HONRA FEMININA DEFENDIDA POR INDIVÍDUOS

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HONRA FEMININA DEFENDIDA POR INDIVÍDUOS MASCULINOS.
ANÁLISE DE PROCESSOS CRIMES DE SEDUÇÃO. (1951-1953)
Tânia Lígia A. do Nascimento1
Resumo
Este artigo propõe analisar processos de crimes de sedução arquivados no NEDHIS
(Núcleo de Documentação Histórica) em Sobral. Partindo da categoria de análise
gênero, trabalhamos com quatro processos crimes da cidade de Sobral da década de
1950, onde os pais das vítimas faziam a denuncia contra aqueles que haviam
desonrando suas filhas, na tentava de resgatar a honra da filha e também a familiar.
Palavras chave: gênero, sedução, honra, defloramento
______________________________________________________________________
Introdução
As mulheres tiveram sua entrada tardia no campo da história, uma vez que a
história positivista mantinha interesse maior pela história política. A partir dos Annales
foi possível realizar uma transformação teórica que ampliou a possibilidade de
abordagens e metodologias na pesquisa historiográfica.
Ao se aproximar de outras ciências e outras fontes também foi possível uma
ampliação dos problemas analisados pelos historiadores. Fazendo com que as mulheres
passassem a ser objeto de pesquisa do campo da história.
A princípio, as mulheres apareceram na historiografia definidas como sujeitos
passivos, frágeis, ingênuos, etc. Contudo, à medida que houve revolução nas
concepções teóricas historiográficas, houve também mudança na forma como essas
eram vistas e descritas pela história Surgem então outras versões sobre as mulheres,
onde essas passam a ser descritas como ativas, fortes, batalhadoras, determinadas.
1
Pos Graduanda em Especialização em História do Ceará pela Universidade Estadual Vale do AcaraúUVA. Professora da Secretaria de Educação do Estado do Ceará. E-mail: [email protected]
2
Podemos dizer, grosso modo, que a história das mulheres “evoluiu” para a
história do gênero. Percebeu-se que não havia como estudar as mulheres em categoria
separada dos homens, além disso, os estudos de gênero possibilitaram analisar as
relações de poder existentes entre os dois sexos e para a negação do determinismo
biológico frente às funções sociais atribuídas ao sexo masculino e ao sexo feminino.
Utilizaremos a categoria gênero considerando que acima das definições
biológicas que justificam o “ser homem” e o “ser mulher”, foram construídas outras.
Nessa perspectiva, falar de gênero não é mais falar apenas “de mulher”, mas questionar
as formas pelas quais, socialmente se construíram as categorias homem e mulher.
Construções essas que variam de acordo com o período e a sociedade analisada.
O termo “gênero”, [...] é também utilizado para sugerir que qualquer
informação sobre as mulheres é necessariamente informação sobre os
homens, que um implica o estudo do outro. [...] Além disso, o termo
“gênero” também é utilizado para designar as relações sociais entre os
sexos. [...] o termo “gênero” torna-se uma forma de indicar
“construções culturais” – a criação inteiramente social de ideias sobre
os papéis adequados aos homens e às mulheres. [...] “Gênero” é,
segundo esta definição uma categoria social imposta sobre um corpo
sexuado. (SCOTT, 1990; p.75)
É sob essa perspectiva de estudo que este artigo está formulado. Tentando
elucidar, através da análise de quatro processos crimes de sedução, como eram definidos
os papéis sociais de homens e de mulheres e de que forma se dava a defesa da honra
feminina nas famílias sobralenses da década de 50.
De acordo com o jurista José Eulálio citado por Santos e Moura (2008) o crime
de sedução é um crime contra os costumes, caracterizando-se pela proteção da honra
sexual da mulher virgem, menor de 18 anos e maior de 14 anos que é submetida ao
congresso carnal por algum homem, aproveitando-se de sua inexperiência ou
justificável confiança.2 Percebe-se que a construção jurídica da mulher, com idade entre
14 e 18 anos, está pautada na ingenuidade e falta de conhecimento e experiência sexual.
O crime de sedução é um artigo direcionado exclusivamente às mulheres, o que
demonstra tratamento distinto sobre práticas sexuais de rapazes e moças entre 14 e 18
anos de idade. Os processos nos mostram que aos rapazes solteiros dessa idade, a
inserção nas atividades sexuais era permitida, às moças era sinônimo de desonra.
2
ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo de. Sedução: Instituto do Código Penal. 2007.
http://www.educadora.elo.com.br/~eulalio/Home_Artigos_Sedu%E7%E3o.htm.
3
2. Descrevendo o Processo de Sedução
Todos os processos em questão tiveram inicio com a denúncia prestada pelos
pais das moças descritas como “seduzidas”. A denúncia era prestada na delegacia de
policia civil; em seguida, o denunciante, a “vítima” e o réu prestavam seus depoimentos.
Eram recolhidos documentos oficiais dos envolvidos, dentre esses, ressaltamos a
importância do documento que comprovasse a idade da mulher “ofendida” nos casos.
Como um crime de sedução não pode ser configurado se o padrão de
idade não estiver dentro da lei, faz-se necessário anexar uma cópia da
certidão de nascimento, com a finalidade de comprovar a veracidade
da informação. A lei é bastante clara ao proteger as mulheres apenas
até os dezoito anos, pois a partir desta idade o Estado não se julga
mais responsável pela tutela feminina. (RIBEIRO, 1997; p. 65)
O mundo após as guerras mundiais sofreu uma mudança de paradigmas. O
mundo ficara mais moderno. Contudo, a modernidade também tinha representações
diferenciadas para o sexo masculino e para o sexo feminino. Caulfield (2005) aponta
que enquanto para esse a modernidade tinha o sentido positivo de racionalidade
progressiva, para aquelas, implicava moral licenciosa e estilo de vida desregrado.
A justiça ao legislar e normatizar distinguindo comportamentos - como a
conduta e a moral do masculino e do feminino, acabou por estabelecer espaços de poder
entre esses, onde o primeiro se sobrepôs ao segundo.
Retornando à descrição do Processo Criminal, para provar a denuncia do crime
era construído um laudo de conjunção carnal, através do qual, peritos atestavam a
prática sexual e construíam relatórios descreviam o hímen da “vítima”.
No exame de corpo de delito de Maria Luiza encontramos que “o exame policial
a que se submeteu a vítima revela que houve desvirginamento antigo, constatando a
mesma se encontrar no quarto mês de gestação”. No de Maria José Santana temos
“constatamos defloramento achando-se a mesma em estado de gestação”.
No caso de Maria da Conceição Rocha temos:
[...] Do exame constatamos a existência no abdome, de estrias
gravídicas (a paciente informa que teve um parto prematuro em
janeiro deste ano); nos seios notamos pigmentação de aureola
primitiva, nos genitais vemos ruturas antigas do hímem. Conclusão:
paciente divirginada a tempo e que já tete uma gestação. [...].
4
Analisando o laudo dos peritos ficamos a imaginar o quão constrangedor deveria
ser para essas mulheres, que por vezes desconheciam o próprio corpo e, que dentro dos
padrões morais da época, deveriam resguardar sua intimidade, expor seus corpos para
que homens desconhecidos às examinassem, as tocassem e confirmassem a ruptura de
seus himens, atestando em documentos oficias a perda de sua honra.
Ainda sobre a construção do processo criminal, após o recolhimento da
documentação e dos depoimentos das testemunhas e dos envolvidos, o delegado
escrevia um relatório em que solicitava que a Promotoria Pública assumisse o caso.
Junto à solicitação do delegado, para que o Ministério Público assumisse o processo era
anexado documento que comprovasse a condição de pobreza do pai da ofendida.
O promotor público intimava novamente à ofendida e as testemunhas, após ouvilas, intimava também o acusado a comparecer para prestar novos esclarecimentos. Era
lavrado então auto de qualificação do mesmo, onde este passava a ser réu no processo.
Quanto ao papel das testemunhas convocadas para prestar depoimentos, eram
intimadas a depor por conhecer algum dos envolvidos e, nos processos, auxiliar ao
poder judiciário a traçar um perfil dos mesmos a partir de suas vidas regressa.
Os envolvidos no processo passavam a ser analisados partindo dos depoimentos
prestados e dos depoimentos das testemunhas. Suas vidas passavam a ser vigiadas. Essa
vigilância se fazia mais criteriosa sobre o sexo feminino. A vida das mulheres
classificadas como “vítimas” era analisada em suas peculiaridades, observava-se como
viviam, que ambientes frequentavam, quais eram seus hábitos. Em resumo, essas
mulheres tinham sua intimidade invadida, fiscalizada e exposta no processo:
o crime de sedução é um artigo basicamente destinado à proteção da
honra e moral feminina. Este delito não se enquadra aos homens.
Partindo deste princípio, entendemos que o crime de sedução existe
para legitimar a dupla moral sexual, uma vez que só protege
mulheres.( RIBEIRO,1997, p.63)
Percebemos, que a Justiça, a partir de características atribuídas aos corpos de um
e de outro, ajudou na elaboração de papeis sociais de homens e de mulheres. Dessa
forma, os processos de crimes de sedução constituem-se importante fonte de pesquisa
para se analisar as relações de poder entre o masculino e o feminino. A análise desses
permite identificar de que forma difundiu-se o domínio masculino sobre a sexualidade e
de que forma os comportamentos considerados desviantes foram normatizados, assim
5
como também auxilia a compreender como a sociedade e seus sujeitos históricos
conceberam as relações de gênero, a sexualidade, a moralidade e outros tipos de
comportamento social.
O relato das testemunhas: de ofendidas a acusadas
Nos processos analisados percebemos a importância das narrativas das
testemunhas ao descrever a vida regressa das moças categorizadas como “ofendidas”.
De acordo com Caulfield (2005) tanto os acusados pelo crime quanto as ofendidas e
suas famílias ligavam liberdade à experiência sexual feminina, buscando enfatizar
sempre, como evidência da virgindade da moça, que ela era rigorosamente vigiada.
Para usarmos como exemplo, no processo onde temos como réu Eurico Crispim
e como ofendida Maria José Santana, temos no depoimento da testemunha Miguel
Odorico “que a referida moça [...] é pessoa recatada, não se dando frequência de festa”.
No depoimento de Manoel Caetano da Silva temos:
[...] o declarante veio ter conhecimento por intermédio da própria
menor Maria José Santana, ter a mesma sido deflorada pelo seu
namorado Eurico Crispim, fato este que muito admirou, dado as
qualidades que possuía Maria José, pois nunca soube ter a mesma
frequentado festa dansante nem ter outro namorado a não ser o
indivíduo que infelicitou-a
No processo onde o reu é Raimundo Mendes da Silva e a ofendida Maria da
Conceição Rocha, encontramos o relato de Maria de Jesus Linhares:
Maria Conceição é uma menina pobre, mas de bons predicados, não
conhecendo outro namorado a não ter sido Raimundo Mendes que a
infelicitou; que Maria da Conceição não era moça acostumada a andar
em festas, vivendo de seu trabalho
Ainda nesse processo a testemunha Francisca Alves dos Santos, relatou:
que conhece a moça acima referida sendo uma moça muito calma não
frequentava festas, vivendo esclusivamente do seu trabalho; que não
conhece outro namorado de Maria da Conceição a não ser Raimundo
Mendes, que este após cometer o crime foragiu-se desta cidade (sic)
Percebe-se nas narrativas dos depoentes, que a mulher categorizada como
“vítima” precisava provar ser mulher honesta e de bom comportamento, caso isso não
ficasse evidente na fala dos depoentes, a mulher poderia perder o status de vítima e o
judiciário a julgar como também responsável pelo defloramento.
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Chama atenção que os processos estudados ocorreram dentro da residência da
“ofendida”, como no caso de Maria Conceição Rocha, e em eventos sagrados, como “as
novenas da Igreja do Patronato” e à “época da Festa de São Francisco”.
Considerando que essas mulheres tinham liberdade de sair desacompanhadas de
casa, para ir a eventos religiosos e, ao frequentar esses espaços, acabavam dar-lhes
novos sentidos, pois eram usados não apenas como local de oração, mas como espaço
onde podiam, ao estar longe da vigilância familiar, encontrar paqueras, namorados e até
mesmo praticar atos considerados indevidos para moças de família.
Homens como defensores da honra feminina
Honra, diz respeito à honestidade, castidade, inocência. Nesse sentido, um crime
de sedução é um crime contra a honra feminina, pois, a vítima é seduzida pelo acusado,
que aproveitando da sua inexperiência, acaba por ludibriar a moça com falsas
promessas, até que essa entregue-se sexualmente, ocorrendo assim a sua desonra.
No início do século XX, o termo “honra”, aparentemente neutro, analisado pela
ótica do gênero perde essa característica, pois dependendo do sexo a que era atribuído
possuía características diferentes. Segundo Caulfield (2005) o homem honesto era um
bom trabalhador, respeitável e leal, que não desonraria uma mulher ou voltaria atrás em
sua palavra. Já a honestidade feminina referia-se a sua virtude moral no sentido sexual.
A honra feminina estava atrelada à manutenção de um comportamento moral
recatado e à manutenção da virgindade sexual. A ruptura do hímen gerava, além da
perca da virgindade, um desprestígio social para a sua família. Perder o hímen era como
perder a competência para ser uma boa esposa de família e consequentemente uma boa
mãe.Vale ressaltar, que família que tivesse sua honra “perdida”, estaria exposta a sofrer
discriminações pelos olhares preconceituosos da sociedade.
Declaração do pai da ofendida que data de agosto de 1951:
Disse que vinha representar contra o indivíduo Francisco Soares, [...].
Cujo elemento começou [...]a frequentar a casa do representante com
os fins de namorar com a menor FRANCISCA COELHO, que,
[...]ficou frequentando a casa do representante e ali demorava onde
alimentava o namoro com a referida moça, este prometendo cazar-se;
que agora no mês de julho do corrente ano veio o declarante saber que
7
Francisco Soares havia desvirginado sua filha e que estava se
afastando para não reparar a falta que cometera (...)
Em outro processo crime de sedução que data de outubro de 1952 apresentamos
o termo de declaração feita pelo pai da ofendida:
[...] Que há dois (2) anos passados tinha conhecimento do namoro de
Marcelo Pessoa, com a menor Maria Luiza Rodrigues de Oliveira,e,
que o mesmo [...]certamente aproveitou-se da ausencia do declarante
que trabalha como vaqueiro do finado Pedro Frota, e, sua filha estava
na casa da viuva deste, a qual sempre teve com sua filha severa
vigilância, mas, quando esta saia com as filhas da patrôa do
declarante, encontrava-se com Marcelo, (...) Diante das promessas , o
declarante foi sabedor que sua filha havia sido disvirginada, [...]após
vários meses, por Marcelo Pessoa
Nos exemplos acima temos as figuras dos pais das ofendidas dirigindo-se à
justiça para denunciar os defloradores. Ao pai, cabia à função de proteger as mulheres
da família da desonra. Quando descobriam a perca da honra dessas, recorriam às
delegacias buscando reparar o mal e forçar os defloradores a casarem-se com as vítimas.
Evitando assim, macular a honra individual da mulher e logo a honra da família.
A perda da honra feminina representava uma falha no poder de mando do chefe
familiar e logo a perda da honra familiar. O pai, ao buscar via justiça o reparo da honra
perdida pela filha, buscava também o reparo da sua honra enquanto patriarca.
Não importando se preferissem o termo “defloramento”, “sedução” ou
“ desvirginamento”, os juristas concordavam unanimamente em que,
ao punir o defloramento, a lei protegia um princípio moral e não
somente uma marca fisiológica. (CAULFIELD,2005, p. 77)
Nas formulações da denuncia, os pais juntamente com as testemunhas por eles
indicadas, não poupavam esclarecimentos sobre a educação da vítima do defloramento.
No inquérito cuja vítima era Maria Luiza Rodrigues, a mesma foi definida como “uma
menina direita e que se entregando ao acusado, foi porque confiava nas promessas por
ele feitas de casar com ela. Tais esclarecimentos faziam-se necessários para demonstrar
a honradez e pureza das mulheres envolvidas nos inquéritos.
Deflorar por fraude consistia em convecer uma mulher de que o
deflorador seria seu marido legítimo, quando na verdade, não o seria.
Dessa maneira, o consentimento da mulher na relação sexual fora do
casamento seria defensável somente se ela tivesse a ilusão de que
estava concedendo um “adiantamento de direitos de marido”.
(CAULFIELD , 2005, p. 78)
Aqui temos a solução buscada para solucionar os delitos: o casamento. Junto a
esse se estabelecia a reparação da honra perdida tanto pela moça como pelo grupo
8
familiar ao qual essa fazia parte, pois concedia à mulher deflorada, o status de mulher
casada e, ao pai da vítima, o de cumpridor de sua tarefa de patriarca: zelar pela honra
das mulheres sob sua tutela e conduzir as mesmas ao matrimônio.
Devemos levar em consideração que na década de 1950 não era fácil discutir
sexualidade, tendo em vista que os pais não conversavam com os filhos sobre esse
assunto. Tal tema era tratado pela Igreja Católica, e era ela quem tratava de ensinar as
moças a manterem-se honradas a data do casamento.
Sobral é uma cidade que surge a partir de uma fazenda de criar, a Fazenda
Caiçara que, como muitas cidades do interior do Ceará, seu desenvolvimento se deu em
torno de um rio e de Igrejas católicas, essas detinham forte influência sobre a população.
Segundo Felix citada por Santos e Moura (2008) Sobral como cidade pequena tinha a
religiosidade bastante acirrada e a Igreja tinha grande influência na vida familiar3.
O discurso da religiosidade católica sobre sexualidade era o de que a relação
sexual só devia ser estabelecida visando à reprodução humana. Cabendo à mulher a
função de ser fiel ao esposo, de procriar e cuidar das tarefas domésticas e familiares.
Priore (2006) aponta que a igreja, desde os primeiros escritos de Paulo, busca
controlar corpos e almas, e o casamento seria o remédio que Deus dera aos homens para
que estes se preservassem da imundície, no caso as relações sexuais.
Isso nos leva a perceber que as condutas sociais femininas e masculinas não
eram traçadas apenas no cotidiano familiar. A igreja e o próprio Estado, através de suas
instituições como o judiciário, também eram determinadores de tais funções.
Conclusões
Os resultados dos inquéritos avaliados apresentam conclusões diferentes. No
final do inquérito onde aparece como vítima Maria José Santana e como acusado Eurico
Crispim, consta anexada ao processo, a certidão de casamento do casal em questão.
Desfecho idêntico ao do inquérito de Raimundo Mendes e Maria Conceição Rocha.
Esse era o final idealizado por todos os “homens de família” que buscavam
defender a honra das mulheres “ defloradas” e da família a qual era o chefe.
3
FELIX, Ana Cristina Costa. Mulher: submissão, socialização e higienização. Sobral, 1910 a 1920.
Monografia- UVA, p. 11, 2003.
9
No processo envolvendo Francisco Soares e Francisca Coelho, o primeiro foi
condenado a dois anos e dois meses de prisão.
Já no inquérito onde acusado e vítima são respectivamente Marcelo Gadelha e
Maria Luiza Rodrigues, consta certificado assinado em 5 de julho de 1953, por oficial
de Justiça onde consta “deixei de efetuar a prisão ao denunciado Marcelo Gadelha Pessa
por não ter encontrado nesta cidade e não ter sido informado onde é seu paradeiro”.
Nessa situação percebe-se que o objetivo da queixa não atendida, uma vez que o
acusado aparentemente some ou foge da cidade para não necessitar casar.
Podemos concluir que os querelantes dos crimes de sedução buscavam a justiça
para conseguir reaver a honra e dignidade das moças defloradas, fazendo com que os
acusados se casassem com a vítima. A anexação da certidão de casamento foi o que
encerrou inquérito que tinha como acusado Eurico Crispim.
No entanto, no inquérito onde o acusado era Marcelo Pessa, consta no relatório
do inquérito a vida pregressa do mesmo onde se tem:
consta nesta delegacia, contra o acusado Marcelo Gadelha Pessa, que
aos doze do mês de Junho do corrente ano, o mesmo foi processado,
por crime de defloramento na pessoa de Maria de Lurdes de Amorim
Portela, menor de 16 anos
Marcelo já era acusado de outro crime de sedução e foi sentenciado a três anos e
seis meses de reclusão. No entanto anexo ao processo encontramos um certificado
assinado por um oficial de justiça onde o mesmo afirma não ter efetuado a prisão do
acusado devido ao mesmo não ter sido encontrado.
Nesse caso, temos uma situação onde um mesmo indivíduo pratica dois crimes
de sedução. E, mesmo sendo julgado como culpado pela justiça, foge para não cumprir
a pena, e também não obedecendo a ordens judiciais, cometendo novamente o mesmo
crime com outra moça e fugindo da justiça para não cumprir as normas processuais.
Dessa forma, concluímos que mesmo com o Estado, a igreja e a família criando
regras onde as mulheres solteiras só deveriam ter relações sexuais pós-casamento,
encontramos nos processos de sedução, mulheres e homens que transgrediram aos
papeis social a eles imposto e tecendo novos arranjos sociais que não os impostos pela
sociedade vigente.
10
Referências Bibliográficas
ALMEIDA, José Eulálio Figueiredo de. Sedução: Instituto do Código Penal. 2007.
Disponível
em:
http://www.educadora.elo.com.br/~eulalio/Home_Artigos_Sedu%E7%E3o.htm.Acesso
em 14.06.2011
BRASIL. Juízo de Direito de Sobral. Ação Criminal.nº não identificado. Vítima:
Francisca Cavalcante do Nascimento, Acusado: Francisco Soares. Sobral, 1951.
BRASIL. Juízo de Direito de Sobral. Ação Criminal.nº594. Vítima: Maria Luiza
Rodrigues de Oliveira,Acusado: Marcelo Gadelha Pessa. Sobral, 1952.
BRASIL. Juízo de Direito de Sobral. Ação Criminal.nº393. Vítima: Maria José Santana,
Acusado: Eurico Crispim de Sousa. Sobral, 1953
BRASIL. Juízo de Direito de Sobral. Ação Criminal.nº590. Vítima: Maria Conceição
Rocha,Acusado: Raimundo Mende da Silva. Sobral, 1953.
DEL PRIORE, MARY. História do Amor no Brasil. São Paulo: Contexto, 2006
MOURA, Juliana Aragão. SANTOS, Chrislene Carvalho. Em busca da honra: justiça
nos processo de sedução. Revista Homem, espaço, tempo, 2008.
PERROT, Michele. Minha História das Mulheres.[Tradução Angela M.S. Côrrea]. São
Paulo: Contexto, 2007.
RIBEIRO, Edmeia Aparecida. Fonte Judicial na Pesquisa Histórica. O crime de
sedução.
SCOTT. Joan. Gênero: uma categoria útil de análise histórica.Revista Educação e
Realidade, v. 15, n.2, jul/dez 1990.
SOIHET, Raquel. HIISTÓRIA DAS MULHERES. IN: Domínios da História: Ensaios
de Teoria e Metodologia. Ciro Flamarion Cardoso, Ronaldo Vainfas (orgs). Rio de
Janeiro: Elsevier, 1997 – 21º reimpressão. 275-296.
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