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TCC Com quem a segurança publica pensa que está falando: O dilema de viver entre gigantes e moinhos de vento

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UNIVERSIDADE DO VALE DO RIO DOS SINOS - UNISINOS
UNIDADE ACADÊMICA DE GRADUAÇÃO
CURSO DE PSICOLOGIA
ALEXANDRE HENRIQUE DE ALMEIDA
Com quem a Segurança Pública Pensa que Está Falando?
O Dilema de Viver Entre Gigantes e Moinhos de Vento:
Cartografias da Segurança Pública a Partir de um Curso de Formação da Guarda
Municipal de Novo Hamburgo
São Leopoldo
2019
Alexandre Henrique de Almeida
Com quem a Segurança Pública Pensa que Está Falando?
O Dilema de Viver Entre Gigantes e Moinhos de Vento:
Cartografias da Segurança Pública a Partir de um Curso de Formação da Guarda
Municipal de Novo Hamburgo
Projeto de Pesquisa apresentado como
requisito parcial para obtenção do título de
Bacharel em Psicologia, pelo Curso de
Psicologia da Universidade do Vale do Rio
dos Sinos – UNISINOS
Orientadora: Professora Zuleika Kohler Gonzales
SÃO LEOPOLDO
2019
Agradecimentos
Agradeço no percurso deste trabalho as muitas mãos que comigo o fizeram,
aquelas mãos que mesmo muito distantes sempre estiveram presentes. Daqueles que
na minha forma de ser e ver o mundo se fizeram e ainda se fazem viajantes.
Inicialmente a minha mãe pela dedicação e persistência de insistir para que o filho
estudasse, mesmo sem condições de pagar os estudos e que sempre me motivou a
seguir em frente, in memoriam de meu pai que na sua vasta experiência de vida
sempre me ensinou a questionar e duvidar daquilo que parecia mais óbvio. Agradeço
a minha esposa Jucilene principalmente pela paciência de aceitar compartilhar minhas
dúvidas e incertezas assim como permitir que estas situações fizessem parte do
tempo e da vida que compartilhamos juntos. Agradeço aos meus colegas de trabalho
que me permitiram mesmo sem entender muito bem, transitar e questionar esse
terreno, que por tantas vezes parece desconexo e sem saída. Aos colegas e alunos
do curso de formação da Guarda Municipal de Novo Hamburgo pela paciência e por
se permitirem viver as experiências que vivemos, cada um de nós a sua maneira, por
permitirem criarmos um espaço de compartilhamento de vida e de afetações.
Agradeço à minha orientadora Professora Zuleika pelo tempo e dedicação, pelo
empenho e coragem de optar de me apoiar em seguirmos este caminho, e agradeço
especialmente a todas as milhares de pessoas que não sei, não posso e não
conseguiria nomear, que diariamente demandam e esperam um atendimento mais
humanitário e zeloso dos agentes de Segurança Pública.
Advirto, Sancho amigo que esta aventura como outras semelhantes
a esta, não são aventuras de ilhas, senão só de encruzilhadas, em que não
se ganha outra coisa senão cabeça quebrada, ou orelha de menos. Tende
paciência, não vos hei de faltar aventuras em que não somente eu vos possa
fazer governador, mas algo mais. (CERVANTES, 1978, p 38).
RESUMO
O campo da segurança pública no Brasil é historicamente marcado por
discursos e práticas pautadas em agenciamentos e construções sociais, muitas delas
relacionadas com lógicas e processos oriundos do período escravocrata do país. O
país historicamente tem enfrentado graves problemas na área da segurança pública
o que na atualidade não é diferente, durante a construção desta pesquisa vivenciamos
mais um processo denominado de crise na segurança pública. O estado brasileiro
reage a esta condição sem a construção de políticas públicas efetivas e sem a
adequação de modelos pautados na valorização da vida e dos direitos humanos. O
agir principalmente dos órgãos policiais no Brasil ainda é orientado por lógicas que
espelham praticas do período ditatorial, como a lógica do inimigo interno e ações
repressivas destinadas principalmente a parcelas mais pobres da sociedade. As
Guardas Municipais têm uma inserção neste campo recente, vivendo ainda processos
de construção identitários e de uma práxis pautada ainda em discursos de promoção
da cidadania e na reprodução de ações repressivas e higienistas principalmente
direcionada a públicos específicos, como a população em situação de rua. A educação
é um processo dinâmico e vivencial onde convergem diversos atores e fluxos, sendo
potente para a transversalização dos modelos instituídos, assim a educação em
segurança pública precisa de um diálogo constante com a psicologia, considerando
está ciência implicada em seu papel ético e político de transformação social.
Palavras-chave: Psicologia. Guarda Municipal. Formação. Cartografia. Segurança
Pública.
Lista de Siglas e Palavras
GMs
Guardas Municipais
Guarnição
Guardas Municipais empregados para trabalharem em um determinado posto ou
em uma viatura.
QRV
Código Fonético internacional - Significa Prossiga com a mensagem
QAP
Código Fonético internacional - Significa está pronto para receber mensagens.
IML
Instituto Médico Legal
PE
Polícia do Exército
Posto
Local de trabalho, prédio, parque, escola, etc.
53 – penta
ter
Código Policial para usuário de drogas.
VTR
Viatura, carro ou moto policial.
SUMÁRIO
1.
DE COMO JUNTAR ARMADURAS, AMORES E AMIGOS PARA UMA
AVENTURA ................................................................................................................ 8
1.1. CENA UM: COM QUEM A SEGURANÇA PÚBLICA PENSA QUE ESTÁ
FALANDO? OU DE QUANDO DOM QUIXOTE ENCONTRA O GIGANTE. ............. 11
1.1.1. Traçados e Linhas: Com quem se pode falar? ........................................... 13
2. BOSQUEJOS DAS JORNADAS COMO CAVALEIROS ANDANTES ................. 15
2.1. HISTÓRIAS QUE FALAM DE ‘UMA SEGURANÇA PÚBLICA’ OU DE UMA
SEGURANÇA NO PÚBLICO..................................................................................... 15
2.2. BOSQUEJOS ÉTICO- METODOLÓGICOS ....................................................... 18
2.2.1. Cena: 2: Dos Companheiros da Cavalaria andante. ................................... 19
2.2.2. Das Condições para que se viva uma aventura de cavaleiro andante ..... 20
3. O LOUCO AVENTUREIRO: EXPERIMENTO(AFETA)ÇÕES .............................. 21
3.1. A SALA .............................................................................................................. 21
3.2. CENA: O CANSAÇO DOS CAVALEIROS ......................................................... 22
3.3. TRAÇADOS E LINHAS: A SALA VIVA............................................................... 24
3.4. BRI(COLAGENS) ............................................................................................... 25
3.5. A ARENA............................................................................................................ 27
4. GIGANTES, MAGOS E FEITICEIROS: A AVENTURA EM BUSCA DE NOVAS
PAISAGENS NA SEGURANÇA PÚBLICA .............................................................. 28
4.1. TRAÇADOS E LINHAS: A MORTE BATE À NOSSA PORTA. .......................... 28
4.2. TRAÇADOS E LINHAS: A CONFLITUALIDADE NAS FORMAS DE VIVER OS
ESPAÇOS DA CIDADE............................................................................................. 30
4.3 CARTOGRAFIA DA POLIS: O DISPOSITIVO “POLÍCIA” COMO FERRAMENTA
DE CRIAÇÃO DAS “CLASSES PERIGOSAS”. ......................................................... 32
4.3.1. Traçados e Linhas: O Penta-ter ................................................................. 32
4.4. GUARDAS MUNICIPAIS: ENTRE A (RE)INVENÇÃO DO CAMPO SEGURANÇA
PÚBLICA E A REPRODUÇÃO DAS VELHAS PRÁTICAS. ...................................... 36
4.4.1. Traçados e Linhas: Vagabundo ou “Cidadão à margem da sociedade”. . 36
4.5. CENA: FORMAÇÃO EM SEGURANÇA PÚBLICA: POR UM SUL A SEGUIR. 39
4.5.1. Traçados e Linhas Oito: O Guarda Municipal Dramin................................ 40
4.5.2. Traçados e Linhas: O Perguntador .............................................................. 41
4.6. CENA - NOVOS ACOPLAMENTOS: É POSSÍVEL A MÁQUINA “POLÍCIA”
PRODUZIR DIREITOS? ............................................................................................ 42
4.6.1. Traçados e Linhas: Quais são os Lugares que o Guarda pode habitar? . 43
4.6.2. Traçados e Linhas: Aproximação com o Inusitado. ................................... 43
5. DOM QUIXOTE ENCONTRA DULCINÉIA: DIÁLOGOS ENTRE A PSICOLOGIA E
A SEGURANÇA PÚBLICA. ...................................................................................... 45
5.1. CENA: OS ENCONTROS .................................................................................. 45
5.1.1. Traçados e Linhas: Ser Guarda é ser Psicólogo e Pedagogo ................... 46
5.1.2. Traçados e Linhas: Os Viajantes por perto ................................................. 47
5.1.3. Traçados e Linhas: A procura de Dulcinéia. ............................................... 48
6. QUAL É O FIM DE UM CAVALEIRO ANDANTE? ............................................... 50
7. REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 53
APÊNDICE – 1 - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO.......... 58
APÊNDICE – 2 - CARTA DE ANUÊNCIA DO LOCAL DE PESQUISA ................... 59
ANEXO I - PARECER CEP....................................................................................... 60
8
1. DE COMO JUNTAR ARMADURAS, AMORES E AMIGOS PARA UMA
AVENTURA
(...)E a primeira coisa que fez foi limpar umas armas que tinham sido
dos seus bisavós, e que, desgastadas de ferrugem, jaziam para um canto
esquecidas havia séculos. Limpou-as e consertou-as o melhor que pôde;
porém viu que tinham uma grande falta, que era não terem celada de encaixe,
senão só morrião simples. A isto porém remediou a sua habilidade: arranjou
com papelões uma espécie de meia celada, que encaixava com o morrião,
representando celada inteira.(...)Foi-se logo a ver o seu rocim; e dado tivesse
mais quartos que um real, e mais tachas que o próprio cavalo de Gonela, que
tantum pellis et ossa fuit, pareceu- lhe que nem o Bucéfalo de Alexandre
nem o Babieca do Cid tinham que ver com ele. Quatro dias levou a cismar
que nome lhe poria, porque (segundo ele a si próprio se dizia) não era razão
que um cavalo de tão famoso cavaleiro, e ele mesmo de si tão bom, ficasse
sem nome aparatoso. Barafustava por lhe dar um, que declarasse o que fora
antes de pertencer a cavaleiro andante; pois era coisa muito de razão que,
mudando o seu senhor de estado, mudasse ele também de nome,(...) até que
acertou em o apelidar: Rocinante,(...) significativo do que havia sido quando
não passava de rocim, antes do que ao presente era, como quem dissera que
era o primeiro de todos os rocins do mundo.
Posto a seu cavalo nome tanto a contento, quis também arranjar outro
para si; nisso gastou mais oito dias; e ao cabo disparou em chamar-se Dom.
Quixote;(...). Recordando-se porém de que o valoroso Amadis, não contente
com chamar-se Amadis(...) acrescentou o nome com o do seu reino e pátria,
para a tornar famosa, e se nomeou Amadis de Gaula, assim quis também ele,
como bom cavaleiro, acrescentar ao seu nome o da sua terra, e chamar-se
D. Quixote de la Mancha; (...) assim limpas as suas armas, feita do morrião
celada, posto o nome ao rocim, e confirmando-se a si próprio, julgou-se
inteirado de que nada mais lhe faltava, senão buscar uma dama de quem se
enamorar; que andante cavaleiro sem amores era árvore sem folhas nem
frutos, e corpo sem alma.
Foi o caso, conforme se crê, que, num lugar perto do seu, havia certa
moça lavradora de muito bom parecer(...). Chamava-se Aldonça Lourenço; a
esta é que a ele pareceu bem dar o título de senhora dos seus
pensamentos;(...) veio a chamá-la Dulcinéia del Toboso, por ser Toboso a
aldeia da sua naturalidade; nome este (em seu entender) músico, peregrino,
e significativo, como todos os mais que a si e às suas coisas já havia posto.
De início é necessário situar o leitor que chega a que percursos convido a trilhar
e por que tomarei estes caminhos, dentre tantos menos tortuosos e propensos à
queda. Escolho esta estrada como percurso da jornada, pelo muito que ela me
inquieta e atravessa a todo instante, seja como campo de trabalho, de produção e de
subjetivação, reconhecendo também que: Ao caminharmos, construímos o caminho
por que passamos e modificamos suas paisagens através dos encontros que por ele
venham a se dar. Este trabalho surgiu de uma inquietação, com raízes nas
experiências e acontecimentos que marcaram meu encontro com o campo da
segurança pública. Estou neste percurso há aproximadamente dez anos. Trata-se de
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um campo no qual produzo e (re)produzo práticas; Algumas destas em minha
percepção acabam sendo compostas através de diversos processos, orientados por
certos modus Operandi que, geralmente, estimulam a não-reflexão nas práticas
cotidianas. Cabe então questionar: qual é este lugar, afinal? E a quais lógicas de
produção subjetiva ele interessa?
O campo da segurança pública constitui-se no país marcado por certas
condições e orientadas a práticas militarizadas, conforme Adorno (2016) os modelos
de formação em segurança pública priorizam a preparação para combates e para a
guerra, o que acaba por orientar um modelo de produção de subjetividades violentas,
principalmente marcando a figura do outro como inimigo a ser combatido. O autor
destaca que estas práticas exacerbam discursos de exclusão, negando as diferenças
e diversidades, principalmente estimulando processos de extermínio da população
pobre e negra historicamente o público envolvido em grandes índices de confronto
com as polícias. No percurso de andar-cartográfico, pretendo compartilhar - ou melhor
- partilhar(com) aqueles que dispostos à caminhada sem a certeza de um caminho
previamente conhecido, estejam cientes de que encontros se darão no percurso porvir
e estejam desejosos de experiências por percursos incertos. As experiências que se
seguem foram construídas e marcadas como relato cartográfico através de diários de
campo, construídos pelo pesquisador-artesão neste percurso aventureiro, sendo que
o disparador do registro dos diários era sempre o fator afetivo que mobilizou o
pesquisador seja durante as experiências ou mesmo depois de vividas, ainda quando
desta trama de acontecimentos o pesquisador reviveu as passagens e via nelas
relações com a pesquisa.
Por muitas vezes buscar uma intersecção entre o fazer em segurança pública
e a psicologia constitui-se como a batalha de um cavaleiro andante, que percorre seu
caminho sonhando com aventuras e encontros, certo de que mais vale viver as
experiências neste campo, ainda que, os gigantes se confundam com moinhos de
vento.
Esta pesquisa produziu se no encontro do fazer de Guarda Municipal junto ao
setor de educação desta organização, mapeando a formação de profissionais através
de processos existentes, num curso de formação profissional de Guarda Municipal
com relação às diversas práticas e discursos que se constroem sobre o criminoso, a
violência, a cidadania, o respeito às diversidades e aos direitos humanos e
fundamentais de todas as pessoas.
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Um curso de formação ou a própria criação das Guardas Municipais pode ser
compreendido como um dispositivo, pois, segundo Foucault (1979), o dispositivo é um
conjunto de discursos, decisões, regulamentos, leis e medidas administrativas,
enunciados e produções científicas, podendo aparecer como um programa ou uma
instituição, criado de maneira não proposital, que busca dar respostas a uma
necessidade social. Este estudo busca pensar e discutir, a partir da lógica da produção
de subjetividades, o fazer em segurança pública. Assim, convido para que não
desistamos, pois mesmo que o caminhar nos mostre incertezas, continuemos juntos
cartografando este campo-devir segurança pública.
O trabalho que você tem nas mãos é um “plano B” construiu-se, desconstruiu,
reconstruiu-se novamente e gostaria que assim pudesse seguir, que quem esteja
lendo faça o uso que dele servir, pois esta pesquisa não almeja estar construída, mas
ser tosca e incompleta, não pretende ser o plano, mas a toca, o labirinto, seguimos
assim, mais certos de estar na encruzilhada do que na linha reta. Pesquisar a
formação em segurança pública é problematizar um campo em devir ou em outras
palavras: É a expectativa da invenção de novas e outras máquinas de guerra, capazes
de operarem mudanças no campo político e social.
No exato momento em que se construiu está pesquisa o país vivenciava, pode
se dizer, mais um processo de crise na segurança pública, enquanto grande parcela
da população clama por ações repressivas à criminalidade e violência, também
percebe-se o aumento da (in)segurança pública. Segundo Betim (2018), com
discursos que justificam intervenções militares em diversos locais do país, como no
caso do Rio de Janeiro, o estado propõe ações de recrudescimento a criminalidade
principalmente ao tráfico de drogas. Assim este trabalho surge nesta encruzilhada,
pensar e estudar como se dá a produção subjetiva dos futuros profissionais de
segurança pública em uma organização de caráter civil, porém marcada
historicamente por formações de cunho militarizado.
Para tanto, o objetivo desta pesquisa foi: Cartografar como ocorrem os
processos de subjetivação dentro de um curso de formação para profissionais
de segurança pública na Guarda Municipal de Novo Hamburgo?
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1.1. CENA UM: COM QUEM A SEGURANÇA PÚBLICA PENSA QUE ESTÁ
FALANDO? OU DE QUANDO DOM QUIXOTE ENCONTRA O GIGANTE.
Correndo o risco de deturpar a maravilhosa obra de Cervantes, mas certo de
que a cartografia propõe e nos convida a ocupar outros lugares, fazendo transitar no
lugar acadêmico, quem ou aquilo que a muito tempo esteve a sua margem, convido o
leitor para deixar nos acompanhar como guia de viagem este personagem nomeado
por Cervantes como Cavaleiro da Triste Figura, que em muito tem proximidade com
os sonhos e agruras dos trabalhadores deste campo o qual estamos para adentrar.
Estavam eles por dias a seguirem suas sinas de serem cavaleiros andantes,
ele montado em seu fiel cavalo Rocinante. Nestes últimos dias parecia mais
desvairado do que de costume. Sancho que a ele acompanhava já se via a muito
preocupado com a saúde da cachola de seu senhor, principalmente depois daquele
confronto com os moinhos de vento e que ele insistia que eram gigantes e dizia mais:
-Verás meu caro Sancho, jamais na história da Cavalaria Andante se verão
façanhas como as nossas, principalmente depois de derrotar tão grande número de
Gigantes.
Sancho retrucava novamente:
-Mas meu senhor...eram moinhos…
Ele nem deixava a frase de Sancho terminar e seguia seus desvarios.
-Há! quem dera encontrar mais uma vez um daqueles gigantes a sós, que por
nenhuma magia, seja a do feiticeiro Roldão hei de perder a batalha e sair lesado como
fora em nossa última.
-Sancho só ouvia aquelas loucuras e nem para o lado de Dom Quixote se
atrevia olhar.
Quando do Alto d’uma coxilha Dom Quixote vê uma bela e grande carruagem
transitar por cima das pastagens, não tem dúvidas dê lá surgirão grandes aventuras.
Dom Quixote esporeia Rocinante que até tenta correr como um possante, mas o que
faz mesmo é pinotear e derrubar Dom Quixote de um solapão.
- Sancho lhe adverte:
- Deixe-o senhor, não devemos procurar mais encrencas...
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Dom quixote nem o escuta e ao subir novamente em Rocinante, sacudir a
poeira e desamassar parte de sua armadura, segue em direção a grande carruagem,
bradando descabidas loucuras.
- Saia daí feiticeiro Roldão, ainda não aprendestes a lição, já dei cabo a tua
dúzia de gigantes eu e meu fiel escudeiro Sancho Pança não descansaremos em paz
enquanto não livrarmos a toda a Espanha de gente como tu, pois só assim poderei
descansar e voltar para os braços de minha bela e amada Dulcinéia de Toboso.
E bradando tantas mais injúrias quanto estas, aproximou-se da bela
carruagem.
Ao chegar próximo gritou ao cocheiro…
- Detenha-te! não sabes que por estas terras não se pode andar pelas
pastagens?
Do interior da Carruagem surge a cara de um homem velho, de roupa
imponente, um importante comerciário da região, que diz:
- Saia da minha frente seu doido varrido.
Dom Quixote diz:
Daqui não sairá, sem antes provar dos rigores da lei da Cavalaria.
O Homem de seu canto perguntou:
- Por acaso seu doido, sabes com quem está falando?
Dom quixote cai novamente em devaneio profundo.
-Claro que sei, pois agora é que vejo, neste momento me caiu a máscara da
magia, sim Roldão vejo que tentavas me enganar para fugir do povoado.
O homem viu que a loucura de Dom Quixote era maior do que ele até ali
perceberá, mandou o cocheiro chicotear o Cavalo, que ao sentir o relho em seu lombo
em um pinote acerta uma patada em Dom Quixote. Este último voou por mais de dois
metros caindo aos pés do cavalo de Sancho Pança que olhava de longe desanimado
aquela situação.
A Carroça do importante comerciante partiu em disparada e Dom Quixote ao
acordar do desmaio disse:
-Vês meu querido Sancho, que em muito breve livraremos nosso povoado de
bandidos, magos e feiticeiros, como este Roldão que por ali foge, eles não tardam por
esperar!
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1.1.1. Traçados e Linhas: Com quem se pode falar?
De uma abordagem de trânsito no treinamento dos novos servidores surgiu a
seguinte história e um dos analisadores deste trabalho, que busca pensar os
processos de subjetivação na formação em segurança pública. Quando ao abordar
um condutor, por estar estacionado em local proibido, este condutor, conhecido como
uma pessoa importante e influente no município fala para um dos novos agentes:
- Tu sabes com quem está falando?
O aluno diz que não.
Ele diz que não é criminoso e que não está fazendo nada de errado. Se multar
ele o aluno irá se incomodar, pega o telefone celular e liga para alguém.
Posterior a atividade, os alunos voltam para a sala e surge este tema como
discussão, alguns dos instrutores dizem:
- Este cara é importante, tem grande influência política, não é bom se meter
com eles. Não é qualquer chinelo!
Com quem a Segurança pública no Brasil pensa que está falando?
E com quem este campo quer falar? Problematizamos como e porque historicamente
a segurança pública no país têm falado de formas diferentes com as diversas parcelas
da população.
“Uma abordagem não é igual, na Maurício Cardoso e na Santo Afonso”. Citação
de um dos instrutores durante uma das atividades operacionais do curso de formação.
Diante da construção da noção de risco atribuída a uma parcela da população,
as ações, intervenções e abordagens dos agentes das guardas municipais e das
policias militares, vem sendo pautadas por formas diferentes de agir e de tratar as
pessoas. São elas as parcelas da sociedade que tem menos acesso aos diversos
aparatos de proteção social, sejam estes jurídicos estatais ou midiáticos.
Historicamente recebem um outro olhar e uma forma diferente de tratamento pelos
órgãos de segurança; estas questões direcionam para a mesma população a visão de
comunidades mais perigosas, como se a criminalidade e o descumprimento às leis
fossem ações específicas daqueles que vivem nas regiões mais pobres das cidades
e, ao mesmo tempo, (des)historicizada quanto a própria noção de criminalidade e
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quanto aos aparatos e procedimentos que se criam/formulam para dar conta da lei,
considerando ainda que estas são linhas que transversalizam o espaço urbano.
A Segurança Pública entendida como poder do Estado, através da
Polícia, segue os mesmos parâmetros sociais exemplificados acima, quando,
por exemplo, chega a um determinado local da Zona Leste, centro da cidade,
cujo tratamento do público e forma de atuação ocorrem com certa fineza e
urbanidade, muitas vezes só no diálogo. Por outro lado, na Zona Oeste, por
exemplo, nos bairros Silvio Leite, Silvio Botelho, Raiar do Sol e outros,
considerada “periferia”, a forma de tratamento e abordagem é totalmente
diferente, pois se criou a mazela e o estigma de que ali é área de risco e que
tal procedimento policial deve ser mais enérgico. Nesse caso, não se pode
dar chance de reação, em tese, ao malfeitor, o qual muitas vezes é
interpelado sem motivo justificado. (NETO, 2013. p 2).
Em diversos outros momentos surgem a questão dos bairros mais perigosos
em que os agentes têm de atuar de forma “enérgica e mais atenta”, sem dar espaço
para que se criem possibilidades de reações sejam estas quais forem, nem que para
tal precise ser incluído figuras(dispositivos) como o Caveirão (DA COSTA REBEQUE,
JAGUEL, BICALHO, 2008) e outras capazes de impor força as comunidades. Surgiu
assim, este discurso institucional hegemônico. Goffman (1988) Considera o estigma
como uma marca subjetiva imposta nas relações que se trata com aqueles “marcados
pela chaga”, esta marca faz com que acreditamos verdadeiramente que aquelas
pessoas não sejam humanos e a partir deste distanciamento, talvez como forma de
não enxergar as características que compartilhamos ou estamos muito próximos de
compartilhar, fazemos diversas discriminações, as quais, muitas vezes reduzimos a
capacidade de vida das pessoas, neste sentido produzimos o lugar do estigma, como
forma de referendar a noção de periculosidade e inferioridade.
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2. BOSQUEJOS DAS JORNADAS COMO CAVALEIROS ANDANTES
[Bosquejo: 1. Desenho rápido, geralmente sem pormenores, que se constitui
na base inicial para a criação de uma obra; esboço.2 .A primeira versão de
uma obra intelectual.3 . Descrição superficial de algo; resumo, síntese.]
2.1. HISTÓRIAS QUE FALAM DE ‘UMA SEGURANÇA PÚBLICA’ OU DE UMA
SEGURANÇA NO PÚBLICO.
A Experiência na pesquisa cartográfica não pode se eximir de considerar, o que
fez e ainda faz com que o artesão-pesquisador olhe e se toque (afete), reverberando
memorias destas experiencias, que datam da infância de quem a viveu e que agora
como artesão-pesquisador busco dar curso através de outras composições de
imagens, linguagens e sensações.
Algumas destas experiências marcaram a infância de uma criança que cresceu
na periferia de Porto Alegre, que admirava a polícia e as armas que eles usavam, que
assistiu a jovens da sua idade serem mortos em confronto com a própria polícia ou
entre gangues, que começava a entender que este destino traçado, não era escrito
tão por acaso, mas por um lugar social estratificado do qual muitos não
deveriam/poderiam sair.
A Faca Embainhada...
Ainda enquanto “moleque” corria nas ruas do bairro Restinga em Porto Alegre,
brincava com arma de espoleta sempre alertado por minha mãe:
- Olha se a polícia te pegar tu vais preso, ou até morto, porque eles pensam
que é arma de verdade(...)
Um dia correndo na rua com uma faca de minha mãe na bainha, ela
pergunta...o que é isto guri?
- Isto aqui é porque eu sou polícia!
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É a PE...É a PE...Bate com a mão, bate com o Pé…
Está é uma das cantigas que se escuta pela manhã, nos altos do morro Santa
Teresa em Porto Alegre, em meio a vários soldados que correm nas ruas da zona sul
da cidade, vai se deixando claro que lugar as forças de segurança no país tendem a
ocupar. Ocupei este lugar por cinco anos e nele vivi afetos e encontros com corpos
que me levaram a esta forma pesquisar.
Um dia ouvi dê um oficial do batalhão:
- Porque está lendo, soldado não precisa pensar!
O pé de porco…
Em 2009 ainda na Polícia do Exército fiz concurso para Brigada Militar, sendo
aprovado e ingressando nesta organização no mesmo ano. Lá deparei me com a
condição de acreditar em proteger as pessoas e ter de se saber perder. Acabei por
me reconhecer no campo da segurança pública, sentir visceralmente a dor das
pessoas as quais às vezes muito pouco tínhamos a fazer...isolar um local de crime,
até a perícia chegar em meio a madrugada. O medo de que nos assolava. De que a
mãe da vítima chegasse antes do IML liberar o local e retirar dali o corpo..., Mas ela
chegava e o silêncio e a dor nos estrangulava (…) Perdemos de novo(...).
Outras vezes era andar pelas ruas e se deparar com a inquietação de porque
éramos o estranho naquele ambiente. E de repente lá do fundo de um grupo de jovens
na rua se ouvia:
- Ó os Pé de Porco…
- Borá lá! Todo mundo bota a mão na parede!
(A) gente de Cidadania…
- Ei, o que é cidadania?...
Ingressei na Guarda municipal de Novo Hamburgo em 2012, após ser aprovado
no concurso do ano anterior e passar por um curso de formação de 6 meses, trabalhei
por alguns anos num local chamado Sala de operações, recebendo denúncias das
ocorrência e repassando para o atendimento das viaturas, no telefone e no trato com
os colegas inevitavelmente deparava me com algumas perturbações, incômodos,
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palavras, alegrias e dores. Deste lugar fui convidado para ocupar outro, com certo
desafio do colega que me convidou para o trabalho:
- Precisamos trabalhar para que eles sejam menos “polícia”...
A dúvida deste questionamento ecoou por todo o curso de formação e talvez
ainda hoje, ou para sempre, seguirá ecoando pelos corredores da Guarda Municipal.
Seremos gigantes ou moinhos de vento?
Muito prazer, meu nome é otário
Vindo de outros tempos, mas sempre no horário
Peixe fora d'água, borboletas no aquário.
Muito prazer, meu nome é otário
Na ponta dos cascos e fora do páreo
Puro sangue, puxando carroça.
Um prazer cada vez mais raro
Aerodinâmica num tanque de guerra
Vaidades que a terra um dia há de comer
"Ás" de Espadas fora do baralho
Grandes negócios, pequeno empresário
Muito prazer, me chamam de otário
[Refrão]
Por amor às causas perdidas
Tudo bem, até pode ser
Que os dragões sejam moinhos de vento
Tudo bem, seja o que for
Seja por amor às causas perdidas
Por amor às causas perdidas.
[Refrão]
Tudo bem, até pode ser
Que os dragões sejam moinhos de vento
Muito prazer, ao seu dispor
Se for por amor às causas perdidas
Por amor às causas perdidas
(Letra da Música: Dom Quixote, Engenheiros do Hawaii, 2003).
Este é o percurso que trouxe e dá sequência a esta jornada aventureira, que é
a formação em segurança pública numa Guarda Municipal, assim as construções que
se seguem fazem parte daquilo que reverberou pelo período de seis meses do curso
de formação, daquilo que fomos vivendo juntos, sentindo e construindo, das emoções
e sentimentos, que se fizeram enquanto construímos ou buscamos construir como
coletivo, costurado pelas afetações e movimentos que utilizamos e principalmente que
eu utilizava para resistirmos como humanos nestes espaços.
Trata se aqui de uma obra que nasce ela mesma em sua orfandade, nega ou
quer tentar negar sua origem, o rigor acadêmico e metodológico, ordenador de um
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modus de produção e fabricação de subjetividades, para que este trabalho no
encontro com outras “formas”, enquanto moldes do social, procure dentro do processo
de educação em segurança pública se desvencilhar do próprio academicismo,
produzir objetos estranhos, sem uso prático a priori, corpos-esquizo da segurança
pública. Este trabalho como jornada não se preocupa em recuperar, mas
principalmente em viver aquilo que cotidianamente se vive.
2.2. BOSQUEJOS ÉTICO- METODOLÓGICOS
No caminho que se segue peço ainda certa paciência, para que possamos
traçar juntos os percursos por linhas que sei não serão as mais fáceis. Mas
necessários são, para a um rigor metodológico e muito próximas ainda de minha
dificuldade em trabalhar as palavras, para que estas passagens possam tornar-se
mais leves. Gostaria de que, nas páginas que se seguirão, está dureza metodológica
se atenue para fazer com que esta figura de nossa aventura, o leitor-viajante possa
acompanhar o cavaleiro andante e caminhar com a leveza que a muito este campo
merece, embora, terreno muitas vezes árido e de afetações indigestas, penso que se
pode seguir com prazer a sequência desta obra.
Preciso marcar caro viajante, que a pesquisa que tem nas mãos almeja
exatamente ser uma não-pesquisa, desejo que seja um movimento clandestino,
pesquisa que se cria num ritmo vagabundo (vaga-mundo) mais afeta a viver do que a
retratar, mais preocupada com o sentir do que representar códigos de significação
dados a priori. Talvez agora ela já dê indícios de falha, como em muitos outros
momentos possivelmente fará, principalmente diante das expectativas que alguém
venha racionalmente e conscientemente construir, mas o desejo a constrói, e este
alguém que a deseja, a sonha menos científica, embora necessária, deseja se que
seja visceral, que cheire a gente, suor, saliva e sangue. Que misture os cheiros e os
corpos e que estes se tornem uma só coisa: Uma pesquisa sobre a educação
(formação) em segurança pública. Sugiro assim que estes conceitos devem orientar
aquilo, que este fazer-se-pesquisa vem mobilizar. Esta pesquisa traz aquilo por que o
artesão-pesquisador viveu, sentiu, chorou e regurgitou (ou aqui mesmo agora ainda
regurgite), aquilo que no pesquisador cresceu como um tumor, que ele mesmo cuidou
para que vivesse e que talvez um dia venha ainda a destruir o organismo, criar aí
talvez um corpo sem órgãos daquilo que lhe fez jorrar sangue, suor e todos os outros
19
fluidos corporais por todos os poros, o viver segurança pública no Brasil durante um
curso de formação.
2.2.1. Cena: 2: Dos Companheiros da Cavalaria andante.
“ - Se bem lhe digo meu querido Sancho, 12 eram ao todo os Gigantes.
- Mas meu amo, bem vi que não se tratavam de gigantes. Eram sim moinhos
de vento, destes que ao menor sopro se põem a girar e com suas pás baterem na
cabeça de quem por imprevisto, ou por loucura mesmo, se põe sob eles.
- Cala te! Pois de muito longe se nota que nada sabeis das bravuras da
cavalaria, pois ao acaso imaginas que, não fossem minha agilidade e destreza, muitos
outros gigantes não teriam surgido. (E olhando ao alto no céu com olhar de quem
desvai em sonho) Pois bem sei, que muitos são os feiticeiros e outros que conspiram
para que vivamos estas aventuras”
Muitos foram os que desta nossa aventura participaram, como em nenhum
outro campo, o fazer psicologia pode ser proposto individualmente, embora muitos
discursos busquem construir heróis ou mitos, nossos gigantes são muitos e anônimos.
Foram os doze alunos do curso de formação da decima segunda turma de Guardas
Municipais, além dos instrutores, servidores e gestores que de maneira ou outra
permitiram que este curso e esta pesquisa acontecessem. Foram também as pessoas
que em algum momento passaram na vida de todos nós, que vivíamos este processo
singular e que de alguma maneira participaram daquilo que estávamos vivendo nesta
jornada formativa.”
Uma cartografia nunca é um trabalho individual, nem está ocupada e
preocupada nos indivíduos, mas visa captar e registrar os agenciamentos que destes
sujeitos se formam, para tanto como propõe Gallo (2008) que não há sujeitos
individuais somente agenciamentos coletivos, importa olhar para aqueles aspectos
que remetem para além de condições individuais, configurando toda a condição de
problemas e inquietações singulares que os encontros – entre elementos
heterogêneos: da ordem das coisas no mundo – agenciam com novas relações e
novos usos, em oposição aos usos instituídos e estabelecidos por um discurso
majoritário.(GALLO, 2008, p. 77).
20
2.2.2. Das Condições para que se viva uma aventura de cavaleiro andante
Este trabalho foi aprovado pelo Comitê de Ética em pesquisa da Universidade
do Vale do Rio dos sinos sob o número: 2.955.821 e autorizado pela direção da
Guarda Municipal, bem como todos os participantes assinaram termo de
consentimento livre e esclarecido sendo explanado que em momento algum nenhum
dos participantes seria identificado.
O percurso deste estudo-experimento ocorreu em encontros realizados no
transcorrer do curso de formação da Guarda Municipal de Novo Hamburgo. Os
encontros foram compostos de períodos em que o pesquisador-cartógrafo esteve
praticando atividades como um dos instrutores do curso de formação, de momentos
em que estavam juntos participando de atividades formativas e das atividades de
construção das disciplinas, das relações e daquilo que surgiu no contato com os
servidores integrantes da organização ou com a gestão da Guarda Municipal. As
experiências-vivências foram descritas e relatadas em um diário de campo que foi
sendo construído a partir das afetações produzidas no praticar de cartógrafo e que
posterior foram utilizadas para os rabiscos deste desenho-cartográfico.
21
3. O LOUCO AVENTUREIRO: EXPERIMENTO(AFETA)ÇÕES
3.1. A SALA 1
“O espaço era um quadrado, certo cubículo, parecia vazia, mas estava cheia
de corpos amontoados, dos vários tipos, do uso que deles se pudesse fazer. De lá
não se ouviam vozes, não aquelas que se ouve costumeiramente. Haviam Grunhidos,
gritos mais de animais, de cães que cavam suas tocas ou ratos que criam seus
buracos...(Este era também um devorar esquizo de uma obra literária). Do fundo deste
buraco, o que nos movia a todos os corpos era uma dúvida: Como na solidão da sala
cavarmos uma toca?2”
1
Desenho construído pelo autor após a atividade descrita como a Sala Viva.
2 Conceito proposto por Silvio Gallo, proposto como deslocamento 2. Na obra: Por uma
educação Menor. No Livro Deleuze e a Educação, encontro concomitante a experiências e construção
do desenho pelo autor. (GALLO, 2008,p. 71).
22
3.2. CENA: O CANSAÇO DOS CAVALEIROS
Sancho sabia do erro que era irem em direção de mais uma taberna, ainda
lembrava da surra que levaram na última, mas seus apelos eram impassíveis para o
seu amigo.
Dom quixote mais uma vez estava decidido que aquela taberna, pois mais
parecia uma sala, um cubículo, era um castelo e dizia ele:
- Certamente este castelo é de um Mouro, que ousou vir com sua fama e
dinheiro para as terras da Mancha.
No fundo dom quixote tivera uma ideia, que não ousara compartilhar com
Sancho, sabiam se cansados, pois, andavam há mais de dia sem parar, montados no
lombo de Rocinante, e no Burrico que levava Sancho, que mais de arrasto não iam
porque isto seria caírem de vez. Dom quixote tinha um plano secreto, queria neste
castelo testar a bravura de Sancho Pança, fazê-lo enfrentar um grande gladiador,
destes que os castelões tem para criar aventuras sangrentas, para deleite de sua corte
(fora isto que ele lera em seus livros de cavalaria e agora tinha certeza de estar
vivendo).
Tinha para si, que no mais Sancho já havia dado provas de lealdade e
honestidade para sagrar se cavaleiro e que derrotando um cavaleiro em uma justa
não haveria Castelão que não lhe sagraria Cavaleiro Andante. Caso não desse certo,
saberia no momento correto intervir ele mesmo Dom Quixote, fosse para salvar a vida
de Sancho e para bem mostrar a força de seu braço.
Ao chegarem na taberna gritou dom quixote:
- Ei de Lá, baixem a porta para que o maior Cavaleiro da Mancha possa entrar
com seu fiel e valente escudeiro, procuramos pouso, boa comida e belas damas.
- Sancho cochichou:
- Não esqueçais, meu senhor, que um bom vinho também não faria nenhum
mal, inclusive ajuda a descansar os atordoados e cansados de longas viagens.
O que a dupla não previa é que na taberna estava sim outro doido, mais pelo
vinho que havia há muito subido para a cabeça e que a esta altura pensava ser o
cavaleiro negro. Ao ouvir os disparates de Dom Quixote vindos de fora da taberna
gritou lá dentro:
23
- Soldado! Abri a porta, (hick). Deixai-me ver quem é este, que ousa invadir a
estas terras (hick) De somente um cavaleiro a honrar a pureza da bela e Única
princesa e Dama Rossana de Montiel.
- Dom Quixote em um pulo caiu do cavalo de costas. Sacou a espada e antes
do taberneiro abrir a porta partiu ela ao meio.
-Quem ousa proclamar outra dama além da única e pura dama de Toboso,
minha imaculada Dulcineia!
O bêbado se levanta no fundo da taberna e grita:
- Fui eu vovô. (gargalhadas gerais).
- Ah infame! Isto será honrado com a vida. Mas não serei eu, pois para mim
seria covardia destruir-te com uma só cutelada. Não. Será meu valente escudeiro, que
lavará a Honra da formosa Dulcinéia, para provar a todos e a este castelão, que
recebe gente de tão baixo valor, que anda comigo o segundo maior Cavaleiro andante
que a Espanha já viu.
Sancho arregalou os olhos e se arrepiou.
- Está doido, meu senhor? Já viste o tamanho dele? De só um soco me parte
ao meio.
- Não temais tolo, te empresto minha espada com a qual fui sagrado o maior
cavaleiro da Mancha. Tome mostrai-o como se deve respeitar uma dama.
Não fora Sancho que investiu primeiro. Pois que ao tentar levantar a espada o
dito Cavaleiro Negro saltou com a garrafa de vinho e moeu-a na cabeça de Sancho.
Dom quixote, que vendo aquilo não se aguentou e jogou para cima do bêbado cadeira
e mesa da taberna.
O taberneiro homem simples e trabalhador, já por desatar em pranto ao ver os
dois homens caídos e Dom Quixote a atirar cadeiras e mesas implorou:
- O que desejas senhor, para que partas daqui, por favor? Disse o Taberneiro.
-Quero que digas a todos, que pelo cavaleiro da triste figura perguntarem, que
embora ferido seu fiel escudeiro não desistiu e embora, ainda não esteja no tempo de
sagrar se cavaleiro, foi capaz de derrotar o cavaleiro negro e mais dois Gigantes.
O taberneiro ajudando D. Quixote a colocar Sancho, ainda desfalecido no
cavalo, exclama:
-Tudo que quiseres nobre cavaleiro, o seu nome jamais será esquecido e saiba
que aqui jamais precisará voltar, porque nunca entrará outro cavaleiro além deste
nobre que agora sai.
24
Dom quixote virou-se de costas e seguiu puxando Sancho desmaiado sobre o
Cavalo e disse:
-Pois assim espero!
Ao virar de costas o taberneiro teve ainda tempo para fazer um gesto com o
braço para ele.
3.3. TRAÇADOS E LINHAS: A SALA VIVA.
A sala era de uma aula comum, muitos corpos, pessoas de diversos lugares.
O tema indigesto. A criminalidade, o que leva alguém a praticar um crime?
Do meio da aula o professor pergunta.
- Alguém se levanta: Mas é que este governo estimula, dando dinheiro para
vagabundo! Eles nem precisam trabalhar. Preso tem dinheiro dos trabalhadores e
“cidadãos de bem”. Só tem uma saída: A pena de morte! Todos os alunos estão
calados, alguns talvez concordem, mas ninguém ousa se levantar e falar, talvez
alguns pensassem nisto, mas não acreditavam na coragem do homem que está
prestes a se erguer.
Bem aos poucos uma mão negra lá do fim da sala vai subindo. Pede
humildemente licença para discordar do nobre colega. Alguns cochicham: Xii esta
discussão já vimos milhares de vezes.
De repente este homem se levanta completamente, é pequeno, mas se
avoluma como um gigante e de lá conta em lágrimas sua história. Meus colegas, dói
que pensem assim. Hoje sou professor de jovens em um projeto de educação e
esporte, porque acredito neles, mas vou lhes contar uma história. Perdi meu primeiro
e único filho morto por um assaltante. Odiei ele por alguns anos, até que encontrei a
mãe dele sem querer, compartilhei a dor dela e ela compartilhou a minha. Já vi o
homem que matou meu filho, olhei nos olhos dele, não soube o que falar, mas queria
dizer para ele, que merece uma segunda chance, que não o culpo e que nada que se
faça trará meu filho de volta(...). Ao final da aula estávamos cansados, abatidos e
calados, o mundo nos pesava nas costas.
Neste momento convido a darmos sequência a nossa aventura de cavaleiros
andantes, para que possamos conforme propôs Cervantes, que em um dado
momento a força de tanto lermos e imaginarmos, possa nos distanciar da realidade,
25
para que em algum momento já não saibamos em que dimensões vivemos, assim e
talvez, a partir daí podermos pensar em outras linhas, que nos permitam ocupar outros
planos, linhas virtuais que se entrecruzam e produzem encontros-andantes, aqueles
que potencializam a vida e são produtores de alegria.
“Afinal, rematado já de todo o juízo, deu no mais estranho pensamento em
que nunca jamais caiu louco algum do mundo; e foi: parecer-lhe convinhável
e necessário, assim para aumento de sua honra própria, como para proveito
da república, fazer-se cavaleiro andante, e ir-se por todo o mundo, com as
suas armas e cavalo, à cata de aventuras, e exercitar-se em tudo em que
tinha lido exercitavam os da andante cavalaria, desfazendo todo o gênero de
agravos, e pondo-se em ocasiões e perigos, donde, levando-os a cabo,
cobrasse perpétuo nome e fama.”(CERVANTES, 1978, p 36).
3.4. BRI(COLAGENS)3
Um lugar, campo do inabitável, podendo estar entre os diversos subúrbios
quentes do Sul (DOS MAIS VARIADOS SUIS QUE HABITAM CADA UM DE NÓS) do
mundo, onde ali ainda se produzem diferenciações. Em seu interior pululam corpos,
3
Imagem produzida pelo autor durante o curso de formação e construção da pesquisa, afetações do
encontro com a obra de: MOSSI, Cristian Poletti. Um corpo-sem-órgãos, sobrejustaposições. Quem a
pesquisa [em educação] pensa que é, v. 124, 2014.
26
indistinguíveis, corpos que se atravessam, se misturam, sobreposições. Aos poucos
quem chega de longe e nesta sala passa a habitar, ao canto, na penumbra, por ali
fica e percebe as poucas distinções (se perceptíveis), vê mais os contornos de linhas
que parecem delinear os corpos, vê ao centro um círculo, - gestos- que se atravessam,
não percebe e nem sabe (talvez não queira) distinguir quantos corpos é possível
contar, vê que por vezes se misturam, ocupam formas difusas(ora são móveis,
mobília, ora invadem uns aos outros, os tomam sem pudor, aos olhos de outros que
atentos observam. Há outros ainda, chocados pelo que observam, cadeiras acoplam
se com braços, uma mesa se desdobra em outros membros...em certo instanteAgitação- os corpos querem ser tomados, ser guiados, como animais se agitam, se
agridem, rasgam a pele, outros se mostram desinteressados a um canto, percebe-se:
querem não se afetar, como se toda aquela profusão de corpos e agitações, de gritos
e uivos pudessem passar-se sem afetações. Os corpos que agitados buscam se aninhar, a-grupar como ratos que se achegam a procura de calor, gritam...querem
segurança...algumas linhas na névoa de palavras que se forma, parecem querer
conformar uma máscara (TER)Giversar, construir o simulacro, demarcar uma
identidade...todos querem agarrar se ao território por segurança...Os outros corpos
seguem atrás percebem (ou imaginam perceber) um terreno firme (É que para estes
corpos ser iguais os torna seguros) (IR)manar.
27
3.5. A ARENA4
Dois Gladiadores se olham, sabem que sua luta é ineficaz...qualquer resultado
representa, dor, sangue e suor...mas não se deixam amainar, ficam ali...não percebem
a multidão de corpos que os observa...De repente…A estocada...A investida...Os
corpos se atiram um sobre o outro, puxões, socos, chutes e gritos...aliás, tudo são
gritos...Um dos oponentes morde, arranca a dentadas o mais interno do ser do outro,
(as palavras)...cospe as como sangue, misturadas com sangue…a velocidade do
tempo se reduz ao extremo. O olhar do que está a morrer percebe, numa fração de
vida que a linha demarca uma história. Um vir a ser, aquilo que estava a lhe
constituir...antes de morrer divaga, mas afinal era sobre isto? Era só por estes
caminhos que sempre andamos, sempre fomos um, até chegarmos nesta arena,
dualizamos nossas vidas...tudo ou nada, vida e morte, afinal resumem nossa jornada.
“Em outro plano este embate se dá em um encontro entre comentários sobre as instruções
que serão ministradas alguns discutem o que pensam da formação da Guarda Municipal...um dos
coordenadores do serviço dispara…-A última formação focou que eles são polícia, não é bom …. ruim
que nem aquela de esquerda focou muito no social(...).”
4
Imagem de desenho produzido em uma atividade com o grupo de alunos que se trabalhava
diversidade, diante da experiencia intitulada Arena.
28
4. GIGANTES, MAGOS E FEITICEIROS: A AVENTURA EM BUSCA DE NOVAS
PAISAGENS NA SEGURANÇA PÚBLICA
O campo da segurança pública no país sempre seguiu destinos incertos e
imprecisos embora tomado por concepções e interesses diversos, muitos foram os
eventos que neste percurso foram moldando o fazer e as práticas ligadas
principalmente ao agir da polícia. Segundo Souza (2015), historicamente as ações
policiais no país surgem relacionadas aos interesses da colônia na manutenção da
ordem vigente, “status quo” social, principalmente relacionado ao medo de uma
parcela da sociedade brasileira em perder os benefícios e interesses desta como elite
histórica, cultural e econômica. Conforme Sousa e Morais (2011), a configuração da
segurança pública e das políticas de repressão e controle da criminalidade tem suas
origens na própria formação do estado brasileiro em seus aspectos econômicos,
sociais, políticos e culturais.
4.1. TRAÇADOS E LINHAS: A MORTE BATE À NOSSA PORTA.
Primeiro dia da atividade de estágio supervisionado, alguns dos alunos estão
empregados em viaturas e outros em postos de serviço...De repente a rede do rádio
de comunicação chama:
Atento! VTR Quarto, Bis, Ócta (428) verifica uma denúncia de uma vinte seis
(26) próximo a escola Maria Alice!5
Nesta guarnição está um dos alunos e um Guarda Municipal “antigo”, eles
respondem pelo rádio que estão em deslocamento...faz se um silêncio na rede de
rádio, são alguns minutos, mas para aqueles que o vivenciam parecem eternos. Até
informarem a chegada no local e a constatação do homicídio.
Os corpos dos trabalhadores da segurança pública, bem como dos novos
agentes que escutam no rádio estas informações se reviram, calam de tensão,
silêncios muitos, certo não-saber ocupa as ondas de rádio, inquietação e curiosidade,
dúvidas, a finitude da vida tão perto!
26 – Código utilizado pela PM e adotado pela GM NH para caracterizar homicídio. Os nomes da escola
e prefixo da viatura foram alterados.
5
29
Um agente pergunta no rádio:
- Quais as características do indivíduo morto? Tem um ex-aluno da escola que
foi visto aí perto.
A confirmação: Era o jovem. Abandonara a escola a algum tempo.
Perdemos nós todos, as políticas de segurança pública perdem mais uma vez,
não por não encontrar mais um criminoso, mas por ainda estarem jogando o mesmo
jogo, estar no jogo é a certeza de que muito poucas vezes se ganha e alguns dos que
chegam agora já começam a perceber isto. A dor oculta perpassa todos os corpos,
uma solução se apresenta durante a discussão sobre a atividade de estágio os alunos
já havia aprendido algumas formas de lidar com isto…
Um dos que acompanharam a ocorrência diz:
-O colega que conhecia ele disse que ele era vago!6
Os discursos e as práticas existentes nas Guardas Municipais buscam, a partir
da insção ou demarcação de “soluções – vagas”, criar formas de sobreviver em um
espaço permeado de tensões e jogos de forças. Muitas vezes justificando ocupar o
lugar que as polícias militares exercem ou outras ainda buscando justificar este lugar
(ou sendo chamadas) para tal, como se possível fosse, terem de provar sua
necessidade e sua capacidade de lidar “resolver” os problemas das políticas
segurança pública.
A relação da guarda municipal e das polícias com o corpo é o da disciplina,
aquele corpo que foge às regras, que transgredem, que se furta a estar no lugar para
ele preparado, pensado e pronto, aquele corpo que emana multiplicidade e devir, que
ao ser já não é, mas ainda é, cria por si só um corpo transgressivo. A necessidade da
ordem e do controle impõem esta relação, como busca de normatizar, concretizar esta
mudança aqueles que fogem ao padrão esperado, recebem o estigma a chaga de
Vagos, termo corriqueiro para vagabundo, que não respeita as leis, criminosos ou
simplesmente quem não trabalha, são alguns dos sujeitos a que este termo tende a
ser atribuído pelos profissionais de segurança pública. O corpo é também o ponto zero
da experiência, o processo molecular de encontro entre o caos e o plano, onde estes
se manifestam e misturam, mas o caos que é o corpo também pois é vivo enquanto
multiplicidade, lance de dados e frêmito intensivo de vida e de morte. (Zordan, 2016.
6
Termo correspondente a vagabundo: Vulgarmente designa criminoso.
30
p1). Este breve limiar busca territorializar aquilo que se está vivendo, dizer sobre o
indizível e poder fazer desta experiência algo que ao menos traduza o mal estar é
uma possibilidade e uma linha-saída, possibilidade e rota de fuga, para este mesmo
mal estar, assim se convive e se convence, talvez a si mesmo, de que pode se
conviver com isto. Não se pretende aqui explicar nem representar a experiência de
cada um da morte e da vida, vale mais recortar esta cena, desenhar talvez o rabisco
de uma história de quem a vive e cria seu patuá de vida, mesmo lidando da sua
maneira com a morte, ainda que este movimento seja um grito em silêncio.
4.2. TRAÇADOS E LINHAS: A CONFLITUALIDADE NAS FORMAS DE VIVER OS
ESPAÇOS DA CIDADE.
O grupo de alunos retornava para as instalações onde geralmente ocorria o
curso de formação, é que neste dia as atividades ocorriam em um espaço externo,
pois tratavam se de prática e aprender técnicas operacionais como possíveis
confrontos com criminosos e abordagens a pessoas e veículos.
No percurso de volta, com o micro-ônibus da guarda municipal ao passar na
área central, um dos instrutores que conduzia o veículo para e desce. Juntamente
com ele, outro Guarda Municipal, os alunos ficam no veículo observando a ação.
O condutor estava incomodado, há tempos já havia comentado que aquela
praça do centro da cidade estava se tornando uma bagunça.
- Como pode? que vergonha! Em pleno centro da cidade a praça cheia de
mendigos, gente dormindo, em plena luz do dia, isto realmente estraga a imagem do
município. Dizia:
-Quando entrei na Guarda me colocaram a pé numa praça, jamais ia acontecer
isto, dava 8 horas, eu chegava perto deles e começava a cantar, dava uma alvorada
para eles saírem. O Prefeito, o secretário de segurança e o diretor da guarda na
época, enlouqueciam se vissem eles dormindo durante o dia, eu podia até ser
exonerado.
Nesta manhã, esse Guarda Municipal desceu do veículo, mais uma vez
incomodado e disposto a acordar alguém que dormia totalmente coberto e mandar
sair dali. Ao se aproximarem o outro Guarda Municipal diz:
31
- Calma ai! Vamos ver se está vivo.
Quando chegam mais perto a pessoa deitada, levanta a coberta, e olha de
sobressalto a dupla se aproximar. Os guardas recuam e encontram um motorista de
táxi que se aproximava dele, ele cumprimenta os Guardas e diz:
- Esse aí é tranquilo, ele ajuda a cuidar das lojas à noite, o pessoal das lojas
convive e cuida dele aqui.
Os guardas deixam o morador de rua dormindo, retornam para o micro-ônibus.
O Guarda Municipal que conduzia o veículo refere junto ao grupo de alunos:
-Não tem mesmo o que fazer, por isso está assim, a população protege eles,
depois reclamam que a praça está um lixo.
Uma das condições que vivemos durante o processo de formação foi o
tensionamento sempre presente da segurança pública e as pessoas em situação de
rua. O espaço urbano permitido para se viver não é o mesmo para todos, aos
estranhos, aqueles que subvertem a ordem, a pureza, aqueles que, por estarem em
outro lugar que não o esperado são vistos como “agentes poluidores” e que segundo
Bauman(1999) muitas vezes são aqueles os quais que nenhum lugar certo foi
idealizado, e que não foi reservado qualquer fragmento de ordem preparada pelos
homens. Sendo assim o mundo daqueles que procuram pureza é simplesmente
pequeno demais para acomodar a diversidade e diferença. O estranho também traz
potencialidade, revira e subverte o ambiente, imprime novas paisagens tem o impacto
de um terremoto nas territorializações. Como diz Selbach (2006) é o Flâneur pós
moderno, que imprime outros usos e tempos para a cidade, Inventa seu espaço e
busca que se conviva com ele, ainda que se busque negar sua existência ele constrói
sua rede de relações, inventa novos usos para a cidade enquanto se busca impõr a
eles lógicas hegemônicas, ainda que estas sigam a perversa linha da exclusão e da
higienização, gritam. Eu estou aqui!
Como também gritam de outra maneira o ‘estar aí’ os servidores e alunos do
Curso de formação, para trabalhadores-servidores que se constituem como uma
função, a manutenção da ordem no espaço público? Precisando questionar que
ordem estamos falando? Uma ordem estabelecida a serviço de quê? De quem? Neste
sentido o morador de rua é bom enquanto ele cuida das lojas, desde que não atrapalhe
32
o consumo, não perturbe o fluir de mercadoria... dentro desta perspectiva esta lógica
se mantém com a figura do: Ele é tranquilo!
Segundo Valencio et al (2008) historicamente o Brasil tem recrudescido as
práticas coercitivas que impedem a expressão da cidadania das populações em
situação de rua, através de ações truculentas como a busca pela eliminação do
cenário dos sujeitos vulneráveis seja pela ação pública ou de órgãos específicos,
chegando ao auge da beligerância e da tortura como forma de dominação política que
naturalizam o autoritarismo. De outro ponto se avolumam os grupos que cobram um
tratamento e um olhar para estas populações considerando as risco para a segurança
pública e buscando retroceder na interlocução com os direitos humanos destas
populações. O que se constata é que os órgãos de segurança pública seguem tendo
em suas pautas as questões de higienização e exclusão das pessoas em situação de
rua, com discursos que justificam a proteção de cunho higienista atrelando essas
pessoas a criminalidade e retirando seus pertences, fichando-as nos registros policiais
ou simplesmente levando as para outras cidades como justificativa de as devolver a
cidades natais. Em meio a esta conflitualidade encontram se os servidores da
segurança pública, uma sociedade e “cidadãos” que cobram a limpeza e exclusão dos
estranhos e a garantia e manutenção de direitos das pessoas fragilizadas pela
situação de rua. (Bauman, 1999).
4.3 CARTOGRAFIA DA POLIS: O DISPOSITIVO “POLÍCIA” COMO FERRAMENTA
DE CRIAÇÃO DAS “CLASSES PERIGOSAS”.
4.3.1. Traçados e Linhas: O Penta-ter
(...)Atento a patrulha de “gê-emes”(GMs) que está na esquina. “Que-ape”(QAP) para um indivíduo que vai passar por ai, é mulato, aspecto sujo, tá de calça
jeans e camisa amarela, é um conhecido penta-ter(53)7 do local.(...)
- Se visualizarem abordem ele.
7 53 (penta-ter)– Código policial utilizado para designar usuário de drogas. e incorporado a Guarda Municipal de Novo
Hamburgo, significa usuário de drogas, drogadicto, traficante ou ainda pode definir uma pessoa que não condiz com os lugares
idealizados para ela. “Fulano tem cara de penta-ter”.
33
A rede de rádio do treinamento é em um dado momento interrompida por esta
informação dada por um dos instrutores. A construção e inserção da máscara não se
dá sem dor, a educação em segurança pública perpassa a produção discursiva de
uma ordem militarizada, o suspeito, o perigoso tem uma face, um jeito de ser
geralmente identificado como o pobre ou marginal.
O conceito de polícia, segundo De Souza (2016), como instituição, tem origem
na palavra grega politeia (pólis = cidade + téia = administração). Este termo passa ao
latim com o mesmo sentido, governo, administração da cidade, no entanto com o
tempo passa a designar os interesses de tutela do governo e do estado, assim polícia
passa a designar a instituição incumbida de zelar pelos interesses do estado. Sua
própria função vem sendo moldada ao longo dos anos, construída diante das questões
e necessidades que se impõem na própria história social do ser humano, das
configurações e relações sociais que se impõem na contemporaneidade. Bengochea
(2004) cita, no caso específico da instituição policial brasileira, o período ditatorial
como marco de modelização desta prática. Segundo Sousa e Morais (2011) a
instituição policial tem legitimidade de ação quando algo que acontece não deveria
acontecer, ou, quando não acontece algo que deveria acontecer, é esta instituição
incumbida de usar da força a que o estado, através de suas organizações e
instituições, demanda para o cumprimento da lei e manutenção da ordem. É a
instituição que tem autorização ao uso da força e da coerção, embora dentro dos
preceitos e limites legais.
A Polícia é um órgão governamental, presente em todos os países, politicamente
organizados, cuja função é a de repressão e manutenção da ordem pública através
do uso da força, ou seja, realiza o controle social (SOUSA; MORAIS, 2011, p.3).
A história da polícia brasileira é marcada por lógicas escravocratas, clientelistas
e autoritárias, para Halloway (1997) este processo é percebido nos diversos
tratamentos que esta organização atribui aos sujeitos, aos quais, pretende atender e
a qual parcela da sociedade eles encontram se inseridos. Halloway (1997) atribui o
aparecimento do “dispositivo polícia” no contexto histórico brasileiro à vinda da família
real em 1808 ao país, criando assim estruturas burocráticas estatais ao modelo do
império Português. As primeiras polícias no Brasil têm origem mesmo antes da
república e da independência, sendo que data dessa época o surgimento das duas
34
principais estruturas corporativas policiais existentes no contexto social da atualidade,
as polícias militares e a polícia civil.
Em 1808 foi criada a Intendência-Geral de Polícia da Corte, com as tarefas
de zelar pelo abastecimento da Capital (Rio de Janeiro) e de manutenção da
ordem. Entre suas atribuições incluíam-se a investigação dos crimes e a
captura dos criminosos, principalmente escravos fujões. O intendente-geral
de polícia ocupava o cargo de desembargador, e seus poderes eram bastante
amplos. Além da autoridade para prender, podia também julgar e punir
aquelas pessoas acusadas de delitos menores. (SOUSA; MORAIS, 2011, p.
5).
Conforme Sousa e Morais (2011), a principal instituição a originar as polícias
militares foi a Guarda Real de Polícia. Criada em 1809 e organizada militarmente,
possuía amplos poderes para a manutenção da ordem pública, destacando-se que
ainda na atualidade esta é uma das principais atribuições das polícias militares, sendo
que estas corporações espelhavam os métodos brutais e violentos existentes nas ruas
e na sociedade em geral. Como resultado da ineficiência desta organização foi em
breve extinta, seus oficiais redistribuídos em unidades militares do exército e suas
praças dispensados. No mesmo ano, foram criadas as Guardas Municipais
permanentes, buscando suprir a falta da primeira. Note-se que neste período os
principais problemas de ordem pública decorriam da manutenção do processo
escravagista, sendo que estas corporações tinham na perpetuação deste sistema, seu
maior desafio.
No período da primeira república, com a abolição da escravidão, estas
corporações têm
seu
escopo alterado drasticamente, também devido
ao
reaparelhamento do aparato repressivo estatal. Para Sousa e Morais (2011), com a
abolição da escravatura e o surgimento do federalismo descentralizado, houve uma
rápida inflação das áreas urbanas do país, o que demandou profundas modificações
nas estruturas policiais. Com esta mudança social, o trabalho das polícias foi
reorientado da manutenção da ordem escravista, passando a focar na manutenção
da ordem da população urbana que crescia desenfreadamente migrando do campo
para as os centros urbanos.
Na era Vargas, a polícia tem seu papel reconfigurado novamente, para
atribuições de controle social de ordem política. Conforme Bretas e Rosemberg
(2013), data do período de governo Vargas o surgimento da polícia política como
órgão de controle e repressão dos dissidentes ao referencial ideológico do estado.
35
Neste sentido, certos grupos passam a ser mais vigiados e controlados pelos órgãos
policiais, são os ditos sujeitos subversivos: italianos, judeus, alemães, japoneses,
comunistas e anarquistas. No estado novo, o governo passa a ser o estado e a polícia
o principal órgão de poder da sociedade, pois personificava o aspecto executivo da
figura do ditador, configurando assim um novo projeto político ditatorial (CANCELLI,
1993).
Ao final da década de 50 e início dos anos 60, o país passa a viver um
conturbado momento político, pois algumas classes populares aumentam sua
participação política e o mundo, diante do período pós-guerra, vive as incertezas da
então insurgente guerra fria, com a separação entre comunismo x capitalismo. No
Brasil, alguns movimentos passam a consolidar aspectos políticos e culturais
desenvolvendo noções sociais como a de cidadania e luta por direitos humanos e
sociais. Porém, de acordo com Simões (2004), a elite empresarial brasileira, após a
queda de Getúlio Vargas, passa a projetar um desenvolvimento modernizante para
inserir o país como sociedade industrial no mercado internacional capitalista. Este
projeto partia de premissas conservadoras e excludentes e está ideologia encontrou
adeptos na então Escola Superior de Guerra (instituição de formação de oficiais do
exército brasileiro). Neste contexto, a chegada de João Goulart ao poder com a
renúncia de Jânio Quadros significava retrocesso ao projeto desenvolvimentista da
elite brasileira.
As classes dominantes e seus aparelhos ideológicos e políticos, no pré-64
apenas enxergavam baderna, anarquia, subversão e comunização do país
diante de legítimas iniciativas dos operários, camponeses, estudantes,
soldados e praças... Tais demandas em sua substância, reivindicavam o
alargamento da democracia política e a realização de reformas do capitalismo
brasileiro (TOLEDO, 2004, p.68).
De acordo com Cancelli (1993), este emaranhado de tensões e interesses
políticos difusos converge então no golpe militar de 1964. Instaurado o golpe militar,
o papel das polícias militares em muitos estados, como no caso de Minas Gerais, foi
incumbir-se de reforçar e orientar suas práticas como apoio ao exército, ocupando-se
neste período da manutenção da ordem em defesa de um patriotismo.
Com os adventos das crises políticas havidas no Brasil, no corrente ano, e
que gerou no seio do povo situação de expectativa e mesmo de ansiedade,
a Polícia Militar manteve-se de prontidão nos seus quartéis, velando pela paz
do Estado (OLIVEIRA, 1962, p.39).
36
Neste cenário, exacerba-se o papel repressivo e político das polícias que
passam a ter como incumbência combater a figura do “inimigo interno”. Na
contemporaneidade, o papel da polícia se redimensiona principalmente a partir do
processo de redemocratização do país. Na década de 1980, as organizações policiais
vêem seu papel questionado, principalmente as antigas práticas exercidas agora em
diante de uma sociedade dita de direitos. No início dos anos 1990, as corporações
policiais, cujas práticas históricas foram enrijecidas pelo período ditatorial, iniciam um
processo de rompimento com o modelo histórico do sistema policial, principalmente
devido às mudanças sociais e em especial, ao crescimento das práticas democráticas
e fortalecimento da noção de cidadania. Este descompasso entre as práticas policiais
e o contexto social produz nestas organizações uma crise (BENGOCHEA, 2004,
p.20). Novas práticas e propostas políticas passaram a ser pensadas na segurança
pública e no papel das polícias, como a abertura aos municípios da discussão sobre
seu papel na segurança pública. Cabe destacar que o papel da polícia não se trata de
campo estanque na atualidade, mas permeado por tensões e discursos, que ora
buscam construir políticas públicas inclusivas, democráticas e protetoras de direitos,
ora objetivam a manutenção de práticas repressivas e excludentes em defesa dos
interesses culturais e sociais de parcelas da sociedade.
4.4. GUARDAS MUNICIPAIS: ENTRE A (RE)INVENÇÃO DO CAMPO SEGURANÇA
PÚBLICA E A REPRODUÇÃO DAS VELHAS PRÁTICAS.
4.4.1. Traçados e Linhas: Vagabundo ou “Cidadão à margem da sociedade”.
Durante as atividades de ensino uma figura linguística surge, “o vagabundo”.
Um instrutor me relata estar incomodado com esta fala, que tem se tornado constante
e profere em uma de suas aulas:
-Não quero mais que usem o termo vagabundo!
Percebo que durante as próximas atividades a turma passa a referenciar
aqueles que antes nomeavam como vagabundo por: “Cidadão à margem da
sociedade”, este termo passa a se ampliar para alguns dos alunos passando a nomear
então aqueles sujeitos que além de cometerem crimes, ilícitos e outras situações não
37
bem aceitas pela sociedade como morar nas ruas, por vezes utilizam para aqueles
que não tem emprego ou ainda moram em locais tidos como violentos ou estão em
situação de pobreza, ou ainda não obedecem às leis de trânsito. Percebo que este
termo vai tomando ao longo da formação tom de deboche.
“- Daí o Vagabundo (ops) Cidadão à margem da sociedade, vai preso e a
família ainda fica ganhando dinheiro do estado para bancar ele, têm é que matar tudo!”
(Fala em uma discussão acalorada).
Os movimentos de repulsa e separação das diferenças, daquilo que foge de
uma identidade congelada, do desejo que vai produzindo movimentos outros e
inesperados assusta um grupo. Passa-se a olhar com repulsa, diferenciar e produzir
diferenciações negar a maquinaria social e se apregoar a uma identidade fixa e
cristalizada é um movimento necessários para aqueles corpos que se percebem
diante da possibilidade de se envolver pela diversidade e pluralidade. Deste platô
extinguir o plural parece ser a solução possível.
A Guarda Municipal de Novo Hamburgo foi criada a partir da lei 05/1990, com
efetivo inicial de 180 Guardas Municipais que iniciaram seus trabalhos no ano de 1992,
passando por curso de formação de 133 horas aula no um total de 15 dias. Sob
comando do primeiro diretor da Guarda Municipal o Cel. PM da reserva Sr. Antônio
Francisco Mesquita Salgado, sendo que este convidou para seu assessor na época,
o Subtenente. PM da reserva Natalício Inquelman Blanco.(GUARDA MUNICIPAL DE
NOVO HAMBURGO, 2019).
No ano de 2018, foram nomeados 12 servidores para participar do curso de
formação de Guardas Municipais em um curso constando com 830 horas aula,
conforme plano politico pedagógico do curso de formação (Guarda Municipal de Novo
Hamburgo, 2018)8. Após seis meses de curso os 12 servidores aprovados no curso
entram em exercício no dia 27 de novembro de 2018.(PREFEITURA MUNICIPAL DE
NOVO HAMBURGO, 2018).9
A função dos municípios na segurança pública pode ser pensada como um
desafio recente, principalmente após a constituição de 1988 que define em seu art.
8
Plano Politico pedagógico do Curso de Formação de Guardas Municipais de Novo Hamburgo, 2018.
Site
da
Prefeitura
Municipal
de
Novo
Hamburgo.
Disponivel
em:
<
https://www.novohamburgo.rs.gov.br/noticia/guarda-municipal-forma-turma-novos-agentes> Acesso
em: 31/05/2019.
9
38
144, no que trata da segurança pública em seu § 8 as disposições das competências
do município na segurança pública.
Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade
de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes
órgãos:(...)
(...) § 8º Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas
à proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei
(BRASIL, 1988).
Somente a partir da constituição federal de 1988 os municípios passaram a ser
pensados como entes colaborativos na segurança pública, sendo que, a partir do ano
2014, foi aprovado pelo congresso nacional e sancionado pela então presidenta Dilma
Rousseff a lei 13.022 que institui o Estatuto Geral das Guardas Municipais,
oficializando estas organizações e demarcando suas atribuições e funções na
segurança pública. Em seu texto, o estatuto não transforma as corporações de
segurança pública municipais em polícias, porém amplia o rol de atividades e
competências dentro das políticas de segurança pública. Segundo Kopttike (2016) o
ministério da justiça formulou e apresentou o projeto de lei em 2014, buscando garantir
que as guardas municipais não se tornem polícias militares dos municípios, porém ao
mesmo tempo não permaneçam restritas simplesmente ao cuidado dos prédios
públicos.
Em Novo Hamburgo, no ano de 1990, é instituída a guarda municipal através
da lei nº 5 de janeiro de 1990. No ano de 2008, a lei é alterada para comportar as
funções de fiscalização de trânsito em âmbito municipal.
Art 1. Fica criada a Guarda Municipal de Novo Hamburgo, corporação
uniformizada e armada, à qual caberá a proteção e a vigilância dos bens,
serviços e instalações do município, assim como zelar pelo sossego público
e cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito de
suas atribuições, no Município de Novo Hamburgo. - Redação dada pela Lei
nº 1794/2008.(NOVO HAMBURGO, 2008).
No ano de 2017, o município altera novamente as atribuições da Guarda
Municipal de Novo Hamburgo através da lei 3.067 de 2017 que atribui novas
competências a Guarda Municipal em seu anexo I.
Anexo I(...)Descrição Analítica: Promover a vigilância e proteção dos
logradouros públicos, realizando o policiamento diurno e noturno; promover a
vigilância dos próprios municipais; promover a segurança e fiscalização para
39
a utilização adequada dos parques, jardins, praças e outros bens de domínio
público, evitando a depredação; promover a vigilância das áreas de
preservação do patrimônio natural e cultural do município, bem como
preservar mananciais e a defesa de fauna, flora e meio ambiente; garantir a
segurança ao pleno desenvolvimento de atividades curriculares nas
instalações das escolas municipais; garantir a integridade física e moral de
toda a comunidade escolar no âmbito de competência municipal; exercer e
apoiar a fiscalização da prefeitura na aplicação da legislação relativa ao
exercício de poder de polícia administrativa do município, inclusive inibir e
impedir ocupação ou invasão de áreas públicas municipais destinadas às
políticas de habitação; promover a formação, qualificação, aperfeiçoamento
e habilitação dos integrantes da GM; capacitar e treinar seus servidores ao
desenvolvimento de aptidão física e de técnicas de defesa pessoal; Promover
palestras, cursos, treinamento e instruções da comunidade em geral, com
vista ao desenvolvimento a cidadania e consciência da preservação do
patrimônio público, meio ambiente e segurança ao trânsito; elaborar planos
de segurança para eventos instalações e espaços públicos sobre a
responsabilidade da comunidade; coordenar suas atividades em ações do
estado no sentido de oferecer e obter colaboração para ações integradas na
proteção e segurança da população em geral; proteger autoridades e
servidores do quadro efetivo quando de representação ou em exercício da
função administrativa operacional ou de fiscalização; promover a educação,
a orientação, controle e fiscalização do trânsito no âmbito da jurisdição e
circunscrição municipal; realizar escoltas de pessoas, cargas e valores
quando de interesse de responsabilidade do poder Público Municipal; garantir
a segurança dos locais e servidores quando em atividades de ação
comunitária ou de promoções de eventos populares sob a responsabilidade
do município.(NOVO HAMBURGO, 2017).
Neste sentido, o que muitos autores como Adorno (2016) têm discutido é o
lugar dentro das políticas de segurança pública ocupado pelas Guardas Municipais e
como estas têm buscado construir sua atuação. Na grande maioria dos casos o que
se observa é que estas corporações têm buscado seguir o modelo das polícias
militares no que tange a repressão, em muitos casos acabam reproduzindo práticas
de controle e segregatórias, ordenadas por modelos tradicionais das polícias militares.
Nesse sentido, para o autor, o que as guardas municipais emulam são práticas
idênticas as já executadas pelas polícias militares, citando ainda que, em vários casos,
há guardas municipais sendo capacitadas para o uso de fuzis, operando lógicas nas
quais não há um debate aprofundado a respeito do papel das guardas municipais nem
dos municípios no caso da segurança pública.
4.5. CENA: FORMAÇÃO EM SEGURANÇA PÚBLICA: POR UM SUL A SEGUIR.
“(Sancho) - Meu senhor, quem sabe possamos retornar às nossas humildes
casas, penso se a esta hora minha mulher, sua sobrinha e sua ama já devem à muito
40
procurar nós, se não andarem por aí a dizer que estamos mortos e a procurarem
nossos corpos. Pois lhe digo, meu senhor, a esta altura, pelo cansaço e pela fome
que aqui vou, estou já a abrir mão da ilha que me darias e da qual me faria
Governador.
(Dom Quixote) - Acalma te homem, tens falado muitas tolices acaso não sabes
que antes de ser governador o que de mais honroso há para um homem é sagrar se
cavaleiro, deveras não entende. Se soubesses que estas aventuras que travamos só
ocorrem para elevarmos o grande nome da formosa senhora dos meus dias a bela e
encantadora dama Dulcinéia do povoado de Toboso. Tu também se tivésseis grande
dama e o mínimo de honra, por ela farias as maiores peripécias.
Sigamos, pois, a partir de agora ao Sul, pois o Norte de todos os Feiticeiros,
magos e malfeitores é o Sul para que vamos seguir…
Sancho seguiu-o sem entender palavra do que Dom Quixote havia dito.”
Nosso norte é o sul, sem bairrismos buscamos aqui problematizar as
postulações, fugindo dos discursos dominantes no campo e no papel da segurança
pública, encontrarmos linhas de fuga, produção de desejo no social que cria
movimentos de singularidades, interessa-me discutir o papel das Guardas Municipais,
principalmente da Guarda Municipal de Novo Hamburgo, com o seguinte
questionamento: como tem sido conduzidas as formações nesta corporação? Como
não é consenso o lugar das guardas municipais nas políticas atuais, não há também
consenso entre as práticas e modelos formativos, cada município agindo e
promovendo cursos de formação conforme suas lógicas e demandas locais, bem
como os preceitos de determinada linha de comando. Embora recente a proibição de
Policiais Militares na direção destas corporações com o advento da lei 13.022/14
(BRASIL, 2014), o que se observa é que, em muitos municípios, oficiais das polícias
militares ainda assumem a posição de chefia sobre as guardas municipais como
secretários municipais de segurança pública (BISPO, 2016).
4.5.1. Traçados e Linhas Oito: O Guarda Municipal Dramin.
Era uma aula junto a uma corporação externa a Guarda Municipal, ocorria no
prédio do corpo de bombeiros e refere-se a conhecimentos sobre combate a incêndio.
41
Durante um momento da atividade um dos Alunos levanta a mão e solicita para
o palestrante que estava à frente:
- Posso sentar na primeira fileira? É que não estou me sentindo bem, tive de
tomar um Dramin.
(Risadas).
No retorno para a sede da Guarda alguns dos colegas(alunos) passam a
chamar o colega de GM Dramin.
4.5.2. Traçados e Linhas: O Perguntador
“(Instrutor) - O Guri novo é perguntador né?
(...) Daí ele começou com uma história de: E se isso, e se aquilo(...)
Já dei a real para ele. Para com esta história de e se..., e se…
Se não tu já vais se queimar aqui na Guarda.
Segundo FENAPEF (2016) os profissionais de segurança pública convivem
cotidianamente com processos de silenciamento e boicotes, seja por parte dos
comandos ou dos próprios profissionais de segurança pública. O policial que expõe
sua fragilidade ou medo, muitas vezes recebe a marca de menos operacional, assim
muitos. relacionam alto grau de assédio moral em instituições policiais e militares de
todos os níveis e relaciona estas relações com a característica de serem instituições
totais com alto grau normativo e burocrático que tende a engolir e englobar a
subjetividade e a afetividade dos trabalhadores. (CORREA et al, 2012).
Para De Miranda (2008) a cada vez que a mídia divulga casos de violência
policial, retoma-se o debate de discutir os currículos dos cursos de formação. Esta
autora refere ainda que, em pesquisas sobre as formações em segurança pública,
prevalecem a socialização dos indivíduos através do exercício da função,
marcadamente autoritárias e hierárquicas, pautadas no combate ao crime e na
capacitação aos conflitos armados. De Miranda (2008) propõe ainda que esta
característica não é marca única das polícias e instituições brasileiras, mas da maioria
dos países de orientação democrática, sendo que estas organizações mostram se
extremamente resistentes a mudanças na maioria dos países.
42
A partir da implementação da lei 13.022/14, muitos municípios que possuem
guardas municipais têm implementado mudanças na gestão das instituições, como
tentativa de ordenarem-se em direção ao cumprimento da legislação, tendo como fio
condutor novas ações, buscando adequar as formações em linhas preventivas e
comunitárias (BARROSO; MARTINS, 2016). O pano de fundo das ações são as
orientações políticas para formação estabelecidas pela Secretaria Nacional de
Segurança Pública e Ministério da Justiça.
Em 2004, o Ministério da Justiça, por meio da Secretaria Nacional de
Segurança Pública (Senasp), desenvolveu uma proposta para a formação
das guardas municipais usando como referência estratégica o Sistema Único
de Segurança Pública (Susp), no qual cada esfera (federal, estadual e
municipal) e instituição (policiais, bombeiros e guardas municipais) tinha
atribuições conectadas e articuladas para a promoção da segurança. Coube
aos municípios e às guardas municipais as atribuições de caráter
predominantemente comunitário e preventivo. (BARROSO; MARTINS, 2016,
p.43)
4.6. CENA - NOVOS ACOPLAMENTOS: É POSSÍVEL A MÁQUINA “POLÍCIA”
PRODUZIR DIREITOS?
“Dom quixote e Sancho seguiam pelos bosques da Mancha quando ao longe
avistaram alguns meninos por volta de 8 anos de idade.
Pois, nesta aventura até ia lá Sancho concordar com Dom Quixote, crente de
não haver o mínimo risco de se envolverem em encrencas.
O nosso cavaleiro andante se aproxima dos meninos que a colher frutos de
trepados em uma laranjeira estavam. De lá de baixo Dom quixote grita:
-Ei Garotos, de onde sois vós? pois devo levardes em segurança a suas mães!
Os meninos apavorados com as figuras, principalmente com Dom Quixote e
sua extravagante armadura e seu cavalo Rocinante, mais em pele e osso do que outra
coisa, começam a atirar laranjas nos cavaleiros. Por boa pontaria ou pela maior
silhueta, o primeiro que eles acertam é Sancho exatamente na cabeça, que de tão
forte pancada quase fica desacordado.
As próximas certamente acertam Dom Quixote que de uma só vez lhe arrancam
o elmo da cabeça, os dois assustados partem em disparada.
43
- Quem acreditaria meu velho amigo Sancho, pois certamente aí o mago
Arcalaus me prega das suas, não somente com gigantes, mas também e agora
através dos pequenos. ”
4.6.1. Traçados e Linhas: Quais são os Lugares que o Guarda pode habitar?
“Nunca
me
vi
neste
papel(...)
O
trabalho
com
as
crianças
me
surpreendeu...Hoje vejo que a função de Guarda Municipal, está muito mais em
trabalhar com estas crianças na proposta de prevenção…”
Em qual a cor da farda dos guardiões da ordem? Cecília Coimbra(2013)
discorre sobre a construção das políticas de segurança pública no país e sua
orientação histórica a manutenção da ordem relacionada a exclusão das classes
menos privilegiadas e de trabalhadores, neste sentido muitas vezes o lugar dos
órgãos de segurança pública no Brasil tem sido combater o inimigo interno desde a
doutrina da segurança interna proposta no período ditatorial. Os órgãos de segurança
pública têm pautado e orientado suas práticas em um modelo repressivo de
manutenção da ordem com vistas a estratificação social e proteção de grupos e
interesses específicos no país. Muitas das condições que vivem os policiais e agentes
da segurança pública dizem respeito a uma dupla contradição diante da inexistência
e ineficácia de políticas públicas para a segurança e a existência de valores morais
arraigados na sociedade brasileira que se pautam pela lógica do “Bandido bom é
bandido morto” os próprios meios de comunicação, a mídia e uma parcela
conservadora dominam a opinião e reafirmam o posicionamento da necessidade de
uma polícia violenta que dê conta de conter os crimes dos “marginais”.(CRUZ, 2016.
s.p).
4.6.2. Traçados e Linhas: Aproximação com o Inusitado.
“...Em frente à escola fui entregar uma fitinha (da campanha maio amarelo) e
disse pra ele:
- Pede para teu pai colocar em ti.
Ele me disse:
- Meu pai tá preso!
44
Na hora não saia nada, não sabia o que dizer, de repente veio baixinho, como
sem querer.
-Pede para tua mãe então!
É necessário discutir e questionar se as organizações de segurança pública
são capazes de reconstruir suas práticas em direção a uma ação mais solidária,
comunitária e responsável, com vistas à proteção dos direitos humanos e da
cidadania. Bicalho (2005) considera que é possível apostar em um modelo de
segurança pública e lógicas policiais, que divergem do modelo de combate ao “inimigo
interno” e da doutrina de segurança nacional que opera na lógica da guerra aos
“vagabundos que nos retiram os direitos de andar livremente pelo calçadão”
(BICALHO, 2005, p.10). O autor ainda convida a questionar: o que estamos fazendo
em direção a uma formação policial? Estas práticas estão incumbidas e responsáveis
socialmente, com reflexão da ação? Neste sentido, é importante discutir e questionar:
por que se mantém discursos como “direitos humanos são para bandidos” ou de que
“direitos humanos devem ser somente para humanos direitos” mantendo ainda as
dicotomias direta x esquerda?
Os agentes de segurança pública, segundo Cruz (2016) exercem a perversa
missão da manutenção da ordem estatal com um excessivo peso destacado para suas
vidas, ao mesmo tempo em que executam ações da violência estatal são também
vítimas dele, gerando um lugar de insegurança e medo em relação ao agir do policial.
O policial na ponta é em certa medida o carrasco do rei, para cumprir as mais difíceis
funções a que o estado lhe atribui, sejam desocupar famílias de uma área de invasão,
seja prender ou cumprir determinações de internação compulsória estes
trabalhadores se deparam com a possibilidade do inusitada e da incongruência: Ser
agente de promoção de cidadania e garantia de direitos e executar a manutenção do
papel institucional de um estado que nega os direitos e as diversidades.
45
5. DOM QUIXOTE ENCONTRA DULCINÉIA: DIÁLOGOS ENTRE A PSICOLOGIA
E A SEGURANÇA PÚBLICA.
5.1. CENA: OS ENCONTROS
O coração de Dom Quixote estava acelerado. Sancho não sabia, mas ele tinha
certeza que entre aquelas três donzelas, que caminhavam pela estrada afugentando
se do sol com sombrinhas na mão, junto delas estava Dulcinéia.
Ao chegarem perto das Damas Sancho cumprimentou as:
Boa tarde! Senhoritas.
- Dom Quixote que vinha um pouco atrás repreendeu-o.
- Desça do cavalo homem! Ajoelhe-se diante da mais formosa dama que toda
a terra já viu…
As mulheres começaram a rir(...)
Não entendiam nada dos disparates que Dom Quixote estava a proferir. Ele
falava em Amor mais belo que o de Amadis de Gaula e Oriana, que por hora
precisavam permanecer distantes enquanto ele o Cavaleiro da triste figura estivesse
a enfrentar todo o tipo de Bravuras para enaltecer o nome de tão magnífica donzela.
As mulheres assustadas, seguem viagem e Dom Quixote murmura para
Sancho.
- Ah, Sancho, não fosse eu tão valoroso Cavaleiro. Largaria tudo e seguiria com
a Doce Dama de Toboso, deixaria para vós toda a fama que conquistamos até agora.
Sancho retruca:
- Não esqueça senhor que ainda me falta a ilha para governar, que seja ainda
uma pequena e com poucas gentes.
- Mal sabes tu Sancho, não terás só ilhas, terás continentes!
A aproximação da psicologia com o campo da segurança pública, assim como
Dom Quixote em busca de sua amada Dulcinéia é uma aproximação-sonho, possível
e capaz desde que uma psicologia como ciência que conheça seu lugar e as
responsabilidades que opera diante das comunidades e coletivos com quem convive.
Precisa antes de tudo conhecer suas linhas de atuações ético-políticas como ciência,
para que possa mais do que profetizar e prescrever formas de ser e identidades
homogêneas, operar na potencialização da vida, que possa junto aos trabalhadores e
46
as comunidades viver com eles a miséria do mundo e ser companheira de viagem,
não como mera observadora, mas identificar-se e perceber as novas formas de
sofrimento e que muitas vezes como ciência contribui para que se fortaleçam.(GALLO,
2008, p. 72). A psicologia precisa produzir assim como as minhocas seu patuá, sua
razão de ser micropolítica, que a nível rizomático possa construir seu submundo e
talvez a partir deste lugar micropolítico, possa também destrua as raízes das antigas
práticas majoritárias, como as minhocas que alimentam se das raízes destas velhas
práticas em níveis ínfimos até o ponto em que estas já não sejam capazes de se
manter, fazendo aí que se imprimam mudanças nas paisagens e nos terrenos deste
campo através da criação e do surgimento de outros rizomas e outras relações mais
humanitárias e preocupadas com a vida em todos os seus níveis.
5.1.1. Traçados e Linhas: Ser Guarda é ser Psicólogo e Pedagogo
Durante as atividades de estágio um dos alunos relata a seguinte experiência:
Estava acompanhando uma dupla de Guardas Municipais “antigos” um colega
e uma colega e fomos chamados para auxiliar em uma escola, sobre um aluno que
agrediu um colega e ameaçou a professora.
Encontramos Ele. A Colega foi para um canto conversar com o menino.
Começou dizendo que já conhecia ele, que sabia que ele sempre agia assim e que
não queria mais saber dessas incomodações na escola(...). Ela (colega da Guarda)
seguia xingando ele (aluno), que parecia nem estar ouvindo…. De-repente, Ela
(Guarda) deu um tapa no braço dele. Eu me assustei, não sabia como agir, se falava
para ela que não achava legal aquilo, ou se ficava ali caso ele avançasse nela (ele já
era grande, podia não respeitar ela), como ela era a mais antiga não falei nada.
- Enquanto ela estava lá também xinguei ele, mas no fundo não achei certo o
que ela fez. Quando ela saiu chamei ele e tentei dar uma moral para ele, disse:
-Cara, a gente vê que tu é um guri bom, porque faz isso? Tu não quer ter uma
vida legal?
Ele disse que sim, que queria ir para o exército. Daí eu disse:
-Tu achas, que lá tu vai durar desse jeito? Lá, assim tu ias acabar preso, olha
o que eu mais quero é um dia te encontrar como um colega meu, não como bandido.
47
Colocando em xeque as dicotomias – mocinho x bandido – e transitando nas
bordas dos lugares de saber, talvez algo se irrompa nos caminhos já tão bem traçados
e delimitados moralmente no social.
5.1.2. Traçados e Linhas: Os Viajantes por perto
Em visita a um estabelecimento de ensino, aqueles que por desejo ou condição
imposta, pela necessidade de assumir o cargo, também nomeados como alunos
comentam que existe uma estrutura boa, relembram que onde estudaram nem sempre
tiveram estas condições, um dos instrutores fala:
- É que estamos em uma área nobre em outros bairros tem muita violência e
chinelagem.
Os corpos de início presos ancorados ainda por um desconhecido medo de
perderem-se, iniciam se tímidos nos espaços da escola, uma criança vem, abraça um
dos instrutores chama ele pelo nome, ele pergunta como está, diz para os alunos que
trabalhou nesta escola por, muito tempo fez muitos amigos, os corpos se afetam
surgem “flexibilizações”, sorrisos, olhares entre os alunos e as crianças, este se
aproximam, conversam. Alguns dos instrutores portam armas, as crianças se
aproximam querem saber, ver (tem medo e atração) por estes corpos capazes de
ceifar a vida de pessoas. Um dos instrutores diz:
“- É que nós bairros da periferia as crianças não têm medo de arma, chegam e
dizem: meu pai tem uma pistola dessa tio, essa é uma 380? Meu pai tem uma 9
milímetros ou uma Ponto 40.”
Alguns dos integrantes da turma deixam se levar, percebem se ocupar outro
espaço, permitem se encontrar com aqueles outros corpos, diversos e variados,
crianças, professores, educação, escolar, instituições, polícia. visitamos um espaço
de arte criado pelos alunos da escola, a turma passa a ampliar se, deixam se tocar,
surgem comentários diante de quadros, esculturas, maquetes e lembranças, revivem
a infância e permitem ser outros.
Ao sair da escola deparamo-nos com infrações de trânsito, comentários:
Pais que não respeitam, que ameaçam professoras por chamarem a guarda,
estes são os “tortos” só apreendem na base da multa, a turma concorda a cisão se
cria novamente eles/nós:
48
Deixa aos que a vivem o medo da incerteza a necessidade e busca urgente de
uma máscara de um terreno que possa suportar e conter o sujeito-devir que se forma.
Uma psicologia que conheça suas armaduras, que se tenha presente uma
responsabilidade, luta em defesa da vida e da potência de vida, não se furta de estar
próximo e de dialogar com a segurança pública. Cria espaços e se despe de
preconceitos dos mais diversos para considerar o que vivem as pessoas e as
comunidades, bem como os trabalhadores. Uma ciência que esteja próxima e cheire
a gente que se proponha a conviver com as misérias do humano seja de que ordem
elas forem. Saber questionar os processos e jogos de força que impõem as ações da
própria psicologia como ciência, da segurança e do estado buscando questionar seu
papel social e seu lugar como defensora da vida e potencializadora das multiplicidades
e diversidades, capaz de fomentar coletivos e incluir na agenda política e de
segurança pública esta discussão parece ser uma aproximação rica e muito
necessária na atualidade de tempos tão indigestos como os que vivemos na
atualidade quando se fala em segurança.
5.1.3. Traçados e Linhas: A procura de Dulcinéia.
Atividade de estágio, um dos alunos está em uma viatura designada para
cumprir uma ordem judicial, internação compulsória de uma gestante usuária de
drogas. Ele retorna da atividade e diz:
- Foi bem difícil, atender ela, estava resistente, convencê-la a ir para o tratamento,
mas o mais difícil foi ver que era uma guria nova, muito bonita, aquilo me chocou,
esperava ver uma mulher feia, magra destruída pela droga, não aquela guria, ela era
muito bonita ninguém diria que usava drogas.
Pensar o mundo do trabalho e o mundo da polícia implica olhar e refletir sobre
dois campos significativos. Na bricolagem de saberes e práticas, entendo
estar a possibilidade da construção de conhecimento que permita a
passagem da vida e a produção de possibilidades de mudanças e
deslocamentos institucionais. (BAIERLE, 2016, p. 961).
Um olhar que inclua a desconstrução dos lugares-dados: A mulher feia que usa
drogas... ou a mulher bonita que não usa drogas. Ou ainda, o sofrimento de acatar e
49
executar a imposição de uma internação compulsória a alguém, a uma gestante, pois
não parte dela esta escolha, mas, de uma ordem judicial.... Como situar-se nestes
entre-lugares do sofrimento e da função do trabalho na segurança pública? A
necessidade de criar mecanismos e dispositivos de saúde mental para os
trabalhadores é indispensável nesta aproximação buscando agenciamentos que
possibilitem a invenção da vida, no sentido de reconhecer e considerar que os
trabalhadores não são inertes a este processo, mas que o trabalho se constitui num
jogo de forças que transversalizam estas situações produzindo múltiplos sentidos.
A possibilidade de fazer fluxo onde o sintoma social está estagnado, de impor
movimentos e possíveis desterritorializações nos campos tão engessados,
flexibilizando o olhar de quem cotidianamente precisa lidar com as mais diversas
situações e circunstâncias, aproximando se daqueles que muitas vezes são vistos
como inimigos ou possíveis geradores de um conflito potencial pode ser pensada
como uma linha de fuga capaz de operar mudanças no social á partir do olhar da
psicologia.
Os profissionais dos serviços policiais, assim como das instâncias das
políticas de segurança pública vivem em seu cotidiano uma grande contradição
institucional, ser pedagogo da cidadania e dos direitos humanos em instituições em
que vários de seus próprios direitos são negados.
50
6. QUAL É O FIM DE UM CAVALEIRO ANDANTE?
Retornaram a dupla de Cavaleiros da divisa de Toledo. Depois do encontro e
da Derrota de Dom Quixote pelo homem que se dizia Rei da Gargantulia, mas que na
verdade era Sansão Carrasco, amigo de Dom Quixote, ele decidira que não poderia
mais ser um cavaleiro andante. Aquelas alturas Dom Quixote já havia há muito
decaído de suas forças e apaziguavam se seus “delírios”.
Sancho que via seu olhar não acreditava caído, pensava que isto não poderia
ser uma saída para tão nobre Cavaleiro, que ele mesmo tinha lá suas dúvidas, se por
vezes parecia tão louco, por vezes tinha lá suas razões. Pensava Sancho: quando em
sua vida teria vivido tantas aventuras não fora esta jornada que se permitirá viver com
o Cavaleiro da triste figura.
Dom Quixote Dizia:
- Vejo meu fiel Sancho, que minha hora se aproxima, não mais viver aventuras,
não mais jurar a beleza da encantadora Dulcinéia para mim parecem ser o fim da
linha.
Sancho quase parava no caminho, retrucava:
- Mas, meu senhor, o senhor ainda tem força no braço, derrotará muitos outros
gigantes.
- Não Sancho é chegada minha hora. E de um recobro de consciência disse
quero descansar meu magro Rocim e Voltar para minha Sobrinha e minha ama(...)
Sancho já havia perdido as esperanças quando pararam sob uma macieira,
Dom Quixote dormiu e acordou de um susto.
Sancho vendo aquilo disse:
- Está bem, meu senhor?
-Sim homem.
- Sancho, já te contei das aventuras que vivem os caçadores de dragões(...)
51
O homem se desperta de um incerto
Sonho de espadas e de campo plano,
Toca de leve a barba com a mão
Duvidando se está ferido ou extinto.
Não o perseguirão os feiticeiros
Que juraram seu mal. Por sob a lua?
Nada. O frio apenas. Apenas sua
Amargura nos anos derradeiros.
Foi o fidalgo um sonho de Cervantes
E Dom Quixote um sonho do fidalgo.
O duplo sonho os confunde e algo
Está ocorrendo que ocorreu muito antes.
Quijano dorme e sonha. Uma batalha:
Os mares de Lepanto e a metralha.
(Jorge Luís Borges, apud. Ministério da Cultura, 2001. p.25)
Esta pesquisa nada quis provar, não teve por propósito revirar o já revirado,
pretendeu mais contornar as paisagens e as deformações no espaço, causadas no
próprio tecido e território da segurança pública, que inevitavelmente se produz da
interação dos diversos corpos que compõem esta paisagem. Este trabalho não focou
nas manchetes nem nas matérias jornalísticas, que envolveram a formação, mas nas
entonações, nas lutas, na lágrima e no sorriso de canto, no falar e no silenciar, no
pulsar da pele e arrepiar dos pelos, no engolir seco e no faltar das palavras, na boca
que abre e grunhe em silêncio. Não se procurou nestas páginas revolucionar,
procurava-se resistir. Ainda nestas linhas não se pretendeu representar nada, nem
estratificar ao máximo dos instantes, tampouco ordena-los ou controla-los, o que se
almeja é fruir, liquefazer os instantes, observar seus fluxos negando qualquer
possibilidade de analogias ou metáforas, retratar uma paisagem que ao mesmo tempo
que se forma já não é ela mesma, pois está também em constante devir.
Assim, pensar uma psicologia implicada no social e a partir da segurança
pública impõe o desafio de sentir e cartografar perspectivas, que incluam uma
mudança nas relações que se estabelecem com o trágico, possibilitando arranjos em
que o mal-estar ali produzido seja capaz de reinserir a processualidade nos modos de
ser, abrindo-se para novas paisagens e novas formas de compor no mundo. Para que,
52
como propõe Rolnik (1995) essa psicologia possa constituir-se como fábrica de
hibridizações de forças e fluxos, produtora de diferenças fluindo aquilo que por
tendência tende a aglutinar-se, fazendo daí que se processe a eclosão de
acontecimentos.
Estes
questionamentos
levam
incessantemente
a
uma
problemática: vamos resistir ao trágico com as nossas ‘velhas’ moralizações na
manutenção da ordem ou afirmaremos o trágico na vida – e paradoxalmente na
segurança pública?
53
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58
APÊNDICE – 1 - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
Este é um convite para você participar da pesquisa: Experiências (em) formação:
Cartografias da segurança pública a partir da experiência de um curso de formação da Guarda
Municipal de Novo Hamburgo, que tem como pesquisador responsável o Aluno Alexandre Henrique
de Almeida, graduando em Psicologia pela Unisinos, sob supervisão da professora Zuleika Kohler
Gonzales.
Esta pesquisa pretende estudar os processos de construção dos modos de ser e pensar dos
profissionais de segurança pública, através da experiência como instrutor em um curso de formação
de Guardas Municipais no município de Novo Hamburgo. O motivo que nos leva a fazer este estudo é
conhecer a importância dos processos de formação no aprendizado dos servidores da Guarda
Municipal de NH. Caso você opte por participar, você concorda em responder a entrevistas,
questionários, ser observado durante o curso de formação pelo pesquisador, sendo discursos, falas e
comportamentos objetos deste estudo. Em todo este processo não haverá divulgação de seu nome,
nem de características que possam vir a identificá-lo. Durante a realização a previsão de riscos é
mínima, ou seja, o risco que você corre é semelhante àquele existente em um trabalho de grupo ou
uma conversa, porém caso aconteça algum desconforto, você pode a qualquer momento procurar o
pesquisador e este buscará minimizar este desconforto. Durante todo o período da pesquisa você
poderá tirar suas dúvidas ligando para o pesquisador Alexandre Henrique de Almeida pelo fone: (51)
997068016 ou e-mail: [email protected], ou para a professora Zuleika Kohler Gonzales, email: [email protected]
Você tem o direito de se recusar a participar ou retirar seu consentimento, em qualquer fase da
pesquisa, sem nenhum prejuízo para você. Os dados que você irá nos fornecer serão confidenciais e
serão divulgados apenas em congressos ou publicações científicas, não havendo divulgação de
nenhum dado que possa lhe identificar. Esses dados serão guardados pelo pesquisador responsável
por essa pesquisa em local seguro e por um período de 5 anos.
Sua assinatura a este documento, impresso em duas vias, uma que ficará com você e a outra
com o pesquisador responsável Alexandre Henrique de Almeida, indica sua concordância em participar
do estudo.
Novo Hamburgo, _____de____________________________ de 2018.
_______________________________________
Assinatura do participante da pesquisa
____________________________
Assinatura do pesquisador
________________________________
Assinatura da professora Orientadora
59
APÊNDICE – 2 - CARTA DE ANUÊNCIA DO LOCAL DE PESQUISA
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ANEXO I - PARECER CEP
61
62
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