UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ CURSO NORMAL SUPERIOR – EAD CAPACITAÇÃO DE TUTORES 12/08/2006 DISCIPLINA SOCIOLOGIA DA EDUCAÇÃO I Livro 9 Sociologia da Educação: Múltiplos olhares Professoras Responsáveis Profa. Débora Giselli Bernardo [email protected] Profa. Regina Maria Zanatta [email protected] Profa. Tatyana Murer Cavalcante [email protected] Obs: este roteiro – um resumo - foi elaborado para facilitar a apresentação na capacitação. O trabalho com o mesmo não substitui a leitura dos capítulos do livro 9. 1. TRANSFORMAÇÕES NA SOCIEDADE CAPITALISTA E O SURGIMENTO DA SOCIOLOGIA O contexto histórico As transformações ocorridas na Europa, desde o século XVI, tomaram um grande impulso no século XVIII atingindo o sistema capitalista; • este período foi chamado por Marx como a primeira grande crise do Capital; Fenômenos que expressavam a necessidade da reorganização do sistema capitalista: • forte expansão demográfica e deslocamento da massa populacional para os centros urbanos em busca de trabalho; • formação de um contingente de desempregados (mão de obra barata para os burgueses capitalistas e deteriorização da condição de vida dos trabalhadores); • nova dinâmica no modo de produção com a utilização do maquinário industrial; • organização da produção pela divisão do trabalho; • envolvimento do mercado mundial; • mecanismos novos para o escoamento da produção (navio a vapor e utilização das ferrovias); • desigualdade social. Este período é caracterizado por muitos historiadores como Revolução Industrial (1770-1870). Foi, também, diante destes fenômenos que se deu a Revolução Francesa, uma reação da burguesia e do povo contra os privilégios da 2 aristocracia e que desencadeou forte repercussão política por toda a Europa propagando as idéias socialistas. O movimento político social, deflagrado diante da crise do sistema, denuncia a necessidade de um novo pensar sobre a sociedade e sobre o seu próprio sistema de produção. O surgimento da Sociologia É diante deste contexto que a Sociologia desponta como uma nova ciência para estudar os fenômenos e fatos sociais e explicar as transformações que vinham acontecendo. A Sociologia nasceu sob a esteira das transformações que o sistema capitalista vinha sofrendo, culminado pela Revolução Industrial e pela Revolução Francesa. Estas transformações impulsionam os homens para uma reflexão sobre a sociedade, sobre as mudanças, os problemas e as contradições sociais. A designação de Sociologia foi dada por Comte na obra intitulada Cours de Philosophie Positive. As primeiras expressões do pensamento sociológico se projetam: • pela crítica da secularização de atitudes e modos de compreender a natureza humana e da origem e fundamento das instituições; • pela necessidade da instituição de um processo de racionalização que projeta para a esfera da ação 3 coletiva a ambição de conhecer, explicar e dirigir os acontecimentos e a vida social. Representante do pensamento sociológico: August Comte (1798 – 1857) • frente aos problemas da sociedade (desorganização social) propõe o estabelecimento de uma nova ordem social para a superação da crise social; • uma forma de progresso simultânea ao desenvolvimento natural da sociedade; • a tarefa da Sociologia era de encontrar caminhos para a reconstrução e o progresso das formas e estruturas sociais. O papel do sociólogo: • identifica os fatos, analisa, procura compreender e os explica (cientista social) por meio de uma interpretação imparcial. Objeto da Sociologia • envolve todas as atividades humanas e suas relações sociais. • Durkheim explica que a proporção dos ramos da Sociologia se faz pela variedade dos fatos sociais A divisão da sociologia: • Sociologia Geral; • Sociologia econômica; 4 • Sociologia política; • Sociologia industrial; • Sociologia da linguagem; • Sociologia da Educação e outras. A sociologia da Educação: Dewey • Primeiro pensador que menciona a relação entre escola e sociedade; • propunha que o papel da escola e da Igreja deveria ser o de incutir na criança a consciência sobre a sociedade que crescia ao seu redor para que pudesse dela participar (pensamento democrático); • concebia a escola como uma comunidade em miniatura que refletia a sociedade mais ampla; • manifestava que o ambiente familiar o meio ambiente deveriam se explicitar no processo educacional. Durkheim (1858 – 1917) 1) Considerava a sociedade como um todo e cada milieu social particular determina o ideal que a educação realiza; 2) a sociedade só sobrevive quando existe um certo grau de homogeneidade entre os homens; 3) a educação perpetua e reforça essa homogeneidade ao fixar na criança as semelhanças essenciais que a 5 vida coletiva exige mas assegura, também, a necessária diversidade; 4) não existe um tipo ideal de educação mas uma educação própria às exigências de cada sociedade; 5) cada sociedade determina o tipo de educação necessária à sua existência e manutenção; 6) a educação deve corresponder às transformações ocorridas na sociedade. Mannheim (1893 – 1947). • Compreendia a educação como um dos elementos dinâmicos da Sociologia; • a educação era, em si mesma, uma técnica social e um meio de controle social. • percebeu que a abordagem sociológica dos problemas educacionais era um meio de ajudar a estabelecer, para a própria educação, um conteúdo e um método; Origem e desenvolvimento da Sociologia da Educação • inicialmente chamada de Sociologia Educacional (ênfase seria nas questões educacionais e sociais, aplicação de princípios da Sociologia aos processos de educação); • Sociologia da sociológicos Educação envolvidos no (ênfase interior nos problemas da instituição educacional); 6 • Fundamentos Sociais da Educação (campo de estudo que inclui História, Filosofia e Sociologia da Educação e Educação Comparada). A disciplina A Sociologia da Educação é uma disciplina com que se preocupam tanto os sociólogos da educação quanto os pedagogos: tanto uns como outros têm valiosas contribuições a oferecer. Discussões atuais sobre a Sociologia da Educação. Dermeval Saviani, Pablo Gentili, José Carlos Libâneo, Moacir Gadotti, Gaudêncio Frigotto esclarecem que esta área de conhecimento procura tratar das relações entre escola e sociedade de forma crítica, analisando as causas e as conseqüências da interferência de questões sociais no cenário educacional. Diferente da concepção defendida por Durkheim (a escola era uma forma de reproduzir a sociedade), estes autores propõem o desenvolvimento crítico dos professores e alunos para a compreensão das transformações sociais e a busca de caminhos que superem a reprodução. Conteúdos da Sociologia da Educação. • Interesses por conceitos como: sociedade, cultura, comunidade, classe, meio ambiente, socialização, 7 interiorização, acomodação, assimilação, defasagem cultural, status etc.; • estudos, como: o efeito da economia sobre o tipo de educação ofertada pelo Estado; as forças e determinantes sociais que influenciam as mudanças educacionais e culturais; as instituições sociais envolvidas no processo educacional, como a família, a escola e a igreja; os problemas de desestruturação social que contribuem para o desenvolvimento de problemas educacionais; democratização e elitismo educacional; as relações entre classe social, cultura e linguagem, e entre educação e ocupação; • temas que implicam a relação entre escola, educação e sociedade. 8 2. AUGUSTE COMTE (1798-1857): SOCIOLOGIA E EDUCAÇÃO POSITIVISTA. O período O sistema capitalista vinha se transformando desde o século XVI, com o ressurgimento do racionalismo, a revolução científica e tecnológica e a revolução das idéias culminando, no século XVIII com a necessidade da sua reestruturação; as transformações descortinavam um novo conteúdo para a sociedade e instituía novos significados; O pensamento sócio-político Compreender a natureza do agir político, a essência política da realidade concreta; discutir sobre a existência e o momento, o homem e a realidade (formaram os pilares do pensamento de Comte, determinando seu método e estilo); reavaliar as instituições do Estado Liberal e tudo o que a ele estava relacionado; as idéias absolutistas, liberais e socialistas disputavam espaço e aceitação. O objetivo Indagar a essência (não o porquê das coisas) pelas leis e pelas relações existentes entre os fenômenos; observar os mecanismos que regem o mundo. Influência de pensadores nas idéias de Comte 9 Fundava-se nas concepções de pensadores, “ideólogos” iluministas, dos teóricos da economia política, dos filósofos e historiadores como Turgot (1723-1789) (a obra Plano de Dois Discursos sobre a Historia (1751) que focalizava a lei dos três estados: o estudo do progresso humano e o exame das causas que contribuíram para tal progresso) e Condorcet (1743-1794) (Esboço de um Quadro Histórico dos Progressos do Espírito Humano (1794) que abordava o desenvolvimento da humanidade pelos descobrimentos e inventos da ciência e da tecnologia, levando o homem a alcançar um estágio em que a organização social e política seria produto das luzes da razão); influência e identificação do pensamento com o de Saint-Simon que afirmava a chegada de uma nova ordem social, em todo o Ocidente, em substituição ao catolicismo feudal e apontava que a indústria capitalista e a ciência substituiriam a guerra e a Teologia. A reorganização da sociedade acabaria com os padres, com os nobres e com os soldados, fazendo surgir em seu lugar engenheiros, chefes industriais, capitalistas e operários. Os capitais seriam utilizados para cultivar a terra, fabricar, expandir o comércio e, principalmente, fazer surgir e manter os cientistas e artistas, por meio da indústria capitalista que seria guiada pela ciência. A motivação de Comte 10 Inspirava-se no ambiente de lutas entre o proletariado e a burguesia, designando-o como um estado de “anarquia” e de “desordem”, um caos social em que a sociedade européia mergulhava. As idéias religiosas não exerciam mais força na conduta dos homens e não serviam mais de parâmetros para a reorganização da nova sociedade. As idéias iluministas somente levavam à desunião entre os homens e à desintegração social. A filosofia tendo perdido a independência reduzia-se a uma disciplina auxiliar da ciência e restringia-se aos métodos e aos resultados. Idéias políticas de Comte: Unir a política com a ciência como instrumento de neutralização das contradições; tornar científico o estudo da política, torná-la ciência racional e estabelecer a influência da ciência sobre os estadistas, guiados pelo empirismo vulgar (Separação geral entre Opiniões e Desejos (1817)); focalizar a história como caminho para conhecer o passado, dirigir o presente e oferecer processos superiores aos práticos da política; analisar o curso histórico da humanidade, interpretá-lo como uma evolução natural e harmônica revelando à indústria o seu poder e o seu futuro, tal como Saint-Simon fizera com a origem da indústria e dos seus agentes (manufatura, comerciantes, banqueiros), partindo do período moderno; 11 adotar uma nova forma de poder, baseado na capacidade científica e industrial, para substituir o antigo poder medieval, de caráter espiritual-teológico e temporalmilitar (indústria, capital e trabalho), seguindo o pensamento de Turgot e Condorcet (Sumaria Apreciação do Conjunto do Passado Moderno (1820)); Idéias sociais: a Sociologia Curso de Filosofia Positiva (1830) obra em que menciona a Sociologia pela primeira vez. No prefácio do último volume (seis) revela que havia chegado o tempo de os biólogos e sociólogos ocuparem o posto principal do mundo intelectual; após 1846 Comte desenvolve um programa de reforma social e propõe uma nova religião, Religião da Humanidade proclamando-se sumo sacerdote; focado na coesão e no equilíbrio entre os homens desejava restabelecer a ordem nas idéias e nos conhecimentos e criar um conjunto de crenças comuns a todos os homens (proposta religiosa); afirmava que o Positivismo (posição contrária aos iluministas que expressavam certo negativismo diante da sociedade) deveria generalizar a ciência real e sistematizar o estado social começando a reorganização social pelos proletários e pelas mulheres, sabedores de uma forma muito particular e eficaz de imposição sobre as demais classes (Sistema de Política Positiva -1851); 12 contrário aos partidos: conservador e socialista, no movimento dos proletários (1848) descreve outro partido unindo os fundamentos destes; entendendo que a reorganização da sociedade exigia a elaboração de uma nova maneira de conhecer a realidade, estabeleceu princípios de orientação do conhecimento humano e defendeu que uma verdadeira filosofia poderia se posicionar diante da realidade de forma “positiva”. Objetivo realizar uma reforma espiritual capaz de reorganizar a sociedade e a política por meio do “espírito positivo”; opunha-se, desta forma, à filosofia iluminista “negativa”, que contestava as instituições sociais. A sociologia sociologia e positivismo aparecem estritamente ligados; a criação da sociologia como ciência marcaria o triunfo final do positivismo no pensamento humano; o advento da sociologia representava o ponto alto da evolução do conhecimento cientifico que se iniciou com a matemática, a astronomia, a física, a química e a biologia, sucessivamente; faltava fundar uma “física social”; a sociologia deveria seguir os mesmos procedimentos das ciências naturais em suas investigações: a observação, a experimentação, a comparação, e assim por diante. 13 o papel da sociologia dedicar-se à busca dos acontecimentos constantes e repetitivos da sociedade, ou seja, as leis que a regiam. Princípios da filosofia comtiana Estrutura-se em três temas básicos: na filosofia da história pautada na lei dos três estados, mostrando as razões porque a concepção positiva da história poderia imperar (organizada com base na lógica formal, predominância do pensamento comum); na fundamentação e na classificação das ciências, observando-se a periodização da evolução de cada ciência com base na lei dos três estados; na sociologia que determinaria a estrutura e os processos de modificação da sociedade até a reforma prática institucional, vista como o “fim essencial de toda a filosofia positiva”. Estes princípios resultaram dos estudos sobre o desenvolvimento da inteligência humana, dos primórdios até o seu tempo. Pretendia descobrir a lei fundamental que regia a inteligência humana e como as ciências e o espírito humano se desenvolveram por meio de três fases distintas (do estado teológico e metafísico até ao estado positivo). No estado teológico, a imaginação desempenha um papel primordial. O homem, diante da natureza, só consegue explicá-la mediante a crença na intervenção de 14 agentes sobrenaturais: deuses e espíritos explicam as anomalias aparentes do universo. No estado metafísico a idéia de “força”: força física, força química, força vital, explica os fenômenos em substituição às divindades. A idéia de força está alicerçada na natureza, que corresponde à idéia de Deus único. Procura soluções absolutas para a explicação da natureza como faz a teologia. A diferença está na substituição do concreto pelo abstrato e a argumentação toma o lugar da imaginação. No estado positivo encontra-se a preocupação de descobrir, por meio da razão e da observação, as leis efetivas, as relações invariáveis similitude. Neste estado últimos das causas e de sucessão e de renuncia-se a busca dos fins os “porquês”. Daí partiria a organização das ciências como investigação do real, do certo incontestável, do precisamente determinado. Nos domínios do social e do político, marcaria a passagem do poder espiritual para as mãos dos sábios e cientistas e do poder material para o controle dos industriais. O desenvolvimento da Sociologia representaria o ápice do conhecimento humano e formularia um sistema filosófico que reestruturaria e manteria a sociedade com base na ordem e no progresso. Propiciaria a harmonia entre as idéias de existência e as idéias de movimento, à correlação permanente das idéias de organização com as 15 idéias de vida e a correlação entre as idéias de ordem e as de progresso. A Sociologia adquiriu amplo sentido vinculando-se a outras ciências: à psicologia, à economia política, à ética e à filosofia da história. Ordem social e progresso Ordem social denominada de estática social, responsável pela preservação dos elementos permanentes da organização social, das instituições que mantêm a coesão e garantem o funcionamento da sociedade (família, religião, propriedade, linguagem, direito), é o mais importante; o progresso, é o desenvolvimento da sociedade, denominado de dinâmica social, representa a passagem para formas mais complexas de existência, como a industrialização; o progresso aperfeiçoa os elementos da ordem sem destruí-la; sociedade burguesa industrial deveria ser defendida em seu próprio interior; O Positivismo buscava justificar por meio de um método cientifico adequado, os padrões burgueses industriais de organização social e resolver os conflitos sociais por meio da exaltação à coesão, à harmonia natural entre os indivíduos e a um suposto bem estar do todo social. 16 A desordem social As idéias governam e subvertem o mundo; os mecanismos sociais se assentam em opiniões; a situação social reflete a desordem das inteligências apoiadas em três filosofias incompatíveis: a filosofia teológica, a metafísica e a positiva. A solução sobreposição da filosofia positiva às demais filosofias. O papel da Sociologia na Educação Preocupação com os “fins sociais” da educação e a necessidade de se preparar a criança para a vida na sociedade burguesa; relaciona o bem-estar social à estabilidade, ao progresso e à capacidade de transformação sem revolução; O objetivo Formar o cidadão para viver harmoniosamente em sociedade; enobrecer a obediência e consolidar o comando. O papel da educação diante da sociedade a educação como caminho para acabar com a crise política e moral da sociedade capitalista, a reforma moral pela qual deveria passar a sociedade européia de sua época só seria alcançada por meio de uma reforma no sistema de ensino; propunha a reforma da sociedade e a reforma geral do sistema de educação; 17 ampliação populares e do sistema atingir um para atender conteúdo geral as massas nos seus descendentes, contribuindo para o progresso social; alcançar as diferentes classes sociais: do proletariado aos detentores do capital. Divisão da Educação Espontânea: educação física, moral e estética; ocorre nos primeiros meses de vida e acontece na família, com a direção da mãe. Educação afetiva, na qual a educação física da cultura dos sentidos deve prevalecer. O aspecto intelectual é essencialmente para representar o mundo exterior no cérebro. Na educação moral, a criança deveria desenvolver o instinto de conservação. A educação estética se faria pela sistematização de uma série gradual de estudos regulares: leitura, escrita, canto, desenho e línguas; sistemática, educação intelectual. Inicia na adolescência instituindo-se a lógica universal do ensino abstrato com as leis científicas. Procura desenvolver a razão abstrata, ou seja, sistematizar os conhecimentos já adquiridos, incluir o estudo das leis naturais que regem a natureza e o homem, instruir para a vida ativa com inclusão da aprendizagem de um oficio e preparar para um trabalho na sociedade. Assim, o adolescente seria instruído a se conhecer, a conhecer sua personalidade e sua função no organismo social. Para essa fase seria fundamental a existência de um sistema de educação pública, universal, 18 que atendesse às necessidades do mundo moderno. A sistematização da educação deveria seguir a mesma ordem de classificação das ciências positivas, que qualifica a ordem universal, partindo da mais simples para mais complexa. Todos deveriam concluir a educação geral, cujo objetivo era completar a ordem interior estabelecida pela educação afetiva e estética e culminar com a aquisição do conhecimento da ordem exterior, ou seja, das leis naturais. A educação, em seu conjunto, deveria ao final determinar convicções fixas e comuns, tendendo para a ordem moral. O aperfeiçoamento dos estudos deveria ser realizado nos locais de trabalho por meio de cursos de especialização. As universidades não seriam para todos, serviria como complemento do ensino integral. Educação da mulher A mulher como principal motor educacional da nova ordem: “a principal força da mulher consiste em superar a dificuldade de obedecer”; o pilar sobre o qual se fundaria a nova ordem social, o Estado Positivo. educá-la segundo os preceitos da boa moral positiva; a mulher proletária seria o alvo da pedagogia comteana. A burguesia e o proletariado visão otimista da sociedade industrial; admitia os conflitos existentes entre a burguesia e o proletariado; 19 a burguesia poderia atenuar os conflitos por meio de medidas repressivas ou da elaboração de novas normas que orientassem a conduta individual; combinação entre as classes; a melhoria de vida dos trabalhadores deveria ser de responsabilidade da elite industrial e dos cientistas, a reforma moral asseguraria a ordem social; a ordem transformação social do seria alcançada proletariado em por meio da “cidadãos” e “funcionários sociais”, sua utilidade estaria na atividade prática, essencial para o progresso capitalista. a conciliação entre as classes, o aperfeiçoamento moral e a conquista do conhecimento só seriam alcançados pela intervenção da sociedade na vida do individuo, pela influência da vida coletiva na individual, de forma a educar a conduta individual para subordinar o egoísmo ao altruísmo, para “viver para outrem”; a harmonia social é o fim último do Positivismo, conquistada por meio de um “sentimento” de solidariedade que objetivaria a ordem e o progresso e alcançada pela formação integral do homem, cultivando sua aptidão para viver em solidariedade com os demais cidadãos, aparente igualação atendia aos interesses da burguesia; o povo não poderia dispensar a sua participação na ordem moral, embora o pudesse na ordem política. Questões para reflexão: 20 • De que maneira você considera que o pensamento positivista influencia na educação na atualidade? • Qual deve ser o papel do professor para superar o positivismo na sala de aula? 21 3. HERBERT SPENCER E O DARWINISMO SOCIAL Herbert Spencer (1820-1903), filósofo e sociólogo da Inglaterra; Positivista e fundador da filosofia evolucionista; seus escritos estavam voltados para a biologia, a política, a economia e a sociedade. construiu uma teoria baseada no darwinismo social e pelas idéias de progresso e positivismo de August Comte (1798-1857). Idéias de Darwin (1809-1882) Origem do homem sob o olhar científico, descendência da humanidade; explica a evolução do homem pela seleção natural, como ocorreu com os outros seres vivos; o homem, independentemente de sua vontade, passou por modificações em seu aspecto físico e mental; as espécies mais fortes prevaleceram, pela adaptação e reprodução; no homem, o desenvolvimento da inteligência foi um dos fatores que possibilitaram sua sobrevivência, favorecendo a sua defesa dos animais mais fortes e distinção entre os alimentos que eram comestíveis ou não. O darwinismo social Teoria de grande influência no pensamento europeu do século XIX até o final da Segunda Guerra Mundial; os cientistas positivistas ajustaram as perspectivas organicistas e evolucionistas de Darwin, até então aplicada 22 à Biologia, tornando-as um meio de estudo da sociedade e fundaram o darwinismo social; fundamentou-se na crença de que as sociedades mudariam, evoluiriam, no sentido da passagem de um nível menos elevado, simples, para um nível superior. as sociedades estariam sujeitas à lei da seleção natural, como ocorria com o desenvolvimento biológico do homem; as sociedades mais fortes, mais capazes prevaleceriam; as menos fortes se extinguiriam por meio de lutas e pela dificuldade em superar os obstáculos impostos pela natureza; essa concepção respaldou as forma de dominação européia sobre outras sociedades, a colonização; justificou os diferentes sistemas sociais impostos pelo capitalismo, as desigualdades sociais, as teses de eugenia (campo da ciência que estuda as condições mais propícias à reprodução e ao melhoramento genético da espécie humana) e as doutrinas raciais difundidas pelo mundo. Os princípios teóricos de Spencer o determinismo poderia ser utilizado para elucidar a natureza e a moralidade humana; considerava o mundo como um sistema de relações entre meios e fins, no qual o homem e a sociedade possuíam um início, que seria a sua formação, e um fim, que seria, nesse caso, o progresso final, momento em que 23 homem e a sociedade sobrevivente chegariam à “perfeição”, à “civilização, à “plena felicidade”; o homem sofria modificações em sua natureza adaptando-o à condição social; adquiriria a liberdade por meio do progresso; o mal desapareceria naturalmente e o homem alcançaria a plena felicidade com a ajuda da ciência; o homem que melhor se adaptasse ao mundo em que vivia seria valorizado como “o homem civilizado” (europeu), em detrimento dos “não civilizados”(costumes rústicos, primitivos) aqueles que não haviam “evoluído”. Os civilizados estariam adiantados na marcha progressiva do homogêneo para o heterogêneo. A sociedade e os seus princípios Assemelha-se a um organismo biológico vivo, suas partes desempenham funções definidas para funcionamento do todo; o processo de conhecimento acompanha a complexidade da estrutura social com divisões internas e interdependentes; a religião torna-se também complexa, à medida que há a separação entre o civil e o religioso, entre o rei e o clero; o rei adota a divisão administrativa; o clero hierarquiza sua organização eclesiástica; 24 a massa social divide-se em classes: umas mais privilegiadas, outras menos; uns governantes, outros governados; a língua se multiplica, as palavras evoluem do oral para o escrito; as artes passam da pintura para a escultura e à arquitetura; a poesia, para a música até chegar na dança. estes fenômenos têm o seu momento de fragmentação até se constituir uma parte. formula a lei da evolução: tanto a sociedade como o organismo biológico, passam de um estágio primitivo, caracterizado pela simplicidade de estrutura e pela homogeneidade, para estágios de crescente complexidade, marcados por uma progressiva heterogeneidade das partes. Os estágios apresentam novas maneiras de integração e revelam um momento em que a sociedade atingiria um nível elevado de civilização. a história das sociedades demonstra a progressiva diferenciação pela qual passaram; pequenas coletividades, sem organização política e com reduzida divisão de trabalho, se transformaram em sociedades grupos complexas, diferentes e heterogêneas, numerosos, com compostas uma por política organizada e diferenciada e com uma multiplicidade de funções econômicas e sociais, o que exigia uma crescente divisão do trabalho. 25 o progresso diversificada satisfação social produção das consistiria dos necessidades objetos na maior e mais imprescindíveis humanas, na à segurança pessoal e da propriedade, como também na crescente e ampla liberdade de ação do indivíduo. semelhantemente aos organismos vivos, as civilizações possuíam os seus próprios ciclos de vida; a Biologia e a Ciência Social seriam os instrumentos básicos para explicar esses ciclos tanto na escala biológica quanto na social. Idéias positivistas de Spencer a ciência é o instrumento imprescindível para a explicação de tudo o que há no Universo; tomou a ciência como um dogma atingindo sua concepção de educação e o seu modelo de indivíduo; justificou a importância do estudo da ciência em favor de uma disciplina mental e da fundamentação de uma moral laica; o trabalho científico proporcionaria ao indivíduo um conjunto de valores semelhantes aos da moral cristã, como: dedicação, perseverança, sinceridade, honestidade intelectual etc. criticou o ensino clássico defendendo os conhecimentos úteis na formação do homem de negócios que poderiam produzir o bem-estar individual (De l’éducation intellectuelle, morale et physique (1878)) 26 as escolas deveriam adotar conteúdos científicos, desde os primeiros estágios da educação infantil; o ensino das ciências permitiria a realização de atividades que possibilitariam ao indivíduo e à sociedade alcançar o grau da civilização, patrocinariam o bom êxito das atividades industriais e dariam subsídios a uma disciplina intelectual e moral; a ciência, como disciplina intelectual, exercitaria a memória e desenvolveria o juízo do indivíduo; a disciplina moral apelaria para a razão, dando-lhe liberdade de análise; a ciência propiciaria o desenvolvimento de um caráter independente facilitando a formulação de conclusões individuais e próprias e a formação de um indivíduo capaz de liderar e não de ser liderado. O Estado e a educação Posicionou-se contra a interferência do Estado na educação da população e defendeu a implementação de estudos úteis e práticos; o Estado deveria assumir o menor número de tarefas dentro da sociedade; os males naturais seriam corrigidos por meio da adaptação do indivíduo; a função do Estado era de manter a ordem e defender os direitos naturais dos homens e suas correspondentes propriedades; a finalidade da educação seria a de formar homens aptos para governar a si mesmos e não para serem 27 governados por outros e pelo Estado. Tem como perspectiva que primeiro o homem evoluiu, para depois criar o Estado; assim ele não é fruto do Estado, e sim o Estado é que é fruto do homem; A educação spenceriana os problemas existentes na sociedade originavam-se dos próprios indivíduos e que não conseguiam se adaptar, por isso era necessário consertar o indivíduo por meio de sua correção moral (incumbência da escola); a escola por meio do ensino das ciências despertaria o indivíduo para a moral; O Estado, conceder excluído escolas desse públicas, processo, obrigatórias e deixaria gratuitas de à população; a educação seria regulada pelas leis do mercado; o determinismo social spenceriano faria dos indivíduos mais aptos, os mais privilegiados financeiramente, mais prósperos por meio da educação, em detrimento de indivíduos inferiores, entendidos como a população mais pobre que não tinha condições financeiras para estudar. concebe o processo educativo como gradativo e paralelo ao ritmo das competências e habilidades do educando; somando-se à cultura acumulada pelas gerações anteriores, que se encontra depositada no cérebro do educando, o processo educativo tem a finalidade de desenvolver as habilidades natas; 28 o conhecimento promove a permanência e a disposição de prudência e possibilita a integração do indivíduo no Estado, sociedade e família; o conhecimento mais útil é o científico é o que promove a autopreservação da espécie humana e sua continuidade; a vida coletiva, nacional e artística depende da aquisição do conhecimento científico elevando o nível intelectual, moral e até religioso do homem; todo o processo educativo, que visa formar o homem civilizado, é dependente da ciência. aprendizagem deve se desenvolver de acordo com o grau de evolução da ciência, partindo dos conhecimentos mais simples e homogêneos para os mais compostos e heterogêneos, do menos conhecido para o certo, do concreto para o abstrato; o procedimento educacional deve recolocar o educando nos caminhos que a própria humanidade trilhou em seu processo de evolução; A contemporaneidade do pensamento de Spencer o mercado como grande regulador social; o Estado como mantenedor de políticas públicas que visam não a igualdade mas a eqüidade; o Estado, atendendo a normas impostas pelos organismos internacionais (FMI, BIRD e Banco Mundial) sacrifica as políticas de atendimento ás áreas sociais mais necessitadas. 29 4. ÉMILE DURKHEIM E SUA INFLUÊNCIA NA EDUCAÇÃO Aparecida Meire Calegari-Falco Claudinéia Justino Franchetti * Importância do autor para a consolidação da Sociologia como disciplina científica: - ocupou a primeira cátedra de Sociologia criada na França; - fundou a Escola Sociológica Francesa, ao reunir um grupo de cientistas voltados para a análise da sociedade; * Foi bastante influenciado pelo contexto histórico (viveu entre 1858-1917), discutido anteriormente; tal influência se deixa transparecer nos temas de seus estudos. Definição de Sociologia, para Durkheim: “[...] ciência das instituições, tanto de sua gênese como de seu funcionamento.” (CALEGARI-FALCO; FRANCHETTI, p. 44). Objeto próprio da Sociologia, para Durkheim: os fatos sociais; Fatos Sociais: são “[...] as maneiras de agir, de pensar e de sentir exteriores ao indivíduo, dotadas de um poder de coerção em virtude do qual se lhe impõem.” (DURKHEIM apud CALEGARI-FALCO; FRANCHETTI, p. 44). Desse modo, são fatos sociais, por exemplo: as regras jurídicas, morais e religiosas, a moda, a língua, as taxas de casamento, 30 mortalidade e natalidade (no sentido de que exprimem um determinado estado da alma coletiva), dentre outros. EXEMPLO: o idioma; não somos obrigados a nos comunicar em português, mas desde cedo aprendemos que, se não o fizermos, não teremos sucesso nas relações sociais (poder coercitivo). Nesse sentido, toda atitude individual tem algo de social, pois reproduz, de certo modo, o modelo coletivo no qual estamos inseridos. Daí, apreendemos que Durkheim explica a sociedade através do aspecto coletivo, e não do aspecto individual. Método próprio da Sociologia, para Durkheim: 1) considerar os fatos sociais como “coisas” exteriores aos indivíduos, afinal eles não são um produto da nossa vontade, mas sim “[...] moldes de acordo com os quais somos obrigados a formar nossas ações”. (CALEGARIFALCO; FRANCHETTI, p. 46). 2) buscar a objetividade científica, destituindo-se de subjetividade (paixões) e pré-conceitos; * Para a análise dos fatos sociais, Durkheim considera indispensáveis os seguintes conceitos: 31 - consciência coletiva: encontra-se na sociedade, e não no indivíduo; é formada pelo conjunto de crenças e valores partilhados por uma mesma sociedade; “Apesar de todos os indivíduos possuírem ‘consciências individuais’, suas formas de se comportar e de observar a vida, seguem formas padronizadas de conduta e pensamento no interior de qualquer grupo ou sociedade [...]”. (CALEGARI- FALCO;FRANCHETTI, p. 46). A sociedade, no pensamento de Durkheim, prepondera sobre os indivíduos, e a coesão entre eles só é alcançada através da solidariedade, que pode ser mecânica ou orgânica. - solidariedade mecânica: ocorre em sociedades primitivas, nas quais ainda não ocorreu a divisão econômica do trabalho e ainda não surgiu a propriedade privada; nesse tipo de sociedade, a consciência dos indivíduos é semelhante, e a solidariedade ocorre por conta dessa semelhança compartilhada; - solidariedade orgânica: caracteriza as sociedades modernas (divisão do trabalho e propriedade privada); a complexidade desenvolvimento dessas das sociedades possibilita individualidades, no maior entanto, a solidariedade entre eles não é menor, pois todos fazem parte de um mesmo “corpo”, sendo interdependentes (os 32 indivíduos são como órgãos que, com suas funções distintas, precisam funcionar em harmonia para o bem do corpo). Continuando a comparação da sociedade com o organismo vivo, Durkheim considera que existem: - fatos sociais normais: são todos aqueles que estão disseminados na sociedade e nela desempenham função importante; EX.: o crime é um fato social normal na medida em que serve para enfatizar condutas que devem (ou não) serem seguidas. - fatos sociais patológicos: são todos aqueles que fogem ao controle da sociedade; EX.: o crime é um fato social patológico na medida em que ocorre em um nível acima do aceito socialmente, gerando uma situação de caos e ausência de controle. As paixões individuais devem ser contidas para que não venham a abalar o equilíbrio do coletivo. Para tanto, Durkheim propunha as - regras morais: implicam a noção de dever para com os outros; pressupõem que os indivíduos não nortearão suas atitudes pelos impulsos egoístas, mas sim pela noção de solidariedade. 33 DURKHEIM E A EDUCAÇÃO * Função social da Educação Segundo Calegari-Falco e Franchetti, em Durkheim a educação “[...] é fundamental para manter a coesão social, na medida em que, desde criança, o ser humano adquire os hábitos que são comuns na sociedade. [...] Pela educação, para que possa crescer em sociedade, os fatos exteriores ao indivíduo precisam ser internalizados por ele desde a infância, ou seja, a educação serve para socializar a criança.” (p. 51). Para Durkheim, existem 2 indivíduos em cada ser humano: o ser individual e o ser social. O primeiro é composto pela personalidade, pelos estados mentais particulares; o segundo, é formado por idéias, hábitos e valores socialmente construídos e introjetados. A Educação deve voltar-se à construção do SER SOCIAL, ou seja, em síntese: “[...] o homem que a educação deve realizar, em cada um de nós, não é o homem que a natureza fez, mas o homem que a sociedade quer que ele seja; [...]”. (DURKHEIM apud CALEGARI-FALCO; FRANCHETTI, p. 52). 34 5. KARL MARX: EDUCAÇÃO E TRABALHO Éder Fernando dos Santos Edna A. Ferreira Benedicto * Marx (1818-1883) foi um grande (senão o mais importante) pensador do século XIX; fundador de um método de análise da história humana (materialismo histórico e dialético) que inspiraria, em sua época e posteriormente, inúmeras ações políticas de cunho revolucionário; * A importância de estudar o seu pensamento, no âmbito da Sociologia, reside justamente no fato de ele ter criado uma explicação para o desenvolvimento da sociedade ao longo da História (modos de produção). Objetivo do estudo da sociedade, para Marx: dominar a teoria para dirigir a prática (contexto em que escreve é revolucionário); “[...] o conhecimento da realidade social deve se converter em um instrumento revolucionário, capaz de orientar os grupos e as classes sociais para a transformação da sociedade.” (SANTOS; BENEDICTO, p. 60). * A sociedade para a qual Marx se volta, em suas análises, é a capitalista; 35 * Diferentemente de Durkheim, Marx não via na divisão do trabalho no sistema capitalista uma forma de solidariedade entre os homens, e sim uma das formas pelas quais se realizava a exploração de uma classe (proletariado) pela outra (burguesia) e, consequentemente, se criavam antagonismos insuperáveis. * EXEMPLO DE ANTAGONISMO NA SOCIEDADE CAPITALISTA: o avanço da tecnologia permitiu aos homens o domínio da natureza, gerando enriquecimento de alguns (burguesia) e empobrecimento de muitos (proletariado); logo, os empobrecidos tendem a lutar para transformar tal realidade (luta de classes); * Na análise sociológica de Marx, o proletariado aparece, então, como sujeito histórico responsável pela superação do capitalismo; * Como mencionamos, o socialismo científico (nome dado à teoria desenvolvida por Marx e Engels), veio a servir de instrumento de luta para a classe operária no século XIX e posteriormente. Desse modo, “[...] cumpriu o papel de demonstrar e desvendar a essência das relações capitalistas, analisando os seus aspectos fundamentais sempre na direção superadora” (SANTOS; BENEDICTO, p. 62). 36 Trabalho e Conhecimento em Marx * O trabalho ocupa posição central nas obras de Karl Marx. É através do trabalho (produção material), segundo esse autor, que o homem faz o intercâmbio com a natureza e com os outros homens (relações sociais de produção). É a forma de organização do trabalho pelo homem que determina o tipo de organização da sociedade (modos de produção). * Na sociedade capitalista, que Marx busca entender, a propriedade privada dos meios de produção fez surgir a seguinte divisão do trabalho: trabalho manual e trabalho intelectual. Essa divisão se consubstancia no ato de “isolar os responsáveis pela concepção e criação daqueles que simplesmente executam o trabalho. [...] O operário perde a relação existente entre conhecimento e trabalho. A esse processo de separação entre pensar e executar, somado à apropriação dos resultados dos trabalhos por outro que não o trabalhador [mais-valia], Marx chamou de alienação.” (p.65). * TRÊS TIPOS DE ALIENAÇÃO - da natureza: o homem se “coisifica” ao transformar sua força de trabalho em mercadoria e ao desconhecer o produto de seu próprio trabalho (afinal, é através de sua 37 produção material que ele conhece e se relaciona com o mundo e com os homens). - de si mesmo: o trabalho deixa de ter a finalidade do conhecimento e da relação com o mundo, e passa a ser um sofrimento imposto como meio de sobrevivência. - da espécie: o trabalho deixa de ser um vínculo do homem com a humanidade, passando a ser um meio individual de garantir a própria sobrevivência. * Segundo Marx, as instituições sociais (família, escola, leis, meios de comunicação, etc.) estão impregnadas pela ideologia capitalista, acentuando a alienação; * A EDUCAÇÃO, do modo como está organizada na sociedade capitalista, serve, segundo Marx, “[...] como um elemento de hegemonia manutenção ideológica da da hierarquia burguesia”. social e da (SANTOS; BENEDICTO, p. 66). PROPOSTA DE MARX PARA A EDUCAÇÃO * Embora não tenha escrito muito sobre o assunto, Marx apresentava uma concepção de educação, que transpareceu em algumas de suas obras. Para esse autor, uma das formas de emancipar o ser humano e livrá-lo da 38 alienação, seria integrar ensino e trabalho _ o que ele chamou de ensino politécnico ou formação omnilateral. Tal ensino se constituiria em: 1) instrução intelectual; 2) educação física; 3) treinamento tecnológico, que transmita os fundamentos científicos gerais de todos os processos de produção (observar o contexto). * “O processo de ensino e aprendizagem começaria na infância, tendo por base que a educação é para todos e gratuita. Portanto, o ensino intelectual (cultura geral), o desenvolvimento físico (ginástica e esporte) e o aprendizado profissional polivalente (técnico e científico) comporiam o novo ensino formal que contribuiria para a construção de um mundo não mais mediado pela propriedade privada.” (SANTOS; BENEDICTO, p. 67). * Nesse sentido, a educação tem, em Marx, um grande potencial transformador, desde que ela abandone a formação unilateral e alienante proposta pela burguesia e adote o caráter totalizante produzido pela união entre conhecimento e trabalho (trabalho intelectual e trabalho manual). 39 6. MAX WEBER E A ÉTICA PROTESTANTE Ana Lúcia Sales de Lima Aparecida Meire Calegari-Falco * Max Weber (1864-1920): grande pensador alemão, que colaborou para o desenvolvimento da Sociologia moderna. Sua formação intelectual ocorreu no período em que as disputas sobre a metodologia das Ciências Sociais começavam a surgir na Europa, sobretudo na Alemanha. CARACTERÍSTICAS DO PENSAMENTO DE WEBER * Contexto: viveu no período da Unificação Alemã (que se deu oficialmente em 1871) e vivenciou, portanto, as dificuldades e crises desse processo (heterogeneidade das opiniões políticas, de dialetos, de religiões nos 36 Estados). Vivenciou, também, a época de auge da Alemanha, que durou da década de 1880 a 1914, quando se inicia a 1º Guerra Mundial. Foi um momento de crescimento econômico, industrial e tecnológico e, conseqüentemente, também de intenções imperialistas. * A obra que as autoras se propõem a analisar, “A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo”, seria, segundo elas, uma tentativa de Weber de entender as origens desse capitalismo agressivo de início do século XX; Em tempo: Weber vinha de uma família protestante; 40 ALGUMAS CARACTERÍSTICAS GERAIS DO PENSAMENTO DE WEBER * Ao contrário de Durkheim, Weber centrava sua análise no indivíduo, e não na coletividade; considerava que a prática científica poderia levar ao desenvolvimento da racionalidade; Também diferentemente de Durkheim, não considerava a Sociologia como ciência, no sentido de que o sociólogo manifestaria apenas uma explicação conceitual, e não um retrato fiel do fato estudado; * Em relação a Marx, Weber não rejeitou o materialismo histórico; no entanto, embora não negasse o papel das lutas de classes no desenrolar da história da sociedade, ele considerava outros elementos importantes para a transformação social. ANÁLISE DE A ÉTICA PROTESTANTE E O ESPÍRITO DO CAPITALISMO, SEGUNDO LIMA E CALEGARI-FALCO * Weber se propõe a estudar as origens do capitalismo do século XVI. Segundo o autor, a ânsia pela riqueza já existia nas sociedades antes do capitalismo, mas o espírito capitalista (valorização do trabalho, prática de virtudes como: pontualidade, honestidade, sobriedade, 41 etc) teria surgido no contexto do desenvolvimento das religiões protestantes no século XVI. * Qual seria a relação entre esse “espírito capitalista” e as religiões protestantes? Bem, Weber destaca que, antes da Reforma Protestante, a Igreja Católica detinha o monopólio religioso e moral no Ocidente, e que nessa religião o lucro (a usura, por exemplo) era condenado. (TRADICIONALISMO). Com o surgimento das novas religiões cristãs, uma nova moral se estabelece entre seus seguidores, e nela temos a valorização do trabalho secular, dos lucros alcançados com tal trabalho, e da idéia de vocação. * VOCAÇÃO: é através do cumprimento de tarefas aqui na terra que o homem glorifica a Deus, portanto a tendência humana ao trabalho é uma vocação divina, que deve ser seguida. * Teria sido, então, a partir da difusão dessa nova moral, que o espírito capitalista teria encontrado brecha para se desenvolver, derrotando o seu inimigo: o tradicionalismo. * Lima e Calegari-Falco observam que em Martinho Lutero, primeiro grande expoente da Reforma Protestante, a idéia de vocação existe, mas há a 42 condenação do lucro. Foi apenas com a difusão da doutrina calvinista (elaborada por João Calvino) que o espírito capitalista conseguiu se desenvolver. * Preceitos religiosos do Calvinismo: - proibição do culto aos santos e imagens; - combate à autoridade do Papa; - o trabalho como forma de “amor ao próximo”; - apenas 2 sacramentos: batismo e eucaristia; - princípio da predestinação, segundo o qual os homens já nascem predestinados ou não à salvação, sendo que o acúmulo de riquezas por meio de trabalho honesto seria um dos sinais dos “eleitos de Deus”; * No entanto, segundo ressaltam as autoras, embora o acúmulo de bens não fosse condenado pelos calvinistas, o uso indevido da riqueza era considerado um pecado. “Sua aquisição é má somente quando é feita com o propósito de uma vida posterior feliz e sem preocupações. Mas, como o empreendimento de um dever vocacional, ela não é apenas moralmente permissível, como diretamente recomendada” (WEBER apud LIMA; CALEGARI-FALCO, p. 77); * Desse modo, as autoras ressaltam que não devemos afirmar que a ética protestante criou o capitalismo, mas 43 sim que ela abriu possibilidades para que o espírito do capitalismo se manifestasse; 44 7. O TRABALHO NA SOCIEDADE CAPITALISTA Aparecida Meire Calegari-Falco. Claudinéa Justino Franchetti. Trabalho: no dicionário etimológico, vem da palavra trepalium Tripalium: instrumento feito de três paus aguçados, às vezes com pontas de ferro, usado para bater o trigo. Na maior parte dos dicionários, liga-se ao verbo tripare (torturar). Segundo as autoras, para Marx “o trabalho é resultante do dispêndio de energia física e mental, direta ou indiretamente direcionado à produção de bens e serviços, que contribui para a reprodução da vida humana individual e social” (CALEGARI-FALCO; FRANCHETTI, 2005, p.81). Hannah Arendt distingue labor de trabalho: enquanto labor corresponde a atividade biológica; trabalho ao artificialismo da existência humana. Historicamente, trabalho assume conceitos e importâncias distintas. Hoje, fruto da modernidade, de concepções que emergem no processo de Revolução Industrial, está no centro da vida individual e social. Na Antiguidade Grega era visto de forma negativa (dedicação ao ócio intelectual). Só faziam parte da polis (vida pública) aqueles que estivessem livres do trabalho. O trabalho era fator de inferiorização. 45 Ex. Aristóteles: dois elementos fundantes: corpo e alma (a alma deveria governar). Na Idade Média destacam-se os pensamentos de Santo Agostinho (séc.V) e Santo Tomás de Aquino (séc.XIII). Para as autoras: Estes filósofos traduziam o credo cristão por meio das referências aos filósofos gregos Platão e Aristóteles, os quais influenciavam suas reflexões sobre o homem. Com isso, o trabalho era pensado de forma semelhante, mas com algumas alterações, pois, para Santo Tomás de Aquino, o trabalho era árduo, embora não deixasse de ser um bem. O labor acentuava, sobretudo, a pena física e moral, sendo uma conseqüência do pecado original, ou também, uma oferenda a Deus de todo o esforço humano (Idem, p.82-83). Na transição do feudalismo ao capitalismo (até a Rev. Industrial), ganha força a classe burguesa: a partir do século XV, um amplo movimento (filosófico, científico, artístico-cultural) lança bases para uma concepção positiva de trabalho. No âmbito religioso, a Reforma Protestante contribui: o trabalho era a melhor forma de servir a Deus. No âmbito tecnológico: passagem do sistema de produção agrário/artesanal para industrial (do Renascimento ao Séc. XVIII). O trabalho, no contexto da Revolução Industrial, adquire caráter glorioso na vida humana. - John Locke (1632-1704): trabalho é fonte de toda propriedade; ele cria um novo objeto; é fonte de valor; engaja o físico e o moral. 46 - Adam Smith (1723-1790): retoma as idéias de Locke; afirma que só o trabalho produz riqueza. Rompendo com o mercantilismo (política econômica que guiava o comércio, regulado pelo Estado), esclarece que a “riqueza das nações se originava do trabalho dos indivíduos” (Idem, p.84). São John Locke e Adam Smith que desfazem a imagem negativa do trabalho como patrimônio da pobreza, como fardo exclusivo dos que não possuem propriedade, e o definem como fonte de toda a atividade criadora de riqueza (BRESCIANI, 1994, p. 80, Apud CALEGARI-FALCO; FRANCHETTI, 2005, p. 80). - Karl Marx foi além ao elaborar a teoria da mais valia: valorizou o caráter social do trabalho, “soou o primeiro alarme de alerta em meio a toda a glorificação do trabalho” (Idem, trabalhador no p. 85). modo de Encontrou produção a alienação capitalista, do ligado estritamente à propriedade privada. Evidenciou o fetichismo da mercadoria. Entendendo o trabalho como um processo entre homem e natureza, afirmou que o trabalhador assalariado aliena-se da sua relação com a natureza; torna-se objeto e produto do seu trabalho, distanciando-se da ligação entre natureza e trabalho. Para Marx, no capitalismo, o trabalho converte-se num meio de vida, ligando-se estritamente à sobrevivência: “Ao alienar-se de atividades capazes de humanizá-lo, ele aliena a si próprio” (p. 85, grifos nossos). Por fim, aliena-se de sua espécie: o trabalho, vendido como mercadoria, afasta o homem dos vínculos que o unem a sua espécie. A tese do 47 trabalho-valor exprime a idéia de que o capital nada mais é do que a mais-valia capitalizada (mais-valia corresponde ao excedente de horas do trabalho operário). Para as autoras, o trabalho, envolto pelo capitalismo, torna o homem cada vez mais alienado, gerando conseqüências cruéis ao trabalhador. - Georg W. Friedrich Hegel (1770-1831), contribuição no âmbito filosófico: define o trabalho como ação específica do homem, diferenciando-o do animal. É fundamental ao processo de aquisição da consciência de si mesmo: “Em sua concepção, por meio do trabalho, os homens conseguem ser livres e conscientes de si” (idem, p.86). Passagem do Capitalismo Concorrencial ao Capitalismo Monopolista (final do séc. XIX): surgem os grandes bancos, que, através de empréstimos passam a controlar indústria, comércio, agricultura e pecuária; formam-se poderosas empresas internacionais. É elementar aplicação de novos conhecimentos científicos e tecnológicos, automatização e informatização, bem como de novos modelos de gestão, organização do trabalho para aumento de produtividade e disciplinarização do operariado. Destacam-se Frederick Winslow Taylor (1856-1915) e Henry Ford (1886-1947). - Taylor: produtividade e método evitar científico perda de para tempo aumentar a (taylorismo). Baseia-se em: 1. planejamento das tarefas de execução: 48 “operários com iniciativa e afeitos ao trabalho intelectual são excluídos das oficinas e levados com exclusividade à administração superior (Idem, p.87). 2. divisão do trabalho intensificada pelo estudo dos tempos e movimentos, decompondo o trabalho em parcelas elementares. 3. Controle de tempos e movimentos dos operários. Somamse estímulo por empenho individual e estratificação da estrutura de produção. Para as autoras, o taylorismo expandiu-se extensivamente entre o final da 1ª Guerra Mundial e o final da década de 70. Foi muito criticado por humanistas e Marxistas. - Henry Ford: avançou nas idéias tayloristas. Introduziu as linhas de montagem: as esteiras ditam o ritmo do trabalho. Após a 2ª Guerra Mundial, emerge um novo conjunto de técnicas de gerenciamento. O principal desenvolvedor foi Taiichi Ohno (112-1990), da Toyota. - Toyotismo: a proposta é enxugar a produção, na qual a automatização é a chave. Um trabalhador passa a ser responsável por várias máquinas, diminuindo a quantidade de trabalhadores. Outro aspecto diz respeito à produção para venda efetiva (de acordo com a demanda do mercado e enxugando os estoques). A multifuncionalização da mão-de-obra é fundamental: o trabalhador precisa ser polivalente, dominar todo o processo de produção. É também importante o trabalho em equipe, sob a orientação 49 de um líder, que trabalha junto com os demais coordenando e substituindo qualquer membro faltante: “Quanto às relações entre capital e trabalho estabelecidas nesse sistema, o centro é a cooperação” (p. 89). As autoras lembram que o avanço da sociedade capitalista coloca cada vez mais o trabalho no centro da sociedade: “como motor da sociedade, como base da dignidade, satisfação e liberdade humana, como possibilidade de ascensão social” (p. 85). PARTICIPAR DO MUNDO DO TRABALHO É A GARANTIA DA CIDADANIA. Estar excluído dele é estar a margem da sociedade. Lembram também a importância do relógio regulando o ritmo de vida. No século XIX, propagandeia-se o uso econômico do tempo aos trabalhadores. A crescente utilização das máquinas, associada a utilização do trabalho feminino e infantil (crescimento da oferta de trabalhadores) contribui para a desvalorização do trabalho humano. Contemporaneidade: globalização, neoliberalismo, avanço tecnológico indissociação das (principalmente ciências aos informatização), processos produtivos, substituição da mão-de-obra humana pela robótica. Um mundo em constante mutação que exige aprendizado constante. - desemprego estrutural: atinge tanto países desenvolvidos quanto subdesenvolvidos. Fragmentação da classe trabalhadora. Mercado formal e informal. Caráter 50 destrutivo das transformações nas últimas décadas: subemprego, deteriorização da relação entre o homem e a natureza. No mundo atual, com os Programas de Qualidade Total, só estão aptos indivíduos capazes de: - aprender constantemente; - trabalhar em equipe; - ter visão geral; As conseqüências englobam: detrimento da reflexão e distanciamento da solidariedade. O trabalho ocupa o centro da vida das pessoas, depois vêm a família e os amigos. A preocupação constante é o desemprego. “Hoje, alguns estudos já veiculam a idéia de que caminhamos para uma sociedade sem trabalho” (Idem, p.91). As autoras afirmam que para Jeremy Rifkin “estamos presenciando uma Terceira Revolução Industrial, que traz em seu bojo elevados cortes da força de trabalho humana, com a redução e a eliminação de funções e categorias inteiras de trabalho” (p. 91). A cada dia os trabalhadores se tornam menos necessários. Além de substituir a fora física humana, a tecnologia promete também substituir a mente humana. Segundo as autoras, a reengenharia do ambiente de trabalho, com a ajuda do computador, reduzem categorias de cargos. As equipes dinamizam o trabalho, conseguindo resultados surpreendentes. A Inteligência Artificial tende a tornar irrelevante o trabalho do administrador. Citam 51 novamente Rifkin, para quem a redução da carga de trabalho poderia libertar as pessoas das longas jornadas, tornando-as livres para o lazer. Entretanto, poderia causar uma depressão econômica global, uma vez que sem trabalhadores não há consumidores. Em síntese, é perceptível que o trabalho, num primeiro momento, foi visto com preconceito. À medida que emergiam as estruturas capitalistas ele passou a ser positivado no interior das sociedades, especialmente as da Europa e depois em quase todo o mundo. O próprio trabalho do homem criou máquinas cada vez mais eficazes em relação à produtividade, as quais substituíam, de forma crescente, o trabalho humano. Hoje nos deparamos com um avanço tecnológico impressionante a ponto de parecer trilhar seu destino independente da grande maioria dos homens, os quais, por sua vez, ficam subtraídos de um prego bem remunerado, que lhes forneceria direitos e principalmente estabilidade (CALEGARI-FALCO; FRANCHETTI, 2005, p.92). 52 8. EDUCAÇÃO E TRABALHO NO BRASIL Maria Estela Gozzi Camillo. Sheila Cristina Pedroso. A educação básica na Colônia A retrospectiva história é importante para compreender as medidas governamentais para a educação nas últimas décadas. Privilegiam as principais características econômicas que impulsionam a educação nos três períodos (nos modelos: agro-exportador; de substituição das importações; de internacionalização do mercado interno, resultou na globalização). Colônia 1549: início da educação sistematizada, com a chegada de quatro padres e dois jesuítas (vieram com o 1º governador geral, Tomé de Souza). Vinculada a política de colonização, cujo sucesso dependia da aculturação do índio. Os jesuítas dedicaram-se à catequeses e à instrução do gentio. Os objetivos, pautados em valores morais e espirituais da civilização ocidental, visavam o lucro de exploração da mão-de-obra. Missões ou Reduções: regime político autoritário e econômico comunitário. Conservava-se a língua indígena, mas explorava-se racionalmente o trabalho. Colonização: Obrigatória para a produção de Mercadorias (povoamento e cultivo da terra). Escravidão 53 (indígena e negra): necessária. Função da população colonial: propiciar lucros à metrópole. Até o século XVII, prevaleceu a produção açucareira (monocultura latifundiária). A força de trabalho era quase exclusivamente composta de escravos de origem africana. Não havia função de reprodução da força de trabalho a ser produzida pela escola. A educação escolarizada só era conveniente à camada dirigente. As escolas dos jesuítas preenchiam as necessidades, tanto na colônia, quando na metrópole. A Igreja Católica assumia a hegemonia da sociedade civil e, de certa forma, na própria sociedade política, “por meio de uma arma pacífica: a educação” (CAMILLO; PEDROSO, 2005, p.97). Os jesuítas administram o sistema educacional brasileiro até meados do séc. XVIII. Marques de Pompal expulsou os jesuítas de Portugal e seus domínios (1759), desmontando seu sistema educacional. “As reformas pombalinas constituíram uma violenta e sistemática reação jesuíta” (p.97). Como Portugal se distanciava das novas idéias econômicas e culturais européias, fizeram dos jesuítas os responsáveis por seus males. A proposta de Pompal quer recuperar a economia, a partir da concentração do poder real e da modernização da cultura. Suas realizações não tiveram longo alcance. Portugal foi se tornando dependência agrícola da Inglaterra. Para as autoras, modifica-se, no Período Pombalino, apenas o foco de erradicação de influência européia, e também que “Desde a expulsão dos 54 Jesuítas até a vinda da Corte portuguesa para o Brasil, a educação da Colônia passou por um período de segregação e decadência” (p.98). A educação básica no Império - 1808: vinda da família real. Tomam-se medidas para prover defesa militar do Reino: criação da Academia da Marinha (1808) e Academia Militar (1810). Cria-se cursos de Cirurgia, Anatomia e outras organizações superiores. A instrução elementar não recebe cuidados. -1822: independência. Uma nova política de instrução popular começa. Constituição de 1824: garantia da criação de colégios, universidades e promessa de instrução primária gratuita. 1827: lei que dispunha sobre a escola primária (fixava o currículo e instituía ensino primário para o sexo feminino). Apesar da abertura de algumas escolas, o quadro da instrução pública não teve alteração significativa. Descentralizada à partir de 1835, as províncias ficaram desamparadas financeiramente e pouco fizeram pela instrução popular. As autoras lembram que o modelo econômico agroexportador (extremamente vulnerável), implantado na Colônia, persistiu até a crise do café, em 1929. Também afirmam que, apesar da expulsão dos jesuítas, a Igreja preservou sua força sobre a sociedade civil, tanto no Império, como na 1º República: ela continuou a controlar as instituições de ensino. A força de trabalho foi apenas 55 parcialmente substituída pelos imigrantes, permanecendo a mesma estrutura social e a não-necessidade de se qualificar o trabalho do imigrante pela escola. Persistiu a dependência econômica em relação à Inglaterra. Mas o novo contexto trouxe a necessidade de formação de quadros técnicos e administrativos. A independência cria a necessidade de fortalecimento da sociedade política (surgimento de escolas militares superiores), entretanto, as instituições de ensino não confessionais se restringem, apenas, à reprodução dos quadros das camadas dirigentes. Muitas iniciativas jurídicas não passam de letra morta: A situação deplorável das poucas escolas destinadas a formar professores existentes no País acabou por levar ao descrédito a própria instituição. Couto Ferraz, o ministro que reformou em meados da década de 50 todo o ensino na Corte e a instrução superior no Império, não cuidou da criação de uma Escola Normal na capital do País. Considerando o baixo nível do ensino normal provincial e atribuindo tal resultado à inexistência de pessoal devidamente capacitado para manter estabelecimentos dessa natureza, preferiu formar em exercício, sob a supervisão de mestres experientes, o professorado para as escolas elementares da Corte. Somente em 1880 teria a capital do Império sua primeira escola normal mantida e administrada pelos poderes públicos (HAIDAR, 1999, p. 67-68, Apud CAMILLO; PEDROSO, 2005, p. 101). República A educação na Primeira República - 1889 – queda da monarquia; 1991 – primeira constituição republicana 56 República Velha ou Oligárquica (governo de poucos) - fortalecimento de instituições da sociedade política: importância dos aparelhos jurídicos e repressivos do Estado, mediadores do processo econômico. Limitava-se praticamente à produção de café para o mercado externo, articulando interesses de cafeicultores e o mercado. Incentivava a imigração para atender às demandas de trabalho nas lavouras. Lenta mudança no modelo após a 1ª Guerra Mundial: nascimento da industrialização, início da nacionalização da economia, nascimento da burguesia industrial urbana. Organização de sindicatos, sob a influência anarquista. Muitas greves e protestos, bem como revoltas tenentistas. O Estado encarrega-se de amenizar perdas econômicas durante a crise de superprodução cafeeira (início da década de 20). Conseqüência: aumento ilimitado da dívida externa. Crise mundial de 1929: encaminha mudanças estruturais que caracterizam o modelo de substituição de importações. A baixa nos preços do café leva a necessidade de investimento de capitais em outros setores. A substituição produz uma diversificação na produção, reativa o poder econômico dos cafeicultores e fortalece outros grupos econômicos (burguesia urbano-industrial). Essas mudanças reestruturam o poder estatal (sociedades política e civil). Reorganizam-se os aparelhos repressivos do Estado. 57 -1930: Vargas assume o poder, auxiliado por grupos militares e pela classe burguesa. Implanta o Estado Novo em 1937, subordinando a sociedade civil à política. Durante a República Velha poucos foram os avanços no setor educacional, muito restrito à divulgação dos princípios e ideais da escola renovada. Somente em 1930 cria-se o Ministério da Educação e da Saúde. A Igreja Católica também se posicionava contra os ideais positivistas manifestados no governo republicano (separação dos poderes e laicização do ensino). “Os anos 20 caracterizaram-se pelo movimento de valorização do ensino e pela influência das novas idéias provenientes da Europa e dos EUA” (p. 103). O período, conhecido como “entusiasmo educacional”, via a educação como área técnica que merecia consideração. A progressiva centralização política repercutiu também na educação. A educação básica após 1930 Intensa atividade do Estado nas instâncias da superestrutura: - criação do Ministério da Educação e Saúde; - fundação das primeiras universidades; - elaboração de um Plano Nacional de educação: implantação da gratuidade e obrigatoriedade da educação primária, tornou-se facultativo o ensino religioso (muitas elaborações foram absorvidas pela constituição de 1937). 58 - sistema educacional pensado para atender às mudanças macro-estruturais (na infra-estrutura e nas instâncias de profissionalizante poder). (para Introduz-se classes menos o ensino privilegiadas); obriga indústrias a criarem escolas na área de sua especialização para filhos de seus empregados; tornam-se obrigatórias as disciplinas de Educação Moral e Política da Constituição. - mudança de modelo: conscientização da importância do sistema educacional para assegurar e consolidar mudanças em andamento. Política do Estado Novo: transformar o sistema educacional em um instrumento eficaz de manipulação das classes subalternas. Mutações na infra-estrutura (diversificação da produção) abrem o acesso ao sistema educacional: exigência diversificação de de mão-de-obra. maior O qualificação Estado atende e aos interesses privados. As escolas técnicas tornam-se a única via de ascensão permitida ao operário. De nível médio, o ensino técnico não habilitava para o nível superior, criando uma dualidade no sistema educacional: produz e reproduz a mão-de-obra qualificada, garantindo a consolidação da reprodução de classes. - a economia de substituição de importações (1930), fortalecida pela conjuntura internacional pós 2ª Guerra, desloca o centro das decisões de fora para dentro do país 59 (mercado consumidor e desenvolvimento da indústria nacional). Entre 1945 e o início dos anos 60: aceleração e diversificação do processo de substituição de importações. Nível político: estado populista-desenvolvimentista. Momento de euforia econômica. Investimento estrangeiro é bem vindo. Ao final desse período, o conflito latente aflora. Política educacional: reflete ambivalência dos grupos do poder. A constituição de 1946 prevê a necessidade da elaboração de novas leis. As autoras apresentam a tramitação dos projetos de lei (o primeiro, em 1948) que expressam a disputa dos diferentes grupos para a educação brasileira. O texto definitivo da LDB só é sancionado em 1961 (15 anos depois da constituição!). Segundo as autoras, aa Lei 4.024, expressa um compromisso entre duas tendências: prevê ensino público e particular e é omissa quando à gratuidade do ensino. Não deixa de ter caráter eletista: quebra a dualidade do ensino, mas instala a barreira, assegurando ao setor privado a continuidade e controle do ensino médio. Afirmam que essa lei já estava ultrapassada quando entrou em vigor. E, de fato, passa a materializar-se no ensino na década seguinte. - golpe militar de 1964: destrói o estado de direito. Desnacionaliza a economia. Novas exigências são postas à educação, tornando necessário alterar a legislação. Revogou-se a anterior através das leis 5.540/68 (reforma universitária) e 5.692/71 (ensinos primário e médio). Os dois projetos foram apreciados em regime de urgência e 60 mudaram substancialmente o ensino. Ao detalhá-los, as autoras inferem que refletem o contexto político: passam pelo crivo dos interesses do grupo militar-tecnocrático, excluindo professores e demais representantes do debate: deveriam apenas seguir. Não tardam as críticas (entre o final da década de 70 e o início dos anos 80). Nesse período, enfraquecimento. o Segue regime um militar lento dá sinais processo de de democratização (sociedade política e civil). Reavivam-se as mobilizações, o debate pedagógico é reavivado. - 1988: nova constituição. Não se afasta muito da divisão de competências proposta pela Constituição de 1934, entretanto, reconhece e admite a competência dos Sistemas Municipais de ensino. A nova LDB, lei 9.394, só foi aprovada em 1996: Esta lei não significa somente avanços para os sistemas educacionais, mas também retrocessos. O que não deixa dúvida é que a luta democrática continua; cabe a nós, educadores, conhecer a lei que temos, assim como o contesto social em que ela se insere, para continuar a luta em prol de uma educação digna e de qualidade para todos (CAMILLO; PEDROSO, 2006, p. 111). 61 9. As principais teorias da educação no Brasil Aparecida Meire Calegari-Falco. Érica Mieko Ohara Itoda. Segundo as autoras, no Brasil, desde o descobrimento prevaleceu o ensino denominado tradicional, voltado para a formação da elite. Afirmam que, apenas no século XIX intensifica-se o debate sobre a função social da educação (concepção burguesa), de postura ora revolucionária, ora reacionária. Afirmam fundamentar-se nas idéias de Saviani. As principais teorias dividem-se em dois grupos: “não-críticas” e “crítico-reprodutivista”. Trata também de um terceiro grupo, denominado “teorias da resistência”; lembram que a reflexão crítica sobre a instituição de ensino tem início em 1960. Teorias não-críticas - não colaboram com a transformação social; - a função da educação é corrigir o homem. Pedagogia Tradicional - meados do século XIX: reeducar o homem para o trabalho - objetivo: perpetuar a sociedade (direitos e força de trabalho) - privilegia o conhecimento enciclopédico e contribui para a consolidação da burguesia como classe dominante; - busca a padronização dos indivíduos; 62 - educação aparece como remédio para todos os males: ao proporá igualdade entre os homens, tornou-se democrática. - organizador: o professor é o detentor do conhecimento. Fundamentada em Herbart. Não favorece o desenvolvimento autônomo, educa para o trabalho: homens obedientes, que não conhecem suas determinações históricas. - alcançou um grande contingente e colaborou para a elevação intelectual do povo. Como não propõe crítica à sociedade, é denominada Tradicional. Pedagogia Nova A pedagogia tradicional foi considerada incapaz de cumprir seu papel a partir do final do séc. XIX. Foi muito critica e, entre essas críticas, emergiu uma nova teoria: A Escola Nova, Pedagogia Nova ou Escolanovismo. - principal defesa brasileira: Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932). - criticam a escola tradicional, diziam que o problema da tradicional era ter como pressuposto a igualdade entre os homens; - novo discurso: descoberta e aceitação das diferenças individuais; trabalho com a subjetividade; - cabe à educação corrigir diferenças sociais; - papel da educação: transpor barreiras de diferenças, para alcançar um estado social plenamente nivelado; 63 - o professor deixa de ser o centro; o instrumento fundamental passa a ser o ambiente e a organização da aula. - as autoras lembram que esta proposta aumentou a desigualdade: o custo para manutenção dessa escola era muito algo, restringindo-se às escolas privadas (ocorreu o fortalecimento das mesmas) - O comparação escolanovismo à Pedagogia tornou-se Tradicional), reacionário ao (em destacar a desigualdade entre os homens.; - mostra-se ineficaz, uma vez que sua prática só favoreceu níveis mais altos da sociedade. Pedagogia Tecnicista - ditadura militar: valorização da técnica fabril norteamericana. Técnica incorporada à escola (2a metade do século XX). - abandona-se o aspecto subjetivo e centraliza-se o trabalho no professor; - enfoque: padronização e burocratização do ensino; formar pessoas eficientes e produtivas; preocupação com técnicas e resultados. AS TRÊS VERTENTES TERIAM O SEGUINTE OBJETIVO: Do ponto de vista pedagógico, conclui-se que, se para a pedagogia tradicional a questão central é aprender e para a pedagogia nova, aprender a aprender, para a pedagogia tecnicista o que importa é aprender a fazer (SAVIANI, 2003, p. 14, Apud CALEGARI-FALCO; ITODA, 2005, p. 117). 64 Teorias Críticas - desfaz-se a falsa afirmação de que a educação é garantia da igualdade e da universalidade do conhecimento, à medida que se torna evidente que nem todos conseguiam ingressar no ensino, ou ainda que nem sempre alcançavam o êxito prometido (SAVIANI). - teorias críticas surgem a partir da compreensão sociológica que leva em conta as lutas de classe; fundamentam-se na relação dominantes X dominados. - Giroux: interpretação da razão à época Iluminista enobreceu a causa capitalista; no entanto, na continuidade do processo, a razão (positivistas) tornou a ideologia iluminista reacionária. As teorias não críticas, quando negam a luta de classes, enaltecem a cultura dominante (reacionária). - dividem-se em dois grupos: “crítico-reprodutivistas” e “críticas da resistência”. Teorias Crítico-Reprodutivistas - analisam a educação com base nas relações de produção; - escola tem suma importância na reprodução da cultura dominante; - Giroux, na obra Pedagogia Radical, distingue duas variações da teoria crítico-reprodutivista: 1. a teoria da reprodução social (Louis Althusser, Baudelot e Establet, Bowles e Gintis) 65 1. a teoria da reprodução cultural (Bourdieu e Passeron). As duas variações apresentam a escola como subordinada à sociedade vigente. Mérito dos estudiosos: análise, crítica e teorização da função social da escola na sociedade capitalista. Teorias de Reprodução Social - Althusser (1970). A ideologia e os aparelhos ideológicos de Estado. Escola, religião, família, mídia, entre outras, constituem aparelhos ideológicos, por se caraterizarem como instituições culturais de massa. Não desafiam o capitalismo. Mecanismos de disseminação da ideologia dominante são tão engendrados que sua alteração é praticamente impossível. A escola é relativamente autônoma (dependência econômica). - Baudelot e Establet (1971). A escola capitalista na França: comprovação empírica da tese de Althusser na França. Escola defende a sociedade capitalista da ideologia proletária. - Bowles e Gentis (1976). A escola capitalista na América. A escola capacita para o trabalho (embora nem todos sejam absorvidos). Teorias da Reprodução Cultural - Bourdieu e Passeron. Destaque: A reprodução (1970). Enfocam a dominação na esfera cultural: a cultura ensinada na escola é a cultura dominante, vista pelos autores como uma forma de violência simbólica. A cultura 66 dominante é imposta; esta imposição é oculta e vista como natural. A escola privilegia os alunos que já possuem prérequisitos culturais. - As autoras avisam que essa teoria é tratada por Saviani como Teoria do Sistema de Ensino como Violência Simbólica. Teoria Crítica da Resistência - baseadas nos estudos das teorias crítico- reprodutivistas; - aqui, a escola é agente reprodutor, mas também comporta mecanismos de instrumentalização para as classes populares para a realização da transformação. A escola, ao mesmo tempo, reproduz e resiste. As autoras destacam: Dermeval Saviani, Paulo Freire, Henry Giroux. Paulo Freire – Conscientizar para mudar e mudar para trnasformar Destacam: Educação como prática da liberdade (1967), A Pedagogia do oprimido (1970) e Educação e mudança. - mudança é precedida pela tomada de consciência. - “A educação para Freire não é apenas ensinar a ler e a escrever: é criar condições para que a massa possa ter uma participação crítica na sociedade” (p. 121). - papel do professor: instiga a mudança por meio do diálogo. - processo de conscientização: na alfabetização é essencial entender o significado social das palavras; 67 - sociedade da mudança co-existe com a sociedade da estabilidade. Segundo as autoras, Giroux concorda com Paulo Freire: ambos expõem a necessidade do diálogo na escola: valorizam os contextos históricos e sociais. Por meio da alfabetização o homem pode reafirmar sua posição na sociedade. Dermeval Saviani e a pedagogia histórico-crítica (ou pedagogia crítico-social dos conteúdos) Para Saviani, “a função primordial da educação é a transmissão de conhecimento historicamente acumulados a todos os grupos sociais” (p.122). Principais obras: Escola e Democracia (1983) e Pedagogia Histórico-Critica, primeiras aproximações. - valoriza os conhecimentos dos alunos e do professor; importa que o aluno “adquira o conhecimento total e tenha acesso a toas as visões possíveis de um mesmo conteúdo” (p. 122). - o enfoque é o direto do aluno de: - conhecer as relações de produção do conhecimento; que qualquer assunto tratado na escola tem origem na sociedade; reconheça-se como sujeito em construção; seja um cidadão crítico e reflexivo. - não desvaloriza nem exalta nenhum dos elementos educacionais, aluno, professor ou recursos; - propõe a democratização do conhecimento; 68 - NÃO se volta para a mudança de postura do indivíduo e, consequentemente para a transformação social; mas, em fornecer meios de desenvolver uma postura crítica, que acaba auxiliando na transformação. 69