1 unesp UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA FACULDADE DE ENGENHARIA DE ILHA SOLTEIRA DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA MECÂNICA TRANSFERÊNCIA DE CALOR E MASSA POR CONVECÇÃO Prof. Dr. João Batista Campos Silva Ilha Solteira, agosto de 2009 2 _____________________________________________RESUMO Este material foi escrito para servir de apoio aos alunos da disciplina: Transferência de Calor e Massa II (TCMII), do Curso de Engenharia Mecânica da UNESP-Ilha Solteira. O conteúdo de TCMII corresponde ao transporte convectivo de calor e massa. Aqui são apresentados os conceitos fundamentais de convecção e maneiras de se determinar o coeficiente de transferência convectiva de calor e massa. São abordados casos de convecção externa em superfícies planas e rombudas, convecção em escoamentos internos, convecção natural, convecção com mudança de fase e transferência de massa incluindo também difusão. Durante o curso são realizados alguns experimentos em laboratório com a finalidade de medir o coeficiente de transferência de calor, verificar a conservação de energia e analisar processos de convecção natural. 3 Transferência de Calor e Massa por Convecção 0. Introdução Neste tópico apresenta-se uma breve descrição, importância e alguns exemplos de aplicações de transferência de calor e massa. 0.1 Importância de Transferência de Calor (Energia) e Massa A Civilização Moderna depende fortemente de como ela manuseia e usa sua energia, energia esta suprida através de recursos naturais, nem sempre fáceis de serem explorados. O uso de energia pode ser identificado como trabalho, potência e calor, mas na realidade o trabalho e potência que são usados finalmente degeneram em calor. Calor é a troca de energia entre objetos (sistemas) “quentes” e “frios” e a troca ocorre espontaneamente do “quente” para o “frio” (Transferência) de Calor é a ciência que explica e prediz quão rápida ocorre a troca de energia como calor. É a ciência que integra as várias ferramentas analíticas e empíricas provendo um fórum, um corpo de conhecimento, para projetistas, construtores, operadores, gerentes e pesquisadores de forma mais acurada estudar calor como uma troca de energia. A preocupação com energia, sua conservação ou economia pela sociedade requer numa extensão importante a compreensão dos conceitos de transferência de calor e transferência de massa. Alguns casos de aplicação de transferência de calor: - isolamento (por fibra de vidro) de tetos e paredes de edifícios para manter determinadas condições climáticas; - quantificação da perda de energia através de janelas modernas e isoladas para manter o ambiente confortável tanto no inverno quanto no verão; - projeto e operação de geradores de vapor (caldeiras) ou ebulidores requer a compreensão da transferência de calor que ocorre da queima (combustão) de carvão, gás ou óleo para a água nos tubos; 4 - projeto e construção de um radiador (convector) para um motor de automóvel para mantê-lo “frio” quando em operação envolve transferência de calor e massa; - dissipação de calor em linhas de potência elétrica devido à resistência elétrica; - proteção de cabos elétricos contra fogo e altas temperaturas; - manutenção de temperaturas adequadas em circuitos de computadores e outros sistemas; - condicionamento de ar para conforto térmico; - processos sanitários, manuseio de lixo, esterilização; - manuseio e processamento de alimentos. Transferência de massa é o estudo do movimento de massa de um local para outro através do uso de dispositivos mecânicos ou naturalmente devido a diferença de densidade. A diferença de densidade provoca difusão (transporte microscópico) de massa (uma espécie penetra em outra) ou convecção natural (transporte macroscópico) de massa. Os dispositivos mecânicos (bombas, ventiladores e compressores) provocam difusão e convecção forçada de massa. Exemplos onde ocorre transferência de massa: - processos químicos; - poluição do ar; - combustão; - processos criogênicos (baixas temperaturas) tais com produção de N2, H2 e O2 líquidos, gelo seco (CO2 líquido) 0.2 Conceitos 0.2.1 Sistema Físico Um sistema físico pode ser considerado com sendo constituído de um sistema material (subsistema 1) mais um campo de radiação (subsistema 2). O sistema material, geralmente, considerado como meio contínuo, é composto em nível elementar de moléculas (incluindo íons e átomos), de elétrons e de partículas fictícias tais como fónons (quanta de energia vibracional num sólido), etc. Um meio pode ser considerado como contínuo quando o menor elemento de volume ainda contém de 1015 a 1020 moléculas. Sob determinadas condições físicas, tais elementos podem ser caracterizados estatisticamente por propriedades físicas 5 macroscópicas médias sobre todas as moléculas que eles contêm (massa média, velocidade, pressão ou temperatura). O campo de radiação eletromagnética é caracterizado em escala macroscópica G pela definição em cada ponto r do espaço e para cada direção Δ de uma quantidade Iν′ , a intensidade monocromática relacionada com a freqüência ν . O campo de radiação resulta da distribuição de fótons (quanta de energia particular de Bose-Einstein que em G repouso possuem massa nula) cada caracterizado pela freqüência ν , momentum p e spin s. Um quantum tem energia e = hν , onde h = 6,626 x10−34 Js é a constante de Planck. 0.2.2 Equilíbrio Termodinâmico Em termodinâmica, o conceito de equilíbrio termodinâmico perfeito envolve equilíbrio térmico (T uniforme), equilíbrio mecânico (p uniforme) e equilíbrio químico (potencial químico μ uniforme) e é utilizado para equacionamento dos problemas. O equilíbrio térmico significa que o sistema material é isotérmico a temperatura T; o campo de radiação tem uma distribuição uniforme dependente apenas de T; o campo de radiação e sistema material estão na mesma temperatura. Entretanto, para ocorrer transferência de calor, os sistemas devem estar em não equilíbrio térmico. 0.2.3 Equilíbrio Termodinâmico Local O não equilíbrio térmico causa a transferência de calor devido colisões entre moléculas ou entre moléculas e uma parede; interações moléculas/fótons (absorção, emissão espontânea, emissão estimulada); interações entre fónons, entre fónons e elétrons, elétrons e fótons, outras interações. Como as leis da termodinâmica são utilizadas para equacionar problemas de transferência, tem-se que lançar mão do conceito de equilíbrio termodinâmico local (LTE). A hipótese de equilíbrio termodinâmico local permite definir variáveis físicas G G G G T (r , t ), p(r , t ), μ (r , t ) , etc. em qualquer instante de tempo e para cada ponto r . Sob esta hipótese, pode-se assumir que durante um intervalo dt e em um elemento de volume arbitrariamente pequeno (mas macroscópico, contínuo) o sistema material está 6 localmente infinitamente próximo a um estado de equilíbrio, descrito por propriedades intensivas e extensivas. Em LTE adotado para estudo de problemas de transferência de calor o sistema físico é o local dos seguintes processos macroscópicos irreversíveis com os quais um fluxo está associado: - relativo a um elemento de matéria, o efeito cumulativo em escala macroscópica do transporte de várias quantidades físicas (carga elétrica, no de um dado tipo, energia) por partículas (moléculas, elétrons, fónons, etc) traduz para fluxos por difusão: condução elétrica, difusão de uma espécie em outra, condução térmica; - simultaneamente associado com cada transferência macroscópica por um movimento global de parte do sistema material estão associados fluxos macroscópicos de carga elétrica, energia, etc. Estes são chamados fenômenos convectivos: convecção elétrica, convecção térmica, etc.; - interações entre moléculas do sistema material e os fótons do campo de radiação, quando eles não estão em equilíbrio térmico resulta num fluxo macroscópico de energia na forma de radiação. 0.2.4 Meio Contínuo Em teoria cinética dos gases o conceito de meio contínuo é apresentado através da seguinte definição de temperatura: 3 Nk B T = 2 N ∑ s =1 mv s2 2 (0.1) na qual N é o no de átomos idênticos de massa m cada em equilíbrio térmico num elemento de volume dV ( N ≈ 1015 − 10 20 ) o meio é considerado contínuo; k B = 1,38054 x10 −23 J / K é a constante de Boltzmann e v s é velocidade de um átomo em relação a dV. 7 0.3 Modos Principais de Transferência de Energia Os modos principais de transferência de energia na forma de calor são condução, convecção e radiação. A condução térmica ocorre através de um elemento material no qual existe um gradiente de temperatura. Ela representa o efeito global do transporte de energia por portadores elementares (moléculas, fónons, elétrons, etc). Em fluidos os portadores elementares (moléculas, átomos, íons, etc.) são caracterizados por energia de translação, possivelmente vibração e rotação, energia eletrônica. Em sólidos os átomos são arranjados em uma estrutura cristalina mais ou menos perfeita. Os vetores de energia são fónons (quanta de vibração da estrutura cristalina) e talvez elétrons livres (condução elétrica e térmica). Em radiação, energia é permanentemente trocada entre um sistema material e um campo de radiação pelos seguintes processos: - emissão espontânea de radiação que consiste na conversão de energia térmica (energia de vibração ou rotação, energia eletrônica, energia de fónons, etc. para uma energia radiativa (de fótons); - absorção de radiação pela conversão inversa de energia radiativa para energia térmica. Sob o ponto de vista de radiação, pode-se definir três tipos de meio: - meio transparente como aquele que não emite, não absorve, não reflete ou difunde, mas transmite toda radiação incidente qualquer que seja sua direção e freqüência; - meio opaco que não transmite qualquer radiação incidente (Ii) que pode ser absorvida (Ia) ou refletida (Ir). O meio opaco também pode emitir a radiação (Ie); - meio semi-transparente que reflete, absorve ou difunde a radiação incidente, ou transmite ela em distâncias finitas. 8 Figura 0.1 Radiação em meios transparente e opaco Os modos de transferência de energia por condução e radiação foram objeto de estudo da parte I deste curso. O modo de transferência de energia apor convecção será o objeto de estudo do presente curso e será abordado ao longo do mesmo. 0.4 Objetivos e Convenções O objetivo principal é determinar para qualquer sistema em LTE, a evolução do G campo de temperatura T (r , t ) e o fluxo de energia (para todas as formas de energia) que é necessário para controlar o processo. Um processo será em regime transiente (RT) se as quantidades físicas A (escalares, vetores, tensores) dependem do tempo, isto é, G ∂A(r , t ) ≠0 ∂t (0.2) Para processos em regime permanente (RP), não há variação das grandezas físicas com o tempo. Ou seja, G ∂A(r , t ) =0 ∂t (0.3) 9 Define-se fluxo de energia como a potência dΦ (em Watts) atravessando um G G elemento de superfície dS , cuja normal é n e cujo vetor densidade de fluxo é q [W/m2]. Numericamente, G G dΦ = q • n dS . (0.4) Define-se a densidade de fluxo [W/m2] como G G q ′′ = q • n . (0.5) . (0.6) ou q ′′ = dΦ dS G Figura 0.2 Vetor densidade de fluxo através de um elemento dS com normal n . Nos processos de condução térmica, define-se o vetor densidade de fluxo condutivo, pela Lei de Fourier, como G G q cd = −k∇T , (0.7) na qual k é denominada condutividade térmica do material que pode depender da GG G G temperatura e da direção espacial (caso em que k é um tensor e q cd = −k • ∇T ). O 10 sinal negativo na Lei de Fourier é requerido pela 2a Lei da Termodinâmica. O fluxo condutivo pode, então, ser calculado na forma G G G G ∂T q ′′ = q cd • n = −k∇T • n = −k ∂n , (0.8) para q ′′ no sentido da normal ao contorno. Compare a Lei de Fourier com as leis de Ohm e Fick. A Lei de Ohm estabelece G que o vetor densidade de corrente j é dado na forma: G G G j = σE = −σ∇Vel , (0.9) G na qual E é o campo elétrico, σ é a condutividade elétrica e Vel é o potencial elétrico. G Já a Lei de Fick de difusão de massa, estabelece que a taxa de difusão jα de uma espécie α numa espécie β é definida pela equação G G jα = − Dαβ ∇Cα , (0.10) na qual Dαβ é a difusividade de α em β e Cα é a concentração molar definida por Cα = ρ nα M n , onde ρ é a massa específica da mistura e M é o peso molecular da mistura. (0.11)