Artigo 6

Propaganda
Artigo Original
Carcinoma espinocelular de palato mole
Artur Jorge Padilha de Brito1
Mark Makowiecky2
Marcello Haddad Ribas3
José Speck Filho3
Antônio Sérgio Fava4
Squamous cell carcinoma of the soft palate
RESUMO
ABSTRACT
Introdução: Câncer de orofaringe tem incidência mundial de 8,3
casos por 100.000 habitantes. Carcinoma espinocelular
representa 95% do total de tumores malignos da orofaringe. O
palato mole representa 5-12% do total destes tumores. Fatores
etiológicos incluem álcool e tabaco. Os tumores são
freqüentemente assintomáticos e apresentam-se em estádios
avançados ao diagnóstico. Métodos: Trata-se de estudo
retrospectivo baseado na análise de prontuários de pacientes com
diagnóstico de carcinoma espinocelular de palato mole.
Resultados: Dentre 15 pacientes, 13 eram do sexo masculino e 2
do sexo feminino. Idade variou entre 54 a 76, média 63,6 anos.
Sintomas mais freqüentes foram odinofagia, disfagia, nódulo
cervical e emagrecimento. Pacientes no estádio IV tem prognóstico
reservado, demonstrando a importância do diagnóstico precoce
que permita tratamentos curativos.
Introduction: The world incidende of oropharyngeal cancer is 8.3
cases/100,000 inhabitants. The squamous cell carcinoma
represents 95% of all malign tumors of oropharynx and the soft
palate represents 5-12% of those tumors. Etiologic factors include
alcohol and tobacco. The tumors are frequently asymptomatic and
the diagnosis is usually made in advanced stages of the disease.
Methods: This is a retrospective study based on charter review of
cases diagnosed as squamous cell carcinoma of the soft palate.
Results: From 15 pacients, 13 were men and 2 were women. The
ages varied from 54 to 76, average, 63.6 years old. All patients had
previous history of alcohol and tobacco use. The most frequent
symptoms found were odinophagia, dysphagia, cervical nodule
and weight loss. Patients in stage IV have a reserved prognosis,
showing the importance of early diagnosis in order to allow healing
treatment.
Descritores: Carcinoma de Células Escamosas. Neoplasias
Orofaríngeas. Palato Mole.
Key words: Carcinoma, Squamous Cell. Oropharyngeal
Neoplasms. Palate, Soft.
INTRODUÇÃO
O câncer de orofaringe tem uma incidência mundial de 8,3
casos por 100.0001,2. Nos Estados Unidos, existem 4800 novos
casos de carcinoma espinocelular (CEC) de orofaringe por
ano1. No Brasil, segundo o Instituto Nacional do Câncer, não
existem dados específicos da incidência de câncer em
orofaringe, em especial de palato mole.
Segundo a 6ª edição do Manual de Estadiamento da American
Joint Commitee on Cancer (AJCC), a orofaringe é a porção de
continuidade da faringe que se estende do plano da superfície
superior do palato mole à superfície superior do osso hióide. A
orofaringe é dividida em quatro subsítios: loja tonsilar, base de
língua, palato mole e parede posterior da orofaringe.
O carcinoma espinocelular representa 95% do total de tumores
malignos da orofaringe. Os sítios primários mais comuns são a
loja tonsilar e base de língua. O palato mole representa 5-12%
do total de tumores de orofaringe1. Fatores etiológicos incluem
o consumo de álcool e tabaco3. Esses fatores atuam de forma
sinérgica na carcinogênese. Os tumores são freqüentemente
assintomáticos e apresentam-se em estádios avançados da
doença ao diagnóstico. Os sintomas, quando ocorrem, são
odinofagia e linfonodomegalia4.
Devido à baixa incidência de tumores primários de palato mole e
ausência de barreiras anatômicas que impeçam a extensão do
tumor dentro da orofaringe, alguns autores correlacionam os
subsítios, incluindo também outras localizações como:
cavidade oral, laringe e palato duro3,4. Existem poucos estudos
voltados exclusivamente para palato mole3.
O presente estudo tem como proposta apresentar a experiência
do Serviço de Otorrinolaringologia e Cirurgia de cabeça e
Pescoço de um hospital terciário com carcinoma espinocelular
de palato mole no período de 1995 a 2007.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo retrospectivo, baseado na análise de
prontuários de pacientes com diagnóstico de carcinoma
espinocelular de palato mole atendidos no período de 1995 a
2007, no Serviço de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital
do Servidor Público Estadual de São Paulo. Foram excluídos os
tumores de outros sítios primários que apresentavam extensão
1) Médico Otorrinolaringologista. Especializando em Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Serviço de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital do Servidor Público
Estadual – Francisco Morato Oliveira, São Paulo, SP, Brasil.
2) Médico Residente de Otorrinolaringologia do Serviço de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital do Servidor Público Estadual – Francisco Morato Oliveira, São
Paulo, SP, Brasil.
3) Cirurgião de Cabeça e Pescoço do Serviço de Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Hospital do Servidor Público Estadual – Francisco Morato Oliveira, São Paulo, SP,
Brasil.
4) Doutor em Medicina pelo Departamento de Cirurgia da Faculdade de Medicina da FMUSP. Chefe da Seção de Cirurgia de Cabeça e Pescoço do Serviço de Otorrinolaringologia e Cirurgia
de Cabeça e Pescoço do Hospital do Servidor Público Estadual – Francisco Morato Oliveira, São Paulo, SP, Brasil.
Instituição: Hospital do Servidor Público Estadual – Francisco Morato Oliveira, São Paulo, SP, Brasil.
Correspondência: Arthur Jorge Padilha de Brito, Rua São Carlos do Pinhal, 248 – 01333-000 São Paulo, SP. E-mail: [email protected]
Recebido em: 18/12/2007; aceito para publicação em: 27/02/2008; publicado on-line em: 15/05/2008.
Conflito de interesse: nenhum. Fonte de fomento: nenhuma.
88
Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v. 37, nº 2, p. 88-90, abril / maio / junho 2008
para palato mole. Obteve-se um total de 15 pacientes, os quais
foram analisados segundo gênero, idade, sintomatologia,
estadiamento, tratamento e evolução da doença.
RESULTADOS
Em um total de 15 pacientes, 13 eram do gênero masculino e 2
do feminino. A idade variou entre 54 a 76, com média 63,6 anos.
Todos os pacientes eram etilistas e tabagistas. Conforme
apresentado na tabela 1, os sintomas mais freqüentes foram
odinofagia, disfagia, nódulo cervical e emagrecimento.
Tabela 1 – Freqüência dos sintomas em pacientes com carcinoma de
palato mole.
exclusivo inicialmente, ambos classificados como T1N0M0, o
mesmo não incluiu o esvaziamento cervical. Um destes evoluiu
com recidiva local seis meses após cirurgia. Foi encaminhado
para tratamento radioterápico e apresenta-se livre da doença
no seguimento de cinco anos. O segundo apresentou recidiva
regional um ano após a cirurgia e foi submetido a esvaziamento
cervical e radioterapia. Após dois anos, encontrava-se livre da
doença e o mesmo evoluiu ao óbito sem relação direta com o
tumor.
Entre os dois pacientes submetidos a tratamento com cirurgia,
radio e quimioterapia, um evoluiu ao óbito com metástase
óssea, sendo que o outro não apresenta sinais de recidiva locoregional com um ano de seguimento.
Tabela 4 – Casos, estadiamento e evolução segundo o tratamento.
Ao diagnóstico, segundo a classificação TNM, tumores T2 e T3
foram os mais comuns representando juntos 66% dos casos.
Em relação à presença de nódulos cervicais, 8 eram positivos,
sendo mais freqüente a classificação N2c presente em 5 casos.
Nenhum paciente apresentava metástase à distância.
Tabela 2 – Distribuição dos casos segundo a Classificação TNM.
* Um dos pacientes com estádio IVa evoluiu a óbito sem realizar
tratamento cirúrugico e/ou radio/quimioterápico, os quais foram contraindicados por falta de condições clínicas.
A recorrência ocorreu em sete dos 14 pacientes analisados,
sendo que cinco deles evoluíram ao óbito. A recorrência em sítio
primário ocorreu em 62,5% dos casos.
Tabela 5 – Recorrência local, regional e à distância dos tumores.
Quanto ao estadiamento, 11 pacientes apresentavam tumores
avançados ao diagnóstico, estádios III e IV, representando 73%
do total, sendo 9 casos com estádio Iva.
Tabela 3 – Evolução dos casos segundo o estadiamento clínico.
Foi observada segunda lesão neoplásica primária de outro sítio
em 4 dos 14 pacientes ao diagnóstico. Três deles foram tumores
simultâneos envolvendo três sítios: soalho de boca, base de
língua e supraglote. Um paciente apresentava tumor
metacrônico de supraglote.
Tabela 6 – Topografia e cronologia das segundas lesões primárias.
A indicação terapêutica, cirúrgica, radioterápica e
quimioterápica, isolados ou associados, variou conforme o
estádio clínico e as comorbidades, como mau estado geral,
desnutrição, doenças respiratórias e cardiovasculares .
Quatro pacientes foram submetidos à radioterapia exclusiva
como tratamento inicial. Três pacientes com estadiamento IVa
evoluíram ao óbito, sendo que dois apresentavam lesão
residual. Três pacientes receberam tratamento cirúrgico
associado à radioterapia. Dois pacientes evoluíram com
recidiva, um local e outro regional, este último foi a óbito. Quatro
pacientes foram submetidos a radioterapia e quimioterapia. Um
paciente apresentou recidiva local e óbito. Dois pacientes
encontram-se no primeiro ano de seguimento.
Entre os pacientes que receberam tratamento cirúrgico
Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v. 37, nº 2, p. 88-90, abril / maio / junho 2008
Em 75% dos pacientes, o óbito ocorreu como conseqüência da
doença, sendo em 50% dos casos devido às recidivas no sítio
primário da lesão.
89
Tabela 7 – Distribuição dos óbitos segundo a relação do mesmo com o
carcinoma de palato e sua evolução.
Metástase regional tem grande influência na sobrevida,
tratamento e pode ser um importante fator de prognóstico4,5. Os
pacientes apresentavam em 53% dos casos linfonodos
positivos ao diagnóstico inicial, enquanto a literatura refere este
achado em 30-40% dos casos4. Metade dos pacientes com
metástase regional evoluiu a óbito. Os quatro pacientes vivos
apresentam-se livres da doença, sendo que dois ainda estão no
primeiro ano de seguimento. Dos sete pacientes com pescoço
negativo, três (42%) casos evoluíram ao óbito e apenas um
paciente está no primeiro ano pós-tratamento. Weber et al.
identificaram a presença de segunda lesão primária em 25,5%
dos casos em sua estatística. O achado deste estudo, de 28%,
está de acordo com a literatura.
MOASS: morte assintomática do tumor; MOCA: morte por câncer.
CONCLUSÃO
DISCUSSÃO
Pacientes com carcinoma espinocelular de palato mole
freqüentemente têm história de uso excessivo de tabaco e
álcool. Nessa amostra, 100% dos pacientes faziam uso de
ambos. Verificou-se, em amostra de 188 pacientes, que 99%
tinha hábito de tabagismo e mais da metade eram etilistas4.
O efeito sinérgico dessas substâncias na carcinogênese é bem
conhecido e explica a alta taxa de segundo tumor primário4. Em
nosso estudo, quatro de 15 pacientes tinham segundo tumor
em cabeça e pescoço (dois em supraglote, um em soalho de
boca e um em base de língua) e três evoluíram ao óbito.
O tratamento do carcinoma espinocelular de palato mole é
influenciado pelo tamanho da lesão primária e presença de
metástase regional. Neste estudo, quatro pacientes (26%)
apresentavam tumores no estádio precoce (I e II) e foram
tratados com cirurgia, radioterapia e terapia combinada (radio e
cirurgia). Destes, apenas um (25%) paciente evoluiu ao óbito.
Weber et al. encontraram 67% de tumores precoces e, destes,
19% evoluíram ao óbito. Os tumores no estádio avançado, III e
IV, representaram 73% dos casos e estes pacientes evoluíram
a óbito em 64% dos casos. Outros estudos referem que, apesar
da combinação terapêutica de cirurgia e radioterapia, a
sobrevida para estádio III e IVa de palato mole em 5 anos é de
33 a 47%4,5.
90
Esta casuística apresentou uma maior presença de metástase
regional em relação à literatura e, quando presente, interferiu
negativamente no prognóstico. No momento do diagnóstico, os
tumores apresentavam-se mais freqüentemente em estádios
avançados (III e IV). Pacientes no estádio IV, independente do
tratamento, tem prognóstico reservado, com baixa sobrevida
em cinco anos. Isto demonstra a importância do diagnóstico
precoce das lesões para permitir tratamentos curativos.
REFERÊNCIAS
1. Canto MT, Devesa SS. Oral cavity and pharynx cancer incidence
rates in the United States, 1975-1998. Oral Oncol. 2002;38(6):610-7.
2. Hansen E, Panwala K, Holland J. Post-operative radiation therapy for
advanced-stage oropharyngeal cancer. J Laryngol Otol.
2002;116(11):920-4.
3. Sundaram K, Schwartz J, Har-El G, Lucente F. Carcinoma of the
o r o p h a r y n x : f a c t o r s a ff e c t i n g o u t c o m e . L a r y n g o s c o p e .
2005;115(9):1536-42.
4. Weber RS, Peters LJ, Wolf P, Guillamondegui O. Squamous cell
carcinoma of the soft palate, uvula, and anterior faucial pillar.
Otolaryngol Head Neck Surg. 1988;99(1):16-23.
5. Goodman MD, Tarnoff M, Kain M, Slotman GJ. Interactions between
outcomes and tumor response to preoperative cisplatin-sensitized
radiotherapy in advanced head and neck cancer. Southern New Jersey
Head and Neck Cancer Treatment Group. Am J Surg. 1997;174(5):52731.
Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v. 37, nº 2, p. 88-90, abril / maio / junho 2008
Download