Gravação - Facom-UFBA

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Faculdade de Comunicação da UFBA.
Projeto Experimental de Conclusão de Curso.
Orientador: Profo Messias Bandeira.
Formando: José Luciano Azevedo de Aguiar.
Elaboração de um produto cultural:
“CD demo do grupo Matita Perê”
2
1a parte:
Breves considerações sobre Música e Comunicação
A música é uma forma clara de se comunicar. Ela tem um caráter psicológico
fundamental que pode, em algumas situações, alterar os estados emocionais humanos.
Sabe-se, de antemão, como ela transmite entre os seres algo que lhes parece familiar e
como, neste caso, lhes atrai a atenção e dá prazer. “Há na música qualquer coisa de
inefável e íntimo; além disso, ela passa perto de nós semelhante à imagem de um paraíso
familiar, embora eternamente inacessível” (Schopenhauer, 1995). A música é uma
linguagem1. Há intencionalidade de se comunicar da parte daquele que a emite e há
entendimento por parte daquele que a escuta. Contudo, a forma em que ela se expressa é
singular e traz peculiaridades sobre o seu caráter psicológico, que trafega mais pelos
domínios da emoção. Essa associação entre o campo emocional e os possíveis intervalos
musicais que se dão no tempo, além das texturas musicais, evocadoras de climas, dos
timbres, enfim, fazem e fizeram da música, por exemplo,
elemento fundamental na
estrutura complexa do cinema. Não só deste como também das aberturas de programas na
TV, de suas trilhas sonoras e todas as associações entre a música e a imagem.
Muito antes do cinema, a música já suscitava imagem e associava, na imaginação
humana, cores, formas, texturas e aromas numa verdadeira profusão de sentidos.
Relembra-se, então, a idéia fenomenológica de uma imersão no mundo, com todos os
nossos órgãos sensoriais interconectados. Assim, a música atravessa não só a audição, mas
cria elementos que trafegam por toda a nossa percepção.
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A música popular e, no caso, a MPB (Música Popular Brasileira) tem um fator
ainda mais comunicativo: ela é toda estruturada no formato canção. Num sentido menos
erudito, a canção significa a união entre letra e melodia, o que a torna ainda mais
complexa, fazendo conexões entre a fonética das frases poéticas e as “frases melódicas”.
Em relação à prosódia, Antônio Adolfo coloca que “...uma melodia, assim como uma letra,
possui seus acentos” e que “o entrosamento perfeito (entre as duas) faz-se necessário”,
salvo algumas canções de “compositores mais capazes que sabem tirar partido dessa
acentuação incorreta” (Adolfo, 1997: p.50).
Dessa forma, no formato canção, letra e música se inserem num mesmo contexto
comunicacional; dizem algo em conjunto. Seus sentidos fundem-se agora, como se uma
explicasse o que a outra diz. É notável como a música parece sugerir a letra e vice-versa.
Torna-se bastante estranho quando não há este encaixe.
É justamente dentro deste universo da Música Popular Brasileira que o grupo
musical Matita Perê se envereda. O seu trabalho vai da composição, passa pelo arranjo
musical e segue para a interpretação das músicas; ou seja, percorre todo o trajeto emissão
na comunicação musical. Segundo Alexander Goehr (1995), a execução do músico é
complementar nesta comunicação em que há um ouvinte como receptor e toda uma
ambiência casual somada às predisposições do receptor.
Faz-se necessário, também, colocar que o grupo Matita Perê parece ter a imagem
musical2 como uma das marcas do seu trabalho. Isso se deve à influência de movimentos e
artistas como o Clube da Esquina, onde as notas soavam longa e fortemente, dando idéia
de distâncias e espaços. Além de alguns talentos do famoso movimento mineiro (Milton
Nascimento, Toninho Horta, etc.), outros grandes compositores do Brasil, como Tom
1
GOEHR, Alexander. A música enquanto comunicação. In: MELLOR, D.H. (org.). Formas de
comunicação. Lisboa: Editorial Teorema, 1995.
2
Sobre este assunto, ver: ADOLFO, Antônio. Composição: Uma discussão sobre o processo criativo
brasileiro. Rio de Janeiro: Lumiar Editora, 1997, p. 43.
4
Jobim, Dori Caymmi, Edu Lobo, têm em suas músicas uma forte carga de momentos,
lugares e espaços os quais elas contextualizam.
Um pouco sobre a indústria da música no Brasil
No Brasil, a exemplo de quase todo o mundo, o mercado fonográfico é
praticamente dominado pelas cinco grandes empresas transnacionais: a EMI-Odeon, a
Sony Music, a WEA, a Universal (que recentemente comprou a Polygram) e a BMGAriola, que possuem as maiores condições de distribuição e marketing de seus objetos de
comercialização (CDs, fitas cassete e vídeos musicais). Elas fazem vultosos investimentos
no intuito de encontrar sempre aquele produto que será bem vendido e que lhes dê uma
grande rentabilidade. Pode-se inferir a partir daí que elas estão buscando artistas
supostamente talentosos e carismáticos e que tenham trabalhos bastante atrativos para
serem facilmente aceitos pelo público. A maioria dos produtos nos quais estas gravadoras
investem, hoje, após ter passado por diversas experiências de modismos e tendências
musicais, está moldada de acordo com os formatos estéticos padronizados que já foram
previamente aprovados pelo grande público, como o pagode, a música brega e o axémusic.
Não se quer aqui criticar a formatação e a padronização musicais enquanto tais; ao
contrário: sabe-se, acompanhando o pensamento fenomenológico, que o homem
compreende as coisas e o mundo através das estruturas em que estes se apresentam, das
suas completudes estruturais absorvidas pelos nossos sentidos e não pela simples
associação simbólica de um elemento percebido por nós à sua respectiva significação. O
formato ao qual o texto se refere é a própria estrutura musical. Ela guarda uma relação
entre suas notas, timbres e outros elementos, conforme assinalado em Merleau Ponty
(1983), em seu texto sobre o papel psicológico da música no cinema. Estes formatos
5
seriam aquela silhueta musical dentro da qual perceberíamos a unidade de um produto. O
problema é que, com estas formatações estéticas, características dos produtos musicais da
grande indústria cultural, tornam-se comuns a repetição e, mais grave ainda, a fixação de
estruturas estereotipadas.
A maior parte da produção musical nacional – e, provavelmente, do mundo - tem
sido sufocada ou omitida por este processo seletivo meramente comercial. Muitos
produtores da área de música trabalham e criam artistas que se adequam a estes formatos
estéticos estereotipados, sem a menor pretensão de valorizar ou contemplar qualquer tipo
de trabalho brotado da originalidade artística de alguém, a menos que este já esteja
naturalmente adequado aos esquemas privilegiados pelo mercado. Por este motivo, com a
pequena diversidade musical – consequência dessa política midiática de padronização dos
gostos – vivemos, hoje, respeitando sempre a ordem das demandas do mercado. À medida
que vai se apresentando apenas uma pequena e pobre variedade musical à sociedade, mais
ela se torna inapta à discernir, avaliar ou aceitar outros estilos ou poéticas musicais.
As pretensões do grupo autoral Matita Perê, formado por Borega (Alexandre
Requião), Luciano Aguiar e Carol Carvalho3, são de, no futuro, gravar um CD; realizar um
trabalho para além das formatações estéticas musicais que imperam no mercado. Assim, o
Matita Perê, prima pela singularidade de seus compositores, apesar de terem em suas
raízes influências fortes de determinados segmentos e personalidades da Música Popular
Brasileira, a exemplo dos já citados integrantes do Clube da Esquina, de Edu Lobo, Dori
Caymmi, Tom Jobim, entre outros. Nenhuma forma é genuinamente nova; sempre depende
de outras formas que a ela dão origem. Porém, o estilo do trabalho do grupo Matita Perê
3
Os três integrantes do grupo se conheceram na Faculdade de Comunicação da UFBA (FACOM), onde,
além de terem vivido um grande período de troca de informações e amizades, despertaram para o interesse e
o dom em comum – a música. De início, encontraram-se Luciano Aguiar e Borega, que já tinham um vasto
trabalho composicional, esperando apenas o momento de sua maturação. De lá para cá, foram dois anos e
meio de afinco e, neste ínterim, descobriu-se o talento da flautista Carol Carvalho, que aos poucos foi se
integrando definitivamente ao grupo.
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dará a ele a marca final de sua autoria. É no estilo que se reconhece a autenticidade de um
autor; no seu modo de fazer, pois na obra está contido todo o percurso feito pelo mesmo no
processo de elaboração (Pareyson: 1989). Sem fazer concessões, o grupo pretende chegar
a um produto cultural marcado pela autenticidade musical de seus membros, com todas as
limitações e vantagens que isso possa trazer.
O primeiro grande desafio do grupo é, justamente, fazer jus ao nome Matita Perê,
título de uma canção de Tom Jobim e Paulo César Pinheiro e de um dos grandes LPs de
Jobim (Matita Perê, 1974). Contudo, se, por um lado, o Matita Perê sente a
responsabilidade de usar este nome, por outro, o mesmo traz força ao grupo tanto em
termos de sonoridade como de significado. Antes de mais nada, “matita perê” é a
denominação de uma ave brasileira de cor parda, amarelada, com peito e pescoço brancos e
crista vermelha, hoje, pouco encontrada em nosso território; essa palavra também é
sinônimo de Saci Pererê, entidade cheia de magias que assombra os viajantes, tem uma
perna só e vive fumando o seu cachimbo vermelho.
O grupo Matita Perê revela neste nome as suas referências artísticas e culturais, o
universo no qual o seu trabalho está inserido: o Brasil lendário, imenso, de culturas
diversas e grandes desigualdades sociais. Assim como é rico e belo em natureza, o Brasil
tem uma musicalidade incrível e sem igual. É notável como a música brasileira tem a
capacidade de trabalhar e conjugar elementos musicais diversos, contrariando àqueles que
dizem não haver, na arte, mais nada para se criar. O Matita Perê acredita que a música é
ilimitada, principalmente se adentrarmos no campo da música brasileira. A prova disso é a
originalidade e a diversidade dos trabalhos de seus grandes compositores.
O talento e o estilo original dos seus jovens integrantes e a capacidade de
incrementação harmônica, melódica e rítmica são um dos elementos mais atraentes do
Matita Perê, sendo assim uma grande promessa para a música brasileira e um alento para
aqueles que querem ver a continuidade da autêntica MPB.
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Sente-se que não será fácil inserir o trabalho do Matita Perê no mercado musical,
devido à inadequação do seu produto em relação aos formatos estéticos ditos comerciais.
Porém, nem sempre as regras mercadológicas imperam na indústria cultural, contrariando
as idéias dos filósofos da escola de Frankfurt, Theodor W. Adorno e Max Horkheimer
(1978), os quais demonstram em seu texto A indústria cultural: o iluminismo como
mistificação de massas que esta indústria imprime modos de produção artística,
submetendo a arte ao poder do capital. Mesmo sem ter aderido aos padrões estéticos das
músicas produzidas atualmente pela indústria fonográfica, é possível encontrar uma
maneira de se estabelecer como músico cantor, arranjador, instrumentista e compositor no
mundo de hoje; principalmente, após o surgimento de inúmeras possibilidades
comunicacionais na contemporaneidade, como a Internet e toda tecnologia digital de
gravação, por exemplo. Através delas consegue-se fazer a elaboração, a publicização e a
venda de produtos com baixos custos. Pode-se produzir videoclipes para serem veiculados
na MTV, festivais e outros eventos midiáticos. A própria sequência de “shows” de um
artista ou grupo musical pode angariar admiradores e encontrar um determinada fatia de
público “sintonizada” com as suas músicas. Ainda que não se consiga a projeção dada por
um desses grandes esquemas de produção midiática, é possível encontrar outras formas de
se lançar no mercado, vender o seu produto e ser reconhecido pelo seu trabalho musical.
Alguns artistas vêm conseguindo, dessa forma, chamar a atenção dos meios de
comunicação, agendar shows, fazer gravações, buscar saídas estratégicas para irem
criando, paulatinamente, as suas inserções na sociedade, mesmo sem estarem formatados
por padrões estéticos estabelecidos pelo mercado. Portanto, a gravação em CD de um
trabalho do grupo musical Matita Perê terá como marca a sua autenticidade e veracidade,
respeitando as idéias originais dos autores. Destarte, será definida uma maneira adequada
de inseri-lo no campo midiático musical e, consequentemente, no mercado fonográfico.
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O objetivo deste projeto experimental é dar um primeiro passo na direção da
gravação deste CD; neste sentido, optamos pela elaboração de um CD demo no
Laboratório de Multimídia (áudio) da FACOM.
O termo “demo” é uma abreviação da palavra demonstração. Portanto, a fita ou o
CD demo é um material da produção para que o artista ou grupo possa apresentar o seu
trabalho musical – da maneira mais clara possível – a outras pessoas. Este CD será
distribuído para gravadoras, produtores, jornalistas e outros interessados, os quais poderão
avaliar o produto. A inserção no mercado fonográfico, por sua vez, é algo imprevisível.
São muitos os compositores, bandas e artistas que disputam uma ascensão no mercado
tentando encontrar uma maior visibilidade para o seu trabalho. Nessa hora, prevalecerão a
qualidade e o amadurecimento do artista. O CD demo, juntamente com o portfolium e
outros materiais sobre a música e a carreira do grupo, são bastante importantes para que
este possa se apresentar no mercado, funcionando como um bom cartão de visita.
Do trabalho ao CD
Para se fazer a gravação de um CD, antes de tudo, é preciso se ter um trabalho
musical já amadurecido, ou seja, que tenha passado por alguns estágios de elaboração –
tanto na parte composicional quanto na qualidade dos seus músicos e intérpretes – e esteja
pronto para ser gravado, evitando deixar dúvidas quanto aos seus propósitos musicais. A
elaboração de um trabalho artístico musical, até chegar a este ponto, carece de tempo, para
que músicos envolvidos no projeto (compositores, arranjadores, instrumentistas) possam
concebê-lo e alcançar um resultado desejável. Todos os elementos musicais entram em
conjugação única, resultado da concepção de seus autores. Por isso mesmo eles se
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debruçam sobre os instrumentos, ensaiam, testam e escutam, pensam nas notas, nos
timbres, nos tempos e harmonias, equalizações, efeitos, entre outros.
Apesar deste texto argumentar a favor da maturação de um trabalho musical e da
precisão na sua elaboração, isso não quer dizer que estes detalhes sejam uma exigência da
indústria fonográfica. Esta última, muitas vezes, coloca nas prateleiras produtos musicais
de qualidade duvidável, primários e sem condições de apresentação.4 Isso acontece porque
estes mesmos produtos são bem aceitos por uma determinada categoria de consumidores,
posto que nem todo mundo tem capacidade de perceber os detalhes de uma má gravação
ou de uma música mal executada. Porém, dentro do gênero musical ao qual o trabalho do
grupo Matita Perê está inserido, fica impossível qualquer tentativa de apresentação e
apreciação de um produto sem que este seja instituído de um certo grau de qualidade.
Como este tipo de trabalho de MPB geralmente é bastante elaborado, são necessários uma
boa qualidade na execução e um bom nível técnico de gravação; de outra forma, alguns
detalhes de harmonias e arranjos musicais podem vir a ficar imperceptíveis, prejudicando a
audição do trabalho. Também, em boa parte, essa cobrança de qualidade se deve ao
público da MPB, que é um dos mais exigentes quanto à resolução técnica e estética de um
produto. Por estes motivos, o grupo musical tem que estar preparado para se lançar no
mercado e a sua capacidade é demonstrada com um resultado já amadurecido de seu
trabalho.
O CD DEMO
Segundo os autores do livro Manual de produção de CDs e fitas demo, Marcelo C.
de Oliveira e Rodrigo de C. Lopes (1997), preferencialmente, uma fita ou CD demo devem
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ser gravados com boa qualidade, mas da maneira mais simples possível, com faixas
limitadas apenas a um instrumento (geralmente o violão) e a voz. Neste caso, o produtor ou
a gravadora iriam ter mais facilidade de conceber o resultado final do produto, já que as
músicas ainda estariam em estado bruto e sem nenhuma definição; a única coisa a ser
apresentada seria o próprio trabalho composicional. Supostamente, num mercado que gera
grandes lucros, estes profissionais sabem ou deveriam saber quais os produtos artísticos
musicais que se enquadram no perfil do consumidor e de que forma este produto deve ser
lançado para ganhar espaço dentro de um segmento ou público alvo. Para poderem
trabalhar sobre a “matéria bruta”, os profissionais da área, segundo os autores citados
acima, preferem um CD ou fita demo mais “enxuto”, o qual tem mais chance de atraí-los
pelo conteúdo do material apresentado. Contudo, essa idéia funciona se aplicada a um
produto cultural mais simples, em que os arranjos e as harmonias já não façam parte da
própria composição. As músicas do Matita Perê são bastante elaboradas já na sua fase
composicional – algo comum em determinados segmentos da MPB – quando surgem
idéias de arranjos e outras sonoridades para a canção. Além disso, o Matita Perê tem a
pretensão de mostrar não apenas um trabalho composicional, mas, também, os seus
propósitos dentro da Música Popular Brasileira, em termos de composição, harmonia e
arranjo, e, como já foi dito anteriormente, isso seria impossível sem pelo menos tornar
audíveis os elementos mais característicos da sua intenção. Tenta-se deixar claro, nas
faixas do cd, que não se quer mostrar nada além dos arranjos musicais ou, mesmo, de um
trabalho bem elaborado com elementos quase que indissociáveis.
Decerto, o produto a ser apresentado aqui é apenas uma demonstração do trabalho
composicional do grupo Matita Perê; são idéias próximas da finalização, porém, gravadas
sem uma qualidade técnica desejada. Trata-se apenas de um prospecto do que será a obra
4
Podemos citar diversos erros de uma má gravação, como: desafinações, choques de harmonização, ritmos
fora do compasso, enfim, um sem número de detalhes que podem comprometer por demais um trabalho
musical.
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final do grupo. É importante dizer que este CD demo traz em si a concepção artística do
Grupo, como por exemplo, a forma em que ele é concebido e executado, sem perder nunca
o seu direcionamento musical. No período de gravação, foram evitados, portanto, solos
desnecessários, sem um prévio estudo, exacerbação de caracterização rítmica, adequação a
modismos musicais, timbres e efeitos mal colocados, etc. Para o grupo, as composições,
antes de serem produtos, são obras artísticas e devem ser encaradas como tal. Qualquer
redução feita neste projeto foi apenas por falta de recursos materiais ou humanos para
realizá-lo.
Tecnicamente, a gravação de um CD demo representa uma série de passos ligados
intimamente aos recursos de sua produção. Deve-se dominar os equipamentos de
execução: desde os instrumentos musicais até os aparelhos tecnológicos do processo de
gravação. Sérgio Bairon (1995), explanando sobre a relação da arte com a técnica,
comenta: “Mal sabia Benjamin5 que a tecnologia no final de seu século iria, não só
multiplicar e subjetivar os conceitos de autoria e reprodução, como também possibilitar a
existência de uma técnica como arte”. Neste caso, Bairon faz referência a todas as
possibilidades artísticas surgidas a partir de processos tecnológicos. O resultado do CD é o
somatório dos dotes musicais de cada integrante do grupo e das manipulações técnicas do
trabalho em cada um dos equipamentos utilizados, perfazendo as etapas de elaboração.
Esta manipulação dos recursos e ferramentas se dá de maneira empírica, através de
sucessivos testes ou tentativas para se chegar a bons resultados. Conta, portanto, a
sensibilidade daquele que está manipulando os sons com tais equipamentos, para saber a
hora de repetir ou dar como terminada mais uma etapa do processo.
Por fim, o CD demo tem que ser produzido de forma tal que as pessoas a quem este
trabalho se destina possam entender com clareza o que lhes é apresentado, podendo fazer
5
Walter Benjamin, autor de A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica. In: LIMA, Luiz Costa
(ORG.) Teoria da cultura de Massa. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1978.
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um julgamento do material sem que haja ruídos na comunicação entre o produto
(mensagem) e seu receptor. É preciso, portanto, dominar ao máximo todos os processos
referentes à elaboração de um CD, evitando que o trabalho seja comprometido numa de
suas etapas.
No caso do trabalho do Matita Perê, não são apenas composições a serem
apresentadas, mas o resultado da sua concepção musical. Muitas composições fortalecemse, ganham brilho com as suas rearmonizações, arranjos, e se tornam indissociáveis destes
elementos.
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Segunda parte:
Memorial da elaboração do CD demo do grupo Matita Perê:
Pré-produção
Nessa primeira etapa, há uma organização de toda a produção que se seguirá na
elaboração do cd. Serão definidos os arranjos e consequentemente os timbres musicais para
cada canção, o que exigirá um estafe de músicos. A escolha dos músicos, a adequação dos
horários de estúdio para gravações e todo um calendário a ser cumprido apontam para a
necessidade de uma pré-produção, etapa que, obviamente, antecede a entrada dos músicos
no estúdio. Muitas coisas estão envolvidas neste processo e muito há para se resolver
previamente, antes da gravação, como por exemplo: a minimização de custos e tempo em
cada uma das etapas acima citadas, mesmo que se trate apenas de um CD demo.
Um estúdio de gravação cobra por período de utilização de seus equipamentos.
Normalmente estes períodos variam de 3 a 4 horas e são bastante caros, a depender do
estúdio. É preciso, então, fazer um agendamento das horas que serão gastas com este
trabalho, treinando a execução dos arranjos antecipadamente para não se perder tempo
dentro do aquário de gravação. O tempo dentro do estúdio custa dinheiro. Este não é
propriamente o caso da gravação do CD demo do Matita Perê. O estúdio utilizado para a
gravação é da Faculdade de Comunicação da UFBA (FACOM), sendo oferecido ao grupo
como espaço para realização deste projeto. Mesmo assim, houve que se agendar horários
para utilização do estúdio da FACOM, dividindo-o com outros trabalhos que lá eram
realizados. Teve-se, também, que marcar com os músicos horários, conciliando estes com
os de liberação do estúdio.
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A pré-produção, portanto, inclui desde a familiarização técnica com os
equipamentos do estúdio, iniciada no ano anterior, até o registro autoral de todas as
músicas que foram gravadas, mesmo sabendo que o CD é um documento datado de
registro, principalmente, um CD realizado no meio acadêmico.
Deve-se fazer uma agenda para garantir a ordenação dos trabalhos. Durante a
gravação do CD demo do Matita Perê, fez-se também um memorial de tudo que ia sendo
realizado.
Gravação
Para se fazer uma gravação organizada e criteriosa, devemos ordenar o que será
gravado. Antes de mais nada, faz-se necessário marcar o andamento de cada música, a
duração de seus tempos de compasso. Pouquíssimas pessoas conseguem executar uma
música inteira dentro de um ritmo6 frequente, sem acelerá-la ou atrasá-la; isso é
extremamente natural e humano; inclusive, causa-nos uma certa estranheza a execução de
uma melodia com tamanha precisão de tempo por um computador. É preciso, então,
marcar os andamentos das músicas em um metrônomo para que os músicos possam se
basear durante a gravação. Em algumas canções pode ser bastante interessante esta
naturalidade com que o homem, simplesmente, aplica o seu tempo interno à música (este
foi o caso da faixa Nascente, gravada sem metrônomo), sem a influência de uma marcação
de tempo externo.
Preparadas as marcações de tempo em um metrônomo, foram iniciadas as
gravações no dia 20 de março. Primeiramente, escolhemos algumas canções do trabalho do
grupo Matita Perê para iniciar o processo. As cinco primeiras foram: Rosiana, Já na Lua,
6
Sobre ritmo, melodia e outros elementos da música, ver: KIEFER, Bruno. Elementos da Linguagem
Musical. 2a ed. Porto Alegre: Movimento; Brasília: Instituto Nacional do Livro-MEC, 1973.
15
Menino de Feira, Tão longe e tão perto de Jobim e Nem dinheiro nem Maria, músicas
prontas para a gravação, ou seja, com o arranjo concebido, e que facilitavam a produção
por poderem ser gravadas apenas pelos membros do grupo.
Colocamos, antes de mais nada, as bases de cada canção. As bases das canções do
Matita Perê, no caso das músicas aqui gravadas, estão sempre nos violões, pois os seus
compositores trabalham mais com este instrumento, transferindo para ele toda a alma do
conjunto. Então, começou-se a gravar os violões base de cada uma das cinco músicas, para,
em seguida, ir preenchendo-as com os outros instrumentos. Este primeiro período de
gravação das bases durou aproximadamente quatro períodos de gravação (doze horas) em
dois dias, pois uma base deve ser gravada com uma boa execução, sem perder o tempo do
compasso e fazendo soar as notas com clareza, afinal, ela irá nortear toda a música e pode
induzir erros nas gravações dos outros instrumentos. Neste dois dias, gravamos quase todos
os violões referentes às cinco músicas, sendo que as bases de Nem dinheiro nem Maria
foram feitas por Luciano Aguiar e o restante por Borega.
Voltamos ao estúdio da FACOM nos dias 27 e 28 de março, quando foram
gravados os baixos das músicas pelo multinstrumentista Borega. Completamos, também, a
gravação dos violões. Os trabalhos se davam quase sempre aos finais-de-semana.
Casualmente,
entrava-se
no
estúdio
no
meio
da
semana
para
adiantar algum serviço e facilitar os momentos de gravações. Isso acontecia, como já fora
dito anteriormente, a produção deste projeto dividia os horários do estúdio com outros
trabalhos realizados no mesmo; era preciso um agendamento.
Somente no dia 10 de abril retornamos ao estúdio para a gravação das flautas por
Carol Carvalho, integrante do grupo, nas faixas Rosiana, Já na Lua e Menino de Feira.
Este trabalho foi concluído no dia 15 de abril. Enquanto isso, Borega já ia gravando alguns
elementos dos arranjos com timbres de um módulo de sons midi pertencente ao próprio
estúdio; os famosos timbres eletrônicos. Para gravar estes detalhes de arranjo, foram feitas
16
exaustivas seleções das timbragens existentes no módulo, buscando aquelas que melhor se
adequavam às faixa em termos de casamento de timbres. Alguns destes timbres estão
presentes em outras faixas do CD demo, pois assim daríamos uma unidade estética para o
trabalho.
As músicas já estavam prontas, faltando somente a inserção das vozes. No dia 21 de
abril, o Matita Perê recebeu a visita da cantora Cláudia Cunha, que lhe emprestou a voz na
canção Já na Lua, juntamente com Borega. A partir daí, as vozes foram sendo gravadas
uma a uma, respectivamente, no período de 21 a 24 de abril, menos a voz de Menino de
Feira, devido a algumas complicações técnicas. Esta música acabou ficando à espera
somente da voz para a sua finalização.
As canções restantes começaram a ser gravadas em 1o e 2 de maio. Durante estes
dias foram feitas as bases de Nascente e Triângulo e foram aproveitadas as bases de
Antenado e Mão a palmatória, que haviam sido feitas desde janeiro, quando o grupo já se
preparava para o projeto. Colocamos, também, os outros violões destas músicas (Os dados
técnicos destas gravações podem ser conseguidos na “Ficha Técnica” do CD).
Após este fim-de-semana, o grupo Matita Perê voltou a se reunir nos dias 15 e 16
de maio para a gravação dos baixos e instrumentos midi das músicas citadas logo acima.
No dia 26 de maio foram gravadas as bases de Ciclo retirante e De Itajubá. Logo no dia 1o
de junho, Carol Carvalho gravou as flautas em De Itajubá. Os outros instrumentos que
restavam para finalizar as músicas foram gravados até o dia 12 de junho, faltando apenas
os violoncelos de Mão à palmatória e Nascente e o triângulo da música Triângulo, única
que leva algum instrumento de percussão.
Entre os dias 13 a 18 de junho foram gravadas as vozes das faixas restantes. Logo
em seguida, no dia 19, o maestro João Omar chega de Vitória da Conquista para gravar o
cello em Mão à palmatória e Nascente e Luciano Aguiar grava o triângulo, encerrando
assim o ciclo de gravações.
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Considerações sobre os detalhes técnicos da gravação
A mesa de gravação utilizada é um software (Session8) de P.C. (Personal
Computer) que funciona no computador, conectada a uma mesa de som da Mackee (16
canais) através de uma placa de som especial do próprio Session8. Os instrumentos são
gravados como arquivos “wave” (.wav) e são processados dentro do próprio computador
para dali sair o CD demo.
A apropriação técnica dos recursos e ferramentas utilizadas nesta gravação se deu
de maneira empírica, do mesmo modo que se explicou anteriormente. O grupo, a partir da
própria prática e uso do equipamento, foi aprendendo, paulatinamente, a trabalhar com o
mesmo. Esta prática, de certa forma, influenciou no resultado do trabalho, ou seja, o
equipamento exigiu um desenvolvimento à parte no modo de fazer o CD – provavelmente
seria diferente com um outro.
Assim, além de se esforçar para conhecer bem o equipamento com o qual estava
lidando, a equipe técnica do CD tentou, ao máximo, dominar os seus recursos de maneira a
extrair o melhor som das gravações. Para as próximas etapas, seria bem mais fácil se
trabalhar num arquivo que já havia sido bem gravado.
O grupo Matita Perê trabalha — basicamente — com instrumentos acústicos,
fazendo uso, de vez em quando, de timbragens eletrônicas. A captação do som de um
instrumento, a exemplo do violão, é feita por microfone e isso exige uma qualidade no
equipamento, assim como o uso correto deste. Para o violão, o ideal é usarmos microfones
unidirecionais apontados para o 14o traste e para a tampa do bojo do violão, nunca
direcionando o microfone para a boca do mesmo. Detalhes como este foram sendo
descobertos no próprio decorrer das gravações, à medida que íamos conseguindo textos
sobre como se gravar, mixar e masterizar. Os violões, por exemplo, de De Itajubá e Ciclo
retirante foram sensivelmente melhores do que os outros, no que se refere à qualidade das
gravações.
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Os violoncelos foram gravados pelo mesmo processo: dois microfones, um na
tampa do bojo, atrás do cavalete, e outro na região inferior do braço. O primeiro capta
melhor as regiões graves do instrumento, assim como o segundo capta melhor os agudos.
Estes microfones entram em dois canais na mesa de gravação (programa: Session8). A
conjunção dos dois canais, buscando um balanceamento para o som dos instrumento
através da regulação de seus volumes, será o resultado final da gravação do instrumento.
Dessa forma, podemos evitar “graves” que estouram o som e “agudos” trastejantes (no
caso do violão) e metálicos, sons de unhas nas cordas, etc.
Estes são alguns detalhes que expressam o quanto o conhecimento técnico favorece
a gravação de um CD.
Mixagem
É muito difícil na elaboração de um CD saber dizer exatamente o que diferencia o
momento de mixagem, de equalização e colocação de efeitos. Pressupostamente, a
equalização e a colocação dos efeitos fazem parte da própria mixagem da música, sendo
muito comum o trabalho com estes processos durante o período de mixagem. Só podemos
entender realmente a mixagem de uma música se escutarmos por inteiro, fazendo uma
soma de todos os “reverbs7” que nela são colocados, dos graves, médios e dos agudos em
cada instrumento e dos volumes destes. Em contrapartida, deve se ter, no momento em que
se aplica algo às gravações, uma noção prévia do que será a música na mixagem final. É
preciso, também, fazer relações entre a qualidade dos sons (equalizações, intensidades e
etc.) dos outros elementos e o efeito que será aplicado no instrumento em que se está
trabalhando.
7
Reverb é um efeito sonoro que dá uma noção de espacialidade, simulando ambientes onde reverberam as
ondas sonoras, por exemplo: corredores, cavernas, salas grandes e muitos outros.
19
Quando se aplica uma equalização a um instrumento pode-se estar imprimindo
ganho ou perda de volume ao mesmo.
O processo de mixagem começou a ser realizado logo após a primeira gravação. A
partir daí, todos os instrumentos vão sendo balanceados com os outros. Não há necessidade
de se gravar um instrumento se este não será escutado no “bolo musical”, se este ficará
escondido atrás dos outros elementos. Na música, tudo tem que se complementar e quem
trará todos os seus detalhes à tona, numa perfeita conjunção, será justamente a mixagem.
Esta é, pode-se afirmar, uma etapa não somente técnica da gravação, mas responsável por
uma condição estética da música. Uma mixagem pode embelezar ou destruir um trabalho.
A mixagem é, propriamente, o balanceamento entre os instrumentos gravados, não
deixando que uma coisa se sobreponha à outra, porém, este encontro sonoro entre os
elementos gravados se deverá, em boa parte, ao trabalho de equalização e colocação de
efeitos em cada uma deles, formando o já citado “bolo musical”. Portanto, é mais fácil
dizer que estas duas etapas do processo estão inclusas na mixagem, apesar de serem
identificadas separadamente.
A mixagem final começou a ser feita no dia 10 de junho, juntamente com o
processo final de equalização e colocação dos efeitos. Para o melhor entendimento das
questões aqui levantadas, prefere-se abordar, de início, estes dois processos: a equalização
e a colocação dos efeitos no trabalho do grupo Matita Perê.
Equalização e Efeitos
No momento em que começamos a trabalhar os arquivos originais das gravações,
foram feitos “backups”8 destes para não se correr risco de perdas. Os arquivos podem ser
8
Backups são cópias de segurança dos arquivos.
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alterados e não haver mais como mudar este resultado, ou seja, perde-se o arquivo ou
aceita que ele fique do jeito que está.
As equalizações foram iniciadas quando foi finalizada a etapa de gravação das
primeiras faixas do CD. Logo após, na última semana de abril, entre 25 e 28 deste mês, foi
iniciado um trabalho de colocação de efeitos (reverbs) nos instrumentos e suas
equalizações. Este processo de equalização e de colocação de efeitos não foi tão ordenado;
ocorria conforme a necessidade e o tempo disponível. As músicas só chegaram a ser
realmente equalizadas quando o projeto se aproximava do final das gravações, dia 10 de
junho. Dali em diante, as músicas foram sendo trabalhadas de acordo com uma sonoridade
que desse unidade ao disco. Pelo menos, esta foi a tentativa: ter no conjunto das músicas,
além de uma unidade composicional e de arranjos, uma ambientação sonora específica
para o CD.
A colocação de efeitos ocorreu, em boa parte dos casos, no próprio momento da
gravação, diminuindo em muito o trabalho no final. Isso aconteceu para facilitar o trabalho
dos músicos que iam colocando os outros instrumentos: “é mais fácil gravar um
instrumento quando a base, à qual se tem que acompanhar, chega mais clara em seus
ouvidos”, como disse o integrante do grupo, Borega. Para os últimos dias, juntamente com
a equalização, foram colocados os efeitos nos instrumentos que faltavam e nas vozes,
fazendo alguns retoques e complementações. A colocação dos reverbs (efeito mais
utilizado neste trabalho) segue, no período final do projeto, praticamente o mesmo
cronograma das equalizações.
Considerações técnicas sobre a equalização e a colocação de efeitos
Os arquivos gravados, conforme dito no item anterior, são processados dentro do
computador – esta é a condição do equipamento digital de gravação do estúdio de áudio da
FACOM. Existem dois softwares instalados no computador de trabalho que podem usados
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para a equalização das músicas, o Sound Forge e o Session8. O Sound Forge se adequa
melhor ao trabalho de equalização de arquivos wave, podendo ser usado para a colocação
de diversos efeitos, masterização, criar “bounces9” estéreos, entre outros, porém, no caso
específico da equalização, o Session8 facilita, em muito, o trabalho do técnico. A questão é
que os arquivos wave geralmente são muito grandes e demoram de ser processados, além
de que, para se escutar a música por inteiro, com todos os instrumentos tocando ao mesmo
tempo, só é possível através da mesa do Session810, no qual a equalização tem uma
aplicabilidade imediata sobre a onda gravada. Já no Sound Forge, este processo é muito
demorado. Para testar uma equalização a ser aplicada num arquivo gravado, o programa
trabalha num processo muito lento e só coloca o efeito sobre um pequeno trecho do
arquivo, que muitas vezes não é suficiente para o técnico perceber a alteração ocorrida.
Esta aplicação não é imediata, levando algum tempo para acontecer. Por estas e outras, o
Session8 se torna mais prático na hora de equalizar.
Um outro problema enfrentado na equalização foi a não fidelidade dos monitores –
ou caixas de som – utilizados em relação ao que realmente está gravado. Têm-se a
impressão, a partir de testes feitos em gravações de fitas para serem escutadas em outros
equipamentos, de que o aparelho da FACOM esconde os graves que soam durante a
música. Às vezes, o que parece ser agudo nos monitores do laboratório fica bastante grave
em outros aparelhos de reprodução sonora. Melhor, então, usar o “fone”. Mesmo assim,
foram necessárias constantes gravações de fitas para melhor apurar os resultados.
Quanto à colocação dos efeitos, o programa utilizado foi o Sound Forge, o único no
computador que possui esta qualidade. Este processo de colocação de efeito se tornou
A palavra “Bounce”, em português significa: pulo, salto, elasticidade, vivacidade, etc. No caso deste texto,
o significado da palavra “bounce” é o mesmo da terminologia técnica utilizada pelo programa Session8: é a
junção de dois ou mais outros arquivos, dando origem a um terceiro. Por exemplo: quando se junta as flautas
de uma música num só arquivo.
10
O programa simula uma mesa de som na tela do computador.
9
22
demasiadamente lento por conta da não imediatibilidade do software e do computador de
trabalho, um pentiun 166 Mhz.
Mixagem no Session8
O disco vinha sendo mixado desde o início das gravações, como já fora dito, pois,
para poderem gravar os seus instrumentos, os músicos precisam escutar o que foi gravado
anteriormente com volumes minimamente equilibrados. Afinal, eles terão que acompanhar
aquela música, não podendo esta lhes parecer confusa. Quando o processo de mixagem
final foi iniciado, no dia 10 de junho, já havia, portanto, um bom equilíbrio entre os
instrumentos que haviam sido gravados nas faixas e já se sabia com mais precisão o rumo
que se iria tomar neste sentido.
Do dia 10 até o dia 21 de junho, todas as mixagens foram feitas, em horas
exaustivas dentro do estúdio e nos intervalos entre uma gravação e outra. Havia três
pessoas trabalhando diretamente nesse trabalho, além de Luciano Aguiar, revezavam-se
Carlos Paiva e Borega no apoio, isso quando não estavam os três. Era super importante ter
a opinião de mais de uma pessoa, pois ninguém consegue estar sempre atento a todos os
detalhes; algo pode escapar. Apesar de haver boas discussões argumentativas, as decisões
eram tomadas sempre em consenso, tornando mais difícil a possibilidade de três pessoas
incorrerem no mesmo erro.
Assim, as músicas foram devidamente mixadas e o trabalho é dado por encerrado
quando todos os arquivos das faixas recebem os decibéis que lhes foram estimados na
mixagem, isto pode ser feito no Sound Forge ou no próprio Session8. Dispensa-se, então, o
controle de ganho de volume da mesa de som do Session8, deixando-a em flat (com os
arquivos no 0 dB). Este trabalho é feito para que se possa dar início à próxima fase.
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Considerações técnicas sobre a mixagem
O software utilizado neste processo é o Session8, pois o mesmo oferece 8 canais
para o trabalho de mixagem. Nele, é possível trabalhar o equilíbrio entre os instrumentos –
agora já equalizados e com reverb – através da mesa de som apresentada na mesa de
computador. O sistema é simples: são oito faixas dispostas paralelamente e na horizontal.
Em cada uma destas faixas são colocados arquivos que foram gravados (um ou mais, desde
que não fiquem superpostos). Para cada uma delas há um controle de ganho (volume) e
este pode ser regulado de acordo com o arquivo que está presente naquele momento do
canal, por exemplo: duas ou três partes de uma flauta num mesmo canal - que nem sempre
são gravadas com a mesma intensidade, além de que, elas estão em pontos diferentes da
música e necessitam de uma avaliação de suas alturas de acordo com contexto geral –
provavelmente devem ser mixadas com volumes diferentes. Não se pode, portanto, fazer
uma regulagem geral do volume naquele canal, tem que se dar ganhos diferenciados em
pontos do mesmo. Para esse tipo de trabalho existem recursos no Session8.
É bom notar mais um detalhe: o volume geral da música e o volume de seus
arquivos individuais não podem passar do limite permitido pela potência do equipamento.
Se isto ocorre, o arquivo terá um som destorcido, com má qualidade de audição,
prejudicando o trabalho. O próprio Session8 mostra quando o arquivo estoura, ou
ultrapassa este limite.
Mix-instrumental estéreo
Esta etapa serve para transformar a música, que ainda é mono (toda regulada numa
única direção) para estéreo, ou seja, com diferença nas duas saídas L e R (Left e Right) de
um som comum, amaciando mais ainda o trabalho, depois de todos os efeitos e
equalizações. O efeito estéreo, neste caso, em termos simples, consiste no deslocamento de
24
um instrumento mais para uma caixa do que para a outra. Por exemplo: um violão pode
pender mais para o lado esquerdo enquanto o outro para o lado direito, dando uma
sensação de ambiência ao ouvinte, de espacialidade da música.
Esse efeito é bastante trabalhoso. Não é apenas a aplicação de um equipamento que
o faça por si só. Ele é calculado, pensado em termos de decibéis, e, ainda aí, há uma
escolha estética no seu equilíbrio.
O mix-instrumental estéreo é a colocação deste efeito apenas sobre a parte
instrumental da música, excluindo-se daí a voz e os instrumentos solos, como o solo de
baixo em Nem dinheiro nem Maria ou a sanfona de Ciclo retirante. Estes últimos são
mixados, depois, sobre o mix-instrumental (esta é uma recomendação encontrada no
próprio manual do Sound Forge).
Segue abaixo o exemplo dos cálculo de um mix-instrumental:
De Itajubá
Viola_bo
Viola_lu
Baixo
Flautas
Jazz1
Fra_jazz
Viointro
cama
harmo
Left
+1.2dB
- 1.2dB
+0.8dB
-0.8dB
+2.2dB
-2.2dB
0dB
0dB
0dB
Right
-1.2dB
+1.2dB
-0.8dB
+0.8dB
-2.2dB
+2.2dB
0dB
0dB
0dB
Voz(start 3.715)
Vale ressaltar que há uma compensação dos ganhos para cada instrumento. O
arquivo Viola_bo, por exemplo, perde 1,2dB na caixa da direita, mas ganha 1,2 dB na
esquerda. Também ocorre que os dois lados das caixas devem ficar razoavelmente
equiparados em relação às suas intensidades sonoras, senão causaria um efeito incomodo
no ouvinte, que escutaria uma caixa mais alta do que a outra.
25
Para finalizar esta explicação, levanta-se aqui o fato de que nem todos os
instrumentos da música De Itajubá estão soando ao mesmo tempo, portanto, o equilíbrio
deve ser feito considerando o momento da música, e isso é muito complicado.
O mix-instrumental começou a ser preparado na noite do dia 21 de junho. Tinha-se
a impressão de que seria fácil e sem maiores complicações. Este trabalho demorou dois
dias para a sua conclusão, pois o computador demorava bastante para processar os dados.
Considerações técnicas sobre a elaboração dos mix-instrumentais estéreos
O primeiro passo para a elaboração de um mix-instrumental é fazer um bounce no
Session8 de todos os arquivos instrumentais da música, considerando os parâmetros de
alturas da saída esquerda e um outro para a direita. A partir destes dois bounces (bnc_l.wav
e bnc_r.wav), segue-se para o Sound Forge, onde transforma-se estes arquivos em dois
lados de um arquivo estéreo.
Junção das vozes com os mix-instrumentais
A junção da voz e de alguns instrumentos solo com o mix-instrumental deve ser
feita por último, conforme relatado anteriormente. Apesar do pequeno comentário sobre
este processo, o mesmo requer bastante cuidado e preciosismo. A voz, ou um instrumento
solo, tem que se sobressair na música, deixando clara a letra e a melodia da canção. Porém,
deve-se encontrar um ponto certo entre a intensidade dos instrumentos e a da voz,
evitando, assim, a supressão de alguns elementos mais baixos ante o volume desta. A voz é
gravada sem diferença nas saídas, com o mesmo volume para ambos os lados.
Um outro detalhe interessante é que em muitas músicas gravadas o volume de voz
aparece mais alto que os demais instrumentos, situando-a num outro plano: a voz fica fora
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do “bolo musical”. O ideal é que ela fique imersa neste conjunto, sem que se perceba esta
separação. Fazer isso é muito difícil e requer muita precisão.
O bounce das vozes foi feito no mesmo momento em que se acabou de fazer os
mix-instrumentais, durando três dias consecutivos, varando-se as madrugadas. Algumas
vezes, descobrimos detalhes imprecisos na mixagem, equalização, etc., reiniciando todo o
processo para corrigir erros anteriores.
O programa e o computador demonstraram as suas máximas lentidões, gastando
bastante tempo no processo de aplicação das vozes nos mix-instrumentais. Cada vez que se
testava um volume da voz no mix, demorávamos em torno de 20 mim para o computador
processar e muitas vezes o trabalho ainda não estava no ponto. Foi bastante desgastante. O
trabalho foi finalizado no dia 25 de junho.
Masterização
De acordo com a explicação de Mauro Cogo, técnico de masterização profissional,
em entrevista concedida ao site Usina, na Internet (http://i.am/usina, 1999), “a
masterização surgiu como uma nova etapa da produção musical. Até meados da década de
80 os discos de vinil eram prensados à partir da fita da mixagem, sem passar por nenhum
outro processo. Com a chegada do CD e gravadores e processadores digitais, novas
possibilidades no tratamento do áudio surgiram, incluindo a finalização, onde trabalha-se
os canais L e R da música já mixada. Em outras palavras, para as músicas serem gravadas
no CD, elas tem que ser transferidas para um computador, com softwares específicos de
edição de áudio, e, nesse processo, o som é processado melhorando sua qualidade”. Fazem
parte do processamento de masterização: compressão, equalização, ambientação, etc.
Enfim, o que se faz nos canais isolados de mixagem, pode-se fazer, agora, nos canais L e
R.
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Na elaboração do CD demo do Matita Perê, dos processos envolvidos numa
masterização completa, fez-se apenas uma compressão manual das ondas sonoras nos
canais L e R, diminuindo os picos, ou pontos de máximo das ondas – infelizmente, não
tínhamos um equipamento que fizesse a compressão completa dos canais. Estes picos da
gravação distorcem o som reproduzido e podem danificar os aparelhos de som. No próprio
Sound Forge, que é, basicamente, um software de edição sonora, o técnico de som pode
verificar a onda gravada e reduzir os picos desta, sem que ninguém perceba alguma
alteração audível no decorrer da música. Mudar um pouco um pequeno trecho da onda é
imperceptível ao ouvido humano, mas melhora sensivelmente a reprodução por parte dos
equipamentos.
Este processo de redução de picos nas músicas aconteceu em dois momentos:
durante a mixagem, em alguns arquivos que estavam com pontos muito altos em relação ao
seu nível de gravação, e na masterização, para limpar os momentos em que a música esta
“estourando”. Em ambos os casos, tivemos bastante cuidado para não retirar os harmônicos
dos instrumentos ou alterar a própria interpretação dos músicos, a dinâmica que eles dão à
suas gravações. A masterização não pode corromper o trabalho ou alterá-lo no seu
propósito.
Na masterização, fizemos, também, uma equalização final das faixas, sem alterá-las
por demais. As músicas já estavam praticamente concluídas.
O início das masterizações se deu a partir do dia 25 de junho, quando os arquivos
estéreo já estavam com as vozes adicionadas. No arquivo estéreo, pode-se fazer a
masterização dos dois lados separadamente ou em conjunto.
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Finalizações
No momento em que realizávamos a masterização dos arquivos estéreo,
aproveitamos para fazer a limpeza dos mesmos, cortando os excessos no início e no fim,
retirando ruídos destas regiões, aplicando fades, etc. Enfim, trabalhando a música para que
ela não contenha indesejáveis.
Partiu-se, então, para a gravação das músicas no CD. O programa Corel Cd faz este
trabalho, convertendo o arquivo wave num arquivo de áudio para CD. O tempo médio para
reprodução de cada CD foi de 1 hora para ser reproduzido no equipamento aqui utilizado.
Conclusão
Gravar um CD, cumprindo todas as suas etapas, é um processo árduo e exige
grande dedicação. Para realizar este projeto, o grupo musical Matita Perê já vinha se
preparando desde o ano passado, quando havia gravado três músicas num outro trabalho
acadêmico (uma delas foi adicionada ao CD demo, Casa do Fogo – última faixa do disco).
Estas três músicas demoraram quase um ano para serem finalizadas, demonstrando o
quanto seria difícil a realização deste projeto, que aliás só foi possível graças à experiência
de trabalho que o grupo já havia adquirido anteriormente. O processo é lento e exigiu
dedicação máxima por parte do grupo.
Obtivemos uma boa qualidade no produto final. Vale lembrar que se trata de um
CD demo. Conseguimos, com os recursos disponíveis, demonstrar as composições e os
elementos de arranjo de forma clara em quase todas as músicas, sem deixar dúvidas para
quem vai ouvir. O maior problema ocorrido aconteceu na mixagem das vozes. O técnico de
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mixagem foi enganado pelos monitores, que dão uma resposta diferente do som
reproduzido pelo CD. As vozes das músicas acabaram ficando um pouco altas.
Houve problema, também, de saturação na reprodução dos CDs. As faixas foram
registradas num volume (intensidade) que, no equipamento do estúdio, não apontava
nenhum problema, mas está estourando em equipamentos normais de som. Este mesmo
CD será utilizado agora como parâmetro para uma nova mixagem, guardando as devidas
proporções entre o que nele se escuta e o que se ouve nos monitores do estúdio.
A não gravação de instrumentos percussivos nas músicas foi uma opção do próprio
grupo (com exceção do triângulo na faixa de mesmo nome – neste caso, o instrumento faz
parte da própria concepção musical do autor). Seria por demais trabalhoso e pouco
demonstrativo, já que a concepção rítmica está embutida na própria execução dos
instrumentos e nos arranjos. Seguindo a cadência de cada uma destas faixas gravadas no
CD demo, o Matita Perê já tem idéia de qual será a aplicação dos instrumentos percussivos
nas suas músicas.
O CD demo do Matita Perê ainda é uma obra aberta, sujeita a alterações. Foram
feitos backups de todos os arquivos, tornando possível retrabalhar os mesmos, e há, até
mesmo, a possibilidade de regravar alguns instrumentos, apesar de que para isso necessitese de bastante tempo e esforço.
De posse do CD demo, o grupo Matita Perê tem maiores chances de se inserir no
mercado, podendo almejar a próxima etapa de sua produção.
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