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PRODUTOS CULTURAIS DESTINADOS AO PÚBLICO FEMININO E À
NATUREZA FEMININA: ANÁLISE DA AÇÃO DO DISCURSO (1)
Ana Julia Alves de Lima (2), Ana Beatriz Alves de Lima (3), Cristina dos Santos Lovato
(4)
(1)
Trabalho executado no âmbito do Grupo CNPq de pesquisa e extensão Cultura, Linguagem, Sociedade e Educação;
Universidade Federal do Pampa; Itaqui, Rio Grande do Sul; [email protected];
(3) Estudante; Universidade Federal do Pampa;
(4) Orientadora; Universidade Federal do Pampa.
(2) Estudante;
Palavras-Chave: Análise Crítica do Discurso; Produtos Culturais; Revistas femininas.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho integra o projeto de pesquisa Análise Crítica do Discurso: a representação da
mulher em textos midiáticos da região da fronteira oeste do Rio Grande do Sul. A partir da Análise Crítica do
Discurso (FAIRCLOUGH, 2001, por exemplo), analisamos como dois exemplares da revista Jornal da
mulher, produzida na cidade de São Borja, no estado do Rio Grande do Sul, constroem o perfil de suas
leitoras. Partimos do pressuposto de que essas revistas estabelecem “o perfil de suas receptoras em torno
de assuntos relacionados à sua esfera específica: sedução e sexo, família, casamento, maternidade e
futilidades” (SWAIN, 2001). Na sequência, descrevemos os procedimentos metodológicos utilizados na
análise e os resultados alcançados.
METODOLOGIA
A abordagem teórico-metodológica empregada é orientada pelas três dimensões de análise sugeridas
por Fairclough (2001): descrição, interpretação e explicação. Essa abordagem permite vislumbrar o modo
como são as relações entre mudança discursiva e social e as propriedades detalhadas de textos associadas
às propriedades sociais de eventos discursivos como instâncias da prática social (FAIRCLOUGH, 2001). A
análise apresenta, portanto, duas etapas: análise textual e análise contextual. A análise textual é feita por
meio do mapeamento do campo semântico das matérias jornalísticas presentes nas revistas do corpus.
Verificamos as categorias de presença e ausência de discursos particulares relacionados às
temáticas: sedução e sexo, família, casamento, maternidade, futilidades, debate político, assuntos
econômico-financeiros, estratégias e objetivos sociais, questões jurídicas e opinativas (SWAIN, 2001).
Esses dados foram cruzados com informações sobre o contexto de produção dessas revistas, tais como
missão da revista, objetivos e público-alvo, a fim de cotejar os resultados alcançados na análise textual com
as condições de produção dos produtos culturais disponíveis nos dois exemplares, tal como exposto na
próxima seção.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
As análises indicaram a presença dos seguintes temas: futilidades, comportamento, saúde, profissão,
gastronomia, automóveis, educação e política. Os gêneros discursivos predominantes são: artigo de opinião
e anúncio publicitário, com conteúdos relacionados, principalmente, a comportamento e futilidades. Em relação a comportamento, destaca-se o artigo intitulado O que é ser chic em que a autora dita regras de comportamento social, que ela julga como sendo adequadas. Observa-se que no texto a autora reproduz configurações identitárias que se esperam de uma mulher idealizada. A seguir trechos da reportagem ilustram
esse aspecto.
“(...) Chique mesmo é quem fala baixo. Quem não procura chamar atenção com suas risadas muito altas, nem por seus imensos decotes e nem precisa contar vantagens, mesmo quando são verdadeiras. (...) Chique mesmo é ser discreto, não fazer perguntas
ou insinuações inoportunas, nem procurar saber o que não é da sua conta. (...) Chique mesmo é não se exceder jamais! Nem na bebida, nem na comida, nem na maneira de se vestir. (...)”.
Parecem ser reproduzidos “paradigmas físicos, morais, mentais, cujas associações tendem a homogeneizar o ‘ser mulher’, desenhando em múltiplos registros o perfil da ‘verdadeira mulher’” (SWAIN, 2001).
No artigo A nova Amélia, a autora discorre sobre o “novo” papel da mulher na sociedade, verifica-se que,
Anais do 8º Salão Internacional de Ensino, Pesquisa e Extensão – Universidade Federal do Pampa
mesmo quando se trata de relatar esse novo papel, a mulher não consegue se libertar desse estigma de
‘Amélia’, conforme demonstra o trecho a seguir:
“(...) Hoje a “Amélia” transformou-se em Dra. Amélia ou a Engenheira Civil Amélia, pois ainda é a mulher, em sua grande maioria, que assume as funções domésticas depois de um dia longo de trabalho. Levantar, trabalhar, pegar as crianças no colégio, chegar
em casa e dar conta de tudo e de um bom sexo e noite de sono, são discussões a serem consideradas (...)”.
No trecho acima, destaca-se o fato de que essa mulher se transformou em doutora, mas ainda é, impreterivelmente, uma mãe, pois a maternidade parece ser inerente à natureza feminina, parecendo ser
inadmissível a ideia do “não ser mãe”. “De fato, o que se nota é certa condescendência em relação à mulher
profissional, cuja atividade seria apenas um acréscimo às suas tarefas habituais, nunca uma modificação da
divisão ‘natural’ do trabalho” (SWAIN, 2001).
Os anúncios publicitários ocupam cerca de 70% do espaço da revista e reforçam os sentidos e as representações sociais observadas nos artigos de opinião analisados.
Tabela 1 – Propagandas Publicitárias
Imagem 1
Imagem 2
Fonte: Elaborado pelas autoras.
Como visto nos exemplos da Tabela 1, os anúncios se concentram em serviços e produtos para embelezamento que buscam assegurar o padrão de beleza idealizado pela sociedade, são publicidades referentes ao corpo feminino e mostram como as mulheres “devem ser” esteticamente.
CONCLUSÕES
Estudos prévios já apontavam a ausência, em revistas destinadas ao público feminino, de debates
políticos, estratégias e objetivos sociais, assuntos econômico-financeiros e questões opinativas (SWAIN,
2001). Quando esses temas aparecem nas revistas analisadas, referem-se ao particular e exclusivo do
universo feminino, uma matéria jornalística sobre um projeto social associa, por exemplo, a mulher ao
sentimentalismo e a domesticidade (“transformadora de vidas através da educação e do amor”). Sobre
política, em sua única ocorrência, é uma bibliografia sobre um político da região.
A revista Jornal da Mulher parece reproduzir e manter um discurso sobre a mulher “atrelado à
subserviência feminina”. Demonstrando a mulher não como um ser independente e livre para fazer suas
próprias escolhas sobre casamento, profissão, filhos e muitas outras esferas de sua vida, mas com toda a
carga das responsabilidades do lar, além da vida profissional. A ação discursiva nessa revista parece ser
construída de modo a reduzir o feminino a sua expressão mais simples e simplória: consumidoras, fazendo
funcionar poderosos setores industriais ligados às suas características “naturais”: domesticidade, sedução e
reprodução (SWAIN, 2001).
Por fim, observa-se que a revista se assemelha mais a um informe publicitário a uma revista com um
projeto social desenhado para proporcionar uma reflexão crítica sobre a condição do ‘ser’ feminino na
sociedade. Isso é reforçado pelo fato da revista organizar suas reportagens em grande parte associadas a
propagandas de produtos e serviços, assim, atendendo a interesses econômicos e não sociais.
REFERÊNCIAS
FAIRCLOUGH, N. Discurso e mudança social. Brasília: Editora da UNB, 2001.
SWAIN, T. N. Feminismo e recortes do tempo presente: mulheres em revistas "femininas". Perspectivas, São Paulo,
15, 67-81, 2001.
Anais do 8º Salão Internacional de Ensino, Pesquisa e Extensão – Universidade Federal do Pampa
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