Alimentos aos Cônjuges. Sob o regime do Código Civil de 2002, a prestação de alimentos entre ex-cônjuges (ou ex-companheiros por equiparação) é regulada, essencialmente, em dois artigos diversos. O art. 1.694, CC, estabelece que “podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação”. Por sua vez, o art. 1.704, CC, estabelece, na primeira hipótese, que “se um um dos cônjuges separados judicialmente vier a necessitar de alimentos, será o outro obrigado a prestá-los mediante pensão a ser fixada pelo juiz, caso não tenha sido declarado culpado na ação de separação judicial” (art. 1.704, caput, CC). Por outro lado, “se o cônjuge declarado culpado vier a necessitar de alimentos, e não tiver parentes em condições de prestá-los, nem aptidão para o trabalho, o outro cônjuge será obrigado a assegurá-los, fixando o juiz o valor indispensável à sobrevivência”. O art. 1.694, CC, visa a regular a situação, inusitada, mas não rara, do litígio de cônjuges e companheiros que habitam sob o mesmo teto e, além disso, a situação daqueles que cônjuges que se encontram separados, mas não divorciados (para aqueles que ainda admitem a existência da separação em nosso sistema). O art. 1.704, CC, complementando a regra anterior, irá apresentar um critério de culpa, para nos dizer que o cônjuge culpado só tem direito ao “indispensável à sobrevivência”; consequentemente, o não-culpado terá direito a alimentos “para viver de modo compatível com a sua condição social”. Tem-se, portanto, que o cônjuge só pode pedir alimentos para aquele com quem tem relacionamento. Esse direito é de receber assistência e, após a separação, se transforma em direito de perceber alimentos. A pensão devida ao cônjuge, não é demais lembrar, não se confunde com aquela devida aos filhos. “Para a manutenção dos filhos, os cônjuges separados judicialmente contribuirão na proporção de seus recursos” (Art. 1.703). Duas são as condições para que o cônjuge faça jus aos alimentos: a) Separação sem culpa sua, necessidade e possibilidade. Conforme o art. 1.703, “na separação judicial litigiosa, sendo um dos cônjuges inocente e desprovido de recursos, prestar-lhe-á o outro a pensão alimentícia que o juiz fixar, obedecidos os critérios estabelecidos no art. 1.694”. Estes alimentos são civis e o cônjuge inocente “terá direito à mesma condição social de que desfrutava durante o casamento, mantendo seu padrão de vida” (MHD, p. 562). b) Separação com culpa sua, necessidade, possibilidade e ausência de outra forma de sobrevivência. Conf. art. 1.704, par. único, CC, “se o cônjuge declarado culpado vier a necessitar de alimentos, e não tiver parentes em condições de prestá-los, nem aptidão para o trabalho, o outro cônjuge será obrigado a assegurá-los, fixando o juiz o valor indispensável à sobrevivência”. Os alimentos aqui terão caráter humanitário, sendo simplesmente naturais. Nenhum dos dois artigos sob análise estabelece o que se passa com cônjuges divorciados. O art. 1.704, CC, deixa claro que a obrigação de prestar alimentos pode ser constituída posteriormente à separação, mas não deixa claro se, após o divórcio, as partes podem ser tornar credoras uma das outras de alimentos. Três soluções são teoricamente possíveis: (i) caso um dos cônjuges já esteja separado, mas não divorciado, e receba pensão, o pagamento persiste mesmo após o divórcio; (ii) não assiste aos divorciados direito de constituir pensão cujos requisitos não existiam por oportunidade do divórcio; (iii) os divorciados estão indefinidamente ligados entre si e podem, a qualquer tempo, vir a pleitear alimentos 1. De modo geral, admite-se que, por situações surgidas após o divórcio, um cônjuge venha a pleitear alimentos do outro. Essa possibilidade é enfatizada em situações de miserabilidade 2. A prevalecer 1 Paulo Lobo. Famílias. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 354. RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE ALIMENTOS DEDUZIDA EM FACE DE EX-CÔNJUGE - AUSÊNCIA DE PEDIDO DE FIXAÇÃO DO ENCARGO NO DIVÓRCIO LITIGIOSO - IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA E RENÚNCIA TÁCITA RECONHECIDAS NA SENTENÇA DE PRIMEIRO GRAU - MANUTENÇÃO DA EXTINÇÃO DO FEITO, SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO (ART. 267, VI, DO CPC), PELO ACÓRDÃO LOCAL. INSURGÊNCIA DA ALIMENTANDA. 1. Tese de violação ao art. 1.704 do Código Civil. Acolhimento. Alimentos não pleiteados por ocasião do divórcio litigioso. Requerimento realizado posteriormente. Viabilidade. Impossibilidade jurídica afastada. Renúncia tácita não caracterizada. 2. Não há falar-se em renúncia do direito aos alimentos ante a simples inércia de seu exercício, porquanto o ato abdicativo do direito deve ser expresso e inequívoco. 3. Em atenção ao princípio da mútua assistência, mesmo após o divórcio, não tendo ocorrido a renúncia aos alimentos por parte do cônjuge que, em razão dos longos anos de duração do matrimônio, não exercera atividade econômica, se vier a padecer de recursos materiais, por não dispor de meios para suprir as próprias necessidades vitais (alimentos necessários), seja por incapacidade laborativa, 2 essa visão, o art. 1.704, CC, é aplicado para além de seu significado literal, para abranger os cônjuges separados e divorciados. No nosso sentir, os divorciados só podem pleitear alimentos entre si quando seu pedido assenta-se sobre situação fática existente na data do divórcio. Por conseqüência, o cônjuge divorciado nada deve para com aquele que conviveu por fatos posteriores a dissolução do matrimônio. A restrição aos alimentos quando do divórcio é consentânea com a dinâmica social contemporânea, na qual o casamento torna-se cada vez mais transitório, com inúmeras pessoas casando-se por diversas vezes ao longo de suas vidas. Não há sentido tratar o casamento como um vínculo vitalício, a impor deveres recíprocos, como se parentes fossem, mesmo após o divórcio3. Também é necessária cautela no que diz respeito à culpa. Como grande parte da doutrina4 e da jurisprudência5, este julgador entende que a avaliação da culpa proposta pelo art. 1.704, CC, perdeu o seja por insuficiência de bens, poderá requerê-la de seu ex-consorte, desde que preenchidos os requisitos legais. 4. Recurso especial provido, a fim de afastar a impossibilidade jurídica do pedido e determinar que o magistrado de primeiro grau dê curso ao processo. (REsp 1073052/SC, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 11/06/2013, DJe 02/09/2013) “APELAÇÃO CIVIL. FAMÍLIA. ALIMENTOS. CÔNJUGE. CULPA. MÍNIMO VITAL. BINÔMIO NECESSIDADE/POSSIBILIDADE ATENDIDO. RECURSO DESPROVIDO. - A análise da responsabilidade pelo fim do casamento não se presta a indeferir os alimentos pleiteados. A identificação da responsabilidade pelo fim do casamento serve exclusivamente para limitar o valor da prestação de alimentos, sendo que ao culpado somente caberá perceber o necessário para a manutenção de um mínimo vital, ainda assim, após a verificação que não é apto para o trabalho e nem possua parentes a quem o possa socorrer. - os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada. (artigo 1.694, § 1º, do Código Civil). Negou-se provimento aos recursos” (Acórdão n.555424, 20090710249317APC, Relator: LÉCIO RESENDE, Revisor: LECIR MANOEL DA LUZ, 1ª Turma Cível, Data de Julgamento: 07/12/2011, Publicado no DJE: 15/12/2011. Pág.: 82) 3 Vide nesse sentido, NOGUEIRA DA GAMA, Guilherme Calmon. Comentários ao Código Civil Brasileiro. Rio de Janeiro: Forense, 2005, vo. XV, p. 365; JOSÉ LUIZ GAVIÃO DE ALMEIDA. Direito Civil. Família. Elsevier, 2008, p. 261; TJMG, APC 1.0687.06.043698-/001, 4ª CC, Des. José Francisco Bueno, j. 28.5.2009 4 Grande parte da doutrina, no entanto, vem negando aplicação ao art. 1.704, CC, sob o argumento de que, com a extinção da separação pela EC 66/2010, não há mais que se avaliar culpa para quaisquer fins em direito de família (vide, exemplificativamente, Maria Berenice Dias. Manual de Direito das Famílias. 7ª Ed. São Paulo: RT, 2010, p. 516; vide Milton Paulo de Carvalho Filho, In CC Comentado. Coord. Cezar Peluso, p. 1715). Maria Berenica Dias indica, para ser preciso, que o que se pode discutir, não é a culpa pela separação, esta abolida, mas a culpa pela situação de “necessidade”, indicando que se a “necessidade” advém da culpa do alimentando, os alimentos não são devidos. 5 Para além das discussões teóricas a respeito do papel da culpa no divórcio, é certo que a jurisprudência do e. TJDFT aponta, de forma uníssona, para a irrelevância da questão. Esse entendimento é anterior à Emenda Constitucional n. 66 e merece ser prestigiado na hipótese dos autos. Acresça-se que decisão interlocutória já havia indeferido provas com esse fundamento, sem recurso pelas partes. CIVIL. FAMÍLIA. DIVÓRCIO DIRETO LITIGIOSO. RECONVENÇÃO. ALEGAÇÃO DE CULPA. NÃO CABIMENTO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. 1. A ação de divórcio é direito potestativo da parte, não havendo que se perquirir a respeito da culpa. Dessa forma, comprovada a condição de casados, de que não mais coabitavam, a inexistência de bens a partilhar, tem-se por acertado o julgamento antecipado da lide e a consequente decretação do divórcio pelo julgador monocrático, repelindo-se a alegada violação ao artigo 5º, incisos LIV e LV, da Constituição Federal. 2. Tendo em vista a improcedência do pedido reconvencional, bem assim o princípio da causalidade, o réu-reconvinte deve suportar as verbas de sucumbência. 3. Recurso de apelação não provido. Sentença mantida. (Acórdão n.636368, 20120110230492APC, Relator: FLAVIO ROSTIROLA, Revisor: CESAR LABOISSIERE LOYOLA, 1ª Turma Cível, Data de Julgamento: 21/11/2012, Publicado no DJE: 29/11/2012. Pág.: 75) APELAÇÃO CÍVEL. DIVÓRCIO LITIGIOSO. DIREITO POTESTATIVO. DESNECESSIDADE DE ATRIBUIÇÃO DE CULPA A UM DOS CÔNJUGES OU LAPSO TEMPORAL. EC Nº 66/2010. Sendo o divórcio direito potestativo, está condicionado apenas e tão-somente ao pedido de uma das partes, não havendo falar-se em necessidade de verificação de culpa ou lapso temporal para sua decretação, após a promulgação da Emenda Constitucional nº 66/2010, a qual modificou a redação do art. 226, §6º da CF/88. (Acórdão n.687606, 20110111726092APC, Relator: CARMELITA BRASIL, Revisor: WALDIR LEÔNCIO LOPES JÚNIOR, 2ª Turma Cível, Data de Julgamento: 26/06/2013, Publicado no DJE: 28/06/2013. Pág.: 67) DIREITO DE FAMÍLIA. APELAÇÃO CÍVEL. DIVÓRCIO DIRETO. CITAÇÃO POR EDITAL. REVELIA. CURADORIA ESPECIAL. SUBSTITUIÇÃO PROCESSUAL. RETORNO AO USO DO NOME DE SOLTEIRA. IMPOSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO DO CÔNJUGE VIRAGO. DIREITO PERSONALÍSSIMO. RECONHECIMENTO. 1. A novel legislação civil (CC/2002), recriando paradigmas, afastou-se da busca pela apuração de culpa quando do desfazimento da união conjugal, fazendo desaparecer, por conclusão lógica, a obrigatoriedade do cônjuge virago de voltar a assinar o nome de solteira, a teor dos artigos 1571 e 1578, da legislação de regência. 2. Para que haja a mudança de nome do cônjuge que incorpora o patronímico do outro consorte por ocasião do casamento, faz-se necessária a manifestação pessoal do interessado, não permitindo, dita manifestação, ser substituída por decisão judicial ex officio, ou mesmo em atendimento a pedido do outro cônjuge, por tratar-se de direito que integra os atributos da personalidade. 3. Apelação conhecida e provida. (Acórdão n.588638, 20110310089238APC, Relator: MARIO-ZAM BELMIRO, Revisor: NÍDIA CORRÊA LIMA, 3ª Turma Cível, Data de Julgamento: 02/05/2012, Publicado no DJE: 29/05/2012. Pág.: 129) APELAÇÃO CÍVEL. DIVÓRCIO. AUSÊNCIA DE CONTESTAÇÃO. NULIDADE INEXISTENTE. PEDIDO DE ALIMENTOS. INOVAÇÃO RECURSAL. 1. Não sendo o alegado impedimento de acesso aos autos para apresentação de contestação comprovado, inexiste nulidade a ser reconhecida. 2. O divórcio prescinde da comprovação de culpa. 3. É inadmissível a inovação de pedido em sede recursal, sob pena de supressão de instância. (Acórdão n.437291, 20080111106866APC, Relator: FERNANDO HABIBE, Revisor: ARNOLDO CAMANHO DE ASSIS, 4ª Turma Cível, Data de Julgamento: 04/08/2010, Publicado no DJE: 09/08/2010. Pág.: 80) CIVIL E PROCESSUAL CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE INDEFERE RECONVENÇÃO EM AÇÃO DE DIVÓRCIO DIRETO - IMPROVIMENTO DO RECURSO. - A ação de divórcio direto tem como fundamento legal a separação judicial por mais de um ano ou a comprovada separação de fato por mais de dois anos, sendo despicienda qualquer discussão acerca da culpa em tal sede, ao manejo da via reconvencional. Não perde a eficácia a medida liminar concedida sentido com a extinção da separação pela EC 66/2010. Não há mais que se avaliar culpa para quaisquer fins em direito de família6. A pergunta que deve ser feita, diante desse cenário, é se, com a supressão da culpa, ainda deve ser feita alguma diferença no patamar dos alimentos devidos por um cônjuge a outro. Em outras palavras, quer-se saber se após o divórcio, um cônjuge deve ao outro alimentos meramente suficientes para a sobrevivência ou pode estar obrigado a manter o patamar de vida anterior 7. A solução mais consentânea é aquela que busca equilibrar, de um lado, a idéia de divórcio e, de outro, idéia de que os cônjuges não devem ser punidos pelo fim do relacionamento. Os alimentos devem ser, na medida do possível, temporários ou atrelados à necessidade da parte credora. Mas, se a culpa não é relevante para o divórcio, nenhum dos cônjuges pode se ver tolhido da possibilidade de pleitear alimentos segundo a regra do art. 1.704, CC, ou seja, para além do indispensável para a sua sobrevivência. Note-se que há aqueles que buscam resgatar a necessidade de prestação de alimentos entre ex-cônjuges, adicionando um elemento objetivo, qual seja, o grande desnível na situação patrimonial. Aos alimentos fixados nessa situação, boa parte da doutrina convencionou denominar “alimentos compensatórios”. Confira-se: “Jorge O. Azpiri define a pensão compensatória no Direito espanhol como uma prestação periódica em dinheiro, efetuada por um cônjuge em favor do outro por ocasião da separação ou do divórcio vincular, se disso provier desequilíbrio econômico em comparação com o estilo de vida experimentado durante a convivência matrimonial, para compensar, desse modo, a sensível disparidade no padrão social e econômico do separando alimentário, comprometendo, com a ruptura das núpcias, os seus em ação cautelar de separação de corpos, ainda que escoado o prazo legal para o ingresso de ação principal, sem submissão ao art. 806 do CPC. (Acórdão n.191098, 20020020079786AGI, Relator: DÁCIO VIEIRA, 5ª Turma Cível, Data de Julgamento: 15/09/2003, Publicado no DJU SECAO 3: 27/05/2004. Pág.: 49) “CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DIVÓRCIO LITIGIOSO. APELAÇÃO. AUDIÊNCIA DE RATIFICAÇÃO. DESNECESSIDADE. IMPROVÁVEL A OBTENÇÃO DE ACORDO. CASAL SEPARADO DE FATO POR LONGO PERÍODO. IMPUGNAÇÃO POR MOTIVOS RELIGIOSOS. DOGMAS NÃO IMPONÍVEIS AO OUTRO CÔNJUGE. ESTADO LAICO COM LIBERDADE DE CRENÇA. ART. 19, I e 5º, VII DA CF. DISSOLUÇÃO DO MATRIMÔNIO. DIREITO POTESTATIVO. EMENDA CONSTITUCIONAL Nº 66/10. ART. 226, § 6º DA CF E art. 1571, § 1º DO CC/02. SEM CONTROVÉRSIA QUANTO AOS EFEITOS JURÍDICOS DO DIVÓRCIO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Apelo interposto contra sentença que decretou o divórcio entre os litigantes, sem a designação de audiência conciliatória. 1.1. Recorrente alega que dissolução do vínculo matrimonial constitui afronta aos seus princípios religiosos e assevera ser indispensável a tentativa judicial de acordo entre as partes, face a avançada idade do apelado. 2. A associação da velhice à debilidade intelectual é posicionamento equivocado, pois o avançar da idade não conduz a presunção absoluta de incapacidade civil do indivíduo. 2.1. Sendo o recorrido sujeito sobre o qual não pairam quaisquer das hipóteses de interdição previstas nos art. 3º e 4º do Código Civil, deve ter sua autonomia de vontade respeitada, sob pena de implicar em discriminação etária e ofensa a isonomia de direitos (arts. 1º, IV, 5º da CF e arts. 2º e 4º da Lei 10.741/2003) 3. Desnecessária a realização de audiência de conciliação em ação de divórcio litigioso, especialmente, quando os elementos demonstram ser improvável a obtenção de acordo entre os cônjuges separados por longo lapso temporal. 3.1. Precedentes do STJ e desta Corte. 4. A Emenda Constitucional nº 66 de 14 de julho de 2010, que conferiu nova redação ao § 6º do art. 226 da CF, inseriu no ordenamento jurídico pátrio a permissão para que qualquer dos cônjuges ingresse com o pedido de divórcio, independente de prévia separação judicial e de perquirição quanto à culpa pelo declínio do casamento. 4.1. "Sendo o divórcio direito potestativo, está condicionado apenas e tãosomente ao pedido de uma das partes, não havendo falar-se em necessidade de verificação de culpa ou lapso temporal para sua decretação, após a promulgação da Emenda Constitucional nº 66/2010, a qual modificou a redação do art. 226, §6º da CF/88" (20110111726092APC, Rel. Carmelita Brasil, 2ª Turma Cível, DJE 28/06/2013). 5. O Código Civil atual também confere ao divórcio poder de dissolução do casamento (art. 1571, §1º), identificando os legitimados a propor a demanda (art. 1582) e esclarecendo a dispensa/faculdade da partilha de bens para a sua decretação (art. 1581). 6. O Estado brasileiro, como ente democrático e laico, ocupa posição imparcial em assuntos religiosos, não apoiando ou discriminando nenhuma religião, mas respeitando a coexistência das múltiplas crenças, nos termos dos arts. 19, I e 5º, VII da CF. 6.1. Com o fim do afeto que unia o casal, não faz sentido forçar a permanência de uma relação conjugal, em detrimento da dignidade e da liberdade religiosa do cônjuge infeliz com o matrimônio. 7. O objeto cognitivo das ações de divórcio não consensual é extremamente restrito. A litigiosidade da demanda não deve repousar sobre conflitos de vontade e de atuação 7.1. Não havendo controvérsias quanto aos efeitos jurídicos da dissolução, o divórcio é direito potestativo assegurado pela Constituição Federal, em seu art. 226, § 6º. 8. Recurso conhecido e desprovido” (Acórdão n.902684, 20140110315217APC, Relator: JOÃO EGMONT, Revisor: LEILA ARLANCH, 2ª Turma Cível, Data de Julgamento: 21/10/2015, Publicado no DJE: 03/11/2015. Pág.: 168) 6 Na doutrina, vide REGINA BEATRIZ TAVARES DA SILVA. Dissolução da sociedade e do vínculo conjugal. In o Novo Código Civil. Homenagem ao Prof. Miguel Reale. 2ª Ed. Ltr. Mas a solução não é unânime: “RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. SEPARAÇÃO E DIVÓRCIO. PROVA INÚTIL E QUE FERE O DIREITO À PRIVACIDADE PREVISTO NA CONSTITUIÇÃO. SEGURANÇA CONCEDIDA. 1. O direito líquido e certo a que alude o art. 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal deve ser entendido como aquele cuja existência e delimitação são passíveis de demonstração de imediato, aferível sem a necessidade de dilação probatória. 2. A culpa pela separação judicial influi na fixação dos alimentos em desfavor do culpado. Na hipótese de o cônjuge apontado como culpado ser o prestador de alimentos, desnecessária a realização de provas que firam seu direito à intimidade e privacidade, porquanto a pensão não será aferida em razão da medida de sua culpabilidade (pensão não é pena), mas pela possibilidade que tem de prestar associada à necessidade de receber do alimentando. 3. Recurso ordinário provido” (RMS 28.336/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, QUARTA TURMA, julgado em 24/03/2009, DJe 06/04/2009) 7 A indicar que os alimentos devem seguir o padrão de vida, vide LUIZ FELIPE BRASIL SANTOS. A separação judicial e o divórcio no novo Código Civil. In o Novo Código Civil e a Constituição. Livraria do Advogado, p. 288. compromissos materiais, seu estilo de vida e a própria subsistência” (Rolf Madaleno. Obrigação, Dever de Assistência e Alimentos Transitórios. In R. CEJ, Brasília, n. 27, p. 69-78, out./dez. 2004). "ALIMENTOS COMPENSATÓRIOS. MANUTENÇÃO DO EQUILÍBRIO ECONÔMICO-FINANCEIRO. Alimentos compensatórios são pagos por um cônjuge ao outro, por ocasião da ruptura do vínculo conjugal. Servem para amenizar o desequilíbrio econômico, no padrão de vida de um dos cônjuges, por ocasião do fim do casamento. Fixados em valor razoável, não reclamam elevação. Agravo não provido” (TJDFT, 20080020195721AGI, Relator JAIR SOARES, 6ª Turma Cível, julgado em 10/06/2009, DJ 17/06/2009 p. 80) “Os chamados alimentos compensatórios, ou prestação compensatória, não têm por finalidade suprir as necessidades de subsistência do credor, tal como ocorre com a pensão alimentícia regulada pelo art. 1.694 do CC/2002, senão corrigir ou atenuar grave desequilíbrio econômico-financeiro ou abrupta alteração do padrão de vida do cônjuge desprovido de bens e de meação. 6. Os alimentos devidos entre ex-cônjuges devem, em regra, ser fixados com termo certo, assegurando-se ao alimentando tempo hábil para sua inserção, recolocação ou progressão no mercado de trabalho, que lhe possibilite manter, pelas próprias forças, o status social similar ao período do relacionamento. 7. O Tribunal estadual, com fundamento em ampla cognição fático-probatória, assentou que a recorrida, nada obstante ser pessoa jovem e com instrução de nível superior, não possui plenas condições de imediata inserção no mercado de trabalho, além de o rompimento do vínculo conjugal ter-lhe ocasionado nítido desequilíbrio econômico-financeiro. 8. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, parcialmente provido para fixar o termo final da obrigação alimentar” (REsp 1290313/AL, Rel. Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA, QUARTA TURMA, julgado em 12/11/2013, DJe 07/11/2014) [analisar] RECURSO ESPECIAL. FAMÍLIA. AÇÃO DE EXONERAÇÃO DE ALIMENTOS. CASAMENTO SOB O REGIME DE COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS. ALIMENTADA APTA AO TRABALHO. ACORDO DE SEPARAÇÃO EM QUE ASSUMIDA OBRIGAÇÃO ALIMENTAR. PACTO COM NATUREZA DE CONSTITUIÇÃO ONEROSA DE RENDA VITALÍCIA. INAPLICABILIDADE DO ART. 1.699 DO CÓDIGO CIVIL. 1. Tendo sido estabelecido, pela instância ordinária, que a prestação recebida pela ré, embora intitulada de alimentos, tem natureza de renda vitalícia (Código Civil arts. 803 e seguintes), ajustada, no acordo de separação, "como verdadeiro sucedânio da partilha de bens" a que faria jus, não se lhe aplica a disciplina do art. 1.699 do Código Civil, segundo a qual os alimentos são estabelecidos conforme a necessidade do alimentado e a possibilidade do alimentante. 2. Igualmente não se confunde tal prestação com a construção doutrinária dos "alimentos compensatórios", cujo escopo, nos termos do decidido no Recurso Especial n° 1.290.313/AL (4ª Turma, relator Ministro Antônio Carlos Ferreira) volta-se a "corrigir ou atenuar eventual desequilíbrio econômico-financeiro decorrente da ruptura do vínculo conjugal, em relação ao cônjuge desprovido de bens e de meação." 3. Recurso especial não provido. (REsp 1330020/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 04/10/2016, DJe 23/11/2016) AGRAVO DE INSTRUMENTO. REVISÃO DE ALIMENTOS. DIVÓRCIO. Em razão do divórcio dos litigantes, não perdura mais o dever de mútua assistência, eis que dissolvido o vínculo matrimonial, e, por conseqüência, os deveres a ele inerentes. Destarte, os alimentos então estipulados passaram a não mais decorrer do vínculo matrimonial extinto, mas, sim, da obrigação contratual assumida. Por conseguinte, não há possibilidade jurídica no pleito de elevação da verba alimentar, visto que o fundamento decorrente do vínculo matrimonial não mais subsiste. NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME. (Agravo de Instrumento Nº 70075184606, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 08/02/2018) Como a idéia de “alimentos compensatórios” sem culpa é uma criação doutrinária recente, a doutrina e alguns arestos apontam a necessidade de sua fixação quando a divisão de bens não opera efeitos práticos. Maria Berenice Dias, por exemplo, afirma que “também cabe a concessão de alimentos compensatórios quando os bens do casal que produzem rendimentos permanecerem na administração exclusiva de um do par” (Maria Berenice Dias. Manual de Direito das Famílias. 7ª Ed. São Paulo: RT, 2010, p. 537). Nessa hipótese, diante do nítido caráter indenizatório, não cabe prisão civil (idem). Também não se discute aí o binômio possibilidade e necessidade, pois o que está em jogo é a manutenção de um determinado padrão de vida. Com a devida vênia aos posicionamentos de doutrina e jurisprudência que advogam essa última possibilidade, deve-se convir que ela não é consentânea com a fluidez dos relacionamentos modernos. O casamento contemporâneo deve conviver harmoniosamente com a possibilidade de seu fim, para que as pessoas relacionem-se exclusivamente por afeto, sem medo de que, ao escolherem o convívio, possam ficar eternamente vinculadas àqueles pelos quais já não nutrem qualquer sentimento. Para além disso, estabelecida uma co-propriedade sobre determinado bem, se um condômino se vê usurpado da possibilidade de fruir o bem, cabe-lhe indenização civil na proporção dos frutos civis que deixou de auferir. Não se trata, portanto, de manter determinado padrão de vida social, mas do justo direito de ver-se indenizado na exata proporção do prejuízo que vier a sofrer.