VERIFICAÇÃO DE QUE O DECAIMENTO DE UMA FONTE RADIOACTIVA DE PERIODO DE DESINTEGRAÇÃO T1/2 MUITO LONGO SEGUE A LEI ESTATÍSTICA DE POISSON 1 – INTRODUÇÃO Considere-se a situação que ocorre quando se fazem determinações de actividade de uma fonte radioactiva. Admita-se que se trata de uma fonte cujo período de semi-desintegração é suficientemente longo para que se possa considerar a sua actividade constante no decurso de uma experiência. Nestas condições, verificar-se-á que, repetindo as medições em condições supostas idênticas, não se obterá sempre o mesmo resultado mas um conjunto de resultados diferentes, distribuindo-se em torno de um valor médio com uma certa regularidade. Situação semelhante ocorre sempre que se fazem determinações de qualquer grandeza física. Com efeito, qualquer método de determinação numérica de uma grandeza está sempre sujeito a erros. Estes erros designam-se de uma maneira geral por erros de observação. Estes podem classificar-se em erros sistemáticos e em erros aleatórios ou acidentais. Os erros sistemáticos são inerentes ao método de observação em si: existem sempre que se utilize o referido método e introduzem variações constantes no mesmo sentido, pelo que não são susceptíveis de tratamento estatístico. O observador deve sempre fazer intervir no cálculo do erro do resultado final uma parcela que traduza o somatório dos erros sistemáticos envolvidos no método de medição. Os erros aleatórios são devidos a um grande número de causas que não podem ser controladas pelo experimentador. Os erros devidos a estas causas flutuam pois de forma irregular de uma observação para outra e não é possível predizer os seus valores com exactidão; são considerados como variáveis aleatórias e tratados por métodos da Teoria das Probabilidades. Pode pois dizer-se que a medição é uma experiencia aleatória cujo resultado, a medida, é uma variável aleatória. Uma variável aleatória fica definida desde que conheça a respectiva lei de probabilidade ou lei de distribuição. 2 – CASO DE MEDIDAS DE ACTIVIDADE No caso da medição do número de desintegrações que ocorre numa fonte radioactiva durante um determinado intervalo de tempo ∆ em que ∆ ≪ / da fonte há que ter em conta que não só a medição (baseada na interacção da radiação com a matéria) é aleatória, mas também o próprio processo de decaimento é inerentemente aleatório A emissão radioactiva é um fenómeno estatístico ao qual está associada a probabilidade de desintegração de um núcleo por unidade de tempo – constante de desintegração radioactiva, . O problema situa-se em saber em que medida é que o resultado de uma única determinação ou de um conjunto de determinações de actividade representa a “actividade” da fonte radioactiva. É fácil mostrar que a emissão radioactiva segue a lei de Poisson (ver apêndice I) e que esta tende para a lei normal de variância igual à média (aproximação esta que já é válida para valores de média ≳ 30). Como é sabido as melhores estimativas dos parâmetros (média) e (desvio padrão) de uma distribuição, calculados a partir de uma amostra de medidas , … , são dadas por: = = − −1 para uma distribuição normal e no caso de uma distribuição de Poisson por: = = . Atendendo ao significado de média e desvio padrão resulta que, se se fizer um conjunto de determinações , , … , cuja média é ou uma única determinação então há 68% de probabilidade de, fazendo nova determinação, o valor obtido se encontrar no intervalo ± ou que 68% das determinações pertencem ao referido intervalo. A = chama-se desvio padrão da amostra (conjunto de determinações). Pode ainda dizer-se que há 68% de probabilidade de o valor “verdadeiro” se encontrar no intervalo ± . A ! = dá-se o nome de desvio padrão da média e significa que, se se fizer um novo conjunto de determinações de média ′ há 68% de probabilidade de ′ pertencer ao intervalo ± ! . É óbvio que se se fizer uma única determinação então ! = = razão porque também se denomina desvio padrão de uma observação isolada. Claro que os resultados obtidos são tanto mais precisos quanto maior for o número de determinações efectuadas. 2.1- Correcção de Fundo Poder-se-á verificar que, mesmo na ausência de fontes radioactivas, são contados impulsos no sistema de medição. A existência destes impulsos, chamados contagens de fundo, deve-se a ruído electrónico e à existência de radiações cósmicas e radiações provenientes de isótopos radioactivos naturais. Se se pretende fazer uma determinação correcta de actividade de uma fonte as contagens de fundo devem ser subtraídas da contagem total. Normalmente o fundo, se for constante, não introduz erro significativo a não ser que se esteja a medir uma fonte pouco intensa em locais onde o fundo possa ser apreciável. Nos casos em que se impõe fazer a correcção de fundo deve o erro da sua determinação entrar no cálculo do erro do resultado. 3 – LEI DA PROPAGAÇÃO DOS ERROS Em geral a medição de uma grandeza faz-se indirectamente, isto é, medem-se outras grandezas a ela ligadas por relações conhecidas e que permitem inferir o valor desejado. É o caso, por exemplo, da determinação da taxa de contagem de uma fonte radioactiva através de uma contagem total (fonte + fundo) e de uma contagem de fundo. Em tais circunstâncias, interessa saber de que maneira os erros inerentes às grandezas que se medem directamente afecta o erro da medida indirecta. De um modo geral se se calcular # a partir de medidas normais, relacionadas com # pela função # = $ , , … , , … e se for ∆ o erro (erro padrão, erro provável ou outro) da medida então o erro ∆# correspondente a # vem dado por '$ ∆# = % & ( ∆ ' expressão que traduz a lei de distribuição dos referidos erros. 4 – REALIZAÇÃO PRÁTICA Convém mais uma vez lembrar que o que se disse é válido apenas quando o período de semi-desintegração do isótopo radioactivo, cuja actividade se está a medir, for muito grande comparado com o intervalo de tempo durante o qual se fazem as determinações. Esta condição assegura que a actividade se possa considerar constante dentro deste intervalo. É ainda de notar que todas as medições devem ser feitas exactamente nas mesmas condições. Qualquer alteração no sistema de contagem ocorrido durante a medição (instabilidade da fonte de alta tensão ou do sistema de contagem, variação na posição da fonte, etc.) será detectada por uma análise deste tipo. Para a realização deste trabalho devera proceder-se do seguinte modo: 1) Montar o sistema de contagem. Determinar a tensão de trabalho do G.M. 2) Efectuar uma contagem de fundo durante 5 minutos. 3) Colocar a fonte radioactiva junto de detector em posição suficientemente estável para que não seja fácil a sua deslocação durante as determinações. 4) Decidir qual o tempo de contagem para cada medição. Este intervalo de tempo não deve ser inferior a 1 minuto nem o número de contagens obtido ser inferior a 1000. Porquê? Efectuar 100 medições durante o intervalo de tempo escolhido. Verificar se a tensão aplicada se mantém constante durante a experiência. 5) Fazer nova contagem de fundo durante 5 minutos. 6) Determinar a média e o desvio padrão da amostra. Comparar os valores obtidos. 7) Verificar se 68% das medições estão no intervalo ± . Comentar o resultado. 8) Fazer um histograma de frequências. 9) Comparar e comentar os resultados obtidos para o fundo. 10) Determinar a contagem total corrigida de fundo e determinar o erro. Comentar o resultado. APÊNDICE 1 DEMONSTRAÇÃO DE QUE O DECAIMENTO DE UMA FONTE RADIOACTIVA DE PERÍODO / MUITO MAIOR QUE O TEMPO DURANTE O QUAL SE FAZ A MEDIÇÃO SEGUE A LEI DE POISSON. 1.1 Lei Binomial Considere-se o caso simples de um saco contendo bolas brancas e pretas. Pretende saber-se qual a probabilidade de em n extracções de uma bola do saco (com reposição) saia vezes a bola branca. Seja: p a probabilidade do acontecimento favorável (saída de bola branca), que deverá ser constante para que este esquema seja válido. A reposição da bola no saco assegura que p=constante. q = 1 - p, a probabilidade de saída de bola preta. É fácil provar que a distribuição de probabilidade em causa é dada por: ) = *+ , + - .+ ! com *+ = +! .+!. Por aplicação da definição de momentos a esta distribuição concluiu-se que os momentos de primeira e segunda ordem são respectivamente dadas por: = , = ,- Para valores de n muito grandes a lei binomial torna-se porém pouco prática. No entanto, no caso de se verificarem simultaneamente as seguintes condições: 1) a probabilidade do acontecimento favorável ser muito pequena, , ≪ 1; 2) o número n de experiencias ser muito grande; 3) ser possível considerar constante o produto , = ; então a lei Binomial (com → ∞ e , → 0) tende para a lei de Poisson conforme a seguir se demonstra. DEMONSTRAÇÃO ) = ,+ ! ! 1 − ,.+ , + 1 − ,.+ = − ! + ! ! − ! ) = − 1 … − + 1 + 1 − , 31 − 1 431 − 2 4 … 31 − − 1 4 + 1 − , = 1 − ,+ . … ! 1 − ,+ ! uma vez que , = como, 1 − , = 31 − ,.6 4. e por definição 6 lim:→; 1 + < : pelo que ainda == lim6→; >1 − ,. 6 ? . … A 6→; .6 lim→@ .6 = = .6 = = .! =1 logo no limite quando → ∞ e , → 0 vem: ) = B CD + +! expressão que traduz a lei de Poison. Diz-se que então que o acontecimento em causa e que verifica as condições anteriores segue a Estatística de Poisson. Esta aproximação é já aceitável para valores de ≳ 100 e , < 0.05. 1.2 Analogia do Esquema da Lei Binominal com a Desintegração Radioactiva Experiência: tirar uma bola do saco ≡ “observar” um núcleo num intervalo ∆. Resultado: bola branca ou bola preta ≡ decai ou não decai. Probabilidade do acontecimento favorável numa experiência simples, , ≡ ∙ ∆ Número de experiências: ≡ nº de núcleos radioactivos presentes na amostra, . Aproximações necessárias: = considera-se constante. De facto o número de núcleos radioactivos é tão elevado que o decaimento da fonte durante o tempo da medição não produz alteração significativa nesse número. Assim, o fenómeno da desintegração radioactiva pode ser descrito pela lei binominal. Mas uma vez que é muito elevado e que a medição da actividade de uma fonte só tem sentido se o período for muito grande relativamente ao tempo de medição então ∙ ∆ ≪ 1. Ainda, como = , = ∙ ∙ ∆ se pode considerar constante, uma vez que e são constantes tem-se que a desintegração radioactiva segue a lei de Poisson. Matematicamente como aproximação da Lei Binomial para ≫ e elevado é também possível chegar à seguinte expressão: ) = 1 2 +.!I ! =. que é a expressão da lei normal (também conhecida por Lei Gauss) com = . Verifica-se que para valores ≳ 30 já esta aproximação é razoável. Resumindo: para contagem de urna fonte muito fraca, ou de fundo, por exemplo, deve usar-se a lei de Poisson; para contagens de uma fonte radioactiva usa-se normalmente a lei de Gauss com = , pois no geral se tem > 30 cps.