o contribuinte,
como no caso do IPTU, IR, IPVA; e os indiretos, que incidem sobre o consumo
e as vendas e não tem como identificar o contribuinte porque quem presta as
informações ao fisco não é a fonte pagadora. Isso acontece no caso do ICMS,
já que somos nós que pagamos esse imposto (dentre outros indiretos) quando
adquirimos um bem ou serviço, mas quem presta contas é a empresa que nos
vendeu o produto.
As taxas, por sua vez, são aquelas que pagamos por um serviço que o
Estado presta ao cidadão de forma generalizada, como a taxa de coleta de lixo,
taxa de iluminação pública, dentre outros, e que vai beneficiar a qualquer cidadão,
independentemente da sua identificação. Por exemplo, quando você passa à noite
numa rua com boa iluminação pública, mesmo que não resida no local, também
é beneficiado, pois terá maior segurança.
As contribuições (geralmente de melhoria) são aquelas que o poder público
executa e que irão beneficiar determinados grupos ou localidades. Como exemplo
clássico temos a contribuição de melhoria que pagamos quando a administração
pública executa uma obra de pavimentação da rua onde residimos. Geralmente
pagamos um valor que é calculado levando em conta a metragem do terreno em
relação à rua a ser pavimentada. Chama-se contribuição de melhoria, porque
esta obra irá valorizar o seu imóvel e você e todos os residentes da rua onde você
mora serão diretamente beneficiados, razão pela qual o valor é cobrado.
79
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Voltemos à nossa análise do fluxo da atividade econômica. O que
falta incluirmos na nossa análise? Com o avanço da globalização econômica e
financeira, sabemos que as relações comerciais entre os países, ou entre blocos
econômicos, estão cada vez mais acirradas e a interdependência entre os mesmos
é cada vez maior.
Então o setor externo, por sua vez, importa e exporta bens e serviços e
fatores de produção, de acordo com as necessidades e recursos disponíveis em
cada país.
Analisemos um exemplo dessa interdependência comercial entre os
países, no caso do Brasil, com o mercado de fertilizantes.
Por ser um país produtor de alimentos, conhecido inclusive como “celeiro
do mundo”, o Brasil demanda grande quantidade de fertilizantes e defensivos
agrícolas. Ocorre que em sua maioria os insumos utilizados para a produção de
fertilizantes, principalmente os nitrogenados, são importados, já que os maiores
produtores mundiais são China, Índia e Estados Unidos, conforme indica a
imagem do gráfico a seguir:
FIGURA 3 – PRODUÇÃO DE FERTILIZANTES NITROGENADOS POR PAÍS EM 2011
Outros Países 30%
China 32%
Egito 2%
Índia 11%
Ucrânia 3%
Canadá 3%
Indonésia 3%
Rússia 6%
Estados Unidos 10%
FONTE: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S008021072015000200129#B11>. Acesso em: 21 ago. 2018.
80
TÓPICO 1 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA
Em contrapartida, o Brasil é um dos maiores exportadores de alimentos,
sendo que os países que mais importaram produtos do agronegócio brasileiro
foram, em 2017, respectivamente, China, Zona do Euro e Estados Unidos,
conforme indica o quadro a seguir:
FIGURA 4 – PRINCIPAIS DESTINOS DAS EXPORTAÇÕES DO AGRONEGÓCIO BRASILEIRO (US$
FOB) E AS RESPECTIVAS PARTICIPAÇÕES (%) NO TOTAL EXPORTADO PELO AGRONEGÓCIO
BRASILEIRO – DE JANEIRO A SETEMBRO DE 2017
Destino
Valor (US$ FOB)
Participação (%) do total exportado
China
22.415.242.407
30,3%
Zona do Euro
11.159.722.938
15,1%
Estados Unidos
4.645.257.788
6,3%
Rússia
1.846.666.774
2,5%
Irã
1.786.733.099
2,4%
Japão
1.786.293.897
2,4%
Hong Kong
1.749.873.758
2,4%
Arábia Saudita
1.658.602.295
2,2%
Egito
1.482.847.380
2,0%
Coreia do Sul
1.345.244.223
1,8%
Demais Países
24.185.250.810
32,7%
FONTE: FIESP (2018, s.p.)
É por estas características que observamos, não só nos dias de hoje,
fluxos migratórios, fluxos de comércio e fluxo de capitais estrangeiros,
aportando nas mais diferentes economias mundo afora. Só que esse
comportamento moderno pode afetar as economias, domesticamente,
criando o desequilíbrio entre as nações (NOGAMI, 2012, p. 41, grifo
da autora).
É importante analisar a abordagem citada, pois como Nogami (2012)
afirma, e nós destacamos, uma das consequências mais perversas da economia
moderna é o acirramento da xenofobia como consequência do aumento dos
fluxos migratórios.
81
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
E
IMPORTANT
Ficou em dúvida sobre o que significa “xenofobia”? De acordo com o Dicionário
Etimológico (2018, s.p.):
Xenofobia significa aversão a pessoas ou coisas estrangeiras. O termo é de origem grega
e se forma a partir das palavras “xénos” (estrangeiro) e “phóbos” (medo). A xenofobia pode
se caracterizar como uma forma de preconceito ou como uma doença, um transtorno
psiquiátrico.
O preconceito gerado pela xenofobia é algo controverso. Geralmente se manifesta através
de ações discriminatórias e ódio por indivíduos estrangeiros. Há intolerância e aversão por
aqueles que vêm de outros países ou diferentes culturas, desencadeando diversas reações
entre os xenófobos.
Nem todas as formas de discriminação contra minorias étnicas, diferentes culturas,
subculturas ou crenças podem ser consideradas xenofobia. Em muitos casos são atitudes
associadas a conflitos ideológicos, choque de culturas ou mesmo motivações políticas.
Como doença, a xenofobia é um transtorno causado por um medo descontrolado do
desconhecido, que se transforma em desequilíbrio. Quem sofre este transtorno possivelmente
passou por uma má experiência ao estar exposto a uma situação desconhecida que causou
terror e deixou marcas que vão interferir na sua vida diária.
As pessoas com essa patologia sofrem de angústia e extrema ansiedade, se distanciam do
convívio social, evitam o contato com estranhos e, em alguns casos, podem ter crises de
pânico.
Xenofobia no Brasil
O Brasil é conhecido por ser um país que recebeu e recebe muitos imigrantes de vários
países com diferentes culturas, sem graves demonstrações de xenofobia. No entanto, no
século XIX se verificou no Brasil um fenômeno chamado lusofobia, que resultou de um
sentimento nacionalista de alguns políticos brasileiros, que tinham como objetivo reduzir a
interação de indivíduos portugueses na economia local.
Xenofobia na Europa
A existência de xenofobia é bastante comum na Europa, principalmente nos países onde
há um grande fluxo de imigração, como a Inglaterra e Suíça. Também em Portugal, alguns
portugueses apresentam sentimentos xenófobos em relação a brasileiros.
Xenofobia e racismo
Xenofobia e racismo são dois conceitos diferentes, mas que muitas vezes se traduzem em
atitudes semelhantes de discriminação em relação a alguém. A xenofobia está direcionada
para alguém que vem de outro país, mesmo que seja da mesma etnia. Por outro lado, o
racismo é a discriminação fundamentada na existência de uma raça superior às outras. É
uma construção social que não encontra eco na comunidade científica, sendo um grave
preconceito, e que pode ocorrer também a uma pessoa que tenha nascido no mesmo país
daquela que comete o ato racista.
82
TÓPICO 1 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA
De qualquer forma, o setor externo desempenha um papel muito
importante para a economia das nações, pois permite a aquisição de bens
e serviços que não possuem ou não têm competitividade e a venda de bens e
serviços que possuem em abundância no país.
NOTA
Pela importância do setor externo, muitos economistas o incluem como um
quarto agente econômico.
Especialmente para o Brasil, que ainda é grande exportador de
commodities, manter sólida relação comercial com o exterior é muito importante,
pois trata-se, em muitos casos, de produtos perecíveis ou com um grande
excedente de oferta em relação à demanda interna, que obriga a exportar o que
não é brevemente consumido internamente.
NOTA
Outro esclarecimento é importante: um dos setores da economia brasileira que
mais exporta é o agronegócio. De acordo com Geraldo Barros (apud LUZ, 2015, s.p.):
Agronegócio é a expressão que resulta da fusão de
agricultura ou agropecuária e negócio. Este termo – negócio
– vem originalmente do latim negotium (negação do ócio)
e tem o significado de ocupação ou trabalho visando atingir
determinados fins para satisfação de desejos ou necessidades
de quem os executa ou de outrem; neste último caso, mediante
alguma recompensa aos executores. Considerando a origem
do termo, agronegócio relaciona-se a atividades ou trabalhos
relacionados à agricultura. O termo negócio pode ser tomado
num sentido amplo de geração de valor através do uso do
trabalho e do capital; no caso do agronegócio, englobam-se a
agricultura e demais segmentos produtivos a ela relacionados.
Quando analisamos quais produtos do agronegócio são exportados, temos
que, segundo dados divulgados pela Federação das Indústrias do Estado de São
Paulo (FIESP) para 2018, a soja em grãos é de longe o produto do agronegócio em
maior quantidade e valor exportado, como demonstra a figura a seguir:
83
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
FIGURA 5 – EXPORTAÇÕES BRASILEIRAS DO AGRONEGÓCIO: ABRIL 2017 E 2018
Principais Produtos
Valor (US$ milhões)
Quantidade (mil t)
2017
2018
Δ%
2017
Soja em grãos
2.534
4.072
60,7
Açúcar
2018
Preço Médio (US$/t)
Δ%
2017
2018
Δ%
6.955 10.195
46,6
364
399
9,6
1.041
540
-48,1
2.662
1.871
-29,7
391
289
-26,1
Carne de Frango
606
701
15,8
375
454
21,1
1.614
1.543
-4,4
Carne Bovina
533
840
57,6
128
159
24,5
4.179
5.291
26,6
Celulose
497
605
21,6
1.056
1.094
3,4
471
553
17,4
Farelo de Soja
403
725
80,0
1.156
1.730
49,6
348
419
20,3
Milho
357
205
-42,7
2.323
1.170
-49,6
154
175
13,8
Madeira e Produtos
270
269
-0,4
469
534
13,9
577
504
-12,6
Café em grãos
255
182
-28,6
96
75
-22,3
2.653
2.438
-8,1
Couros e Produtos
184
106
-42,6
32
72
-30,9
5.749
4.774
-17,0
Papel
160
156
-1,9
181
141
-22,0
881
1.107
25,6
Suco de Laranja*
149
175
16,9
80
93
16,3
1.867
1.867
0,6
Carne Suína
135
118
-12,6
56
67
18,4
2.387
1.763
-26,1
Óleo de Soja
115
151
31,7
151
216
42,8
761
702
-7,8
Etanol
81
91
12,9
125
145
15,8
645
630
-2,4
Café solúvel
48
38
-21,7
6
5
-11,3
8.000
7.065
-11,7
Algodão
31
16
-48,8
19
9
-54,9
1.633
1.854
13,5
Cacau e Produtos
31
27
-13,8
7
7
-10,0
4.191
4.016
-4,2
7
3
-57,8
3
1
-53,8
2.760
2.520
-8,7
323
273
-15,4
-
-
-
-
-
-
Lácteos
Demais produtos
(*) Volume de suco de laranja calculado em Frozen Concentrate Orange Juice (FCO) equivalente - Brix 66.
FONTE: FIESP (2018, s.p.)
A soja exportada não necessariamente representa o excedente da
produção nacional em relação à oferta. Sua exportação, em muitos casos, se dá
pela ausência de silos públicos ou privados para correto armazenamento deste tão
importante cereal, ou, o que é ainda mais deplorável, pela ausência de indústrias
beneficiadoras de grãos, que transformem a soja em óleo de soja e outros derivados
com maior valor agregado e, somente neste formato, o exportem, obtendo maior
valor na comercialização do que ocorre exportando o cereal in natura.
Assim, é comum que meses depois do produto ser exportado, ele seja
importado para suprir a demanda interna, ou que importemos o óleo de soja, que
pode ser inclusive proveniente do grão que exportamos.
Teríamos muito a tratar a respeito da economia internacional, mas isso
será abordado com mais profundidade nas disciplinas específicas. Por ora
é importante você perceber que, se por um lado a globalização econômica e
financeira dinamizou ainda mais a relação comercial entre os países, também
84
TÓPICO 1 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA
se dinamizaram os conflitos, relações de troca desfavoráveis aos países menos
desenvolvidos, aumento do endividamento externo, xenofobia em função
do aumento dos fluxos migratórios, dentre outros fatores atinentes a esta tão
fascinante área da economia.
Assim, quando analisamos o fluxo da atividade econômica com governo e
setor externo, temos a seguinte configuração descrita na figura a seguir:
FIGURA 6 – FLUXO BÁSICO DA ECONOMIA COM GOVERNO E SETOR EXTERNO
Fatores e gastos
Renda
Exportação
Setor
externo
Importação
Consumo ($)
Produto
Bens e serviços
Indivíduos
Empresas
Fatores de produção
(Capital, mão de obra, terra, capacidade empresarial)
Renda($)
(Juro, salário, aluguel, lucro)
Impostos
transferências
Governo
Impostos
gastos do governo
FONTE: Nogami (2012, p. 40)
Numa economia aberta, constituída por famílias, empresas, governo e
setor externo, pode-se afirmar que a renda obtida a partir da venda dos fatores
produtivos terra, trabalho, capital e capacidade empresarial, bem como da venda
dos bens e serviços, é utilizada, em grande medida, na compra dos produtos e
serviços necessários e desejados pelos agentes econômicos.
Assim, ocorre uma circulação contínua de produtos e rendimentos que
possibilitam a observação do desempenho macroeconômico de uma economia
sob três óticas distintas: o produto (P), a renda (R) e a despesa (D). Afirma-se que
estes três agregados constituem uma identidade econômica básica, por que:
85
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Produto ≡ renda ≡ despesa
Observe que a forma mais adequada para expressar as identidades é a
utilização do símbolo da identidade (≡) em vez do símbolo da igualdade (=). Isso
para demonstrar que, “da mesma forma que não pode ocorrer uma compra sem
que vejamos do outro lado uma venda, também não pode haver uma produção
que não constitua um dispêndio e não seja simultaneamente geração de renda”
(PAULANI; BRAGA, 2006, p. 8). Daí surge a denominação identidade básica.
2.2.1 Modelo de Economia Simples
Analisemos cada agregado separadamente. Para melhor compreensão
desses conceitos, partiremos de um modelo de economia simples, sem governo e
sem setor externo.
Sob a ótica das famílias, basicamente toda a renda obtida é gasta na
compra de produtos e serviços. Entretanto, aquilo que não é gasto no momento é
poupado. A poupança nada mais é que uma renúncia do consumo presente para
poder consumir mais no futuro, já que o dinheiro aplicado rende juros. Assim, se
pode afirmar que:
R=C+S
em que:
R = renda; C = consumo e S = poupança (savings, em inglês).
Na ótica das empresas, tudo o que é produzido (denominaremos a partir
de agora de produto) é destinado ao consumo das famílias e parte desta produção,
que é constituída por bens de capital (aqueles utilizados na confecção de outros
bens, como máquinas, equipamentos e materiais de construção) é denominada
de investimentos. Não podemos esquecer que a parcela que é produzida e não
vendida é considerada como investimento em estoques e, por isso, também é
contabilizada como investimento. Assim:
P=C+I
em que:
P = produto; C = consumo e I = investimento.
Se partirmos do pressuposto de que R = P, então, igualando as duas
equações, temos que:
C+S=C+I
86
TÓPICO 1 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA
Ou, finalmente, obtemos que:
S=I
Chegamos assim à outra identidade econômica básica. A poupança
é tecnicamente igual ao investimento porque o excedente sobre o consumo
(poupança) é canalizado para o investimento. Assim:
S≡I
Temos aqui uma importante observação: uma economia, para crescer,
precisa investir, e para investir precisa contar com uma renda não consumida,
que pode ser a poupança. Por isso que taxas de poupança elevadas tendem a
levar a taxas de investimento também elevadas, o que explica, de certo modo, o
bom desempenho econômico de países com altas taxas de poupança. Observe a
figura a seguir:
FIGURA 7 – TAXA DE POUPANÇA (%) DE PAÍSES SELECIONADOS EM RELAÇÃO AO PIB – 2015
O quanto cada país economiza
China
47,9
México
19,9
TAXA DE
POUPANÇA
EM 2015
(em%)
Média da
América
Latina
18,4
Índia
31,3
Colômbia
21,3
Chile
15,9*
25,3
Cingapura
46,1
Brasil
Japão
Indonésia
32,5
20,4Argentina
14,3*
*Projeção do FMI
FONTE: O Globo (2018, s.p.)
Nesta figura, só para exemplificar, observa-se que a China, a qual teve
uma taxa de poupança de 47,9% em relação ao PIB no ano de 2015, apresentou
uma taxa de crescimento do PIB da ordem de 6,9% no mesmo ano.
A relação entre poupança e investimento é objeto de discussões acaloradas
entre os economistas. E você sabe por quê?
87
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Há quem defenda, como a exemplo dos monetaristas, que a poupança é
que precede o investimento, e há quem entenda que é o investimento que precede
a poupança, como para Keynes.
Para ele, o investimento é que precede a poupança; a renda adicional
criada pelo investimento produz a posteriori a poupança exigida.
Logo, pode haver investimento sem poupança – por exemplo, via
criação de crédito [...] e, por conseguinte, não é a poupança que
explica o investimento e sim um conjunto de outras variáveis, como a
preferência pela liquidez, a eficiência marginal do capital e a taxa de juros
(PAULANI; BRAGA, 2006, p. 8).
Por isso, é importante levar em conta outras variáveis, além da poupança
e investimento, quando analisamos os condicionantes do crescimento econômico.
Uma série de outros fatores políticos, econômicos e sociais, que constituem o
sistema econômico como um todo, é imprescindível numa análise mais apurada.
2.2.2 Modelo de Economia Fechada (com governo e sem
setor externo)
Quando incluímos o governo no nosso modelo de análise, passamos a
tratar com mais duas variáveis importantes, que são os gastos do governo (G) e
a tributação (T).
Os gastos governamentais são de três naturezas: custeio (manutenção da
máquina pública), investimentos do governo (infraestrutura de saúde, educação,
transportes, moradia, segurança pública) e transferências (pagamento de
aposentadorias, subsídios e pensões).
A tributação abrange os impostos, taxas e contribuições, que constituem
as receitas governamentais.
Você já deve ter percebido que tributação e gastos são postos em lados
contrários quando se analisam as contas públicas visando conhecer a sua situação
fiscal. Assim, quando o governo gasta mais do que arrecada por meio dos
tributos, temos um déficit fiscal, e o contrário ocorre quando as receitas superam
as despesas, quando temos um superávit fiscal.
Acadêmico, como a tributação é extraída da renda e os gastos do governo
advêm de parte da produção, então:
C+S+T=C+I+G
Temos que:
S+T=I+G
88
TÓPICO 1 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA
Ou, ainda:
S-I=G-T
Essa nova identidade pode ser assim interpretada: o excesso de
despesas do governo sobre a arrecadação, isto é, o déficit do orçamento
do governo é contabilmente idêntico ao excesso de poupança sobre o
investimento privado. Em outras palavras, o déficit orçamentário do
governo é financiado pela poupança privada, que deveria estar sendo
canalizada para investimentos na economia (NOGAMI, 2012, p. 104).
Quando falamos em investimento (não de aplicação financeira), existem
três agentes envolvidos: as famílias (construção de imóveis, educação), as
empresas (criação ou ampliação de unidades fabris, maquinário, equipamentos)
e o governo (infraestrutura). Quando o governo tem uma estrutura de gastos
muito elevada em custeio ou transferências, sobra pouco para investir em
infraestrutura (transportes, saúde, moradia, educação, segurança pública), que é
um dos determinantes do crescimento econômico. Quando o governo apresenta
déficit fiscal, ele precisa fazer empréstimos para realizar as ações governamentais,
fazendo com que a poupança privada (transformada em diversas modalidades
de aplicações financeiras), que tecnicamente deveria atender à demanda de
investimentos, seja mais atrativa circulando no mercado financeiro.
2.2.3 Modelo de Economia Aberta (com governo e com
setor externo)
Vamos completar nosso modelo com a inclusão do setor externo que,
como já vimos, é imprescindível para as nações.
Assim, temos que o excedente que produzimos, além dos demais fatores
de produção e serviços, é comercializado por meio das exportações (X), enquanto
que são importados (M) bens e serviços e fatores produtivos que não dispomos
internamente ou que são mais vantajosos quando trazidos do exterior.
Na ótica da renda, além do consumo, poupança e tributação, incluímos
as importações, e na ótica do produto ou da despesa, temos o consumo, o
investimento, os gastos do governo e as exportações.
Assim:
C+S+T+M=C+I+G+X
Logo:
S+T+M=I+G+X
89
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Agrupando este conjunto de variáveis de acordo com sua procedência,
temos que:
Privado Externo Público
(S - I) + (M - X) = (G - T)
Como entender essa equação?
Em relação ao setor privado, o montante poupado é superior ao investido,
ou seja, há uma poupança interna líquida, enquanto que no setor externo há uma
remessa de recursos ao exterior superior à entrada no país, o que representa uma
poupança externa líquida. Tendo a terceira relação apresentando um déficit fiscal,
chega-se à conclusão de que a poupança interna líquida e a poupança externa
líquida podem – e têm financiado – o endividamento público, podendo assim
causar paralisia ou lentidão na economia que, sem capacidade de investir, tem
dificuldade de crescer (NOGAMI, 2012).
Por outra ótica, podemos deduzir que qualquer acontecimento ou política
econômica que reduza o consumo (C), os investimentos (I), os gastos do governo
(G) ou resultado da balança comercial (M – exportações menos importações – X) a
um dado nível geral de preços (P) leva à diminuição da demanda agregada (DA).
3 AGREGADOS ECONÔMICOS
Agora vamos estudar os agregados econômicos. Como exposto
anteriormente, temos a seguinte igualdade econômica:
Produto ≡ renda ≡ despesa
Veremos, na sequência, como estes agregados são mensurados.
3.1 O PRODUTO NACIONAL E A DESPESA NACIONAL
O produto nacional (ou produto agregado) é o somatório do valor de
todos os bens e serviços finais, em determinado período de tempo (geralmente
um ano), contabilizados em termos monetários. O grifo é importante porque
neste cômputo não entram os bens ou serviços intermediários, pois implicariam
em dupla contagem. Assim, por exemplo, no caso do valor de uma cadeira,
considerado um produto final, já está implícito o valor pago ao fornecedor das
matérias-primas e insumos como a madeira, a cola, a tinta etc. Temos então que:
n
Produto Nacional = PQ
i i
i 1
90
TÓPICO 1 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA
Em que:
Pi = preço médio do produto i
Qi = bem ou serviço i
i = bens e serviços finais i = 1, 2,...n PQ
= valor da produção de setor i
i i
Vale observar que há diferentes formas de definir o produto: interno,
nacional, bruto ou líquido e a preço de mercado ou a custo de fator.
O Produto Interno Bruto (PIB), na maioria das vezes o mais conhecido e
divulgado, é a soma, em unidades monetárias, de tudo o que é produzido em bens
e serviços dentro do país, ou seja, não entra neste cômputo o que é produzido por
multinacionais brasileiras no exterior, mas entra o que é produzido no país por
multinacionais estrangeiras.
No caso do Brasil, nos últimos anos houve flutuações muito grandes no PIB,
devido aos fenômenos econômicos ocorridos tanto interna como externamente
(especialmente a crise financeira de 2008). Para você compreender melhor essas
flutuações, observe a figura a seguir:
FIGURA 8 – PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB) DO BRASIL DE 2000 A 2016 (%)
O VAIVÉM DO PIB
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2015
2016
7,5%
6,1%
5,8%
5,1%
4,4%
4,0%
4,0%
3,2%
3,1%
3,0%
1,9%
1,4%
1,1%
0,5%
-0,1%
FONTE: IBGE (2018, s.p.)
91
-3,8%
-3,6%
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Observe na figura que o reflexo mais forte da crise financeira internacional
sobre o PIB brasileiro foi sentido no ano de 2009, quando houve um decréscimo
nesse indicador da ordem de 0,1%, embora já em 2008 (a crise “estourou” em agosto
de 2008) tenha havido uma queda significativa, passando de um crescimento de
6,1% em 2007 para 5,1% em 2008.
Nos anos seguintes, e ainda hoje, muitos países continuam sendo afetados
pelos efeitos gerados pela crise de 2008, como se observa quando vemos que a
partir de 2013 houve novos decréscimos no PIB brasileiro, quando aliado à
situação econômica internacional, somaram-se também fatores internos que
geraram uma forte crise na economia do país.
Quando nos referimos ao PIB, observe que existe aqui uma delimitação
geográfica importante. O PIB, como já afirmamos, é o somatório de tudo o que é
produzido no país, independentemente da nacionalidade das empresas.
Já o Produto Nacional Bruto (PNB), como a denominação indica, mede o
que é produzido em bens e serviços pelas empresas nacionais, quer elas estejam no
país ou no exterior, desde que a propriedade da empresa pertença a empresários
do país. Neste caso, não é contabilizado o que é produzido pelas multinacionais
instaladas no país que têm sua matriz no exterior.
No sistema de contas nacionais, o PNB é encontrado quando subtraímos a
Renda Líquida Enviada ao Exterior (RLEE) do PIB. A renda enviada ao exterior
é líquida porque representa a diferença entre recursos enviados ao exterior
para remuneração da matriz das multinacionais instaladas no país e os recursos
recebidos do exterior para remuneração da matriz das empresas brasileiras que
têm filiais em outros países.
E
IMPORTANT
Vamos pensar numa questão: Na comparação entre países desenvolvidos e
países em desenvolvimento, em qual deles o PNB tende a ser maior que o PIB?
A tendência é de que o PNB seja maior que o PIB nos países desenvolvidos do que nos
demais porque historicamente é comum que países, como os EUA, integrantes da União
Europeia, Japão, por exemplo, tenham um número muito maior de multinacionais atuando
nos países menos desenvolvidos, como ocorre em relação ao Brasil, que tem um número
significativo de empresas estrangeiras operando nos mais diferentes ramos de atividade, em
especial, o automobilístico. Por isso no Brasil o PNB é menor do que o PIB, já que a renda
enviada ao exterior para remuneração das matrizes das multinacionais é maior do que a que
vem para o Brasil proveniente de multinacionais brasileiras instaladas no exterior.
92
TÓPICO 1 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA
Assim, temos que:
PNB = PIB - RLEE
Outro conceito relacionado ao produto é o de Produto a Preço de Mercado
(PIBpm). Este é o produto que inclui os impostos indiretos (que incidem sobre
a produção e o consumo, tais como ICMS, IPI, dentre outros), já descontados
os subsídios. Podemos dizer, assim, que o PIBpm é a soma do valor dos bens e
serviços efetivamente pagos pelo consumidor.
Já o conceito de Produto a Custo de Fatores (PIBcf) é aquele que reflete
os custos de produção das empresas, pois não inclui os impostos indiretos, mas
inclui os subsídios.
Temos, ainda, que efetuar uma diferenciação entre o Produto Nacional
Bruto e o Produto Nacional Líquido (PNL), já que o produto se torna líquido
quando extraímos o valor relativo à depreciação (bens e serviços produzidos para
a reposição ou manutenção do capital, na forma de máquinas, equipamentos e
instalações das mais diversas).
Assim:
PNL = PNB - depreciação
Alternativamente, o produto agregado pode ser obtido contabilizandose o Valor Adicionado em cada etapa produtiva. Para exemplificar, utilizamos
uma abstração da realidade. Imaginemos, então, que um país produza um único
bem final, o pão. Para produzir pão, dois insumos fundamentais são requeridos:
o trigo e a farinha (LOPES; VASCONCELLOS, 2008). Esses insumos tiveram um
custo para serem produzidos. Assim, conforme estabelecido no quadro abaixo, o
valor adicionado de cada etapa produzida estaria assim representado:
QUADRO 1 – VALOR ADICIONADO PRODUÇÃO AGREGADA
Produto
Valor do produto
Insumos
Valor adicionado
Trigo
10
0
10
Farinha
15
10
5
Pão
20
15
5
FONTE: Lopes e Vasconcellos (2008, p. 31)
93
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Desta forma, soma-se o valor adicionado a cada etapa produtiva, gerando
um valor total de $ 20,00. Neste exemplo, o Valor Bruto da Produção (VBP) é a soma
de todos os bens (trigo, farinha e pão), que soma $ 45,00. Entretanto, não podemos
considerar este valor, pois incorreríamos no erro de dupla contagem. Temos,
então, que suprimir o valor dos insumos necessários à produção do pão, no caso,
denominados de bens de consumo intermediário (LOPES; VASCONCELLOS, 2008).
Assim, o valor adicionado (VA) é dado por:
VA = VBP - consumo de bens serviços intermediários
Então:
VA = 45 - 25
VA = 20
Como afirmamos anteriormente, produto, despesa e renda agregados
formam uma identidade econômica básica. Mas como obter o valor da despesa
(ou dispêndio) nacional? Esta é encontrada quando medimos as despesas
realizadas pelos consumidores, empresas, governo e setor externo para produzir
bens e serviços.
DN = Despesas de consumo
Ou seja: “Para produzir, quais tipos de bens a economia despendeu seus
esforços, sua força de trabalho, seu capital material?” (PAULANI; BRAGA,
2006, p. 12).
Na sociedade em que vivemos e que é, no aspecto material,
inteiramente organizada pela troca, a ótica do produto considera a
atividade dos indivíduos como produtores, ou seja, a atividade das
unidades produtivas ou empresas. Já a ótica do dispêndio (ou do
gasto, ou da demanda) refere-se à sua atuação como consumidores,
ou seja, como famílias. Finalmente, a ótica da renda analisa os
indivíduos em sua condição de proprietários de fatores de produção.
As transações ocorrem entre as famílias e empresas e envolvem fluxos
reciprocamente determinados de bens e serviços concretos, por um
lado, e de dinheiro, por outro (PAULANI; BRAGA, 2006, p. 20).
94
TÓPICO 1 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA
3.2 A RENDA NACIONAL
A terceira forma de medir a atividade econômica utiliza o conceito de
Renda Nacional, que nada mais é do que a soma da remuneração obtida pela
utilização dos fatores produtivos terra, capital, trabalho e capacidade empresarial,
denominados, respectivamente, de aluguel, juro, salário e lucro, na produção dos
bens e serviços demandados pela sociedade.
RN = aluguel + juro + salário + lucro
Vimos, desta forma, que as três óticas (produto, despesa e renda) são
utilizadas para medir a atividade econômica e conduzem ao mesmo resultado
numérico, expresso em unidades monetárias.
Para fecharmos as medidas de produto e de renda, podemos introduzir
os conceitos de Renda Nacional (RN), que é o Produto Nacional Líquido
a custo de fatores, Renda Pessoal (RP), que é igual à Renda Nacional
menos os lucros retidos pelas empresas, os impostos diretos sobre
empresas, outras receitas do governo (contribuição previdenciária,
FGTS etc.), e mais as transferências governamentais (aposentadorias,
seguro desemprego etc.). Temos ainda a Renda Pessoal Disponível
(RPD), que é a Renda Pessoal subtraindo-se os impostos diretos sobre
as famílias (LOPES; VASCONCELLOS, 2008, p. 38).
TUROS
ESTUDOS FU
É importante observar que, nesta disciplina, você se familiariza com os principais
conceitos da contabilidade social (ou nacional), que os estudos utilizando exemplos práticos
e exercícios com o arcabouço próprio da escrituração contábil ocorrerão em disciplina
específica (Contabilidade Social).
95
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:
• O fluxo circular da atividade econômica mostra de forma simplificada a
maneira pela qual indivíduos e firmas interagem na economia, cada qual
buscando atingir diferentes objetivos: as firmas procurando maximizar seus
lucros e os indivíduos procurando maximizar a satisfação de seus desejos e
necessidades” (NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 371).
• Analisamos o fluxo circular da atividade econômica somente com dois agentes
econômicos: empresas e famílias. As empresas oferecem bens e serviços e
demandam fatores de produção, enquanto as famílias demandam bens e
serviços e oferecem fatores de produção.
• Quando introduzimos o governo na nossa análise, vimos que este desempenha
uma função muito importante na economia, pois, de acordo com Nogami
(2012, p. 39), “o governo é a instância máxima de administração executiva,
geralmente reconhecida como a liderança de um Estado ou uma nação. O
papel que um governo desempenha é, na sua essência, zelar pelo bem-estar,
da mesma maneira como o chefe de uma unidade familiar, ou o síndico de um
condomínio”.
• Para que o Estado possa desempenhar essas funções, precisa auferir renda e o
faz por meio da cobrança de tributos (que são divididos em impostos, taxas e
contribuições).
• O setor externo desempenha um papel muito importante para a economia das
nações, pois permite a aquisição de bens e serviços que não possuem ou não
têm competitividade e a venda de bens e serviços que possuem em abundância
no país.
• Assim, ocorre uma circulação contínua de produtos e rendimentos que
possibilitam a observação do desempenho macroeconômico de uma economia
sob três óticas distintas: o produto (P), a renda (R) e a despesa (D). Afirma-se
que esses três agregados constituem uma identidade econômica básica, por
que: Produto ≡ renda ≡ despesa.
• O produto nacional (ou produto agregado) é o somatório do valor de todos
os bens e serviços finais, em determinado período de tempo (geralmente um
ano), contabilizados em termos monetários.
96
• O Produto Interno Bruto (PIB) é a soma, em unidades monetárias, de tudo o
que é produzido em bens e serviços dentro do país, ou seja, não entra neste
cômputo o que é produzido por multinacionais brasileiras no exterior, mas
entra o que é produzido no país por multinacionais estrangeiras.
• O Produto Nacional Bruto (PNB) mede o que é produzido em bens e serviços
pelas empresas nacionais, quer elas estejam no país ou no exterior, desde que
a propriedade da empresa pertença a empresários do país. Neste caso, não é
contabilizado o que é produzido pelas multinacionais instaladas no país que
têm sua matriz no exterior.
• Outros indicadores são: Produto a Preço de Mercado (PIBpm); Produto a Custo
de Fatores (PIBcf); Produto Nacional Líquido (PNL).
• Alternativamente, o produto agregado pode ser obtido contabilizando-se o
Valor Adicionado em cada etapa produtiva.
• O valor da despesa (ou dispêndio) nacional é encontrado quando medimos
as despesas realizadas pelos consumidores, empresas, governo e setor externo
para produzir bens e serviços.
• A Renda Nacional é a soma da remuneração obtida pela utilização dos fatores
produtivos terra, capital, trabalho e capacidade empresarial, denominados,
respectivamente, de aluguel, juro, salário e lucro, na produção dos bens e
serviços demandados pela sociedade.
97
AUTOATIVIDADE
1 Diferencie o PIB do PNB e discorra sobre a importância desses dois
agregados para a economia das nações.
2 Sobre o fluxo circular da atividade econômica, podemos afirmar que:
a) ( ) O fluxo circular da atividade econômica mostra de forma simplificada
a maneira pela qual indivíduos e empresas interagem na economia,
cada qual buscando atingir diferentes objetivos. As firmas procurando
maximizar seus lucros e os indivíduos procurando maximizar a
satisfação de seus desejos e necessidades.
b) ( ) Qualquer que seja a empresa, agrícola, industrial ou de serviços, ela
necessita, para operar, de recursos produtivos.
c) ( ) O consumo representa a demanda total de bens e serviços dos
indivíduos em uma economia, e que dependem da renda disponível
desses indivíduos.
d) ( ) As empresas, utilizando os fatores de produção disponíveis, produzirão
bens e serviços que serão oferecidos aos indivíduos.
e) ( ) Todas as alternativas estão corretas.
3 Por fluxo real entende-se o movimento dos recursos produtivos e de bens
e serviços entre os diversos agentes econômicos. Assinale a alternativa
CORRETA:
a) ( ) O fluxo real representa o pagamento pela utilização dos recursos
produtivos.
b) ( ) As empresas oferecem bens e serviços e compram recursos produtivos,
e os trabalhadores vendem recursos produtivos, o que representa o
fluxo real da economia.
c) ( ) As empresas representam o lado monetário da economia e os
trabalhadores o lado real.
d) ( ) Os recursos produtivos são fornecidos somente pelo governo.
e) ( ) Nenhuma das alternativas anteriores.
4 Complete a citação de Nogami (2012, p. 35): “Como contrapartida monetária
dos fluxos reais temos os fluxos __________. Toda vez que um bem ou serviço
é transferido de um agente para outro, são efetuados pagamentos em troca
deles. O fluxo monetário, consequentemente, gira em direção contrária ao
__________”.
Assinale a alternativa que completa a frase:
a)
b)
c)
d)
e)
(
(
(
(
(
)
)
)
)
)
Cambiais, reais.
Reais, cambiais.
Econômicos, cambiais.
Fluxo real, monetários.
Monetários, fluxo real.
98
TÓPICO 2
UNIDADE 2
A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O MODELO
CLÁSSICO
1 INTRODUÇÃO
O modo de produção capitalista é um sistema que gera e reproduz crises.
Isso porque a crise é inerente a este sistema, que divide a sociedade em duas
classes sociais: o capital e o trabalho, como já afirmamos.
Uma das mais graves crises foi a ocorrida em 1930, que você já ouviu falar
desde o Ensino Fundamental ou Médio, não à toa chamada de “Grande Depressão”.
A teoria clássica de Adam Smith (também conhecida como teoria do
liberalismo econômico) foi hegemônica desde a Revolução Industrial até a
Grande Depressão.
A base desta teoria trazia os seguintes pressupostos: o mercado deveria
funcionar livremente; b) a economia deveria atingir o pleno emprego; c) o
desemprego somente ocorreria quando os trabalhadores quisessem receber
acima do salário de mercado – desemprego voluntário; d) a oferta cria sua própria
demanda – Lei de Say.
A partir da Grande Depressão, pelo menos até as décadas de 1970/1980,
as nações praticamente não mais utilizaram como modelo a teoria clássica, mas a
“Teoria da Determinação do Equilíbrio da Renda Nacional”, de Keynes, capítulo
integrante da célebre obra Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda, publicada
em 1936, que contestava veementemente a ideia de que “havia uma tendência
automática ao pleno emprego, com inexistência de desemprego e de capacidade
ociosa” (NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 395).
Já estudamos na Unidade 1 que a macroeconomia analisa as relações
existentes entre dois mercados específicos: o mercado real e o mercado monetário.
Vimos também que é por meio das políticas macroeconômicas que acontece a
intervenção do Estado na economia, o que pode acontecer tanto no mercado
monetário quanto no mercado real.
99
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Os principais órgãos responsáveis por implementar estas políticas são o
Ministério da Fazenda, que atua mais especificamente no mercado real, e o Banco
Central, também chamado de Autoridade Monetária, que se responsabiliza pelo
mercado monetário.
Um dos principais objetivos da intervenção do Estado na economia é a
geração de renda, componente fundamental para o crescimento econômico e a
geração de empregos. Mas existem teorias divergentes no que se refere à forma
como se determina a renda, que são o modelo clássico e o modelo keynesiano.
Para que você possa construir seu próprio pensamento crítico a respeito
das duas teorias de determinação da renda, analisaremos primeiro o modelo
clássico de determinação da renda nacional para, em seguida, conhecermos o
modelo keynesiano.
2 O MODELO CLÁSSICO
Para Rossetti (1988, p. 606), “todo o desenvolvimento clássico sobre
o equilíbrio geral da atividade econômica foi definitivamente resumido nos
primeiros anos do século XIX pelo teórico francês Jean-Baptiste Say (1767-1832),
em seu Traité d’Êconomie Politique, cuja primeira edição foi publicada em 1803”.
Defensor do liberalismo econômico, tal como proposto por Adam Smith,
Say era defensor do livre mercado e do mecanismo do sistema de preços,
assegurando que a produção cria mercados para os produtos.
Segundo Pereira (1976, p. 9), “a Macroeconomia Clássica, como toda a
teoria econômica clássica, parte do pressuposto fundamental de que o mundo
econômico é governado por leis naturais, as quais, se forem deixadas a funcionar
livremente, produzirão sempre os melhores resultados possíveis”.
Os clássicos se utilizam de três hipóteses para formular a sua teoria de
determinação da renda nacional: a) as forças de mercado tendem a equilibrar a
economia a pleno emprego; b) a quantidade de moeda afeta apenas o nível geral
de preços; e c) a demanda agregada não é um fator determinante do nível do
produto, hipóteses essas que estudaremos adiante.
Antes de prosseguirmos, entretanto, uma informação é importante: como já
frisamos, até a Grande Depressão de 1930 a teoria macroeconômica não tinha grande
importância na literatura econômica, sendo Keynes seu principal formulador.
Assim, de acordo com Lopes e Vasconcellos (2008, p. 105-6):
O que os livros-textos de Macroeconomia caracterizam como modelo
clássico é na realidade a junção da contribuição de diversos autores
isolados. [...] Na verdade, o chamado modelo clássico utilizado nos principais
livros-texto de Macroeconomia diz respeito ao modelo neoclássico, que se
baseia na hipótese da racionalidade dos agentes econômicos.
100
TÓPICO 2 | A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O MODELO CLÁSSICO
Um dos principais defensores de Say sustentava que:
Como a oferta cria a sua própria procura, não poderia haver
superprodução, afastando-se, consequentemente, a possibilidade de
ocorrência do desemprego geral. A produção global sempre criaria, ela
própria, mercado para seu escoamento, pois, numa economia baseada
nas trocas e na divisão do trabalho, o ato da produção representa
um futuro ato de procura; o fato de a coletividade estar produzindo
significa que ela está se preparando para consumir (A. G. PIGOU apud
ROSSETTI, 1988, p. 606).
Segundo Lopes e Vasconcellos (2008, p. 105):
O modelo clássico considera que as forças de mercado tendem a
equilibrar a economia a pleno emprego, isto é, no ponto em que se
igualam a oferta e a procura de mão de obra; corresponde a dizer que
há completa flexibilidade de preços e salários; como o nível de atividade
e de emprego está determinado automaticamente pelas forças de
mercado, a quantidade de moeda afeta apenas o nível geral de preços.
Significa dizer que as variáveis reais, bem como os preços relativos, não
são afetados pela política monetária (hipótese da neutralidade da moeda);
a demanda agregada não é um fator determinante do nível do produto;
é válida a chamada Lei de Say: ‘a oferta cria sua própria demanda’.
Para que possamos conhecer todas as proposições do modelo clássico de
determinação da renda nacional, analisaremos primeiro como se forma a oferta
agregada, a função de produção agregada, demanda, oferta e equilíbrio no
mercado de trabalho, oferta e demanda agregada, o papel da moeda no modelo
clássico, poupança, investimento e o papel da taxa de juros para, finalmente,
analisarmos o equilíbrio entre oferta e demanda
2.1 OFERTA AGREGADA
A demanda agregada não é um fator determinante do nível do produto
para os clássicos; é válida a chamada Lei de Say: "a oferta cria sua própria
demanda".
Segundo esta lei, a oferta agregada, ou seja, as quantidades produzidas e
o volume de serviços oferecidos são determinados pela quantidade e qualidade
dos fatores de produção existentes, nível tecnológico, capacitação do capital
humano e pela capacidade de administração dos empreendedores (LOPES;
VASCONCELLOS, 2008).
Say argumentava que havia simultaneidade e interdependência dos
fluxos da produção e da renda. Mas o que isso significa?
Basicamente, significa que a produção vai determinar a oferta, e esta
criará a demanda e a renda, então será uma consequência da produção, já que
no processo produtivo todos os agentes são envolvidos, quer sejam firmas, quer
sejam trabalhadores.
101
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
“Afinal, a geração simultânea da produção e da renda coloca nas mãos
da coletividade um potencial de compra suficiente para que todos os bens e
serviços produzidos pelo sistema possam ser efetivamente consumidos”
(ROSSETI, 1988, p. 609).
Não é a demanda agregada que determina o nível de produtos e serviços
da economia, mas sim as condições de oferta. A demanda apenas determina o
nível de preços (LOPES; VASCONCELLOS, 2008).
E a oferta agregada, como se forma? Para os clássicos, “a oferta agregada
corresponde ao total de produto que as empresas e famílias estão dispostas a
oferecer em um determinado período de tempo, a um determinado padrão de
preços” (LOPES; VASCONCELLOS, 2008, p. 106).
É preciso lembrar que existem algumas condições importantes na análise
clássica do equilíbrio geral, dentre elas que as empresas estão inseridas num
mercado perfeitamente competitivo e, assim, são tomadoras de preços, ou seja, é
o próprio mercado que determina o preço dos produtos na interação entre oferta
e demanda. Somando-se a produção de cada firma, obtém-se a oferta agregada.
A renda nacional é gerada no processo de produção pela remuneração
dos fatores produtivos (salários, lucros, juros e aluguéis) e retorna para o mesmo
processo na forma de consumo ou investimento.
Com isso, toda a produção de bens e serviços da economia seria escoada,
não havendo vazamentos. Mesmo a parte da renda que não fosse para o consumo,
isto é, a parte poupada, iria para os investimentos em bens de capital.
2.2 FUNÇÃO DE PRODUÇÃO AGREGADA
“Produzir significa adaptar a natureza, por meio da combinação de
fatores de produção, às necessidades humanas. Para gerar produto, portanto,
as empresas se utilizam de capital (máquinas, equipamentos, edifícios etc.) e
trabalho, de acordo com uma dada tecnologia” (LOPES; VASCONCELLOS, 2008,
p. 106).
Assim, para produzir sapatos é preciso de máquinas e equipamentos,
matérias-primas e insumos, mão de obra, sendo que o nível tecnológico irá
depender de quão modernos são estes bens de capital e, ainda, o nível tecnológico,
adaptado ao conhecimento, irá determinar a produtividade da empresa.
Para analisar a relação existente entre a quantidade produzida e os fatores
produtivos empregados, os clássicos utilizam a seguinte função de produção:
Y = f (K.N,T)
102
TÓPICO 2 | A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O MODELO CLÁSSICO
Em que:
Y = produto;
K = estoque de capital utilizado;
N = quantidade de trabalho (horas);
T = nível tecnológico.
Essas variáveis são definidas num dado período de tempo, nesse caso
considerado o curto prazo, que é aquele período de tempo em que pelo menos
um dos fatores de produção é fixo, neste caso o capital, sendo o trabalho o fator
variável.
Vamos considerar que a produção responde positivamente a qualquer
das variáveis que a determina, ou seja, aumentando a quantidade de fatores
produtivos utilizados, aumentará a quantidade produzida e que a função de
produção apresenta retornos constantes de escala.
Se tomarmos o capital (K) como um fator de produção fixo, essa função
apresentará rendimentos marginais decrescentes em relação ao fator variável (N),
que é o trabalho. Dessa formulação resulta um conceito muito utilizado pelos
clássicos, que é o da produtividade marginal decrescente.
Para entender esse conceito, vamos a um exemplo formulado por Nogami
e Passos (2003, p. 225-226):
Suponhamos que uma fazenda possua uma determinada área
cultivável de, por exemplo, 10 hectares. Façamos então a hipótese
de que esse fator de produção permanecerá fixo e que a mão de obra
será o único fator de produção variável, de tal forma que essa fazenda
possa produzir volumes maiores de produção (trigo) por meio do
aumento desse fator (mão de obra).
Em termos de função de produção, teríamos:
Y = f (K.N)
Em que:
K = Terra (capital) e N = Trabalho
Logo:
Y = f (N)
Ou seja, o nível de produto varia apenas em função (ou depende) de
alterações na mão de obra, em curto prazo, coeteris paribus (todas as demais
variáveis permanecem constantes). Observe o quadro a seguir:
103
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
QUADRO 2 – PRODUÇÃO DE TRIGO COM UM FATOR DE PRODUÇÃO VARIÁVEL (MÃO DE OBRA)
Quantidade de
Terra utilizada
(K)
Unidades
de mão de obra empregadas
(N)
Produto
Total
(Y)
Produto
Marginal
Pmg = ∆q/∆L
10
0
0
-
10
1
10
10
10
2
22
12
10
3
39
17
10
4
52
13
10
5
60
8
10
6
60
0
10
7
56
-4
10
8
48
-8
FONTE: Nogami e Passos (2003, p. 226)
Podemos observar no quadro que
os dados da coluna 3 indicam a produção máxima de trigo que pode
ser obtida a partir de diferentes quantidades de mão de obra, sempre
na suposição de que o fator terra permaneça fixo. A mão de obra (N) é
medida em homens/ano e o produto total (Y) em sacas/ano. Tais dados
mostram que quando o fator mão de obra é zero, o volume de produto
também é zero. O resto da tabela deve ser lido da seguinte forma: se o
fazendeiro contratar um trabalhador, a produção de trigo será de 10
sacas/ano; se contratar dois trabalhadores, a produção de trigo deverá ser
de 22 sacas/ano. Se contratar três trabalhadores, então a produção total
será de 39 sacas/ano e assim por diante (NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 226).
Note que com cinco trabalhadores essa firma conseguiria o máximo de
produção (60 sacas) e a partir do sexto trabalhador contratado a produção inicialmente
permaneceria a mesma, para depois ir diminuindo. Por que isso acontece?
Quando o número de trabalhadores vai aumentando até chegar a cinco,
cada um pode se especializar em alguma etapa da atividade produtiva, que é a
lógica da divisão do trabalho, mas a partir do sexto trabalhador não haverá mais
condições de aumentar a produtividade, havendo, ao contrário, um decréscimo
na produção, porque alguns ficarão ociosos.
A partir dessa constatação é que os clássicos formularam a teoria da
produtividade marginal de um fator de produção, no caso, da mão de obra.
Essa teoria consiste no seguinte: “O produto marginal (ou produtividade
marginal) do fator variável é definido como sendo a variação na produção total
decorrente da variação de uma unidade no fator de produção variável. Como em
nosso exemplo, a mão de obra é o único fator de produção variável” (NOGAMI;
PASSOS, 2003, p. 229).
104
TÓPICO 2 | A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O MODELO CLÁSSICO
Assim, o nível de produção depende da quantidade utilizada do fator
trabalho, dado o estoque de capital e o nível tecnológico, como se observa no
gráfico ilustrado a seguir, sendo que a produtividade marginal do trabalho é
positiva, mas decrescente:
FIGURA 9 – FUNÇÃO DE PRODUÇÃO AGREGADA
Y
Y = F (N)
A Produtividade Marginal do Trabalho
corresponde à inclinação da reta
tangente à função de produção em cada
um de seus pontos.
N
FONTE: Lopes e Vasconcellos (2008, p. 108)
Considerando o curto prazo em que, em nosso caso, apenas a quantidade
de trabalho pode ser alterada, percebemos que a produção ou oferta
agregada passa a depender exclusivamente de quanto é utilizado deste
fator. O nível de emprego (utilização) do fator trabalho é determinado
no mercado de trabalho, em que a demanda é realizada pelas empresas
que o utilizam na produção, e a oferta pelos indivíduos (famílias,
trabalhadores) que o possuem (LOPES; VASCONCELLOS, 2008, p. 108).
Como para os clássicos o mercado de trabalho é a força motriz, que
determina o nível de mão de obra e o salário real de pleno emprego, vamos
analisar agora os condicionantes desse mercado.
2.3 DEMANDA, OFERTA E EQUILÍBRIO NO MERCADO DE
TRABALHO
Considerando a hipótese dos clássicos de que as forças de mercado tendem
a equilibrar a economia a pleno emprego, ou seja, que flutuações na economia
seriam apenas momentâneas, questionamos: Como, então, explicar o desemprego?
O desemprego seria apenas momentâneo, haja visto que, como sempre
haveria tendência ao equilíbrio nos mercados, se houvesse desemprego seria
porque haveria um excesso de oferta de trabalho em relação à demanda dos
empresários pela mão de obra.
Desta forma, para restabelecer o equilíbrio no mercado de trabalho (assim
como acontecia no mercado de bens e serviços), bastaria reduzir os salários (o
preço da mão de obra) para que a demanda por trabalho aumentasse e o problema
fosse resolvido.
105
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
A livre interação entre as forças de oferta e demanda por trabalho é que
determina o número de pessoas e os seus salários reais de equilíbrio. Assim, há
a seguinte relação entre demanda e oferta de mão de obra: a oferta de trabalho é
função crescente do salário real e a demanda por trabalho é função decrescente
do salário real.
NOTA
Por salário real entende-se a remuneração paga ao trabalhador descontada a
inflação, pois caso contrário denominaríamos de salário nominal.
Quanto ao trabalhador, a decisão de quanto trabalhar corresponde à
escolha de como alocar as horas do dia entre o trabalho e o lazer, sendo que o
trabalho não gera nenhum prazer, apenas a renda necessária para poder consumir
e obter a satisfação decorrente do consumo de mercadorias.
Assim, a decisão de dedicar seu tempo ao trabalho depende do valor do
salário real, ou seja, deve ser tal que induza o indivíduo a abrir mão do lazer.
“Por simplicidade, suporemos que o efeito substituição se sobreponha ao
efeito renda, e que a curva de oferta de trabalho seja positivamente inclinada em
relação ao salário real” (LOPES; VASCONCELLOS, 2008, p. 111).
O resultado é, então, o exposto no gráfico ilustrado a seguir:
FIGURA 10 – OFERTA DE TRABALHO POSITIVAMENTE INCLINADA
W
P
Ns
N
FONTE: Lopes e Vasconcellos (2008, p. 112)
Já com relação à empresa, levando em consideração que a produtividade
marginal do trabalho é decrescente, a empresa somente contrata mais trabalhadores
se o salário real baixar, de forma a aumentar seu lucro ou pelo menos manter
seu lucro dentro do esperado. Graficamente, temos a seguinte representação da
demanda por mão de obra:
106
TÓPICO 2 | A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O MODELO CLÁSSICO
FIGURA 11 – DEMANDA DE MÃO DE OBRA NO MODELO CLÁSSICO
Como a PMgN é decrescente, para que
haja mais contratação de trabalho, o
salário real deve reduzir-se.
W
P
N d = PMgN
N
FONTE: Lopes e Vasconcellos (2008, p. 110)
Já analisamos a oferta e a demanda de mão de obra no modelo clássico.
Considerando que a teoria do equilíbrio parcial considera que os
mercados operem em uma situação de concorrência perfeita, em que empresas e
trabalhadores são tomadores de preços tanto de bens e serviços quanto de fatores
produtivos, o equilíbrio entre oferta e demanda de mão de obra é análogo ao
formato do equilíbrio entre oferta e demanda de um produto qualquer (já que é
o mercado que vai determinar o preço dos produtos e dos fatores produtivos).
Desta maneira, o equilíbrio configura-se da seguinte forma:
FIGURA 12 – EQUILÍBRIO NO MERCADO DE TRABALHO
W
P
Ns
W P 1
W P 2
W P 3
N d Excesso de demanda de trabalho
N
Nc
FONTE: Lopes e Vasconcellos (2008, p. 113)
107
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Assim, quando o salário real estiver acima do nível de equilíbrio,
haverá excesso de oferta de trabalho, o número de horas de trabalho
oferecidas pelos trabalhadores será maior do que o demandado pelas
empresas, caracterizando uma situação de desemprego (W/P). Com
isso, a concorrência entre trabalhadores para obter empregos levará
à redução dos salários, reduzindo a oferta e ampliando a demanda,
até que as duas quantidades se igualem, em um nível inferior de
salário real (W/P). Se o salário real estiver abaixo do equilíbrio, haverá
excesso de demanda por trabalho (superemprego) (W/P). Com isso, a
concorrência entre as firmas para conseguir trabalhadores levará ao
aumento do salário real, ampliando a oferta de trabalho e diminuindo
a demanda, até que as duas quantidades se igualem (W/P) (LOPES;
VASCONCELLOS, 2008, p. 113).
2.4 OFERTA E DEMANDA AGREGADA E O PAPEL DA MOEDA
Tendo analisado a oferta e demanda de mão de obra no modelo clássico
e considerando que neste modelo (analisado no curto prazo) o nível de produto
depende da função de produção, e sendo a mão de obra o único fator de produção
variável, temos o seguinte formato do produto de pleno emprego (que será ao
mesmo tempo a oferta agregada da economia) (LOPES; VASCONCELLOS, 2008).
FIGURA 13 – OFERTA AGREGADA NO MODELO CLÁSSICO
Y = F (N)
Y
YE
N
NE
FONTE: Lopes e Vasconcellos (2008, p. 114)
Note que a curva de produto, embora seja positiva, cresce a taxas
decrescentes devido à produtividade marginal do trabalho ser decrescente, como
já analisamos anteriormente.
Desta forma, “o nível de emprego e de produto independem de variáveis
nominais (monetárias), como o nível de preços ou salário nominal, por exemplo.
[...] Portanto, a oferta agregada é inelástica ao nível de preços, o que significa
que a curva de oferta é vertical” (LOPES; VASCONCELLOS, 2008, p. 114, grifo
da autora).
108
TÓPICO 2 | A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O MODELO CLÁSSICO
Afinal, o que significa essa afirmação? Quando um produto é inelástico
a preços, significa que se aumentar o preço, a quantidade ofertada permanecerá
a mesma. Isso acontece porque este é o nível de produção no pleno emprego,
ou seja, não há mais recursos disponíveis para aumentar a produção, razão pela
qual, se aumentar o nível de preços da economia, a oferta permanecerá a mesma.
Isso porque, para que o nível de oferta (e de produto) aumente, é preciso
que haja uma expansão dos recursos produtivos: que aumente a quantidade
de matérias-primas disponíveis, por exemplo, com a descoberta de novos
materiais, que o nível tecnológico se modernize (o que faz com que se produza
mais e desperdiçando menos), aumentando assim a produtividade do trabalho,
ou, ainda, com o aumento da população economicamente ativa (crescimento
populacional). Podemos chamar isso de expansão da fronteira de produção.
A curva de oferta agregada de pleno emprego será, então, vertical ao eixo
horizontal (inelástica a preços).
FIGURA 14 – OFERTA AGREGADA DE PLENO EMPREGO
OA
P
YE = YP
Y
FONTE: Lopes e Vasconcellos (2008, p. 115)
Analisemos agora a demanda agregada no modelo clássico.
Sendo o produto real dado pela oferta, o que determina, então, a demanda
agregada? Para os clássicos, esta seria determinada pelo nível de preços.
Partindo do pressuposto de que a renda nacional se iguala ao produto
(que é igual à oferta), se o nível de preço dos produtos sobe o nosso poder de
compra cai, ou seja, com a mesma renda passamos a adquirir menos produtos.
O inverso também é verdadeiro: se o nível de preços cai, aumenta nosso
poder de compra, permitindo adquirir mais produtos com a mesma renda
disponível. Desse modo, o formato da curva de demanda agregada clássica fica
assim representado:
109
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
FIGURA 15 – CURVA DE DEMANDA AGREGADA CLÁSSICA
P
DAO = (MO , VO)
Y
FONTE: Lopes e Vasconcellos (2008, p. 116)
Como a posição da curva de demanda é determinada pela oferta de moeda,
concluímos que, no modelo clássico, um aumento da quantidade de moeda em
circulação ampliará a demanda agregada, que fará com que suba o preço das
mercadorias, já que a oferta agregada no curto prazo é fixa.
FIGURA 16 – EFEITO DE AUMENTO DA QUANTIDADE DE MOEDA SOBRE A DEMANDA
AGREGADA
P
M1 > M0
DA1 = (M1 , V0)
DAO = (MO , VO)
Y
FONTE: Lopes e Vasconcellos (2008, p. 116)
Note no gráfico acima que quando há um aumento da quantidade de
moeda ofertada de M0 para M1, a curva de demanda agregada se desloca inteira
para cima (DA0 para DA1), elevando os preços dos produtos.
Demonstrando agora, graficamente, como se dá o equilíbrio entre oferta e
demanda agregada no modelo clássico, chegamos à seguinte configuração:
110
TÓPICO 2 | A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O MODELO CLÁSSICO
FIGURA 17 – OFERTA E DEMANDA AGREGADA DE EQUILÍBRIO NO MODELO CLÁSSICO E
NÍVEL GERAL DE PREÇOS
P
OA
P1
DA1 = (M1 )
P0
DAO (MO )
Y
YE = YP
FONTE: Lopes e Vasconcellos (2008, p. 117)
2.5 O PAPEL DA MOEDA NO MODELO CLÁSSICO
Vimos que uma das hipóteses do modelo clássico de determinação
da renda supõe que há uma separação entre o lado real e o lado monetário da
economia. Para estes, a moeda tende a ser neutra, especialmente no longo prazo.
Mas o que isso significa?
Basicamente significa que, caso haja aumento da quantidade de moeda
em circulação, acarretará em aumento do nível geral de preços (gerando inflação),
sem alterar o nível de produto, nível de emprego, salário real e os preços relativos
da economia.
Caso imperfeições no mercado venham a ocorrer (lembremos de que
os clássicos supõem a livre concorrência), como a pressão de sindicatos com o
consequente aumento dos salários, haverá desemprego, fazendo com que haja
uma oferta maior de mão de obra em relação à demanda e uma diminuição do
produto (ficará abaixo do produto potencial).
Entretanto, com o desemprego haverá trabalhadores aceitando trabalhar
por salários cada vez menores, ou, se o governo lançar mão da política monetária
e injetar moeda na economia, elevará o nível geral de preços e o valor do salário
real cairá, o que restabelecerá novamente o equilíbrio.
111
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
2.6 POUPANÇA, INVESTIMENTO E O PAPEL DA TAXA DE
JUROS
Apesar dos clássicos sustentarem a aplicabilidade da Lei de Say,
admitiam a existência de uma variável que poderia interromper (mas sempre
temporariamente) este mecanismo: a poupança.
“Sem dúvida, se a sociedade destinasse ao consumo todo o rendimento
gerado pelo processo da produção, não haveria motivos para que ocorressem
a superprodução, o desemprego e o desequilíbrio da atividade econômica”
(ROSSETTI, 1988, p. 609).
Afirmavam, então, que a poupança, se de início pode causar algum
desequilíbrio, acaba sendo importante componente para o crescimento da
economia, porque esta se traduziria em investimento, bastando, para restaurar o
equilíbrio, que as duas variáveis se igualem. Ou seja, acreditavam que a poupança
é uma variável que antecede o investimento.
Sendo o nível de poupança determinado pela taxa de juros, quanto maior
a taxa de juros de mercado, maiores os recursos poupados. Já o investimento
caminha em sentido contrário: como os investidores (unidades produtoras) em
geral captam recursos no mercado financeiro, quanto menores essas taxas, maior
será o nível de investimento.
Segundo Nogami e Passos (2003), uma vez que a poupança é estimulada
pelas altas taxas de juros e o investimento é encorajado pelas baixas taxas de
juros, as curvas de poupança e do investimento caminham em direções inversas,
devendo interceptar-se em determinado ponto de equilíbrio, como podemos
observar no gráfico ilustrado a seguir:
Taxa de Juros
FIGURA 18 – UM EXEMPLO DA CONCEPÇÃO CLÁSSICA DA IGUALAÇÃO AUTOMÁTICA
POUPANÇA-INVESTIMENTO
s1
E
m
m
s
l
E1
1
s
l
s
n
n1
Poupança e investimento
FONTE: Rossetti (1988, p. 611)
112
TÓPICO 2 | A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O MODELO CLÁSSICO
É importante destacar, por fim, que o nível de consumo agregado também
depende da taxa de juros, pois quando as mesmas estão elevadas o custo da
moeda também se eleva, podendo elevar os preços dos produtos.
NOTA
Para os clássicos, a taxa de juros considerada é a taxa de juros real, ou seja, é
a taxa que se forma quando se subtrai a inflação que está contida na taxa nominal de juros.
A relação entre a taxa de juros nominal, a taxa de juros real e a inflação é dada pela seguinte
fórmula:
ir in t
1+t
Em que:
ir = taxa real de juros
in = taxa nominal de juros
t = taxa de inflação
As taxas devem ser expressas em termos centesimais, ou seja, devem ser divididas por 100,
por exemplo, 10% correspondem a 0,10 na fórmula (NOGAMI; PASSOS, 2003).
Assim, exemplificando, para uma taxa de juros nominal de 40%, supondo uma taxa de
inflação de 33%, qual é o valor da taxa de juros real?
Temos que:
ir 0 , 40 0 , 33
1 0 , 33
Assim:
ir =
0 , 07
1, 33
Logo:
ir = 0 , 053 ou 5 , 3%
113
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
2.7 EQUILÍBRIO ENTRE OFERTA E DEMANDA
Tendo estudado oferta e demanda agregadas separadamente, vamos
analisar como se dá o equilíbrio entre as duas variáveis.
Temos que:
Oferta Agregada = Demanda Agregada, ou seja:
Y = DA
Considerando apenas o consumo e o investimento, temos que:
DA = C + I
Assim, no equilíbrio entre oferta e demanda, substituímos DA por C + I:
Y=C+I
Considerando, ainda, que tanto o consumo como o investimento
dependem da taxa real de juros, temos que:
Y = C( i ) + l( i ), sendo r a taxa real de juros
Pela definição de poupança, temos que:
S=Y-C
Sabendo que:
S=S(i)
Chegamos, finalmente, no equilíbrio macroeconômico, que é obtido
quando:
S ( i ) = l( i )
Ou seja, de acordo com Lopes e Vasconcellos (2008, p. 122), “a taxa de
juros tem a função de equilibrar o mercado de produto”.
114
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:
• Existem duas teorias antagônicas (opostas) de determinação da renda nacional:
a teoria clássica, baseada principalmente na Lei de Say (a oferta cria a sua
própria demanda), e a teoria keynesiana.
• A teoria clássica vigorou até a década de 1930 como hegemônica e, com a
Grande Depressão de 1930, surge a teoria keynesiana, que foi adotada desde
1930 até as décadas de 1970/1980 pela maioria das nações.
• O modelo clássico considera que “as forças de mercado tendem a equilibrar
a economia a pleno emprego, isto é, no ponto em que se igualam a oferta e a
procura de mão de obra; corresponde a dizer que há completa flexibilidade de
preços e salários; como o nível de atividade e de emprego está determinado
automaticamente pelas forças de mercado, a quantidade de moeda afeta
apenas o nível geral de preços. Significa dizer que as variáveis reais, bem
como os preços relativos, não são afetados pela política monetária (hipótese
da neutralidade da moeda); a demanda agregada não é um fator determinante
do nível do produto; é válida a chamada Lei de Say: "a oferta cria sua própria
demanda"’ (LOPES; VASCONCELLOS, 2008, p. 105).
• “O produto marginal (ou produtividade marginal) do fator variável é definido
como sendo a variação na produção total decorrente da variação de uma
unidade no fator de produção variável. Como em nosso exemplo, a mão de
obra é o único fator de produção variável” (NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 229).
• Para os clássicos, a poupança, se de início pode causar algum desequilíbrio,
acaba sendo importante componente para o crescimento da economia, porque
esta se traduziria em investimento, bastando, para restaurar o equilíbrio, que as
duas variáveis se igualem. Entretanto, a poupança é uma variável que antecede
o investimento.
• A taxa de juros no modelo clássico é responsável pelo equilíbrio macroeconômico
do nível de produção e consumo.
• Os clássicos utilizam a taxa real de juros para abordar esse equilíbrio, sendo
que esta taxa obtém-se subtraindo a taxa de inflação que está embutida na taxa
nominal de juros.
115
AUTOATIVIDADE
1 Por que para os clássicos é a poupança que antecede o investimento?
Explique.
2 Se em um país a taxa nominal de inflação for de 60%, sendo que a taxa de
inflação tenha sido de 55%, qual é o valor da taxa real de juros?
3 Discorra sobre a seguinte afirmação: A demanda agregada não é um fator
determinante do nível do produto; é válida a chamada Lei de Say: "a oferta
cria sua própria demanda".
116
TÓPICO 3
UNIDADE 2
A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
– O LADO REAL
1 INTRODUÇÃO
Como informado no tópico anterior, o modelo clássico de determinação
de renda foi mundialmente assimilado e empregado desde o final do século XVIII
até a década de 1930.
Ao estudar a evolução do pensamento econômico, você irá constatar que
existem os clássicos propriamente ditos, ou seja, os primeiros a fazerem esta
abordagem da economia (como Smith e Say), além dos chamados neoclássicos
(como Stuart Mill, Walras, Pigou, Marshall), incluindo ainda os monetaristas
(como Friedman) e mais recentemente os chamados “novos clássicos” (como
Robert Lucas).
Assim, em oposição aos “clássicos” está a corrente que se formou
na história do pensamento econômico, cujos adeptos podem ser
chamados de “teóricos da demanda efetiva”, ou “da crise”, entre os
quais podemos incluir desde os Mercantilistas, passando por Malthus,
Marx, Rosa Luxemburgo até Kalecki e Keynes, desembocando nos
chamados “Pós-Keynesianos” (Sraffa, Joan Robinson, Minsky)
(MESQUITA FILHO, 2018, s. p.).
A discussão que embasa a teoria keynesiana pode ser resumida na
seguinte questão:
i. É o produto (oferta) que determina a demanda, como preconizado
pela chamada Lei de Say – ‘a oferta cria sua própria procura’; ou,
ii. é a demanda, as decisões de gasto, que determinam o produto
(a oferta), conforme preconizado por Keynes, Kalecki e outros
autores, que defendiam o chamado Princípio da Demanda Efetiva?
(VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 108-109).
Responder a estas indagações não é assim tão fácil, não é mesmo? Opiniões
antagônicas são objeto de debates ainda neste século e você, com certeza, ainda
irá ler e ouvir muito sobre esta controvérsia. Mas por que estas indagações foram
tão importantes para Keynes?
117
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Como Keynes viveu neste período e sentiu os horrores da Grande
Depressão, percebeu que a Lei de Say não conseguia mais se justificar naquele
momento, pois havia grande oferta de produtos, sendo que alguns economistas
afirmam que a crise de 1930 originou-se devido a uma superprodução que não foi
acompanhada pelo lado da demanda.
Desta forma, podemos constatar que estudar as flutuações no produto
(oferta agregada) e, consequentemente, no nível de emprego, é importante para
intervir em situações de crise como as que ocorreram em 1930, década de 1970
(com as chamadas crises do petróleo), crise financeira de 2008 e outras tantas que
com certeza virão, quer sejam motivadas por fenômenos econômicos internos,
quer externos, quer ainda, motivadas por ambas as situações.
É claro que, para responder a estas questões, outras variáveis precisam
ser levadas em conta, como o que determina o crescimento a longo prazo do
produto (que é cada vez mais determinado pela lei da escassez) e, ainda, como
aliar crescimento econômico com distribuição de renda, além da estabilidade
de preços e alto nível de emprego, que são os principais objetivos de política
macroeconômica, como vimos na Unidade 1.
Como você já pôde perceber ao longo dos estudos desta unidade, há
uma intensa discussão entre economistas que defendem a teoria do liberalismo
econômico de que os mercados, sozinhos, se autorregulam, inspirados no que
Smith chamou de “mão invisível”. Ou seja, há no mercado uma espécie de mão
invisível que faz com que o próprio mercado dê conta de equilibrar o sistema
econômico, fazendo com que, automaticamente, a economia seja conduzida ao
pleno emprego de recursos.
Por outro lado, há aqueles que afirmam ser impossível que o mercado
consiga dar conta disso, uma vez que as próprias crises do capitalismo demonstram
a fragilidade do sistema em equilibrar os diversos componentes do sistema
econômico, exigindo, assim, que o Estado intervenha buscando restabelecer este
equilíbrio.
Isso por que, segundo estes:
O governo, principalmente com seus gastos, seria um elemento
fundamental para a inversão do quadro de recessão e desemprego,
uma vez que, gastando mais, estaria aumentando a despesa agregada
e, consequentemente, o nível de produção, permitindo às empresas
ocupar sua capacidade ociosa e elevar a procura de mão de obra
(VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 122).
Analisando os efeitos da Grande Depressão de 1930, Keynes formulou,
como já afirmamos, a “Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda” em 1936
e propôs, então, a intervenção do Estado na economia como forma de debelar
a recessão econômica quase que mundial do período, sendo que o primeiro
país a adotar estas medidas foram os Estados Unidos, seguido posteriormente
por outros. Tais medidas consistiam, de forma geral, em aumentar a demanda
118
TÓPICO 3 | A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O LADO REAL
agregada, que seria obtida por meio do aumento dos gastos governamentais,
principalmente na forma de investimentos públicos em infraestrutura, já que estes
demandam muita mão de obra, matérias-primas e insumos. Assim, empresários
teriam sua demanda aumentada, trabalhadores seriam contratados e aumentaria
a renda agregada que, por sua vez, seria despendida no consumo dos mais
diferentes bens e serviços, o que beneficiaria todo o sistema econômico, gerando
crescimento econômico e superando a crise.
Keynes sustentava que uma economia poderia atingir o equilíbrio,
mesmo apresentando significativos níveis de desemprego de
trabalhadores e de outros fatores de produção. Sustentava, também,
que seria necessária a intervenção do governo no sentido de regular
a atividade econômica e levar a economia para o pleno emprego
(NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 395).
A parte do estudo keynesiano que aborda essas medidas é denominada
teoria de determinação do equilíbrio da renda nacional, também conhecida como
modelo keynesiano básico (VASCONCELLOS; GARCIA, 2005).
Neste tópico, estudaremos o modelo básico analisando o lado real da
economia, constituído pelo mercado de bens e serviços e pelo mercado de trabalho.
TUROS
ESTUDOS FU
No Tópico 4 trataremos do lado monetário, constituído do mercado monetário
e de títulos.
2 HIPÓTESES DO MODELO BÁSICO
Keynes desenvolveu o modelo básico de determinação da renda ao
observar a economia mundial durante a Grande Depressão de 1930, período este
em que havia altas taxas de desemprego, principalmente nos Estados Unidos
e nos países da Europa Ocidental (Alemanha, Áustria, Dinamarca, Espanha,
França, Itália, Portugal, Reino Unido, Suécia, Suíça, dentre outros). Para entender
este modelo, Keynes formulou cinco hipóteses, que passamos a analisar a partir
de agora.
A primeira hipótese, de acordo com Vasconcellos e Garcia (2005, p. 123),
é que “o modelo keynesiano supõe a existência de desemprego, ou seja, que a
economia esteja em equilíbrio abaixo do pleno emprego, produzindo abaixo do
seu potencial: as empresas estão com capacidade ociosa e uma parcela da força de
trabalho está desempregada”.
119
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Com certeza você consegue entender essa hipótese, não é mesmo?
Observando o que acontece na economia, é possível perceber que há realmente
muitas situações em que isso ocorre. Desde 2013, quando o Brasil iniciou um
período de recessão, as taxas de desemprego começaram a aumentar, ficando em
11,75% em 2016 e em 10,85% em 2017.
Observe no gráfico ilustrado a seguir o comportamento da produção
industrial no período de janeiro de 2002 a março de 2017:
FIGURA 19 – PRODUÇÃO INDUSTRIAL BRASILEIRA DE JANEIRO DE 2002 A MARÇO DE 2017
(2012=100)
Produção Industrial Mensal (2012=100)
110
105
100
95
90
85
80
ago/16
mar/17
jan/16
jun/15
nov/14
set/13
abr/14
jul/12
fev/13
dez/11
out/10
mai/11
mar/10
jan/09
ago/09
jun/08
nov/07
set/06
abr/07
fev/06
dez/04
jul/05
out/03
mai/04
ago/02
jan/02
70
mar/03
75
FONTE: Silveira (2017, s.p.)
Vemos, assim, que houve uma significativa queda da produção industrial
brasileira a partir de 2012, apresentando leve recuperação em 2016 e 2017, o que
contribuiu para aumentar as já referidas taxas de desemprego.
A segunda hipótese do modelo básico keynesiano propõe que:
Como a economia está em desemprego, não há razões para as
empresas elevarem os preços dos produtos, num eventual aumento
da demanda. Ou seja, supõe-se que as empresas, quando estimuladas
por um aumento da demanda de seus produtos, procurarão elevar
sua produção, e não os preços, porque estão com capacidade ociosa
(VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 123).
Essa hipótese também pode ser perfeitamente compreendida, pois se os
empresários estão com altos estoques de matérias-primas e insumos, por exemplo,
estes já foram adquiridos a um preço dado e, como para aumentar a produção é só
inseri-los no processo produtivo, não há realmente razão para aumentar os preços.
120
TÓPICO 3 | A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O LADO REAL
A terceira hipótese, de acordo com Vasconcellos e Garcia (2005, p. 124), é
que “o modelo básico analisa a teoria da determinação da renda no curto prazo,
ou seja, analisa o papel das políticas macroeconômicas na estabilização do nível
de atividade e emprego, e do nível de preços”.
Por que no curto prazo? Por definição, o curto prazo é aquele período de
tempo em que pelo menos um dos fatores produtivos é fixo (terra, trabalho, capital
e capacidade empresarial – alguns economistas incluem também a tecnologia).
Assim, o estoque existente desses recursos somente vai ser alterado em sua
totalidade no longo prazo, quando os fatores produtivos passam a ser variáveis.
Como geralmente é o fator trabalho que mais sofre em períodos de
recessão econômica, é fácil de entender essa formulação: se a oferta é maior do que
a demanda, formam-se estoques tanto de produto final (aquele que está pronto
para ser consumido) quanto de matérias-primas e insumos (que teoricamente não
podem ser devolvidos aos fornecedores). Assim, trabalhadores são demitidos,
sabendo-se que poderão ser rapidamente contratados caso ocorra um novo
crescimento da demanda.
A quarta hipótese, com relação à oferta agregada potencial:
A oferta agregada de bens e serviços (OA) é o valor total da produção de
bens e serviços finais colocados à disposição da coletividade num dado
período. É o próprio produto real, ou PIB. A oferta agregada varia em
função da disponibilidade de fatores de produção: mão de obra (força
de trabalho ou população economicamente ativa), estoque de capital e
nível de tecnologia (VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 124).
Como bem frisaram Vasconcellos e Garcia (2005), existe uma diferença
significativa entre a oferta agregada potencial e a oferta agregada efetiva.
Enquanto a oferta agregada potencial é aquela gerada quando a economia está no
pleno emprego de todos os seus recursos e não pode ser alterada no curto prazo, a
oferta agregada efetiva é aquela que foi efetivamente gerada pela economia num
dado período de tempo (o que acontece com o PIB, que geralmente é computado
anualmente), mesmo que essa produção tenha sido gerada com desemprego de
recursos, como acontece nas situações de recessão econômica, podendo sofrer
alterações por meio de intervenções na economia.
Assim, Keynes propôs intervenções que atingem a economia no curto
prazo, buscando restabelecer o equilíbrio do sistema econômico, em que haja
novamente o pleno emprego dos recursos, elevando a oferta agregada efetiva.
Por fim, a quinta hipótese, ainda no que se refere à demanda efetiva,
Keynes afirmava que “a demanda ou procura agregada de bens e serviços (DA) é a
soma dos gastos planejados dos quatro agentes econômicos: despesas das famílias
com bens de consumo (C), gastos das empresas com investimentos (I), gastos
do governo (G) e despesas líquidas do setor externo (X-M)” (VASCONCELLOS;
GARCIA, 2005, p. 124-125).
121
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Assim:
DA = C + I + G + (X - M)
E
IMPORTANT
Lembrando que exportações líquidas é o resultado das exportações efetuadas,
subtraídas as importações.
Keynes enfatiza a importância de analisar os gastos da economia, sendo
que, devido à possibilidade de grandes volumes de investimento (na forma de
gastos) serem efetuados por parte do Estado, este seria o principal indutor do
desenvolvimento, especialmente em situações de flutuações na oferta e demanda
e, consequentemente, no emprego.
O princípio da demanda efetiva foi formulado, então, fazendo a
seguinte análise:
Uma vez que a oferta agregada potencial não se altera no curto prazo,
dados os estoques de produção, as alterações do nível de equilíbrio da
renda e do produto nacional devem-se exclusivamente às variações
da demanda agregada de bens e serviços, em outras palavras, as
flutuações da demanda agregada são as responsáveis pelas variações
do produto e da renda nacional a curto prazo (VASCONCELLOS;
GARCIA, 2005, p. 125).
Em outras palavras, numa situação de recessão econômica, em que há
excesso de oferta em relação à demanda, uma política de aumento de gastos
governamentais, via políticas monetária e fiscal (principalmente esta última), no
sentido de conceder incentivos fiscais (isenção de tributos, crédito subsidiado) e
efetuar gastos na forma de investimentos em obras de infraestrutura (transportes,
saúde, educação, segurança), faz com que aumente a demanda agregada efetiva de
forma a levar as empresas a aumentarem sua produção potencial, restabelecendo
assim os níveis de renda e emprego.
122
TÓPICO 3 | A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O LADO REAL
3 CONDIÇÃO DE EQUILÍBRIO MACROECONÔMICO
Quando tratamos dos agregados macroeconômicos, vimos que renda
nacional, produto nacional e despesa nacional são grandezas de igual valor (que
possuem uma identidade básica). Entretanto, como podemos agora compreender
a partir das hipóteses keynesianas, a condição de equilíbrio macroeconômico
pode ser alcançada mesmo com a economia operando abaixo do pleno emprego,
o que Keynes chamou de produto efetivo (o que, por analogia, conduz às demais
igualdades, que são a renda e a demanda, à mesma designação).
Assim, a renda de equilíbrio (ou renda efetiva) é determinada quando a
demanda agregada e a oferta agregada se igualam, o que pode acontecer mesmo
quando a economia estiver operando com capacidade ociosa de produção
(VASCONCELLOS; GARCIA, 2005).
Então, como restabelecer o equilíbrio que possa conduzir a economia
novamente ao pleno emprego dos recursos? É isso mesmo que você deve estar
pensando: “Como a oferta agregada é fixada no curto prazo, a política econômica
deve se concentrar em elevar a demanda agregada, por meio de instrumentos que
proporcionem aumento dos gastos de consumo, investimento, gastos do governo,
elevação das exportações acima das importações etc.” (VASCONCELLOS;
GARCIA, 2005, p. 126).
forma:
Graficamente, podemos transcrever a proposta keynesiana da seguinte
FIGURA 20 – EQUILÍBRIO MACROECONÔMICO SEGUNDO KEYNES
Nível geral
dos preços
OA
P3
P2
DA2
DA0
DA3
DA1
P1
Renda (Produto) Real
RN0
RN1
RNpe
Y0
Y1
Ype
FONTE: Rossetti (1988)
123
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Quais variáveis são analisadas nesse gráfico? Vejamos: temos o Nível Geral
de Preços, no eixo vertical do gráfico, a Renda Nacional Real (RN) (ou efetiva),
no eixo horizontal e as variáveis que são dependentes tanto dos preços quanto da
renda, que são a Demanda Agregada (DA) e a Oferta Agregada (OA).
Vamos analisar o gráfico ponto a ponto. Para Keynes, quando a Oferta
Agregada (OA) está distante da Renda Nacional de Pleno Emprego (RNpe) é
possível aumentar a Demanda Agregada (DA) de DA0 para DA1 sem aumentar
o Nível Geral de Preços e, consequentemente, aumentar a Renda Nacional (RN)
de RN0 para RN1.
Observe que, nesse caso, a economia está operando abaixo do pleno
emprego, certo? Entretanto, quando a economia está operando no pleno
emprego dos recursos, quando há equilíbrio entre Demanda Agregada (DA2) e
Oferta Agregada no ponto em que a Renda Nacional chega ao pleno emprego
de recursos (RNpe), aumentos na Demanda Agregada (DA) de D1 para D2 não
alteram a Oferta Agregada (OA), porque esta oferta é fixa no curto prazo, o que
vai acarretar no aumento do Nível Geral de Preços de P1 para P2.
Observe que existe uma parte da curva intermediária, na qual o
aumento da demanda agregada leva ao incremento do produto, mas
com uma pequena elevação do nível geral de preços. Nessa área da
curva, o governo precisa tomar muito cuidado com sua política de
aumentar a demanda agregada, pois ele vai começar a levar a economia
para um processo inflacionário (ROSSETTI, 1988).
Conseguiu visualizar a afirmação no gráfico da Figura 20? Quando
a economia está operando no pleno emprego de recursos, para que haja uma
expansão da Oferta Agregada (OA) é preciso aumentar a quantidade de recursos
disponíveis, o que somente é possível no longo prazo. Portanto, qualquer estímulo
da Demanda Agregada (DA) nesse intervalo de tempo pode causar um processo
inflacionário, já que a demanda será maior que a oferta, levando o nível geral de
preços de P2 para P3.
4 CONSUMO, POUPANÇA E INVESTIMENTO AGREGADO
Agora que já estudamos as relações existentes entre Nível Geral de
Preços, Renda Nacional Efetiva (ou real), Demanda Agregada (DA) e Oferta
Agregada (OA), vamos incluir outras variáveis que são importantes na análise
macroeconômica, que são o consumo, a poupança e o investimento agregado.
Por que estas variáveis são importantes? Vejamos na sequência.
124
TÓPICO 3 | A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O LADO REAL
4.1 CONSUMO AGREGADO
Quando você decide adquirir um bem, por exemplo, um automóvel, que
fatores você leva em conta na sua decisão de compra?
Provavelmente irá verificar, em primeiro lugar, a sua renda disponível,
para decidir a forma de compra desse bem (se à vista ou financiado), a taxa de
juros praticada pelos bancos (já que se você precisar financiar tem que avaliar
se terá moeda suficiente para efetuar o pagamento das prestações mensais),
suas expectativas sobre o fluxo da sua renda no futuro, bem como a situação
econômica do país, avaliando se não haverá uma alta significativa da inflação,
por exemplo, que fará com que o valor das prestações mensais se eleve muito ao
longo do tempo, dentre outras variáveis.
Mais ou menos isso acontece com a macroeconomia. O Consumo
Agregado também depende de variáveis como a “renda nacional, estoque de
riqueza ou patrimônio, taxa de juros do mercado, disponibilidade de crédito,
expectativa sobre a renda futura e rentabilidade das aplicações financeiras”
(VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 128).
Entretanto, como no exemplo anterior (onde analisamos como funcionam
suas decisões de compra), a Renda Nacional Disponível (RND) é o fator mais
importante a ser levado em conta no consumo agregado.
Renda Nacional Disponível é aquela que sobra quando subtraímos os
tributos (impostos, taxas e contribuições) da Renda Nacional Efetiva, ou seja, é
a renda efetivamente utilizada para o consumo de toda a coletividade, o que é
gasto, despendido por todos os residentes em uma nação.
Assim, podemos expressar esta relação algebricamente:
C = f (RND)
Sendo que:
C = consumo agregado;
RND = Renda Nacional Disponível.
125
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
E
IMPORTANT
Antes de prosseguirmos com as demais variáveis, vamos a um conceito criado
por Keynes que é deveras importante para a análise macroeconômica. É o que Keynes
denominou Propensão Marginal a Consumir.
A denominação parece difícil de entender, mas com um simples exemplo você irá entender
perfeitamente.
Como o consumo depende em grande medida da renda, utilizando o exemplo anterior,
quando você pensa em adquirir um automóvel, irá verificar se sua renda disponível será
suficiente para efetuar a compra.
Se num primeiro momento você constatar que sua renda não será suficiente, provavelmente
não efetuará a compra. Mas se no futuro sua renda disponível aumente em, digamos, 30%,
será que você finalmente comprará o automóvel tão desejado?
Analisando agora, em termos macroeconômicos, a Propensão Marginal a Consumir mede
a variação que ocorre no Consumo Agregado quando ocorre uma variação na Renda
Nacional Disponível, ou seja:
do
C
Varia��o
no no
consumo
a Consumir
= Variação
consumoagregad
agregado
Propens�oPropensão
marginal marginal
a Consumir
=
=
Varia��o
na
renda
nacional
dispon�
vel
RND
Variação na renda nacional disponível
Vamos a um exemplo: Se a Renda Nacional Disponível sofrer uma variação de 30% e o
Consumo Agregado variar 25%, temos que:
Propensão
marginalaaConsumir
Consumir =
Propens�o
marginal
25
= 0 , 83
30
O que este resultado significa? Que para este país, 83% da Renda Nacional Disponível é
destinada ao consumo dos mais diferentes bens e serviços.
Assim, se a Renda Nacional Disponível sofrer um aumento de, digamos, $ 100 milhões, $ 83
milhões serão destinados ao consumo.
Mas, e o restante da Renda Nacional Disponível? É o que veremos na
próxima seção.
126
TÓPICO 3 | A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O LADO REAL
4.2 POUPANÇA AGREGADA
Você já parou para pensar o que significa a palavra poupar? Do latim,
palpare, significa deixar de gastar, economizar (DICIONARIOWEB, 2018). Ou
seja, você deixa de gastar hoje para poder gastar mais no futuro.
A moeda, quando retirada de circulação e posta numa aplicação financeira,
dentre elas a mais popular, chamada de “caderneta de poupança”, rende juros que
aumentam o seu poder de compra ao longo do período em que estiver aplicado,
protegendo sua renda dos efeitos da inflação.
Mas de onde se origina a poupança? Esta é parte da nossa renda pessoal
disponível e responde à pergunta que fizemos. Da nossa renda pessoal disponível
(deduzidos os impostos), ou nós gastamos com o consumo ou nós poupamos.
Assim, ampliando nosso horizonte para toda a macroeconomia, “a poupança é a
parte residual da renda nacional disponível, ou seja, a parcela da renda nacional
que não é gasta em bens de consumo” (VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 129,
grifo da autora).
Algebricamente, temos o seguinte:
S = f (RND)
Sendo que:
S = poupança agregada (do inglês, savings);
RND = Renda Nacional Disponível.
E
IMPORTANT
Da mesma forma que podemos calcular a propensão marginal a consumir de
uma nação, é possível conhecer a sua propensão marginal a poupar.
127
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Assim, temos que:
Propensão Marginal a Poupar =
Variação na poupança agregadaa
S
=
Variação na renda nacional disponível RND
Ora, utilizando o mesmo exemplo do Consumo Agregado: se a Renda
Nacional Disponível sofrer uma variação de 30% e a Poupança Agregada variar
5%, temos que:
Propensão Marginal a Poupar =
5
= 0, 17
30
Também podemos obter este resultado com outra fórmula, bem fácil de
entender:
Propensão Marginal a Poupar + Propensão Marginal a Consumirr = 1
Assim, se sabemos que a Propensão Marginal a Consumir é igual a 0,83:
Propensão Marginal a Poupar + 0,83 = 1
Logo:
Propensão Marginal a Poupar = 1 - 0,83
Ou seja:
Propensão Marginal a Poupar = 0,17
Aplicando no exemplo anterior, para um acréscimo na Renda Nacional
Disponível de $ 100 milhões, $ 17 milhões serão poupados e o restante ($ 83
milhões), consumidos.
NOTA
Você saberia dizer se há diferenças significativas nas propensões marginais a
poupar e a consumir entre países desenvolvidos e os países emergentes ou subdesenvolvidos?
Vamos facilitar a análise: entre um trabalhador (ambos solteiros, morando na casa dos pais
e tendo toda a sua renda para gastar somente consigo mesmo) que recebe um salário
mensal de $ 2.000,00 e outro que recebe $ 3.500,00, qual deles, teoricamente, gasta um
percentual menor da sua renda com bens e serviços finais? Ou, qual deles, teoricamente,
poderia destinar algum valor da sua renda para a poupança?
128
TÓPICO 3 | A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O LADO REAL
Teoricamente, o que ganha mais, certo?
Entre os países, segundo a literatura afirma, a tendência é de que os emergentes ou
em desenvolvimento tenham uma propensão marginal a consumir maior que os países
desenvolvidos porque naqueles as demandas são maiores, ou seja, a população quer ter
mais acesso a bens de consumo que não poderiam acessar se não tivessem um acréscimo
na renda. Já nos países desenvolvidos, o acesso aos bens de consumo já foi conquistado
há mais tempo, razão pela qual a proporção da renda gasta com bens e serviços tende a ser
menor que nos países mais pobres.
Também se pode observar que a maioria das novas tecnologias surge nos países
desenvolvidos e são comercializadas primeiro internamente para depois serem exportadas
para os demais países.
Como consequência, se pode afirmar que políticas macroeconômicas, principalmente
fiscais, costumam surtir efeito mais rápido sobre a economia dos países subdesenvolvidos
do que nos desenvolvidos.
4.3 INVESTIMENTO AGREGADO
Antes de mais nada, é importante definirmos o que é investimento, pois
há confusão principalmente em relação às aplicações financeiras.
“Investimento é o acréscimo ao estoque de capital que leva ao crescimento
da atividade produtiva (construções, instalações, máquinas, dentre outros).
Ele pode ser interpretado sob dois ângulos: a curto prazo e a longo prazo”
(VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 129, grifo da autora).
Então, quando falamos de investimento, estamos nos referindo ao lado
real da economia (produção de bens e serviços) e não ao lado monetário (pois há
quem utilize a expressão investimento para se referir a uma aplicação no mercado
financeiro).
Depois dessa diferenciação, vamos entender: O que é investimento de
curto e longo prazos e quais seus efeitos?
Muito bem acadêmico, vamos lá! Como já estudamos nessa unidade,
no curto prazo a Oferta Agregada (OA) é fixa, injeções de renda via gastos com
investimento irão fazer com que a capacidade de produção aumente, afetando,
assim, a Demanda Agregada (DA).
Como por definição o curto prazo é aquele período de tempo em que pelo
menos um dos fatores de produção é fixo, vamos então imaginar que este fator
seja a mão de obra. Logo, se aumentar os gastos com investimento, no caso, na
construção de uma escola, trabalhadores serão contratados para a execução da
obra, mas os demais fatores envolvidos nesse processo produtivo já estarão em
estoque (matérias-primas, insumos). Assim, aumentará a renda dos trabalhadores,
o que fará com que aumente a demanda agregada.
129
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Agora, se o objetivo é aumentar a Oferta Agregada (OA), isso acontecerá
somente no longo prazo, período em que todos os fatores de produção são
variáveis (capital, tecnologia, trabalho, capacidade empresarial, terra).
Com relação ao investimento, há que se ressaltar a sua importância para o
crescimento econômico de um país. É fácil de entender essa afirmação: para que
um país possa crescer ao longo dos anos, aumentando sua riqueza, volumosos
recursos na forma de investimentos são necessários, na forma de incremento da
infraestrutura do país: ampliação e manutenção de estradas, rodovias, portos,
aeroportos, edificações para armazenamento e distribuição dos produtos, bem
como nas áreas de saúde, educação e segurança pública, dentre outros.
Por que isso é preciso, então? Ora, se houver um aumento da produção
nacional e não tiver uma infraestrutura condizente com este aumento, haverá
o que chamamos de “gargalo” logístico na economia. De certa forma já
convivemos com essa realidade no Brasil, pois não temos sequer rodovias em
muitas regiões, deixamos que a rede ferroviária fosse sucateada, ainda há lacunas
de investimentos nas demais áreas de transporte de cargas (como o fluvial,
marítimo e aéreo), temos uma educação muito aquém daquela que seria a ideal
para desenvolvermos pesquisa e desenvolvimento de qualidade (que nos tornem
mais soberanos em relação aos países desenvolvidos, principalmente na inovação
tecnológica), a saúde pública ainda é precária e a segurança, então, você conhece
muito bem, pois é notícia diária nos telejornais e mídias sociais.
Ao mesmo tempo em que o investimento é uma variável indispensável
quando tratamos do crescimento e desenvolvimento econômico, precisamos
refletir na sua instabilidade, pois “seu comportamento é de difícil previsão,
por depender de fatores não apenas econômicos, mas também das expectativas
quanto ao futuro” (VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 130).
E do que ele depende, então? Vamos a uma análise micro para depois
entender estas relações na sua forma macro.
Dissemos anteriormente que quando você quer adquirir um automóvel, a
renda pessoal disponível será a principal variável na sua decisão de compra. Isso
pode ser analisado em duas situações:
1) Se você tiver feito uma aplicação financeira e tiver reunido o valor necessário
para a compra do automóvel, irá pensar se valerá a pena adquiri-lo neste
momento, analisando como estão as taxas de juros no mercado, pois se a taxa
de juros estiver elevada, poderá preferir deixar seu dinheiro aplicado, que lhe
renderá juros, ao invés de resgatar este valor na aquisição do veículo, ainda
mais que este veículo deprecia ao longo do tempo.
2) Se você não tiver o dinheiro necessário para adquirir o automóvel à vista,
poderá optar por um financiamento, mas se a taxa de juros estiver muito
elevada, talvez não seria indicado adquiri-lo neste momento, porque você
pode não conseguir efetuar o pagamento das prestações mensais.
130
TÓPICO 3 | A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O LADO REAL
Com o investimento agregado acontece mais ou menos a mesma coisa,
ou seja, ele vai depender da taxa de rentabilidade esperada e da taxa de juros
do mercado.
A taxa de rentabilidade esperada ou taxa de retorno é calculada a partir
da estimativa do retorno líquido esperado pela aquisição do bem de capital [...ou,
ainda] também é chamada, na literatura econômica, de eficiência marginal do
capital” (VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 130, grifos do original).
A taxa de retorno do investimento baseia-se nas relações entre: o fluxo de
renda esperado advindo da aquisição do bem de capital, o preço de compra e o
tempo de depreciação desse bem e a taxa de juros praticada no mercado.
Se esta taxa for superior à taxa de juros, que corresponde ao custo de se
obter empréstimos para realizar o investimento ou o custo de oportunidade de se
imobilizar os recursos, o empresário investe; se for o contrário, não investe.
Algebricamente, temos que:
RL - t x 100
TR=
I
Em que:
TR = Taxa de Retorno;
RL = Receita Líquida obtida;
t = Tempo de depreciação do bem;
I = Investimento realizado (preço do bem).
Vamos a um exemplo ilustrativo:
Segundo Nogami e Passos (2003, p. 469), se o custo do investimento (um
bem de capital como uma máquina), for de $ 50 milhões, a receita líquida obtida
for de $ 55 milhões, sendo que esta máquina deprecie totalmente em 1 ano, temos
que:
50.000.000 - 1 x 100
TR 55.000.000 Logo:
TR = 10%
O que esse resultado expressa? Isoladamente ele apenas indica que o
investimento efetuado trará um rendimento líquido de 10%.
131
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
A decisão de investir na aquisição deste bem de capital dependerá, então,
da taxa de juros praticada no mercado, pois se esta for superior a 10% ao ano
não é aconselhável à empresa fazer o investimento, já que, se ela tiver o valor
equivalente, ganhará em juros um valor maior do que adquirindo a máquina e,
se não tiver o valor requerido, pagará juros maiores pelo empréstimo em relação
à taxa de retorno que obterá. Isso, ainda, sem levar em conta o risco que está
associado ao investimento produtivo que, em geral, é mais elevado que o risco
relacionado a aplicações financeiras.
Como você deve ter percebido, o investimento é inversamente proporcional
à taxa de juros de mercado.
Se a empresa já dispõe de capital próprio, a taxa de juros representará
quanto a empresa ganharia se, em vez de investir em suas instalações,
aplicasse o dinheiro no mercado financeiro. Se a empresa precisa
tomar emprestado, por exemplo, para comprar equipamentos ou
ampliar suas instalações, a taxa de juros do mercado representa para
ela o custo do empréstimo. Nas duas situações, quanto maior a taxa
de juros de mercado, menores os investimentos em bens de capital
(VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 130).
5 O MULTIPLICADOR DO INVESTIMENTO DE KEYNES
Como já afirmamos, ao contrário de Say, que salientava a importância da
oferta agregada, Keynes atribui à demanda agregada o papel preponderante para
a geração de riqueza de um país.
Numa situação em que a economia esteja operando abaixo do pleno
emprego, Keynes afirma que é o investimento produtivo que fará com que
aumente a renda nacional mais que proporcional ao aumento da demanda.
Vamos exemplificar: imaginemos uma situação de recessão econômica,
onde há elevada taxa de desemprego de fatores produtivos (tanto de mão de
obra quanto de demais fatores como matérias-primas, insumos, parque fabril
instalado) e elevado estoque de produtos acabados. Numa situação como essa,
como a oferta agregada pode impulsionar a demanda agregada? Se há elevada
taxa de desemprego, consequentemente a renda nacional também diminuiu,
então, como impulsionar o crescimento econômico?
Para Keynes, dada a situação descrita acima, uma política de gastos
governamentais, principalmente na forma de investimentos, gera um efeito
multiplicador em todo o sistema econômico, da seguinte maneira: o governo
resolve, então, investir na execução de uma grande obra, como na construção de
uma ferrovia (que aliás é um dos meios de transporte mais barato e sucateado
no Brasil). Para isso precisará efetuar um processo de licitação para selecionar a
empresa que executará a obra. A empresa vencedora da licitação: i. Contratará
trabalhadores (engenheiros, operários da construção civil) que receberão salários
132
TÓPICO 3 | A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O LADO REAL
que serão gastos com consumo de bens e serviços (que estimularão outros
setores, como de alimentos, vestuário, eletrodomésticos, etc.); ii. Demandará
matérias-primas e insumos de empresas fornecedoras, que conseguirão vender
seus estoques e, a depender do aumento dos pedidos, poderão novamente passar
a produzir com utilização de toda a sua capacidade produtiva.
Vamos utilizar valores para que você possa entender melhor quanto
o efeito multiplicador é importante para reverter uma situação de recessão
econômica, na proposta keynesiana.
De acordo com Vasconcellos e Garcia (2005), assim, se este gasto
governamental for de $ 100 bilhões, a empresa executora da obra contratará
trabalhadores e aumentará a produção da construção civil nesse valor. Isso
se transformará em renda para os trabalhadores e empresários do setor de
construção civil, que por sua vez gastarão com alimentos e vestuário. Esses gastos
dependerão das propensões marginais a consumir e a poupar.
A Propensão Marginal a Consumir (PMgC), como já vimos, é definida
como a variação no consumo resultante da variação na renda. A sua fórmula é
dada por:
PMgC =
∆C
∆Y
Em que:
PMgC = Propensão marginal a consumir;
∆C/∆Y = Variação no consumo dividido pela variação na renda (aumento
inicial de gastos ou investimentos).
Ela nos mostra a tendência que cada família tem de gastar em bens de
consumo a porcentagem de cada unidade monetária adicional que se dê em sua
renda. Suponhamos que dos $ 100 bilhões injetados na economia pelo governo
na construção de estradas e hospitais, $ 80 bilhões sejam consumidos pelos
envolvidos no processo.
Desta forma a PMgC será de 0,80:
PMgC =
80.000.000.000
100.000.000.000
Logo:
PMgC = 0,80
133
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
A propensão marginal a poupar, por sua vez, é a variação na poupança
decorrente da variação na renda. A sua fórmula é dada por:
PMgS =
∆S
∆Y
Em que:
PMgS = Propensão marginal a poupar;
∆S/∆Y = Variação na poupança dividido pela variação na renda (aumento
inicial de gastos ou investimentos).
Ela nos mostra a tendência que cada família tem de poupar a porcentagem
de cada unidade monetária adicional que se dê em sua renda. Assim, suponhamos
que dos $ 100 bilhões injetados na economia pelo governo na construção da
ferrovia, $ 20 bilhões sejam poupados.
Desta forma, a PMgS será de 0,20:
PMgS =
PMgS =
∆S
∆Y
20.000.000.000
100.000.000.000
Logo:
PMgS = 0,20
Devemos observar que a Propensão Marginal a Consumir mais a
Propensão Marginal a Poupar devem totalizar 1 (ou 100%) para cada variação na
renda. Assim:
PMgC + PMgS = 1
(Já que de toda a renda pessoal ou nacional, uma parte é consumida e a
outra é poupada.)
Da mesma forma, podemos concluir que a Propensão Marginal a Consumir
é igual a 1 menos a Propensão Marginal a Poupar:
PMgC = 1 - PMgS
Concluímos que, se a variação inicial na renda for de $ 100 bilhões, supondo
então uma propensão a consumir igual a 0,80 e uma propensão a poupar igual
a 0,20, os trabalhadores e empresários da construção civil gastarão $ 80 bilhões
134
TÓPICO 3 | A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O LADO REAL
com alimentos e vestuário, poupando $ 20 bilhões. A produção de alimentos e
vestuário elevar-se-á em $ 80 bilhões, e será transformada em renda (salários,
lucros) dos trabalhadores e empresários dos setores de alimentos e vestuário.
Com a propensão a consumir agregada de 0,80, estes, por sua vez, gastarão $ 64
bilhões (80% de $ 80 bilhões) com, digamos, lazer. O setor de lazer receberá um
incremento de renda de $ 64 bilhões e o processo continuará, elevando a renda
gerada na economia.
Ao final desse processo ocorrerá um acréscimo de renda e produto
nacionais muito superior ao gasto inicial de $ 100 bilhões.
Como se observa, essa multiplicação dependerá das propensões marginais
a consumir e a poupar: quanto maior a propensão a consumir da coletividade,
maiores os gastos com bens e serviços, em cada etapa, e maior o efeito
multiplicador. Quanto maior a propensão a poupar, menor o efeito multiplicador
(NOGAMI; PASSOS, 2003).
5.1 CÁLCULO DO MULTIPLICADOR KEYNESIANO (k)
Para calcular o efeito multiplicador do investimento sobre a renda
nacional, utilizamos as seguintes fórmulas:
k = 1/1 - PMgC
Ou
k = 1/PMgS
Em que:
k = multiplicador de investimento.
Seguindo o exemplo anterior, poderemos concluir que o multiplicador (k)
é igual a 5, pois:
k=
1
1 - PMgC
k�=
1
1 - 0,80
k=5
135
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Ou, alternativamente:
k=
k=
1
PMgS
1
0 , 20
k=5
Assim, para um multiplicador de 5, o aumento inicial de gastos do governo
de $ 100 bilhões levaria a um aumento da renda nacional para $ 500 bilhões.
5.2 CÁLCULO DA VARIAÇÃO DA RENDA NACIONAL
Para o cálculo da variação da renda nacional utilizamos a seguinte fórmula:
∆RN = k(∆Y)
Em que:
∆RN = variação na renda nacional;
K = multiplicador de investimentos;
∆Y = variação inicial na renda por meio dos investimentos/gastos.
Como no exemplo anterior, com o multiplicador sendo igual a 5, o
aumento inicial de gastos do governo de $ 100 bilhões levará a um aumento da
renda nacional de $ 500 bilhões (5 X 100 bilhões). Assim:
∆RN = k(∆Y)
∆RN = 5 (100.000.000.000)
∆RN = 500.000.000.000,00
E
IMPORTANT
O multiplicador também tem um efeito perverso: se os gastos caírem em $ 100
bilhões, a renda cairá num múltiplo de $ 100 bilhões (no exemplo anterior, $ 500 bilhões)
(VASCONCELLOS; GARCIA, 2008).
Por isso que o setor de construção civil é considerado um termômetro da economia.
Quando a economia cresce, o setor também cresce fortemente, mas quando a economia
entra em recessão, este setor também sofre uma queda muito forte.
136
TÓPICO 3 | A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O LADO REAL
Você consegue perceber esse fenômeno? Note que quando ocorre uma forte recessão
econômica, as famílias deixam de gastar com imóveis e até mesmo investimentos em
educação são postergados (pela diminuição da renda que a recessão provoca), as empresas
também cessam os investimentos em novos projetos produtivos ou na aquisição de bens
de capital (máquinas e equipamentos) e se o governo não tem recursos para gastar com
investimentos em infraestrutura, há uma forte demissão de trabalhadores, que geram um
efeito multiplicador negativo, iniciando pelo setor de construção civil e atingindo demais
setores econômicos.
137
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:
• A discussão que embasa a teoria keynesiana pode ser resumida na seguinte
questão: É o produto (oferta) que determina a demanda, como preconizado
pela chamada Lei de Say – ‘a oferta cria sua própria procura’ ou é a demanda,
as decisões de gasto, que determinam o produto (a oferta)?
• Analisando os efeitos da Grande Depressão de 1930, Keynes formulou a “Teoria
Geral do Emprego, do Juro e da Moeda” em 1936 e propôs, então, a intervenção
do Estado na economia como forma de debelar a recessão econômica quase
que mundial do período.
• Keynes sustentava que uma economia poderia atingir o equilíbrio, mesmo
apresentando significativos níveis de desemprego de trabalhadores e de outros
fatores de produção. Sustentava, também, que seria necessária a intervenção
do governo no sentido de regular a atividade econômica e levar a economia
para o pleno emprego (NOGAMI; PASSOS, 2003).
• São cinco as hipóteses do modelo keynesiano: 1) o modelo keynesiano supõe a
existência de desemprego, ou seja, que a economia esteja em equilíbrio abaixo
do pleno emprego, produzindo abaixo do seu potencial; 2) as empresas, quando
estimuladas por um aumento da demanda de seus produtos, procurarão
elevar sua produção, e não os preços, porque estão com capacidade ociosa;
3) o modelo básico analisa a teoria da determinação da renda no curto prazo
(quando pelo menos um fator de produção é fixo); 4) a oferta agregada de bens
e serviços (OA) é o valor total da produção de bens e serviços finais colocados à
disposição da coletividade num dado período. É o próprio produto real, ou PIB.
A oferta agregada varia em função da disponibilidade de fatores de produção:
mão de obra (força de trabalho ou população economicamente ativa), estoque
de capital e nível de tecnologia; 5) a demanda ou procura agregada de bens e
serviços (DA) é a soma dos gastos planejados dos quatro agentes econômicos:
despesas das famílias com bens de consumo (C), gastos das empresas com
investimentos (I), gastos do governo (G) e despesas líquidas do setor externo
(X-M).
• A condição de equilíbrio macroeconômico pode ser alcançada mesmo com
a economia operando abaixo do pleno emprego, o que Keynes chamou de
produto efetivo.
• A renda de equilíbrio (ou renda efetiva) é determinada quando a demanda
agregada e a oferta agregada se igualam, o que pode acontecer mesmo quando
a economia estiver operando com capacidade ociosa de produção.
138
• Para restabelecer o equilíbrio que possa conduzir a economia novamente ao
pleno emprego dos recursos, sendo a oferta agregada fixa no curto prazo, “a
política econômica deve se concentrar em elevar a demanda agregada, por
meio de instrumentos que proporcionem aumento dos gastos de consumo,
investimento, gastos do governo, elevação das exportações acima das
importações etc. (VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 126).
• A Renda Nacional Disponível (RND) é o fator mais importante a ser levado em
conta no consumo agregado.
• A poupança é a parte residual da renda nacional disponível, ou seja, a parcela
da renda nacional que não é gasta em bens de consumo.
• Investimento é o acréscimo ao estoque de capital que leva ao crescimento da
atividade produtiva (construções, instalações, máquinas, dentre outros).
• Como no curto prazo a Oferta Agregada (OA) é fixa, injeções de renda via gastos
com investimento irão fazer com que a capacidade de produção aumente,
afetando, assim, a Demanda Agregada (DA).
• Agora, se o objetivo é aumentar a Oferta Agregada (OA), isso acontecerá
somente no longo prazo, período em que todos os fatores de produção são
variáveis (capital, tecnologia, trabalho, capacidade empresarial, terra).
• O investimento agregado depende da taxa de rentabilidade esperada e da taxa
de juros do mercado. O investimento é inversamente proporcional à taxa de
juros de mercado.
• Ao contrário de Say, que salientava a importância da oferta agregada, Keynes
atribui à demanda agregada o papel preponderante para a geração de riqueza
de um país.
• Keynes afirma que é o investimento produtivo que fará com que aumente a
renda nacional mais que proporcional ao aumento da demanda.
• Para Keynes, uma política de gastos governamentais, principalmente na forma
de investimentos, gera um efeito multiplicador em todo o sistema econômico,
e este efeito vai depender das propensões marginais a consumir (PMgC) e a
poupar (PMgS) da economia.
139
AUTOATIVIDADE
1 Explique, por meio de um exemplo, por que quando a taxa de juros aumenta,
diminui o nível de investimentos, o que, consequentemente, diminui o nível
de emprego e de renda.
2 Quando um empresário pretende fazer um investimento produtivo, ele
deve analisar a taxa de retorno do investimento, a possível receita líquida
que será gerada por meio do investimento e a taxa de juros do mercado.
Dessa forma, ele deverá fazer o investimento produtivo quando:
a) (
b) (
c) (
d) (
e) (
)
)
)
)
)
A taxa de retorno for maior do que a taxa de juros do mercado.
A taxa de juros do mercado for maior do que a taxa de retorno.
A receita líquida esperada for maior que a taxa de juros do mercado.
A taxa de juros do mercado for maior que a receita líquida esperada.
Nenhuma das alternativas anteriores.
3 Se a taxa de juros do país for de 12% ao ano, sendo que a taxa de retorno
do investimento para os projetos de uma empresa moveleira for conforme
determinado na tabela abaixo, em qual(is) projeto(s) a empresa investirá e
qual o montante total investido nos projetos em que a taxa de retorno seja
maior que a taxa de juros do mercado?
Projeto
Investimento necessário (em R$
milhões) – montante por projeto
Taxa de retorno esperada
A
4,5
7,20% a.a.
B
3,75
13,75% a.a.
C
6,4
11,20% a.a.
D
1,3
22,0% a.a.
E
1,7
12,85% a.a.
4 Sabendo que de um montante de R$ 500.000,00 investidos na economia, e R$
420.000,00 foram destinados ao consumo, de quanto será a:
a) PMgC:
b) PMgS:
c) K:
d) ∆RN resultante deste processo:
140
TÓPICO 4
UNIDADE 2
A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
– O LADO MONETÁRIO
1 INTRODUÇÃO
Vimos na Unidade 1, quando tratamos da estrutura da análise
macroeconômica, as seguintes condições de equilíbrio:
QUADRO 3 – ESTRUTURA DA ANÁLISE MACROECONÔMICA
Classificação
Parte real da economia
Parte monetária da economia
Mercados
Variáveis determinadas
Mercado de bens e serviços
Produto nacional
Nível geral de preços
Mercado de trabalho
Nível de emprego
Salários nominais
Mercado financeiro
(monetário e títulos)
Taxa de juros
Estoque de moeda
Mercado de divisas
Taxa de câmbio
FONTE: Vasconcellos (2014, p. 201)
Assim, a parte real da economia, constituída pelos mercados de bens e
serviços e de trabalho, determina variáveis importantes para a macroeconomia,
quais sejam: produto nacional, nível geral de preços, nível de emprego e salários
nominais.
A parte monetária, por seu turno, constituída pelos mercados financeiro
e de divisas, determina a taxa de juros, o estoque de moeda e a taxa de câmbio.
No tópico anterior abordamos o lado real da determinação da renda
proposta pelos clássicos e por Keynes. Neste tópico vamos abordar o lado
monetário das duas vertentes de pensamento.
Para isso, primeiro conheceremos aspectos gerais relacionados à moeda
(este ativo tão importante para a economia), faremos um breve histórico das suas
origens, evolução, importância, funções, características, demanda e oferta.
141
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Por fim, analisaremos as condições de equilíbrio no mercado monetário
nas versões clássica e keynesiana.
2 SOBRE A MOEDA
Como você já estudou anteriormente, a moeda é um ativo, certo? Mas, o
que é um ativo?
Na etimologia da palavra, moeda provém do latim activus, “que tem ação,
que atua, que opera com energia” (DICIONÁRIOWEB, 2018, s.p.).
A moeda é, portanto, um ativo, porque é o meio utilizado pelas nações
para efetuar o pagamento de todos os demais bens e serviços existentes, ou seja,
é o equivalente geral de todas as mercadorias.
Você já se perguntou por que cada país tem uma moeda diferente, tanto
na forma (figuras constantes nas cédulas e nas moedas metálicas) como na
nomenclatura (real, dólar, euro, yene etc.)?
Isso se dá devido ao fato de que cada país determina qual moeda utilizará
de acordo com suas características, situação econômica, sendo que em muitos
casos é comum inserir a figura de personalidades importantes da história do país.
Agora, você sabe o que faz com que as pessoas aceitem utilizar a moeda
que o governo cria, como foi no caso da implantação do real em 1994? Isso se deve
ao fato da moeda ter curso forçado, ou seja, ser determinado por lei.
Mas nem sempre foi assim. A história da moeda é bem antiga, como
veremos em breve exposição nas linhas seguintes.
2.1 ORIGEM E EVOLUÇÃO
De acordo com Nogami e Passos (2003), são seis fases distintas que
explicam a origem e a evolução da moeda.
A primeira fase remonta ao início da civilização, quando o homem deixa de
ser nômade e passa a viver em pequenas comunidades, iniciando assim o processo
de divisão do trabalho e especialização (caça, pesca, plantio, colheita etc.).
O que isso significa? Ora, como acontece hoje, as pessoas se especializam
em algum tipo de profissão, ou seja, se especializam em alguma área do
conhecimento humano (ciências humanas, exatas, etc.), sendo que a divisão
do trabalho é o que permite esta especialização (em vez de cada pessoa ter que
efetuar todo o processo produtivo, é responsável por uma parte).
142
TÓPICO 4 | A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O LADO MONETÁRIO
Com isso é comum ocorrer excedentes de produção, como se percebe
facilmente na agricultura: se um agricultor se especializa na produção de grãos,
gerará um excedente, que no início da civilização, como ainda não havia nenhuma
moeda de troca, era trocado entre os demais agricultores, dando origem ao que
chamamos de era da troca de mercadorias ou escambo, que durou muito tempo.
Conforme as civilizações se formavam e cada núcleo familiar surgia, o
número e a variedade de mercadorias produzidas aumentavam. Então, continuar
utilizando esse sistema estava se tornando insuportável, pela dificuldade que
era encontrar alguém que tivesse a mercadoria desejada e, ao mesmo tempo,
demandasse a mercadoria ofertada.
Apenas para exemplificar, Nogami e Passos (2003, p. 446) dizem que a
quantidade de transações necessárias para que um indivíduo adquirisse o que
estivesse demandando neste sistema de escambo poderia ser determinada pela
seguinte fórmula:
TM n n 1
2
Em que:
TM: número de trocas de mercadorias;
n = quantidade de produtos existentes.
Assim, por exemplo, se nessa economia houvesse 100 produtos disponíveis,
seriam necessárias 4.950 transações para que todos os proprietários desses bens
pudessem finalmente trocar o produto em excesso pelo que estava em falta.
Ou seja:
TM 100 100 1
2
Logo:
TM = 4.950
Percebeu qual seria o grau de dificuldade se esse sistema de escambo
funcionasse na economia moderna, que possui milhares de produtos diferentes?
Já na Antiguidade, esse sistema se tornou insuportável e com a evolução
das trocas entre tribos e famílias, estas perceberam que existiam mercadorias mais
raras que outras e, então, começaram a eleger uma dessas mercadorias como meio
143
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
de pagamento. E foi assim que mercadorias como animais, alimentos, metais não
nobres, até os metais nobres foram utilizados ao longo da história da humanidade,
prevalecendo este sistema até o final da Idade Moderna (fins do século XVIII,
constituindo-se na segunda fase da moeda a fase das mercadorias-moeda.
Com a utilização dos metais já na segunda fase da moeda, a sociedade
começou a ver nesta mercadoria algo que a diferenciava das demais mercadoriasmoeda, e passaram a dar a ela maior preferência por diversos motivos, dentre
os quais a durabilidade (durava mais que alimentos, cereais, dentre outros), a
homogeneidade (possibilidade que têm os metais de serem moldados de forma
que fiquem exatamente iguais), a divisibilidade (é possível derreter o metal e
parcelar em valores diferentes), a facilidade de manuseio e transporte (entendese que é mais fácil transportar um baú com moedas que dez cabeças de gado, que
foi uma das mercadorias-moeda mais utilizada) (NOGAMI; PASSOS, 2003).
Assim, a terceira fase da moeda inicia-se com a utilização de metais não
nobres, como o cobre, o bronze e o ferro, mas logo percebeu-se que tais metais, por
existirem em abundância, não serviriam como reserva de valor. “Em outras palavras,
a existência em abundância desses metais, associada à descoberta de novas jazidas
e ao aperfeiçoamento do processo industrial de fundição, fez com que tais metais
perdessem gradativamente seu valor” (NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 450).
A consequência disso com certeza você já sabe: a descoberta de metais
chamados nobres, devido ao fato de suas características melhor se ajustarem às
exigências para que uma mercadoria seja considerada moeda, fez com que o ouro
e a prata passassem a ser a moeda metálica por excelência, ou seja, esta é a fase
da moeda metálica.
E como inicia a quarta fase da moeda? Nos clássicos filmes de faroeste
norte-americano, ou mesmo no hilariante “Piratas do Caribe”, de Jack Sparrow,
podemos encontrar facilmente a resposta: carregar baús de moeda metálica, além de
pesados, deixava os mercadores expostos a ladrões e piratas, que frequentemente
assaltavam as caravanas ou os navios, gerando muita insegurança.
“Para contornar esse problema, especialmente após o século XIV, com
o crescimento dos fluxos comerciais na Europa, iniciou-se a difusão de um
instrumento monetário mais flexível: a moeda-papel” (NOGAMI; PASSOS, 2003,
p. 451, grifo da autora).
Citadas pelos historiadores como embrião do Sistema Financeiro, surgem
assim as Casas de Custódia, que funcionavam da seguinte forma: os mercadores
depositavam as moedas metálicas que dispunham nas casas de custódia existentes
em seu lugar de origem e o “custodiante” (dono da casa de custódia) emitia
um certificado de depósito especificando o valor depositado. De posse desse
papel, o mercador ia para seu lugar de destino e trocava esse papel por moedas
depositadas naquela casa e somente depois comercializava seus produtos.
144
TÓPICO 4 | A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O LADO MONETÁRIO
Esse sistema de pagamento deu tão certo que com o tempo os mercadores
perceberam que não seria mais necessário trocar o certificado pelas moedas,
efetuando pagamentos e aceitando recebimentos por meio do papel, daí a
denominação “moeda-papel”.
Uma característica, entretanto, é fundamental nessa fase da moeda:
a moeda-papel era 100% lastreada em ouro, ou seja, representava que o valor
contido no certificado era exatamente equivalente ao depositado em moedas
metálicas nas casas de custódia.
E o que diferencia a fase da moeda-papel para a quinta fase, conhecida
como a fase do papel-moeda ou moeda fiduciária?
Com o passar do tempo, as ‘Casas de Custódia’, que recebiam o metal
e forneciam certificados de depósito (ou moeda-papel) totalmente
lastreados, começam a perceber que os detentores desses certificados
não faziam a reconversão ao mesmo tempo. Além disso, enquanto
alguns faziam a troca de moeda-papel pelo metal, outros faziam novos
depósitos em ouro e prata, o que acabava por ensejar novas emissões
(NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 451).
Surge, assim, o papel-moeda no formato que conhecemos hoje, já que com
o passar dos anos as Casas de Custódia, que mais tarde foram denominadas de
bancos, passaram a emitir os certificados de depósito sem o lastro em metal, sendo
aceito baseado numa relação de confiança (significado da expressão ‘fidúcia’)
entre o custodiante e os comerciantes e consumidores em geral.
Note que houve um período em que bancos privados podiam emitir papelmoeda. Entretanto, como você deve imaginar, naquele tempo, como hoje, havia
os honestos e também os desonestos, que levaram o sistema à ruína e obrigaram
o Estado a ser o emissor oficial da moeda, o que no Brasil é realizado por meio da
Casa da Moeda.
Com o tempo, as moedas passaram a denominar-se moeda de curso forçado,
isto é, aceita por força de lei e não eram mais lastreadas em metais preciosos.
Houve tentativas de restaurar o padrão ouro depois da Primeira Guerra
Mundial, da Grande Depressão e da Segunda Guerra Mundial. O
acordo de Bretton Woods trouxe a aceitação geral de um padrão ouro
fundamentado no dólar dos Estados Unidos. Segundo esse acordo,
as principais moedas tinham valor em dólar, sendo que o dólar era
conversível em ouro. Esse acordo acabou em 1971, quando foi suspensa
a conversibilidade do dólar em ouro (NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 452).
A sexta e última fase da moeda é a conhecida como a fase da moeda bancária.
Essa, entretanto, é complementar ao papel-moeda, pois representa uma modalidade
diferente de manusear dinheiro. É chamada de moeda bancária ou escritural porque
representa os depósitos à vista e a curto prazo nos bancos, sendo que a escrituração
das contas dos correntistas é feita pelo mesmo sistema de partidas dobradas da
contabilidade, ou seja, para todo crédito existe um débito correspondente.
145
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
2.2 FUNÇÕES, CARACTERÍSTICAS E FORMAS DA MOEDA
Vasconcellos e Garcia (2005) enumeram três funções básicas da moeda: 1.
Instrumento ou meio de trocas: é a intermediária perfeita para efetuar as transações
comerciais; 2. Denominador comum monetário: serve como equivalente geral
para todas as mercadorias, funcionando como um padrão de medida; 3. Reserva
de valor: quando retirada de circulação a moeda pode valorizar-se, mantendo o
valor de compra, como acontece quando fazemos uma aplicação financeira.
Já Nogami e Passos (2003) incluem ainda uma quarta função: a de padrão
de pagamento diferido que, trocando em miúdos, significa que somente com a
moeda é possível efetuar compras a prazo, fazer financiamentos, pois quando
você adquire um automóvel, por exemplo, sai com o produto e somente pagará
as parcelas, cujos valores são expressos em moeda, no futuro.
No que se refere às características da moeda, além das já elencadas acima
(durabilidade, homogeneidade, facilidade de manuseio e transporte), Nogami e
Passos (2003) incluem ainda a indestrutibilidade e inalterabilidade, pois custa
caro emiti-la e, mesmo com toda tecnologia utilizada na sua fabricação, ainda
existem os falsificadores. Por isso buscam-se novas formas de torná-la mais
resistente, para que possa circular mais tempo e não seja passível de falsificações.
E quanto às formas de moeda? Isso com certeza você já sabe: existem
as moedas metálicas (as de menor valor), o papel-moeda (cédulas) e a moeda
bancária (depósitos à vista ou a curto prazo), que circulam na forma de cheques,
ordens de pagamento, cartões de débito e de crédito.
3 OFERTA E DEMANDA DA MOEDA
Naturalmente, você sabe muito bem da importância que a moeda tem
no nosso dia a dia, quer seja ela utilizada na forma de moedas metálicas, papelmoeda ou moeda bancária (hoje a mais utilizada devido à segurança que propicia
aos usuários).
A não ser por alguns núcleos ou comunidades isoladas que experimentam
outros sistemas monetários (como a utilização das chamadas “moedas sociais”),
ou que realizam atividades de escambo (nos chamados comércios alternativos),
precisamos de moeda para todas as transações comerciais que fazemos e por isso
o lado monetário da economia é tão importante.
Para entender as versões clássica e keynesiana em relação ao lado
monetário da economia, antes precisamos entender como se dá a oferta e demanda
de moeda.
146
TÓPICO 4 | A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O LADO MONETÁRIO
3.1 A OFERTA MONETÁRIA
Você já sabe que a moeda é também uma mercadoria e, como tal, tem seu
preço fixado pela relação entre a oferta e a demanda.
Assim, conceitua-se oferta de moeda como “o suprimento de moeda para
atender às necessidades da coletividade” (VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 141).
Já os meios de pagamento, que é outra forma de conceituar a moeda,
[...] constituem o total de moeda à disposição do setor privado não
bancário, de liquidez imediata, ou seja, que pode ser utilizada
imediatamente para efetuar transações. A liquidez da moeda é a
capacidade que ela tem de ser um ativo prontamente disponível e
aceito para as mais diversas transações (VASCONCELLOS; GARCIA,
2005, p. 141).
Consideramos o seguinte exemplo: Caso você tenha uma aplicação
financeira de médio e longo prazos, como Letra de Crédito Imobiliário, Certificado
de Depósito Bancário, dentre diversas modalidades que o sistema financeiro
oferece, não pode utilizar de imediato o saldo da aplicação para pagar suas
compras, sendo necessário primeiramente efetuar o resgate dos valores. Por isso
essas aplicações não têm a liquidez que o valor depositado em conta corrente tem.
Dessa forma, segundo Nogami e Passos (2003, p. 457), meios de pagamento
(ou M1):
É o total de haveres de perfeita liquidez em poder do setor não
bancário. É representado pelo ‘Papel-Moeda em Poder do Público’
(PMP), também chamado ‘moeda manual’ (papel-moeda e moedas
metálicas), ou ‘moeda corrente’, mais os depósitos à vista nos bancos
comerciais (DBC), públicos e privados, aí incluídos o Banco do Brasil
(DBB) e a carteira comercial das Caixas Econômicas (DCE).
Entretanto, existem outros conceitos de moeda, quais sejam:
1 M2: M1 mais os Depósitos de Poupança e os Títulos Privados;
2 M3: M2 e por Quotas de Fundos de Renda Fixa mais Operações Compromissadas
com Títulos Federais;
3 M4: M3 mais Títulos Federais (SELIC) mais Títulos Estaduais e Municipais.
Nogami e Passos (2003) explicam que é através do conceito de M4, que
envolve os ativos monetários e não monetários, que o Banco Central procura
controlar a oferta total de moeda na economia.
É dever do Banco Central do Brasil, órgão executor das políticas monetária
e cambial, providenciar a regulação da oferta de moeda, crédito, taxas de juros
e câmbio levando em conta a demanda da coletividade, que sofre oscilações em
decorrência da atividade econômica e o equilíbrio do balanço de pagamentos
(VASCONCELLOS; GARCIA, 2005).
147
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
TUROS
ESTUDOS FU
O aprofundamento de seus estudos sobre o sistema financeiro nacional e seu
funcionamento será oferecido na disciplina de Economia Monetária. Os instrumentos de
política monetária serão abordados na Unidade 3 deste livro de estudos.
3.1.1 A Criação da Moeda
Já vimos que, além do papel-moeda, existe também a moeda bancária ou
escritural. Entretanto, se já é sabido por todos que é função do governo emitir
moeda, como podemos afirmar que os bancos também têm o poder de criar moeda?
Sim, isso é possível, mas não é a mesma coisa que a moeda manual
(cédulas) que utilizamos para nossos pagamentos em espécie.
“A moeda escritural possui uma alta participação na composição do meio
circulante, e isso pode ser explicado pela capacidade dos bancos em multiplicar
os depósitos à vista realizados por seus correntistas. Trata-se, portanto, do
mecanismo de criação de moeda pelos bancos” (NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 459).
Como se dá, então, a criação de moeda escritural? Imaginemos que você
seja um grande empresário e que efetue uma aplicação financeira em um título de
renda fixa no valor de $ 500 milhões em um banco comercial existente na sua cidade,
que chamaremos de “Banco A”. O seu gerente, então, irá utilizar parte deste valor
(porque uma parte ele tem que reter como reserva ou encaixe bancário), digamos,
70%, o que corresponde a $ 350 milhões para emprestar a outro empresário, que
tem conta no “Banco B”. Ocorrerá, então, a transferência bancária entre o “Banco
A” e o “Banco B”. Já o “Banco B” poderá emprestar 70% dos $ 350 milhões a um
terceiro empresário correntista do “Banco C” ($ 245 milhões).
No que essa movimentação bancária resulta? Ora, se somarmos o valor
inicial depositado em papel-moeda ($ 500 milhões) aos valores emprestados pelo
“Banco A” ao “Banco B” ($ 350 milhões) e do “Banco B” ao “Banco C” ($ 245
milhões), teremos uma expansão dos depósitos à vista de $ 1.095 bilhões, sendo
que foram efetivamente emprestados $ 595 milhões em moeda escritural (que não
existe no meio físico, apenas no seu modo bancário).
Algebricamente temos que a criação de moeda escritural é dada por:
M 1
xR
z
148
TÓPICO 4 | A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O LADO MONETÁRIO
Em que:
∆M = total de moeda criado;
z = fração dos depósitos à vista que é destinada aos encaixes bancários;
∆R = aumento inicial de reservas (depósito inicial efetuado).
Assim, se tivermos um aporte inicial de moeda de $ 1 bilhão, supondo que
a fração dos depósitos à vista que os bancos têm que reter na forma de encaixe
bancário ou reserva monetária seja de 30%, temos que:
M 1
x 1.000.000.000
0 , 30
∆M = 3.333.333.333,00
Finalmente, é preciso fazer uma consideração a respeito da moeda
escritural. Você já percebeu que esta é uma moeda fictícia, isto é, existe apenas
no sistema bancário. Isso significa que o volume de moeda escritural é muito
superior ao de papel-moeda, sendo impossível que todos os proprietários de
papel-moeda consigam resgatar ao mesmo tempo os valores que efetivamente
possuem no sistema financeiro.
3.2 A DEMANDA DE MOEDA
Para que precisamos de moeda? Você sabe responder a esta pergunta
rapidamente?
Bem, vamos refletir: a literatura econômica lista três fatores que
determinam a demanda por moeda. Utilizamos aqui a demonstração de Nogami
e Passos (2003):
a) Demanda por moeda por motivo transacional: é a mais conhecida e praticada
por todos os agentes econômicos, sem exceção. Utilizada para efetuar as
transações comerciais de bens e serviços e de recursos produtivos, a demanda
transacional depende da renda disponível, ou seja:
Dt = f (Y) , em que
Dt = Demanda para transação
Y = renda, logo
Dt = tY
b) Demanda de moeda por motivo precaucional: precaução significa prudência,
cuidado, ou seja, todos deveríamos fazer uma reserva financeira para situações
emergenciais como problemas de saúde, acidentes, desemprego. Claro que a
demanda precaucional também depende da renda disponível (também é uma
parcela t da renda) e a maioria das pessoas, infelizmente, não consegue fazer
149
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
uma reserva para essas situações por auferirem uma renda muito baixa, como
é o caso de milhões de brasileiros. Assim, temos que:
Dp = f (Y), em que
Dp = Demanda para precaução
Y = renda, logo
Dp = pY
Como DT e DP dependem da renda disponível, ao juntá-las podemos
representá-las como uma proporção k da renda, em que k = t + p. Logo:
D(t+p) = k (Y)
Assim, se da nossa renda, 80% são gastos com bens e serviços e 20% são
guardados para situações emergenciais, temos que:
D (80 + 20) = 100(Y)
c) Demanda de moeda para especulação: diferente dos outros tipos de demanda,
a demanda de moeda para especulação é determinada não pela renda, mas pela
taxa de juros praticada no mercado. Como o nome especulação sugere, especular
com moeda significa obter um ganho financeiro a partir das aplicações financeiras.
Esse mercado tem crescido muito e hoje é muito poderoso, causando inclusive
problemas para o equilíbrio econômico, pois devido à especulação a moeda que
deveria estar disponível a preços acessíveis para o setor produtivo investir na
economia, ou para o consumidor financiar suas aquisições a longo prazo (como
automóveis e imóveis), permanece “circulando” no sistema financeiro.
A demanda especulativa por moeda foi apresentada por Keynes e
“fundamenta-se na relação entre os preços do mercado dos títulos de renda fixa
e as taxas de juros ganhas pelos que detinham tais títulos” (NOGAMI; PASSOS,
2003, p. 463).
Há, assim, uma relação inversa entre os preços dos títulos financeiros e
a taxa de juros de mercado, ou seja, quando o preço dos títulos disponíveis no
mercado está elevado, a taxa de juros cai e ocorre o contrário quando o preço do
título cai.
Keynes observou que, quando os preços dos títulos estão altos e a
taxa de juros baixa, as pessoas preferem manter seus ativos na forma
de valor monetário, ficando no aguardo de que houvesse uma queda
nos preços dos títulos. Se comprados quando estivessem em queda, a
aquisição desses títulos ensejaria ganhos especulativos. Por outro lado,
se os preços dos títulos estivessem baixos e as taxas de juros elevadas,
as pessoas procuravam manter os saldos monetários reduzidos
aplicando em títulos, na expectativa de que seus preços se elevassem
no futuro. Se vendidos quando se encontrassem em alta, propiciariam
maiores ganhos especulativos (NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 463).
150
TÓPICO 4 | A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O LADO MONETÁRIO
Assim, temos que:
De = f (i), em que
De = Demanda especulativa
i = taxa de juros
Analisemos graficamente essa expressão:
FIGURA 21 – DEMANDA ESPECULATIVA DA MOEDA
8
(%)
Taxa de Juros
6
4
2
0
100
200
Quantidade Demanda de Moeda
300
(milhões de unidades monetárias)
FONTE: Nogami e Passos (2003, p. 464)
Como se observa no gráfico ilustrado, que apresenta no eixo vertical a
taxa de juros praticada no mercado e no eixo horizontal a quantidade de moeda
demandada para especulação, quando a taxa de juros se eleva, diminui a demanda
por moeda especulativa, e quando a taxa de juros cai, a demanda por moeda
especulativa se eleva.
Assim, se pode afirmar que, segundo Keynes, além da demanda precaucional
e transacional, a demanda especulativa integra a demanda total de moeda.
A demanda total de moeda fica assim representada algebricamente:
DM = D(t+p)+ De
ou
DM = KY + f ( i ) , em que
DM = Demanda total de moeda
151
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
Graficamente, temos a seguinte demonstração da demanda total de moeda:
FIGURA 22 – DEMANDA TOTAL DE MOEDA
8
6
4
2
DM
0
DT + P
100
+
DE
200
300
DM
DM
Demanda Total de Moeda
FONTE: Nogami e Passos (2003, p. 465)
Vemos representada no gráfico ilustrado a taxa de juros no eixo vertical
e a quantidade de moeda no eixo horizontal. As demandas transacional e
precaucional são indiferentes à taxa de juros, mas são determinadas pela renda
disponível. Suponhamos, então, que Dt + Dp sejam de 10% da moeda disponível
(R$ 1 bilhão).
Nesse caso, Dt + Dp somariam R$ 100 milhões. Já a demanda especulativa,
que depende da taxa de juros e é inversamente proporcional a ela, será de R$ 100
milhões quando a taxa de juros for de 4% e aumentará para R$ 200 milhões se a
taxa de juros cair para 2%.
Ao incluir a demanda especulativa como importante componente da
demanda de moeda, Keynes demonstrou que a demanda da moeda não é somente
associada para motivos de transação ou precaução, sendo que especular com a
moeda pode ser decisivo para determinar o nível de produção da economia.
3.3 EQUILÍBRIO NO MERCADO MONETÁRIO
Assim como ocorre no mercado real, no mercado monetário também se
requer que haja equilíbrio para que o sistema econômico como um todo esteja
equilibrado, como já vimos de forma mais breve na Unidade 1.
152
TÓPICO 4 | A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O LADO MONETÁRIO
E como ocorre o equilíbrio neste mercado? Como você já deve ter
percebido, tal equilíbrio ocorre quando a oferta de moeda se iguala à demanda
de moeda. Assim, temos que:
OM = DM
Como a oferta de moeda é fixa (valor determinado pelas autoridades
monetárias), e a demanda de moeda é função da taxa de juros, podemos
representar graficamente o equilíbrio no mercado monetário da seguinte forma:
FIGURA 23 – O EQUILÍBRIO NO MERCADO MONETÁRIO
OM
8
Taxa de Juros
(%)
6
E
4
2
DM
0
100
200
300
400
Quantidade de Moeda
(milhões de unidades monetárias)
FONTE: Nogami e Passos (2003, p. 466)
Vemos que para uma oferta monetária de $ 200 milhões, o equilíbrio entre
oferta e demanda ocorre no ponto de intersecção entre as duas curvas, quando a
taxa de juros é de 4% (que será, portanto, a taxa de juros de equilíbrio).
Se houver uma diminuição da oferta monetária, de $ 200 milhões para
$ 100 milhões, a taxa de juros de equilíbrio aumentará e a demanda por moeda
diminuirá até atingir $ 100 milhões, igualando-se à oferta.
153
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
TUROS
ESTUDOS FU
Na Unidade 3, quando tratarmos dos instrumentos de política econômica,
analisaremos como a política monetária afeta a taxa de juros e sua influência sobre a economia.
3.4 OFERTA MONETÁRIA E ATIVIDADE ECONÔMICA NA
VERSÃO KEYNESIANA
Já vimos nesta unidade como funcionam os mercados de bens e serviços e de
recursos produtivos e o mercado monetário. Analisamos também o modelo clássico
de determinação da renda. Vejamos agora a relação efetuada por Keynes entre a
oferta monetária e a atividade econômica (e, consequentemente, o nível de renda).
Um esquema elaborado por Nogami e Passos (2003, p. 472) ilustra essas
relações da seguinte forma:
FIGURA 24 – RELAÇÃO KEYNESIANA ENTRE A OFERTA MONETÁRIA E A ATIVIDADE ECONÔMICA
Aumento na
Oferta Monetária

Diminui a Oferta
Monetária
Cai a Taxa de
Juros

Eleva o
Investimento
Aumenta a Taxa
de Juros

Cai o Investimento
Eleva o Nível de
Renda e Emprego

Diminui o Nível de
Renda e Emprego
FONTE: Nogami e Passos (2003, p. 472)
Se o governo aumentar a oferta de moeda, automaticamente deverá
ocorrer uma redução na taxa de juros praticada no mercado, o que vai aumentar
as despesas com investimento produtivo, elevando as despesas com consumo, o
que, finalmente, levará a um aumento na renda e no emprego da economia.
Logicamente, o inverso também ocorre quando o governo diminui a
oferta de moeda: aumenta a taxa de juros, que faz cair o nível de investimento,
reduzindo o nível de emprego e renda da economia.
Na prática, se observarmos ao nosso redor, podemos perceber facilmente
a relação entre essas variáveis. Quando percebemos que as taxas de juros para
empréstimos estão elevadas, adiamos nossas demandas por bens de alto valor,
como automóveis e imóveis. O mesmo acontece com o setor produtivo, já que,
154
TÓPICO 4 | A TEORIA KEYNESIANA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA – O LADO MONETÁRIO
como já frisamos anteriormente, se o empresário tiver o recurso para investir na
aquisição de um novo parque fabril, por exemplo, mas o retorno que ele espera
desse investimento for inferior ao que ele recebe mantendo este recurso no mercado
financeiro, ele não fará o investimento, o que afetará o nível de emprego e renda.
Por isso Keynes atribui um papel fundamental ao investimento como indutor
do crescimento econômico e, consequentemente, ao Estado que, teoricamente,
teria condições de gastar volumosas quantias na forma de investimentos em
infraestrutura, como garantidor do equilíbrio no sistema econômico.
Para finalizarmos esta unidade de estudos, apresentamos algo a respeito
do bitcoin, como leitura complementar. Para você conhecer um pouco como
funciona essa moeda da internet, leia a seguir um texto bem explicativo retirado
do site BBC News Brasil (2017):
155
UNIDADE 2 | O FLUXO CIRCULAR DA ATIVIDADE ECONÔMICA E A TEORIA DA DETERMINAÇÃO DA RENDA
LEITURA COMPLEMENTAR
Bitcoin: o que é e como funciona a moeda virtual
Um dos investimentos de mais rápida valorização e de maior potencial
de controvérsia em 2017 é uma moeda virtual, cuja existência sequer é física – o
Bitcoin, como é chamada, existe exclusivamente on-line. E suas transações são
feitas por meio da internet, em um ambiente codificado, que garante a segurança
dos dados.
O valor dele disparou no segundo semestre desse ano. Em meio a
oscilações bruscas entre novembro e dezembro, cada moeda chegou a valer mais
de U$ 18 mil (R$ 59 mil) – um aumento considerável, já que o câmbio no início de
2017 era de 1 bitcoin para U$ 1 mil.
Antes considerado um reduto de especulação para versados em
tecnologia ou corretores afeitos ao risco, nesta semana, a moeda virtual começou
uma migração para o mercado financeiro tradicional ao passar a ser oferecida no
mercado futuro da bolsa de Chicago, a CBOE (Chicago Board Options Exchange).
Mercados futuros são ambientes em que se negociam contratos de
compra e venda de ativos financeiros para datas futuras – o objetivo é lucrar com
a arbitragem. Também é uma forma de quem negocia se proteger contra o excesso
de volatilidade nos preços.
Mas afinal, o que é o Bitcoin e o que está por trás do alvoroço mundial em
torno da moeda?
O que é o Bitcoin?
O Bitcoin é basicamente um arquivo digital que existe on-line e funciona
como uma moeda alternativa. Nisso, ele se diferencia muito de moedas
convencionais, como o dólar americano. Ele não é impresso por governos ou
bancos tradicionais, mas criado por um processo computacional complexo
conhecido como "mining" (mineração).
Todas as moedas e todas as transações feitas com elas ficam registradas na
rede de internet – em um espaço conhecido como "blockchain", uma espécie de
banco de dados descentralizado que usa criptografia para registrar as transações.
Dessa forma, os arquivos não podem ser copiados ou fraudados e as transações
não podem ser rastreadas.
Existem cerca de 16,5 milhões de bitcoins em circulação, e cerca de 3,6
mil novos são criados todos os dias. Como outras moedas, ela não tem um "valor
inerente": seu preço é determinado pelo quanto as pessoas estão dispostas a pagar
por ela.
156
"Ela não é reconhecida oficialmente, você não pode pagar impostos ou
usar para quitar débitos", diz o economista Garrick Hileman, pesquisador de
criptomoedas e professor da Universidade de Cambridge.
Por que o Bitcoin subiu tanto neste ano?
Alguns economistas dizem que é uma clássica bolha especulativa:
investidores eufóricos pagando por um ativo muito mais do que ele é válido
por medo de ficar de fora. Eles colocam o entusiasmo com o bitcoin na mesma
categoria da bolha da internet do ano 2000 ou da bolha no mercado imobiliário
americano que levou à crise de 2008.
Outros afirmam que o crescimento é resultado da passagem do Bitcoin
para mercado financeiro tradicional – por exemplo, sua entrada no Mercado
Futuro de Washington. "Boa parte disso é especulação, mas há sinais de que o
Bitcoin tem de fato sido usado", diz Hileman. Ele diz que havia entre três e seis
milhões de pessoas no mundo usando a criptomoeda em abril.
"Hoje esse número já está provavelmente em 10 ou 20 milhões de pessoas,
então é uma base de usuários que só tende a crescer", afirma. O fato da moeda ter
começado a ser usada por grandes instituições financeiras também aumentou seu
valor, afirma o especialista.
Como comprar Bitcoin?
Hoje existem centenas de diferentes tipos de criptomoedas, mas o Bitcoin
ainda é a mais conhecida. Para recebê-la, o usuário deve ter um endereço de
Bitcoin – uma série de até 34 letras e números. Esse endereço funciona como uma
espécie de caixa postal através da qual as moedas são enviadas.
Não há um registro dos endereços, o que permite que usuários protejam
sua anonimidade. Carteiras virtuais armazenam os endereços e podem ser usadas
para gerenciar o dinheiro. Elas operam como contas de banco privadas – com
o detalhe de que, se as informações são perdidas, as moedas referentes àquela
carteira também se perdem.
As regras de funcionamento da moeda determinam que apenas 21 milhões
de bitcoins podem ser criados – e esse número está cada vez mais próximo. Não
se sabe o que vai acontecer com o valor das bitcoins quando o limite for atingido.
É possível usar bitcoins para comprar produtos?
Um aumento de 900% no valor de uma moeda normal, como o dólar
americano, teria um impacto grande no poder de compra de consumidores e nos
negócios que aceitam a moeda. Não é o caso do Bitcoin, já que a maioria dos donos
das moedas não as usam para comprar coisas. O seu uso como uma moeda normal
é até possível – a anonimidade garantida pelas moedas virtuais tem atraído pessoas
157
querendo fazer compra e venda de mercadorias ilegais pela internet.
E um pequeno – mas crescente – número de empresas consolidadas tem
permitido que seus clientes comprem mercadorias e serviços com a moeda. Há
desde multinacionais como a Microsoft até pequenas empresas que usam a moeda
como uma espécie de novidade chamativa, como um restaurante japonês em
Cambridge e uma galeria de arte em Londres. Mas, segundo Hileman, a grande
maioria dos usuários entra nesse universo para fazer investimento. "Eu estimaria
algo em torno de 90% dos usuários", diz ele. "Então hoje seria mais apropriado
dizer 'criptoativo' do que 'criptomoeda'".
Pontos preocupantes
"No momento, o Bitcoin existe praticamente sem nenhuma regulação",
diz o advogado Bradley Rice, especialista em regulação financeira do escritório
britânico Ashurst. Ele tem sido muito usado na deep web, que não pode ser
acessada por um navegador de internet normal. Também há preocupações em
relação à volatilidade da moeda, o que levou tanto a China quanto a Coreia do
Sul a proibirem o lançamento de novas moedas virtuais.
Em setembro, a autoridade financeira do Reino Unido alertou investidores
que eles poderiam perder dinheiro se comprassem novas moedas virtuais
recém-criadas por algumas empresas, conhecidas como "inicial coin offerings",
ou ofertas iniciais de moedas. Mas a tecnologia por trás do Bitcoin é vista como
infalível por algumas das maiores instituições financeiras. "É por isso que alguns
dos reguladores financeiros na Europa estão tendo uma postura de 'esperar para
ver'", diz Rice.
O Bitcoin é uma bolha financeira?
Não faltam veículos especializados em finanças e especialistas dizendo
que a euforia em torno do Bitcoin é uma bolha. "Pode haver bons motivos para
comprar Bitcoin", disse recentemente um artigo da revista The Economist. "Mas o
motivo principal no momento é o fato de que os preços têm subido."
A alta abrupta no câmbio – o valor do Bitcoin dobrou em menos de um
mês – tem levado a argumentos de que ele é volátil demais, que o seu crescimento
exponencial é insustentável e que uma queda é inevitável. No entanto, o Bitcoin
já tinha sido declarado "morto" algumas vezes, diz Hileman. "Ele tem mostrado
resiliência e retornado algumas vezes depois de quase morrer".
No entanto, o especialista prevê uma nova queda em um "futuro não
muito distante". "Segure firme se você é dono desse tipo de moeda", conclui.
FONTE: <https://www.bbc.com/portuguese/brasil-42313567>. Acesso em: 14 ago. 2018.
158
RESUMO DO TÓPICO 4
Neste tópico, você aprendeu que:
• A parte monetária da economia, constituída pelos mercados financeiro e de
divisas, determina a taxa de juros, o estoque de moeda e a taxa de câmbio.
• A moeda é um ativo porque é o meio utilizado pelas nações para efetuar o
pagamento de todos os demais bens e serviços existentes, ou seja, é o equivalente
geral de todas as mercadorias.
• A literatura econômica enumera seis fases distintas da moeda: era da troca de
mercadorias ou escambo; era da mercadoria-moeda; era da moeda metálica;
era da moeda-papel; era do papel-moeda e; a moeda bancária ou escritural.
• São funções da moeda: 1. Instrumento ou meio de trocas; 2. Denominador
comum monetário; 3. Reserva de valor e; 4. Padrão de pagamento diferido
(futuro).
• São características da moeda: durabilidade, homogeneidade, facilidade de
manuseio e transporte, indestrutibilidade e inalterabilidade.
• A oferta de moeda é o suprimento de moeda para atender às necessidades da
coletividade.
• É dever do Banco Central do Brasil, órgão executor das políticas monetária e
cambial, providenciar a regulação da oferta de moeda, crédito, taxas de juros e
câmbio levando em conta a demanda da coletividade, que sofre oscilações em
decorrência da atividade econômica e o equilíbrio do balanço de pagamentos.
A Renda Nacional Disponível (RND) é o fator mais importante a ser levado em
conta no consumo agregado.
• Através da multiplicação dos depósitos à vista e a curto prazo os bancos
comerciais criam moeda escritural.
• Para Keynes, além da demanda de moeda por motivo transacional e
precaucional, ao contrário dos clássicos, existe também a demanda por moeda
para especulação, sendo esta determinante para entender a oferta e demanda
agregada.
• Diferente dos outros tipos de demanda, a demanda de moeda para especulação
é determinada não pela renda, mas pela taxa de juros praticada no mercado.
159
• Há uma relação inversa entre os preços dos títulos financeiros e a taxa de juros
de mercado, ou seja, quando o preço dos títulos disponíveis no mercado está
elevado, a taxa de juros cai e ocorre o contrário quando o preço do título cai.
• Se o governo aumentar a oferta de moeda, automaticamente deverá ocorrer
uma redução na taxa de juros praticada no mercado, o que vai aumentar as
despesas com investimento produtivo, elevando as despesas com consumo, o
que finalmente levará a um aumento na renda e no emprego da economia.
• Logicamente, o inverso também ocorre quando o governo diminui a oferta de
moeda: aumenta a taxa de juros, que faz cair o nível de investimento, reduzindo
o nível de emprego e renda da economia.
• Keynes atribui um papel fundamental ao investimento como indutor do
crescimento econômico e, consequentemente, ao Estado que, teoricamente,
teria condições de gastar volumosas quantias na forma de investimentos em
infraestrutura, como garantidor do equilíbrio no sistema econômico.
160
AUTOATIVIDADE
1 Se o governo vender títulos no valor de $ 80 milhões ao mercado financeiro,
com uma taxa de reservas de 0,60, quanto será o valor total de moeda
escritural criado ao final do processo?
2 A respeito do modelo keynesiano, assinale a alternativa CORRETA:
a) ( ) A demanda por moeda está diretamente relacionada à taxa de juros, ao
passo que o investimento está inversamente relacionado.
b) ( ) A demanda por moeda e o investimento estão diretamente relacionados
à taxa de juros.
c) ( ) A demanda por moeda e o investimento estão inversamente relacionados
à taxa de juros.
d) ( ) A demanda por moeda está inversamente relacionada à taxa de juros,
ao passo que a demanda de investimento está diretamente relacionada.
3 O liberalismo econômico defende a economia de mercado, onde o Estado
atua apenas de forma marginal, enquanto que a teoria keynesiana defende
que o Estado é um importante indutor do desenvolvimento e atua no sentido
de corrigir as falhas que o capitalismo ocasiona. Você defende qual teoria?
Justifique sua resposta.
161
162
UNIDADE 3
A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS
MACROECONÔMICAS E SEUS
DILEMAS
OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM
A partir desta unidade você será capaz de:
• conhecer os instrumentos de política macroeconômica;
• compreender o funcionamento do modelo IS-LM;
• analisar como ocorre a interligação entre as políticas macroeconômicas,
bem como conflitos delas decorrentes.
PLANO DE ESTUDOS
Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade você
encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.
TÓPICO 1 – INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
TÓPICO 2 – A CURVA IS-LM E AS POLÍTICAS MONETÁRIA E FISCAL
TÓPICO 3 – O MODELO IS-LM E DILEMAS DE POLÍTICAS
MACROECONÔMICAS
163
164
TÓPICO 1
UNIDADE 3
INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
1 INTRODUÇÃO
Para atingir seus objetivos, o governo utiliza de instrumentos de política
macroeconômica. Caro acadêmico, você sabe o que são instrumentos de política
macroeconômica? Vamos explicar!
Instrumento é claro que você sabe o que significa, pois é todo e qualquer
utensílio, podendo ser uma máquina, um aparelho, uma ferramenta utilizada
para realizar uma tarefa, uma obra. Assim, este livro de estudos é um dos seus
instrumentos de aprendizagem.
Política, na etimologia da palavra:
É a ciência da governança de um Estado ou Nação e também uma
arte de negociação para compatibilizar interesses. O termo tem origem
no grego politiká, uma derivação de polis que designa aquilo que é
público. O significado de política é muito abrangente e está, em geral,
relacionado com aquilo que diz respeito ao espaço público. Na ciência
política, trata-se da forma de atuação de um governo em relação a
determinados temas sociais e econômicos de interesse público:
política educacional, política de segurança, política salarial, política
habitacional, política ambiental etc. (SIGNIFICADOS, 2018, s.p., grifos
do original).
Assim, se a política designa como se dará a atuação do governo na
sociedade, que abrange todas as áreas de interesse público como segurança,
saúde, educação, meio ambiente, inclusão social, seguridade social, dentre outras,
a política econômica diz respeito à atuação do Estado na economia.
Isto quer dizer que, por ser um dos agentes econômicos, o governo tem
um papel triplo na sociedade: ele exerce o papel de consumidor (porque compra
e vende fatores produtivos e bens e serviços), empresário (porque oferece bens e
serviços à sociedade e demanda fatores produtivos) e governo propriamente dito
(porque tem a função de administrar o país, fiscalizar a atuação de todos os agentes
econômicos e intervir na sociedade, por meio de políticas), com a finalidade de
atingir as metas de política macroeconômica, que já abordamos na Unidade 1.
165
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
NOTA
Outra definição de política também é bastante interessante:
Do grego politikos, que significa “cívico”. O termo politikos, por
sua vez, se originou a partir da palavra polites, que quer dizer
“cidadão”, que se originou de polis, traduzido por “cidade”. Numa
sociedade como a grega, em que a vida pública interessava a
todos os cidadãos, os politikos eram aqueles que se dedicavam
ao governo da polis ("a cidade” ou “o Estado"), colocando o bem
comum acima de seus interesses individuais. Por intermédio
do latim, o termo ingressou em todas as línguas ocidentais.
No início, porém, adquiriu uma conotação claramente
pejorativa: politician, no inglês do séc. 16, designava alguém
que recorria a intrigas para adquirir poder ou cargos públicos:
algo semelhante ao que hoje chamamos de politiqueiro, que faz
politicagem. A partir do século seguinte, no entanto, prevaleceu
o sentido de homem público, que representa os partidos na
composição do governo. No dicionário de Morais, que é de
1813, o termo volta a ter, como na Grécia, o sentido elogioso
de estadista (DICIONÁRIO ETIMOLÓGICO, 2018, s.p.).
Assim, a política macroeconômica é um conjunto de ações governamentais
desenvolvidas para o alcance de diferentes finalidades, que estão intrinsecamente
relacionadas com a situação econômica de um país e mesmo de uma respectiva
região, conjunto de países ou de blocos econômicos.
É fácil deduzir que, interferindo na economia, o Estado influencia a sua
condução no que diz respeito à produção, distribuição e o próprio consumo da
sociedade.
Há que ressaltar, ainda, que, por ser a economia uma ciência social, as
medidas governamentais podem alterar até a composição das classes de renda
do país, favorecendo a ascensão das classes mais pobres a extratos maiores de
renda, ou, como tem sido em boa parte da história do Brasil, mantendo interesses
de grupos econômicos já abastados e fazendo com que a distribuição de renda
brasileira seja uma das piores entre as nações.
Em cada país as políticas econômicas, mesmo que semelhantes, podem
trazer resultados robustamente diferentes, pois, como já é do seu conhecimento,
depende da subjetividade de cada agente econômico, do nível de organização das
instituições, da diversidade de grupos econômicos e de seu poder em pressionar
os poderes Executivo e Legislativo, e da própria teoria econômica que embasa os
formuladores dessas políticas.
166
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
Agora que você já sabe o que são instrumentos de política macroeconômica,
precisamos conhecer e distinguir cada um deles, quais sejam:
•
•
•
•
Política Monetária.
Política Fiscal.
Política Comercial e Cambial.
Política de Rendas.
Vamos abordar cada uma nas páginas seguintes.
2 POLÍTICA MONETÁRIA
A política monetária é conhecida até pelos mais leigos, pois é muito
utilizada pelo governo por seu efeito rápido na economia. Sendo muito utilizada,
é constantemente divulgada nas mídias sociais e telejornais.
E você, que já conhece um pouco mais desse universo econômico, sabe o
que é e para que serve a política monetária? Bem, a expressão “monetário” vem
de moeda, portanto na etimologia da palavra moeda, esta:
Vem do latim moneta, derivada do verbo monere ("avisar, aconselhar,
lembrar"), da mesma família, portanto, de monumento ("o que
deve ser lembrado") e de premonição ("aviso prévio de que algo vai
acontecer"). Moneta ("a que avisa") era um dos nomes dados à deusa
Juno, porque os romanos acreditavam que ela os havia advertido
várias vezes da iminência de desastres militares e de catástrofes da
natureza. No grande templo dedicado a Juno Moneta, que se erguia no
Capitólio, foi instalada uma casa de cunhagem de dinheiro metálico,
que logo passou a ser designado de moneta. Daí vieram moeda e
monetário (port.), moneda (esp.), moneta (it.), monnaie (fr.) e money
(ing.) (DICIONÁRIO ETIMOLÓGICO, 2018, s.p.).
Para Wassily Leontieff (apud NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 445), “a moeda
é a mercadoria (ou um ativo), que serve de equivalente geral para todas as
mercadorias”.
Assim, a política monetária é um:
Conjunto de medidas adotadas pelo governo visando adequar os
meios de pagamento disponíveis às necessidades da economia do
país. Essa ação geralmente ocorre por meio de uma ação reguladora,
exercida pelas autoridades sobre os recursos monetários existentes,
de tal maneira que estes sejam plenamente utilizados e tenham um
emprego tão eficiente quanto possível (SANDRONI, 1989, p. 244).
167
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
E o que são meios de pagamento?
É o total de haveres de perfeita liquidez em poder do setor não
bancário. É representado pelo ‘Papel-Moeda em Poder do Público’ (PMP),
também chamado ‘moeda manual’ (papel-moeda e moedas metálicas)
ou ‘moeda corrente’, mais os depósitos à vista nos bancos comerciais
(DBC), públicos e privados, aí incluídos o Banco do Brasil (DBB) e a
carteira comercial das Caixas Econômicas (DCE) (NOGAMI; PASSOS,
2003, p. 457).
Mas de que forma a política monetária interfere na economia e que reflexos
recaem sobre os agentes econômicos?
Bem, como a política monetária determina principalmente a quantidade
de moeda disponível na economia, sua interferência sobre a renda e o consumo
vai se dar de forma indireta, ou seja: irá atuar sobre o nível de preços e a taxa
de juros, o que irá influenciar no poder de compra dos agentes econômicos,
nas expectativas dos agentes com relação à inflação (nível geral de preços), que
poderão ser estimulados ou desestimulados a tomar decisões de investimentos, o
que vai influenciar no mercado real (de bens e serviços e de fatores produtivos).
Não podemos nos esquecer de que quando nos referimos à política
monetária estamos tratando do lado monetário da economia, que é composto
pelo mercado financeiro (monetário e de títulos), que tem como variáveis
determinadas a taxa de juros e o estoque de moeda e o mercado de divisas, que
tem como variável determinada a taxa de câmbio.
Para analistas, existem dois tipos de política monetária: a ativa e a
passiva. Na primeira, o objetivo do governo é controlar a oferta de
moeda e, neste caso, a taxa de juros oscila para determinar o equilíbrio
entre oferta e demanda de moeda. No segundo caso, o objetivo do
governo é determinar a taxa de juros e, neste caso, o governo, tanto via
taxa de redesconto como pela remuneração dos títulos públicos, tenta
determinar a taxa de juros de mercado, deixando a oferta de moeda
variar livremente para manter esta taxa de juros, ou seja, a oferta de
moeda fica endogenamente determinada (CASTOLDI, 2006, p. 90).
A política monetária se utiliza, assim, de diferentes ferramentas (ou
instrumentos), quais sejam:
•
•
•
•
•
controle direto da quantidade de dinheiro em circulação;
operações no mercado aberto;
fixação da taxa de reserva;
fixação da taxa de redesconto;
controles seletivos de crédito.
Vamos analisar a seguir cada uma dessas ferramentas.
168
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
2.1 CONTROLE DIRETO DA QUANTIDADE DE DINHEIRO EM
CIRCULAÇÃO
Esta ferramenta é a de mais fácil entendimento, pois se refere à atuação
direta do governo sobre a moeda, já que é uma das suas atribuições a sua emissão.
Mas quando e para que o governo emite moeda? Já houve casos no Brasil
em que a emissão de moeda foi muito utilizada para financiamento da dívida
pública, o que contribuiu sobremaneira para o aumento da inflação. Por isso
a emissão de moeda deve ser efetuada somente quando ocorre uma expansão
da economia (crescimento do PIB e da renda), que fará aumentar as transações
entre os agentes econômicos e a renda, o que, consequentemente, irá aumentar a
demanda de moeda.
Caso contrário, lançando mão desse tipo de recurso sem haver um
crescimento proporcional do PIB, haverá uma expansão monetária, fazendo com
que haja uma oferta excessiva de moeda em relação à demanda, o que levará a
uma queda em seu preço, levando a um aumento no nível de preços dos produtos.
A emissão de moeda também pode ser efetuada para fornecimento de
empréstimos de liquidez às instituições bancárias e à realização de operações de
compra e venda de moeda estrangeira.
2.2 OPERAÇÕES NO MERCADO ABERTO
Também conhecidas pela nomenclatura de open market, as operações
de mercado aberto constituem um instrumento de política monetária ágil e de
reflexos muito rápidos sobre a economia.
Consiste na compra e venda de títulos públicos por parte do Banco Central
com a finalidade de controlar a liquidez da moeda. Este instrumento de política
monetária é muito utilizado pela sua eficácia, já que permite ao governo regular
no dia a dia a oferta monetária e a taxa de juros.
Como funciona esse mecanismo? Podemos expressar esta operação da
seguinte forma:
169
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
FIGURA 1 – OPERAÇÕES NO MERCADO ABERTO
Venda de
títulos
Contração
dos meios de
pagamento
Compra de
títulos
Expansão
dos meios de
pagamento
FONTE: Nogami e Passos (2003, p. 478)
Genericamente, o open market é operado por intermédio da compra e venda
de títulos da dívida ativa pública, como as letras e as obrigações do Tesouro Nacional.
Como demonstrado no esquema, quando as autoridades monetárias
querem contrair os meios de pagamento, ou seja, diminuir a quantidade de
moeda em circulação, eles vendem títulos públicos. Assim, o comprador fica com
o título e entrega moeda ao governo, que recolhe o dinheiro no cofre do Banco
Central, diminuindo a oferta monetária.
O contrário acontece quando o governo quer expandir a quantidade de
dinheiro em circulação, quando efetua a compra de títulos públicos. Assim, o
vendedor retoma o dinheiro e entrega o título à autoridade monetária, com o
consequente aumento da oferta monetária.
Os principais títulos utilizados nas operações de mercado aberto no Brasil
são as Notas do Tesouro Nacional (NTN), as Letras do Tesouro Nacional (LTN) e
os Títulos do Banco Central (TBC).
2.3 FIXAÇÃO DA TAXA DE RESERVA
Este mecanismo permite ao governo atuar diretamente sobre os bancos,
que são fiscalizados e normatizados pelo Sistema Financeiro Nacional.
No que consiste este instrumento? As reservas bancárias, também
conhecidas como depósitos compulsórios, consistem num percentual sobre os
depósitos à vista que os bancos têm que manter no Banco Central.
Como já tivemos a oportunidade de estudar quando tratamos da criação
da moeda escritural pelos bancos, uma parte dos depósitos à vista pode ser
emprestada e outra deve ser retida. Assim, o esquema funciona da seguinte forma:
170
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
FIGURA 2 – ALTERAÇÕES NA TAXA DE RESERVA
Aumento da
taxa de reserva
Contração
dos meios de
pagamento
Redução da
taxa de reserva
Expansão
dos meios de
pagamento
FONTE: Nogami e Passos (2003, p. 479)
Deduzindo o esquema apresentado, temos que quando as autoridades
monetárias querem diminuir a oferta monetária, estas determinam que os
bancos aumentem suas taxas de reserva, e o contrário ocorre quando o objetivo é
aumentar a oferta de moeda.
Este mecanismo também é deveras utilizado e tem efeito direto sobre o
multiplicador monetário (z), como vimos na Unidade 2.
2.4 FIXAÇÃO DA TAXA DE REDESCONTO
“O redesconto é um empréstimo que os bancos comerciais recebem do
Banco Central para cobrir eventuais problemas de liquidez. A taxa de juros
cobrada sobre esses empréstimos é chamada Taxa de Redesconto” (NOGAMI;
PASSOS, 2003, p. 479).
Mesmo não trabalhando em uma instituição bancária é fácil imaginarmos
que estas têm que manter uma boa reserva de moeda para suas operações diárias,
que são chamadas de reservas voluntárias. Ocorre que mesmo assim, há situações
em que não há disponibilidade suficiente de crédito em determinados períodos
com maior movimento de transações bancárias.
Não encontrando outros bancos na praça que possam efetuar empréstimo,
os bancos têm que recorrer ao Banco Central. É assim que acontecem as operações
de redesconto, sendo que aqui o esquema funciona da seguinte forma:
171
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
FIGURA 3 – ALTERAÇÕES NA TAXA DE REDESCONTO
Elevação
da taxa de
redesconto
Redução dos
meios de
pagamento
Redução
da taxa de
redesconto
Elevação dos
meios de
pagamento
FONTE: Nogami e Passos (2003, p. 479)
2.5 CONTROLES SELETIVOS DE CRÉDITO
Para que você possa entender esse mecanismo, que geralmente é utilizado
em conjunto com a política comercial e industrial do país, vamos citar o exemplo
do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
A missão do BNDES é “promover o desenvolvimento sustentável e
competitivo da economia brasileira, com geração de emprego e redução das
desigualdades sociais e regionais” (BNDES, 2011, s.p.). Veja que estão embutidos
na missão do BNDES dois dos principais objetivos de política macroeconômica e,
por isso, não é à toa que é chamado de “Banco do Desenvolvimento”.
Assim, a cada ano o BNDES estipula suas metas, como será sua política
de crédito aos setores econômicos, podendo beneficiar determinados setores que
precisam de maiores incentivos financeiros para se tornarem competitivos no
comércio mundial (como ocorreu, por exemplo, com o setor de informática), com
o oferecimento de crédito a taxas de juros menores, o que ele faz por meio dos
diversos programas que oferece.
Também os bancos comerciais públicos (Banco do Brasil, Caixa Econômica
Federal), que atuam como executores da política monetária, oferecem créditos
com juros subsidiados, como o Crédito Rural, Programa Nacional da Agricultura
Familiar (PRONAF), dentre outros. Nesses casos, o governo pode controlar o
volume e a destinação do crédito, determinando prazos, limites e condições dos
empréstimos. Outra forma de controle se refere a aumentos ou reduções das taxas
de juros da economia.
Você deve se lembrar de que o Conselho de Política Monetária (COPOM)
é o órgão responsável pela fixação da taxa de juros básica da economia, a famosa
SELIC. Esta se constitui em outra forma de intervenção direta, cujo mecanismo
pode ser explicado da seguinte maneira:
172
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
FIGURA 4 – ALTERAÇÕES NA TAXA DE JUROS
Elevação da
taxa de juros
Diminuição
da oferta
monetária
Redução da
taxa de juros
Aumento
da oferta
monetária
FONTE: A autora
E
IMPORTANT
A política monetária, assim como a política cambial, ao contrário da política
fiscal, é de competência exclusiva do Governo Federal. Os governos estaduais e municipais
têm autonomia somente para desenvolver ações de política fiscal no que se refere a tributos
que são de suas competências.
3 POLÍTICA FISCAL
Quando nos referimos à política fiscal, temos que estar cientes de que
existem dois aspectos a serem considerados: a arrecadação e os gastos.
A arrecadação, facilmente compreendida, consiste na cobrança de
tributos, que se dividem em impostos, taxas e contribuições, e é chamada de
política tributária.
Os gastos, por sua vez, determinam a forma pela qual o governo utiliza os
recursos públicos, e essa atuação é chamada de política de gastos.
A política fiscal é fortemente utilizada pelos países, já que a participação
do Estado na economia tem sido bastante significativa na maioria das nações,
sendo que tal política afeta não só as relações internas, mas também o comércio
internacional. Fortemente criticada por diversos segmentos da economia
brasileira, a nossa carga tributária, que nada mais é do que a proporção do PIB
que é destinada aos tributos, é considerada uma das mais elevadas do mundo.
173
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
NOTA
Leia a seguir o que diz o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação sobre
os tributos:
BRASILEIRO TRABALHA 153 DIAS POR ANO PARA PAGAR IMPOSTOS
Dinheiro vai para os cofres públicos e não retorna como deveria.
Curitiba, 14 de maio de 2018 – Mais de R$ 879 bilhões já foram arrecadados somente neste
ano, segundo dados do Impostômetro. É uma quantia expressiva que teve destino certo: os
cofres públicos. Para se ter uma ideia, com esse valor seria possível adquirir quase 6 milhões
de apartamentos de moradia popular.
De tudo o que se é consumido no país, 33%, em média, é imposto, enriquecendo mais a
cada dia esse número estrondoso.
Não é tarefa fácil demonstrar esses dados, são precisos vários cálculos e tabelas, pois são
muitos os tributos que impactam no preço final de produtos e serviços. Pensando nisso, em
2006, o Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação – IBPT, em um de seus estudos,
identificou que o brasileiro trabalhou 145 dias naquele ano, o equivalente a quase cinco
meses, apenas para pagar seus impostos.
FONTE: <https://ibpt.com.br/noticia/2644/BRASILEIRO-TRABALHA-153-DIAS-POR-ANOPARA-PAGAR-IMPOSTOS>. Acesso em: 15 ago. 2018.
Não podemos nos esquecer de que a principal discussão a se fazer quando
se trata de carga tributária não é a respeito do seu percentual em relação ao PIB,
mas do retorno que o Estado faz dessa arrecadação em serviços ao cidadão.
Países desenvolvidos como Dinamarca, França, Suécia, dentre outros,
tiveram uma carga tributária bem superior ao Brasil no ano de 2013, como se vê
no gráfico da Figura 5. Entretanto, os serviços prestados à população por estes
países (educação, saúde, segurança pública, moradia, transporte, acessibilidade,
dentre outros) são em maior volume e qualidade que os verificados no Brasil,
o que faz com que a satisfação dos cidadãos com a administração pública seja
maior lá do que a verificada por aqui.
174
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
FIGURA 5 – CARGA TRIBUTÁRIA NO BRASIL E EM PAÍSES DA OCDE (2013)
0,0
10,0
20,0
Dinamarca
França
Finlândia
Suécia
Itália
Áustria
Noruega
Luxemburgo
Hungria
Eslovênia
Alemanha
Islândia
Média OCDE (1)
República Tcheca
Brasil
Grécia
Portugal
Reino Unido
Espanha
Canadá
Israel
Turquia
Irlanda
Suíça
Estados Unidos
Coreia do Sul
Chile
30,0
40,0
45,0
44,0
42,8
42,6
42,5
40,8
39,3
38,9
36,8
36,7
35,5
35,0
34,1
33,7
33,5
33,4
32,9
32,6
30,6
30,5
29,3
28,3
27,1
25,4
24,3
50,0
48,6
20,2
FONTE: <http://www.politize.com.br/carga-tributaria-brasileira-e-alta/carga-tributaria-ocde/>.
Acesso em: 16 ago. 2018.
Como é sabido por todos, o governo (compreendido nas esferas
federal, estadual e municipal) efetua despesas na economia na forma de
pagamento do funcionalismo público, na manutenção e construção de escolas,
hospitais, rodovias, penitenciárias etc. A partir do momento em que os gastos
governamentais aumentam, entendemos que o governo está efetuando uma
política fiscal expansionista. Quando ocorre o contrário, estaremos diante de
uma política fiscal contracionista.
O que isso significa, na prática? Bem, “a política tributária, além de influir
sobre o nível de tributação, é utilizada, por meio da manipulação da estrutura e
alíquotas de impostos, para estimular (ou inibir) os gastos de consumo do setor
privado” (VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 91).
175
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
Ao adotar uma política fiscal expansionista, além de aumentar os gastos,
o governo pode diminuir alíquotas de impostos, estimular as exportações por
meio de incentivos fiscais, taxar ou impor barreiras ao produto importado,
incentivando a produção nacional para atender à demanda interna. Por exemplo,
em 2008, quando estourou a bolha imobiliária americana, que resultou na
chamada “Crise Financeira Mundial”, o governo brasileiro lançou mão de uma
política tributária expansionista chamada de renúncia fiscal, ao isentar, dentre
outros, o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) dos automóveis, o que
fez aumentar a renda pessoal disponível e, consequentemente, o consumo.
Já para conter a inflação ou quando houver um aumento da demanda
agregada superior à capacidade produtiva do país, o governo pode lançar mão
do aumento das alíquotas dos impostos, para inibir (ou diminuir) o consumo,
já que esse aumento repercute sobre a renda disponível, o que representa uma
política tributária contracionista.
Ao adotar uma política tributária contracionista (ou restritiva), o governo
pode diminuir gastos públicos (o que pode pressionar a renda, reduzindo o
consumo), elevar a carga tributária sobre os bens de consumo, desencorajando os
gastos, reduzir ou eliminar tarifas e barreiras para o produto importado.
As administrações estaduais e municipais também utilizam a política fiscal
como forma de atrair investimentos, aumentar o nível de emprego, desenvolver
a economia. Um dos grandes problemas que ocorre em relação à política fiscal
entre estados e municípios é a chamada guerra fiscal, já que os mesmos impostos
(como o ICMS e o IPVA de competência estadual e o IPTU e o ISS de competência
municipal) podem ter alíquotas diferentes entre estes.
Muitas vezes ocorre de uma empresa que está instalada em determinado
Estado acabar indo para outro, por este oferecer vantagens tributárias.
3.1 FUNÇÕES DO GOVERNO
Para exercer sua política tributária e de gastos, o governo se baseia, em
nível teórico, nas funções a ele atribuídas, quais sejam:
• A função alocativa;
• a função distributiva;
• a função estabilizadora.
A função estabilizadora “corresponde ao manejo da política econômica
para tentar garantir o máximo de emprego, crescimento econômico, com
estabilidade de preços” (GREMAUD, 2005, p. 195, grifo do original).
176
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
Como já vimos nas unidades anteriores, a intervenção do Estado na
economia se fortaleceu fortemente depois da Grande Depressão de 1930, atuando
no sentido de elevar a demanda efetiva, o nível de emprego, de renda e de
consumo.
Também chamada de anticíclica, a função estabilizadora pode ser utilizada
para intervir tanto em casos de recessão econômica, quanto em situações de
crescimento acelerado, evitando que tal crescimento saia do controle e estimule
um forte processo inflacionário.
“Quanto à função alocativa, tem-se a ação do governo complementando
a ação do mercado no que diz respeito à alocação de recursos na economia”
(GREMAUD, 2005, p. 195, grifo do original). O que isso significa?
Como todos nós sabemos, o capitalismo tem o lucro como figura central.
Isso nos faz imaginar, então, que um empresário só irá empreender se a atividade
for lucrativa. Existem, assim, bens e serviços que precisam ser ofertados à
coletividade, mas que, por não gerarem lucro, não são de interesse da iniciativa
privada, bem como demais “falhas de mercado” que precisam ser atendidas pelo
setor público, como as externalidades e economias de escala, além dos chamados
bens públicos.
“As externalidades (ou economias externas) correspondem ao fato de que
a ação de determinados agentes pode ter impactos sobre o resultado almejado
por outros agentes” (GREMAUD, 2005, p. 195, grifo do original). Complicado de
entender? Vamos descomplicar.
Quando você circula com seu automóvel por uma rodovia e se depara
com inúmeros buracos, se pergunta: Quem é o responsável por isso?
Partindo do pressuposto de que a rodovia tenha sido construída dentro
dos parâmetros recomendados, uma possível resposta a essa pergunta reside no
fato de muitos caminhões transitarem com peso superior ao permitido, causando
danos à rodovia. Ou seja, todos nós sofremos as consequências pela atuação
negativa ou de má-fé de uma parcela da população que transita na rodovia. Muitos
outros exemplos estão associados a este, como os custos derivados da poluição,
que são suportados por todos, a destruição da camada de ozônio, dentre outros.
Estes são exemplos de externalidades negativas.
Há também exemplos de externalidades positivas. Quando uma empresa
instala uma unidade num bairro de uma cidade e efetua uma série de melhorias,
como asfaltamento das ruas, temos uma externalidade positiva. Ou ainda, quando
um município destina determinada área pública para a criação de um distrito
industrial, oferecendo infraestrutura na forma de rodovias, energia elétrica e
sistema de comunicações, favorece o desenvolvimento da cidade, possibilita a
inovação e a criação de novas tecnologias, além de elevar o nível de emprego.
177
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
“As economias de escala são definidas como a situação em que o
aumento da produção de determinado bem, por uma única empresa, leva à
redução do custo médio por produto, ocasionando no limite o aparecimento
dos ‘monopólios naturais’” (GREMAUD, 2005, p. 195, grifo do original).
Pela citação anterior, você já deve ter deduzido que se trata dos casos em que
uma única empresa domina a oferta de determinado produto por características
próprias da atividade, como os custos para a implantação da empresa serem
excessivamente altos (como o caso da Petrobras, Vale do Rio Doce), por serem estas
destinadas à operação em áreas públicas (como as hidrelétricas), serem consideradas
de interesse público (como a segurança pública, telecomunicações) etc.
Normalmente as nações estabelecem formas diferenciadas de fiscalização
desses monopólios, como é o caso no Brasil das Agências Reguladoras, como
a Agência Nacional do Petróleo (ANP), Agência Nacional das Águas (ANA),
dentre outras.
Também estão associadas aos monopólios naturais ou a empresas estatais
as atividades que, embora sejam importantes ao país, apresentem risco elevado,
como o setor de energia nuclear, pesquisas de novos medicamentos, novos
produtos e processos. Naturalmente que o setor privado tem mais restrições
a investir nestes segmentos, restando essa responsabilidade ao setor público,
especialmente ligado às universidades públicas.
“Os bens públicos são caracterizados pelo fato de seu consumo ser não
excludente e não rival, isto é, o consumo de uma pessoa não impede o consumo
de outra” (GREMAUD, 2005, p. 196, grifo do original).
Existem atividades que não são lucrativas, ou que são de atribuição
própria do Estado, como o caso da segurança pública, das forças armadas, da
iluminação pública, educação, saúde, que devem ser disponibilizadas para todos
os cidadãos, independentemente de sexo, idade, condição financeira.
Finalmente, temos a função distributiva, que “corresponde à função
do governo em arrecadar impostos (reduzir a renda) de determinadas classes
sociais ou regiões, para transferi-los a outras” (GREMAUD, 2005, p. 196, grifo
do original).
Você estudou na Unidade 2 que um dos princípios da Constituição
Federal de 1988 é reduzir as desigualdades sociais e regionais. Somos um país de
dimensões continentais, que passou por um processo de colonização a partir do
seu descobrimento em 1500, já de forma concentradora de renda e de riquezas em
determinados estados.
178
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
A Proclamação da República, em 1889, não alterou muito o cenário, com a
presença de poucas atividades industriais no país, que até então era dependente
da exportação de matérias-primas e vivia os chamados “ciclos econômicos” do
ouro, da borracha, da cana-de-açúcar e, por derradeiro, o ciclo do café.
A Grande Depressão de 1930 fez com que o Brasil fosse obrigado a alterar a
sua matriz econômica, totalmente dependente das exportações do café, passando
então a um processo de industrialização por substituição de importações, mais
uma vez caracterizado pela falta de planejamento e por priorizar determinadas
regiões, principalmente Sudeste e Sul do país.
Um exemplo do que significou o processo de industrialização no Brasil
relaciona-se a aspectos demográficos. No início do século XX, cerca de 80% da
população brasileira vivia no campo e somente 20% na cidade. No final do século
esta realidade se inverteu totalmente, já que hoje as estatísticas demográficas dão
conta de que mais de 80% da população vive nas cidades.
A concentração populacional nos grandes centros urbanos, como São
Paulo e Rio de Janeiro (as chamadas metrópoles), resultou na favelização,
reunindo principalmente famílias (ou parte delas) provenientes de regiões mais
pobres do Norte e Nordeste, que vinham para o Sudeste atraídos pela promessa
de empregos, os quais não existiam para todos.
As famílias que permaneceram no campo convivem ainda hoje com a falta
de água e demais políticas públicas que possam favorecê-los. Por isso existem
políticas fiscais destinadas especialmente às regiões mais pobres do país, como
Norte e Nordeste.
No que se refere às desigualdades sociais, como já exposto, somos um
país de contrastes, já que há um pequeno número de famílias que fica com mais
da metade da riqueza, enquanto a maioria da população sofre com a pobreza. Por
isso que o princípio de diminuição das desigualdades regionais e sociais ainda é
um desafio que requer do Estado o pleno exercício da sua função distributiva na
economia.
É importante ainda destacar que o Estado pode utilizar-se ao mesmo
tempo das três funções na economia. Vamos exemplificar: na transposição do Rio
São Francisco, o Estado se valeu de sua função estabilizadora, já que a obra é
realizada por meio do aumento de gastos públicos (política fiscal expansionista),
da função distributiva, pois está destinando recursos a uma região específica do
país, e da função alocativa, pois com a obra está oferecendo aos cidadãos um bem
público, que é a própria transposição.
179
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
3.2 POLÍTICA TRIBUTÁRIA E DE GASTOS
Como já salientado anteriormente, a arrecadação pública é efetuada
por meio dos tributos, que são os impostos, taxas e contribuições, sendo que os
primeiros são os de maior valor.
Lembramos, ainda, que os impostos se dividem em diretos (incidem
sobre a renda e o patrimônio) e indiretos (incidem sobre o consumo e as vendas).
No Brasil, a arrecadação de impostos é ainda mais injusta com a população
mais pobre, já que o peso dos impostos indiretos na arrecadação representa quase
a metade de todos os impostos, conforme indica o gráfico ilustrado a seguir:
FIGURA 6 – O PESO DOS IMPOSTOS INDIRETOS NO BRASIL (EM %) – DADOS DE 2015
Venezuela
Chile
Brasil
Argentina
Uruguai
México
Reino Unido
Noruega
Alemanha
Bélgica
Canadá
Suíça
EUA
49,68%
0
15
30
45
60
75
% da arrecadação total
FONTE: <https://economia.estadao.com.br/blogs/nos-eixos/as-injusticas-tributarias-do-brasilem-5-graficos/>. Acesso em: 16 ago. 2018.
Afinal, o que isso significa? É isso mesmo o que você deve estar pensando:
cidadãos com renda totalmente diversa pagam o mesmo percentual de impostos
sobre bens e serviços, ou seja, ao adquirir uma garrafa de água mineral de 600 ml,
um cidadão com renda mensal de R$ 900,00 paga em média 44% em impostos, o
mesmo valor que irá pagar um cidadão com renda mensal de R$ 20.000,00.
Já com relação aos impostos diretos, que incidem sobre o patrimônio e
a renda, o percentual cobrado no Brasil é baixo, se comparado a outros países,
como verificamos no gráfico ilustrado a seguir:
180
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
FIGURA 7 – O PESO DOS IMPOSTOS DIRETOS NO BRASIL (EM %) – DADOS DE 2015
FATIA DOS TRIBUTOS SOBRE RENDA, LUCRO E RENDA DE CAPITAL NA ARRECADAÇÃO
TOTAL DOS PAÍSES
EUA
Canadá
Suíça
Noruega
México
Chile
Bélgica
Reino Unido
Alemanha
Venezuela
Uruguai
Brasil
Argentina
20,9%
0
10
20
30
40
50
% da arrecadação total
FONTE: <https://economia.estadao.com.br/blogs/nos-eixos/as-injusticas-tributarias-dobrasil-em-5-graficos/>. Acesso em: 16 ago. 2018.
Cobrando menos impostos diretos, a função distributiva do governo fica
prejudicada, uma vez que aqueles que têm maior renda pagam proporcionalmente
menos impostos. Como se não bastasse, essa distorção é ainda mais cruel quando
analisamos a defasagem no reajuste da tabela do Imposto de Renda (IR) em
relação à inflação, conforme apresentamos a seguir:
FIGURA 8 – DEFASAGEM DA TABELA DO IMPOSTO DE RENDA (1996 A 2016)
Defasagem da tabela do IR
Comparação entre os reajustes da tabela progressiva e a inflação anual
IPCA
Correção da tabela
20
83%
Defasagem acumulada desde 1996
15
10
5
0
1996
2001
2006
2011
2016
FONTE: <https://economia.estadao.com.br/blogs/nos-eixos/as-injusticas-tributarias-do-brasilem-5-graficos/>. Acesso em: 16 ago. 2018.
181
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
Podemos observar que a tabela do IR não está sendo corrigida da forma
devida, fazendo com que as faixas menores de renda entrem na base de cálculo
do imposto, penalizando mais uma vez os mais pobres.
“Desde 1996, ano em que a tabela foi convertida de unidades fiscais para o
real, o imposto acumula uma discrepância de 83% em relação ao Índice de Preços
ao Consumidor Amplo (IPCA)” (LIMA, 2017, s.p.).
Percebeu o significado dessa afirmação? Se a tabela do IR fosse reajustada
com base na inflação do período, muitos trabalhadores voltariam para a faixa de
renda isenta de tributação, o que implicaria num aumento da renda disponível de
boa parte dos cidadãos brasileiros.
Ainda no que se refere à política tributária, o volume de arrecadação
depende de duas variáveis macroeconômicas, que são o nível de renda e produto
da economia. “Conforme aumenta a renda dos indivíduos e a riqueza da sociedade,
aumenta a arrecadação de impostos diretos, e conforme aumenta o produto, a
circulação de mercadorias, aumentam os impostos indiretos” (GREMAUD, 2005,
p. 198-199).
Cada país tem um sistema tributário, definido no Código Tributário
Nacional. A forma de estruturação desse sistema é que determinará o impacto
desses impostos sobre o nível de renda e sua distribuição e mesmo sobre a
competitividade da economia, já que países que possuem uma estrutura tributária
menos invasiva acabam, por exemplo, oferecendo bens e serviços com preços
mais vantajosos para os consumidores.
Assim, os sistemas tributários podem ser classificados em progressivos,
regressivos ou neutros. “Um sistema tributário é dito progressivo quando a
participação dos impostos na renda dos indivíduos aumenta conforme a renda
aumenta, isto é, paga mais (em termos relativos) quem ganha mais” (GREMAUD,
2005, p. 199).
“Um sistema é regressivo quando a participação dos impostos na renda
dos agentes diminui conforme a renda aumenta (paga mais quem ganha menos)”
(GREMAUD, 2005, p. 199). Conforme exemplificamos, o Brasil não possui um
sistema tributário com características progressivas, já que este tem recaído mais
(relativamente) sobre as faixas de renda menores, tendendo a ser mais regressivo.
Um sistema tributário “é neutro quando a participação dos impostos
na renda dos indivíduos é a mesma, independentemente do nível de renda”
(GREMAUD, 2005, p. 199).
Uma das principais atribuições da política fiscal é proporcionar à
sociedade a possibilidade de se desenvolver e obter eficiência econômica, de tal
forma que possa ser competitiva em nível internacional, já que as exportações são
uma forma importante de crescimento econômico.
182
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
Desta forma, distorções nos preços relativos dos bens e serviços devem ser
evitadas, bem como desincentivos ao investimento e perda de competitividade dos
produtos nacionais. Por exemplo, se o governo taxar com altas alíquotas matériasprimas ou insumos importantes para o setor produtivo, como o petróleo e seus
derivados e energia elétrica, poderá ocasionar uma distorção nos preços relativos
dos produtos, encarecendo-os, o que pode inclusive acarretar no aumento do nível
de preços e na perda de competitividade com os produtos do exterior.
“Por outro lado, quando se fala em desenvolvimento, o sistema tributário
deve ser flexível, para facilitar o cumprimento de metas socialmente desejáveis”
(GREMAUD, 2005, p. 199).
O que é uma meta socialmente desejável? Existem produtos essenciais
e produtos supérfluos, não é mesmo? Produtos essenciais são aqueles
imprescindíveis à sociedade, e podemos citar a cesta básica cujos produtos têm
uma alíquota tributária menor em relação a produtos menos importantes ou até
nocivos ao ser humano, como o cigarro.
Veja a seguir alguns exemplos da taxação de produtos considerados
supérfluos ou menos essenciais:
QUADRO 1 – OS DEZ PRODUTOS MAIS TRIBUTADOS NO BRASIL
TRIBUTAÇÃO
ALÍQUOTA (%)
1 – Cachaça
81,87
2 – Casaco de pele
81,86
3 – Vodca
81,52
4 – Cigarro
80,42
5 – Perfume importado
78,99
6 – Caipirinha
76,66
7 – Videogame
72,18
8 – Revólver
71,58
9 – Perfume nacional
69,13
10 – Motos acima de 250 cc
64,64
FONTE: <https://epocanegocios.globo.com/Dinheiro/noticia/2017/04/os-10-produtos-commais-imposto-no-brasil.html>. Acesso em: 16 ago. 2018.
Desta forma, o governo aumenta a alíquota de produtos considerados
supérfluos ou nocivos para desestimular o consumo e pode diminuir ou até
isentar produtos considerados essenciais.
183
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
Outra forma de flexibilidade tributária é a concessão de subsídios. De
acordo com Sandroni (1989, p. 301), o subsídio:
Tecnicamente, pode ser definido de várias formas: a) benefícios a
pessoas ou a empresas pagos pelo governo, sem contrapartida em
produtos ou serviços; b) despesas correspondentes à transferência de
recursos de uma esfera de governo em favor de outra; c) despesas de
governo visando à cobertura de prejuízos das empresas (públicas ou
privadas) ou ainda para o financiamento de investimentos; d) benefícios
a consumidores, na forma de preços inferiores que, na ausência de tal
mecanismo, seriam fixados pelo mercado; e) benefícios a produtores
e vendedores mediante preços mais elevados, como acontece com a
tarifa aduaneira protecionista; e f) concessões de benefícios pela via do
orçamento público ou outros canais.
Como você pôde observar pela definição de Sandroni (1989), existe uma
infinidade de formas diferentes de concessão de subsídios que são importantes
para o desenvolvimento econômico, desde que não impliquem no aumento
do endividamento público. Exemplos? Temos o Programa de Financiamento
Estudantil (FIES) como uma forma importante de ingresso e permanência de
alunos nas universidades, o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura
Familiar (PRONAF), que favorece os pequenos agricultores, dentre tantos outros.
Infelizmente, a concessão de subsídios também passa por uma
interpretação ideológica do agente público, que pode optar por beneficiar setores
ou grupos economicamente já privilegiados e deixar de atender a setores mais
marginalizados pelo sistema econômico.
DICAS
Leia mais sobre subsídios em: <http://www.valor.com.br/brasil/5503631/brasilconcedeu-quase-r-4-tri-em-subsidios-nos-ultimos-15-anos>.
Uma das características da estrutura tributária brasileira que você já deve
ter discutido é o grande número de impostos, que na linguagem “economês”
compõe o que se chama de “custo Brasil” e dificulta a abertura de empresas,
além da burocracia que está associada a esta estrutura, pois inúmeras portarias e
decretos são frequentemente editados, o que faz com que as empresas tenham que
contar com um verdadeiro aparato contábil e jurídico para decifrar e implantar
as constantes modificações efetuadas no sistema tributário. Por isso a sociedade
clama por uma reforma tributária que atenda aos interesses nacionais, reduza o
número de impostos e torne nossos produtos mais competitivos.
A maioria dos tributos no Brasil é de competência federal, conforme
podemos observar:
184
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
FIGURA 9 – REPARTIÇÃO DAS RECEITAS TRIBUTÁRIAS ENTRE AS ESFERAS DE GOVERNO
ITEM
TIPO
UNIÃO
ESTADOS
MUNICÍPIOS N, NE, CO.
Tributos de Competência da União (ART. 153 e 154)
I
II - Importação
100%
-
-
-
II
IE - Exportação
90%
10%
-
-
III
IR - Renda e Proventos
52%
21,5%
23,5%
3%
IV
IPI - Produtos Industrializados
42%
29%
25%
3%
V
IOF - Operações Crédito/Câmbio
e Seguros
100%
-
-
-
VI
ITR - Propriedade Territorial
Rural
50%
-
50%
-
VII
COFINS - Financiamento da
Seguridade
100%
-
-
-
VIII
CSLL - Sobre o Lucro Líquido
100%
-
-
-
IX
CIDE - Contribuição sobre o
Domínio Econômico
71%
21,75%
7,25%
-
Tributos de Competência dos Estados (ART. 155)
I
ITCMD - Transmissão Bens
Imóveis e Doação (Causa Mortis)
-
100%
-
-
II
ICMS - Circulação Mercadorias e
Serviços
-
75%
25%
-
III
IPVA - Propriedade de Veículos
Automotores
-
50%
50%
-
Tributos de Competência dos Municípios (ART. 156)
I
IP´TU - Predial e Territorial
Urbano
-
-
100%
-
II
ITBI - Transmissão Inter Vivos de
Bens Imóveis
-
-
100%
-
III
ISQN - Serviços de Qualquer
Natureza
-
-
100%
-
FONTE: <https://www.google.com.br/search?q=reparti%C3%A7%C3%A3o+da+recei
ta+entre+as+esferas+de+governo&source=lnms&tbm=isch&sa=X&ved
=0ahUKEwiwtvqCpOPbAhUEhZAKHa0RDrgQ_AUIDSgE&biw=1366&bi
h=635#imgrc=Dh8lgXZ8oZ_9fM>. Acesso em: 16 ago. 2018.
Essa concentração dos tributos na esfera federal também é alvo de muitas
críticas, pois a forma como está repartido o bolo tributário obriga municípios e
estados a praticar o que denominamos de política do “pires na mão”, ou seja,
frequentemente ouvimos nos noticiários e lemos nas mídias sociais sobre a ida de
representantes de estados e municípios a Brasília para reivindicar mais recursos
para si, o que representa uma forte relação de subserviência com o Governo Federal.
185
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
Tal concentração fica ainda mais evidente ao observarmos a figura com o
gráfico a seguir, já que, embora tenha havido uma diminuição da concentração ao
longo dos anos, a União ainda fica com mais da metade dos recursos.
FIGURA 10 – EVOLUÇÃO DA PARTICIPAÇÃO PERCENTUAL DOS TRÊS NÍVEIS DE GOVERNO
NA RECEITA DISPONÍVEL NO BRASIL – 1960 A 2016
100%
MUNICÍPIOS
90%
80%
70%
ESTADOS
60%
50%
40%
UNIÃO
30%
20%
10%
0%
1960
1970
1980
1990
2000
2010
2013
2014
2015
2016
FONTE: <http://carta.fee.tche.br/article/a-problematica-descentralizacao-das-receitas-nobrasil/>. Acesso em: 16 ago. 2018.
De acordo com Meneghetti Neto (2017, s.p.):
Entre 1960 e 2016, a participação da União no bolo dos recursos
disponíveis passou de 59,5% para 53,9%; a dos estados, de 34,1% para
25,5%; e a dos municípios, de 6,4% para 20,6% do total das receitas
disponíveis. Isso significa que os municípios ganharam 14,2 pontos
percentuais, que saíram da União (5,6 pontos percentuais) e dos
estados (8,6 pontos percentuais).
Analisemos agora a política de gastos. “Os gastos do governo podem
ser divididos numa primeira aproximação em despesas correntes ou gastos de
custeio (funcionários públicos e bens e serviços – materiais) e transferências”
(GREMAUD, 2005, p. 196, grifo do original).
Nas despesas correntes, incluem-se quatro itens: o consumo do governo
(pagamento dos funcionários e despesas como energia elétrica e materiais),
transferências (despesas do setor público destinadas ao setor privado, sem
contraprestação de serviços ou fornecimento de bens como, por exemplo, é
a Assistência e Previdência Social), juros (pagamento de juros tanto da dívida
interna como externa) e subsídios.
186
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
O quadro a seguir relaciona a despesa da União por grupo, incluindo
também os investimentos, que no sistema de contabilidade nacional é contabilizado
na Conta Produção (PIB):
QUADRO 2 – DESPESA DA UNIÃO POR GRUPO
ORÇAMENTOS FISCAL E DA SEGURIDADE SOCIAL
JANEIRO A DEZEMBRO DE 2017
DESPESA LIQUIDADA
GRUPO DE DESPESA
Valor Nominal
DESPESAS CORRENTES
1.603.334.836.678
Pessoal e Encargos Sociais
281.304.357.337
Juros e Encargos da Dívida
203.109.395.198
Outras Despesas Correntes
1.118.921.084.143
Transferências a Estados, DF e Municípios
306.248.756.942
Benefícios Previdenciários²
545.691.007.405
Demais Despesas Correntes
266.981.319.796
DESPESAS DE CAPITAL
396.720.394.192
Investimentos
18.858.130.548
Inversões Financeiras
57.485.889.292
Amortização da Dívida²
320.376.374.352
SUBTOTAL
2.000.055.230.870
Amortização da Dívida - Refinanciamento
462.632.657.650
Refinanciamento da Dívida Mobiliária
458.414.994.032
Refinanciamento da Dívida Contratual
4.217.663.618
TOTAL
2.462.687.888.520
DESPESAS INTRAORÇAMENTÁRIAS
42.887.383.131
Fonte: SIAFI - STN/CCONT/GEINC
Nota: Excluídas as operações intraorçamentárias, que poderão ser obtidas no Relatório
Resumido de Execução Orçamentária do mesmo período.
² Os Benefícios Previdenciários referem-se ao pagamento de inativos, pensões, outros benefícios
previdenciários.
³ Excetuados os valores referentes ao refinanciamento da Dívida Pública.
FONTE: <http://www.tesouro.fazenda.gov.br/-/series-historicas>. Acesso em: 16 ago. 2018.
Como você pôde observar no quadro, temos uma situação de
estrangulamento em alguns pontos das despesas públicas: o primeiro se
refere ao elevado volume de recursos destinados ao pagamento de benefícios
previdenciários e o segundo ao refinanciamento e amortização da dívida pública
(externa e interna).
187
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
No primeiro caso, a tão discutida reforma da Previdência está no centro
dos debates no Congresso Nacional e no Poder Executivo há anos, pois com a
melhora significativa da expectativa de vida no Brasil (que implica no aumento do
tempo de prestação do benefício previdenciário por aposentado) e a diminuição
da taxa de natalidade (hoje caminha para menos de 1% ao ano) é preciso pensar
numa alternativa viável para que as futuras gerações possam contar com a
aposentadoria pública.
Há ainda que se ressaltar que nessa discussão não se pode deixar de
tratar das injustiças que ocorrem em relação aos beneficiários da Previdência,
principalmente relacionadas à aposentadoria dos servidores públicos, em especial
de juízes, governadores, deputados e senadores, que embolsam grande fatia do
bolo previdenciário.
Já no tocante à dívida da União, aquela famosa frase conhecida por todos
– de que é preciso gastar somente o que se recebe –, é preciso ser levada com
seriedade pelos gestores públicos, para que tenhamos uma futura redução desses
valores que permita ao país utilizar o recurso público de forma mais eficiente.
“O total de impostos arrecadados no país corresponde à chamada carga
tributária bruta. A diferença entre a carga tributária bruta e as transferências
governamentais (juros sobre a dívida pública, subsídios e gastos com assistência
e previdência social) é a carga tributária líquida do governo” (GREMAUD,
2005, p. 210).
É com base na carga tributária líquida que o governo pode financiar
seus gastos correntes, que nada mais é do que o consumo do governo (custeio
da máquina pública). Ao extrairmos da carga tributária líquida o consumo do
governo, teremos a poupança do governo em conta corrente.
Assim:
Poupança do governo em conta corrente = Carga tributária líquida –
consumo do governo
O investimento público, por sua vez, de acordo com Gremaud (2005,
p. 211), “refere-se aos gastos do governo com a construção de novas estradas,
hospitais, escolas etc. A diferença entre a poupança pública e o investimento
público deveria fornecer o valor do déficit ou superávit público, ou seja, a
diferença entre arrecadação total e gasto total.
Déficit público = Investimento público – poupança pública em conta
corrente
Como essa conta geralmente tem apresentado déficit, este gasto maior do
que a receita pode ser coberto de duas formas: o governo pode vender títulos ao
188
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
setor privado, quando ocorre uma transferência da poupança privada ao setor
público; ou, vender títulos públicos ao Banco Central, que leva à emissão de
moeda para financiar a compra desses títulos (GREMAUD, 2005).
As duas alternativas levam ao endividamento público. Por isso,
como temos salientado, o governo acaba ficando refém do sistema financeiro,
interferindo, consequentemente, sobre a própria economia do país.
Os gastos de capital, especialmente os investimentos, que no Brasil já são
baixos em relação a outros países, têm apresentado uma redução ainda maior nos
últimos anos, conforme podemos observar no gráfico ilustrado a seguir:
FIGURA 11 – DESPESAS DE INVESTIMENTO COMO PERCENTUAL DO PIB A PREÇOS
DE DEZEMBRO/2017
1,4%
120
1,34%
100
1,15%
1,20% 1,23%1,19%
1,2%
1,04%
0,93%
1,02%
80
0,90%
1,0%
0,80%
60
0,69% 0,8%
0,6%
40
0,4%
20
0,2%
0
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2015
2016
2017
0,0%
FONTE: <http://www.tesouro.fazenda.gov.br/documents/10180/246449/
Apresenta%EF%BF%BD%EF%BF%BDo-RTN+Dezembro+2017.pdf/5e411f53-47a1-46ab-b5f9792ed0548e2f>. Acesso em: 28 ago. 2018.
Uma queda tão significativa nos investimentos públicos, que em 2014 eram
da ordem de 1,14% do PIB e em 2017 reduziram para 0,69% do PIB, inviabiliza
muitas obras públicas que se fossem executadas poderiam gerar um impacto
muito significativo sobre a demanda agregada, estimulando o emprego, a renda
e o crescimento econômico.
189
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
4 POLÍTICAS COMERCIAL E CAMBIAL
Muitos autores utilizam apenas a expressão “cambial” para se referir
às políticas efetivadas com o exterior, pois a política comercial se dá muito em
função da política fiscal (barreiras tarifárias e não tarifárias).
Aqui, preferimos utilizar a expressão “política comercial” para nos
referirmos “aos instrumentos de incentivos às exportações e/ou estímulo e
desestímulo às importações, ou seja, refere-se a estímulos fiscais (crédito-prêmio
do ICMS, IPI, etc.) e creditícios (taxas de juros subsidiadas) às exportações e ao
controle das importações (via tarifas e barreiras quantitativas sobre importações)”
(VASCONCELLOS; GARCIA, 2004, p. 92).
Como você deve imaginar, mesmo em tempos de globalização econômica
e financeira, os países adotam medidas protecionistas, ou seja, protegem a
indústria nacional e o fazem mediante alguns argumentos.
O primeiro se refere à proteção à indústria nascente, que não sobreviveria
se fosse competir em condições de igualdade com as externas. É com a criação de
empresas nacionais que os países podem ter acesso a novas tecnologias, conquistar
maior autonomia e soberania tecnológica, diminuindo a dependência externa.
A segurança nacional constitui um segundo argumento, já que há
setores considerados estratégicos para as nações que, por essa razão, devem ser
protegidos da concorrência internacional, como o caso do setor petrolífero, de
energia elétrica, dentre outros.
Um terceiro argumento, mas não menos importante, é a proteção ao
emprego dos residentes no país, já que o nível de emprego é uma das principais
variáveis determinantes do crescimento econômico.
Finalmente, no sistema de contas nacionais, temos o Balanço de
Pagamentos, que tem em uma das suas contas a balança comercial, que registra o
saldo entre as importações e exportações de mercadorias. Se o valor dos produtos
importados for superior ao exportado, teremos um déficit na balança comercial,
que pode influir no déficit do Balanço de Pagamentos.
O gráfico a seguir registra o resultado da balança comercial brasileira recente:
190
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
FIGURA 12 – BALANÇA COMERCIAL BRASILEIRA (EM BILHÕES DE US$)
60
44,9
47,7
46,5
40
33,8
40
29,8
25 25,3
24,9
20,1
20
19,7
19,4
13,2
0
-6,8 -6,6 -1,3 -0,7
2,7
2,3
4,1
20
15
20
13
20
11
20
09
20
07
20
05
20
03
20
01
19
99
19
97
-20
FONTE: <http://www.geografiaopinativa.com.br/2017/01/comercio-exterior-brasileiro.html>.
Acesso em: 28 ago. 2018.
Como se observa, há significativas alterações na balança comercial
brasileira, muito em função da produção agropecuária, já que grande parte das
exportações provém desse setor. Ou seja, quando a produção agropecuária é boa,
aumenta o saldo da balança comercial. Mas os produtos com maior valor agregado
também sofrem impactos pela situação econômica interna e externa, ocorrendo
períodos em que aumentam as exportações desses produtos e outros em que a
exportação declina. Isso porque cada país irá adotar uma certa política comercial
conforme a sua conjuntura interna, alternando períodos de maior abertura com
períodos mais protecionistas.
DICAS
Os Estados Unidos têm adotado uma política comercial protecionista no ano de 2018,
que tem contribuído fortemente para acirrar a chamada guerra comercial entre os países. Leia mais
sobre o assunto acessando o link <http://www.valor.com.br/internacional/5620771/indicadoreseconomicos-ja-mostram-estrago-da-guerra-comercial?utm_source=newsletter&utm_
medium=email&utm_campaign=newsletter_tarde>.
191
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
Além das medidas protecionistas, a intervenção governamental no
comércio mundial também pode se dar na forma de restrições ao livre comércio,
por meio de barreiras tarifárias e não tarifárias.
O governo pode aplicar uma barreira tarifária, isto é, um imposto que,
adicionado ao preço internacional do produto, poderá fazer com que
o preço da mercadoria produzida internamente se torne competitivo;
dessa forma, o governo protege os produtos nacionais a fim de que
não sofram a concorrência de produtos importados mais baratos
(NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 519).
Barreiras tarifárias são impostas a diversos produtos brasileiros. Dentre
elas, uma das mais conhecidas são as aplicadas por países como Estados Unidos
e União Europeia, Japão e China ao suco de laranja, com a imposição de altas
tarifas de importação para esse produto.
Nesse caso, assim como no caso da barreira tarifária, o governo visa
dar maior competitividade ao produto nacional. A diferença básica
é que não se aplica um imposto, mas sim obstáculos quantitativos ou
burocráticos que oneram ou inviabilizam as importações. Como
restrições burocráticas podemos citar os certificados de origem e vistos
consulares. Como restrições quantitativas temos a fixação de cotas
(volume máximo a ser importado) (NOGAMI; PASSOS, 2003, p. 519).
Os certificados de origem, na maioria das situações, exigem que o país
exportador atenda a uma série de exigências, como no caso dos alimentos, de
ordem sanitária e fitossanitária (embalagens, temperatura, bem-estar animal etc.).
O Brasil, por ser grande produtor do chamado agronegócio, é
constantemente bombardeado com barreiras não tarifárias, sendo comuns casos
aplicados ao frango e aos suínos.
Finalmente, a intervenção do governo no comércio exterior também pode
se dar na forma de incentivos, que podem ser fiscais ou creditícios, fazendo com
que o produto nacional se torne competitivo internacionalmente.
Os incentivos fiscais podem se dar na forma da redução ou isenção de
impostos ao produto exportado e os creditícios na forma de financiamentos para
a produção com juros subsidiados (NOGAMI; PASSOS, 2003).
NOTA
Um dos incentivos governamentais às exportações mais conhecido da recente
economia brasileira é a chamada Lei Kandir (de 13/09/1996), de autoria do ex-deputado
federal Antônio Kandir, que isenta o ICMS dos produtos e serviços destinados à exportação.
Confira na íntegra a lei disponível no link <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/lcp/
Lcp87.htm>.
192
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
A política cambial, por seu turno, “refere-se à atuação do governo sobre
a taxa de câmbio” (VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 92).
Conforme já estudamos neste livro, uma das condições de equilíbrio
macroeconômico diz respeito às divisas, que são as moedas estrangeiras. Nesse
mercado a condição de equilíbrio é dada por:
Oferta de divisas = demanda de divisas
Apenas para recordar, já vimos que as moedas estrangeiras também são
mercadorias e as divisas têm seu preço determinado pela taxa de câmbio. A
taxa de câmbio, por sua vez, é o valor que se paga, em moeda nacional, por uma
unidade de moeda estrangeira, que pode ser o dólar, euro, ou qualquer moeda
aceita no mercado de câmbio.
A taxa de câmbio, por sua vez, é determinada pela relação entre a demanda
e a oferta de moeda estrangeira. O órgão responsável pela taxa de câmbio é o
Banco Central, que pode utilizar dois regimes cambiais: torná-la fixa ou permitir
que ela flutue ao sabor do mercado. As duas formas de administração da taxa de
câmbio já foram utilizadas no Brasil.
Num período mais recente, foi o Plano Real que tornou a taxa de câmbio
fixa ao estabelecer, em julho de 1994, que R$ 1,00 equivaleria a US$ 1,00. Por meio
dessa medida, também chamada de âncora cambial, o governo utilizou a política
cambial para ajudar no combate à inflação. Cada vez que os preços nacionais de
alguns produtos ameaçavam subir, o governo liberava a importação do produto
que, por ter uma taxa cambial fixa, tinha o mesmo valor do produto nacional,
desestimulando o aumento dos preços.
É claro que essa política de câmbio fixa, em que pese ter ajudado
efetivamente no combate à inflação, trouxe sérias consequências para a economia
brasileira, já que contribuiu para aumentar o endividamento do país, pois
para manter o câmbio fixo o Banco Central tinha que comprar ou vender dólar
diretamente ao mercado, comprometendo as contas públicas. De acordo com
Gremaud (2005, p. 283):
No regime de câmbio fixo, as oscilações nas demandas e ofertas de
divisas não repercutem sobre a taxa de câmbio, mas apenas sobre o
volume de reservas internacionais do país e sobre a oferta de moeda
primária nesse país, pois a oferta de moeda dentro do país aumenta
quando o governo compra divisas e diminui quando há venda de
divisas. Isso porque, quando o governo adquire as divisas, as troca por
moeda nacional, colocando tal moeda em circulação; e quando as vende,
recebe em troca moda nacional, que, assim, é retirada de circulação.
Setores importantes da economia brasileira também foram afetados,
alguns positiva e outros negativamente no período em que vigorou a taxa de
câmbio fixa.
193
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
Para os exportadores foi um período difícil, pois os produtos a serem
exportados rendiam o mesmo valor em dólar e assim isso desestimulava as
exportações. Já os importadores foram beneficiados, pois conseguiam importar
produtos com o mesmo valor em dólar, o que propiciou a modernização de
setores econômicos que tiveram condições de adquirir principalmente bens de
capital, como máquinas e equipamentos.
No regime de taxas de câmbio flutuantes o valor do câmbio é determinado
pela relação entre a oferta e demanda de divisas, sendo que o governo não
interfere diretamente, apenas indiretamente como um dos agentes econômicos.
Assim, quando a demanda de divisas for maior do que a oferta, dizemos
que a moeda nacional se desvaloriza em relação à estrangeira, ficando a cotação
mais distante (por exemplo, US$ 1,00 equivale a R$ 3,00), e quando a oferta de
divisas for maior do que a demanda, a moeda nacional se valoriza em relação à
estrangeira (US$ 1,00 = R$ 1,20).
O sistema de taxas de câmbio flutuantes provoca grandes desconfortos
ao comércio mundial, pois, com a alta volatilidade de taxas, pode levar a
constantes alterações nos preços relativos. Com isso, cria-se um cenário
desfavorável à formação de expectativas e, consequentemente, à tomada
de decisões dos agentes econômicos (GREMAUD, 2005, p. 285).
Está difícil de entender? Vamos descomplicar.
Imaginemos que você fez uma reserva financeira para uma viagem à
Europa por uma semana e ao se aproximar o dia de efetuar a troca de reais por
dólar ou euro você observa que a moeda nacional está se desvalorizando, ou seja,
precisa de mais reais para adquirir a divisa que irá utilizar. Você pode ficar em
dúvida se deve adquirir logo a moeda, temendo por uma desvalorização ainda
maior da moeda nacional, ou esperar que a moeda nacional se valorize, quando
seu poder de compra de divisas aumente.
Assim também acontece com os demais agentes econômicos. Derivados
dos dois principais regimes cambiais citados no parágrafo anterior, temos ainda
dois outros, o sistema de flutuação suja e o sistema de bandas.
A partir de meados da década de 70, o sistema de flutuação suja foi
utilizado e consistia em intervenções pontuais do governo em períodos em que a
taxa, que era flutuante, apresentava riscos à economia interna. Nessas situações o
governo intervinha estabilizando ou direcionando a taxa para o patamar desejável
(GREMAUD, 2005).
194
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
Recentemente o regime de bandas cambiais tem sido utilizado e consiste
na fixação de um teto e uma base para a taxa, limites nos quais a taxa é fixa, sendo
que no intervalo entre as duas “bandas” o regime é flutuante. Entretanto, assim
como ocorre em relação ao regime de câmbio fixo, o regime de bandas cambiais
também tem o inconveniente de se ter que trabalhar com uma taxa desejável.
Como o comércio internacional atinge interesses antagônicos, já que para alguns
o ideal é uma taxa valorizada e para outros uma taxa desvalorizada, fixar essa
taxa desejável é um desafio para os governantes.
5 POLÍTICA DE RENDAS
“A política de rendas refere-se à intervenção direta do governo na
formação de renda (salários, aluguéis), com o controle e congelamento de preços”
(VASCONCELLOS; GARCIA, 2005, p. 92).
A intervenção direta do governo brasileiro sobre preços e salários foi
fartamente utilizada nas décadas de 1980/1990 para combater a inflação. O
tabelamento de preços foi uma das principais armas do governo Sarney (1985 a
1990) durante o Plano Cruzado, sendo que o sucesso desta ferramenta no início da
implementação do plano era tanto que as mulheres saíam às ruas para fiscalizar
os preços, ficando conhecidas como as “fiscais do Sarney”.
Infelizmente, se no seu início o Plano Cruzado estava conseguindo
controlar a inflação, o tabelamento de preços se mostrou ineficiente no longo
prazo, devido à pressão exercida pelos empresários que adotaram uma política
de diminuição da oferta, pressionando os preços. Exemplo dessa política foi a
chamada de “Boi no pasto”, ou seja, os pecuaristas deixavam o boi gordo no
pasto e cobravam ágio para vender o produto, fazendo com que o plano perdesse
credibilidade e apoio popular.
O tabelamento ou congelamento de preços foi utilizado também por
outros governos, como no caso do governo Collor, com os planos Collor I e II e,
devido à sua ineficácia, foi perdendo cada vez mais credibilidade.
O Plano Real, lançado em 28 de fevereiro de 1994, após o fracasso de seis
planos diferentes (além dos já citados tivemos o Plano Cruzado II, Verão, Bresser)
foi bem-sucedido no combate à inflação após estas inúmeras tentativas de “ensaio
e erro” e teve, dentre as principais medidas, a instituição da Unidade Real de
Valor (URV) no dia 1º de março de 1994, que valia 1 dólar americano, pela qual os
preços dos produtos eram convertidos diariamente a esta nova unidade de valor,
de forma a excluir a inflação passada dos preços dos produtos.
195
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
Em julho de 1994 lançaram o que foi conhecida posteriormente como
“âncora cambial”, que consistia em manter o real megavalorizado em relação ao
dólar americano (inicialmente com R$ 1,00 comprava-se U$ 1,00, mas logo em
seguida, com 0,84 centavos de real, comprava-se um dólar americano).
“Com esse câmbio e com a abertura comercial, as pressões por reajuste
foram dissolvidas de forma truculenta com uma invasão avassaladora de
produtos importados” (SICSÚ, 2014, s.p.).
Não há dúvida de que o mérito do Plano Real foi ter conseguido trazer
a inflação para patamares administráveis e acabar com a chamada “inflação
inercial” das décadas de 1980/1990. Entretanto, os custos que a sociedade teve
que arcar com as medidas adjacentes à criação do real foram enormes.
A concentração de renda foi extraordinária nos anos do Plano Real: a
participação dos salários no PIB caiu de 45,1% em 1993 para 38,2% em
1999. A carga tributária aumentou 11% entre 1993 e 1999. A taxa média
de crescimento econômico foi de 2% (a mesma taxa de crescimento do
governo Dilma). No primeiro mandato de FHC, que corresponde a
aproximadamente ao período do Plano Real, foram criados apenas 824
mil empregos formais (em quatro anos) (SICSÚ, 2014, s.p.).
No âmbito da política de rendas, não se pode deixar de tratar da política
salarial, especialmente a que trata do salário mínimo. Estudo do Departamento
de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), intitulado 20 motivos para
a manutenção de ganhos reais de salários, faz algumas análises importantes a este
respeito e que têm relação direta com o crescimento econômico no longo prazo,
com distribuição de renda, que são dois dos principais objetivos de política
macroeconômica.
“Os salários no Brasil são efetivamente muito baixos. Isso por si só é
razão suficiente para que os trabalhadores e o movimento sindical busquem
permanentemente o aumento real nos salários” (DIEESE, 2015, p. 2).
Conforme podemos observar no gráfico a seguir, que relaciona o salário
mínimo de um grupo de países, o salário mínimo do Brasil, que é um importante
vetor para aumento dos salários das categorias econômicas, fica abaixo de quase
todos os países da União Europeia, Japão, América do Norte e até de países da
América Latina.
196
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
FIGURA 13 – SALÁRIO MÍNIMO EM US$ DE 2015
25.000.0
20.000.0
15.000.0
10.000.0
5.000.0
Austrália
Luxemburgo
Netherlands
Belgium
Germany
France
New Zealand
Ireland
United States
Canada
Slovenia
Korea
Israel
Spiam
Turkey
Poland
Greece
Portugal
Hungary
Slovak Republic
Estoria
CzechRepublic
Lithuaria
Costa Rica
Latvia
Chile
Colombia
Brazil
Russian Federation
México
0,0
FONTE: <http://old.operamundi.com.br/dialogosdosul/apos-defender-fim-de-universidadespublicas-banco-mundial-quer-reduzir-salario-no-brasil/13032018/>.
Acesso em: 16 ago. 2018.
A política do salário mínimo brasileira é resultado de uma campanha
iniciada em 2004 pelas centrais sindicais, que realizaram três marchas a Brasília
para pressionar Executivo e Legislativo. Em 2007, foi criada uma política
permanente, que tinha como critérios reajuste pela inflação do ano anterior mais
aumento real conforme a variação do Produto Interno Bruto (PIB) de dois anos
anteriores, além de antecipação da data-base de revisão a cada ano, até chegar a
janeiro, o que aconteceu em 2010 (REDEBRASILATUAL, 2015, s.p.).
Desde 2012, por meio da Lei nº 12.382/11, foi estabelecida uma política de
valorização do salário mínimo nacional, que consiste na concessão de um reajuste
anual baseado na variação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC),
acrescido da taxa de crescimento real do PIB apurada dois anos antes. A Medida
Provisória nº 672/2015 manteve a mesma regra para o período de 2016 a 2019.
Por meio desta política, desde 2003 foram concedidos aumentos reais ao
salário mínimo, como podemos observar a seguir:
197
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
FIGURA 14 – AUMENTOS REAIS DO SALÁRIO MÍNIMO NO BRASIL (2003 A 2018)
O MÍNIMO E A INFLAÇÃO
Aumento real desde 2003 (em%)
13,04%
8,23%
7,59%
5,79%
6,02%
5,10%
4,03%
2,46%
2,64%
1,23%
1,16%
1,19%
0,36%
0,37%
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
2012
2013
2014
2015
2016
-0,10%
2017
-0,25%
2018
FONTE: DIEESE (2018, s.p.)
Infelizmente, nos três últimos anos, a queda do PIB tem interferido nos
aumentos reais, sendo que em 2018 sequer o INPC foi concedido na sua integralidade
(o valor apurado foi de 8,78% e o aumento concedido apenas de 8,41%).
Em tempos de crise, os trabalhadores são os primeiros a sentir os seus
efeitos, pois de acordo com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos
Socioeconômicos:
As empresas já vêm ajustando seus custos com mão de obra via redução
do quadro de pessoal e também através do rebaixamento salarial por
meio da enorme rotatividade que caracteriza o mercado de trabalho
no Brasil. Em períodos de crise, inclusive, aumenta a diferença entre
a média dos salários de demissão e de contratação. O achatamento
do salário real, decorrente da reposição salarial abaixo da inflação,
irá agravar ainda mais a situação da economia, na medida em que
contribui para um desaquecimento maior do mercado interno. Em um
cenário em que a economia não cresce, o governo reduz os seus gastos,
a taxa de desemprego aumenta. Se o salário não tiver ganho real, a
conjugação desses fatores levará a uma redução ainda mais forte no
consumo, conduzindo a economia a uma espiral negativa, puxada pela
redução da demanda agregada (DIEESE, 2015, p. 2).
198
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
De acordo com toda a teoria macroeconômica de determinação da renda
keynesiana, sabemos da importância do nível de emprego e da massa salarial
para estimular a demanda agregada da economia.
A aplicação do ganho real nos salários possibilita a ampliação do nível
de rendimentos das famílias, que tem sido o pilar da melhoria da
distribuição de renda no Brasil nos últimos anos. Segundo a Pesquisa
Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) realizada pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2013, no Brasil, 74,4%
da renda familiar advém do trabalho. Neste contexto, uma melhoria
dos salários reais exerce efeito imediato sobre o nível de bem-estar
das famílias, com efeito sobre saúde, educação e até mesmo sobre a
produtividade do trabalho (DIEESE, 2015, p. 3).
Temos no Brasil um mercado consumidor de 200 milhões de pessoas.
Assim, se aumenta o poder de compra da maioria da população (que são os
trabalhadores), toda a economia pode ser beneficiada, a exemplo do que ocorreu
quando do estouro da crise financeira mundial de 2008. Com um mercado
interno aquecido, os efeitos negativos da crise não foram tão fortemente sentidos
internamente.
“No atual contexto de persistência da crise mundial, nosso vasto mercado
interno é dos mais valiosos ativos que o país possui. Ao invés de reduzi-lo, é
fundamental ampliá-lo” (DIEESE, 2015, p. 4).
Enfim, acreditamos que no âmbito da política de rendas, além de manter
uma política de reajuste do salário mínimo, o governo deveria também adotar
medidas que visem ao aumento do poder de compra de todos os trabalhadores, o
que contribuiria para uma maior distribuição de renda e crescimento econômico.
199
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
LEITURA COMPLEMENTAR
Estrutura tributária e a qualidade dos gastos públicos
Está em voga a discussão acerca da reforma tributária no Brasil, e a
questão que emerge é a seguinte: qual seria, de fato, a reforma necessária? Devese assinalar que, embora o Brasil não tenha a maior carga tributária do mundo,
a parcela paga pelos contribuintes se alinha à proporção paga em muitos países
desenvolvidos. Em termos de valores, no Brasil, esse montante representa 32,6% do
PIB, enquanto, nos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento
Econômico (OCDE), a média percentual é de 34%. Em países como Suécia, França,
Bélgica e Finlândia, essa carga ultrapassa 43%. Na Dinamarca, chega a 45,9% do
PIB, sendo essa a maior proporção entre todos os países (estatísticas de 2015).
Aliado ao fato de a carga tributária brasileira ser alta, outro problema, que
é anterior a esse, causa maior desalento – a “percepção de retorno” que o cidadão
tem em relação à quantia de tributo que paga é muito baixa. Nem é preciso citar
estatísticas para se convencer de que há algo de muito errado em áreas vitais
da sociedade, como saúde, educação e segurança. E, ao nos compararmos com
países que possuem a mesma carga tributária, ou até menor, podemos perceber o
quão grave é a situação. Podemos citar como exemplos: Suíça (27,7%), Alemanha
(37,1%), Estados Unidos (26,2%) e Canadá (32,0%). Convenhamos, esses
países se encontram entre os dez primeiros colocados no ranking do Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH) enquanto o Brasil ocupa a 79ª posição, de acordo
com dados de 2015 do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento
(PNUD). Vale lembrar que esse indicador remete ao desempenho de três óticas –
renda, educação e longevidade.
Ademais, outra característica da carga tributária brasileira que nos parece
perversa é a forma que esses impostos incidem sobre a população. Enquanto na
maior parte dos países desenvolvidos os impostos incidem mais sobre a renda
(diretos) do que sobre o consumo (indiretos), no Brasil, o maior percentual (quase
50%) recai sobre o consumo. Assim, a parcela menos favorecida da população acaba
arcando com o maior peso, já que boa parte de sua renda é destinada ao consumo de
bens e serviços. Deste modo, o Brasil parece seguir na contramão, como podemos
observar na tabela a seguir, que apresenta dados de alguns países selecionados.
200
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
Composição e representatividade da carga tributária (%) - 2015
Países
Renda
Patrimônio
Consumo
Outros
Carga tributária (% do PIB)
Alemanha
31,2
2,9
27,8
38,1
37,1
Bélgica
35,7
7,8
23,8
32,7
44,8
Dinamarca
63,1
4,1
31,6
1,2
45,9
EUA
49,1
10,3
17,0
23,6
26,2
Japão
31,2
8,2
21,0
39,6
30,7
Noruega
39,4
2,9
30,4
27,3
38,3
Suécia
35,9
2,4
28,1
33,6
43,3
Brasil
21,0
4,4
49,7
24,9
32,6
FONTE: Reforma Tributária Solidária (2018): OECD Revenue Statistics 2017.
E os problemas não param por aqui. A complexidade da estrutura
tributária do país também é passível de críticas. Enquanto a maioria dos países
adota um imposto único, chamado Imposto sobre Valor Agregado (IVA), no
Brasil, temos 5 impostos/contribuições sobre o consumo: Imposto sobre Produtos
Industrializados (IPI), Imposto sobre Operações Relativas à Circulação de
Mercadorias e Serviços (ICMS), Imposto sobre Serviços (ISS), Contribuição para
os Programas de Integração Social e de Formação do Patrimônio do Servidor
Público (PIS/Pasep) e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social
(Cofins). E, para contribuir com a confusão, as regras para o IPI e o ICMS variam de
um estado para outro, o que culmina na “guerra fiscal” entre os entes federativos.
Efetivamente, segundo dados do Instituto Brasileiro de Planejamento e
Tributação (IBPT), o sistema tributário brasileiro conta com 63 tributos em vigor
e 97 obrigações acessórias (conjunto de documentos, registros e declarações
utilizadas para o cálculo dos tributos). Essa complexidade, sabemos, é muito
desfavorável para o ambiente de negócios, pois, além de onerar as empresas com
estruturas especializadas no assunto, contribui para fraudes e evasão fiscal. De
acordo com o IBPT, as empresas precisam seguir cerca de 3.790 normas distintas,
que mudam com frequência, para estarem em dia com suas obrigações, gerando
muita complexidade e insegurança no ambiente de negócios.
201
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
Um dado que pode confirmar esse cenário adverso é o Ease of Doing
Business – um indicador do Banco Mundial que compara 190 economias de
acordo com a facilidade de pequenas e médias empresas domésticas em fazerem
negócios. Nesse ano, o desempenho do Brasil neste indicador é de 56,4, ocupando
a 125ª posição no ranking, atrás de nossos vizinhos Paraguai (108ª), Argentina
(117ª) e Uruguai (94ª). Outra estatística negativa é a do tempo gasto pelas empresas
para cumprir as obrigações tributárias, indicador verificado pelo Banco Mundial
(2017). De acordo com essa estatística, no Brasil, as empresas gastam cerca de 1.958
horas em média, por ano, para cumprir essas exigências, dado que coloca o país
em último lugar no ranking. A Bolívia ocupa o penúltimo lugar, com 1.025 horas
gastas. Na Argentina, o tempo médio é de 311,5 horas. Já nos países da OCDE, o
tempo é de 160,7 horas por ano, em média, o que representa 8% do tempo gasto
no Brasil. Esse ambiente, logicamente, prejudica a nossa competitividade.
Em junho deste ano, aconteceu em São Paulo o Fórum Internacional Tributário
(FIT), com o intuito de discutir temas relacionados à Reforma Tributária. Estiveram
presentes 20 palestrantes de 14 países, que partilharam os avanços e retrocessos em
suas nações no que se refere à estrutura tributária. Na ocasião, foi lançado o livro
“A Reforma Tributária Necessária: diagnóstico e premissas”, ligado ao movimento
“Reforma Tributária Solidária”. Nas discussões, ficou evidente a insatisfação dos
conferencistas quanto à estrutura tributária no Brasil, principalmente, no que tange a
sua característica regressiva e injusta. No entanto, algo que não se pontuou no debate
foi o mau uso do dinheiro público no contexto brasileiro.
Neste sentido, vale destacar alguns traços interessantes da estrutura
tributária da Dinamarca e da Suécia, expostos pelos palestrantes Michael Klitgaard
e Asa Hansson. Eles enfatizaram a consciência e a satisfação da população em ser
contribuinte. Mesmo se tratando das cargas tributárias mais elevadas do mundo,
existe consenso da população e, na Dinamarca, uma parcela da população acredita
que a carga tributária deveria ser ainda maior. Não nos surpreende constatar que
nesses países a estrutura de impostos é progressiva e as alíquotas são amplas e
uniformes, o que torna a gestão mais fácil e menos suscetível a fraudes. Outro
traço marcante nessas economias é o alto compliance e a certeza de que cada um
cumpre o seu papel.
Agora, permanece a questão: qual seria, de fato, a reforma necessária no
Brasil? Após percorrermos esse panorama, acreditamos ser consenso de que a
reforma precisa contemplar, pelo menos, três pontos básicos: simplificação, redução
e equidade. Mas, no intuito de ir além desses passos e do que já foi discutido,
levantamos duas outras questões: como são alocados os recursos públicos? Quais
os custos da ineficiência e dos desvios desses recursos para a população?
Diante desses questionamentos, os pontos básicos para a reforma parecem
ficar em segundo plano, pois a discussão sobre a redução da carga tributária
ou a simplificação da estrutura dos tributos parece não importar ao cidadão se
os recursos carreados aos cofres públicos não cumprem a sua finalidade e não
chegam ao seu destino.
202
TÓPICO 1 | INSTRUMENTOS DE POLÍTICA MACROECONÔMICA
Portanto, existem problemas mais urgentes a serem discutidos antes
de se propor uma reforma tributária, baseando-se nos passos que, à primeira
vista, parecem ser coerentes. E, talvez, dentre esses problemas, se destaquem a
ineficiência e os desvios de recursos, que são combatidos com ética e eficiência
na gestão.
Corroborando esse cenário, o Índice de Retorno de Bem-Estar à Sociedade
(Irbes), calculado pelo IBPT, mostra que, em 2017, pelo sexto ano consecutivo,
o Brasil é o país com pior retorno de bem-estar à população nas esferas federal,
estadual e municipal. Esse indicador leva em consideração a carga tributária em
relação ao PIB e ao IDH, e o resultado se baseia na comparação do Brasil com os
30 países que possuem as maiores cargas tributárias do mundo. Essa realidade é
inaceitável.
Dito isto, nas discussões acerca dos problemas brasileiros, parecenos que a urgência recai sobre os temas referentes à gestão e ao controle dos
recursos públicos, a fim de que possamos analisar os problemas pela “raiz”. Ao
aprimorarmos os mecanismos de controle e de alocação de recursos, buscando
maior eficiência e eficácia dos gastos, uma consequência certamente será a
melhoria da percepção de retorno à sociedade.
Não queremos entrar no mérito das discussões sobre qual o tamanho
do governo ou da máquina pública, mas, sim, questionar como os recursos
arrecadados são aplicados. Na realidade, ao se comparar, por exemplo, os gastos
com educação no Brasil, os percentuais em relação ao PIB estão equiparados aos
de economias desenvolvidas. Esses gastos totalizaram 4,9% do PIB brasileiro
enquanto a média dos países da OCDE é de 5,2% do PIB (dados de 2015). No
entanto, apesar desse nível de investimento, o país continua entre os últimos
colocados no ranking do Pisa – entre 70 países, o Brasil ficou na 63ª posição em
ciências, 59ª em leitura e 66ª em matemática (dados de 2016). Assim, percebe-se
que o problema maior não reside, sempre, na falta de verba e, sim, como ela é
alocada. É lamentável observar que os problemas de gestão, aliados à malversação
dos recursos, parecem se sobrepor a questões, como o tamanho do orçamento ou
da carga tributária.
Para finalizar, recordamos as palavras do Prêmio Nobel em Economia,
Milton Friedman, segundo o qual existem quatro maneiras de se gastar dinheiro:
1) Gastar o seu dinheiro com você mesmo, situação em que você procurará o
menor custo e a máxima qualidade; 2) Gastar o seu dinheiro com os outros, caso
em que você buscará o menor custo e a mínima qualidade; 3) Gastar o dinheiro
dos outros com você, onde seu objetivo será o maior custo e a máxima qualidade;
4) Enfim, gastar o dinheiro dos outros com os outros, situação em que você não
terá nenhuma preocupação com custo e nem com a qualidade. Tendo em vista as
estatísticas referentes ao bem-estar da população, parece-nos que os governos, de
modo geral, se utilizam mais da quarta maneira de se gastar dinheiro.
FONTE: BREDA, Zulmir Ivânio. Estrutura tributária e a qualidade dos gastos públicos. 2018. Disponível
em: <http://www.crc-ce.org.br/2018/08/etqdgp/>. Acesso em: 29 ago. 2018.
203
RESUMO DO TÓPICO 1
Neste tópico, você aprendeu que:
• Para intervir na economia, o governo lança mão de políticas macroeconômicas,
que são as políticas monetária, fiscal, comercial e cambial e de rendas.
• A política monetária visa intervir na quantidade de moeda em circulação,
aumentando ou diminuindo a oferta de acordo com a conjuntura econômica.
• Uma política monetária restritiva irá diminuir a quantidade de moeda em
circulação, o que irá elevar a taxa de juros, tendo efeitos sobre o consumo e
a renda e é basicamente utilizada para controlar a inflação ou excessos de
demanda.
• Uma política monetária expansionista, ao contrário, irá aumentar a quantidade
de moeda em circulação, o que levará a uma diminuição da taxa de juros,
podendo estimular o consumo, a renda e o emprego.
• Para executar a política monetária o governo se utiliza de instrumentos, que
são: controle direto da quantidade de dinheiro em circulação; operações no
mercado aberto; fixação da taxa de reserva; fixação da taxa de redesconto e;
controles seletivos de crédito.
• A política fiscal diz respeito à arrecadação e aos gastos do governo e divide-se,
portanto, em política tributária e de gastos.
• A política tributária consiste na fonte de receitas públicas e se dá por meio da
arrecadação de impostos, taxas e contribuições.
• O governo desempenha três funções básicas na economia: alocativa, distributiva
e estabilizadora.
• A função estabilizadora corresponde ao manejo da política econômica para
tentar garantir o máximo de emprego, crescimento econômico, com estabilidade
de preços.
• Quanto à função alocativa, tem-se a ação do governo complementando a ação
do mercado no que diz respeito à alocação de recursos na economia.
• A função distributiva corresponde à função do governo em arrecadar impostos
(reduzir a renda) de determinadas classes sociais ou regiões, para transferi-los
a outras.
204
• Quanto à política fiscal e sua interação com a economia, o governo pode lançar
mão de uma política expansionista ou restritiva.
• Se a política fiscal for restritiva, poderá efetuar um aumento dos tributos ou
uma diminuição dos gastos do governo, que pressionará o consumo agregado
e a renda nacional, podendo reverter situações de inflação ou excesso de
demanda.
• Para uma política fiscal expansionista, poderá haver um aumento dos gastos
(investimentos, gastos autônomos do governo), que estimulará o aumento do
consumo, da renda e da produção, podendo reverter situações de recessão
econômica.
• A política comercial se refere aos instrumentos que o governo dispõe para
incentivar as exportações e/ou estimular e desestimular as importações.
• A política cambial diz respeito à atuação do governo sobre a taxa de câmbio.
• O Brasil já teve períodos em que o regime de câmbio era fixo, outros em que
o mesmo era flutuante e, ainda, períodos em que o governo adotou regime de
bandas cambiais.
• A política de rendas refere-se à intervenção direta do governo na formação de
renda (salários, aluguéis), com o controle e congelamento de preços.
• O controle e congelamento de preços foi muito utilizado no Brasil como
instrumento de combate à inflação, mas tal política não obteve resultados
muito positivos.
• A política salarial, principalmente de valorização do salário mínimo, tem se
constituído numa ferramenta de distribuição de renda importante para o Brasil,
devido à concessão de aumentos reais ao salário mínimo, aumentando assim o
poder de compra de grande parte dos brasileiros e contribuindo também para
a valorização dos salários das categorias econômicas remuneradas com salário
normativo (que é aquele estabelecido nas convenções coletivas entre sindicatos
patronais e de trabalhadores).
205
AUTOATIVIDADE
1 Explique, por meio de um exemplo, como seria a execução simultânea das
funções alocativa, distributiva e estabilizadora do governo.
2 Com relação à oferta monetária e à atividade econômica, de acordo com a
visão keynesiana, é correto afirmar que:
a) ( ) Uma redução na oferta monetária provoca uma elevação na taxa de
juros; essa elevação na taxa de juros aumenta o nível de investimento;
esse aumento no investimento provoca uma diminuição da renda e do
emprego.
b) ( ) Um aumento na oferta monetária provoca uma diminuição na taxa de
juros; essa diminuição na taxa de juros reduz o nível de investimento;
essa redução no investimento provoca um aumento da renda e do
emprego.
c) ( ) Um aumento na oferta monetária provoca uma diminuição na taxa de
juros; essa diminuição na taxa de juros aumenta o nível de investimento;
esse aumento no investimento provoca uma diminuição da renda e do
emprego.
d) ( ) Uma redução na oferta monetária provoca uma elevação na taxa de
juros; essa elevação na taxa de juros reduz o nível de investimento; essa
redução no nível de investimento provoca uma diminuição da renda e
do emprego.
e) ( ) Nenhuma das alternativas anteriores.
3 De modo geral, há um consenso entre os economistas de que são quatro as
principais metas perseguidas pelos governos quando da execução de suas
políticas macroeconômicas. Essas metas são:
a) ( ) Manutenção de um alto nível de emprego, manutenção da estabilidade
dos preços, conquista de uma distribuição da renda mais justa e
equilibrada e estímulo ao crescimento econômico.
b) ( ) Manutenção de um alto nível de emprego, manutenção da oferta da
moeda; estabilidade dos preços, conquista de uma distribuição da
renda mais justa e equilibrada e estímulo ao crescimento econômico.
c) ( ) Manutenção de um alto nível de investimentos sociais, manutenção da
estabilidade dos preços, conquista de uma distribuição da renda mais
justa e equilibrada e estímulo ao crescimento econômico.
d) ( ) Manutenção de um alto nível de emprego, manutenção da estabilidade
dos preços, conquista de maior inserção do país no exterior, estímulo
ao crescimento econômico.
e) ( ) Nenhuma das alternativas anteriores.
206
4 São medidas contracionistas de política monetária:
a) ( ) Venda de títulos públicos; redução da taxa dos depósitos compulsórios;
aumento da taxa de juros de redesconto; aumento da taxa de juros
básica (SELIC).
b) ( ) Venda de títulos públicos; elevação da taxa dos depósitos compulsórios;
aumento da taxa de juros de redesconto; aumento da taxa de juros
básica (SELIC).
c) ( ) Compra de títulos públicos; elevação da taxa dos depósitos
compulsórios; aumento da taxa de juros de redesconto; aumento da
taxa de juros básica (SELIC).
d) ( ) Venda de títulos públicos; elevação da taxa dos depósitos compulsórios;
redução da taxa de juros de redesconto; aumento da taxa de juros
básica.
e) ( ) Nenhuma das alternativas anteriores.
5 Se o Banco Central brasileiro decidir diminuir a oferta monetária por meio
de operações de mercado aberto, o que terá de fazer? Assinale a alternativa
CORRETA:
a)
b)
c)
d)
e)
(
(
(
(
(
)
)
)
)
)
Comprar títulos públicos.
Aumentar os tributos.
Aumentar os depósitos à vista.
Diminuir os depósitos à vista.
Vender títulos públicos.
207
208
TÓPICO 2
UNIDADE 3
A CURVA IS-LM E AS POLÍTICAS MONETÁRIA E FISCAL
1 INTRODUÇÃO
Já estudamos as políticas macroeconômicas, por isso temos condições de
voltar à análise do modelo de determinação de renda, incorporando nesta análise
a curva IS e a condição de equilíbrio, a curva LM e a condição de equilíbrio para,
finalmente, interligar as duas curvas (lado real e monetário da economia).
Após ter efetuado esta análise, introduziremos os efeitos das políticas
fiscal e monetária sobre as curvas IS-LM. O modelo IS-LM trabalha as principais
características da macroeconomia, juntando a teoria keynesiana com a teoria
clássica, formando, então, o que chamamos de síntese neoclássica, ou seja,
quando tratarmos de síntese neoclássica, estaremos falando do modelo IS-LM,
que faz a junção do mercado de bens e serviços com o mercado monetário.
Antes de abordar os modelos IS e LM separadamente, é preciso fazer
algumas considerações sobre o modelo keynesiano de determinação da renda.
No modelo simples de determinação de renda, as intervenções do governo
só afetam o lado real da economia (composto pelo mercado de bens e serviços),
sendo que essas intervenções no lado real não afetariam o lado monetário (moeda
e ativos financeiros, taxas de juros e nível de preços).
O modelo keynesiano generalizado (também conhecido como síntese
neoclássica) admite que intervenções do governo no lado real da economia irão
provocar alterações na taxa de juros, porque quando há aumento de gastos, haverá
aumento do produto/renda, gerando aumento do consumo, que levará então a
um aumento da demanda de moeda para transação, o que afetará a variável taxa
de juros e o nível de preços da economia. Mesmo efetuando política fiscal, sem
interferir ao mesmo tempo com uma política monetária, haverá alterações no
produto e na renda da economia e, consequentemente, no mercado monetário.
209
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
Precisamos fazer uma consideração antes de prosseguir. Você poderia
estar se perguntando: Mas o mercado real não incorpora o mercado de fatores
produtivos? Nossa resposta é sim. Entretanto, quando analisamos o modelo ISLM temos que o mercado de fatores (e neste tratamos principalmente do fator
trabalho) aparece de forma implícita junto ao mercado de bens e serviços. Isso
porque supõe-se que se o mercado de bens e serviços se altera, consequentemente
haverá alterações no mercado de fatores. Por exemplo, se houver aumento do
produto nacional, esse aumento está amparado pelo aumento na utilização dos
fatores produtivos, ou seja, podemos concluir que o mercado de fatores é uma
variável determinada pelo mercado de bens e serviços.
Passemos, então, à análise das curvas IS e LM.
2 A CURVA IS E A CONDIÇÃO DE EQUILÍBRIO
Quando abordamos o equilíbrio do lado real da economia, estamos
nos referindo ao mercado de bens e serviços, sendo que o mercado de fatores
produtivos fica atrelado ao mercado de bens e serviços, pois um funciona em
consequência de outro, como já explicamos.
Assim, partimos nossa análise de uma economia fechada e sem
governo. Lembramos que numa economia fechada e sem governo o equilíbrio
macroeconômico é dado por: produto ≡ despesa ≡ renda. Nesse modelo, temos
que o produto da economia é dado por:
Y = C + I, em que:
Y = produto;
C + I = despesa (consumo das famílias + investimento das empresas).
A renda é dada por:
Y = C + S, em que:
Y = renda;
C + S = renda destinada ao consumo ou à poupança.
Assim, se igualarmos produto (C + I) e renda (C + S), teremos:
C+I=C+S
Efetuando a operação (C – C + I = S), teremos que:
I=S
Dessa relação de equilíbrio no mercado de bens e serviços temos que
poupança é igual a investimento, formando a curva I-S (investment = savings).
210
TÓPICO 2 | A CURVA IS-LM E AS POLÍTICAS MONETÁRIA E FISCAL
Vamos entender graficamente como se comporta o equilíbrio no mercado
de bens e serviços, que é dado pela curva IS:
GRÁFICO 1 – A CURVA IS
r
r1
IS
Y1
Y
FONTE: A autora
Temos a taxa real de juros (r) no eixo vertical e a renda agregada (Y) no
eixo horizontal do gráfico. A intersecção das duas variáveis forma a curva IS.
Note que quando há um aumento da taxa de juros (r) de r1 para r2 diminuem
os investimentos produtivos, o que vai gerar uma redução na renda de Y1 para Y2
e, consequentemente, na produção, conforme demonstra o gráfico seguinte:
GRÁFICO 2 – ALTERAÇÃO NO EQUILÍBRIO DA CURVA IS DEVIDO AO AUMENTO DA TAXA
DE JUROS
r
r2
r1
IS
Y2
Y1
FONTE: A autora
211
Y
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
Assim, o investimento passa a ser endógeno ao modelo e também é a
variável mais importante na formação da curva IS, sendo que a poupança passa a
ser uma variável determinada pela renda e pelos investimentos. Dessa afirmação
podemos deduzir que a relação entre renda e taxa de juros é inversa em função
dos investimentos.
2.1 FATORES QUE AFETAM A INCLINAÇÃO E
DESLOCAMENTO DA CURVA IS
Mudanças na taxa de juros e no nível de renda provocam movimentos ao
longo da curva IS porque r e Y são variáveis endógenas ao modelo.
Quando ocorrerão, então, deslocamentos da curva IS para cima ou para
baixo? Para entendermos essas mudanças, precisamos incorporar na nossa análise
o governo e o setor externo, que se tornam demandantes de bens e serviços e de
ativos financeiros.
A curva IS se desloca para cima ou para baixo quando houver variações
exógenas, como aumento ou diminuição dos gastos do governo, variação na
riqueza, mudanças nas expectativas dos agentes econômicos, bem como os
resultados líquidos do setor externo (exportações menos importações) que irão
deslocar a curva de IS1 para IS2 (direita ou esquerda).
GRÁFICO 3 – DESLOCAMENTOS DA CURVA IS
r
r1
IS
IS1
IS2
Y
Y1
FONTE: A autora
212
TÓPICO 2 | A CURVA IS-LM E AS POLÍTICAS MONETÁRIA E FISCAL
Como vimos anteriormente, o governo interfere na economia por meio
de políticas econômicas, sendo que aquelas que terão maior impacto sobre o lado
real e monetário são as políticas fiscal e monetária.
Assim, medidas de política fiscal do governo, que irão ter impactos no
mercado de bens e serviços (via investimentos e tributos), afetarão a curva IS,
devido à relação existente entre investimento e taxa de juros e, consequentemente,
afetarão também a curva LM, como veremos adiante.
No que se refere à inclinação da curva IS, dois fatores afetam essa inclinação:
a sensibilidade do investimento em relação à taxa de juros e a propensão marginal
a consumir. Mas que isso significa?
No que se refere à sensibilidade do investimento em relação à taxa de juros,
vimos nas unidades anteriores que uma das variáveis que afetam o investimento
é a expectativa dos agentes econômicos em relação à variação nessa taxa, pois
taxas de juros muito elevadas inibem o investimento produtivo e taxas de juros
mais baixas estimulam o investimento. Assim, quanto mais sensíveis os agentes
forem às variações na taxa de juros (para baixo ou para cima), maior ou menor
será a inclinação da curva IS.
Quanto à propensão marginal a consumir, esta mede a variação no
consumo decorrente na variação na renda. Assim, quanto maior a propensão
marginal a consumir de um país, maior será o investimento, que terá influência
sobre a inclinação da curva IS.
3 A CURVA LM E A CONDIÇÃO DE EQUILÍBRIO
Já vimos que existem no mercado dois fluxos: real e monetário. No
item 2 deste tópico, vimos a condição de equilíbrio no mercado real (de bens
e serviços), demonstrada pela curva IS. Já do lado monetário (moeda e títulos),
temos a curva LM.
A curva LM (do inglês Liquidity Money) representa o equilíbrio no
mercado de ativos. Para facilitar a exposição, vamos considerar que
existam dois tipos de ativos na economia, nos quais os indivíduos
alocam sua riqueza: moeda e títulos. A característica do primeiro é
possuir liquidez absoluta, mas que não rende qualquer juro, isto é, sua
posse não dá um rendimento ao detentor. Já os títulos rendem juros,
mas possuem uma liquidez inferior à da moeda, isto é, existe um custo
para transformá-lo em poder de compra (LOPES; VASCONCELLOS,
2008, p. 191).
Fácil entender, não? Papel-moeda e cartões de crédito e débito garantem
a você liquidez absoluta, ou seja, permitem que você pague suas contas sem que
precise fazer nenhuma operação bancária.
213
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
Já os títulos (caderneta de poupança, aplicações financeiras, ações, títulos
públicos) não têm liquidez absoluta, porque para utilizá-los você precisa primeiro
transformá-los novamente em moeda, mas em compensação lhe permitem obter
um ganho financeiro por meio dos juros (ou do lucro no caso das ações).
A curva LM mede o equilíbrio entre demanda e oferta de ativos financeiros:
GRÁFICO 4 – A CURVA LM
r
LM
r1
Y
Y1
FONTE: A autora
A oferta de moeda é uma variável exógena à economia, ela é determinada
pelo governo, por meio da Política Monetária, como já vimos. Portanto, mudanças
na taxa de juros e no nível de renda provocam movimentos ao longo da curva LM
porque r e Y são variáveis endógenas ao modelo. Entretanto, é a demanda por
moeda que vai determinar o formato da curva LM.
Você recorda quais são motivos para demandar moeda? Vamos sintetizar
no quadro a seguir:
QUADRO 3 – RELAÇÃO ENTRE DEMANDA DE MOEDA, RENDA E TAXA DE JUROS
Motivo
Variável determinante
Relação variável X demanda
de moeda
Transação
Renda
Direta
Precaução
Renda
Direta
Especulação
Taxa de juros
Inversa
FONTE: Adaptado de: <https://www.youtube.com/watch?v=ieNNjk_2AC8>.
Acesso em: 16 ago. 2018.
214
TÓPICO 2 | A CURVA IS-LM E AS POLÍTICAS MONETÁRIA E FISCAL
É fácil entender a relação direta existente entre demanda de moeda para
transação e precaução, não é mesmo?
Se aumenta a renda disponível, os agentes econômicos poderão consumir
mais, as empresas poderão investir mais, bem como poderá haver uma reserva de
moeda maior para utilizar em situações imprevistas, como acidentes, viagens etc.
Com relação à demanda especulativa de moeda, esta ocorre para aproveitar
oportunidades de investimento (títulos, imóveis etc.). Portanto, há uma relação
inversa com a taxa de juros. A moeda é um ativo que não rende juros, mas possui
valor estável. Os “títulos” pagam rendimento, mas seu valor oscila em função
de mudanças da taxa de juros. Quando os juros sobem, o preço dos títulos cai.
Quando os juros estão baixos e um investidor espera (especula) que subirão logo,
ele vende títulos e demanda moeda, visando preservar o valor de seu patrimônio
(NOGAMI; PASSOS, 2003).
3.1 FATORES QUE AFETAM A INCLINAÇÃO E O
DESLOCAMENTO DA CURVA LM
Vimos que alterações na renda e na taxa de juros irão provocar alterações
no equilíbrio entre demanda e oferta de moeda na curva LM. Mas existem fatores
exógenos que farão com que a curva LM se desloque para a direita ou para a
esquerda, a exemplo do que ocorre com a curva IS, como indica o quadro seguinte:
QUADRO 4 – ALTERAÇÕES NA DEMANDA E NA OFERTA DE MOEDA E DESLOCAMENTOS
DA CURVA LM
Alteração de variáveis exógenas
Política Monetária (oferta de moeda)
Alterações na demanda de moeda
provocadas por mudança no
comportamento dos agentes
econômicos
Deslocamento da LM
Expansiva (aumento da
oferta de moeda)
Para a direita e para baixo
Restritiva (redução da
oferta de moeda)
Para a esquerda e para cima
Redução na demanda de
moeda
Para a direita e para baixo
Aumento na demanda
de moeda
Para a esquerda e para cima
FONTE: Adaptado de: <https://www.youtube.com/watch?v=ieNNjk_2AC8>.
Acesso em: 16 ago. 2018.
Sendo a oferta de moeda uma variável determinada pelo governo, por
meio da política monetária, este pode fazer com que a curva LM se desloque
para a direita ou para a esquerda, com a finalidade de intervir na conjuntura
econômica do país, visando à estabilidade de preços, crescimento econômico etc.
215
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
Assim, quando aumenta a oferta monetária, toda a curva LM se deslocará
para a direita e para baixo e o inverso ocorrerá quando houver diminuição da
oferta monetária, como é demonstrado no gráfico:
GRÁFICO 5 – DESLOCAMENTOS DA CURVA LM
r
LM2
LM
LM1
r1
r
Y*
Y*1
Y
FONTE: A autora
No que se refere à inclinação da curva LM, esta será determinada pela
elasticidade da demanda de moeda em relação à renda e à taxa de juros.
Quanto maior a elasticidade da demanda da moeda em relação à
renda, maior será a inclinação da curva LM, uma vez que uma pequena
variação na renda levará a uma grande expansão na demanda de
moeda, exigindo uma maior elevação da taxa de juros para compensála. Por outro lado, quanto maior a elasticidade de demanda de moeda
em relação à taxa de juros, menor será a inclinação. Se a demanda
de moeda for muito sensível à taxa de juros, qualquer variação nesta
exigirá uma mudança significativa na renda para compensá-la; ou
inversamente, qualquer alteração no nível de renda exigirá uma
pequena mudança na taxa de juros, para manter o mercado monetário
em equilíbrio (LOPES; VASCONCELLOS, 2008, p. 194).
4 A CURVA IS-LM: INTERLIGANDO O LADO REAL E
MONETÁRIO
Analisamos as curvas IS e LM separadamente, agora vamos interligá-las, de
modo a entendermos como as duas curvas se relacionam. Desta forma, o lado real
e o lado monetário da economia estarão interligados, como veremos na sequência.
216
TÓPICO 2 | A CURVA IS-LM E AS POLÍTICAS MONETÁRIA E FISCAL
Para prosseguirmos em nossos estudos, primeiro precisamos conhecer
as hipóteses do modelo IS-LM, que de acordo com Vasconcellos (2014) são as
seguintes:
a) Economia com desemprego de recursos (ou seja, com capacidade ociosa e mão
de obra desempregada).
b) Preços constantes.
c) Decorre de “a” e “b”: políticas de crescimento levam a aumento da produção,
e não de preços.
d) Princípio da Demanda Efetiva: é a Demanda Agregada que determina a renda
de equilíbrio (a Oferta Agregada é “passiva”).
e) Decorre de “b”: todas as variáveis expressas em termos reais (“deflacionadas”).
f) Decorre de “e”: taxa nominal de juros (i) = taxa real de juros (r).
Observe que estas hipóteses são importantes e precisam estar bem
entendidas para compreendermos plenamente o Modelo IS-LM.
Como vimos na Unidade 2, no modelo keynesiano de determinação da
renda se refuta a teoria de Say (de que a oferta cria a própria procura), o que anula
a teoria do equilíbrio geral (de que a economia sempre tenderá ao equilíbrio entre
oferta e demanda, mesmo sem qualquer interferência do governo).
Neste modelo os preços são constantes porque não há razão para os
empresários elevarem os preços se estão com fatores desempregados. Qualquer
estímulo será respondido com um aumento da produção, sem elevar os preços.
Se os preços são constantes, não há inflação e, consequentemente, as taxas
de juros consideradas são sempre as reais (r) e não nominais (i), assim como todas
as demais variáveis consideradas no modelo.
De acordo com Lopes e Vasconcellos (2008, p. 187, grifo do original):
No modelo IS-LM (também conhecido como Análise Hicks-Hansen),
incorporamos o mercado de ativos e a determinação da taxa de juros à
análise, com esta passando a influir na determinação da renda através
do investimento. Nesse modelo, temos a determinação simultânea da
taxa de juros e da renda que equilibram o mercado de bens e de ativos.
Constitui-se, portanto, um modelo de equações simultâneas.
O que isso significa? Bem, primeiro podemos perceber a importância
atribuída ao investimento para a determinação da renda nacional. Esta percepção
contraria a teoria clássica de que a oferta cria sua própria demanda e, portanto,
determina a renda nacional.
217
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
Em segundo lugar, atribui papel fundamental à taxa de juros, que vai
determinar o investimento, sendo este grande impulsionador da renda nacional.
Lopes e Vasconcellos (2008, p. 188) demonstram da seguinte forma a
estrutura lógica deste modelo de equações simultâneas:
FIGURA 15 – ESTRUTURA DO MODELO IS-LM
ESTRUTURA LÓGICA DO MODELO
Mercado de Ativos
Taxa
Oferta e demanda
de moeda
de juros
Mercado de
Bens e Serviços
Produto Demanda
Agregada
Política
monetária
Renda
Política fiscal
FONTE: Lopes e Vasconcellos (2008, p. 188)
Vejamos como interpretar esta demonstração. Como vimos anteriormente,
a política fiscal, ao estimular o crescimento da demanda agregada e,
consequentemente, a expansão do produto nacional, interfere no mercado de
bens e serviços, alterando também a renda nacional.
A política monetária, por seu turno, ao intervir na demanda e
oferta de moeda, irá alterar o equilíbrio no mercado de ativos financeiros e,
consequentemente, na taxa de juros. Mas tanto a política monetária quanto a
política fiscal intervirão simultaneamente nos dois mercados, já que ambas irão
alterar a taxa de juros, sendo esta a variável responsável pela interligação entre
os dois mercados.
Vamos então analisar graficamente como se dá a interligação das curvas
IS-LM. Você percebeu que tanto a curva IS quanto a curva LM são formadas pela
intersecção entre os eixos vertical (taxa de juros) e o eixo horizontal (renda)?
Observe o equilíbrio simultâneo entre as duas curvas representado no gráfico:
218
TÓPICO 2 | A CURVA IS-LM E AS POLÍTICAS MONETÁRIA E FISCAL
GRÁFICO 6 – EQUILÍBRIO NO MERCADO DE BENS E SERVIÇOS E DE ATIVOS FINANCEIROS
r
LM
r1
E
IS
Y1
Y
FONTE: A autora
Como você observa, as curvas IS-LM estão interligadas e no ponto de
intersecção (r1 e Y1) temos o equilíbrio simultâneo nos dois mercados.
“No caso da curva IS, como vimos, pontos sobre a curva correspondem
aos pares (renda taxa de juros) que garantem o equilíbrio no mercado de bens”
(LOPES; VASCONCELLOS, 2008, p. 196).
Consequentemente, pontos fora da curva IS (à esquerda ou à direita),
representam excesso de demanda e excesso de oferta, respectivamente.
Segundo a lógica keynesiana, com preços constantes, havendo excesso
de oferta, ocorrerá acúmulo de estoques, fazendo com que as empresas
diminuam a produção. Havendo excesso de demanda os estoques
diminuirão, forçando o aumento da produção. Essa é a primeira regra
de ajustamento: sempre que houver desequilíbrios no mercado de
bens, o ajuste se dará via quantidades, alterando o nível de produto
(renda) (LOPES; VASCONCELLOS, 2008, p. 196).
Percebe como essa regra keynesiana leva à conclusão de que o governo
pode restabelecer o equilíbrio no mercado de bens e serviços por meio da política
fiscal, aumentando os gastos públicos (principalmente via investimentos)?
Observe agora a curva LM (mercado monetário). Na curva LM, haverá
excesso de demanda por moeda quando houver pontos à direita e abaixo da
curva e haverá excesso de oferta de moeda quando houver pontos à esquerda e
acima da curva.
219
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
“Essa é a segunda regra de ajustamento: desequilíbrios no mercado
monetário são corrigidos com variações nas taxas de juros. Quando há excesso de
oferta a taxa de juros diminui e quando há excesso de demanda a taxa de juros se
eleva” (LOPES; VASCONCELLOS, 2008, p. 198).
As duas regras de ajustamento estão sintetizadas a seguir:
FIGURA 16 – O MODELO IS-LM E AS REGRAS DE AJUSTAMENTO
O modelo IS LM parte do modelo keynesiano e incorpora o mercado
monetário.
Desta forma as regras de ajustamento do modelo são:
1 Desequilíbrio no mercado de bens (IS) são ajustados via quantidades,
alterando o nível de produto(renda);
2 Desequilíbrios no mercado monetário (LM) são corrigidos com variações nas
taxas de juros.
i
I
LM
II
iE
IS
IV
LM
IS
{
{
Pontos acima da IS: EOB  ↓ Y
Pontos abaixo da IS: EDB  ↑ Y
Pontos acima da LM: EOM  ↓ i
Pontos abaixo da LM: EDB  ↑ i
III
YE
Y
FONTE: Adaptado de Lopes e Vasconcellos (2008, p. 198)
Observe que na região I do gráfico encontram-se intervalos de excesso
de oferta de moeda (EOM) e de bens (EOB), o que irá pressionar a redução tanto
da renda como da taxa de juros. “Na região II, o excesso de oferta de moeda
pressiona a queda da taxa de juros e o excesso de demanda por bens (EDB) à
ampliação do produto. Na região III, temos excesso de demanda de bens e moeda
e na região IV excesso de oferta de bens e excesso de demanda de moeda (EDM)”
(LOPES; VASCONCELLOS, 2008, p. 198).
220
TÓPICO 2 | A CURVA IS-LM E AS POLÍTICAS MONETÁRIA E FISCAL
Como você deve ter observado, no modelo IS-LM a taxa de juros tem uma
importância muito grande, pois é ela que faz a ligação entre os dois mercados.
Desta forma, qualquer alteração exógena no mercado monetário determina uma
nova taxa de juros, que afetará o Investimento Agregado e, portanto, provocará
alterações no equilíbrio do mercado de bens e serviços.
Por outro lado, uma alteração exógena no mercado de bens e serviços, por
exemplo, aumento dos gastos públicos, deslocará a Curva IS, elevando a taxa de
juros, afetando assim demanda de moeda e, consequentemente, o equilíbrio do
lado monetário (VASCONCELLOS, 2014).
5 CURVA IS-LM E EFICÁCIA DA POLÍTICA MONETÁRIA
Para analisarmos a eficácia da política monetária sobre a curva ISLM, primeiramente vamos considerar uma política expansionista, ou seja, um
aumento da oferta monetária. Neste caso, teremos uma queda da taxa de juros
e um aumento da renda, pois com uma taxa de juros mais baixa estimula-se o
investimento; este, por sua vez, provocará uma expansão da demanda agregada,
que irá fazer com que haja uma diminuição dos estoques. Para responder ao
aumento da demanda os empresários aumentarão a produção. O aumento da
renda aumenta também a demanda de moeda para transações, que provocará
então uma elevação na taxa de juros para diminuir a demanda pelo motivo
especulativo, de modo a equilibrar o mercado monetário.
É importante observar, como demonstra o gráfico ilustrado a seguir, que o
aumento da taxa de juros de i para i2 neste segundo momento é menor em relação
ao patamar inicial, o que possibilita a confirmação de uma elevação na renda de
Y para Y2.
Apenas para exemplificar, já que neste modelo estamos considerando
preços constantes, caso houvesse inflação, a política monetária poderia ser
utilizada para inibir o consumo, visando baixar o nível geral de preços, quando
teríamos o comportamento inverso da curva LM, deslocando-se para cima e
para a esquerda. Uma das consequências negativas desta medida, entretanto, é a
redução da renda nacional, que pode levar ao desemprego e à recessão econômica.
221
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
GRÁFICO 7 – EFEITO DE UMA EXPANSÃO OU RETRAÇÃO MONETÁRIA
i
LM1
LM
LM2
i1
i
i2
IS
Y1 Y Y2
Y
FONTE: A autora
Por fim, resta salientar que a eficácia da política monetária expansionista:
• diminui, quando a elasticidade da demanda por moeda em relação à taxa de
juros aumenta, ou seja, havendo uma pequena alteração na taxa de juros haverá
uma grande alteração na demanda;
• aumenta, quanto maior é a sensibilidade do investimento em relação à taxa de
juros. Neste caso, pequenas diminuições na taxa de juros provocam um grande
aumento nos investimentos;
• aumenta, na medida em que aumenta a velocidade-renda da moeda. Para
esta situação, quanto maior for a velocidade-renda da moeda (quanto mais
rapidamente circular entre os agentes econômicos), maior será a eficácia da
política monetária no estímulo ao crescimento da economia.
6 CURVA IS-LM E EFICÁCIA DA POLÍTICA FISCAL
Quando estudamos o modelo simples de determinação de renda keynesiano,
verificamos que a política fiscal pode impactar a economia de duas formas.
“Uma política fiscal expansionista gerará uma expansão mais que
proporcional da demanda e do produto, caso haja capacidade ociosa na
economia” (GREMAUD, 2005, p. 216). Isso porque o aumento de gastos do
governo, principalmente via investimentos públicos, acionará o multiplicador
de investimentos, pois haverá um aumento inicial de produção, que gerará uma
renda adicional, aumentando assim a demanda agregada. Por outro lado, se a
política fiscal for baseada numa renúncia fiscal (com a redução de impostos),
aumentará a renda pessoal disponível e, consequentemente, o consumo.
222
TÓPICO 2 | A CURVA IS-LM E AS POLÍTICAS MONETÁRIA E FISCAL
De fato, no pós-Segunda Guerra, iniciando pelos Estados Unidos, esta
política fiscal expansionista foi colocada em ação e contribuiu para o crescimento
da economia mundial até o início da década de 1960.
O grande entrave à continuidade de tal política, porém, se deveu aos
profundos déficits contraídos pelas nações como consequência dessa atuação
mais direta sobre a economia das nações, que levou à formulação do Consenso
de Washington em 1989, estabelecendo uma série de políticas conhecidas como
de cunho neoliberal.
Há um grande risco de déficits muito elevados levarem o país à insolvência,
ou seja, à incapacidade de honrar com as dívidas contraídas. Uma das razões que
explicam essa possível insolvência é o fato de que, em momentos de crescimento
econômico, a maioria dos países não terem feito uma reserva de caixa para poder
intervir nos momentos de crise. O que se viu, em muitos deles, em especial no
Brasil, foi um inchamento da máquina pública com um excessivo contingente
de servidores públicos, além do aumento dos chamados cargos comissionados e
regalias a determinados segmentos públicos.
No caso do Brasil, o endividamento público havido nos anos de 1970/1980
foi financiado com a poupança do setor privado e também com a poupança
interna, o que contribuiu para elevar fortemente as dívidas interna e externa.
Quando o governo pretende reduzir a inflação, pode utilizar-se de uma
política fiscal restritiva (ou contracionista), reduzindo os gastos ou aumentando
os impostos. Esta é a segunda forma de intervenção do governo na economia por
meio da política fiscal. Lembramos, entretanto, que o modelo IS-LM pressupõe
preços constantes.
Em todo caso, para analisarmos a eficácia da política fiscal, vamos supor
que o governo adote uma política expansionista, elevando os gastos públicos.
Teremos, neste caso, o deslocamento da curva IS para cima e para a direita.
Lembremos que o tamanho deste deslocamento irá depender do chamado efeito
multiplicador do investimento sobre um incremento adicional de gastos e da
propensão marginal a consumir, como vimos anteriormente.
O aumento do investimento (deslocando a curva de IS para IS1) irá fazer com
que aumente a renda nacional de Y para Y1, que aumentará o nível de empregos e
o consumo, com posterior aumento da produção e um novo incremento na renda.
Mas como houve um aumento na renda, aumentando a demanda por moeda,
haverá também um aumento na taxa de juros, o que futuramente poderá fazer
com que o investimento reduza.
223
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
GRÁFICO 8 – DESCOLAMENTO DA CURVA IS DEVIDO À POLÍTICA FISCAL EXPANSIONISTA
LM
i
i1
i
IS1
IS
Y Y1
Y
FONTE: A autora
Uma política fiscal expansionista sempre deve ser adotada quando
verificada a real situação econômica do país, para não estimular uma alta muito
forte na taxa de juros, o que no futuro pode neutralizar o efeito positivo pretendido
com a medida.
224
RESUMO DO TÓPICO 2
Neste tópico, você aprendeu que:
• No modelo simples de determinação de renda, as intervenções do governo só
afetam o lado real da economia (composto pelo mercado de bens e serviços),
sendo que essas intervenções no lado real não afetariam o lado monetário
(moeda e ativos financeiros, taxas de juros e nível de preços).
• O modelo keynesiano generalizado (também conhecido como síntese
neoclássica) admite que intervenções do governo no lado real da economia irão
provocar alterações na taxa de juros, porque quando há aumento de gastos,
haverá aumento do produto/renda, gerando aumento do consumo, que levará
então a um aumento da demanda de moeda para transação, o que afetará a
variável taxa de juros e o nível de preços da economia.
• Mudanças na taxa de juros e no nível de renda provocam movimentos ao longo
da curva IS porque r e Y são variáveis endógenas ao modelo.
• A curva IS se desloca para cima ou para baixo quando houver variações
exógenas, como aumento ou diminuição dos gastos do governo, variação na
riqueza, mudanças nas expectativas dos agentes econômicos, bem como os
resultados líquidos do setor externo (exportações menos importações).
• No que se refere à inclinação da curva IS, dois fatores afetam essa inclinação:
a sensibilidade do investimento em relação à taxa de juros e a propensão
marginal a consumir.
• A curva LM mede o equilíbrio entre demanda e oferta de ativos financeiros.
• Mudanças na taxa de juros e no nível de renda provocam movimentos ao longo
da curva LM porque r e Y são variáveis endógenas ao modelo.
• Sendo a oferta de moeda uma variável determinada pelo governo, por meio
da política monetária este pode fazer com que a curva LM se desloque para
a direita ou para a esquerda, com a finalidade de intervir na conjuntura
econômica do país.
• No que se refere à inclinação da curva LM, esta será determinada pela
elasticidade da demanda de moeda em relação à renda e à taxa de juros.
225
• No modelo IS-LM (também conhecido como Análise Hicks-Hansen),
incorporamos o mercado de ativos e a determinação da taxa de juros à análise,
com esta passando a influir na determinação da renda através do investimento.
Nesse modelo, temos a determinação simultânea da taxa de juros e da renda
que equilibram o mercado de bens e de ativos. Constitui-se, portanto, um
modelo de equações simultâneas.
• Primeira regra de ajustamento: sempre que houver desequilíbrios no mercado
de bens, o ajuste se dará via quantidades, alterando o nível de produto (renda).
• Segunda regra de ajustamento: desequilíbrios no mercado monetário são
corrigidos com variações nas taxas de juros. Quando há excesso de oferta a
taxa de juros diminui e quando há excesso de demanda a taxa de juros se eleva.
• A eficácia da política monetária expansionista: diminui, quando a elasticidade
da demanda por moeda em relação à taxa de juros aumenta, ou seja, havendo
uma pequena alteração na taxa de juros haverá uma grande alteração na
demanda; aumenta, quanto maior é a sensibilidade do investimento em
relação à taxa de juros. Neste caso, pequenas diminuições na taxa de juros
provocam um grande aumento nos investimentos; aumenta, na medida em
que aumenta a velocidade-renda da moeda. Para esta situação, quanto maior
for a velocidade-renda da moeda (quanto mais rapidamente circular entre os
agentes econômicos), maior será a eficácia da política monetária no estímulo ao
crescimento da economia.
• Sobre política fiscal expansionista: lembremos que o tamanho deste
deslocamento irá depender do chamado efeito multiplicador do investimento
sobre um incremento adicional de gastos e da propensão marginal a consumir.
• O aumento do investimento (deslocando a curva de IS para IS1) irá fazer com que
aumente a renda nacional de Y para Y1, que aumentará o nível de empregos e o
consumo, com posterior aumento da produção e um novo incremento na renda.
• Uma política fiscal expansionista gerará uma expansão mais que proporcional
da demanda e do produto, caso haja capacidade ociosa na economia.
226
AUTOATIVIDADE
1 Explique o funcionamento de uma política monetária expansionista no
modelo IS-LM.
2 O que acontecerá na curva IS se houver um aumento dos gastos do governo?
3 Diferencie política fiscal expansionista de política monetária expansionista e
explique seu funcionamento sobre a curva IS-LM.
227
228
TÓPICO 3
UNIDADE 3
O MODELO IS-LM E DILEMAS DE POLÍTICAS
MACROECONÔMICAS
1 INTRODUÇÃO
Como você já deve ter pensado ao longo dos seus estudos, intervir na
economia por meio de políticas macroeconômicas é um grande desafio para os
governantes, pois, segundo o ditado popular, às vezes uma dose exagerada de
um medicamento pode matar o paciente ou deixá-lo ainda mais combalido.
O medicamento a que estamos nos referindo são justamente as políticas
macroeconômicas, pois se as medidas adotadas forem excessivas, podem provocar
efeitos bem contrários aos pretendidos.
2 O SUCESSO DO MODELO IS-LM E AS ADEQUAÇÕES
AO MODELO
O modelo IS-LM, que foi vastamente utilizado no pós-guerra até as décadas
de 1960/1970, teve um relativo sucesso para a maioria dos países que o utilizaram.
A versatilidade do modelo [IS-LM] é responsável pela sua
sobrevivência: pode ser usado para analisar tanto a política fiscal
quanto a política monetária considerando tanto o pleno emprego
quanto o desemprego; pode gerar resultados de teoria quantitativa ou
puramente keynesianos com apenas pequenas modificações (FISHER,
1987; DARITY; YOUNG 1995, p. 37 apud HELLER, 2005, p. 12).
Por esse motivo é conhecido mundialmente, exercendo influência sobre
economistas, formuladores de política econômica, estudantes de muitas gerações,
escritores das mais variadas vertentes (HELLER, 2005).
As modificações ocorridas na economia mundial após a década de 1970,
com a ocorrência de processos inflacionários em muitos países e o aumento do
déficit público em tantos outros, muitas vezes até como decorrência de uma
política monetária/fiscal expansionista, fizeram retomar o debate sobre o alcance
das políticas macroeconômicas e sua eficácia sobre a economia, sendo que o
modelo IS-LM também vem sendo alvo de críticas nas últimas décadas.
229
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
“Com a introdução das metas de inflação e com os bancos centrais
seguindo metas de taxas de juros ao invés de metas de oferta monetária – uma
das suposições do modelo IS-LM –, esse modelo perdeu um pouco seu sentido,
sendo necessário transformá-lo” (COSTA JÚNIOR, 2010, p. 142).
E o que seria, então, o regime de metas de inflação? Desde o ano de 1999,
por meio do Decreto nº 3.088, foi criado no Brasil o regime de metas de inflação,
que tem por objetivo estabelecer um limite máximo para a inflação medida no
ano, chamado de teto da meta inflacionária. Naquele ano a meta foi fixada em 8%.
Assim, o governo, por meio do Banco Central, tem que adotar medidas
para que a inflação no período fique abaixo do teto estabelecido para aquele ano.
Quem determina a meta é o Conselho Monetário Nacional, por meio de Resolução
do Banco Central. A Resolução nº 4.499, de 30 de junho de 2016, estabeleceu em
seu art. 1º que: “É fixada, para o ano de 2018, a meta para a inflação de 4,5%
(quatro inteiros e cinco décimos por cento), com intervalo de tolerância de menos
um e meio ponto percentual e de mais um e meio ponto percentual, de acordo
com o § 2º do art. 1º do Decreto nº 3.088, de 21 de junho de 1999” (BCB, 2016, s.p.).
Desta forma, para o ano de 2018, a inflação, respeitando o limite de
tolerância, deverá chegar ao máximo em 6%. Assim, com essa mudança no
padrão de política monetária, o modelo IS-LM perdeu um pouco seu brilho, pois
passou a receber muitas críticas, especialmente por adotar a hipótese de preços
constantes e não prever com maior ênfase as mudanças nas expectativas dos
agentes econômicos (COSTA JÚNIOR, 2010).
Com a adoção do modelo de metas de inflação, o Banco Central acaba
deixando de utilizar com maior ênfase a política monetária para estimular a
demanda agregada e passa a utilizá-la mais fortemente para combater a inflação,
o que não estava previsto no modelo IS-LM. Não que o modelo não possa mais
ser utilizado, mas é preciso fazer adequações.
Costa Júnior (2010, p. 143) propõe que “para uma adequação a metas
de inflação, uma proposta é substituir a curva LM por uma curva MP (política
monetária) – curva essa que indica a escolha da meta da taxa de juros real pelo
Banco Central”. Isso porque a variável mais importante a ser controlada pelo
Banco Central passa a ser a taxa de juros e não a oferta monetária.
Mas a que se deve esta escolha da taxa de juros? Para Costa Júnior (2010),
esta escolha se deve em função da relação existente entre a taxa de juros, inflação
e produto. Diante dessas duas variáveis macroeconômicas, o formato da curva
IS-MP poderia assumir duas formas diferentes.
230
TÓPICO 3 | O MODELO IS-LM E DILEMAS DE POLÍTICAS MACROECONÔMICAS
“A primeira diz que a meta de taxa de juros é função apenas da inflação, e
seu equilíbrio estaria no cruzamento das curvas IS e MP” (COSTA JÚNIOR, 2010,
p. 143-144), conforme mostra o gráfico:
GRÁFICO 9 – EQUILÍBRIO NO MODELO IS-MP – PRIMEIRA ABORDAGEM
r
MP
r
IS
Y
Y
FONTE: Costa Júnior (2010, p. 145)
Desta forma, quando a inflação aumenta, o Banco Central aumenta a
meta da taxa de juros, o que faz com que a economia se contraia, diminuindo o
consumo e, consequentemente, o produto e o nível geral de preços.
“A segunda abordagem estabelece que a meta de taxa de juros seria em
função da inflação e do produto, e seu equilíbrio também seria encontrado pelo
cruzamento dessas curvas” (COSTA JÚNIOR, 2010, p. 144).
Temos que nos lembrar de que, para a macroeconomia, produto = renda
e, portanto, elevar o produto significa elevar a renda também, o que pode levar a
pressões inflacionárias pelo aumento da demanda agregada.
Assim, um aumento no produto elevaria a inflação, forçando o Banco
Central a aumentar a meta da taxa de juros para estabilizar a inflação, mas em
função da relação inversa existente entre taxa de juros e produto, a inclinação da
curva MP seria descendente.
231
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
GRÁFICO 10 – EQUILÍBRIO NO MODELO IS-MP – SEGUNDA ABORDAGEM
r
r
MP
IS
Y
Y
FONTE: Costa Júnior (2010, p. 147)
No que consiste, então, a diferença básica entre os modelos IS-LM e IS-MP?
Vimos que no modelo IS-LM obteremos o equilíbrio geral quando
tanto o mercado de bens e serviços quanto o mercado monetário estiverem
simultaneamente em equilíbrio. Alterações exógenas (por exemplo, por meio da
política econômica) ajustarão possíveis desequilíbrios no modelo até chegar a
uma nova condição de equilíbrio.
“Na versão dinâmica do modelo IS-MP, assume-se que no mercado de
bens o produto é ajustado de acordo com o excesso de demanda agregada e no
mercado monetário pela diferença entre a taxa de juros ótima e a taxa de juros
adotada pelo Banco Central” (COSTA JÚNIOR, 2010, p. 153).
TUROS
ESTUDOS FU
Outras adequações ao modelo IS-LM foram propostas pelos economistas,
entre elas a que incorpora a taxa de câmbio à análise. Esses estudos serão propiciados
nas disciplinas futuras do curso de Ciências Econômicas, como Economia Monetária e
Economia Internacional.
232
TÓPICO 3 | O MODELO IS-LM E DILEMAS DE POLÍTICAS MACROECONÔMICAS
3 A POLÍTICA MACROECONÔMICA RECENTE NO
BRASIL
A economia brasileira terminou as duas últimas décadas do século XX
e iniciou o século XXI alternando pequenos ciclos de crescimento com períodos
recessivos, às vezes refletindo crises internas e às vezes pela ocorrência de crises
externas, a exemplo do que ocorreu em 2008 com a Crise Financeira Mundial.
A tabela abaixo, que mede o crescimento do PIB de 2001 a 2015, ilustra
muito bem a situação econômica brasileira recente:
FIGURA 17 – CRESCIMENTO DO PIB REAL (% A.A.) DE 2001 A 2015
PIB
Agricultura
Indústria
Serviços
2001
1,4
5,2
5,4
2,1
2002
3,1
8,0
15,2
3,1
2003
1,1
8,3
4,6
1,0
2004
5,8
2,0
-0,5
5,0
2006
4,0
4,6
6,5
4,3
2007
6,1
3,2
2,9
5,8
2008
5,1
5,8
4,1
4,8
2009
-0,1
-3,7
-2,1
2,1
2010
7,5
6,7
14,9
5,8
2011
3,9
5,8
3,3
3,4
2012
1,9
-3,1
-2,1
2,9
2013
3,0
8,4
-3,0
2,8
2014
0,5
2,8
-1,5
1,0
2015
-3,8
3,6
-6,3
-2,7
FONTE: Paula e Pires (2017, s.p.)
233
UNIDADE 3 | A CURVA IS-LM, AS POLÍTICAS MACROECONÔMICAS E SEUS DILEMAS
Apesar de contar com anos em que o PIB teve um crescimento pífio ou
mesmo decréscimo, como nos anos de 2001 (1,4%), 2003 (1,1%) e 2009 (-0,1%),
tivemos um período de expansão significativa do PIB entre os anos de 2004 a
2013, quando crescemos em média 4,0% a.a. (PAULA; PIRES, 2017).
Esse período de expansão foi ainda mais relevante porque foi acompanhado
por uma melhoria nos indicadores de distribuição de renda e queda nos níveis de
pobreza, propiciado tanto pelas políticas assistenciais quanto pelo aumento real
do salário mínimo, dentre outras.
Entretanto, revertendo esta tendência de expansão, a partir de 2014 o PIB
vem decaindo, sendo que nos últimos anos a taxa passou a ser negativa (-3,8% em
2015, 3,6% em 2016), crescendo apenas 1% em 2017.
É lógico que há uma série de condicionantes para esta conjuntura econômica
brasileira e a instabilidade política, corrupção, dentre outros fatores, contribuem
para deixar o cenário futuro ainda mais incerto. Mas é importante que se analise
quais são as possibilidades de política macroeconômica a serem adotadas para
que o Brasil volte a apresentar um crescimento robusto, aliado à distribuição de
renda mais equilibrada, com estabilidade de preços e elevado nível de emprego,
que são, como você já estudou, as quatro grandes metas governamentais.
Em relação à política monetária, Paula e Pires (2017) sugerem que o
regime de metas de inflação não pode ser um fim em si mesmo, devendo vir
acompanhado de uma meta que vise ao crescimento do produto nacional dentro
das suas potencialidades, pois o Brasil, com as características que tem, pode
superar as adversidades que têm surgido nos últimos anos.
“De fato, em muitos países a lei que rege o BC estabelece, como objetivo
subsidiário, que essa instituição dará suporte à prosperidade econômica e ao
bem-estar social, de modo geral” (PAULA; PIRES, 2017, s.p.).
Para que isso aconteça é importante que o BC e o governo “falem a mesma
língua”, ou seja, estejam imbuídos dos mesmos objetivos. Além disso, Paula e
Pires (2017) sugerem que o Brasil passe a flexibilizar o período estabelecido para
a meta inflacionária, que hoje é de um ano, para pelo menos dois anos, para que
o BC possa ter maior poder de manobra para operar em situações de flutuações
de preços, que podem ser ocasionadas tanto por excesso de demanda, como
aumento dos custos de produção.
Um dos entraves ao pleno exercício das funções públicas no Brasil é o
endividamento, que tem subido fortemente na segunda década deste século.
Por isso a política fiscal, exercendo seu papel de estabilizadora da economia
(principalmente nas recessões econômicas), precisa continuar executando uma
política expansionista no curto prazo, mas também atentar para a necessidade
de diminuição gradativa do nível de endividamento (que nos torna reféns dos
bancos), com medidas como o total combate à corrupção (que desvia recursos
públicos para o setor privado), melhor gerenciamento da administração pública
(política de pessoal, diminuindo o peso do pagamento do funcionalismo sobre
as receitas públicas ou ainda estabelecendo um teto para os gastos), fazendo com
que haja maior volume de recursos disponíveis para investimento público.
234
TÓPICO 3 | O MODELO IS-LM E DILEMAS DE POLÍTICAS MACROECONÔMICAS
Entretanto, a política fiscal terá desafios no longo prazo, pois a Proposta
de Emenda à Constituição (PEC) nº 241, que prevê um limite para o crescimento
da despesa pública dado pela inflação do ano anterior para um período de 20
anos, colocada em prática no ano de 2017, engessará o governo, pois não haverá
aumento real de despesas em áreas visivelmente já debilitadas, como saúde,
educação, segurança pública, dentre outras.
Além do que, esse mecanismo não considera a possibilidade de uma forte
retomada da economia brasileira no futuro, quando os investimentos públicos
também poderiam crescer na proporção do crescimento do PIB e, com a PEC,
ficariam inviabilizados.
De acordo com Paula e Pires (2017, p. 140), “se o ajuste fiscal não conseguir
combinar adequadamente as medidas de curto prazo com as medidas estruturais
de longo prazo, o esforço de recuperação do crescimento pode exigir muito da
política monetária”.
No que se refere à política cambial, já vimos que a chamada “âncora cambial”
tem sido utilizada desde o Plano Real (1994) para conter pressões inflacionárias
internas, ou seja, com o câmbio valorizado se permite liberar a entrada de produtos
do exterior para neutralizar iniciativas de aumento de preços internos.
Se por um lado o câmbio valorizado ajuda no combate à inflação, por outro
lado inibe as exportações e contribui sobremaneira para aumento dos déficits, quer
no balanço de transações correntes, quer no balanço de pagamentos, o que também
não é desejável. Por isso, a recomendação de vários economistas seria no sentido de
o governo buscar a manutenção de uma taxa de câmbio competitiva para o Brasil,
nem tão valorizada e nem tão desvalorizada, o que poderia ser obtido mediante um
regime de câmbio flutuante administrado (PAULA; PIRES, 2017).
Finalmente, no que se refere à política de renda, seria imperioso que o
governo brasileiro desse continuidade à política de valorização do salário mínimo,
uma das formas de diminuir a nefasta concentração de renda no país, estabelecendo,
ainda, uma política de valorização salarial das categorias econômicas.
Em 2017, de acordo com o site UOL (2018, s.p.), “uma minoria mais rica
formada por 10% dos brasileiros detinha 43,3% da renda total do país. Na outra
ponta, os 10% mais pobres detinham apenas 0,7% da renda total”.
DICAS
Leia mais sobre este assunto acessando o link: <https://economia.uol.com.br/
noticias/redacao/2018/04/11/concentracao-renda-ibge.htm>.
Você pode complementar seus estudos sobre as políticas econômicas recentes no
Brasil acessando o estudo de Paula e Pires (2017) no link: <http://www.scielo.br/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S0103-40142017000100125>.
235
RESUMO DO TÓPICO 3
Neste tópico, você aprendeu que:
• “A versatilidade do modelo [IS-LM] é responsável pela sua sobrevivência:
pode ser usado para analisar tanto a política fiscal quanto a política monetária
considerando tanto o pleno emprego quanto o desemprego; pode gerar
resultados de teoria quantitativa ou puramente keynesianos com apenas
pequenas modificações” (FISHER, 1987; DARITY; YOUNG 1995, p. 37 apud
HELLER, 2005, p. 12).
• O modelo IS-LM teve grande sucesso e foi utilizado por muitas nações para
o estabelecimento da política macroeconômica, mas com o tempo precisou
passar por adequações.
• Com a introdução das metas de inflação e com os bancos centrais seguindo
metas de taxas de juros ao invés de metas de oferta monetária – uma das
suposições do modelo IS-LM –, esse modelo perdeu um pouco seu sentido,
sendo necessário transformá-lo.
• Com a adoção do modelo de metas de inflação, o Banco Central acaba deixando
de utilizar com maior ênfase a política monetária para estimular a demanda
agregada e passa a utilizá-la mais fortemente para combater a inflação, o que
não estava previsto no modelo IS-LM.
• Para uma adequação a metas de inflação, uma proposta é substituir a curva
LM por uma curva MP (política monetária) – curva essa que indica a escolha
da meta da taxa de juros real pelo Banco Central. Isso porque a variável mais
importante a ser controlada pelo Banco Central passa a ser a taxa de juros e não
a oferta monetária.
• Desde o ano de 1999, por meio do Decreto nº 3.088, foi criado no Brasil o regime
de metas de inflação, que tem por objetivo estabelecer um limite máximo para
a inflação medida no ano, chamado de teto da meta inflacionária.
• Na versão dinâmica do modelo IS-MP, assume-se que no mercado de bens
o produto é ajustado de acordo com o excesso de demanda agregada e no
mercado monetário pela diferença entre a taxa de juros ótima e a taxa de juros
adotada pelo Banco Central.
236
• Em relação à política monetária, Paula e Pires (2017) sugerem que o regime de
metas de inflação não pode ser um fim em si mesmo, devendo vir acompanhado
de uma meta que vise ao crescimento do produto nacional dentro das suas
potencialidades. Além disso, Paula e Pires (2017) sugerem que o Brasil passe
a flexibilizar o período estabelecido para a meta inflacionária, que hoje é de
um ano, para pelo menos dois anos, para que o BC possa ter maior poder de
manobra para operar em situações de flutuações de preços, que podem ser
ocasionados tanto por excesso de demanda, como aumento dos custos de
produção.
• A política fiscal, exercendo seu papel de estabilizadora da economia
(principalmente nas recessões econômicas), precisa continuar executando uma
política expansionista no curto prazo, mas também atentar para a necessidade
de diminuição gradativa do nível de endividamento (que nos torna reféns dos
bancos), com medidas como o total combate à corrupção (que desvia recursos
públicos para o setor privado), melhor gerenciamento da administração pública
(política de pessoal, diminuindo o peso do pagamento do funcionalismo sobre
as receitas públicas ou ainda estabelecendo um teto para os gastos), fazendo
com que haja maior volume de recursos disponíveis para investimento público.
• Em relação à política cambial, a recomendação de vários economistas seria no
sentido de o governo buscar a manutenção de uma taxa de câmbio competitiva
para o Brasil, nem tão valorizada e nem tão desvalorizada, o que poderia
ser obtido mediante um regime de câmbio flutuante administrado (PAULA;
PIRES, 2017).
237
AUTOATIVIDADE
1 Pesquise sobre a política macroeconômica recente no Brasil e transcreva
aspectos referentes a cada um dos instrumentos (políticas monetária, fiscal,
cambial e comercial e de rendas). Não esqueça de indicar as fontes de
pesquisa.
2 Você considera acertada a recomendação dos economistas de que a política
monetária recente do Brasil (de regimes de metas de inflação) não pode ser
um fim em si mesma e que é preciso aliar esta política com medidas que
visem estimular o crescimento do país? Justifique a sua resposta.
3 Que outras medidas de política macroeconômica você considera importantes
para propiciar o desenvolvimento sustentável do Brasil?
238
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