A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO DE 2015 A NOVA GEOGRAFIA DA PRODUÇÃO DE COCO NO BRASIL LEANDRO VIEIRA CAVALCANTE1 Resumo: O objetivo deste artigo é apresentar algumas das principais características da nova geografia da produção de coco no Brasil, evidenciada a partir de uma importante reestruturação produtiva que atinge esse setor desde meados dos anos 1990, responsável, dentre outras coisas, pela reorganização do circuito espacial de produção do fruto, pela modernização do seu cultivo e pela dispersão da sua produção pelo país, trazendo fortes rebatimentos socioespaciais e territoriais. Palavras-chave: Produção de coco; reestruturação produtiva; dispersão espacial da produção. Abstract: The objective of this paper is to present some of the main features of the new geography of coconut production in Brazil, evidence from a major restructuring process that reaches this sector since the mid-1990s, responsible, among other things, for the reorganization of the spatial circuit fruit production, the modernization of cultivation and the dispersion of production across the country, bringing strong socio-spatial and territorial repercussions. Keywords: coconut production; productive restructuring; spatial dispersion of production. 1 – Introdução Nota-se que sobretudo a partir de meados da década de 1990 a produção agrícola brasileira passa a receber com mais intensidade influência direta da tecnologia, da ciência e da informação, signos do atual período histórico chamado por Santos (1996, 2009) de técnico-científico-informacional, que tem na globalização da produção e do consumo um de seus pilares fundamentais, conforme indica Elias (2003, 2007). Com isso, é visível a intensificação do processo de reestruturação produtiva da agricultura nacional, responsável por modernizar e reorganizar o cultivo de diversos gêneros agrícolas, alterando sobremaneira seus sistemas produtivos e abrindo margem para a territorialização do capital nos principais cultivos realizados no país, notadamente aqueles voltados para atender importantes parcelas do mercado consumidor, seja ele nacional e/ou internacional. Essa reestruturação produtiva da agricultura brasileira, além de se processar de maneira espacialmente seletiva e socialmente excludente (ELIAS, 2006), vem privilegiando somente alguns gêneros agrícolas, que passam por uma modernização de seus processos produtivos e que são reorganizados com a finalidade de auferir 1 Acadêmico do Programa de Pós-Graduação em Geografia da Universidade Estadual do Ceará. Email de contato: [email protected] 2709 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO DE 2015 uma maior rentabilidade ao capital, abrindo espaço para o desenvolvimento de uma agricultura científica e de mercado. Esse processo vai culminar em uma reconfiguração dos principais circuitos espaciais de produtivos agrícolas e de seus respectivos círculos de cooperação (SANTOS, 1994, 1996), implicando em novos usos do território ao reestruturar as tradicionais formas de produção, comercialização, distribuição e consumo desses produtos. Exemplo disso é o que vem ocorrendo com a produção de coco, que passou a ser diretamente inserida nesse contexto de reestruturação produtiva há aproximadamente duas décadas e que a partir desse período observa seu cultivo ser completamente reorganizado. Enquanto que anteriormente não existia uma produção de coco realmente estruturada no país, onde o mesmo era cultivado em pequenas quantidades sob os moldes semiextensivos, hoje observa-se a configuração de uma nova geografia da produção brasileira de coco, com destaque para um aumento do cultivo do fruto nos moldes da agricultura de mercado e da agricultura científica, inaugurando um novo momento para o seu circuito espacial produtivo, trazendo, inclusive, fortes rebatimentos socioespaciais e territoriais. Como já pudemos indicar em outros momentos (CAVALCANTE, 2012, 2013, 2014), essa nova geografia da produção de coco no Brasil pode ser caracterizada, dentre outros processos, pelo expressivo aumento da quantidade produzida e da área plantada com o fruto, impulsionada principalmente pelo considerável aumento do consumo de água de coco e pela expansão do cultivo de coqueiros anão e híbrido; pela incorporação de novas tecnologias ao processo produtivo, com a utilização de modernos insumos e implementos na produção; pela consolidação de determinados agentes, notadamente grandes empresas agrícolas, agroindustriais e de pesquisa; e pela dispersão espacial da produção de coco por todas as regiões do país. Com isso, somente através de uma análise mais aprofundada é que perceberemos quais são as novas relações que se dão no novo sistema de produção do coco a partir da reestruturação produtiva que atinge o setor. Desse modo, esse trabalho visa apresentar algumas das principais características dessa nova geografia da produção do fruto no Brasil, atentando especialmente para a identificação e análise de algumas dinâmicas socioespaciais observadas a partir da 2710 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO DE 2015 materialização desse processo, sobretudo a reorganização de seu circuito espacial de produção, a modernização do seu cultivo e a sua dispersão espacial produtiva pelo país. Para tanto, nos baseamos em uma metodologia constituída basicamente por um levantamento bibliográfico acerca da temática, pela organização de um banco de dados e pela realização de trabalhos de campo em alguns dos mais importantes municípios produtores de coco do país, notadamente aqueles localizados no Estado do Ceará, o segundo principal produtor nacional do fruto. Destaca-se que neste artigo estamos apresentando apenas alguns resultados de uma investigação maior acerca das mais importantes dinâmicas socioespaciais advindas com a reestruturação produtiva do setor do coco, realizada em virtude da consecução de nossa pesquisa de mestrado, finalizada na Université Paris 1 Panthéon-Sorbonne e em curso na Universidade Estadual do Ceará2. 2 – A atual configuração da produção brasileira de coco Especialmente após os anos 1990 é válido afirmar que a produção brasileira de coco já não é mais a mesma, uma vez que agora ela é realizada em moldes intensivos e inserida em uma agricultura de mercado, se contrapondo a uma produção mais tradicional e de caráter de subsistência que caracterizava praticamente todo o setor até o final do século passado. É somente a partir da reestruturação produtiva que puderam-se edificar as bases para uma verdadeira reviravolta no cultivo desse fruto no país, dotando-lhe de características que até então não eram observadas. Nota-se, de um modo geral, que em apenas 20 anos a produção brasileira de coco mudou completamente, uma vez que o cultivo desse fruto deixa de ser realizado quase que exclusivamente por comunidades litorâneas localizadas no Nordeste do país e em pequenas quantidades sem a utilização de quaisquer insumos, passando a ser cultivado em larga escala em todas as grandes regiões e a receber importantes aportes de capital, ciência e tecnologia, levando ao 2 Sob orientação da professora Denise Elias e com bolsa do CNPq. 2711 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO DE 2015 desenvolvimento de uma nova maneira de se produzir coco, ampliando a quantidade produzida3 e a produtividade. Analisando os dados divulgados pelo IBGE (tabelas 01 e 02), nota-se que de 1990 a 2010 essa produção de coco no Brasil obteve um aumento considerável, por volta de 158%. Já a área plantada com coqueiros acompanhou o aumento da produção do fruto, porém mais modestamente, tendo um crescimento de aproximadamente 28%, o que demonstra que há uma expansão do cultivo de coqueiros em território brasileiro. Associada ao aumento da área plantada e da quantidade produzida, a produtividade também obteve um crescimento importante, indicando uma modernização do processo produtivo do fruto, relacionado à difusão do uso de modernos insumos e implementos pelos coqueirais do país. Tabela 01 – Brasil. Área plantada com coqueiros (em hectares), quantidade produzida de coco (em mil frutos) e produtividade (mil frutos/ha). 1990 – 2010. 1990 2000 2010 Área plantada 215.652 266.577 276.934 Quant. produzida 734.418 1.301.411 1.895.635 Produtividade 3,41 4,88 6,85 Fonte: IBGE/PAM. Elaboração: Cavalcante, 2013. Tabela 02 – Brasil. Área plantada com coqueiros (em hectares), quantidade produzida de coco (em mil frutos) e produtividade (mil frutos/ha). Variações absoluta e relativa (em %). 1990 – 2010. Variação Absoluta Variação Relativa 1990 2000 1990 1990 2000 1990 2000 2010 2010 2000 2010 2010 Área plantada 50.925 10.357 61.282 23,61 3,89 28,42 Quant. produzida 566.993 594.224 1.161.217 77,20 43,57 158,11 Produtividade 1,48 1,96 3,44 43,35 40,21 101,00 Fonte: IBGE/PAM. Elaboração: Cavalcante, 2013. Esse aumento da produção, da área plantada e da produtividade está intimamente relacionado com o novo momento pelo qual passa o cultivo de coco. Percebe-se, grosso modo, que a expansão da produção desse fruto no Brasil está diretamente associada a três processos que estão interligados: o aumento do consumo de água de coco, a proliferação do cultivo sobretudo de coqueiros anões e a modernização de seu processo produtivo agrícola. Esses três processos, além de vários outros, como a crescente participação de empresas agrícolas 3 e O Brasil é, atualmente, conforme apontam os dados da FAO, o quarto maior produtor de coco do mundo, enquanto em 1990 o país ocupava apenas a décima colocação no ranking mundial. 2712 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO DE 2015 agroindustriais na regulação do setor do coco, vêm contribuindo para dotar o cultivo desse fruto de novas e importantes características. O crescimento do consumo de água de coco é um dos fatores que nos ajuda a entender a reestruturação produtiva do setor e a organização do mercado do fruto em âmbitos tanto nacional quanto internacional. Nota-se que a expansão do consumo de coco, e mais precisamente da água, vem alavancando a quantidade produzida do fruto por todo o país, favorecendo o aumento da área plantada com coqueiros e, consequentemente, a sua dispersão espacial produtiva. A esse respeito, Cavalcanti et al (2006, p. 138) apontam que a “expectativa do crescimento do mercado de água de coco tem animado os produtores a expandir suas áreas com espécies precoces”, a exemplo do coqueiro anão, que fornece o coco ainda verde. O coco é apontado por Cavalcanti et al (2006) como sendo o “produto da moda”, e isso se deve ao extraordinário aumento no consumo da sua água. Em virtude das investidas do mercado explorando as qualidades nutricionais da água de coco, seu consumo in natura está em larga expansão por todo o Brasil sobretudo desde meados dos anos 1990, e em caixinhas Tetra Pak após 2010, a grande novidade do setor4. Com isso, aos poucos a água de coco, um produto tipicamente associado ao litoral do Nordeste, transforma-se em um sinônimo de verão e difundese para as demais regiões do país, especialmente a Sudeste. Também a partir de 2010 a água de coco em caixinha começa a ser amplamente exportada, sobretudo para os Estados Unidos. Para atender à demanda por água de coco, aumentam os plantios de coqueiro anão, o mais indicado para a produção de coco verde (fotos 01 e 02). O cultivo dessa variedade de coqueiro está em ampla expansão pelo território nacional, passando a ocupar até mesmo áreas não tradicionais no cultivo de coco, conforme nos indicam Fontes et al (2002) e Martins e Jesus Júnior (2011), com destaque também para a variedade híbrida5. Foram essas as variedades de 4 Dentre as principais empresas que controlam o mercado de água de coco em caixinha no Brasil destacamos: Sococo, Ducoco, Coco do Vale e PepsiCo (que adquiriu em 2009 a empresa Amacoco). 5 A expansão dos cultivos de coqueiros anão e híbrido se dá pari passu da redução do cultivo de coqueiro gigante, o mais indicado para a produção de coco seco e encontrado sobretudo ao longo do litoral nordestino. 2713 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO DE 2015 coqueiro mais contagiadas pela reestruturação produtiva e as que mais absorveram as inovações advindas com a agricultura científica (SANTOS, 2003). Além disso, destaca-se que é também nas áreas de cultivo de coqueiro anão e híbrido onde o capital encontrou meios mais favoráveis de se difundir e de se territorializar, uma vez que foram essas as áreas elencadas por grandes produtores para alavancar a quantidade produzida de coco. Associado a isso, observa-se por todo o Brasil o crescente número de grandes empresas agrícolas e agroindustriais investindo no cultivo do fruto, a exemplo da Sococo (no Pará), Ducoco, Cohibra e Unique (no Ceará), Aurantiaca (na Bahia), Kero Coco e Queiroz Galvão (em Pernambuco), Coco do Vale (na Paraíba), dentre outras, muitas das quais em atividade há pouquíssimos anos e que cultivam exclusivamente coqueiros anão e híbrido visando a produção sobretudo de água de coco. Foto 01 – Produção de coco verde em Acaraú (CE). Fonte: Leandro Cavalcante, 2014. Foto 02 – Cultivo de coqueiro anão em Paraipaba (CE). Fonte: Leandro Cavalcante, 2014. Todas essas empresas, além de outros grandes e médios produtores, e em certos casos também pequenos produtores, estão investindo pesado em novas tecnologias voltadas para o cultivo de coco. Assim, o incremento e a difusão de diversas inovações técnico-científicas e agronômicas são processos também em curso evidenciado a partir da reestruturação do setor. A partir da utilização dessas inovações foi-se possível ampliar consideravelmente a produtividade dos coqueiros, abrindo espaço para a modernização do processo produtivo agrícola do fruto. Assim, observa-se pelos coqueirais do Brasil uma propagação de diversas inovações, como àquelas relacionadas ao uso de novos métodos de irrigação, a 2714 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO DE 2015 exemplo das práticas de irrigação localizada e totalmente automatizada, representada pelo uso dos microaspersores, onde cada coqueiro é irrigado individualmente e recebe uma quantidade exata de água. Esse método de irrigação por microaspersão é o mais utilizado atualmente pelos produtores de coco, especialmente por aqueles que se dedicam ao cultivo de coqueiro anão e híbrido. Há ainda uma difusão no uso de técnicas de adubação que garantem uma maior precisão e uma maior produtividade, sendo a mais importante dessas a técnica de fertirrigação, onde cada coqueiro recebe uma quantidade pré-determinada de fertilizantes diluídos junto com a água e aplicada pelos microaspersores. Acrescidos ao sistema de irrigação, observa-se a difusão de toda uma variedade de máquinas agrícolas que servem de apoio à produção de coco, como arados, roçadeiras, tratores, pulverizadores motorizados, dentre outros. O uso de todo esse maquinário agrícola é bastante recente e vem contribuindo para reduzir o tempo destinado ao trato dos coqueiros, modificando as relações de trabalho historicamente associadas ao seu cultivo. Vem se difundindo também toda uma série de defensivos, adubos e fertilizantes dos mais variados tipos. Além disso, os chamados tratos culturais também foram readaptados às novas exigências do setor, difundindo-se algumas inovações agronômicas que vem modificando as tradicionais formas de produção de coco, a exemplo da adoção de um sistema de espaçamento entre as árvores conhecido como triangulação, indicado para melhor distribuir os coqueiros em uma determinada área, como também dos frequentes investimentos em análises foliar e de solo em laboratórios especializados, visando determinar as principais deficiências dos coqueiros e da área onde estão plantados. Esse é o contexto na nova produção de coco realizada no Brasil, mais científica e mecanizada. 3 – A nova configuração espacial da produção de coco Com essa reestruturação produtiva, erguem-se as bases para se desenhar ainda um novo arranjo espacial relacionado ao cultivo do fruto no Brasil. Desse modo, essa nova geografia da produção de coco no país pode ser caracterizada também especialmente pela dispersão espacial produtiva em direção às regiões não 2715 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO DE 2015 tradicionais do cultivo do fruto e por uma consequente consolidação de espaços especializados na sua produção, modificando sobremaneira a divisão territorial do trabalho e as dinâmicas socioespaciais que passam a ser observadas em tais espaços. Se anteriormente o coco (e o coqueiro) era um sinônimo exclusivo de litoral, sobretudo o nordestino, atualmente observamos a emergência de novos espaços que estão se especializando no cultivo do fruto. O coco começou a ser cultivado no Brasil pelos portugueses que aqui começaram a chegar depois de 1500, produção essa concentrada incialmente em terras baianas. Martins e Jesus Júnior (2011, p. 15) indicam que a partir da Bahia, “o coqueiro disseminou-se pelo litoral nordestino, especialmente por ser uma frutífera típica de clima tropical onde encontrou condições favoráveis para cultivo, e posteriormente acabou se adaptando em outras regiões do país”. Do Nordeste essa produção se disseminou também para os Estados do Pará e do Espírito Santo, ainda na década de 1980, passando a ser cultivado em escala comercial pela primeira vez no Norte e no Sudeste. Assim, até o início dos anos 1990 o cultivo de coco se restringia apenas às regiões Nordeste, Sudeste e Norte, mas ainda continuava sendo produzido majoritariamente no litoral nordestino, em uma área que ia basicamente da Bahia ao Ceará, além do nordeste do Pará e do litoral norte do Espírito Santo. Entretanto, esse quadro começou a ser alterado com a reestruturação produtiva do setor, que aos poucos vem sendo responsável por uma importante dispersão do cultivo de coco pelas cinco grandes regiões do país. Depois de já produzida em todo o Nordeste, essa produção passou a ser realizada também nos outros Estados do Norte e Sudeste, como também no Centro-Oeste e no Sul. Os dados divulgados pelo levantamento da Produção Agrícola Municipal (PAM/IBGE) indicam que a produção de coco em larga escala no Centro-Oeste começou no início dos anos 1990, e já no Sul apenas depois dos anos 2000. Esses dados (tabela 03) indicam ainda um aumento da produção e da área plantada em todas as regiões, garantindo uma performance positiva quando observamos o contexto brasileiro como um todo. 2716 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO DE 2015 Tabela 03 – Regiões do Brasil. Quantidade produzida de coco (em mil frutos) e área plantada com coqueiros (em hectares). 1990 – 2010. 1990 2000 2010 Área plantada 13.352 18.120 28.493 Norte Quantidade produzida 104.053 162.175 255.048 Área plantada 199.746 232.426 224.293 Nordeste Quantidade produzida 619.698 932.960 1.297.528 Área plantada 2.551 14.144 20.411 Sudeste Quantidade produzida 10.646 186.239 300.517 Área plantada 0 0 202 Sul Quantidade produzida 0 0 2.282 Área plantada 3 1.887 3.535 Centro-Oeste Quantidade produzida 21 20.037 40.260 Área plantada 215.652 266.577 276.934 BRASIL Quantidade produzida 734.418 1.301.411 1.895.635 Fonte: IBGE/PAM. Elaboração: Cavalcante, 2013. Assim como as grandes regiões do Brasil ocupam um papel diferenciado na configuração socioespacial e produtiva do coco, o mesmo se pode dizer dos Estados do país, que apresentam dinâmicas bem distintas uns dos outros, porém que estão inseridas em um mesmo processo regido pela reestruturação produtiva do setor. Em 2010, dos 26 Estados, apenas quatro ainda não apresentam uma produção significativa de coco ao ponto de aparecerem nas estatísticas oficiais: Roraima, Amapá, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Por outro lado, todas os demais já são produtores de coco, algumas bem mais recentemente, como é o caso do Mato Grosso, do Tocantins e do Paraná, já outros com a produção consolidada já a um certo tempo, a exemplo, sobretudo, da Bahia, do Ceará e de Sergipe. Desse modo, percebe-se que está havendo uma dispersão espacial da produção de coco no Brasil, que pode ser caracterizada um avanço da fronteira agrícola do fruto em direção ao semiárido nordestino e em direção às demais regiões, sobretudo Sudeste e Norte. Na imagem a seguir (imagem 01), podemos observar a distribuição espacial do cultivo de coco no Brasil e sua evolução entre 1990 e 2010. Através dessa imagem é possível notar claramente essa dispersão espacial da produção de coco e em quais Estados ela é mais significativa. Essa expansão do cultivo do fruto em Estados não-Nordestinos só foi possível graças, sobretudo, aos pesados investimentos realizados no melhoramento genético dos coqueiros e na grande quantidade de insumos e implementos que passaram a ser utilizados, especialmente os adubos e o microaspersores. 2717 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO DE 2015 Desse modo, como se percebe, nessas últimas duas décadas vem se desenhando um novo arranjo espacial da produção de coco no Brasil, onde o cultivo do fruto vem passando a ser realizado nacionalmente e deixando de ser regionalmente localizado, incorporando novos espaços de produção à medida que o setor vem sendo reestruturado, modificando consideravelmente as paisagens do interior do país. Além disso, o que deve ser destacado é que o recente aumento da área plantada com coqueiros em todas as regiões do país demonstra especialmente que o cultivo de coco é uma variável importante que pode nos auxiliar na compreensão das recentes transformações que vem sendo observadas no espaço rural brasileiro. Imagem 01 – Distribuição espacial da produção de coco no Brasil, em 1990 e 2010. Organização: Cavalcante e Mendoza (2015). 4 – Considerações finais De um modo geral, a reestruturação produtiva do setor do coco no Brasil vem significando, antes de mais nada, a emergência de um novo tempo, de um tempo 2718 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO DE 2015 marcado pelo ritmo do coco. Ao ter seu sistema produtivo modificado e ao passar a ser produzido em novos espaços, o cultivo do fruto induziu ao desenrolar de uma série de novas dinâmicas anteriormente não observadas, alterando a forma e o conteúdo espaciais, que foram reorganizados visando atender a expansão e consolidação da produção do fruto. Nesse sentido, Santos (1985, p. 68) considera que “cada produção organiza o espaço segundo uma modalidade própria”, e com o coco isso não foi diferente, já que o espaço, bem como a sociedade, teve de ser adaptado às novas exigências do novo modelo de produção desse fruto. Assim, com a chegada do coco, tudo que existia antes foi chamado a se adaptar ao seu novo sistema produtivo e a nova racionalidade imposta por esse cultivo, gerador de conflitos das mais diversas naturezas, uma vez que passaram a entrar em choque direto as antigas relações que se davam nos espaços elencados para a difusão dessa produção com os novos processos resultantes da reestruturação produtiva, associada à territorialização do capital no setor. Tudo isso contribuiu, sobremaneira, para a mudança na forma de uso e ocupação dos espaços agrícolas ocupados pela produção de coco, já que tais espaços tiveram seus conteúdos alterados em virtude da difusão de uma agricultura de caráter empresarial e científica, modificando as relações sociais que lá se reproduziam. Nesse sentido, é necessário, portanto, aprofundar essa discussão acerca da reestruturação produtiva do setor do coco e que vem culminando na territorialização do capital nas áreas produtoras do fruto, intentando revelar qual é a real reestruturação pela qual a produção de coco vem passando e descobrir a quem ela verdadeiramente atende. Assim, poderemos continuar contribuindo na apreensão de algumas das inúmeras nuances do desenvolvimento do capitalismo no campo brasileiro, tomando como base os processos observados a partir da produção de coco, que é um reflexo da reprodução ampliada do capital no processo produtivo agrícola, controlado cada vez mais por pouquíssimos agentes que detém praticamente todo o controle dos circuitos espaciais produtivos no país. 2719 A DIVERSIDADE DA GEOGRAFIA BRASILEIRA: ESCALAS E DIMENSÕES DA ANÁLISE E DA AÇÃO DE 9 A 12 DE OUTUBRO DE 2015 5 – Referências bibliográficas CAVALCANTE, Leandro Vieira. 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