m 3 jornalmarcoedição326dezembro2016 SAÚDE Mário Penna continua sua luta contra o câncer Marianne Fonseca O doente ainda sofre preconceito, mas pesquisas e tecnologia aumentam suas possibilidades de cura Ana Clara Carvalho 7º Período Ninguém quer receber a notícia de que está com câncer, principalmente antes dos 40 anos; mas foi o caso de Vânia Darque, diagnosticada com câncer de mama aos 32 anos. Ela sentiu um nódulo ao fazer o autoexame durante o banho, foi para o posto fazer mamografia e, depois de três meses recebeu o diagnóstico. “Quando eu o senti, o caroço tinha o tamanho de um grão de feijão. Até o final dos exames, ele já tinha o tamanho de uma laranja”, conta Vânia. O tumor tomou 85% da sua mama esquerda. Como o caso já estava bem avançado, a indicação foi de cirurgia, - mastectomia - que é a retirada total da mama. Porém, por Vânia ter apenas 32 anos, a médica optou por procedimentos menos radicais que possibilitassem o desaparecimento do tumor. Foram dois anos de tratamento, nove meses de quimiote- rapia e 33 sessões de radioterapia. Sem precisar tirar a mama, Vânia Darque se tratou, o tumor sumiu e ela foi curada. Há três meses, passou por uma cirurgia de reconstrução de mama, que foi necessária, devido a um esvaziamento axilar – retirada de todos os gânglios da axila – que deixou suas mamas desproporcionais. Mesmo com alta há um ano e meio, ela continua sendo paciente do hospital recebendo acompanhamento. O tratamento começou em 2013 e Vânia foi atendida pelo Sistema Único de Saúde (SUS), no hospital Luxemburgo, uma das unidades do Instituto Mário Penna, instituição filantrópica hospitalar, de referência, no tratamento do câncer. O instituto inclui, também, o hospital Mário Penna, a Casa de Apoio Beatriz Ferraz e um Núcleo de Ensino e Pesquisas. A história do instituto foi construída com muito esforço estimulado pelo sucesso no tratamento de muitas pessoas que passaram por lá. O Luxemburgo atende 30% de pacientes particulares e de convênios; já o Mário Penna é totalmente voltado para o SUS. Mas os recursos do convênio do instituto com o SUS não são suficientes para mantê-lo. Por exemplo, um procedimento de quimioterapia, que custa em torno de mil reais, é oferecido apenas por R$300,00. A outra parte é arrecadada pela comunidade, através de doações e de lojas associadas à promoção do troco solidário. SUPERAÇÃO O hospital Mário Penna já foi conhecido como “depósito de doentes”, pois era um lugar onde eles ficavam desamparados e sem assistência. A portaria fechava às 18h, pois não havia quem pudesse ficar ali para cuidar deles. No outro dia, muitos já tinham morrido durante a noite e eram enterrados no Cemitério da Saudade, na maioria das vezes, como indigen- Hospital vai além do cuidar A Casa de Apoio Beatriz Ferraz abriga pacientes que vêm de outras cidades e não têm onde ficar. Beatriz Ferraz era conselheira e uma das fundadoras do grupo de voluntariado – Volmape. Sua filha, Mariângela Ferraz acompanhou a mãe quando ela estava com câncer de ovário e, nesse período, ficou muito íntima do sofrimento oncólogico. Antes de Beatriz morrer, ela expressou à sua filha o desejo de que seguisse com a obra dela. Mariângela foi presidente das voluntárias e atualmente é diretora de humanização. Há um ano foi instituída essa diretoria para proporcionar aos doentes e funcionários um ambiente acolhedor no instituto. “Dentro do hospital oncológico as perdas são recorrentes, é muito sofrimento. Temos de estar junto com essa equipe toda que cuida do paciente, promovendo um ambiente humanizado”, explica. A ideia é promover ações que quebrem a rotina. Por exemplo, os estagiários de psicologia trabalham na espera do paciente, e, ao acolhê -los procuram convida-los a expres- sarem seus sentimentos, escrevendo, por exemplo, mensagens que são entregues para os funcionários, como um recado de bom dia. “É um modo legitimo e humanizado da gente saber, do próprio paciente, como se sente e de ele nos dar força”, afirma Mariângela. O projeto de humanização, também, sai dos hospitais. Os pacientes que têm câncer de laringe, indicados à cirurgia, perdem as cordas vocais e não falam mais. Uma das formas de voltarem a falar é através do uso de prótese. É preciso que eles passem por um período de recuperação; para isto, foi criado o “Coral Aprendiz”. Mesmo que o paciente não queira participar do coral, os ensaios são importantes para ajudar no uso da prótese. Eles começaram se apresentando nos hospitais e agora já saem, inclusive, para escolas. Eles cantam na base do esforço e, nessas apresentações, dão alguns depoimentos, principalmente para os adolescentes, sobre o uso do tabaco e álcool, principais causas do câncer de laringe. tes. “Quando você chegava à porta do hospital o cheiro já exalava na rua: um mau cheiro que vinha de dentro do hospital. Era de pessoas que estavam apodrecendo ainda vivas”, conta Osmânio Pereira, fundador da Associação dos Amigos do Hospital Mário Penna. A Associação, fundada em 1971, procura mobilizar pessoas e buscar ajuda para o hospital. Através de carnês distribuídos em igrejas e graças a uma ajuda anônima, eles conquistaram sua primeira ambulância. Pereira relata que a associação foi criada por ele, junto com Antônio Jannotti, depois que a irmã dele, Célia Jannotti, disse ter visto uma mulher, que se autodenominou Nossa Senhora de Nazaré, que lhe pediu para olhar pelo hospital. Depois da morte de Célia, em 1970, eles decidiram continuar sua missão. O médico João Baptista Resende, especialista no tratamento cirúrgico e estudioso da cura do câncer, foi um dos maiores responsáveis pela obra de surgimento do Mário Penna. Sua chegada ao ainda “depósito” foi um divisor de águas para a instituição. Com ele, foi criado o primeiro bloco cirúrgico do hospital e, do seu trabalho, junto com seus alunos residentes, começaram a aparecer às primeiras altas. Um hospital onde morriam 100% dos pacientes, atualmente, é Vânia não deixou que a doença lhe roubasse o sorriso referência no tratamento do câncer. Faz qualquer porte de cirurgia oncológica, atende cerca de dois mil pacientes de quimioterapia por mês e realiza mais de 234 mil aplicações de radioterapia por ano. PROJETO No Núcleo de Ensino e Pesquisas já acontecem trabalhos de ponta em parceria com universidades nacionais e estrangeiras e o instituto tem um projeto de inovação tecnológica voltada para a oncologia. Hoje, os moradores do interior de Minas, com suspeita de câncer, são encaminhados aos hospitais Luxemburgo ou Mário Penna. Muitos viajam mais de 700km, chegam com fome, fazem vários exames e só então descobrem que estavam com tumores benignos, não cancerosos. Esse problema será resolvido com o projeto já elaborado de uso da telemedicina e a telepatologia. Com ele vai-se criar um centro de coletas de materiais nas cidades distantes, em convênio com um hospital local, da rede pública e/ou privada. O material, coletado por médicos, será posto numa lâmina e através da telepatologia chegará ao centro de pesquisas em Belo Horizonte. Assim, será possível identificar o tipo e o estágio do tumor sem que o paciente tenha de viajar. Para ter-se a opinião de mais de um médico, o material será repassado para outros centros avançados de tecnologia. Ao final, o paciente vai ser informado do seu diagnóstico e qual o local apropriado para o tratamento. Se for para algum hospital do Instituto, já vai estar com data e hora marcada, e o médico já terá acesso ao seu diagnóstico. “Agiliza o procedimento médico, evita sofrimento, transtorno, e não congestiona o hospital. Isso tudo através da inovação tecnológica que é o que o Mário Penna está sonhando fazer”, explica Osmânio Pereira. Divulgação Funcionárias trabalham na humanização dos pacientes