Acta Obstet Ginecol Port 2012;6(3):107-110 Original Article/Artigo Original Sentinel node biopsy in breast cancer: analysis of a 5-year experience Biópsia do gânglio sentinela no cancro da mama: análise de uma casuística de 5 anos Cecilia Urzal*, Cristina Frutuoso**, Margarida Figueiredo Dias*** Hospitais da Universidade de Coimbra Abstract Sentinel node biopsy has become the standard procedure in the evaluation of the axilla during primary surgery for breast invasive carcinoma. The information brought by the pathologist allows the surgeon to complete the staging in only one intervention. Nevertheless, its utility is determined by the ability to detect or exclude the presence of tumor cells in the nodes. This study was conducted to analyze the sensibility, specificity, positive predictive value and negative predictive value of the technique. We also compared the group of patients who underwent immediate axillary dissection with those whose surgery was postponed by a false negative result. Overexpression of HER-2 by the tumor was the only parameter showing significant difference between both groups. Keywords: biópsia do gânglio sentinela; estadiamento axilar; cancro da mama Introdução Nas doentes com cancro da mama operável e avaliação axilar clínica e ecográfica negativa, a biópsia do gânglio sentinela (GS) representa uma oportunidade fidedigna e minimamente invasiva de proceder ao estadiamento regional1. A dissecção ganglionar selectiva, baseada no achado de invasão tumoral do GS, pode ser efectuada no mesmo tempo operatório, implicando o seu exame extemporâneo. Em alternativa, perante a indisponibilidade do estudo per-operatório ou a sua discordância em relação à análise definitiva, a indicação para efectuar o esvaziamento axilar determina a necessidade de programar uma intervenção adicional. O presente estudo pretende rever os resultados do Serviço na realização da biópsia do GS, com a sua avaliação per-operatória, e comparar o subgrupo de doentes submetidas a dissecção axilar imediata com os casos em que a cirurgia foi completada em diferido. * Interna de Ginecologia e Obstetrícia ** Assistente Hospitalar *** Assistente Graduada, Professora Auxiliar 107 Ursal C, Frutuoso C, Figueiredo Dias M, Métodos Foi efectuada a análise retrospectiva das 487 mulheres com diagnóstico pré-operatório de carcinoma invasivo da mama e sem gânglios axilares palpáveis ou ecograficamente suspeitos de metastização, com indicação para tratamento cirúrgico primário. As doentes foram submetidas a biópsia do GS e excisão do tumor primário (mastectomia total ou tumorectomia, orientada por arpão no caso de lesões não palpáveis) síncronas, entre Janeiro de 2005 e Dezembro de 2009. A identificação do GS integrou a injecção peri-areolar combinada de nanocolóide marcado com 99mTc, com uma dose total de radiação de 2 mCi, na véspera da intervenção, e de azul patente, no bloco operatório, após a indução anestésica. No período inicial, o corante vital era injectado a nível intra-tumoral. Qualquer gânglio corado de azul à inspecção visual, exibindo contagens com sonda de detecção gama superiores a 10% da radiação máxima, ou apresentando-se duro ou aumentado, foi excisado e submetido como GS. O exame extemporâneo foi efectuado mediante estudo macroscópico acompanhado por exame citológico por imprint (ou decalque, envolvendo a remoção de células superficiais ou de uma superfície de corte da peça através do seu contacto com uma lâmina de microscopia) ou raspado do esfregaço (cursando com a remoção das células mais superficiais através de esfoliação). O estudo histológico, em corte de congelação, foi também realizado quando considerado necessário pelo patologista. A análise histopatológica definitiva do tecido nodal, após inclusão em parafina e cortes seriados de 100/ 100 µm, efectuou-se através de coloração com hematoxilina-eosina e, sistematicamente, foi realizada imunomarcação adicional com anticorpo MNF116. A dissecção axilar incluiu os níveis I e II de Berg. Os gânglios em que se identificaram micrometástases (0,2-2,0 mm) ou macrometástases (>2,0 mm) foram considerados positivos. A presença exclusiva de células tumorais isoladas (CTI) ou agrupamentos celulares <0,2 mm foi equiparada à negatividade. A não identificação do GS e a ausência de realização de exame extemporâneo constituíram critérios de exclusão. Resultados Das 487 mulheres propostas para a realização da técnica, excluíram-se aquelas em que o GS não foi identificado (n= 8) ou estudado por exame extemporâneo (n= 5). Os casos integrantes do estudo, relativos a 474 doentes, referemse a um total de 834 gânglios analisados como sentinela. Reportam-se uma taxa de identificação de 97,9% e a excisão de uma média de 1,7 gânglios por doente. 108 Em exame extemporâneo, foi detectada a presença de células tumorais em 70 gânglios (60 com macrometástases, 7 com micrometástases e 3 com CTI), correspondendo a 66 mulheres. A análise pós-operatória foi discordante em 5 casos, de macrometástases. Foram realizadas 64 dissecções axilares imediatas (os 56 casos com macrometástases e os 8 casos sem identificação do GS). Entre as 56 mulheres incluídas no estudo, registaram-se gânglios adicionais invadidos em 21 doentes (20 com macrometástases e 1 com micrometástase). Neste subgrupo, a média da idade das doentes foi de 54,4 anos, integrando 21 pré-menopáusicas e 35 pós-menopáusicas. O estudo histológico da peça de excisão do tumor primário identificou 52 carcinomas ductais invasivos (CDI) e 4 do tipo lobular (CLI). Trinta tumores foram estadiados como T1, 24 como T2 e 2 como T3. Segundo o score de Bloom, 19 foram categorizados em G1, 27 em G2 e 10 em G3. Cinquenta e quatro apresentaram expressão de receptores de estrogénios e 8 demonstraram positividade para o receptor HER-2. O estudo histológico definitivo dos restantes 764 gânglios sentinela identificou 77 estruturas nodais linfáticas com compromisso neoplásico: 38 com macrometástases, 37 com micrometástases e 2 com CTI, referentes a 72 mulheres. Efectuaram-se 54 dissecções axilares diferidas: 34 por macrometástases e 20 por micrometástases. Treze mulheres apresentaram gânglios não sentinela invadidos (11 com macrometástases e 2 com micrometástases). Determinou-se um intervalo médio de 32,9 dias entre as duas intervenções. Vinte e oito das mulheres deste subgrupo eram pré-menopáusicas e 26 eram pós-menopáusicas, com uma média de 55,6 anos. Relativamente aos tumores primários, 49 foram do tipo ductal e 5 do tipo lobular, 32 estadiados como T1 e 22 como T2, 16 classificados em grau 1, 32 em grau 2 e 6 em grau 3. Registou-se positividade para receptores de estrogénio em 48 carcinomas e positividade do receptor HER-2 em 2. O total das 110 dissecções axilares correspondeu a uma média de 15,2 gânglios excisados por intervenção. Não foi realizada dissecção axilar em duas doentes com macrometástases em exame definitivo do GS (uma com tomografia de emissão de positrões mostrando axila normal e outra com 7 gânglios negativos, excisados durante a biópsia do GS). Discussão O estado ganglionar representa o factor com maior capacidade de proporcionar informação sobre o curso clínico do processo tumoral2. Contudo, e não obstante o valor prog- Acta Obstet Ginecol Port 2012;6(3):107-110 Quadro I Número de gânglios Extemporâneo positivo Extemporâneo negativo Histopatologia positiva 62 (7,4%) 75 (9,0%) Histopatologia negativa 5 (0,6%) 692 (83,0%) Sensibilidade (S) 45,3% Especificidade (E) 99,3% Valor preditivo positivo (VPP) 92,5% Valor preditivo negativo (VPN) 90,2% Número de doentes Extemporâneo positivo Extemporâneo negativo Histopatologia positiva 58 (12,2%) 70 Histopatologia negativa 5 (1,1%) 341 Sensibilidade Especificidade Valor preditivo positivo Valor preditivo negativo (14,8%) (71,9%) 45,3% 98,6% 92,1% 83,0% Quadro I. Resultados dos exames extemporâneo e histopatológico, e determinação de S, E, VPP e VPN, baseados no número de GS e de doentes Quadro II Idade Status hormonal Estádio tumor Tipo histológico Grau nuclear RE/RP + HER-2 Dissecção axilar imediata (n=51) Dissecção axilar diferida (n=54) 54,4 anos 19 pré-, 32 pós-menopáusicas 27 pT1, 22 pT2, 2 pT3 47 CDI, 4 CLI 17 G1, 23 G2, 9 G3 49 8 55,6 anos 28 pré-, 26 pós-menopáusicas 32 pT1, 22 pT2 49 CDI, 5 CLI 16 G1, 32 G2, 6 G3 48 2 p = NS p = NS p = NS p = NS p = NS p = NS p < 0,05 Quadro II. Comparação dos subgrupos de doentes submetidas a dissecção axilar imediata e diferida; NS= não significativo nóstico da dissecção axilar, a morbilidade a que se associa tem difundido a prática do mapeamento linfático e subsequente biópsia do GS3,4. Apesar do benefício da dissecção axilar na sobrevivência global ser controverso, e do efeito da biópsia do GS sobre o controlo local da doença não ter sido estabelecido, o esvaziamento ganglionar da axila permanece indicado na presença de GS invadido por macrometástases ou micrometástases5,6. O recurso exclusivo ao exame histopatológico convencional para avaliar o GS resulta na eventual necessidade de completar a abordagem cirúrgica da axila em diferido. A re-intervenção revestese de consequências económicas e psicológicas, obriga a uma segunda anestesia, pode acarretar dificuldade técnica e morbilidade acrescidas e é susceptível de atrasar o início de eventual terapêutica adjuvante7. Uma vez que se associa a uma taxa aumentada de segundas cirurgias, a elevada probabilidade de metastização ganglionar também diminui o potencial interesse da técnica de biópsia do GS. Por este motivo, as suas indicações têm sido restringidas aos está- dios T iniciais, com axila negativa, após exploração clínica e ecográfica8,9. Por sua vez, as vantagens da modalidade minimamente invasiva de estadiamento axilar são maximizadas pela análise patológica per-operatória do(s) gânglio(s), de forma a permitir completar a terapêutica cirúrgica do carcinoma invasivo num único tempo operatório. Os casos falsamente negativos, conforme estabelecido após exame histopatológico definitivo, devem ser, subsequentemente, submetidos a dissecção axilar completa10,11. Assim, a aplicação da técnica do GS encontra-se circunscrita não apenas pela sua disponibilidade, como também pela sensibilidade e especificidade da avaliação extemporânea. Na experiência do Serviço, registou-se concordância entre os estudos per- e pós- operatório do GS em 399/ 474 doentes, cuja abordagem cirúrgica da axila ficou completa numa intervenção. Os casos falsamente positivos reflectirão uma atitude de hipervalorização de quaisquer alterações suspeitas de malignidade. Traduzindo-se numa especificidade de 98,6%, correspondem a um número reduzido 109 Ursal C, Frutuoso C, Figueiredo Dias M, de doentes sobre-tratadas, o que configura um requisito fundamental de um método que se pretende redutor de morbilidade. Relativamente à sensibilidade, algumas considerações podem ser feitas. Os resultados apresentados decorrerão, em parte, da influência da exclusão de doentes com adenopatias aparentes na avaliação pré-operatória. O facto de a maioria dos tumores se encontrar em estádios iniciais, com menor probabilidade de doença ganglionar extensa, pode também ter contribuído para reduzir a taxa de gânglios identificados como positivos, entre o total de gânglios invadidos. Saliente-se ainda que, entre os verdadeiros positivos, 88,7% apresentavam macrometástases e 11,3% micrometástases confirmadas, enquanto os falsos negativos corresponderam a uma proporção semelhante de casos com evidência de macro- (50,7%) e micrometástases (49,3%). Finalmente, verificou-se que 37,5% das mulheres submetidas a dissecção imediata tiveram invasão adicional de gânglios não sentinela, facto que se observou em apenas 24,1% daquelas em que o procedimento foi realizado em segunda intervenção. Todos os elementos parecem apoiar a hipótese de que a sensibilidade da detecção se relacione com a magnitude da invasão tumoral a nível ganglionar. Neste sentido, a expectativa de reduzir o número de re-operações de forma a optimizar as vantagens da técnica implicará considerar as limitações inerentes à análise citológica. Considerando as características tumorais e das doentes, a sobre-expressão de HER-2 foi a única variável a apresentar diferença estatística entre os dois subgrupos constituídos e, por conseguinte, a estabelecer uma relação significativa com a capacidade de identificar, em exame extemporâneo, a positividade do GS. Este resultado original vem sugerir a probabilidade da presença de cargas tumorais superiores nos casos de tumores primários com sobre-expressão destes receptores, eventualmente acompanhando um maior número de células tumorais em circulação. Se se verificar ser um achado reprodutível, a negatividade de HER-2 pas- 110 sará a estimular a necessidade de um maior índice de suspeição na análise per-operatória do GS, ao associar-se ao acréscimo de falsos negativos. Bibliografia 1. Lyman GH, Giuliano AE, Somerfield MR, et al. American Society of Clinical Oncology guideline recommendations for sentinel lymph node biopsy in early-stage breast cancer. J Clin Oncol 2005;23:770320. 2. Iwuchukwu OC, Wahed S, Wozniak A, et al. Recent advances in noninvasive axillary staging for breast cancer. Surg Oncol. doi:10.1016/j. suronc.2010.05.001 3. Veronesi U, Paganelli G, Viale G, et al. Sentinel-lymph-node biopsy as a staging procedure in breast cancer: update of a randomised controlled study. Lancet Oncol 2006;7:983-90. 4. Lucci A, McCall LM, Beitsch PD, et al. Surgical complications associated with sentinel lymph node dissection (SLND) plus axillary lymph node dissection compared with SLND alone in the American College of Surgeons Oncology Group trial Z0011. J Clin Oncol 2007;25:3657-63. 5. Kim T, Giuliano AE, Lyman GH. Lymphatic mapping and sentinel lymph node biopsy in early-stage breast carcinoma: a metaanalysis. Cancer 2006;106:4-16. 6. Krag DN, Anderson SJ, Julian TB, et al: Technical outcomes of sentinellymph- node resection and conventional axillary-lymph-node dissection in patients with clinically node-negative breast cancer: Results from the NSABP B-32 randomised phase III trial. Lancet Oncol 2007;8:881-8. 7. Bear HD. Completion axillary lymph node dissection for breast cancer: immediate versus delayed versus none. Journal of Clinical Oncology 2008; 26:3483-4. 8. Schwartz GF. Clinical practice guidelines for the use of axillary sentinel lymph node biopsy in carcinoma of the breast: current update. Breast J. 2004;10:85-8. 9. Goldhirsch A, Ingle JN, Gelber RD, et al.: Thresholds for therapies: highlights of the St Gallen International Expert Consensus on the primary therapy of early breast cancer 2009. Ann Oncol 2009;20:1319-29. 10. Wada N, Imoto S, Hasebe T, et al. Evaluation of intraoperative frozen section diagnosis of sentinel lymph nodes in breast cancer. Jpn J Clin Oncol. 2004;34:113–7. 11. Christiansen P, Friis E, Balslev E, et al. Sentinel node biopsy in breast cancer: Five years experience from Denmark. Acta Oncol. 2008;47:561–8.