1 Um Fluxo de Carga Misto para Sistemas de Distribuição M. Firmino de Medeiros Jr., and Max C. Pimentel Filho Resumo- Este trabalho apresenta um fluxo de carga específico para sistemas de distribuição, que apresentam uma configuração radial no circuito de média tensão e circuitos malhados de baixa tensão. Para solução da parte radial do sistema será utilizado o fluxo de carga soma de potências e para solução da parte malhada será utilizado o método injeção de corrente, ambos funcionando simultaneamente, i.e., em um mesmo processo iterativo. Essa combinação de algoritmos tem como objetivo explorar as principais características de métodos já consagrados para o calculo de fluxo de carga, compatibilizando-os às necessidades de análise de redes mistas. Palavras-chave—Fluxo de Carga, Injeção de Corrente, Soma de Potências, Distribuição, Sistemas Radiais e Malhados. I. NOMENCLATURA V EA →Tensão complexa na entrada do trecho (fase A); V SA →Tensão complexa na saída do trecho (fase A); I A →Corrente complexa no trecho (fase A); I AB →Corrente complexa entre a fase A e B; Z A →Impedância complexa do trecho (fase A); →Impedância serie do transformador; ZT RN →Relação de espiras do transformador; magnético entre as fases A e B; a V →Tensão complexa no secundário do transformador Mab →Acoplamento (fase A); S →Potência complexa composta; S0 → Potência complexa constante; S1 → Potência complexa de corrente constante; S2 → Potência complexa de impedância constante; I rS k →Parte real da corrente na fase S no nó k; S Im k →Parte imaginária da corrente na fase S no nó k; VrS k →Parte real da tensão na fase S no nó k; VmS k →Parte imaginaria da tensão na fase S no nó k; Os autores agradecem o suporte financeiro dado pela Companhia Energética do Rio Grande do Norte – COSERN, para o desenvolvimento deste trabalho. M. F. de Medeiros Jr é Professor do Departamento de Enga. de Computação e Automação da UFRN (e-mail: firmino @dca.ufrn.br). M. C. Pimentel Filho é Doutorando do Programa de Pós-graduação em Engenharia Elétrica da UFRN (e-mail: [email protected]). P esp k S → Potência ativa especificada na fase S no nó k; Q esp k S → Potência reativa especificada na fase S no nó k; V →Modulo da tensão em pu. II. INTRODUÇÃO O cálculo de fluxo de carga consiste em, a partir do resultado da aplicação das leis de circuito ao modelo de um sistema de energia, resolver um sistema de equações não lineares, através de um método iterativo. Inicialmente, nos anos 50, utilizava-se o método de Gauss-Siedel para a sua resolução. Porém, apesar de eficiente, esse método era muito lento, necessitando de um número excessivo de iterações para encontrar a solução, o que, aliado à baixa capacidade de processamento dos computadores da época, tornava o método inviável. No final dos anos 60, Tinney apresenta a resolução do sistema de equações pelo método Newton-Rapshon, cujo desenvolvimento considerava as características dos sistemas de transmissão de energia, sem explorar computacionalmente características típicas de redes de distribuição. Após a apresentação do método de Newton - conforme começou a ser chamado - ele passou a ser uma referência no cálculo de fluxo de carga, pois apresentava uma convergência rápida e eficiente, mesmo para sistemas mal condicionados. Desde então, praticamente todos os métodos passaram a tomar como base, a formulação de Tinney, e tentar corrigir algumas deficiências que pudesse conter, como a necessidade da inversão da matriz Jacobiana a cada iteração. Porém, como esses métodos foram desenvolvidos levando em consideração as características dos sistemas de transmissão, as simulações de sistemas de distribuição eram realizadas, através de uma formulação, que não lhes era específica. No final dos anos 80, com a modernização da legislação e o aumento da competitividade, bem como a necessidade de uma melhora da qualidade da energia fornecida, como decorrência do aparecimento de cargas mais sensíveis com a variação da tensão, o setor da distribuição de energia passou a ser estudado de uma maneira mais profissional. Em 1990, Cespedes apresenta o método soma de potências, exclusivo para sistemas radiais de distribuição de energia elétrica, desenvolvido tomando como base as suas características. Geralmente, os sistemas de distribuição de energia elétrica apresentam uma configuração radial e o método da soma de potências lhe parece perfeito. Porém, a cada transformador de um sistema de distribuição conecta-se um subsistema de baixa tensão, que geralmente tem o circuito malhado. Como 2 conseqüência, caso se queira simular em um mesmo algoritmo, um sistema de distribuição no qual em alguns transformadores também sejam representados os consumidores de baixa tensão, a utilização do fluxo de carga soma de potências será inadequada. Portanto, tentando adaptar o método da soma de potências para todas as situações, este trabalho irá apresentar um fluxo de carga misto. Nele, a parte radial do sistema, ou de média tensão, será simulada utilizando o algoritmo da soma de potências e, para a resolução dos sistemas de baixa tensão, será utilizado o método da injeção de corrente, ambos funcionando simultaneamente, a cada iteração. III. FLUXO DE CARGA SOMA DE POTÊNCIAS O método Soma de Potências tem, como característica básica, a possibilidade de transformar o problema de cálculo em um conjunto de subproblemas que, por sua vez, podem ser resolvidos através das equações que relacionam as tensões entre dois nós de um alimentador de distribuição, com as potências equivalentes dos nós (potências-soma). Dessa forma, o processo de solução é realizado de dois em dois nós, partindo da subestação (nó referência), até que a tensão em cada nó do sistema seja conhecida. Após atualizar as potências dos nós, o processo é repetido até que os valores das tensões convirjam. A. Modelagem das Linhas de Transmissão As linhas de transmissão serão modeladas considerando a influência do fluxo magnético da corrente de uma fase sobre as outras fases do circuito. No sistema de equações 01, mostra-se o equacionamento de um trecho de uma linha de distribuição trifásica. É importante observar que, na modelagem adotada, a influencia da terra será desprezada. cujo valor é diretamente proporcional à tensão, e as de impedância constante, cujo valor é proporcional ao quadrado da tensão. Assim, uma carga genérica pode ser caracterizada pela equação 02. S S 0 S1 V S 2 V 2 02 C. Modelagem dos Transformadores Em um sistema de distribuição, as cargas podem estar conectadas diretamente no sistema de média tensão (consumidores especiais) ou, como é encontrado com maior freqüência, no secundário de um transformador de distribuição. De acordo com a figura 2, considerando uma relação de espiras RN e desconsiderando o fluxo mútuo no transformador, tem-se: V V ZT RN ZT RN V a V A V B I AB ZT RN V b V c B C V C I BC V A I CA eq. (03) eq. (04) eq. (05) I AB I a RN (06) I BC I RN (07) I CA I RN (08) b c I A I AB I CA I B I C I BC I CA (09) I AB (10) I BC (11) V SA V EA I A Z a I B Mab I C Mca B A C V SB V B E I Zb I Mab I Mbc (01) C C B A VC S V E I Zc I Mcb I Mca Figura 2: Transformador de distribuição com o primário ligado em Delta e o secundário ligado em Y Figura 1: Linha de transmissão trifásica. IV. FLUXO DE CARGA INJEÇÃO DE CORRENTE B. Modelagem das Cargas As cargas serão modeladas utilizando o método clássico, no qual elas são divididas em três tipos: as de potência constante cujo valor não depende da tensão; as de corrente constante O fluxo de carga injeção de corrente constitui-se em mais uma variante do fluxo de carga pelo método de Newton- Raphson. As equações trifásicas de injeção de corrente são representadas em sua forma retangular, resultando em um sistema de equações de ordem 6 n , onde n é o numero total de nós do sistema. A matriz Jacobiana é composta de blocos 6x6 que 3 representam a admitância nodal trifásica entre dois nós. Já os erros de corrente são expressos em função das potências ativa e reativa. As equações básicas do fluxo de carga são: de sistemas malhados. O fluxo de carga misto explora as principais características de cada um dos métodos de resolução de fluxo de carga. Para resolver a parte radial do sistema (média tensão) será utilizado esp S esp S S S o algoritmo pelo método da soma de potências; para resolução P V r k Qk Vm k I rS k k dos sistemas de baixa tensão, será utilizado o método injeção 2 2 VrS k VmS k de corrente. Apresenta-se abaixo o algoritmo do método n completo. G kiSt Vrt i BkiSt Vmt i (12) Algoritmo Geral i 1 t p 1. Ler dados da rede de média tensão e das redes de baixa tensão, a simular; 2. No caso de transformadores que apresentarem esp S esp S S S P V m k Qk Vr k sistema de baixa tensão, considerar a carga inicial I mS k k 2 2 no primário do transformador como a soma de VrS k VmS k todas as cargas existentes no seu secundário; n 3. Partindo do nó final, percorrer o sistema até o nó G kiSt Vmt i BkiSt Vrt i (13) inicial atualizando as potências equivalentes em i 1 t p cada nó e montando o vetor soma de potências (soma de todas as potências conectadas a jusante). O sistema resultante linearizado: No caso de se encontrar um nó com transformador conectado a um sistema de baixa tensão, executar abc abc Vr 1 I m 1 o algoritmo de baixa tensão; abc abc Vm 1 I r 1 4. Partindo do nó inicial e caminhando em direção abc I abc * abc abc * abc aos nós finais, calcular, pela equação 1, as tensões Y12 ... Y1*n Vr 2 m 2 Y11 abc abc abc abc de todos os nós do sistema; * * I rabc2 Y * Vm 2 Y21 ... Yn1 (14) 21 5. Verificar a convergência; caso não tenha ... ... ... ... convergido, voltar ao passo 3; caso contrario o Y * abc Y * abc ... Y * abc processo esta terminado; n 1 n 2 nn abc abc Vm n 6. Imprimir os resultados. I m n abc I abc r n Vm n Algoritmo de baixa tensão 1. Montar a matriz jacobiana; 2. Verificar as tensões de cada fase, em kV, no lado novo Vrabc Vrabc Vrabc (15) de alta tensão do transformador (circuito de média tensão); abc novo abc abc Vm Vm Vm (16) 3. Através das equações 3,4 e 5 encontrar as tensões no lado de baixa tensão; Resolvendo o sistema de equação eq.(14) encontram-se os 4. Calcular, pelas equações 13 e 14, a diferença entre incrementos de tensão ∆Vr e ∆Vm para cada fase de cada nó. a corrente especificada e a calculada em cada nó Portanto, com os novos valores de tensão, recalculam-se os de baixa tensão; desvios de corrente, eq.(12) e eq.(13), resolvendo-se 5. Considerando o lado de baixa tensão do novamente o sistema de equações. O processo estará transformador como um nó slack, calcular os terminado quando os valores de incremento de tensão incrementos de tensão para cada nó resolvendo o estiverem dentro da tolerância admitida. sistema de equações 14; 6. Calcular a corrente fornecida por cada fase do V. FLUXO DE CARGA MISTO secundário do transformador; Nos dois capítulos anteriores foi apresentado, 7. Através das equações 6, 7 e 8, encontrar as separadamente, o fluxo de carga soma de potências e o de correntes dentro do delta do circuito primário do injeção de corrente. Conforme mencionou-se, o fluxo de carga transformador; soma de potências tem sua aplicação voltada para sistemas 8. Através das equações 8, 9 e 10, encontrar a radiais de distribuição; portanto quando se quer representar os corrente fornecida por cada fase; sistemas de baixa tensão que estão conectados aos secundários 9. Com a corrente e a tensão de cada fase, calcular a dos transformadores, essa formulação pode não apresentar potência fornecida por cada fase (em pu); bons resultados, pois geralmente esses sistemas apresentam circuitos malhados. Por outro lado, o algoritmo da injeção de correntes não apresenta nenhum inconveniente para resolução 4 VI. RESULTADOS Para verificar a eficiência do método foi feita a simulação de um alimentador de média tensão (13,8 kV) de um sistema real, com a representação do sistema de baixa tensão conectado a um dos transformadores. Para a simulação, foram consideradas três possibilidades, na primeira o TAP do transformador de distribuição está na posição de 13,8, na segunda na posição de 13,2 e 12,6 na terceira possibilidade. Nas tabela 1 é apresentado um resumo dos resultados referente ao circuito de média tensão; a tensão apresentada neste quadro se refere ao lado primário do transformador ao qual esta conectado o sistema de baixa tensão. Na tabela 2 é apresentado o resumo dos resultados para o sistema de baixa tensão (220,00 volts), nela o valor de tensão apresentado se refere ao secundário do transformador ao qual se esta conectado o circuito de baixa tensão. Tabela 1: Resumo dos resultados do circuito de média tensão Potencia Tensa o Max desvio Numero TAP Slack (kW) (kV) Tensao (%) Iteracoes 13.8 13.2 969,51 972,00 12,64 12,63 10,00 10,00 24,00 29,00 12.6 975,33 12,63 10,00 33,00 Tabela 2: Resumo dos resultados do circuito de baixa tensão Potência Tensão Max desvio Tensão TAP Slack (kW) (V) (%) 13.8 59,43 201,54 21 13.2 61,44 210,61 18 12.6 64,2 220,53 14 teve uma variação de apenas 0,59%; caso a participação da(s) carga(s) representada(s) pelo(s) sistema(s) de baixa tensão represente uma parcela mais significativa da carga total do alimentador, um aumento de 8,03% refletira em um aumento considerável na potência total do alimentador, e o resultado do cálculo de fluxo de carga não seria tão semelhante para as três simulações de TAP, justificando a representação. Como se trata de um fluxo de carga trifásico, as tensões de fase, no secundário do transformador, estão em fase com as tensões de linha do seu primário (desconsiderando as impedâncias de curto-circuito). Este efeito faz com que as tensões de fase no secundário do transformador além de sofrerem o efeito da relação de espiras também estejam defasadas 30 graus com relação a tensão de fase do primário. Portanto, esse tipo de simulação permite que a simulação seja bastante precisa e fiel ao modelo real. Periódicos [1] W. F. Tinney, C. E. Hart. . Power Flow Solution by Newton’s Method, IEEE Trans. on Power System, vol. 86 , pp. 1449-1460 , November 1967. [2] R. Cespedes. New Method For the Analysis of Distribution Networks, IEEE Trans. on Power Delivery, vol. 05, No 1, January, 1990. [3] M. C. Pimentel Filho, M. F. de Medeiros Jr. . Modeling Adjustment and Controls in a Three-Phase Equivalent Power Summation Load Flow Method, Induscon, Junho 2002. [4] P. A. N. Garcia, J. R. Pereira, S. Carneiro Jr., V. M. da Costa, n. Martins. . Three Fase Power Flow Calculations Using the Current Injection Method, IEEE Trans. on Power System, vol. 15 , NO.2 , May 2000. VIII. BIOGRAFIA VII. CONCLUSÕES Analisando os resultados do sistema de baixa tensão são encontradas variações que, caso ele não estivesse sendo representado, não poderiam ser detectados apenas pela simulação do sistema de média tensão. A potência no lado de baixa do transformador e as tensões no circuito secundário tiveram variações de até 10% entre os três TAP’s simulados, representando situações distintas para análise. No caso do sistema de média tensão, inicialmente, pode-se imaginar que as três simulações foram semelhantes. Isso ocorre devido ao fato de apenas um sistema de baixa tensão ter sido representado e sua participação na carga total do sistema não ser significativa. Caso outros sistemas de baixa tensão passem a ser representados e a participação da carga do conjunto passe a ser considerável, esse resultado certamente será diferente. Por exemplo, verificando na tabela 2 a potência consumida no secundário do transformador, tem-se um aumento de 8,03% entre o maior e o menor TAP, porem a carga desse sistema de baixa tensão representa apenas 6,1% da carga total do alimentador que Manoel Firmino de Medeiros Jr. nasceu em 11 de julho de 1954, em Macaíba-RN, Brasil. Graduou-se na Universideade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN em Natal. Especializou-se em Eletrotécnica, na UNICAMP e realizou Mestrado na Universidade Federal da Paraíba, em Campina Grande. Seu título de Doutor (Dr.-Ing.) foi obtido na Technische Hochshule Darmstadt, na Alemanha Suas principais áreas de pesquisa compreendem aplicações de Computação Numéria e Otimização em problemas de Planejamento e Operaçào de Sistemas de Energia Elétrica. Atualmente, exerce a Chefia do Departamento de Engenharia de Computação e Automação da UFRN, em Natal. Max Chianca Pimentel Filho. nasceu em 18 de outubro de 1969, em ReficePE, Brasil. Graduou-se na Universideade Federal da Paraíba – UFPB em C. Grande. Realizou Mestrado na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, em Natal.Hoje faz o curso de doutorado na Universidade Federal do Rio Grande do Norte.