A CHUVA OROGRÁFICA NO PARQUE ESTADUAL DE ILHABELA

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A CHUVA OROGRÁFICA NO PARQUE ESTADUAL DE ILHABELA
(PEIb - SP) - ESTRADA DE CASTELHANOS
Prof. MSc. Marcos Alexandre Milanesi – USP/FFLCH/DG - [email protected]
Prof. Dr. Emerson Galvani – USP/FFLCH/DG – [email protected]
RESUMO
O resgate de uma bibliografia climatológica histórica da pluviosidade da região do litoral norte do
Estado de São Paulo revela uma baixa densidade de estações meteorológicas e de postos
pluviométricos, o que dificulta uma análise mais satisfatória da espacialização dos atributos do clima
na escala dos topoclimas em locais de difícil acesso.
Isso nos leva a crer que em localidades cuja rede de observação seja deficiente as representações
gráficas existentes acerca da distribuição dos atributos do clima e em especial a chuva, no intuito de
sintetizar parte do clima regional é baseado em aproximações teóricas e em soluções de ordem
gráfica.
No litoral norte, em especial, no município de Ilhabela, isso acontece. E faz passar despercebida a
existência de uma dinâmica climática local baseada na interação existente entre uma barreira de
relevo e um fluxo de ar, ou os conhecidos efeitos orográficos.
Entendemos como efeito orográfico parte das interações perceptíveis entre a atmosfera e a
superfície terrestre. O controle que uma rugosidade do terreno revela-se sobre os atributos do clima
por meio do aquecimento diferenciado de parcelas de ar, a redução da temperatura da parcela da
atmosfera local, a formação de brisas e nuvens, a distribuição e a gênese da precipitação do tipo
orográfica.
O objetivo central deste trabalho é a investigação da precipitação orográfica e a de processos
associados como a sombra de chuva, no trecho central da ilha, na área do Parque Estadual de
Ilhabela (PEIb) onde localiza-se a Estrada de Castelhanos.
A Estrada de Castelhanos apresenta 22 km de extensão e varia em altitudes desde o nível do mar
até os 690 m. Ainda, contando com uma orientação geral no sentido W-E, apresentam-se suas duas
grandes vertentes, aquela voltada para o continente e aquela voltada para o oceano.
Ao longo da estrada foram instalados ao todo 13 pluviômetros experimentais e seus dados foram
coletados mensalmente, durante o Ano Hidrológico de 2004 a 2005.
Os resultados demonstraram a ocorrência da chuva orográfica e da sombra de chuva em decorrência
da existência das vertentes opostas. A redistribuição da chuva, em função do relevo, e do aumento
dos valores, por conta da altitude é espacializado quando se observam os diferentes valores
encontrados: a barlavento da ilha (vertente voltada para o oceano) os valores de chuva são
incrementados em 20% quando comparados com aqueles encontrados a sotavento. Em altitudes
superiores a 300 m, choveu em torno de 44% do total coletado, suplantando aqueles de altitudes
menores.
PALAVRAS-CHAVE: relevo, precipitação, sombra de chuva.
ABSTRACT
A review of a climatologic historical bibliography of pluviosity in the North coastline of São Paulo State
reveals a low density of meteorological stations and pluviometers, which makes difficult to reach a
more satisfactory spacing analysis of climate attributes in the scale of topoclimates in places to which
it is hard to have access.
That leads us to believe that in some places whose observation is deficient, graphic representations
concerning the distribution of climate attributes, especially rain, in order to synthesizer part of regional
climate is based on theoretical approximations and on solutions in terms of graphic order.
In the North coastline, especially in Ilhabela town, that happens. And becomes unnoticed the
existence of local climatic dynamics based on the interaction between a relief barrier and air flow, or
the known orographic effects.
We comprehend as orographic effects part of perceptible interactions between the atmosphere and
the terrestrial surface. The control that a roughness land reveals upon climate attributes through
heating differed from parcels of air, the reduction of temperature of the local atmosphere, the
formation of breeze and cloud, the distribution and the genesis orographic precipitation.
The main objective of this work is the investigation of the orographic precipitation and the processes
associated such as rain shadow effect, in the central island stretch, in Ilhabela State Park region
(PEIb) which is located on Castelhanos Road.
This road presents 22 kilometers of extension and it varies since sea level until 690m. Including a
general orientation in W-E direction, its big vertents are presented, the one in the direction to the
continent and the other to the ocean.
Throughout the road, thirteen experimental pluviometers were installed and their data were collected
monthly, during the Hydrologic Year from 2004 to 2005.
The results demonstrated that orographic rain and the rain shadow occur due to the existence of
opposite vertents. The rain redistribution, in the relief function and the values raise, because of
altitude it is spaced when different values found are observed: the windward of the island (the vertent
in the direction to the ocean), the rain values are incremented in 20 % when compared to those found
leeward. In altitudes higher than 300 m, it rained around 44% of the total that was collected,
supplanting those lower altitudes.
KEYWORDS: relief, precipitation, rain shadow.
A CHUVA OROGRÁFICA NO PARQUE ESTADUAL DE ILHABELA (PEIb - SP) ESTRADA DE CASTELHANOS
Prof. MSc. Marcos Alexandre Milanesi - USP/FFLCH/DG - [email protected]
Prof. Dr. Emerson Galvani - USP/FFLCH/DG - [email protected]
Introdução
O resgate de uma bibliografia climatológica histórica da pluviosidade da região do litoral norte do
Estado de São Paulo remonta um fato cotidiano na pesquisa em Climatologia Geográfica no Brasil, a
baixa densidade de estações meteorológicas e de postos pluviométricos. Tal fato evidencia um lógico
comprometimento da análise climática em diversas escalas, mas, sobretudo na topoclimática, aquela
nas quais os atributos do clima mais sofrem com a influência do relevo, do uso e ocupação do solo e
das atividades econômicas.
Para Martinelli (2003), o método isarítmico é aquele que melhor se adapta à representação de
fenômenos contínuos como o relevo, a temperatura e a chuva, a partir de dados coletados de forma
descontinua espacialmente. Baseia-se em um banco de dados georreferenciados a pontos ou estações
observacionais de superfície, os quais gerariam, por meio do método da interpolação linear, as
isolinhas (De Biasi, 1973). Considera-se que a validade do método isarítmico dependa da distribuição
dos pontos/ postos de observação no espaço e da consistência dos dados por eles apresentados (idem).
Isso nos leva a crer que, em localidades de difícil acesso cuja rede de observação seja deficiente
(inexistente ou de funcionamento intermitente), as elucidações e respectivas representações gráficas
existentes acerca da distribuição espacial dos atributos do clima e em especial a chuva (carta de
isoietas), no intuito de sintetizar parte do clima regional é baseada em aproximações teóricas e em
soluções de ordem gráfica.
No litoral norte, em especial, no município de Ilhabela, isso acontece. E faz passar despercebida a
existência de uma dinâmica climática local baseada na interação existente entre o relevo da ilha e os
fluxos de ar predominantes, ou os conhecidos efeitos orográficos.
Entendemos como efeitos orográficos parte das interações perceptíveis entre a atmosfera e a superfície
terrestre. O controle que uma rugosidade do terreno exerce sobre os atributos do clima pode ser
observado por meio do aquecimento diferenciado de parcelas de ar, a formação de brisas e nuvens, a
precipitação do tipo orográfica.
Precipitação orográfica ou chuva de relevo é o fenômeno que se inicia quando um fluxo de ar saturado
é obrigado a elevar-se frente a um obstáculo de relevo, sofrendo resfriamento em maiores altitudes.
Posteriormente, condensando e gerando nebulosidade e tem seu final com a possibilidade da
precipitação, que pode apresentar elevação das quantidades de chuva conforme a altitude. Um efeito
associado a esse fenômeno é identificado como sombra de chuva e refere-se à redução das quantidades
de chuva do lado oposto do relevo após a transposição do fluxo de ar, agora descendente, sobre a linha
de cumeeira.
Smith (1979) esmiúça a teoria da chuva orográfica de Bergeron e propõe sua subdivisão em três tipos
de ocorrência: autoconversão, convecção disparada e seeder-feeder (semeador-alimentador).
A autoconversão é o modelo clássico da chuva orográfica. Esta é o resultado da elevação forçada do
fluxo de ar pela vertente da montanha. Se a temperatura, a umidade e os ventos forem constantes, o
crescimento das gotas (por colisão e coalescência) deverá ser similar em qualquer ponto da montanha,
provocando chuva com característica temporal uniforme. Processo típico ação da brisa marinha sobre o
relevo da zona costeira, e sobre o relevo da ilha, em nosso caso.
A chuva formada pela convecção disparada ocorre fundamentalmente na vertente mais ensolarada da
montanha por meio da formação de nuvens da família dos cumulus, de grande desenvolvimento
vertical. Não apresenta uma distribuição vertical da chuva marcante na encosta, porém, caso seja
vegetada, pode atuar como fornecedora da umidade em altitudes mais elevadas. Este processo é uma
clara marca do aquecimento diferencial de vertentes opostas, em função da quantidade de radiação
solar absorvida ao longo do dia.
O último tipo de chuva orográfica é conhecido como seeder-feeder ou semeador-alimentador e
pressupõe a ocorrência de nuvens mais altas em processo de precipitação (seeder) sobre nuvens mais
baixas (feeder) ocorrentes pela ascensão da coluna de ar sobre a vertente, aumentando a colisão entre
as gotas. No modelo conceitual de Bergeron, a chuva de altos níveis carrega umidade para a camada de
ar subjacente por meio da evaporação da gota em sua trajetória gravitacional. A liberação da massa de
água para o ambiente facilita a formação de nuvens baixas, com bases aproximadamente entre 50 e
200 m acima do nível da superfície, possibilitando a intensificação da chuva orográfica.
Em relação aos mecanismos condicionantes da precipitação orográfica Roe et al. (2003) afirmam que o
controle da distribuição da chuva orográfica é uma função direta da geometria da montanha ou
vertente, pormenorizado num trinômio entre elevação, declividade e orientação. Para Ayoade (1988),
os diversos graus de controle do relevo sobre a precipitação respeitam determinados limites como o
seu tamanho e sua orientação relativa aos ventos úmidos e, à estabilidade atmosférica. Uma posição
perpendicular do obstáculo natural à entrada das massas de ar é fundamental para a geração das
chuvas. Quando a atmosfera local encontra-se estável, o efeito orográfico é restrito aos níveis mais
baixos, mais próximos às vertentes ou montanhas e influi na distribuição da chuva. Quando instável, o
efeito orográfico potencializa e redistribui o volume da precipitação por uma área maior. Em 1979,
Barry e Chorley, apontam ao menos cinco formas de influência das montanhas sobre a chuva, ao
retardar por atrito, uma corrente de ar que se move do oceano para o continente gerando convergência
e ascensão; causando convergência e elevação através do afunilamento da corrente de ar nos vales;
provocando instabilidades convectivas ao favorecer o deslocamento inicial (quando estável) de
correntes de ar, por meio de aquecimento diferencial (vertentes diretamente expostas a maior ou menor
insolação); forçando a ascensão turbulenta do ar pela fricção superficial (atrito com a superfície),
incorrendo na formação de nuvens stratus e stratocumulus e possível precipitação de garoa ou chuvas
rápidas; aumentando a precipitação de origem ciclônica ao retardar seu deslocamento.
Em resumo, o controle do relevo sobre a precipitação tem origem numa diversidade de elementos que
variam tanto em escala espacial quanto temporal. O efeito da maritimidade a que a estrada está sujeita
é, sem dúvida, um facilitador dos processos orográficos, ao disponibilizar vapor de água necessário
para seu acontecimento. Os fatores físicos específicos à morfologia do relevo como área,
comprimento, largura, altitude, declividade, orientação geral e das vertentes, profundidade dos vales
aliados à cobertura do solo e rugosidade do terreno, são determinantes nos processos de controle.
Porém, o principal desencadeante do processo genético da chuva orográfica parece ser o fluxo de ar,
representado pela atuação dos sistemas atmosféricos regionais do sudeste (ventos predominantes de
SE), pela brisa marinha e pela própria instabilidade potencial da atmosfera circundante (convecção).
A disponibilidade de dados de chuva apenas para a vertente voltada para o continente possibilita a
confirmação do efeito de sombra de chuva, mas não da chuva orográfica (escala local). Logo, a
produção cartográfica referente à distribuição espacial da chuva na Ilha de São Sebastião não é
considerada expressão da realidade climática local, senão teoricamente.
Lembrando as palavras do Prof. Conti, quanto à chuva orográfica na Ilha de São Sebastião, em 1975
(p. 51): “faltam observações na vertente exterior da ilha, as quais nos dariam a medida exata do
contraste entre os dois lados”.
O objetivo central deste trabalho é identificar a variabilidade climática da chuva sob influência do
relevo da Ilha de São Sebastião, em particular, sobre a formação e distribuição da chuva orográfica em
suas duas grandes vertentes: barlavento (exposta aos fluxos oceânicos úmidos de SE) e sotavento (em
abrigo aos mesmos fluxos, voltada para o continente) e a de processos associados como a sombra de
chuva, no trecho central da ilha, na área do Parque Estadual de Ilhabela (PEIb) onde encontra-se a
Estrada de Castelhanos, correlacionando os dados de chuva colhidos em campo com aqueles da
Plataforma de Coleta de Dados (PCD) do INPE, em Caraguatatuba e, com os caracteres do sítio de
localização dos pluviômetros, as diferentes vertentes e respectivas altitudes.
Não pretendemos apresentar a síntese dos resultados sob a forma de uma carta de isoietas devido à
distribuição espacialmente linear dos pluviômetros. Fato este fez com que o produto cartográfico
resultante seja apresentado sob a forma de cartograma.
Área de Estudo
Localizada no litoral norte do Estado de São Paulo, distando 210 km a lesnordeste da capital, a área de
estudo (Figura 1) está inserida no município-arquipélago de Ilhabela que compõe-se por lajes, ilhotas e
ilhas maiores, sendo a Ilha de São Sebastião, a maior, com 348 km2, que por sua vez, abriga a sede
administrativa do município, sob as coordenadas geográficas latitude 23° 46’ 28" Sul e longitude 45°
21’ 20" Oeste (10m de altitude). Limitado pelo canal de mesmo nome com os municípios de São
Sebastião a oeste, Caraguatatuba a noroeste e com o Oceano Atlântico, a leste.
A Ilha de São Sebastião apresenta comprimento máximo aproximado de 27 km e relevo planáltico de
orientação geral SW-NE e, com desníveis altimétricos acentuados (Pico de São Sebastião, 1379 m e
Morro da Ponta Alta, 1259 m), encostas com inclinação em torno de 30% e pequenas planícies - sendo
a do Perequê (na porção urbanizada) e a de Castelhanos (na face oriental), as maiores. A vegetação de
Mata Atlântica, que recobre a ilha, encontra-se em diversos estágios de desenvolvimento, em boa parte
preservada pela existência do Parque Estadual de Ilhabela. (Figura 2)
Figura 1 - Imagem da área de estudo, satélite Landsat
5TM, de 20 de agosto de 1988.
Fonte: INPE (2006)
Figura 2 - Área aproximada do PEIb, na
ilha de São Sebastião.
Fonte: Instituto Florestal (2009)
O Parque Estadual de Ilhabela (PEIb) integra a rede unidades de conservação do Sistema Nacional de
Unidades de Conservação (SNUC) administrado pelo Instituto Florestal (IF-SMA). Criado em 20 de
janeiro de 1977 por meio do Decreto Estadual nº 9.414 e regulamentado através do Decreto Estadual
nº 25.341 em 04 de junho de 1986 - com área de 27.025 Hectares. De perímetro estimado em 85 km,
ocupa aproximadamente 85% do município, onde os limites são definidos por cotas altimétricas que
variam de 200 m e 100 m, assegura a manutenção da biodiversidade singular e relictual que o ambiente
ilhéu propicia. Ainda, é reconhecido pela UNESCO como um núcleo da Reserva da Biosfera da Mata
Atlântica.
O parque possui infra-estrutura básica para a realização de pesquisas. Infelizmente o número
relativamente pequeno de estudos desenvolvidos ou em desenvolvimento, marca também a carência de
estudos climatológicos – o parque não tem uma estação climatológica oficial e própria. Existe muito
pouco conhecimento sistematizado na área de estudo acerca do clima local ou da chuva que possa
caracterizar um razoável de banco de dados, com fins específicos e transversais.
A Estrada de Castelhanos, importante via de circulação da ilha, é a única ligação terrestre entre o setor
urbanizado e as comunidades caiçaras de leste. Sua maior extensão encontra-se inserida na área do
PEIb, desprovida de quaisquer tipos de calçamento ou pavimentação. Corta o trecho central da ilha, na
direção W-E num percurso de aproximadamente 22 km (entre o Perequê e Castelhanos), onde as
altitudes variam entre 0 e 690 m (“Serrinha”) e as declividades superam os 30%. Seu alinhamento
latitudinal privilegia a identificação de três compartimentos geomorfológicos: planície, vertente e
divisor de águas, distintos em duas grandes vertentes: uma voltada para o continente (sotavento) e a
outra voltada para o oceano (barlavento). As características de traçado, elevação, declividade,
comprimento e importância social para as comunidades, naturalmente pesaram na sua preferência pela
instalação dos postos pluviométricos utilizados na coleta de dados.
A Figura 3 é um recorte da carta topográfica São Sebastião do IBGE, e apresenta parte dos municípios
de São Sebastião e Ilhabela, o canal de São Sebastião, o TEBAR, a Planície do Perequê, o início da
estrada de Castelhanos, na porção central da ilha, além da localização dos 13 pluviômetros
experimentais.
Figura 3 - Parte da carta topográfica São Sebastião e a localização dos pluviômetros ao longo da Estrada de
Castelhanos.
Fonte: IBGE (1977)
Cabe a consideração que a proposta inicial da instalação de treze pluviômetros experimentais foi
realizada, porém, apresentando problemas no decorrer da pesquisa, comprometendo a confiabilidade
de suas observações. Assim, apenas seis pluviômetros puderam compor o universo de análise (aqueles
grafados em verde) deste estudo.
O perfil topográfico da ilha conforme a estrada (Figura 4) enfatiza sua situação geográfica e apresentase funcionalmente como uma síntese do relevo ilhéu, destacando a variação das altitudes, a orientação
e inclinação das vertentes e indicando o posicionamento dos pluviômetros.
Figura 4 - Perfil topográfico da Estrada de Castelhanos e localização dos pluviômetros. (adaptado)
Fonte: Milanesi (2007)
Foi de grande conveniência utilizá-la, pois a configuração das vertentes opostas pode ser expressa por
meio de uma série diferenciada de indicadores da intensa dinâmica pluvial em quase toda sua de
extensão solos expostos, deslizamentos, afloramentos rochosos, inúmeros lamaçais e a impossibilidade
do trânsito de veículos comuns (figuras 5 e 6).
A maior marítima ilha brasileira está inserida na paisagem dos “mares de morros”, no domínio tropical
atlântico, segundo Ab’saber (2003), e tem como pano de fundo, a oeste, a Serra do Mar, (de relevo
escarpado alto e abrupto em longa extensão do litoral brasileiro mas de forma mais marcante no sulsudeste), área dos antigos dobramentos do Atlântico, sobre rochas do Pré-Cambriano, muito
desgastadas pela erosão, porém, apresentando altitudes superiores a 1000 m (ROSS, 1996). Sua
condição climática geral é ser quente e úmida.
Figura 5 - Remoção de árvore e desobstrução da estrada após
evento de chuva intensa.
Fonte: Milanesi (2007)
Figura 6 - A neblina típica da Serrinha (divisor de águas), o solo
encharcado (barlavento), a baixa penetração de luz são
características da dinâmica climática local. (01/12/2004, às 14h).
Fonte: Milanesi (2007)
A classificação climática de Koppen propõe que a zona costeira do estado receba a classificação Af,
(clima tropical chuvoso, sem estação seca e com precipitação média do mês mais seco superior a 60
mm). E que, em certos pontos como na ilha, aconteça o tipo Am que caracteriza o clima tropical
chuvoso, com inverno seco onde o mês menos chuvoso tem precipitação inferior a 60 mm. O mês mais
frio tem temperatura média superior a 18°C. Ainda segundo o CEPAGRI (2009), temperatura média da
ilha é de 24,8 °C, sendo a média das máximas 31,5 °C e a média das mínimas 18,5 °C. A pluviosidade
anual, também média, é em torno dos 1507,4 mm, apresentando maiores volumes de chuva entre
janeiro e março (acima de 200 mm mensais) e menores entre junho e setembro (abaixo de 80 mm).
Situada na fachada oriental da América do Sul na latitude do Trópico de Capricórnio (~ 30’ a sul), a
ilha está na transição entre duas zonas climáticas a tropical e a subtropical, o que lhe assegura um alto
nível de dinamismo atmosférico.
Em 1973, Monteiro aplicou sua metodologia da análise rítmica ao Estado de São Paulo classificando-o
em nove unidades climáticas, segundo a geomorfologia e o comportamento da pluviosidade. A Ilha de
São Sebastião aparece agora justamente no limite teórico entre duas regiões climáticas controladas por
massas equatoriais e tropicais, ao norte da Ilha de São Sebastião, e por massas tropicais e polares de
latitudes médias, ao sul. A área de estudo ainda figura no limite entre duas das unidades propostas por
ele, uma denominada Litoral e Planalto Atlântico Norte e outra, Litoral e Planalto Atlântico Sul,
fazendo jus à localização espacial da ilha. Individualizam-se das demais por apresentar valores de
chuva muito significativos se comparados às outras áreas do litoral. Fato devido à proximidade óbvia
ao oceano, à existência da Mata Atlântica e, sobretudo, às características morfológicas da Serra do Mar
e à sujeição das muitas incursões dos sistemas frontais durante o ano que influenciam na formação e
intensificação da chuva e na sua distribuição espacial (regional e local) afirmando a variabilidade
climática a que a área está sujeita.
Porém, foi com o prof. Conti (1975) em seu clássico trabalho sobre a circulação secundária e efeito
orográfico na gênese das chuvas na região lesnordeste paulista que a questão da força da orografia
sobre a circulação atmosférica ganha visibilidade no Brasil. Investigou os principais mecanismos
genéticos da precipitação, por meio do método da análise rítmica do Litoral Norte, Serra do Mar, no
Vale do Paraíba e da Serra da Mantiqueira, demonstrando o predomínio dos sistemas extratropicais
(fluxos polares) e a importância da atividade frontal na gênese de chuvas regionais. Acredita o autor
que o relevo não mantém em sua altimetria, a principal relação com a precipitação, apenas em
conjunto com a exposição de vertentes, interferindo na distribuição da pluviosidade pelo espaço.
Confirma a existência do efeito de sombra de chuva, a sotavento da ilha até Caraguatatuba, devido à
orientação SW-NE da ilha, perpendicular à entrada dos fluxos oceânicos de SE.
Milanesi (2007) identifica o posto Usina (Estrada de Castelhanos - 250 m), como o mais chuvoso,
apresentando 1838 mm de média anual e concentração na primavera/ verão. O posto Burrifas (sul da
ilha - 90 m) mostra em média, 1680,8 mm anuais de chuva, sendo que seus volumes de outono/
inverno suplantam os do posto Usina. O posto Ilhabela (centro - 10 m) demonstra os menores valores
médios de chuva (1509,6 mm) e suplanta o posto Burrifas apenas na primavera.
O contexto ambiental no qual a ilha está inserida propicia condições favoráveis à gênese da chuva
orográfica, relevo pronunciado, cobertura de vegetação de Mata Atlântica, ventos predominantemente
oceânicos. Em termos locais, é a própria barreira aos fluxos de ar predominantes e, por meio de sua
morfologia (altitude, comprimento e orientação), certamente exerce controle sobre a precipitação local.
A cartografia de um passado não tão distante da chuva no litoral norte comprova e demonstra com
fidelidade adequada a existência de um dos efeitos orográficos: a sombra de chuva, que é dependente e
resultante de um processo anterior, a chuva orográfica.
O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) possivelmente foi o responsável pela primeira
comunicação cartográfica oficial sobre a distribuição espacial da chuva da área de estudo, quando da
publicação da Carta de Isoietas Anuais da Região mais Chuvosa do Brasil (sem data), entre os anos de
1914 e 1938. Os valores da 1ª Normal Climatológica (sic) são aqui representados no trecho da carta
que inclui a área de estudo (Figura 7). Notamos que a área do canal e da cidade de São Sebastião está
inclusa na isoieta de 1500 mm de chuva anual (sombra de chuva) e que na medida em que as altitudes
tornam-se maiores, aumentam os valores de chuva, tanto na ilha quanto no continente, estando as áreas
mais altas inclusas na isoieta de 2000 mm. Atentamos para o fato da inexistência de postos
pluviométricos na ilha neste período o que justifica as isoietas tracejadas.
Figura 7 - Parte da Carta de isoietas da região mais
chuvosa do Brasil.
Fonte: IBGE (s/d)
Já em 1954, França, identificava a diferença entre os valores de chuva entre as vertentes opostas da
Ilha de São Sebastião devido às altitudes do relevo em estudo de Geografia Humana sobre a Ilha de
São Sebastião.
Conti (1975) analisa a influência da Ilha de São Sebastião sobre a chuva apontando para a ocorrência
do efeito de sombra a sotavento. Esta sombra projeta-se por quase todo o Canal de São Sebastião, em
sentido ao município de Caraguatatuba (Planície do Juqueriquerê), a característica redução da
pluviosidade. A Figura 8 mostra a distribuição da pluviosidade para o ano de 1964, considerado pelo
autor como representativo do ritmo habitual. Nota-se a isoieta de 1100 mm ocupando o canal, a
vertente continental da ilha e parte dos municípios de São Sebastião e Caraguatatuba, aumentando
conforme as altitudes até 1300 mm no barlavento e 1400 mm no continente. No estudo de Conti,
Ilhabela já contava com 2 pluviômetros oficiais, porém, sua opção foi por aquele com série histórica
mais consistente.
Figura 8 - Parte do cartograma de 1964 relativo ao ano de
pluviosidade média representativa do ritmo habitual. (adaptado)
Fonte: Conti (1975)
A Figura 9 identifica os 3 postos pluviométricos oficiais com os quais o município de Ilhabela já
contou (a malha está localizada a sotavento) e foi gerenciada até algum tempo atrás pelo Departamento
de Águas e Energia Elétrica do estado (DAEE). Atualmente o controle dos postos parece estar com o
Instituto Nacional de Pesquisas espaciais (INPE) que construiu uma PCD na Praia de Castelhanos.
A série histórica dos postos é bem heterogênea: o posto Ilhabela apresenta a maior, com 57 anos de
observações e ao menos 12 anos inconsistentes. O posto Usina tem a menor série histórica (17 anos),
porém, a mais confiável com apenas 1 ano inconsistente. Já o posto Burrifas tem 23 anos de coleta de
dados e 6 anos de inconsistências.
Figura 9 – Identificação dos postos pluviométricos do DAEE na Ilha de São Sebastião.
Fonte: Milanesi (2007)
Material e Método
Considerando a inexistência de dados de chuva para a área, a solução imediata foi o desenvolvimento
de um conjunto de 13 pluviômetros experimentais (figura 3, p. 6), que foram instalados ao longo da
extensão da estrada, distribuídos em função da altitude e das vertentes opostas. Os valores de chuva
foram coletados mensalmente durante o Ano Hidrológico de 2004 a 2005 (AH 04/05).
Milanesi e Galvani (2005) dispõem da construção do conjunto de pluviômetros experimentais, de
característica totalizadora para ser instalado em localidades de difícil acesso, como na Estrada de
Castelhanos. Sua realização considerou o problema na essência: qual a capacidade volumétrica dos
reservatórios dos pluviômetros experimentais sendo mensal a freqüência das coletas? Foram
considerados dois pontos na resolução do entrave: o relevo da ilha e a pluviometria regional. O relevo
determinou a opção por dois subconjuntos de capacidades diferentes e a pluviometria, a capacidade
máxima de cada reservatório. Dessa forma foram instalados 5 pluviômetros menores a sotavento e um
no divisor de águas - com capacidades máximas estimadas em 470 mm, e os sete restantes (os maiores,
de 700 mm) instalados a barlavento, sendo três na Praia de Castelhanos.
Um total de 14 trabalhos de campo foram planejados e executados, dois para montagem e
desmontagem do equipamento e outros 12, todo dia 1º de cada mês para coleta da chuva (total mensal),
levando em consideração o conceito de ano hidrológico, que pressupõe o período de tempo que tem
seu início em outubro e término em setembro do ano seguinte, ou seja, marcando o reinício da estação
das águas (primavera – outubro, novembro e dezembro), e seu declínio no inverno (julho,agosto e
setembro).
O acompanhamento dos boletins meteorológicos diários mais a comunicação mantida com os
funcionários do PEIB, em especial, o auxiliar de pesquisa e educador ambiental Marcos Aurélio
Nascimento foi necessário para detectar a possível ocorrência de algum evento extremo (normalmente
não previsto), onde então o trabalho de campo se faria a cada 15 dias, ou na medida em que fosse
preciso.
Durante os trabalhos de campo, uma série de atos de vandalismo fez com que os 13 pluviômetros
instalados inicialmente, fossem reduzidos ao número de 8 unidades, sendo 3 (p11, p12 e p13) na Praia
de Castelhanos. Dada a baixíssima variabilidade espacial da chuva nesta praia (menor que 3%) no
período observado, os valores de seus 3 três pluviômetros foram, por meio do estabelecimento de
médias, sintetizados em um só (p12) e não comprometeram a análise para a identificação da chuva
orográfica. Assim foram considerados 6 pluviômetros (Figura 10) na tentativa de investigar o
fenômeno.
Figura 10 - Localização dos pluviômetros experimentais na Ilha
de São Sebastião.
Fonte: Milanesi (2007)
Concomitantemente, as informações da Plataforma de Coleta de Dados (PCD) do INPE, em
Caraguatatuba, foram utilizadas, também para acompanhamento do tempo meteorológico regional,
mas principalmente, por servir como estação de controle sobre os dados dos trabalhos de campo na
estrada.
Todos os dados foram tratados na escala anual, sazonal e mensal em função das características do sítio
de cada pluviômetro (vertente e altitude), tendo em vista medidas de tendência central, de dispersão e
correlação simples.
A consulta ao Boletim Climanálise foi significativa no sentido de se quantificar o número de passagens
de sistemas frontais, haja vista sua grande participação como sistema gerador de chuva nesta altura do
litoral paulista.
Resultados e Discussões
A análise geral da circulação secundária no AH 04/05 aponta, segundo o boletim Climanálise, uma
considerável redução na passagem de sistemas frontais durante o período sobre a área. Somaram um
total de 66 passagens contra 77 na média histórica, que gerou aproximadamente 60 dias de chuva.
Já os dados de pressão atmosférica da PCD de Caraguatatuba analisados sob o viés de Tarifa (1975),
indicam o predomínio de fluxos polares oscilantes a interrompidos freqüentes em aproximadamente
71% do período, sendo responsável por 57 dias de chuva.
Concordamos com Monteiro (1973) em que a situação geográfica do Estado de São Paulo sugere à sua
dinâmica atmosférica um complexo jogo entre diferentes massas de ar ao longo do ano, sendo essa sua
identidade climática e não o predomínio de este ou aquele sistema. O autor relaciona ainda os anos
secos às poucas invasões polares sobre o estado. A baixa dinâmica dos fluxos de sul que reduzem a
freqüência de frentes frias sobre o litoral explica a ocorrência dos baixos valores de precipitação neste
ano. Não podemos afirmar se este foi um ano mais ou menos chuvoso devido ao reduzido número de
observações, porém, acordamos que foi de pluviosidade reduzida, seguindo a tendência regional.
Durante os trabalhos de campo no AH 04/05, na Estrada de Castelhanos, foi coletado um total de
18092,4 mm de chuva. A distribuição temporal dessa chuva (Figura 11) nos remete a uma média
mensal de 1507,7 mm, concentrada no verão (35,3%) e outono (26,9%), mas sem apresentar uma
estação realmente seca. O mês de maior precipitação foi março com 3313,9 mm (ou 18,3 % do total) e
o mais seco, agosto com 125,3 mm (ou 0,7 %).
3313,9
3500
1790,2
2000
1500
1000
2637,6
2240,2
2500
1324,4
948,0
824,7
858,9
456,4
500
125,3
5
t/ 0
5
se
05
o /0
ag
ju l
/
/0 5
05
5
r /0
/0 5
ai/
m
ab
5
v /0
ar
m
fe
4
/0 5
ja n
v /0
z/0
de
no
t/0
4
4
0
ou
primavera
22%
inverno
15%
1792,8
1780,0
ju n
outono
27%
c huv a (m m )
3000
verão
36%
Figura 11 - Distribuição sazonal e mensal dos totais de chuva na Estrada de Castelhanos no AH 04/05.
Fonte: Milanesi (2007)
Uma interpretação mais apurada acerca da distribuição sazonal da chuva na estrada indica de antemão
a influência do relevo nos volumes coletados. Em todas as estações do ano fica claro o aumento e
redução da pluviosidade em função das vertentes opostas. Na Figura 12 podemos observar que os
maiores volumes de chuva foram coletados na vertente que antepara os ventos úmidos recebidos do
oceano, em contrapartida, na vertente oposta, a sotavento dos fluxos, nota-se uma redução quantitativa
considerável. Em média, chove 5% mais a barlavento em quaisquer estações do ano; mas essas
diferenças são menores no inverno (2,6%) e na primavera (4%) e, particularmente, elevadas no verão
(6%) e no outono (7,5%), a maior. Quando considerados apenas os totais do outono (1754,3 mm, a
sotavento contra os 3119,7 mm de barlavento), diferença pluviométrica fica em torno dos 28%.
4000
3735,7
3500
3119,7
altura (mm)
3000
2643,1
2389,9
2500
2000
1754,3
1672,8
1500
1625,7
1151,2
1000
500
0
primavera
verão
Sotavento
outono
inverno
Barlavento
Figura 12 - Distribuição sazonal dos totais de chuva na Estrada de Castelhanos
em função das vertentes opostas no AH 04/05.
Fonte: Milanesi (2007)
Considerando que no inverno, em nossa latitude, o balanço de radiação habitualmente não favoreça o
desenvolvimento de células convectivas por meio do aquecimento diferencial das vertentes nem a
gênese da precipitação frontal, cremos que a pequena diferença entre barlavento e sotavento seja de
ordem orográfica.
É apresentada na Figura 13, a variação mensal da chuva de todos os 6 pluviômetros experimentais
instalados na estrada mais os dados da PCD Caraguatatuba para o mesmo período do AH 04/05.
750
700
650
600
550
chuva (mm)
500
450
400
350
300
250
200
150
100
50
0
out/04 nov/04 dez/04 jan/05 fev/05 mar/05 abr/05 mai/05 jun/05
Caraguatatuba PCD
p1 (3m)
p2 (170m)
p7 (600m)
p9 (290m)
p126 (5m)
jul/05 ago/05 set/05
p5 (600m)
Figura 13 - Variação mensal da chuva na Estrada de Castelhanos e na PCD
Caraguatatuba durante o AH 04/05.
Fonte: Milanesi (2007)
Um primeiro fato a ser considerado é que os valores de chuva apresentam pequena variação temporal
entre si, o que denota boa correlação linear sugerindo confiabilidade entre os dados, sendo possível a
identificação de um ritmo entre eles. A segunda consideração a ser feita diz respeito ao fato de que,
invariavelmente, chove mais na ilha do que em Caraguatatuba - é uma confirmação do efeito de
sombra de chuva, certamente intensificado pelo relevo da ilha, mas que também já esboça a existência
das chuvas de relevo a barlavento. Porém, possivelmente, a informação de maior relevância não seja
explicita na figura quanto na tabela de desvios relativos dos pluviômetros experimentais com relação à
PCD: o posto p1 foi o único em que se registraram valores inferiores à PCD, em média 18,3%, nos
meses de dezembro, junho e setembro. Este fato colabora com o entendimento da espacialização da
sombra de chuva e corrobora os estudos anteriormente realizados. Traz também uma informação
supostamente nova: há localidades, na ilha, bem menos úmidas englobadas pela sombra de chuva em
seu conhecimento atual.
A distribuição espacial da chuva por meio do total anual dos pluviômetros dispostos sob o perfil do
relevo segundo a Estrada de Castelhanos sintetiza a reposta para a questão mais essencial deste
trabalho, a confirmação da existência da chuva orográfica. (Figura 14)
Figura 14 - Variação espacial da chuva para o ano hidrológico de 2004/2005, em Ilhabela. (adaptado)
Fonte: Milanesi (2007)
Os totais anuais de chuva, quando agrupados pelas vertentes opostas, apresentam valores bem
distintos, a sotavento choveu 39,9 %; um quinto menos que a barlavento com 60,9 % - clara influência
do relevo.
O posto p1 apresenta as menores alturas de chuva, 1758 mm; p2 totalizou 2173 mm e p5, 3289,9 mm
no período. Tanto p1 quanto p2 aproximam-se por quantidades de chuva (abaixo dos 2500 mm e
21,7% do total), pela localização a sotavento e por estarem abaixo dos 200 m de altitude, já na área de
definição da sombra de chuva. Já p5, a 600 m de altitude, tem valores semelhantes a p9 (3462,5 mm) e
p12 (3036,8 mm). Porém estes últimos estão a barlavento e abaixo dos 300 m. Ainda assim mantêm
entre si pequena variação nos totais coletados entre 16 e 19 %. A 600 m de altitude, a barlavento,
encontra-se o posto p7. O posto mais chuvoso de todos apresenta 4371,7 mm ou aproximadamente
24,5 % do total coletado. Tanto quanto p5, p7 também está em situação delicada – é o mais alto da
vertente, voltado para o oceano e exposto à circulação de SE, portanto, numa localidade propícia à
formação da chuva orográfica. Isso nos levou a uma relação mais simples entre chuva e relevo.
O gradiente pluviométrico local é expresso na relação natural existente entre os totais de chuva e as
vertentes opostas. Na Figura 15, observamos na reta da regressão de barlavento, alta correlação entre o
elemento e o fator analisados com R2 = 0,96. A equação descreve ainda que a partir de p12 (5m) a
chuva aumenta em torno de 2,25 mm a cada metro de altitude até seu máximo em p7.
Correlação entre chuva e altitude - sotavento
Correlação entre chuva e altitude - barlavento
5000
p7
4500
4500
4000
4000
p9
chuva (mm)
3500
3500
p12
3000
3000
p5
2500
2000
2500
2000
p2
1500
1500
p1
1000
chuva (mm)
5000
y = 2,572x + 1744,4
R2 = 0,99
y = 2,2536x + 2951,4
R2 = 0,96
1000
500
500
0
0
0
100
200
300
400
500
altitude (m )
600
600
500
400
300
200
100
0
altitude (m)
Figura 15 - Correlação entre o aumento da chuva conforme a altitude a sotavento e a barlavento da Estrada de
Castelhanos no AH 04/05.
Fonte: Milanesi (2007)
Já na vertente oposta, a sotavento da estrada, a reta de regressão aponta para uma redução da chuva em
2,5 mm/m de altitude entre p5 (600 m) e p1 (3 m), apresentando R2 = 0,99, ainda maior que a
barlavento.
A circulação secundária é responsável pela a presença de ventos predominantemente do setor sudeste
na região, fluindo perpendicular aos paredões da Serra do Mar e da Ilha de São Sebastião, de
alinhamento geral SW-NE.
Não se pode admitir que a geometria da Ilha de São Sebastião influa na dinâmica atmosférica regional
a ponto de gerar perturbações na alta troposfera, mas também não se pode considerá-la como de menor
expressão plani-altimétrica, haja vista seus dois picos acima dos 1000m, altitude superior a muitas
áreas da Serra do Mar. Por conta disso, observamos que a ilha interfere, mas não necessariamente
altera as características dessas massas de ar.
A evidente disponibilidade de umidade e de núcleos higroscópicos para a atmosfera está garantida
devido à oceanidade e à cobertura vegetal (Mata Atlântica). A ilha e seu barlavento destacam-se de sua
região por incrementar os potenciais de condensação e saturação locais. As vertentes voltadas para o
oceano estão sujeitas a um foto período maior e pressupõem mais insolação recebida que a vertente
oposta, o que pode ativar movimentos convectivos localizados, assim como os fluxos das brisas pelos
vales da vertente oceânica da ilha. No momento da transposição da linha de cumeeira, quando o ar
marítimo está alterando suas características originais (resfriamento adiabático) gera acúmulo de
nebulosidade nas porções mais altas da Estrada de Castelhanos. Acreditamos que esses elementos são
importantes na consideração da gênese de uma chuva orográfica e que todos os mecanismos propostos
por Smith (1979) ocorram na área de estudo.
Ainda, o relevo da ilha não chega a remover a umidade presente numa massa de ar, mesmo assim,
recebem mais chuvas a barlavento do que as áreas circundantes a sotavento, o que demonstra o
fenômeno da sombra de chuva.
Conclusões
Os resultados apontam para a ocorrência da chuva orográfica e da sombra de chuva devido à existência
das vertentes opostas. A redistribuição da chuva, em função do relevo, e do aumento dos valores, por
conta da altitude são espacializados quando se observam os diferentes valores encontrados: a
barlavento da ilha (vertente voltada para o oceano) os valores de chuva são incrementados em 20%
quando comparados com aqueles encontrados a sotavento.
Em altitudes superiores a 300 m, choveu em torno de 44% do total coletado, suplantando aqueles de
altitudes menores. O posto p7 foi aquele que apresentou alturas de chuva superiores em todos os meses
e a todos os outros postos e deteve a maior porcentagem de chuva (24,5 %), possivelmente devido a
influência da altitude na geração das chuvas orográficas.
O posto p1 foi o único que apresentou valores inferiores aos da PCD Caraguatatuba configurando o
efeito de sombra de chuva devido a seu sítio de instalação: a sotavento, na transição da planície para a
vertente, bem abrigado dos fluxos de ar.
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