Estímulos químicos e visuais de predador sobre a

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Universidade Federal da Paraíba
Centro de Ciências Exatas e da Natureza
Departamento de Sistemática e Ecologia
ESTÍMULOS QUÍMICOS E VISUAIS DE PREDADOR SOBRE A TOMADA
DE DECISÃO ENTRE ALIMENTAR-SE E REFUGIAR-SE EM GRUPOS DE
TILÁPIAS-DO-NILO (Oreochromis niloticus)
Lucas Henrique Cavalcanti Mendes
João Pessoa
1
2010
2
Lucas Henrique Cavalcanti Mendes
ESTÍMULOS QUÍMICOS E VISUAIS DE PREDADOR SOBRE A TOMADA DE
DECISÃO ENTRE ALIMENTAR-SE E REFUGIAR-SE EM GRUPOS DE
TILÁPIAS-DO-NILO (Oreochromis niloticus)
Monografia apresentada ao
Curso de Ciências Biológicas
Da Universidade Federal da Paraíba,
Como requisito para a obtenção do
título de bacharel em Ciências
Biológicas.
Orientadora:
Professora Dra. Ana Carolina Luchiari
João Pessoa
3
2010
4
Lucas Henrique Cavalcanti Mentes
ESTÍMULOS QUÍMICOS E VISUAIS DE PREDADOR SOBRE A TOMADA DE
DECISÃO ENTRE ALIMENTAR-SE E REFUGIAR-SE EM GRUPOS DE
TILÁPIAS-DO-NILO (Oreochromis niloticus)
Banca Examinadora
______________________________
Profa. Dra. Ana Carolina Luchiari (Orientadora)
Universidade Federal do Rio Grande no Norte
______________________________
Prof. Dr. Paulo Montenegro
Universidade Federal da Paraíba
_____________________________
Prof. Dr. Ricardo de Souza Rosa
Universidade Federal da Paraíba
____________________________
Profa. Dra. Maria Cristina Crispim
Universidade federal da Paraíba
João Pessoa-PB, 2010
5
Dedico este trabalho aos meus
queridos
pais,
por
toda
dedicação em formar
um
homem
6
de princípios.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus por ter me guiado até aqui e pelos muitos sonhos e planos
que me indicam onde me levará.
Aos meus pais, minha irmã, e minha namorada Carmem pelo apoio diário,
pelos muitos conselhos de onde extraí sabedoria e pelo apoio incondicional durante
estes anos de curso que muito me fizeram crescer.
Agradeço de maneira especial à minha orientadora Ana Carolina Luchiari, um
dos maiores presentes que recebi de Deus durante o curso. Agradeço a ela por ter me
inserido no mundo da ciência, me motivando, incentivando, patrocinando e muito
pacientemente me ensinando a me fazer pesquisador. Jamais me esquecerei deste
carinho prestado.
Aos meus companheiros de laboratório Diana Chacon, Thiago Brandão e
Rafaela Estrela, pelo apoio, colaboração direta neste trabalho e pelas muitas risadas
que tornavam o trabalho mais aprazível.
A minha turma de biologia (Eternos feras) que carregarei para sempre comigo,
Edinaldo, Rafael, Anderson, Alvino, Taynah, Joana, Laís, Thalita, Bruno, Sarah,
Yara, Franciane, Max, Juliana, Júlio, Julie, Emanuele..., agradeço a todos pelos
inesquecíveis momentos de felicidade que compartilhamos.
Agradeço também à professora Amélia Kanagawa e ao professor Rivete Lima
por terem sido tão presentes durante minha jornada, contribuindo com seus conselhos
e mais ainda sendo exemplos de profissionais e pessoas.
À Banca examinadora por ter aceitado revisar e avaliar este trabalho.
À Damatta Agronegócios por ter generosamente me cedido as cobaias
utilizadas neste trabalho.
7
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Desenho esquemático do aquário usado para os animais foco deste estudo.
Figura 2. Desenho esquemático das condições experimentais testadas.
Figura 3. Esquema do modo de observação dos parâmetros comportamentais do
aquário foco.
Figura 4.Gráfico: Coeficiente de variação da dispersão em grupos de 3 tilápias-doNilo
frente a estímulo químico ou visual de predador (pintado).
Figura 5. a) Distancia do refúgio (planta artificial); b) distancia do sítio de
alimentação
Figura 6. Tempo gasto no sítio de alimentação em grupos de 3 tilápias-do-Nilo frente
a estímulo químico ou visual de predador (pintado).
Tabela:
Tabela-1. Composição nutricional da ração usada na alimentação dos peixes usados
neste estudo.
8
Sumário
1.Resumo......................................................................................................................10
2.Preâmbulo..................................................................................................................11
3.Introdução..................................................................................................................20
4.Objetivos...................................................................................................................24
5.Material e Métodos....................................................................................................25
5.1.Procedimentos Gerais.................................................................................25
5.2.Delineamento Geral....................................................................................26
5.3.Procedimentos específicos..........................................................................28
6.Resultados.................................................................................................................32
7.Discussão...................................................................................................................41
8.Referências Bibliográficas........................................................................................47
9
Estímulos químicos e visuais de predador sobre a tomada de decisão entre alimentarse e refugiar-se em grupos de tilápia-do-nilo (Oreochromis niloticus)
Resumo
O objetivo deste trabalho foi estudar os comportamentos de alimentar-se e de
refugiar-se em grupos de tilápias-do-Nilo frente a um predador. Para testar a
motivação das tilapias para esses comportamentos, três peixes em condição de
hierarquia social foram alimentados diariamente por sete dias (filmados após oferta
alimentar, por 10 min, no sétimo dia) e no oitavo dia, foi imposto aos animais
sinalização química ou visual de predador. Novamente os grupos de tilápias foram
filmados subsequente à oferta alimentar, juntamente com a presença do estímulo de
predador. O comportamento de dispersão no aquário, distância do sítio de alimentação
e do refúgio (planta artificial) oferecidos no aquário e tempo gasto junto ao sítio de
alimentação foram analisados. O principal elemento motivador para todos os
comportamentos foi a dominância social, estando o animal mais dominante sempre
mais próximo do sitio alimentar e aquele mais submisso mais próximo ao refugio. Os
estímulos químico e visual também motivaram comportamentos de fuga e dispersão,
sendo ainda o estímulo químico mais evidente do que o visual. Assim, percebemos
10
que os animais reconhecem os estímulos de predador e preferem refugiar-se a
alimentar-se na presença do estímulo, porém, a manutenção da hierarquia manteve os
animais de diferentes classes sociais com motivações diferentes: os submissos mais
aptos a refugiar-se enquanto o dominante mais apto a alimentar-se.
Palavras-chave: Tomada de decisão, Predador, Estímulo químico, Estímulo visual.
11
Preâmbulo
As trajetórias históricas que conduziram para a visão atual do comportamento
animal foram bastante variadas e interligadas. O homem tem se interessado pelo
comportamento dos animais desde antes da história relatada, e desde esse começo
somente uns poucos observadores e pensadores críticos contribuíram efetivamente
para o estudo do comportamento. O maior progresso desta área da biologia ocorreu
somente nos últimos 200 anos.
Entre 1890 e 1910, muitas pessoas se envolveram no estudo do
comportamento dos animais. Livros e artigos foram publicados e diferentes opiniões
começaram a se formar. As idéias da época deram início ao desenvolvimento de
grandes áreas do estudo do comportamento, todas com abordagens, de uma ou outra
maneira, do controle interno do comportamento.
O estudo do comportamento animal é hoje uma área consolidada da ciência,
com raízes na teoria da seleção natural de Charles Darwin (Souza e Volpato, 2006) e
nos estudos de George Romanes, seu discípulo, considerado o pai do estudo do
comportamento animal segundo Yamamoto e Volpato (2006). Com os delineamentos
do tempo, um tanto quanto recente, esta área forneceu os contornos do que hoje
chamamos de “Etologia”, nome que designa a área da biologia que se dedica ao
estudo do comportamento dos animais e suas nuances, tendo como premissa o
indivíduo em seu ambiente natural, ou em alguma reprodução deste ambiente em
laboratório.
A Etologia surgiu após a morte de Darwin, juntamente com outra vertente de
estudo do comportamento animal, a psicologia comparada. Estas áreas, durante
12
muitos anos, foram opostas, pois seus principais representantes defendiam pontos de
vista diferentes quanto ao estudo do comportamento animal. Enquanto a psicologia
comparativa era focada mais estritamente em princípios do aprendizado associativo
em estudos experimentais laboratoriais, o grupo dos etologistas era formado
principalmente
por
biólogos-zoólogos
com
razoável
conhecimento
dos
comportamentos das espécies e com particular atenção nas relações filogenéticas dos
grupos.
Os principais representantes da área da ciência denominada Etologia foram
Konrad Lorenz, Nikolaas Tinbergen e Karl Ritter Von Frisch. Lorenz (1903-1989) era
um biólogo austríaco, considerado o pai da etologia moderna, e suas teorias ficaram
conhecidas pelos estudos do comportamento sexual e familiar do ganso cinzento.
Tinbergen, nascido em Haia, Países Baixos em 1907, dedicou-se, principalmente, ao
estudo da importância dos comportamentos instintivos e adquiridos para a
sobrevivência do animal. E Von Frisch, nascido em 1886 na cidade de Viena; teve os
insetos, em especial as abelhas, como foco de seus estudos do comportamento. Esses
três etólogos tornaram-se mundialmente famosos ao receber o Prêmio Nobel de
Fisiologia e Medicina, em 1973, por sua contribuição para o estabelecimento da
Etologia (Garcia e Otta, 2002). Foi o Nobel mais biológico dado até hoje. Ainda não
houve reconhecimento de avanços nas áreas de evolução e ecologia, entre outras
disciplinas ainda ignoradas pelo prêmio Nobel.
Defendendo o lado da psicologia comparada estava o seu representante mais
ilustre Burrhus Frederic Skinner que, partindo dos princípios desenvolvidos por John
B. Watson e Ivan Pavlov, desenvolveu a teoria do behaviorismo. A base do trabalho
13
de Skinner refere-se à compreensão do comportamento humano através do
condicionamento operante.
Enquanto a etologia defendia a importância do ambiente e sua influência no
repertório comportamental dos animais, que seria fundamentalmente inato; a
psicologia comportamental defendia que os comportamentos eram fundamentalmente
aprendidos. Os etólogos estudavam ampla variedade de animais, tendo preferência por
estudos com peixes e pássaros em ambiente natural, enquanto os psicólogos
estudavam fundamentalmente mamíferos, principalmente ratos, em ambiente
laboratorial controlado, buscando leis gerais de aprendizado.
Após anos de desentendimento entre as áreas de estudo do comportamento
animal, o pesquisador Daniel Stanford Lehrman propôs a necessidade de uma
abordagem interacionista, em que o comportamento deveria ser visto como a
interação do indivíduo com o meio em que se encontra, levando em conta a grande
plasticidade do sistema nervoso. Em tese, esta é a visão que hoje se adota.
Em uma abordagem histórica do estudo do comportamento, Alcock (2003) faz
uma análise do desenvolvimento do pensamento desde 1950. Conforme tal análise,
entre 1951 e 1975, a maior parte da produção intelectual deste ramo da ciência
versava acerca de duas questões propostas por Tinbergen (1951) para os enfoques da
pesquisas com comportamento animal: os mecanismos causais imediatos e a
ontogênese do comportamento. Esta abordagem foi denominada de “etologia
tradicional”. A partir de 1975 a ciência do comportamento animal começou a mudar
seus contornos e surgiu a “ecologia comportamental”. Semelhante à etologia
tradicional, a ecologia comportamental tem como objeto o estudo do comportamento
das espécies, porém, preocupa-se em responder a questões acerca da evolução, das
14
relações filogenéticas e do valor de um dado comportamento para a sobrevivência da
espécie. Neste sentido, focaliza outras duas questões de Tinbergen (1951),
contextualização do comportamento de uma espécie na história evolutiva e relação do
comportamento com aspectos ecológicos (Krebs e Davies, 1996). De acordo com
West et al. (2003), atualmente esta é a abordagem vigente nos estudos de
comportamento animal.
A Etologia é uma ciência com sólidos alicerces em muitos países. No Brasil, a
etologia ainda é jovem e ainda há muito o que ser feito para compensarmos tal atraso
(Souto, 2005). Em especial, o estudo do comportamento de peixes tem recebido
grande atenção nas últimas décadas. Diversos estudos abordam a seleção sexual
(Freitas et al, 2009), efeitos de colorações do ambiente sobre o repertório
comportamental
(Luchiari,
2009),
estresse
social
(Merighe
et
al,
2004),
comportamento alimentar (Pereira-da-Silva e Pezzato, 1999), preferências espécieespecíficas
(Reddy
e
Leatherland,
1994),
aprendizagem
(Novato,
2000),
comportamento de corte (Cacho et al., 1999), reconhecimento de coespecíficos e
predadores (Junior, 2002), comunicação química (Barbosa, 2007), entre outros
comportamentos.
Nesse sentido, o trabalho ora apresentado pretende contribuir com o
conhecimento científico acerca de um tipo específico de comportamento: a tomada de
decisão. A escolha de grupos de peixes entre alimentar-se ou refugiar-se foi
investigada frente a estímulos ambientais positivos e negativos para uma espécie
essencialmente territorial e agressiva, a tilápia do Nilo.
15
Espécie foco deste estudo: a tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus)
A tilápia do Nilo é um peixe da família Cichlidae, pertencente à subfamília
Pseudocrenilabrinae. Originária do continente Africano, foi introduzida em vários
países, como o Brasil, para fins comerciais com grande sucesso devido à sua
rusticidade e capacidade de suportar baixa concentração de oxigênio e alta
concentração de amônia. Além disso, a tilápia apresenta alta taxa reprodutiva, alta
taxa de conversão alimentar e pouca exigência quanto ao tipo de alimentação.
A tilápia é um animal territorialista, ou seja, os indivíduos defendem seus
territórios com base em encontros agonísticos nos quais ocorrem crescentes
sinalizações e interações físicas (“escalada”) que culminam com o estabelecimento de
hierarquias sociais e áreas territoriais posteriormente defendidas pelo ganhador.
No que diz respeito à interação intra-específica de territorialismo, após os
encontros agonísticos, os animais com tamanho do corpo avantajado geralmente são
dominantes enquanto os menores tornam-se submissos. O estabelecimento e a
manutenção do status social dentro da hierarquia provocam, tanto nos animais
dominantes como nos submissos, situações de estresse (estresse social), com maiores
prejuízos para os submissos (Fernandes, 1997). Após o estabelecimento da hierarquia
em um grupo, os animais sinalizam química e visualmente seu status para a
manutenção hierárquica. A cor do corpo que os indivíduos apresentam é um sinal
desta manutenção. Volpato et al. (1989) observaram que indivíduos dominantes
exibem coloração mais clara após confrontos agonísticos entre coespecíficos,
enquanto os submissos adquirirem coloração escura do corpo. Segundo Volpato et al.
(2003) a cor do olho também é um indicativo de status social em tilápias do Nilo, e o
16
animal submisso apresenta um escurecimento da íris e esclerótica do olho em relação
à coloração apresentada no olho do animal dominante.
A posse prévia do território também contribui para a posição hierárquica
superior do animal (Volpato et al., 1987). Vários estudos têm mostrado claro efeito da
residência prévia durante disputas territoriais em peixes, em que o indivíduo residente
em determinado território torna-se mais propenso a vencer um confronto agonístico
com um possível invasor (Figler & Einhorn, 1983; Huntingford & Turner, 1987;
Turner, 1994; Huntingford & Garcia de Leaniz, 1997). Segundo Maynard-Smith
(1984), o indivíduo que já reside em dada área valoriza mais o território do que um
intruso e, por isso, defende-o mais ferozmente.
O comportamento territorial é muitas vezes relacionado à obtenção de um
recurso ou manutenção da acessibilidade ao mesmo, como por exemplo, o acesso a
uma fonte de alimento (Huntingford, 1979). Na natureza, a tilápia é capaz de utilizar
diversas fontes de alimento - larvas aquáticas, insetos, algas, macrófitas, ervas
daninhas e plâncton (Lowe-McConnel, 1975; Getachew, 1993; Tadesse, 1999), sendo
considerada uma espécie onívora (Shiau, 1997). Durante o comportamento de
forrageio, a tilápia seleciona itens alimentares específicos dentre as fontes presentes
no meio, sendo norteada principalmente pela sua quimiosensibilidade (Adams et al.,
1988).
O comportamento alimentar de peixes é caracterizado por uma seqüência
estereotipada de atos controlados por várias modalidades sensoriais, dependendo do
nicho ecológico do animal, sendo o olfato o principal sentido envolvido na busca pelo
item alimentar (Hara, 1993). Embora outros órgãos sensoriais também estejam
envolvidos no forrageio, o paladar determina a seleção final do alimento, a ingestão e
17
a voracidade na busca pelo recurso (Adron e Mackie, 1978; Rhoades, 1979; Adams e
Johnsen, 1986; Mearns, 1986).
A tilápia do Nilo é considerada uma espécie bastante rústica, de hábito
alimentar variado que aceita também outros tipos de alimento, inclusive alimentos
artificiais, em todos os estágios de vida (Santiago et al., 1987). Segundo Kubtiza
(2000), nas condições climáticas brasileiras e, dependendo da dieta, as tilápias
atingem maturidade sexual entre o 4° e o 6° meses de vida. Após a maturação sexual,
um complexo repertório comportamental caracteriza a reprodução. Os peixes da
família Cichlidae exibem comportamento reprodutivo bastante elaborado, de longa
duração, que inclui cortejo de fêmeas, construção de ninhos e confronto entre machos,
o que os torna diferenciado em relação a outros peixes (Baerends e Baerends van
Roon, 1950). Há evidências de estimulação social na reprodução dos ciclídeos,
afetando o desenvolvimento das gônadas (Gonçalves, 1993).
Gonçalves (1993) constatou que as gônadas se desenvolvem mais rápido em
machos dominantes do que em machos submissos de tilápia do Nilo, mostrando que
há efeito das interações entre machos na reprodução deste animal. Também segundo
Gonçalves de Freitas (1999), a introdução de uma fêmea no mesmo ambiente do
macho estimula a elaboração de ninho em menos de 24 horas. Isto ocorre,
provavelmente, porque informações químicas do estágio reprodutivo na água afetam o
comportamento reprodutivo em tilápia do Nilo (Souza et al.,1998).
É possível que informações visuais também favoreçam o comportamento da
tilápia, pois esses animais apresentam mudança na coloração corporal durante a
reprodução (Lowe-McConnell, 1958; Gonçalves-de-Freitas e Nishida, 1998). Além
disso, boa parte do repertório comportamental da tilápia do Nilo é dependente da
18
visão, como defesa territorial, identificação de predadores, identificação e cortejo de
fêmeas reprodutivas, construção de ninhos e o cuidado parental (Pitcher, 1993). Esta
relação entre o comportamento da tilápia do Nilo e o sentido visual pode ser explicada
pelas características do ambiente natural deste animal, que compreende fundo
esverdeado (Fanta 1995) e luminosidade com comprimentos de onda entre 500 e 570
nm (Kageyama 1999).
Tendo em vista a relevância da capacidade de percepção visual e química,
como acima designados, para o desempenho da tilápia em suas relações intra e
interespecíficas, o presente trabalho ocupou-se em estudar o papel de sinais bióticos e
abióticos para a expressão do comportamento de tilápias mantidas em grupo social.
19
Introdução
A agressividade intraespecífica é um comportamento adaptativo que pode
trazer vantagens no estabelecimento de hierarquias sociais, acesso a sítios alimentares,
conquista de parceiro sexual e defesa da prole (Krebs e Davies, 1995). A natureza
agressiva de muitas espécies de peixes foi evolutivamente moldada e contribui
significativamente para a sobrevivência individual e mesmo da própria espécie, sendo
principalmente observada pelo estabelecimento de hierarquias sociais em grupos de
peixes (Huntingford et al., 1990).
A Tilápia do Nilo (Oreochromis niloticus) é um animal com comportamentos
social e agonístico bem estudados (Luchiari, 2003). Estes peixes apresentam
comportamento gregário no primeiro estágio de vida, o que confere benefícios contra
predação, porém, à medida que se desenvolvem tornam-se territoriais e tendem a
defender seu território e sítio de alimentação da competição intraespecífica e
interespecífica.
O desempenho do animal em manter seu território e alimento está, muitas
vezes, associado às condições de estresse enfrentadas, bem como à presença de
elementos do ambiente que imponham a necessidade de tomada de decisão entre
manter o território ou arriscar-se frente a um dominante ou predador. Esta tomada de
decisão implica na escolha entre duas ações distintas, motivada pela condição e/ou
experiência prévia do animal (Dawkins, 1998).
Alguns estudos investigaram as tomadas de decisões em forragear de animais
sob risco de predação (Lima e Dill 1990; Lima 1998). Durante o comportamento de
forragear, os animais deparam-se com o conflito entre a ingestão do alimento e a
20
vigilância quando existe a possibilidade de presença de predadores. Nestas condições,
o tempo gasto na busca e ingestão do alimento ou na atenção e precaução do risco de
predação sofrem influencia direta do estado energético do indivíduo (Lister e Neff,
2006). Neste sentido, diversos autores têm mostrado que indivíduos desfavorecidos
energeticamente, seja pelo tamanho do corpo, tempo de jejum, disponibilidade de
reserva energética pontual (calorias) ou doença, enfrentam riscos de predação maiores
do que indivíduos em bom estado energético (Kohler e McPeek 1989; Holmes 1991;
Bachman 1993; Krause 1993; Pettersson e Bronmark 1993; Moore 1994; Romey e
Rossman 1995; Weary et al. 1996).
Segundo Krause (1992), os animais tendem a escolher alimentos que lhes
proporcionem maior captação energética, pois podem conferir vantagens durante a
evasão quando em risco de predação ou favorecer o alcance de objetivos reprodutivos.
Porém, mesmo o alimento que fornece grande aporte energético está sujeito à
avaliação prévia; são as variáveis inerentes a ação. Mesmo que o alimento seja
energético e disponível, há outras decisões que devem anteceder sua captura, como a
segurança e a economia de energia ao alimentar-se. As decisões são pesadas em
termos de custo e benefício, e isto se aplica a todas as decisões tomadas pelos animais
a todo instante.
Diversos sinais do ambiente, como informações químicas e visuais, interferem
na tomada de decisão do animal. A sinalização química, entendida como a
transferência de informações de um animal a outros através de substâncias químicas
liberadas no meio, é um tipo de comunicação amplamente desenvolvido em diversos
peixes (Liley, 1982), sendo o sentido olfativo e o gustativo os principais envolvidos
(Hara, 1993). Peixes são capazes de comunicar quimicamente a coespecíficos
21
condições como status social (Giaquinto e Volapto, 1997), estágio reprodutivo
(Gonçalves, 1993) ou presença de predador (Jordão e Volpato, 2000).
O aspecto visual da transmissão de informações entre os animais é outro fator
bastante relevante para a coleta de dicas ambientais que interferem diretamente na
avaliação do meio quando é tomada uma decisão. Segundo Yamamoto e Volpato
(2006), o contato visual se faz determinante em disputas territoriais, uma vez que os
dois primeiros estágios da escalada de agressão, nos quais não ocorre contato físico
com injúrias, dependem essencialmente de sinalização visual para a expressão de
vantagens competitivas perante o oponente.
Ao longo da evolução, os teleósteos desenvolveram variados sistemas visuais,
alguns deles com presença de cones e bastonetes, e a percepção de cores permitiu
expansão de nichos e exploração do meio aquático (Yokoyama, 2000). De acordo
com Fernald (1984) os ciclídeos africanos, como a tilápia do Nilo, habitam
originalmente águas claras e têm a visão como uma das principais modalidades
sensoriais. Neste sentido, a acuidade visual confere vantagens para a detecção de
todos os aspectos do ambiente visual, incluindo presas, predadores, ou coespecíficos
(Collin e Trezise, 2004), como é o caso da tilápia do Nilo.
As informações do meio, sejam visuais ou químicas, motivam as respostas
comportamentais de acordo com a intensidade dos estímulos recebidos e da
interpretação dos mesmos pelo animal. Um sinal de estresse, seja ele da presença de
um predador, um animal hierarquicamente superior ou outra ameaça ambiental, pode
promover mudanças comportamentais e fisiológicas que preparam o animal para
enfrentar o novo desafio ou afastar-se do estímulo visando manter sua integridade
(Moberg, 1999). Assim, este estudo teve como objetivo testar a influência da
22
sinalização química e visual de um predador sobre o comportamento de tomada de
decisão entre alimentar-se ou refugiar-se em grupos de Tilápias do Nilo, no qual o
status social foi previamente estabelecido.
Os estudos que abordam a tomada de decisão em peixes focam, geralmente, a
resposta comportamental de um indivíduo isolado frente ao conflito estabelecido:
comer ou fugir. No entanto, a condição social normalmente encontrada em ambiente
natural pode interferir diretamente na decisão de cada indivíduo em particular
(Krause, 1993). As interações sociais podem afetar positiva ou negativamente os
indivíduos de um grupo (Sogard e Olla, 2000). Os benefícios incluem maior chance
de encontro de presas/alimento, maior tempo de forrageio e menor tempo de
vigilância (Pitcher et al., 1982). No entanto, o grupamento também pode reduzir a
ingestão e o crescimento devido à competição e ao estresse social (Sogard e Olla,
2000). Portanto, incluímos o estresse social no conflito alimento – predador neste
estudo, visando observar como o comportamento de cada indivíduo pode ser
influenciado pela presença de coespecíficos de diferentes hierarquias sociais.
23
Objetivos

Analisar a resposta comportamental da tilápia-do-Nilo frente a estímulo de
predador no momento da alimentação.

Avaliar a influência do fator “hierarquia social” sobre a tomada de decisão de
cada indivíduo do grupo sob influencia de sinais de predador e sem tais sinais.

Analisar os efeitos de sinais químicos de predador sobre a decisão entre
alimentar-se ou refugiar-se em cada individuo em um grupo de tilápias.

Analisar os efeitos de sinais visuais de predador sobre a decisão entre
alimentar-se ou refugiar-se em cada individuo em um grupo de tilápias.

Comparar o comportamento das tilápias frente a estimulo químico ou visual de
predador a fim de observar qual dos estímulos exerce maior influência sobre o
comportamento e a tomada de decisão dos animais.
24
Materiais e métodos
Procedimentos gerais
Juvenis de tilápia-do-Nilo (± 6cm; 4g), Oreochromis niloticus (L., 1958),
obtidos da fazenda de cultivo “Damatta Agronegócios”, João Pessoa, PB foram
transferidos para um tanque de estocagem mantido no Laboratório de Fisiologia
Animal Comparada, no Departamento de Sistemática e Ecologia (DSE) da UFPB,
João Pessoa, PB.
Esses animais foram mantidos em um tanque de fibra de vidro com volume de
500L de água constantemente aerada em temperatura de cerca de 25º C e fotoperíodo
controlado (12L:12E), onde receberam alimentação diária às 14 horas com ração
PURINA NUTRIPEIXE-AL45, de especificações conforme tabela 1.
Tabela 1. Composição nutricional da ração usada na alimentação
dos peixes usados neste estudo - PURINA NUTRIPEIXE-AL45
Parâmetro
Diâmetro da Partícula
Referência
2 a 3 mm
Proteína (mín.)
45,0%
Extrato Etéreo (mín.)
8,0%
Fibra Bruta (máx.)
7,0%
Cálcio (máx.)
2,5%
Fósforo (mín.)
0,6%
Cinzas (máx.)
14,0%
Vitamina C
300,0 mg
25
A fase experimental foi desenvolvida no mesmo ambiente citado acima e os
aquários experimentais foram mantidos às mesmas condições de temperatura e
oxigênio.
Delineamento geral
A estratégia experimental consistiu em avaliar o comportamento de peixes
quanto à decisão entre alimentar-se ou refugiar-se quando submetidos a estímulo
estritamente visual ou estímulo estritamente químico de predador.
Foram utilizados aquário de vidro (40 x 20 x 25 cm) contendo um pequeno
anteparo na região superior esquerda (25 x 2 cm), onde o alimento ficava restrito (área
de alimentação), e plantas artificiais dispostas na extremidade direita, onde os peixes
podiam se refugiar (área de refúgio). O modelo deste aquário pode ser visualizado na
figura 1.
Fig. 1. Desenho esquemático do aquário usado para os animais foco deste estudo. Na região
superior esquerda encontra-se o sítio de alimentação e na região direita a área de refúgio,
composta por plantas artificiais.
Cada subunidade experimental (aquário foco) foi povoada com três animais
provenientes da caixa de acondicionamento. Os animais foram escolhidos de maneira
a serem todos de tamanho e peso semelhantes, visando não pré-determinar a
dominância do grupo, ficando esta variável a ser determinada por características
próprias dos peixes de cada grupo.
26
Na condição de estímulo visual, um segundo aquário de mesmas dimensões
foi faceado na parede lateral esquerda do aquário foco, para a menor distância entre
estímulo visual de predador e sítio de alimentação. Os dois aquários foram mantidos
isolados visualmente através de um anteparo opaco, que só foi retirado no momento
de exposição visual para o grupo de peixes em estudo. Na condição de comunicação
química, o anteparo opaco separando os dois aquários foi mantido, e uma porção da
água do aquário do predador (50 ml) foi transferida com um Becker para o aquário
foco, sendo introduzida através do sitio de alimentação.
Em ambas as condições (estimulação química e visual) foram feitas 7 réplicas,
sendo cada réplica constituída por um trio de tilápias de tamanhos semelhantes e um
predador (Pseudoplatystoma sp.), conforme figura 2.
Fig. 2. Desenho esquemático das condições experimentais testadas. A) estímulo visual de predador
e B) estímulo químico de predador. No estímulo químico, 50 ml de água do aquário estímulo foi
transferida para o aquário foco imediatamente antes da oferta de alimento.
Cada condição de estímulo foi avaliada após o período de 7 dias de
aclimatação dos animais às condições experimentais, para que neste período
pudessem estabelecer hierarquia social, aprender o local e horário de alimentação e
localizar a área de refúgio. Durante os sete dias iniciais, pequena quantidade de
alimento foi oferecida em cada aquário, no sítio de alimentação, às 14:00 horas. A
quantidade aquém do necessário para a total saciedade foi utilizada para que os
27
animais estivessem motivados a buscar o alimento em todas as oportunidades de
oferta.
Os animais foram observados quanto ao comportamento durante a oferta de
alimento no sétimo dia (controle) e no oitavo dia, quando foi apresentado o estímulo
visual ou químico.
Procedimentos específicos
Nos dois dias de observação (7º e 8º dias experimentais) foram feitas
filmagens por 10 min subsequentes à oferta de alimento. No sétimo dia, a filmagem
dos grupos de peixes foi utilizada como observação controle, já que não houve
nenhum estímulo ambiental. A filmagem foi iniciada com a oferta de alimento no sítio
de alimentação e procedeu por 10 min sequenciais.
No dia seguinte (8º dia), as situações envolviam o oferecimento de estímulo
concomitante à disponibilizarão de alimento. Assim, na condição de estímulo visual, o
grupo de peixes foco do estudo permaneceu por 10 min em contato visual como outro
peixe (fonte de estímulo), que tinha seu aquário pareado ao aquário focal.
Imediatamente após o início do pareamento visual, houve a oferta de alimento no sitio
alimentar (localizado na parede do aquário mais próxima ao estímulo, fig. 2) e a
filmagem dos animais foi iniciada. Na condição de estímulo químico, 50 ml de água
proveniente do aquário do animal estímulo foi despejada através da região de oferta
alimentar e em seguida o alimento foi disponibilizado. Juntamente com o início do
estímulo, os animais foram igualmente filmados.
Nessas condições foram quantificados dados sobre a distribuição do animal no
aquário (movimentação, posição em relação ao sítio de alimentação, posição em
28
relação ao refúgio e sinais de dominância/submissão – coloração do corpo) conforme
figura 3. Os animais foram classificados segundo o estabelecimento hierárquico em
animal dominante, submisso 1 e submisso 2, baseado na coloração do corpo de cada
um. De acordo com observações de Huntingford et al. (1990) e Volpato et al. (2003),
o estado de subordinação é usualmente associado com a aparência mais escurecida do
corpo, enquanto o animal dominante tem coloração mais clara.
Fig.3. Esquema do modo de observação dos parâmetros comportamentais do aquário foco.
Parede frontal (40x20 cm) foi quadriculada (2x2cm) e a distribuição dos animais no aquário
foi inferida pela localização do olho do peixe a cada 10 segundos por 10 min de filmagem. A
base do aquário (eixo x) apresentava 12 quadrados e a lateral (eixo y) tinha 5 quadrados. O
sitio de alimentação foi considerado na região x2 e y5 e o refúgio foi considerado x1 e y12.
Distribuição do animal no aquário
A parede frontal (40 x 20 cm) do aquário ocupado pelos peixes foco foi
quadriculado (2 x 2 cm) para avaliarmos os parâmetros de distribuição.
Nas filmagens foram registrados, a cada 10 segundos, a localização do olho do
peixe nos quadrantes feitos no aquário. Esses pontos foram dispostos num sistema de
eixos cartesianos (x-y) e, a cada 1 min de filmagem (6 pontos), calculamos a
coordenada correspondente ao baricentro (média de x e média de y).
Observamos os seguintes parâmetros comportamentais dos animais foco:
29

Dispersão: distância média entre os pontos de observação e os baricentros de cada
1 min de gravação;

Distância do sítio de alimentação: distância média dos baricentros dos momentos
de observação ao local de oferta alimentar, mesmo ponto onde ocorreu estímulo
visual e chegada do estímulo químico;

Distância do refúgio: distância média dos baricentros ao local de presença de
plantas artificiais, região oposta ao estímulo visual e chegada do estímulo
químico;

Tempo despendido no sítio de alimentação: foi registrado o tempo em segundos
que cada animal gastou durante a alimentação, necessariamente ocorrida no sítio
de oferta alimentar;

Sinais de submissão / dominância: foram registrados a cada 10 s de observação, a
localização de cada animal do grupo, classificados como dominante, submisso 1 e
submisso 2. A dispersão e ocupação de determinada região do aquário por cada
animal também foi analisada e indicativa de atividade locomotora e motivação em
alimentar-se ou manter-se refugiado.
Análises estatísticas
Os testes de parametricidades Shapiro-Wilks (normalidade) e Levine
(homocedasticidade) foram usados para se determinar os testes a serem usados
posteriormente. Teste de Anova ou Kruskal-Wallis, seguido de teste de Student
Newman-Keuls, foi usado para comparar a dispersão, a distância do sitio de
30
alimentação e do refugio e o tempo na região de alimento entre os animais de classes
hierárquicas diferentes (dominante, submisso 1 e submisso 2). As comparações entre
o comportamento do mesmo animal no 7º dia (controle) e no 8º dia (estímulo) foram
realizadas através de teste t de Student para dados dependentes. As comparações entre
animais estimulados quimicamente e visualmente foram feitas através de teste t
Student independente. Em todos os casos, foi usado como nível de significancia =
0,05.
31
Resultados
Analisando-se os dados obtidos no tocante à dispersão dos animais dentro do
ambiente experimental, com base nos baricentros, constatou-se que no grupo de
animais submetidos à estimulação química de predador houve diferença significativa
de dispersão entre os animais do grupo na fase de controle (Anova, F=5,08, p=0,02;
fig. 4). O animal dominante mostrou menor dispersão quando comparado ao animal
submisso 2, tendo o animal submisso 1 dispersão intermediaria entre os dois outros
do grupo. Quando o estímulo químico foi oferecido, observou-se que os animais
submisso 1 e submisso 2 tiveram taxas de dispersão semelhantes entre si e maiores
que o animal dominante (Kruskal-Wallis, H=6,50, p=0,04; fig. 4).
Não houve diferença estatística nas comparações de dispersão do mesmo
animal entre o dia controle e o dia estimulado quimicamente (t Student dependente:
dominante: t=0,39, p=0,71; submisso 1: t=-1,60, p=0,17; submisso 2: t=-0,22, p=0,83;
fig. 4).
O mesmo parâmetro comportamental (dispersão) foi analisado nos grupos de
animais expostos à estimulação visual de predador e, desta feita, observou-se que na
fase controle o animal submisso 2 mostrou maior dispersão do que o dominante,
enquanto o animal submisso 1 teve dispersão intermediária entre outros dois
(Kruskal-Wallis, H=6,43, p=0,04; fig. 4). Após a estimulação visual, os animais
submisso 1 e submisso 2 expressaram dispersão semelhante e significativamente
maior do que o animal dominante (Kruskal-Wallis, H=6,26, p=0,04; fig. 4). Também
o estímulo visual não causou alteração da dispersão do animal quando comparado ao
dia controle (t Student dependente: dominante: t=1,80, p=0,12; submisso 1: t=-1,89,
p=0,12; submisso 2: t=1,27, p=0,25; fig. 4).
32
A comparação do comportamento de dispersão no aquário entre os peixes do
grupo submetido a estimulo químico e estimulo visual indicam não haver diferença
desta modalidade comportamental no dia controle (sem estímulos) (t Student
independente, p<0,05). No entanto, quando submetidos a estimulação, apenas houve
alteração da resposta de dispersão do animal submisso 1 que recebeu estímulo
químico em relação ao que recebeu estimulo visual (Mann-Whitney, T=56, p=0,05;
.
150
dispersão por coeficiente de variação (cv)
fig. 4).
120
b
B
ab
A
a
A
90
controle
60
†
estímulo qumico
30
0
30
†
controle
60
estímulo visual
90
120
b
B
ab
A
a
A
150
dominante
submisso 1
submisso 2
Fig 4. Coeficiente de variação da dispersão em grupos de 3 tilápias-do-Nilo frente a estímulo
químico ou visual de predador (pintado). Letras minúsculas diferentes indicam diferença
significativa entre animais controle do grupo referente ao estímulo químico ou visual de
predador (Anova, p<0,05), letras maiúsculas diferentes indicam diferença significativa entre
os animais sob estímulo de predador (Anova, p<0,05). † indica diferença estatística entre o
animal estimulado química e visualmente (teste t independente, p<0,05).
Um dos parâmetros analisados após as filmagens foi a distância que cada
animal mantinha do refúgio (plantas artificiais) no momento da alimentação e,
consequentemente, da estimulação química ou visual. Observando os dados obtidos a
partir do grupo de animais estimulados quimicamente, percebe-se que na fase controle
não há uma diferença significativa entre os posicionamentos dos animais submisso-1
e submisso-2, porém, quando compara-se o posicionamento do dominante em relação
33
aos outros dois animais há uma diferença significativa (Anova, F=39,78, P<0,001;
Fig.5). Mostrando que durante o momento da alimentação os animais submissos
mantinham-se mais próximos do refúgio e o dominante mantinha-se mais distante
deste. Estes mesmos animais, quando submetidos ao estímulo químico, mostraram o
mesmo comportamento exibido na fase controle. Com o dominante mais distante do
refúgio e os submissos equiparados quanto a este parâmetro (Anova, F=13,94,
P<0,001; Fig.5). Apresentou-se neste momento da análise um fato intrigante, uma
diferença significativa no grupo dominante entre a fase de controle e estímulo
químico (teste t dependente, t= -7,26, P=<0,001; Fig.5). O animal dominante
posiciona-se mais distante do refúgio na fase controle (figura-5. a)). Os outros dois
grupos de animais, submisso-1 e submisso-2 não apresentaram diferenças estatísticas
no mesmo animal entre a fase controle e estímulo químico (Submisso-1: t= -0,55,
P=0,61; Submisso-2: t=0,12, P=0,91. Fig.5)
Ainda observando o parâmetro “distância do refúgio”, analisou-se esta
variável tendo como base o grupo de animais submetidos à estimulação visual. Na
fase controle não houve diferença significativa quanto ao posicionamento dos animais
dominante e submisso-1, porém, estes dois grupos diferiram significativamente
quando comparados com o grupo submisso-2(Anova, F=8,64, P=0,002; Fig.5). Sendo,
neste momento, o posicionamento dos animais dominante e submisso-1 mais próximo
ao sítio alimentar que o submisso-2. Na fase de estimulação visual os três grupos
diferiram estatisticamente entre si quanto ao seu posicionamento em relação ao
refúgio (Anova, F=22,62, P=<0,001; Fig.5). O animal submisso-2 esteve mais
próximo do refúgio que o dominante e o submisso-1, que teve posicionamento
intermediário entre os outros dois (figura-5. a)). Não houve diferença estatística nas
comparações de dispersão do mesmo animal entre a fase controle e a fase estimulo
34
visual (Dominante: t= -1,36, P=0,223; Submisso-1: t=0,77, P=0,47; Submisso-2:
t=0,34, P=0,75. Fig.5). Também não houve diferença significativa no posicionamento
quanto à distância do refúgio entre os grupos de animais submetidos à estimulação
química e visual, tanto durante a fase controle (t Student independente, p<0,05) como
durante a fase estímulo (t Student independente, p<0,05).
Em contraponto ao parâmetro anterior analisado, observou-se a distância do
sítio de alimentação. Tomando-se o grupo submetido ao estímulo químico, obteve-se
que no período de controle os submissos mantiveram posicionamento semelhante em
relação ao sítio alimentar, a diferença significativa apresentou-se entre os resultados
do grupo dominante e os submissos, mas, não houve diferença significativa entre os
grupos submisso-1 e submisso-2. Estando o animal dominante sempre mais próximo
ao sítio alimentar que os outros dois (Anova, F=42,28, P=<0,001. Fig.5).
Semelhantemente à fase controle, durante o estímulo químico, o grupo dominante
manteve-se mais próximo ao sítio alimentar do que os outros dois, que apresentaram
posicionamento semelhante (Anova, F=16,85, P=<0,001. Fig.5). Em nenhum dos
grupos houve diferença significativa quanto à distância do sítio de alimentação no
mesmo animal entre as fases controle e estímulo químico (Dominante: t= -0,79,
P=0,46; Submisso-1: t=0,29, P=0,79; Submisso-2: t= -0,30, P=0,78. Fig.5)
A distância do sítio de alimentação também foi testada nos grupos submetidos
à estimulação visual. Na fase controle os grupos dominante e submisso-1 não
apresentaram diferença estatística significativa entre si, mas tal diferença apresentouse quando comparados com o grupo submisso-2(Anova, F=9,73, P=<0,001. Fig.5).
Mostrando neste caso o animal submisso 2 mais distante do sítio alimentar do que os
outros dois com proximidade média semelhante. Na fase de estimulação visual, houve
35
diferença significativa entre os três grupos (Anova, F=21,08, P=<0,001. Fig.5). Com
o animal dominante sendo o mais próximo do sítio alimentar, seguido do submisso-1
e o submisso-2 sendo o mais distante do referencial. Quando comparados os
resultados da fase controle e estímulo visual de um mesmo animal não houve
diferença significativa (Dominante: t=1,34, P= 0,23; Submisso-1: t=0,17, P=0,87;
Submisso-2: t= -0,10, P=0,92. Fig.5)
Fazendo-se a comparação entre as distâncias médias do sítio de alimentação
mantidas pelos grupos de animais estimulados quimicamente e visualmente, não foi
registrada diferença significativa entre as fases controle dos dois tipos de tratamento (t
Student independente, p<0,05). De forma que o animal submisso-1 dispõe-se mais
próximo do sítio de alimentação durante o estímulo visual do que durante o estímulo
químico. Porém, quando comparadas as fases de estímulo dos dois tratamentos quanto
à este dado parâmetro, observou-se uma diferença estatística nos animais de categoria
Submisso-1(t Student independente, F=2,38, P=0,036. Fig.5). Os outros dois grupos
de animais, dominante e submisso-2, não apresentaram diferença significativa entre o
tratamento químico e o visual na fase de estímulo (t Student independente, p<0,05).
36
a)
15
12
*
distância do refúgio (cm)
A
a
9
6
b
B
controle
b
B
estímulo qumico
3
0
3
controle
b
6
C
estímulo visual
9
a
A
a
B
12
15
dominante
submisso 1
submisso 2
b)
distância do sítio de alimentação (cm)
15
b
B
b
B
12
9
a
A
controle
6
†
estímulo qumico
3
0
3
†
6
9
controle
estímulo visual
C
b
12
b
B
a
A
15
dominante
submisso 1
submisso 2
Fig 5. a) Distancia do refúgio (planta artificial) e b) distancia do sítio de alimentação de 3
tilápias-do-Nilo agrupadas frente a estímulo químico ou visual de predador (pintado). Letras
minúsculas diferentes indicam diferença significativa entre animais controle do grupo
referente ao estímulo químico ou visual de predador (Anova, p<0,05), letras maiúsculas
diferentes indicam diferença significativa entre os animais sob estímulo de predador (Anova,
p<0,05). * indica diferença significativa entre controle e estímulo no animal de mesma
hierarquia sob o mesmo tipo de estimulação (teste t dependente, p<0,05). † indica diferença
estatística entre o animal estimulado química e visualmente (teste t independente, p<0,05).
Também foi analisado o tempo gasto pelos animais no sítio de alimentação,
localizado no canto superior esquerdo de cada aquário. Na análise dos grupos
submetidos ao tratamento químico, observou-se que, na fase controle, os três grupos
diferiram estatisticamente (Kruskal Wallis, H=10,6, P=0,005. Fig.6). Onde o animal
dominante passou mais tempo no sítio de alimentação do que o submisso-1, e este
37
passou mais tempo no sítio de alimentação que o animal submisso-2. Na fase de
estímulo químico, os grupos: dominante e submisso-1 tiveram praticamente o mesmo
gasto de tempo no sítio de alimentação, não diferindo estatisticamente. E o grupo
submisso-2 passou menos tempo no sítio de alimentação que os outros dois grupos,
apresentando diferença estatística (Kruskal Wallis, H=7,88, P=0,020. Fig.6).
Mostrando claramente que durante a estimulação química os animais dominante e
submisso-1 estiveram igualmente próximos ao sítio de alimentação, enquanto o
animal submisso-2 manteve-se mais distante deste referencial. Um fato diferenciado
na análise deste parâmetro foi a significativa diferença estatística entre as fases
controle e estímulo no grupo dominante do estímulo químico (t Student, t=2,5,
P=0,055, Fig.6). Mostrando que o mesmo animal (dominante) passou mais tempo no
sítio de alimentação durante a fase controle do que quando recebeu o estímulo
químico de predador. Os outros dois grupos testados quanto ao estímulo químico não
apresentaram mudança significativa no tempo gasto no sítio de alimentação no
mesmo animal entre a fase controle e a fase estímulo (t Student dependente:
submisso-1: t= -1,6, P=0,17; subisso-2: t= -0,22, P=0,83. Fig.6).
Ainda investigando o parâmetro “tempo no sítio de alimentação”, analisou-se
esta variável com base nos grupos de animais submetidos ao estímulo visual de
predador. Observou-se que na fase controle os três grupos diferiram estatisticamente
(Kruskal Wallis, H=9,28, P=0,01. Fig.6). Com o animal submisso-2 sendo o animal
que passou menos tempo no sítio de alimentação, o dominante como o animal que
mais tempo passou no sítio de alimentação e o animal submisso-1 colocando-se entre
os dois anteriores. Na fase de estímulo visual os grupos submisso-1 e submisso-2
foram semelhantes estatisticamente, mostrando-se o grupo dominante como
significativamente diferenciado estatisticamente em relação aos demais (Kruskal
38
Wallis, H=5,7, P=0,06). De forma que o animal dominante passou mais tempo no
sítio de alimentação que os outros dois, que apresentaram o mesmo gasto de tempo no
sítio alimentar. Fazendo-se a comparação entre as fases controle e estímulo visual no
mesmo animal, verifica-se que não houve diferença significativa(Wilcoxon:
dominante: Z= -1,07, P=0,5; submisso-1:Z= -1,84, P=0,12; submisso-2: Z= -1,63,
P=0,25. Fig.6)
a
60
tempo no sítio de alimentação (s)
*
40
ab
A
A
b
B
controle
20
estímulo qumico
†
0
†
20
controle
B
B
estímulo visual
ab
40
60
b
a
A
dominante
submisso 1
submisso 2
Fig 6. Tempo gasto no sítio de alimentação em grupos de 3 tilápias-do-Nilo frente a estímulo
químico ou visual de predador (pintado). Letras minúsculas diferentes indicam diferença
significativa entre animais controle do grupo referente ao estímulo químico ou visual de
predador (Anova, p<0,05), letras maiúsculas diferentes indicam diferença significativa entre
os animais sob estímulo de predador (Anova, p<0,05). * indica diferença significativa entre
controle e estímulo no animal de mesma hierarquia sob o mesmo tipo de estimulação (teste t
dependente, p<0,05). † indica diferença estatística entre o animal estimulado quimica e
visualmente (teste t independente, p<0,05).
O ponto distinto da análise do parâmetro “tempo no sítio de alimentação”
como um todo foi a diferença estatística entre os grupos dominante estimulado
quimicamente e dominante estimulado visualmente. Onde, o grupo dominante
estimulado quimicamente passou menos tempo no sítio alimentar do que o grupo
dominante estimulado visualmente (Mann-Whitney, T=26,5, P=0,04. Fig.5). Não
foram encontradas outras diferenças estatísticas, além da relatada, comparando os
39
resultados dos tratamentos químico e visual de predador quanto ao parâmetro “tempo
gasto no sítio de alimentação”, nem entre as fases controle (Dominante: t Student:
t=1,24, P=0,24; Submisso-1: Mann-Whitney: T= 41,00, P=0,94; Submisso-2: t
Student: t=0,26, P=0,80. Fig.5) nem entre as demais fases de estímulo (Sumbmisso-1:
Mann-Whitney: T=50,00, P=0,30; Submisso-2: t Student: t= -0,46, P=0,30. Fig.6)
40
Discussão
Observamos neste estudo que a tilápia do Nilo mantida sob condição de
agrupamento apresenta estabelecimento de hierarquia social, em que o animal
dominante tem maior acesso e tempo na área de alimentação, enquanto os submissos
mantêm-se em menor atividade e mais próximos ao refúgio (ver figuras). A
sinalização química de risco de predação parece diminuir o tempo que o animal
dominante despende na área de alimentação e aumentar sua proximidade ao refúgio,
sendo mais efetiva do que o sinal visual de predador. Além disso, ambos os sinais
químico ou visual não alteram significativamente o padrão comportamental do animal
mais submisso da hierarquia. Desta forma, a maior parte da tomada de decisão frente
ao risco de predação é feita pelo animal dominante, enquanto os submissos já se
encontram em condição de estresse social crônico e a soma de um novo estressor
parece não ter efeito sobre a escolha entre comer ou refugiar-se, sendo esta última, a
alternativa eleita em tempo integral.
Neste estudo, dizer que um animal toma decisões não significa intenção
consciente, mas somente refere-se ao fato de que o animal está adotando alternativas
comportamentais diferentes em determinados momentos. A tomada de decisão em
animais parece estar adaptada às soluções econômicas dos problemas diários e leva
em consideração custos e benefícios de várias opções diferentes possíveis (Lister e
Neff, 2006).
Quando o animal sente fome, ele busca por alimento. Quando se sente
ameaçado por predadores ou coespecíficos, busca por modos de evitar confrontos
prejudiciais, seja fugindo ou se escondendo. A questão aqui levantada, no entanto,
foca observar o que um grupo de tilápias faz quando está com fome e sob ameaça de
41
um predador e/ou coespecífico dominante. A seleção natural moldou os animais para
escolher a opção comportamental que maximiza seu desempenho, quase sempre
relacionada à sobrevivência para reprodução (Kavaliers e Choleris, 2001).
O reconhecimento de predadores através de sinais visuais depende de dicas
como tamanho, forma e sinais corpóreos, como manchas ou apêndices (Curio, 1993;
Hanson e Coss, 1997; Wisenden, 2000), que permitem à presa responder a predadores
através do reconhecimento inato ou aprendido. No entanto, a tilápia não é simpátrica
do pintado, então, não podemos concluir que houve claro reconhecimento inato.
Porém, a resposta da tilápia ao estímulo de predador evidentemente mostra que ela
pode distinguir entre a presença e ausência do predador, o que pode ser indicador de
uma possível origem inata de resposta, ou seja, alguma base genética. A tilápia é
simpátrica de outros bagres predadores africanos, e, desta forma, características
primitivas compartilhadas pelas espécies podem ter sido estímulo chave para a
resposta de fuga. Corroborando nossos resultados, tipos similares de reconhecimento
foram reportados por Csányi (1986), Altbäcker e Csányi (1990) e Barreto et al.
(2003). Portanto, o reconhecimento do bagre apresentado neste estudo pode ter
influenciado diretamente a tomada de decisão da tilápia.
Nos casos de reconhecimento de predador, é possível que a soma de sinais
como sons e cheiros possam desencadear respostas mais evidentes de mudança
comportamental na tilápia. Segundo Jachner (2001), Barcellos et al. (2010) e Reid et
al. (2010), um fator que pode alterar a resposta comportamental de tomada de decisão
é a experiência previa. Assim, o animal na condição de presa passa a responder ao
predador após experimentar situação aversiva de risco de predação, fato que pode ter
interferido na magnitude da resposta comportamental das tilápias deste estudo.
42
Neste sentido, o peso que o animal infere à informação obtida do meio e
decide o comportamento subseqüente tem sido considerado seguir o minucioso
equilíbrio entre custo e beneficio (Bouskila e Blumstein, 1992). Por exemplo, o peixe
esgana-gata, Gasterosteus aculeatus, forrageia em locais mais expostos a risco de
predação quando está sob influência de estresse energético ou considera o ambiente
seguro contra possíveis ataques (Kotler, 1992). Da mesma forma, os peixes
dominantes da fase controle deste estudo, bem como na fase exposta a sinais visuais
de predador, podem ter reconhecido o ambiente como propício para o forrageio, e,
portanto, não mostraram alteração comportamental. Por outro lado, os animais
submissos, já sob julgo de presença física do dominante (estresse social)
permaneceram menos ativos e deram preferência ao refúgio. Resultados semelhantes
de comportamento diferencial dentro de grupos com hierarquia social também
observados por Huntingford et al. (1990) e Barton (2002).
Os animais em desvantagem (presas / submissos) geralmente respondem à
ameaça pelo aumento do tempo de uso do refúgio, por exemplo, ratos se matem em
suas tocas quando gatos ou raposas estão presentes no ambiente (Lima e Dill, 1990;
Dielenberg e McGregor, 1999). No entanto, o uso do refúgio implica em custos, como
menor tempo forrageando ou buscando parceiros sexuais, que devem ser minimizados
em busca do próprio fitness (Sih, 1990; Johnson et al., 2000). Os animais otimizam a
decisão de quando deixar o refúgio após a exposição ao predador pelo balanço entre o
risco de perdas e as necessidades fisiológicas e comportamentais em determinado
momento (Ydenberg e Dill, 1986). Os riscos e custos são balanceados na
determinação de quando fugir para o refúgio ou quando sair dele. Este balanço pode
ser observado na resposta comportamental das tilápias submissas neste estudo. Esses
peixes mantiveram-se mais tempo no refúgio, devido à presença de animais
43
hierarquicamente superiores e sinais de predador, porém arriscavam-se em menor
quantidade a chegar à região de sítio de alimentação em busca de rápido acesso ao
recurso alimentar.
Sih (1990; 1992) estudou os efeitos da incerteza sobre a presença de predador
sobre o uso de refúgios. Este autor mostrou que o uso do refúgio pode aumentar com
a diminuição do estado de fome, aumento dos riscos fora do refúgio, diminuição na
qualidade ou presença de alimento e decréscimo da certeza de localização do
predador. A incerteza quanto à exata localização do predador pode ter sido o que
ocorreu quando sinais químicos do pintado chegaram ao ambiente das tilápias. Apesar
de o predador alopátrico dificultar o reconhecimento, sinais químicos da presença de
um bagre podem ter sido o sinal chave que alterou a tomada de decisão da tilápia. Em
especial, o peixe dominante, que ocupava a maior área de dispersão e tinha mais
acesso ao sítio de alimentação, passou a ocupar mais o refúgio e gastar menos tempo
alimentando-se. Neste caso, o sinal químico deve ter sido mais efetivo na tomada de
decisão do que o sinal visual, devido á baixa localização da fonte de estímulo.
O risco de predação é muito mais forte para as presas do que o risco de perda
do alimento por um tempo determinado (Bachmann, 1993). Uma única exposição ao
predador pode causar danos irreversíveis e morte da presa, sem outra chance de
conseguir o recurso buscado. Assim, evitar o predação e a exata avaliação do risco são
altamente favorecidos pela seleção natural (Kavaliers e Choleris, 2001). Portanto, é
esperado que haja alta pressão seletiva na percepção de riscos, sinais de possível
predador, e na habilidade de distinguir ameaças (Abrams, 1986; Abrams, 1994;
Thorson et al. 1998). Assim, mesmo não havendo o reconhecimento imediato entre
tilápias e pintados devido a sua alopatricidade, sinais químicos de siluriformes,
44
mesmo que de diferentes famílias, parecem ser indicativos importantes do risco de
predação (Altbäcker e Csányi, 1990).
Sinais diretos são produzidos por predadores que estão fisicamente presentes
no ambiente. Sinais indiretos (químicos, auditivos) não necessariamente indicam a
presença do predador ou que a presa o encontrará, mas indicam para as presas
estimativas do risco de predação (Abrams, 1994; Lima 1998; Thorson et al. 1998).
Helfman (1989) sugeriu a hipótese denominada “sensibilidade de ameaça para fuga de
predador”, que diz respeito à flexibilidade de acessibilidade e comportamentos em
resposta a diferentes graus de ameaça percebidos pela presa. Este conceito foi
originalmente derivado de estudos com peixes que mostravam comportamento
aversivo ou defensivo dependente da natureza da ameaça, na qual sinais visuais
indicam menor reposta de aversão enquanto odores aumentam esta resposta (Kats e
Dill, 1996). Esta teoria reforça os resultados encontrados neste estudo, em que sinais
químicos induziram maior uso do refúgio e distâcia da área de alimentação do que
sinais visuais de predador.
De acordo com Dall et al. (2001), o comportamento normal do animal é um
balanço entre evitar o predador (custo) e os benefícios de uma atividade alternativa
(forragear). Em geral, quando o risco é alto, os animais mostram maior flexibilidade
comportamental
(Godin e Dugatkin, 1996;
Kotler, 1992). Este contínuo
comportamental é remanescente dos conceitos de distância defensiva, contínua
eminência predatória e sistema motivacional supressor de mecanismos de defesa
(Bolles, 1970; Curio, 1993; Lima, 1998). Neste sentido, o presente estudo contribui
com o conhecimento sobre o desafio de tomada de decisão, indicando que sinais
45
químicos parecem mais efetivos em causar alteração comportamental com decisão de
fuga do que sinais visuais isolados.
Embora em grupos de animais, o estressor social pareça ser mais impositivo
do que sinais isolados de predador e esta resposta seja diferente para animais
dominantes ou submissos, mais estudos enfatizando a resposta de tomada de decisão
frente a sinais de predador isolados e somados se fazem necessários. Além disso,
estudos sobre a resposta comportamental de tilápia isolada frente a sinais de predador
podem contribuir para o melhor entendimento do peso da hierarquia e dos fatores que
guiam a resposta do animal em grupo ou isolado socialmente.
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