Antevisão eficaz do cancro Uma técnica mais fiável de detecção do tumor maligno do estômago foi desenvolvida por um grupo de investigadores do Ipatimup, no Porto, e já está a ser utilizada ao nível da comunidade científica DN, 1 de Maio, 2001 Um diagnóstico precoce mais eficaz e fiável para o cancro do estômago está próximo. A técnica já está a ser utilizada a nível da comunidade científica e foi desenvolvida por um grupo de investigadores do Instituto de Patologia e Imunologia da Universidade do Porto (Ipatimup), no âmbito de uma investigação sobre as manifestações de metaplasias, lesões precursoras do cancro. A identificação das mucinas foi um passo essencial e agora até a genética tem dado uma ajuda. As mucinas são microproteínas expressas nas células epiteliais de forma sempre específica. O que quer dizer que cada tipo de célula tem um padrão de expressão de mucinas. Em pessoas normais, encontramos na mucose do estômago as Muc1, Muc5 e Muc6. No intestino, a Muc2. Quanto aparece a Muc2 no estômago soa um sinal de alerta, porque essa presença indicia uma metaplasia intestinal. A equipa do Ipatimup, liderada por Leonor David - que está a participar no Porto Cancer Meeting - conseguiu associar a cada um dos três tipos de metaplasia um padrão de expressão de mucinas: do tipo I, ao qual não está associado o risco de cancro, ao tipo III, o "mais perigoso" em termos de degeneração para doença cancerígena. A identificação destes padrões foi possível graças ao desenvolvimento de anticorpos monoclonais, que reagem somente à presença da mucina para a qual foram concebidos. Estes anticorpos estão agora a ser utilizados pela comunidade científica internacional para identificação das metaplasias e, segundo Celso Reis, um dos investigadores, constituem uma técnica "mais sensível" que os tradicionais testes histoclínicos, que, por vezes, não têm detectado metaplasias de tipo III. Os anticorpos desenvolvidos pela equipa estão já a ser comercializados por algumas companhias farmacêuticas internacionais, embora a sua distribuição seja restrita e ainda não abranja hospitais e laboratórios equipados para a imunocitoquímica e imuno-histoquímica. Um outro estudo do Ipatimup conseguiu avaliar a susceptibilidade genética para contrair cancro expressa no polimorfismo do gene do Muc1, que tem sequências que variam em número das 30 às 125. Ficou demonstrado que pessoas com mucinas "pequenas" evidenciam maior susceptibilidade em desenvolver cancro do que outras com mais sequências nos genes da Muc1. A investigação das mucinas está também a lançar alguma luz noutras patologias que afectam o estômago, nomeadamente a gastrite, provocada pela Helicobacter Pylori. A equipa de investigadores descobriu que nos casos de metaplasia intestinal de tipo I - onde todas as mucinas características do estômago desaparecem, surgindo a Muc2, associada normalmente ao cólon - a bactéria também desaparece. "O que parece indiciar que ela não gosta das mucinas do intestino", explica Celso Reis. Está assim aberto o caminho a uma produção em laboratório de moléculas sintéticas que reproduzam eventualmente as características da Muc2. Também no colóquio do Porto serão apresentados os últimos resultados de uma investigação sobre um tipo específico do cancro da tiróide, o tumor de células de Hurthle. Valdemar Máximo, também investigador do Ipatimup, salienta que este é um tumor que se caracteriza por cada célula ter milhares de mitocondrias, quando o valor normal não é superior a 20. Através do estudo do ADN mitocondrial das células, o investigador explicou que a razão da agressividade associada a este cancro pode estar num defeito da mitocondria que afecta o processo de apoptose (suicídio programado da célula). Ou seja, como esse processo não é desencadeado, as células morrem menos, ficam em maior número e o tumor torna-se mais agressivo. Palco das mais recentes descobertas Anualmente, o Porto Cancer Meeting reúne na cidade os investigadores internacionais e portugueses mais conceituados na doença. A X Edição, que terminou ontem, foi dedicada aos Avanços no Diagnóstico do Cancro e expôs as mais recentes descobertas no âmbito da patologia oncológica. Durante dois dias, o Ipatimup recebeu 20 especialistas que debateram a patologia cirúrgica, questões como a predicção da quimorresistência em tumores malignos e as lesões précancerígenas. Os diversos tipos de cancro tiveram também uma atenção especializada. Um palco privilegiado para demonstrar também que as equipas portuguesas estão atentas e interventivas.